Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
11362/18.3T8LSB.L1-6
Relator: ANTONIO SANTOS
Descritores: EMBARGOS DE EXECUTADO
SENTENÇA ABSOLUTÓRIA
AUTORIDADE DO CASO JULGADO
EXCEPÇÃO DILATÓRIA
RESTITUIÇÃO DO INDEVIDO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 02/28/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I – A autoridade do caso julgado, por via da qual é exercida a função positiva do caso julgado, para poder funcionar como excepção dilatória, não exige a verificação da tríplice identidade a que alude o artº 581º,nº1, do CPC, pressupondo tão só que uma concreta QUESTÃO foi já objecto de decisão judicial, não podendo assim voltar novamente a ser discutida/apreciada .
II – É que, a partir do momento em que uma sentença, transitada em julgado, não reconhece a alguém certo direito, é absolutamente indispensável , para que haja confiança e segurança nas relações sociais, que a referida decisão negatória consubstancie uma aquisição definitiva , isto é, que não possa ser contrariada por uma sentença posterior.
III – Em razão do referido em I e II, o trânsito em julgado de sentença proferida em embargos de executado ( que é o local adequado e especifico para o executado se defender de uma execução injusta, e que consubstancia uma figura quase perfeita de uma acção declarativa ) deve fazer” caso julgado sobre a matéria declaratória, ficando o executado impedido de recorrer a uma acção declarativa por fora, com o fim de obter a condenação do exequente na restituição do indevido, sob pena de ofensa do caso julgado da decisão que julgou os embargos”.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os Juízes na 6ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa
                                           *
1.- Relatório.
A e B , intentaram – em Maio de 2018 - acção declarativa, com forma de processo comum, contra C  , peticionando que seja o Réu condenado:
1 - No pagamento aos Autores da quantia de 69.200,41 Euros com que injustificadamente se locupletou à custa deles pela aquisição da fracção autónoma para habitação pela sua adjudicação pelo preço de 55.000 Euros e pelo recebimento indevido, na sequência da penhoras decretadas, das quantias descontadas na retribuição do Autor no valor de 1.296,47 Euros e das quantias descontadas na retribuição da Autora no valor de 12.903,44 Euros e ainda nos juros vencidos sobre tais quantias à taxa de 4% ao ano desde da sua citação até à sua integral restituição ;
 2 - No pagamento aos Autores e porque continua a correr termos o processo de execução e serão de futuro igualmente descontadas nas suas retribuições na sequência das penhoras decretadas, as quantias que indevidamente vier a receber, em cobrança coerciva através do processo executivo número 2418/95.0TVLSB que corre termos no Tribunal da Comarca de Lisboa, Juízo de Execução de Lisboa - Juiz 2, processo, quantias a apurar em sede de liquidação de sentença.".
1.1. - Para tanto, alegaram os AA, em síntese, que :
- Em 30 de Junho de 1994, por escritura pública de cessão de quotas, o Réu C, titular de uma quota da sociedade comercial "… -…… Snack, Lda" com o valor nominal de 320.000$00, dividiu essa quota em duas, sendo uma com o valor nominal de 270.000$00 e que cedeu a D pelo preço de 6.750.000$00 Escudos e , outra e com o valor nominal de 50.000$00, que cedeu a F  pelo preço de 1.250.000$00 Escudos , tendo ambas as referidas quantias sido pagas nessa data;
- Ainda no âmbito da referida escritura pública de 30 de Junho de 1994,  G, titular de uma quota da mesma sociedade com o valor nominal de 80.000$00, cedeu a sua quota pelo preço de 2.000.000$00 a D, tendo a referida quantia sido paga nessa data;
- Ocorre que, quer a adquirente D , quer a F, não registaram a seu favor as mencionadas transmissão de quotas na competente Conservatória de Registo Comercial ;
- Já em 24 de Outubro de 1994, a D, por acordo denominado de «Contrato-promessa de Cessão de Quotas», prometeu ceder ao Autor uma quota com o valor nominal de 360.000$00 , representativa de 90% do capital social da sociedade comercial por quotas "A ….Café Pastelaria Snack, Lda", pelo preço de 14.500.000$00 Escudos ;
- No acto e para garantia do bom pagamento do preço da prometida cessão de quota com o valor nominal de 350.000$00 Escudos, os Autores subscreveram, aceitaram e entregaram à D uma letra em branco, sem pacto de preenchimento, letra que foi posteriormente preenchida no valor de 15.000.000$00 Escudos;
- A sociedade por quotas "A ….-Café Pastelaria Snack, Lda" era proprietária de um estabelecimento comercial de café e pastelaria sito na Rua de …, n° .., em Lisboa, e a sua aquisição foi o motivo determinante para a celebração da escritura de cessão de quotas e para a celebração da promessa de cessão de quotas ;
- Não obstante, após a celebração do supra aludido «Contrato-promessa de Cessão de Quotas», a promitente D, desinteressada da aquisição das quotas e do estabelecimento, veio a ceder a sua posição ao Réu C a quem endossou a letra supra referida ;
- Já a sociedade por quotas "A ……-Café Pastelaria Snack, Lda" , veio a ser dissolvida e viu encerrada a liquidação e cancelada a matrícula em 18 de Novembro de 2008, sendo que, a respectiva gerência foi exercida pelo Réu C e sua esposa e advogada G desde 8 de Março de 1993 até 18 de Novembro de 2008;
- De resto, o Réu C explorou o estabelecimento comercial de café e pastelaria sito na Rua de ..., n.° .., em Lisboa, desde Outubro de 1994 até ao início de 1995, até haver tomado conhecimento que a quota prometida ceder no valor de 360.000$00 Escudos não se encontrava registada em nome da D;
- Temendo estar a ser enganado e, depois de contactar o Réu, no início de 1995, o Autor marido entregou-lhe o estabelecimento comercial de café e pastelaria sito na Rua de ..., n.° .., em Lisboa;
- Por sua vez, o Réu instaurou em 07/06/1995 uma execução [ com base na Letra supra referida e que a D lhe endossou  ], a qual corre termos actualmente no Juízo de Execução de Lisboa com o número 2418/95.0TVLSB,  e  , no âmbito de cumprimento de carta precatória que lhe foi dirigida, o Tribunal da Comarca de Lisboa Oeste, processo n.°12688/14.0T2SNT, proferiu em 30 de Junho de 2016, em venda judicial, despacho de adjudicação ao Exequente C, ora Réu, da fracção autónoma designada pela letra D, correspondente ao primeiro andar Esquerdo do prédio urbano constituído em regime de propriedade horizontal sito na Rua ..., n° , em Queluz, descrito na CRP de Queluz sob o n° 1343, de 19/11/86, pelo valer de 55.000 Euros, fracção de que eram proprietários e era a sua casa de família;
- Ainda no âmbito do referido processo de execução proposto pelo ora Réu , foi penhorada a retribuição do Autor e, entre Outubro de 2016 e Novembro de 2017, foram descontadas pela entidade patronal e entregues à ordem daquele processo judicial várias importâncias, no valor global de 1.296,47 Euros,  e , foi penhorada também a retribuição da Autora mulher , tendo entre Fevereiro de 2016 e Maio de 2018, sido descontadas pela entidade patronal e entregues à ordem daquele processo judicial várias importâncias, no valor global de 12.903,94 Euros;
 - Ora, com a cobrança coerciva – na execução - fundada na letra que lhe fora endossada, o Réu viu aumentar o seu património, em 30 de Junho de 2016, com o valor de 55.000 Euros [ pela adjudicação em venda judicial da fracção pertencente aos Autores ], acrescido do valor de 1.296,47 Euros [ referente à penhora da retribuição do Autor ] e, outrossim, da quantia de 12.903,94 Euros [ este último referente à penhora da retribuição da Autora ], quantias que somadas perfazem a quantia global de 69.200,41 Euros;
 - Já os Autores, empobrecidos, viram o seu património diminuído no valor de 69.200,41 Euros e, na mesma proporção, viu o Réu aumentado o seu património, enriquecido, mas sem justa causa  ;
- É que, no património do Réu não se verificou a saída de um activo, mas entrou o preço da alienação de um bem, o que decorreu da execução de letra que apenas foi subscrita e aceite como garantia do pagamento do preço da alienação de uma quota,  efeito que se pretendia realizar mas que para todos os efeitos não se veio a verificar ;
- Entendendo-se a força do mérito da Douta Sentença proferida nos autos de embargos pelo Tribunal da Comarca de Lisboa, Juízo de Execução de Lisboa processo número 2418/95.0TVLSB, que declarou improcedentes os embargos deduzidos pelos ora Autores contra o Réu, portador da letra, por aplicação do disposto no artigo 17.° Lei Uniforme sobre Letras e Livranças, declarando inoponíveis as excepções do negócio subjacente ou fundamental, a verdade é que o Réu se locupletou à custa dos Autores, pois o seu património aumentou sem causa justificativa, correspondendo o aumento do seu património ao recebimento do preço do bem que não alienou, enriquecimento na proporção do empobrecimento dos Autores pela perda da fracção autónoma para habitação pela sua adjudicação ao Réu pelo preço de 55.000 Euros e pela perda das retribuições penhoradas, nos valores de 1.296,47 Euros e 12.903,44 Euros.
1.2.- Regularmente citado, contestou o Réu C, por impugnação motivada,  e , outrossim por excepção, invocando designadamente [ para além do erro na forma do processo e da prescrição do direito pelos AA invocado com fundamento no instituto do enriquecimento sem causa ] a excepção dilatória do caso julgado, e decorrente v.g dos seguintes fundamentos:
- A existência de sentença, confirmada em acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 08.02.2012, há muito transitada em julgado, proferida no processo 478/1995, que correu termos em Vara Cível de Lisboa, e que julgou improcedente uma acção declarativa de condenação interposta pelos Autores, contra o Réu, tendente à declaração de nulidade do mesmo contrato promessa de cessão de quotas a que se alude na petição inicial dos presentes autos;
- A existência de sentença que julgou improcedentes os embargos de executado - no processo executivo a que se alude na petição inicial da presente acção - deduzidos pelos ora AA, e no âmbito da qual foi reapreciada a validade dos negócios em causa, quer a promessa de cessão de quotas quer o negócio subjacente ao endosso e a validade do próprio endosso, ou seja, o negócio entre o Réu e D a que se referem os AA na petição inicial.
Termina o Réu por, impetrar – caso não procedam as invocadas excepções dilatórias - que a acção seja julgada improcedente, por em última instância não se verificarem os requisitos do enriquecimento sem causa .
1.3. - Após a apresentação de RESPOSTA pelos AA, foi dispensada a realização de uma audiência prévia, e ,proferido SANEADOR-SENTENÇA, nele apreciou-se e conheceu-se da eventual procedência de excepção dilatória invocada, vindo a decidir-se no mesmo nos seguintes termos:
“(…)
Assim sendo, conclui-se pela verificação da excepção dilatória da autoridade do caso julgado e, consequentemente, absolve-se o Réu da instância.
Custas pelos Autores.
Registe e notifique.
Lisboa, 26/11/2018”
1.4. - Inconformados com tal sentença, vieram os AA A e B, apresentar recurso de apelação, tendo nas respectivas alegações recursórias formulado as seguintes conclusões:
A - Violação dos artigos 364.°, 368.° e 370 ° do Código Civil e 446.° do C.P.C. - São julgados provados factos com base em simples fotocópias fazem prova plena, apesar de arguida a sua autenticidade e impugnada a sua exactidão.
1 - O Réu Recorrido para fundamentar excepção de caso julgado juntou 9 fotocópias sentenças que não foram emitidas nem lhes foi aposto o selo branco dos Tribunais, documentos que não são autênticos, nos termos dos artigos 364.° e 370.º do Código Civil.
2 - Foi impugnada exactidão e ilidida a sua autenticidade e força probatória pelos Autores ora Recorrentes, em 30/08/2018, com a Resposta por eles apresentada com a referência 20042656, nos termos do disposto no n.° l do artigo 446.° do C.P.C, e nos termos do artigo 368º e 371.° do Código Civil, pelo que, tais documentos não podiam fazer prova plena dos factos que representam.
3 - Com base em documentos, fazendo prova plena do aí representado, apesar de impugnado, o Tribunal recorrido deu como provado factos relativos à acção declarativa, que correu termos sob o n.º 3364/09.7TVLSB, primeiro da 11ª Vara Cível de Lisboa, lª Secção, depois do Juízo Central Cível de Lisboa - Juiz 6 e a acção executiva que corre termos sob o n.° 2418/95, agora do Juiz 2 da Secção de Execução do Tribunal da Comarca de Lisboa e os deduzidos embargos de executado, em violação do disposto nos artigos 364.°, 368.° e 370.° do Código Civil e 446.° do C.P.C., porque impugnada a sua exactidão e arguida a sua autenticidade em 30/08/2018.
4 - O Douto Despacho Saneador Sentença julgando provados factos com base em prova plena de documentos cuja autenticidade foi arguida e cuja exactidão e força probatória foi impugnada, violou as normas dos artigos 364.°, 368.° e 370.° do Código Civil e 446.° do C.P.C.
B - Arguição de nulidades do Douto Despacho Saneador Sentença.  
a) Argúi-se a nulidade do Douto Despacho Saneador Sentença, prevista na alínea d) do n.° l do artigo 615.° do C.P.C. - No Douto Despacho Saneador Sentença o Tribunal recorrido não se pronunciou sobre questão sobre a qual se devia ter pronunciado.
5 - Os Autores arguiram, nos termos do disposto do artigo 371° do Código Civil e no n.° l do artigo 446.° do C.P.C., a autenticidade dos 9 documentos por não terem sido foram emitidos por autoridade competente nem lhes ter sido foi aposto o selo do respectivo serviço e impugnaram a sua força probatória plena.
6 - O Douto Despacho Saneador Sentença é nulo porque o Tribunal não se pronunciou sobre a arguida autenticidade e sobre a impugnação dos documentos, documentos em que se funda para proferir Decisão que absolve o Réu do pedido.
b) Argúi-se a nulidade do Douto Despacho Saneador Sentença, prevista na alínea e) do n.° l do artigo 615.° do C.P.C. - O Douto Despacho Saneador Sentença é nulo porque apresenta Fundamentos que estão em oposição com a Decisão.
7 - Lê-se no Douto Despacho Sentença que "A excepção de caso julgado (...) Pressupõe a repetição de uma acção em dois processos distintos, (...) Haverá uma repetição de causas quando se verifique uma identidade quanto aos sujeitos, ao pedido e à causa de pedir (cfr. art. 5810, do Cód. Proc. Civil) e que (...) duas acções só serão idênticas quando numa e noutra (...) seja a mesma a causa de pedir (eadem causa petendi ). Porém,
8 - No Douto Despacho Saneador Sentença dá-se como provado que na acção declarativa, com o n.° 3364/09.7TVLSB (...) era pedido que fosse declarada a nulidade, por simulação, dos contratos promessa de cessão de quotas e bem assim a condenação na restituição de determinada letra e quantias pagas (...).
9 - Na presente acção a causa de pedir é o enriquecimento injustificado do Réu que, sendo o titular da quota, não prometeu a sua alienação, manteve-a na sua titularidade, beneficiou da promessa da sua alienação por quem não era titular, relação jurídica em que agiu como advogado e da qual acabou por tirar proveito e mesmo sem a alienar recebeu o preço da transmissão e mantendo a sua titularidade, convergindo na sua esfera jurídica e em simultâneo o bem e o preço, sendo que ao invés na acção declarativa com o n.° 3364/09.7TVLSB a causa de pedir é a nulidade do contrato promessa de cessão de quota.
10 - Relativamente à acção n.° 3364/09.7TVLSB por comparação com a presente, o Tribunal recorrido fundamenta o Douto Despacho Saneador Sentença com a exactidão da definição do que é caso julgado, definindo num caso e noutro que as respectivas causas de pedir e, exactamente ao contrário do que se fundamenta, conclui-se pela procedência da deduzida excepção de caso julgado, verifica-se assim contradição entre os Fundamentos e a Decisão no Douto Despacho Saneador Sentença e a nulidade prevista na alínea e) do n.° l do artigo 615.° do C.P.C., que se argui.
11 - E o mesmo vale relativamente aos Embargos com o processo n.° 2418/95, em que o próprio Tribunal recorrido conclui que a causa de pedir nesses Embargos foi a invocação de que subjacente à emissão da letra estava um negócio nulo, por simulado, declara que a presente se funda no enriquecimento sem causa, para concluir ser procedente a deduzida excepção de caso julgado, verifica-se contradição entre os Fundamentos e a Decisão no Douto Despacho Saneador Sentença e a nulidade prevista na alínea e) do n.° l do artigo 615.° do C.P.C., que se argui.
B - Violação da norma do artigo 580.°, n.° l do C.P.C. - excepção de caso julgado
a) O efeito de caso julgado da acção que correu termos sob o n.°3364/09.7TVLSB, primeiro da llª Vara Cível de Lisboa, lª Secção, depois do Juízo Central Cível de Lisboa — Juiz 6 não atinge a presente acção.
 12 - A presente acção tem como causa de pedir o enriquecimento injustificado do Réu que, sendo o titular da quota, não prometeu a sua alienação, manteve-a na sua titularidade, beneficiou da promessa da sua alienação por quem não era titular, relação jurídica em que agiu como advogado e da qual acabou por tirar proveito e mesmo sem a alienar recebeu o preço da transmissão e mantendo a sua titularidade, convergindo na sua esfera jurídica e em simultâneo o bem e o preço.
13 - Diferentemente na acção que correu termos sob o n.° 3364/09.7TVLSB a causa de pedir é a nulidade emergente da simulação do contrato promessa; é o Tribunal recorrido quem o afirma
14 - Igualmente o afirma o Réu, nos artigos 2.° e 3.° da sua Contestação articula que foi julgada improcedente uma acção declarativa de condenação interposta pelos Autores, contra si, tendente à declaração de nulidade do mesmo contrato promessa de cessão de quotas que se encontraria alegadamente viciado por ilegitimidade, invalidade formal e simulação
 15 - Se na acção aludida a causa de pedir são os vícios de ilegitimidade, invalidade formal e simulação que afectam o contrato promessa, que motivam o pedido de declaração de nulidade e o pedido de restituição da letra objecto de execução e já na presente acção, a causa de pedir é o enriquecimento ilícito e ilegítimo, não existe qualquer similitude entre as causas de pedir.
16 - Como na acção n.° 3364/09.7TVLSB, a causa de pedir é a arguição dos vícios de ilegitimidade, invalidade formal e simulação que afectam contrato promessa e na presente acção, é o enriquecimento ilícito e ilegítimo, não existe repetição da causa de pedir, o Douto Despacho Saneador Sentença ao decidir pela procedência da excepção de caso julgado viola o disposto no artigo 580.°, n.°l do C.P.C.. b) O efeito de caso julgado dos Embargos que correram termos sob o n.° 2418/95, agora do Juiz 2 de Execução do Tribunal da Comarca de Lisboa não atinge a presente acção.
 17 - Se nos Embargos que correram termos sob o n.° 2418/95, a causa de pedir como bem define o Tribunal "a quo" no Douto Despacho Saneador Sentença, foi a invocação de que subjacente à emissão da letra estava um negócio nulo, por simulado;
18 - Se é o Réu Recorrido (Contestação - artigos 2.° e 3.°) quem articula que nos indicados Embargos foi "... e reapreciada a validade dos negócios em causa, quer a promessa de cessão de quotas a que se refere o artigo 4° da petição inicial, quer o negócio subjacente ao endosso e a validade do próprio endosso, ou seja, o negócio entre o Réu e Maria Fernanda Amélia.".
19 - Se é também o Réu quem esclarece (artigo 8.° Contestação) que "... toda e qualquer questão relacionada com a eventual nulidade do contrato que deu origem a emissão da letra não podia ser oponível ao recorrido ... Assim sendo, sempre teriam os presentes embargos de improceder, pois o fundamento dos mesmos, assentava na nulidade dos dois referidos contratos, a qual, como vimos, não pode ser declarada ( e sendo certo que a eventual nulidade do contrato-promessa de cessão de quotas nunca podia ser oponível ao apelado )."
20 - O propalado e descontextualizado "naufrágio" da acção a que se faz referência no Douto Despacho Saneador Sentença é o naufrágio dos embargos que procuram sem sucesso pôr em causa os valores da certeza e da segurança jurídica do título de crédito, pois são inoponíveis quaisquer vícios da relação subjacente ou fundamental
21 - A cobertura que foi dada ao Réu por ser portador do titulo de crédito vicio da relação subjacente ou fundamental, naufraga agora na presente acção pois aqui desnudado aparece, uma vezes o dono do estabelecimento e da quota, outras advogado numa promessa de transmissão de quota que afinal é sua, em que é o advogado que tem a legitimidade para alienar a quota cuja alienação promete o cliente, mas cujo preço acaba afinal nas suas mãos, assim como o bem.
22 - Ao invés, na presente, a causa de pedir é o enriquecimento injustificado a vantagem patrimonial auferida por quem agindo como advogado, conhecedor da falta de legitimidade do promitente alienante, concretizou o negócio que sabia viciado por ser o legítimo do bem, o que fez logrando alcançar vantagem patrimonial injustificadamente recebida, assim ilícita.
23 - E assim, se nos Embargos com o n.° 2418/95, a causa de pedir foi a nulidade do contrato promessa e na presente, o enriquecimento ilícito e ilegítimo, não existe repetição da causa de pedir, o Douto Despacho Saneador Sentença proclamada a procedência da deduzida excepção de caso julgado viola o disposto no artigo 580.°, n.° l do C.P.C.
c) - A violação das normas dos artigos 580.°, n.°l e 607, n.°2 e 611.°, n.°s l e 2 todos do C.P.C. - O efeito do caso julgado é delimitado temporalmente pelo objecto do litígio.
24 - Tal como é configurado pelos artigos 607.° e 611.° do C.P.C, o objecto do litígio, o quid que é decidido pela sentença-acto, corresponde a todos os factos a tomar em consideração até ao encerramento da discussão
25 - As Doutas Decisões proferidas na acção n.°3364/09.7TVLSB hão-de ser a pronúncia decisória sobre factos ocorridos até 2009 ou 2010, à falta de certidão judicial.
26 - As Doutas Decisões proferidas nos Embargos com o n.° 2418/95 hão-de ser a pronúncia decisória sobre factos ocorridos até 2009 ou 2010, à falta de certidão judicial.
27 - De acordo com a factualidade vertida na petição inicial, só em 30 de Junho de 2016 ocorreu o primeiro aumento patrimonial injustificado na esfera jurídica do Réu, a adjudicação a este da fracção para habitação pertencente aos Autores.
28 - De acordo com a factualidade vertida na petição inicial, só a partir de Fevereiro de 2016 é que foram descontadas pela entidade patronal e entregues à ordem de processo judicial várias importâncias.
29 - Tendo o objecto do litígio conhecidos nas Doutas Sentenças e Acórdãos proferidos nas acções nº 3364/09.7TVLSB e nos Embargos n.º 2418/95 definido e delimitado por factos ocorridos até ao final da discussão nesses processos, os factos que consubstanciam o enriquecimento ilegítimo, a adjudicação e a penhora e entrega dos bens estão certamente fora do objecto do litígio e assim fora do efeito do caso julgado.
 30 - Atribuir efeito de caso julgado a factos ainda não ocorridos à data da prolação das Doutas Sentenças e Acórdãos é estender ad infinitum o efeito de caso julgado e assim mesmo violar o disposto nos artigos 580.°, n.° 1 e 607, n.°2 e 611.°, n.°s l e 2 todos do C.P.C., o que o Douto Despacho Saneador Sentença faz.
31 - Tendo sido o objecto do litígio das Doutas Sentenças e Acórdãos proferidos nas acção n.° 3364/09.7TVLSB e nos Embargos n.° 2418/95 definidos e delimitados por factos ocorridos até ao final da discussão, os factos que consubstanciam o enriquecimento, a adjudicação e a penhora e entrega dos bens estão certamente fora do objecto do litígio e assim fora do efeito do caso julgado.
32 - Atribuir efeito de caso julgado a factos ainda não ocorridos afastados da prolação das Doutas Sentenças e Acórdão é estender ad infinimm o efeito de caso julgado e assim mesmo, violar o disposto nos artigos 580.°, n.°l e 607, n.°2 e 611.°, n.°s l e 2 todos do C.P.C, o que o Douto Despacho Saneador Sentença faz.
C - Violação da norma do artigo 474.° do Código Civil.
 33 - A presente acção foi a única que foi deduzida contra o Réu tendo como causa de pedir o enriquecimento sem causa.
34 - Se ao Réu, por ser portador de letra foi inoponível os vícios do contrato e da relação subjacente ou fundamental, por força dos princípios da literalidade e abstracção, o sistema jurídico tem um mecanismo para se opor como às suas imperfeições, corrigindo situações de manifesta violação do Direito.
35 - Houve assim que recorrer ao mecanismo previsto no artigo 474.º do Código Civil, que faculta o mecanismo na falta de outro para ser restituído o que ilegitimamente foi empobrecido pelo enriquecimento sem causa.
36 - A letra subscrita e aceite titulava relação subjacente ou fundamental, negócio jurídico que não se realizou, da qual não emergiu a obrigação de pagar o preço da transmissão da quota; mas o crédito só existia formalmente, por força do princípio da literalidade e da abstracção e do princípio da certeza e confiança do trafego jurídico nos títulos de crédito.
37 - Entende-se assim o mérito da Douta Sentença e do Douto Acórdão proferidos nos Embargos número 2418/95.OTVLSB, por aplicação do disposto no artigo 17.° Lei Uniforme sobre Letras e Livranças, por serem sendo inoponíveis os vícios do negócio subjacente ou fundamental, no caso, a inexistência do crédito por ilegitimidade do transmitente, ao portador da letra, embora este fosse o criador do vicio e o seu beneficiário patrimonial.
38 - E assim fomos remetidos para o disposto no artigo 474.° do Código Civil, para a restituição por enriquecimento sem causa por não facultar o ordenamento jurídico, aos empobrecidos Autores outro meio de serem ressarcidos naquilo com o que o Réu injustamente se locupletou, normativo que o Douto Despacho negando viola.
Termos em que Deve o presente recurso ser declarado procedente em consequência, deve ser alterado o Douto Despacho Saneador que põe termo ao processo e que é Sentença, deve ser proferido Douto Acórdão que declare improcedente a excepção de caso julgado deduzida e que ordene a elaboração de Despacho Saneador e o prosseguimento da lide. com instrução, discussão e julgamento, pois só assim será feita Justiça.
1.6.- O Réu apresentou contra-alegações, impetrando a improcedência da apelação,  para tanto deduzindo as seguintes conclusões :
1 - Não existe qualquer nulidade de sentença ou questão por decidir, dado que, face aos factos dos autos, esteve bem o Tribunal ao considerar provadas as decisóes antenores, com cópias extraídos em sistema citius .
2 - Não foi possível juntar ao tempo certidões, porquanto os processos estavam apensos a processo que correu termos no Tribunal Administrativo do Circulo de Lisboa, entretanto findo.
3 - De qualquer forma, Juntam-se agora tais certidões, e face à constatação da idoneidade das mesmas face às impressões Juntas com a contestação, tal eventual nulidade, a existir , teria de se Julgar sanada.
4 - Tal invocação, tendo em conta que o Autor é parte de todos os supra referidos processos, e não pode pôr, como não coloca, em causa, a sua existência ou fidelidade, roça os limites da litigância de má fé, ou invocação de formalismos por si mesmo, sem por em causa a verdade dos factos ou a igualdades das partes, é um mero expediente.
5 - Não existe qualquer contradição entre os fundamentos e a decisão, dado que em ambos se considerou que não existia excepção de caso julgado.
6 - Por outro lado, bem esteve o Tribunal ao julgar  as decisões anteriores,  porque apreciavam da validade do negocio subjacente ao litigio, e concluíram pela validade do mesmo, em varias e repetidas instâncias, é um antecedente e precedente que deve agora ser respeitado, e portanto, Impõe-se que nào possa este Tribunal considerar que existe ennquecimento sem causa quando antes, por decisões várias e transitadas, se apreciou da causa, e se constatou que ela existe, e o negócio é valido e causal.
- Não existe assim qualquer violação das normas respeitantes ao enriquecimento sem causa, mesmo que alguns recebimentos sejam postenores às sentenças que apreciaram do mérito do negócio, dado que, havendo causa, nunca pode haver enriquecimento sem causa.
Pelo que se conclui pela improcedência do recurso, assim se fazendo a costumada Justiça
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Thema decidendum
1.7. - Colhidos os vistos, cumpre decidir, sendo que , estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões [ daí que as questões de mérito julgadas que não sejam levadas às conclusões da alegação da instância recursória, delas não constando, têm de se considerar decididas e arrumadas, não podendo delas conhecer o tribunal ad quem ] das alegações dos recorrentes ( cfr. artºs. 635º, nº 3 e 639º, nº 1, ambos do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei nº 41/2013, de 26 de Junho), e sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, as questões a apreciar e a decidir  resumem-se em aferir  :
Primo - Se os documentos juntos pelo apelado com a contra-alegações recursórias devem permanecer nos autos ;
Secundo -Se a sentença apelada é NULA, nos termos da primeira parte da alínea c) , do n.º 1,  do artigo 615º do Código de Processo Civil ;
Tertio Se a sentença apelada é NULA, nos termos da primeira parte da alínea d) do n.° l do artigo 615.° do C.P.C;
Quartus Se forçosa é a introdução de alterações na decisão proferida pelo tribunal de 1ª instância e relativa à matéria de facto;
Quintus - Se o Saneador-Sentença incorre em error in judicando , ao considerar/julgar verificada a excepção dilatória da verificação de excepção da autoridade do caso julgado.
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2.- Motivação de Facto
Pelo tribunal a quo foi fixada a seguinte FACTUALIDADE :
A) PROVADA.
2.1.- Foi intentada, pelos ora Autores contra o ora Réu e D, acção declarativa, que correu termos sob o n° 3364/09.7TVLSB, primeiro da 11ª Vara Cível de Lisboa, 1ª Secção, depois do Juízo Central Cível de Lisboa - Juiz 6, na qual era pedido fosse declarada a nulidade, por simulação, dos contratos promessa de cessão de quotas e respectiva escritura e bem assim a condenação na restituição de determinada letra e quantias pagas, tendo sido proferida sentença que absolveu o réu do pedido, confirmada por acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, transitado em julgado;
2.2. - O aqui Réu intentou acção executiva [ em 7/6/1995 ], com base na referida letra, contra os aqui Autores, a qual corre termos sob o n° 2418/95, agora do Juiz 2 da Secção de Execução do Tribunal da Comarca de Lisboa, no âmbito da qual o aqui Autor deduziu embargos de executado, invocado que subjacente à emissão da letra estava um negócio nulo, por simulado.
2.3. - Os referidos embargos foram julgados improcedentes, determinando-se o prosseguimento da execução.
2.4. - Da decisão de embargos foi interposto recurso, tendo sido proferido Acórdão, em 30/06/2015, que confirmou a decisão recorrida, e nos termos do qual se lê, nomeadamente: " (...) existe um enriquecimento para o recorrido. Só que esse enriquecimento, como já se viu, tem causa justificativa e a tentativa de o impedir ( por via de outra acção judicial) naufragou. (...)".
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3.- Se os documentos juntos pelo apelado com a contra-alegações recursórias devem permanecer nos autos.
Juntamente com as contra-alegações veio o recorrido C juntar diversas certidões de sentenças e acórdãos proferidos em tribunais de 1ª e 2ª instância, para tanto aduzindo que não lhe foi possível juntar ao tempo as competentes certidões, porquanto os processos estavam apensos a processo que correu termos no Tribunal Administrativo do Circulo de Lisboa, entretanto findo.
Compulsados os autos, verifica-se que logo em sede de articulado contestação [atravessado nos autos a 11/7/2018 ], tendo o ora apelado junto meras cópias de todas as decisões judiciais cujas certidões junta agora em sede de contra-alegações, invocou desde logo a impossibilidade de à data poder juntar as certidões, explicando que todas as acções – às quais pertenciam cada uma das decisões judiciais juntas – se encontravam apensas a processo a correr termos no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa , razão porque, logo que “regressassem” tais acções às respectivas secções, seriam requeridas as competentes certidões.
Ora, regulando a junção de documentos com as alegações, diz-nos o artº 651º, nº1, do CPC, aprovado pela Lei nº 41/2013, de 26 de Junho, rezando ele que “As partes apenas podem juntar documentos às alegações nas situações excepcionais a que se refere o art. 425º, ou no caso de a junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido na 1ª instância”
Já o artº 425º do CPC, e para o qual remete o referido artº 651º, do CPC, reza que “Depois do encerramento da discussão só são admitidos, no caso de recurso, os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até aquele momento”.
Conjugando ambas as referidas disposições adjectivas com a do artº 423º, do CPC , quer o seu nº1, quer o respectivo nº 2, prima facie tudo aponta para que os documentos possam pelas partes ser juntos aos autos até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final, e , após o referido momento, podem ainda ser carreados para o processo e para serem ainda valorados pela primeira instância, até ao momento do encerramento da discussão ( cfr. artº 425º do CPC) ou seja, até  a conclusão das alegações orais ( de facto e de direito - cfr. alínea e), do nº 3, do artº 604º) e subsequente encerramento da audiência, e desde que a sua apresentação não tenha sido possível até então, objectiva ou subjectivamente, ou a sua apresentação se tenha tornado necessária em virtude de uma ocorrência posterior ( cfr. nº 3, do artº 423º, do CPC).
Tudo visto e ponderado, porque a justificação aduzida – e logo com a apresentação do seu articulado contestação - pelo ora apelado para a não junção de certidões se revela pertinente e justificada , verificando-se em última instância a impossibilidade  objectiva  subsumível á previsão do artº 425º, do CPC, importa admitir a junção aos autos das certidões juntas pelo apelado em sede de instância recursória.
3.1 –  Se o Saneador-Sentença é NULO, nos termos da primeira parte da alínea c) , do n.º 1,  do artigo 615º do Código de Processo Civil
Vêm os apelantes arguir a nulidade do Saneador-Sentença recorrido porque, no respectivo entender, incorpora Fundamentos que estão em oposição com a Decisão, logo, incorre no vício a que alude a alínea c) [ que não  e) ] ,  do n.° l do artigo 615.° do C.P.C.
É que, explicam os apelantes, consta da Sentença recorrida que "A excepção de caso julgado (...) Pressupõe a repetição de uma acção em dois processos distintos, (...) Haverá uma repetição de causas quando se verifique uma identidade quanto aos sujeitos, ao pedido e à causa de pedir ( cfr. art. 581º, do Cód. Proc. Civil ) e que (...) duas acções só serão idênticas quando numa e noutra (...) seja a mesma a causa de pedir (eadem causa petendi )“ , mas ,  a verdade é que no mesmo Saneador Sentença dá-se como provado que na acção declarativa, com o n.° 3364/09.7TVLSB (...) era pedido que fosse declarada a nulidade, por simulação, dos contratos promessa de cessão de quotas e bem assim a condenação na restituição de determinada letra e quantias pagas (...) ,   e  , já na presente acção , ocorre que a causa de pedir é o enriquecimento injustificado do Réu que, sendo o titular da quota, não prometeu a sua alienação, manteve-a na sua titularidade, beneficiou da promessa da sua alienação por quem não era titular, relação jurídica em que agiu como advogado e da qual acabou por tirar proveito e mesmo sem a alienar recebeu o preço da transmissão e mantendo a sua titularidade, convergindo na sua esfera jurídica e em simultâneo o bem e o preço, sendo que ao invés na acção declarativa com o n.° 3364/09.7TVLSB a causa de pedir é a nulidade do contrato promessa de cessão de quota.
Acresce que, reforçam os apelantes, também no tocante aos Embargos que correram termos sob o n.° 2418/95, e em que, segundo o próprio Tribunal recorrido, a causa de pedir foi a invocação de que subjacente à emissão da letra estava um negócio nulo, por simulado, acontece que já na presente acção, a causa de pedir é o enriquecimento sem causa, beneficio que retirou o Réu sem causa legítima
Em suma, porque o Tribunal fundamenta a sentença com exactidão do que é caso julgado,  e  , num caso e noutro define que a causa de pedir é distinta, então decide exactamente ao contrário do que fundamenta,  concluindo pela procedência da excepção do caso julgado, verificando-se assim a contradição entre os Fundamentos e a Decisão.
Adiantando deste já o nosso veredicto, manifesto é que o vício adjectivo pelos apelantes invocado não se verifica de todo, antes incorrem os recorrentes – o que configura confusão que lamentavelmente é recorrente no regime recursal – no erro de confundirem o  error in judicando com o mero error in procedendo ou erro de forma , e sendo este último o único de que trata o nº1, do artº 615º, do CPC .
Vejamos.
Como é por demais consabido, a invocada nulidade de sentença decorrente de pretensa contradição entre a fundamentação e a decisão, apenas existe quando os fundamentos invocados - de facto e de direito - devessem, necessária e logicamente ( qual vício lógico ), conduzir a uma decisão diferente/oposta àquela que a sentença expressa, sob pena de existir entre ambos uma contradição insanável e incompreensível (a decisão colide com os fundamentos em que ostensivamente se apoia ) . (1)
Dito de uma outra forma, e como ensinam Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio e Nora (2), na alínea c), do nº1, do pretérito artº 668º do CPC, a lei refere-se à contradição real entre os fundamentos e a decisão e não a hipóteses de contradição aparente, resultantes de simples erro material, seja na fundamentação, seja na decisão.
É que, e em rigor, como bem explicam ainda os mesmos e ilustres Prof.s (3) citados, na situação referida, “há um vício real no raciocínio do julgador ( e não um simples lapsus calami do autor da sentença ): a fundamentação aponta num sentido ; a decisão segue caminho oposto ou, pelo menos, direcção diferente”.
Ainda como referência ao vício formal ora em análise, e agora nas palavras de Lebre de Freitas, Montalvão Machado e Rui Pinto (4),” Entre os fundamentos da decisão não pode haver contradição lógica : se na fundamentação da sentença, o julgador seguir determinada linha de raciocínio, apontando para determinada conclusão e, em vez de a tirar, decidir noutro sentido, oposto ou divergente, a oposição será causa de nulidade da sentença”.
E, logo a seguir, os mesmos autores advertem que  Esta oposição não se confunde com o erro de subsunção dos factos à norma jurídica ou, muito menos, com o erro na interpretação desta: quando, embora mal, o juiz entende que dos factos apurados resulta determinada consequência jurídica e este seu entendimento é expresso na fundamentação, ou dela decorre, encontramo-nos perante o erro de julgamento e não perante oposição geradora de nulidade; mas já quando o raciocínio expresso na fundamentação aponta para determinada consequência jurídica e na conclusão é tirada outra consequência, ainda que esta seja a juridicamente correcta, a nulidade verifica-se. A oposição entre os fundamentos e a decisão tem o seu correspondente na contradição entre o pedido e a causa de pedir, geradora da ineptidão da petição inicial (art. 193-2-b).”
Em suma, a hipótese da alínea c), do actual nº1, do artº 615ºº, do cpc, pressupõe a existência de uma oposição real entre os fundamentos e a própria decisão, isto é, situações em que os fundamentos invocados pelo julgador devessem ter conduzido, logicamente e coerentemente, a um  resultado diferente do expresso na decisão .(5)
Dito isto, tal “obriga“ por si só e desde logo a  arredar o invocado vício de nulidade de sentença, com base em pretensa contradição entre a fundamentação e a decisão ou comando /dispositivo – a solução dada ao litígio , pois que, analisado o grosso ( a globalidade) da fundamentação do a quo aduzida no Saneador-Sentença, não se descortina, antes pelo contrário, que aponte ela necessária e obrigatoriamente para um único sentido, tendo porém o Exmº julgador enveredado, contraditoriamente, por diferente desfecho/solução.
Com efeito, analisando a decisão recorrida, nela se mostra explanado, a dado passo, e designadamente, que :
“(…)
Assim, não pode concluir-se que, no caso em apreço, se verifica a excepção do caso julgado, uma vez que não ocorre a tríplice identidade a que alude o art. 581°, do Cód. Proc. Civil.
Não obstante, nos termos supra expostos, a questão que também se põe é a de saber se as decisões definitivas proferidas nos processos em referência atuam como autoridade de caso julgado, impossibilitando a continuação da presente lide.
Verifica-se que, com a presente acção, os Autores pretendem pôr em causa a validade e eficácia do contrato de cessão de quotas que esteve na origem da emissão da letra dada à execução, como pressuposto/forma de alegar da/a inexistência de causa justificativa do "enriquecimento" à custa da adjudicação de bens operada no âmbito da execução em curso. Ou seja, em último caso, pretendem pôr em causa ( mais uma vez ) a existência do crédito executivo.
Ora, tal validade foi já reconhecida no âmbito quer da acção declarativa quer da execução, em sede de embargos de executado, apresentando-se tal reconhecimento como antecedente lógico necessário à parte dispositiva daquela sentença, sendo certo que na sua fundamentação não deixou também o V. Tribunal da Relação de Lisboa de considerar, precisamente, a existência de causa justificativa perante a alegação de enriquecimento sem causa.
Deste modo, dir-se-á que das sentenças proferidas quer nos embargos de executado quer na acção declarativa de 2009, emergiu uma autoridade de caso julgado que impede que se discuta, novamente, a questão que nessas sentenças é antecedente lógico ou premissa da decisão, ou seja, a validade e eficácia do contrato de cessão de quotas e, nessa base, a existência do crédito exequendo.
Noutra ordem de considerações, a possibilidade de conhecimento do pedido formulado na presente acção, colocaria o tribunal na alternativa de contradizer ou de reproduzir uma decisão anterior.
Entendem os Autores que o Réu se locupletou sem causa justificativa, a qual radica, precisamente, na invalidade do dito contrato e na negação do direito de crédito subjacente à emissão da letra dada à execução.
Ora, tal pedido e os factos que o suportam é incompatível com a situação que ficou definida nas decisões transitadas.
Por outras palavras, não é admissível que os Autores, depois de terem sido atingidos pelos efeitos definitivos de duas sentenças de mérito proferidas no âmbito de processos em que tiveram possibilidade de se "defender", façam uso autónomo do direito de (nova) acção para, no fundo, provocar o esvaziamento daquelas sentenças, com prejuízo para o direito que pelas mesmas foi reconhecido.
Mostra-se, pois, impedido o prosseguimento da c, por via da autoridade do caso julgado projectada pelas sentenças judiciais proferidas e supra referidas, com a inerente absolvição do Réu da instância.”
Em suma, e de resto de forma ostensiva, difícil não é descortinar-se que da sentença recorrida consta concreta fundamentação que aponta claramente para a verificação dos pressupostos da excepção dilatória da autoridade do caso julgado e, coerentemente [ que não contraditoriamente ], o desfecho decisório vai precisamente no referido sentido, tendo o Réu sido absolvido da instância.
É certo que, ambos os recorrentes, não se conformando com o comando decisório da sentença, aduzem que em rigor a Exmª Juiz a quo  erra em sede de adequação da factualidade adjectiva provada ao plano abstracto da norma que aplica, ou seja, que a ilustre magistrada erra ao sentenciar como o fez, máxime em função da motivação de facto na qual se baseia e que, de todo não permite uma tal decisão.
Sucede que, a terem os recorrentes razão, então o vício que atinge a sentença será já de natureza substantiva ( error in judicando), que não adjectiva, não sendo ele de todo subsumível à previsão do artº 668º, do CPC.
Em suma, também os AA/apelantes, confundem o error in judicando com o mero error in procedendo, tratando o erro no julgar ou erro material ou de conteúdo como se fosse ele um mero erro adjectivo ou um vício de forma, que não é, de todo.
Destarte, está longe o saneador-sentença de padecer do vício adjectivo subsumível ao nº1, do artº 615º, do CPC , não existindo qualquer   contradição - antes existe coerência e adequação - entre a fundamentação de facto e de direito e o comando decisório da decisão .
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3.2. - Da invocada NULIDADE DA SENTENÇA, à luz do nº1, alínea d), primeira parte do artº 615º, do CPC .
No entender dos apelantes, o saneador-sentença é ainda NULO por força da alínea d) do n.° l do artigo 615.° do C.P.C, pois que, nele não se pronunciou a Exmª Juiz a quo sobre a questão que suscitou no seu articulado de 30/8/2018, a saber, o da falta de autenticidade dos 9 documentos ( cópias de decisões/sentenças judiciais ) juntos aos autos pelo apelado em razão de não terem sido emitidos por autoridade competente.
Em suma, não se tendo pronunciado sobre a referida autenticidade e sobre a impugnação da respectiva força probatória dos aludidos documentos, é  o Despacho-Saneador NULO.
Mais uma vez, e novamente antecipando desde já o nosso veredicto, é para nós pacífico que não padece a sentença apelada do vício adjectivo que lhe é apontado.
Senão ,vejamos.
É vero que reza a alínea d), do nº1, do artº 615º, do CPC, que a sentença é nula quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento “.
O vício/nulidade referida, mostra-se em consonância com o dever [ cfr. nº2, do artº 608º, do CPC ] que recai sobre o Juiz de, em sede de sentença , resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, servindo de cominação ao seu desrespeito (6).
Sobre o Juiz incide , portanto, no dizer de Lebre de Freitas e outros (7), a obrigação de apreciar/conhecer “ todas as questões que lhe são submetidas, isto é, de  todos os pedidos deduzidos, todas as causas de pedir e excepções invocadas e todas as excepções de que oficiosamente lhe cabe conhecer (…), sendo que, a ocorrer uma tal omissão de apreciação/conhecimento,  e , não estando em causa a mera desconsideração tão só de eventuais “(…) linhas de fundamentação jurídica, diferentes da da sentença e que as partes hajam invocado (…)“,  então o “ não conhecimento do pedido , causa de pedir ou excepção cujo conhecimento não esteja prejudicado pelo anterior conhecimento de outras questões, constitui nulidade”.
Porém, importa não olvidar que, como há muito advertia José Alberto dos Reis (8), não se devem confundir factos ( fundamentos ou argumentos ) com questões (a que se reportam os artigos 608.º, n.º 2, e 615º, n.º 1, alínea d), do CPC) a resolver, pois que uma coisa é não tomar conhecimento de determinado facto invocado pela parte, e , outra completamente distinta, é não tomar conhecimento de determinada questão submetida à apreciação do tribunal. (9)
Em rigor, para nós e em termos conclusivos, dir-se-á que as questões a que alude a alínea d), do nº1, do artº 615º, do CPC, mais não são do que as que alude o nº 2, do artº 607º, e artº 608º, ambos do mesmo diploma legal, e que ao Tribunal cumpre solucionar, delimitando-se e emergindo as mesmas da análise da causa de pedir apresentada pelo demandante e do seu confronto/articulação com o pedido que na acção é formulado.
Ou seja, e dito de um outro modo, não se confundindo é certo as questões a resolver pelo juiz em sede de sentença com quaisquer argumentos e razões que as partes invoquem em defesa das suas posições, o correcto/adequado será em rigor considerar-se que o vocábulo “questões” a que alude a alínea d), do nº1, do artº 615º, do CPC, mostra-se empregado na lei adjectiva com o sentido equivalente a “questões jurídicas” ainda carecidas de resolução, impondo-se que no âmbito das mesmas seja dada prioridade às questões de natureza processual que ainda estejam por resolver ( nulidades, excepções dilatórias ainda por apreciar ou outras questões de natureza processual que interfiram no resultado), e , sem embargo da apreciação das questões que sejam de conhecimento oficioso, deve o juiz limitar-se a apreciar as que foram invocadas, evitando, deste modo, a nulidade da sentença por excesso de pronúncia, nos temos do art. 615º, nº 1, al. d), in fine. (10)
Postas estas breves considerações, manifesto se nos afigura, desde logo, que não se descortina que a desconsideração pelo julgador e em sede de julgamento de facto de concreta impugnação e/ou arguição da respectiva irrelevância probatória de um documento [ mero meio de prova ] seja – em face do que acima se expôs – capaz de integrar a previsão da alínea d), do nº1, do eraº 615º, do CPC, porque prima facie não preenche a referida desconsideração a ausência de pronúncia do julgador para concerta e efectiva QUESTÃO a resolver.
Depois, e como é consabido, e a existir um erro de julgamento de facto [ o que ocorre vg também quando o julgador considera provado um facto com base em meio de prova legalmente insuficiente – cfr. artº 364º, do CC  ] , certo é que prevê/indica expressamente o CPC qual o meio adequado de o ultrapassar [ que é o do artº 640º, do CPC ] , logo, também por tal motivo , não pode de todo a questão pelos apelantes suscitada implicar a nulidade da sentença, antes deve a mesma caber na previsão dos artºs 640º e 662º,ambos, do CPC, podendo e devendo ser conhecida e decidida em sede de impugnação da decisão relativa à matéria de facto ( cfr. artº 640º, do CPC ).
Em razão do acabado de expor, improcedem portanto também as conclusões recursórias dos apelantes interligadas com a invocada nulidade da sentença e relacionadas com a alegada omissão de pronúncia sobre pretensa e efectiva questão que devia – o tribunal a quo - apreciar e conhecer.
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4 - Se forçosa é a introdução de alterações na decisão proferida pelo tribunal de 1ª instância e relativa à matéria de facto.
Invocam os apelantes a violação pelo tribunal a quo dos artigos 364.°, 368.° e 370 ° do Código Civil e 446.° do C.P.C. , porque em sede de Saneador-Sentença julga como provados factos com base em simples fotocópias, máxime socorre-se de meras fotocópias de sentenças que não de competentes certidões emitidas.
Acresce que, dizem os apelantes, foi impugnada – com a resposta apresentada - a exactidão e foi também ilidida a sua autenticidade e força probatória dos referidos documentos/cópias pelo Réu juntos , razão porque não podiam os mesmos fazer prova plena dos factos que representam.
Em última análise, portanto, concluem os apelantes, o Douto Despacho Saneador Sentença ao julgar provados factos carecidos de prova plena com base em documentos cuja falta de autenticidade foi arguida e cuja exactidão e força probatória foi impugnada, violou as normas dos artigos 364.°, 368.° e 370.° do Código Civil e 446.° do C.P.C.
Ora, antes de mais, a admitir-se que os AA/apelantes cumpriram e observaram com exactidão todos os ónus [ o que não é claro, máxime – e nas conclusões - os indicados nas alíneas a) e c), do nº1, do artº 640º, do CPC] a seu cargo em sede de impugnação da decisão relativa
a matéria de facto ,  importa desde logo por considerar  a questão probatória como estando ultrapassada em face da admitida junção – com as contra-alegações - das certidões  pelo apelado.

De resto, integrando as meras fotocópias de decisões judiciais a previsão do artº 368º, do CC [ “As reproduções fotográficas ou cinematográficas, os registos fonográficos e, de um modo geral, quaisquer outras reproduções mecânicas de factos ou de coisas fazem prova plena dos factos e das coisas que representam, se a parte contra quem os documentos são apresentados não impugnar a sua exactidão “ ] , a verdade é que  e em rigor, não impugnaram in casu os AA a respectiva exactidão , antes limitaram-se tão só a impugnar a respectiva autenticidade e força probatória.
Ora, como bem observa José Lebre de Freitas [ in A Falsidade No Direito Probatório, 1984, pág. 87 ] ,  a primeira observação que o artº 368º, do CC logo sugere é que a lei prescinde, no que aos documentos nele previstos concerne, da determinação do autor para a sua utilização como meio de prova, ou seja, uma vez apresentados, o que releva não é a impugnação de autoria, mas uma impugnação da sua exactidão .
Mais ensina José Lebre de Freitas, que “ À lei não interessa a autoria do documento, mas apenas a correspondência da representação nele contida á realidade “, ou seja, “ tal como a falta o pedido de confronto do documento condiciona a sua força probatória quanto ao facto ou coisa nele representado  a apresentação do documento contém em si, expressa ou implícita a afirmação da sua exactidão e constitui ela prova bastante; precludido o direito da contraparte a impugná-la, a afirmação torna-se inatacável !.
Isto dito, e para além de serem os próprios AA, no seu articulado, a reconhecerem a existência vg. da execução a que alude o item 2.2. da motivação de facto, certo é que em momento e lugar algum invocaram/arguiram  a falta de qualquer exactidão  - indicando-a , porque ademais  são e foram parte em qualquer uma das acções judiciais em causa , conhecendo e não devendo ignorar  o respectivo processado, máxime o teor das decisões /sentenças neles proferidas  - da cópia com a realidade.
Sem necessidade de mais considerações, nenhuma alteração importa, portanto , introduzir na decisão de facto proferida pelo tribunal a quo .
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5 - Se o Saneador-Sentença incorre em error in judicando , ao considerar/julgar verificada a excepção dilatória da verificação de excepção da autoridade do caso julgado.
No âmbito da sentença apelada, veio a primeira instância a julgar procedente a excepção dilatória da autoridade do caso julgado e, consequentemente, a absolver o Réu/apelado da instância.
Para tanto, ancorou a primeira instância a referida decisão na autoridade do caso julgado material formado e/ou decorrente sobretudo da sentença que julgou improcedentes os embargos de executado que os ora AA/apelantes deduziram no âmbito da acção executiva que lhe foi movida pelo ora apelado [ que corre termos sob o n° 2418/95, da Secção de Execução do Tribunal da Comarca de Lisboa ] ,  sendo que,  a ancorar o aludido julgamento, mostram-se invocados os fundamentos já nossos conhecidos – supra transcritos no item 3.1 do presente acórdão
Em rigor, para o tribunal a quo, e no que à sentença proferida nos embargos de executado diz respeito -  embargos que os ora AA/apelantes deduziram no âmbito da acção executiva que lhe foi movida pelo ora apelado - , pacifico é que da mesma decorre a existência do crédito exequendo, logo , obriga a autoridade do caso julgado  que não possam os ora apelantes – na presente acção – voltar a questionar/suscitar a questão da inexistência de qualquer obrigação exequenda.
Dissentindo do aludido entendimento, certo é que vedado estava ao tribunal a quo sentenciar como o fez, quer porque a causa de pedir nos embargos foi a nulidade de contrato promessa e, na presente, é o enriquecimento ilícito e ilegítimo,  quer ainda porque os factos atendidos nos mesmos Embargos ocorreram até 2009 ou 2010,  e  , no âmbito da presente acção, verifica-se que apenas em 30 de Junho de 2016 ocorreu o primeiro aumento patrimonial injustificado na esfera jurídica do Réu - pela adjudicação a este da fracção para habitação pertencente aos Autores.
Ora bem.
Antes de mais, importa precisar que é o próprio tribunal a quo, em sede de sentença, que reconhece que no confronto da presente acção com qualquer uma das supra identificadas nos itens de facto nºs 2.1., 2.3. e 2.4. , não existe identidade de pedidos  e, outrossim,  diferente é o núcleo essencial das respectivas causas de pedir, razão porque, vedado está poder concluir-se que, no caso em apreço, se verifica a excepção do caso julgado, uma vez que não ocorre a tríplice identidade a que alude o art. 581°, do Cód. Proc. Civil.
Ou seja, no âmbito da decisão apelada, e ora em sindicância, mostra-se reconhecida a não verificação de todos os pressupostos da excepção dilatória do caso julgado, maxime a existência de identidade de  pedido e de causa de pedir, logo, afasta a primeira instância expressis verbis a  verificação da excepção dilatória do caso julgado, e a qual tem por fim evitar a repetição de causas (artº 580º, nºs 1 e 2 do C.P.C.).
E, afastando-a, destituídas de fundamento são as conclusões recursórias dirigidas – pelos apelantes -  para a violação do disposto nos dispositivos legais do artigo 580º, do CPC, maxime para a atribuição ao a quo de um erro na aplicação do direito, e com o fundamento de que, sendo in casu a causa de pedir e os pedidos diferentes nas três acções em confronto, não estão preenchidos os requisitos legais exigidos para a existência da excepção do caso julgado.
Dir-se-á que, sendo a “realidade” objecto da apelação ora em apreciação em absoluto uma realidade inexistente, porque não verdadeira, em termos de facto e de direito, como que, à partida, o conhecimento do objecto recursória mostra-se ab initio e prima facie de todo prejudicado ( cfr. artº 608º/663º, ambos do CPC).
De resto, nesta matéria, não resistimos em fazer nossas as doutas considerações que integram o Ac. do Tribunal da Relação de Lisboa, de 23/4/2015 (11) , e o qual , a dado passo, refere que sendo o próprio «a quo» expresso em afastar a verificação da excepção de caso julgado, por entender expressis verbis não se verificar a tríplice identidade a que alude o art. 581º,nº1, do CPC, nenhum sentido faz, portanto, os Recorrentes insurgirem-se “contra tese coincidente com a que defendem no recurso, já que as impugnações judiciais se destinam a contrariar soluções e construções avessas às defendidas pelas partes que se julguem por elas prejudicadas, nos termos do estabelecido no n.º 1 do art. 627.º do Código de Processo Civil”.
Seja como for, porque a excepção que efectivamente a primeira instância considera que in casu se verifica é a excepção dilatória inominada de autoridade do caso julgado, a qual, diversamente da excepção de caso julgado [ importa diferenciar ambas as “realidades” (12), e ainda que, no entender de J. Alberto dos Reis – in CPC Anotado, vol. III, pág. 93. - , “ a autoridade de caso julgado e a excepção de caso julgado não são duas figuras distintas, mas antes duas faces da mesma figura – consistindo o facto jurídico “caso julgado” em existir uma sentença ( um despacho ) com trânsito sobre determinada matéria “ ], pode funcionar independentemente da verificação da tríplice identidade a que alude o artº 581º do C.P.C.,  pertinente é aferir se ao decidir como decidiu, o fez o tribunal a quo com acerto.
Neste conspecto, insiste-se, e tal como bem se nota em recente Ac. do Supremo Tribunal de Justiça (13), “ O caso julgado material – ponto comummente assinalado na jurisprudência e na doutrina –, pelo seu efeito e funcionalidade processual, tanto pode ser dimensionado como excepção ou como autoridade: no primeiro caso, de efeito ( dominantemente ) negativo, exigindo uma tríplice identidade (art. 581º do CPC) ; no segundo, apenas de efeito positivo, não” .
Ainda o mesmo Tribunal, e outrossim em doutos Arestos recentes (14), é claro em reconhecer que a autoridade de caso julgado, segundo a doutrina e jurisprudência predominantes, não requer a tríplice identidade a que alude o nº1,do artº 581º, do CPC, podendo estender-se a outros casos, designadamente quanto a questões que sejam antecedente lógico necessário da parte dispositiva do julgado, sendo que, e quanto à identidade objectiva, e no seguimento do ensinamento de Castro Mendes (15) “ (…) se não é preciso entre os dois processos identidade de objecto ( pois justamente se pressupõe que a questão que foi num thema decidendum seja no outro questão de outra índole, maxime fundamental ), é preciso que a questão decidida se renove no segundo processo em termos idênticos “.
A reforçar o acabado de referir, recorda-se que a ratio da excepção da autoridade do caso julgado entronca com a compreensível e necessária imposição de a decisão de determinada questão essencial não poder, uma vez resolvida por decisão judicial insusceptível de impugnação,  voltar a ser discutida num processo posterior, isto é, desde que concreta questão essencial foi decisiva para a procedência ou improcedência de uma primeira acção, qualquer outro tribunal em acção subsequente encontra-se obrigado a respeitar a autoridade do julgado com referência à mesma e referida questão, estando-lhe de todo vedado  julgá-la em sentido contrário e/ou conflituante , e ainda que a causa de pedir seja diferente.
É que, recorda-se, o que se pretende e se tem por desiderato assegurar no âmbito do instituto da autoridade do caso julgado é a necessidade de garantir a certeza do direito e a segurança das relações jurídicas .
Na verdade, como há muito ensinava o Prof. José Alberto dos Reis (16), com a autoridade que todos lhe reconhecem, “desde que uma sentença, transitada em julgado, reconhece a alguém certo benefício, certo direito, certos bens, é absolutamente indispensável, para que haja confiança e segurança nas relações sociais, que esse benefício, esse direito, esses bens constituam aquisições definitivas, isto é, que não lhe possam ser tirados por uma sentença posterior. Se assim não fosse, se uma nova sentença pudesse negar o que a primeira concedeu, ninguém podia estar seguro e tranquilo; a vida social, em vez de assentar sobre uma base de segurança e de certeza, ofereceria o aspecto da insegurança, da inquietação, da anarquia.…A força e a autoridade derivam … da necessidade superior de certeza e segurança jurídica”.
Do mesmo modo, também para outro mas não menos conceituado e prestigioso Mestre como o era o Prof. Manuel D. Andrade (17), não sendo respeitado o caso julgado material, o prestígio dos tribunais “seria comprometido no mais alto grau se a mesma situação concreta uma vez definida por eles em dado sentido, pudesse depois ser validamente definida em sentido diferente“, sendo que, mais importante ainda, sem o caso julgado material” estaríamos caídos numa situação de instabilidade jurídica verdadeiramente desastrosa … “, e isto porque, “ seria intolerável que cada um nem ao menos pudesse confiar nos direitos que uma sentença lhe reconheceu “.
Exigível é, para efeitos de aplicação/funcionamento da excepção dilatória inominada de autoridade do caso julgado, tão só que na acção anterior tenha sido decidida em termos definitivos uma questão essencial - porque só esta pode almejar a reivindicar  a autoridade de caso julgado -  , o que equivale a dizer que em causa há-de estar uma decisão que tenha incidido sobre questões relativas v.g. à causa de pedir da nova acção, ou que com ela apresentem uma qualquer conexão relevante.
Dito de uma outra forma, sendo uma concreta e efectiva questão objecto de apreciação/decisão em acção judicial, inevitável é que passe doravante a mesma a estar coberta pela autoridade de caso julgado, manifestando-se o caso julgado material “no seu aspecto positivo de proibição de contradição da decisão transitada : a autoridade de caso julgado é o comando de acção ou a proibição de omissão respeitante à vinculação subjectiva à repetição no processo subsequente do conteúdo da decisão anterior e à não contradição no processo posterior do conteúdo da decisão anterior”. (18)
Aqui chegados, porque uma decisão judicial que no entender do tribunal a quo obstava – por força de excepção dilatória inominada de autoridade do caso julgado - ao prosseguimento da presente acção foi proferida em sede de embargos de executado [ deduzidos pelos ora apelantes na execução que lhe foi movida pelo ora apelado ],  pertinente é ainda [ para a resolução do thema decidendum da apelação ] relembrar que discutida é ( ou foi , em face da actual redacção do nº 5, do artº 732º, do CPC aprovado pela Lei nº 41/2013,de 26/6 ) qual a relevância ou eficácia do caso julgado formado na acção de oposição, designadamente se deve tal eficácia circunscrever-se ao processo executivo  ou, ao invés, se a decisão de mérito proferida na oposição merece desencadear efeitos de caso julgado material.
Explicando melhor, e socorrendo-nos de José Lebre de Freitas (19), o que importa aferir é se, mesmo quando os embargos de executado são julgados procedentes, em causa está tão só uma decisão de acertamento da inexistência do direito exequendo, com reflexos tão só na execução, razão porque, pretendendo o devedor obter a segurança de uma decisão material definitiva, deveria lançar mão de uma acção declarativa autónoma, estrutural e funcionalmente, em que pediria que fosse declarada a inexistência da obrigação .
E, mesmo quando não obtém o executado vencimento na oposição , tal não obstava ( como o refere José Lebre de Freitas, in ob citada  ) a que movesse posteriormente - e com o mesmo fundamento - uma acção contra o credor e para obter a restituição do que indevidamente [ cabendo-lhe então o ónus da prova, visto estarem em causa os pressupostos de direito substantivo da pretensão de restituição do indevido – artº 476º,1, do CC ]  tivesse pago no processo executivo ou (e) para lhe pedir uma indemnização – cfrº artº 483º,1, do CC.
Ora, para José Lebre de Freitas, no âmbito do disposto no artº 817º, do pretérito CPC e com a redacção [ rezando então o nº2, que , os embargos, “  Se forem recebidos, é o exequente notificado para os contestar dentro do prazo de 20 dias, seguindo-se depois, sem mais articulados, os termos do processo ordinário ou sumário de declaração, conforme o valor dos embargos “] anterior à introduzida pelo DL n.º 38/2003, de 08 de Março , adequado e pertinente [ em razão de a lei processual então vigente garantir uma forma à oposição à execução quase tão solene como a do processo comum ] era reconhecer a formação de caso julgado na acção de embargos de executado, não se justificando “admitir posteriormente outra acção com a mesma causa de pedir em que se pudesse voltar a pôr em causa  existência da obrigação exequenda”.
Sendo certo que a referida solução passou a ser mais questionável com a alteração introduzida pelo DL n.º 38/2003, de 08 de Março [ passando o nº 2, do artº 817º, do CPC, a dispor que “ Se for recebida a oposição, o exequente é notificado para contestar, dentro do prazo de 20 dias, seguindo-se, sem mais articulados, os termos do processo sumário de declaração “], ainda assim e para José Lebre de Freitas, tal não obrigava doravante a concluir que o caso julgado não se forma na acção de oposição à execução, antes deve o mesmo e em princípio produzir-se, ainda que se deva admitir que a parte interessada possa provar, em acção que autonomamente venha a ser proposta, que as limitações de prova a impediram de fazer uso de meio de prova que poderia ter influído na decisão final. (20)
Abordando precisamente a referida questão, mais exactamente a da compatibilidade do caso julgado em processo executivo com a acção de restituição do indevido, há muito que José Maria Gonçalves Sampaio (21) , reconhecendo embora tratar-se de matéria bastante discutida, defende que se ao trânsito em julgado de sentença que julga extinta a execução [ que actualmente já não existe, cfr artº 849º, nº 3, do CPC ]  não  se justifica conferir o alcance do caso julgado declarativo ( porque a acção executiva não visa discutir o direito, mas tão somente realizá-lo coactivamente ),  já o trânsito em julgado de sentença proferida em embargos de executado ( que é o local adequado e especifico para o executado se defender de uma execução injusta, e que consubstancia uma figura quase perfeita de uma acção declarativa ) deve fazer” caso julgado sobre a matéria declaratória, ficando o executado impedido de recorrer a uma acção declarativa por fora, com o fim de obter a condenação do exequente na restituição do indevido, sob pena de ofenda do caso julgado da decisão que julgou os embargos”.
A aludida controvérsia, a nosso ver, com o NCPC [ cujo artº 732º, no respectivo nº 5, dispõe que “ Para além dos efeitos sobre a instância executiva, a decisão de mérito proferida nos embargos à execução constitui, nos termos gerais, caso julgado quanto à existência, validade e exigibilidade da obrigação exequenda “ ],  deve considerar-se ultrapassada, (22) pois que vem agora o legislador a pôr termo à discussão doutrinal e jurisprudencial sobre a matéria, ao explicitar ( no nº4) que a procedência dos embargos extingue  execução, no todo ou em parte e, bem assim ( no nº5 ), que a decisão de mérito nos embargos proferida constitui, nos termos gerais, caso julgado quanto à existência, validade e exigibilidade da obrigação exequenda.
Ou seja, pacífico é, actualmente, que o trânsito em julgado da decisão de mérito proferida em sede dos embargos de executado, impede que a validade, existência, e exigibilidade da respectiva obrigação possam ser novamente invocadas e apreciadas num outro processo, seja ele declarativo, seja executivo.(23)
Apetrechados das breves considerações acabadas de tecer, e incidindo agora a nossa atenção sobre o objecto do thema decidenduum da acção/embargos que os aqui AA/apelantes deduziram à acção executiva que o ora Réu/apelado lhes moveu com base em letra [ a letra ou título executivo que em última análise suporta a execução que vai desencadear o empobrecimento pelos Autores invocado na presente acção ], constata-se que [ tal como decorre da sentença proferida a 16/5/2013 ] no âmbito dos referidos embargos visaram os aí executados e ora apelantes demonstrar a inexistência do crédito peticionado na acção executiva, quer com fundamento da invalidade da relação jurídica subjacente, quer com fundamento na falta de legitimidade do exequente para o reclamar, porque alegadamente não existia em rigor a obrigação de pagamento do preço que ficou titulada pela letra de câmbio.
Tendo os referidos embargos improcedido in totum [ considerando o Exmº julgador que, não apenas não havia que questionar a validade do negócio jurídico subjacente ao aceite de A e de B, como pacífico era que a sacadora da letra era a credora do preço ] , foi interposta a competente apelação por cada um dos executados, vindo este mesmo Tribunal da Relação, por Acórdão de 30/6/2015, a confirmar o sentenciado pela primeira instância.
Ainda no âmbito da instância recursória referida, e em sede de conclusões, invocou o apelante A a inexistência de fundamento para o recorrido e ora apelado ter lançado mão da letra dada à execução, sendo que, em última instância, conclui o recorrente, sempre a cobrança coerciva do referido título de crédito configurará uma situação de enriquecimento sem causa.
E, precisamente conhecendo da aludida questão recursória despoletada pelo recorrente A, vem este Tribunal da Relação, no supra referido Acórdão de 30/6/2015, a considerar/julgar, a dado passo, que :
 “ Ora, decorre do acima exposto que, na realidade, existe um enriquecimento para o recorrido .
Só que esse enriquecimento, como já se viu, tem causa justificativa e a tentativa de o impedir ( por via de outra acção judicial ) naufragou
Deste modo, fácil é concluir que “não” [ só por mero lapso, manifesto, a sentença omite a referência ao substantivo alusivo à negação  ] se verifica, “in casu“, qualquer enriquecimento sem causa “
Aqui chegados, e tendo presente que os embargos identificados em 2.3. e 2.4., foram ainda tramitados nos termos do processo ordinário de declaração [ por aplicação do artº 817º, do CPC, com a redacção anterior à introduzida DL n.º 38/2003, de 08 de Março ], ou seja, com a observância em pleno do principio do contraditório, e tal como o defendido por José Lebre de Freitas, tudo obriga a reconhecer e a conferir à decisão que à referida oposição pôs termo, a eficácia do caso julgado material, o que equivale a dizer que não será admissível a propositura de uma posterior acção que venha questionar novamente a existência da obrigação exequenda.
Não se olvida que, como vimos supra, defende designadamente José Lebre de Freitas que a sentença proferida nos embargos de executado, devendo é certo ser dotada dos atributos do caso julgado material, apenas obsta a que posteriormente seja intentada uma outra acção com a mesma causa de pedir e em que se possa voltar a pôr em causa a existência da obrigação exequenda.
 Porém, vimos já também que , tendo presente a ratio da excepção da autoridade do caso julgado , o decisivo é obstar a que  uma questão essencial que tenha sido resolvida por decisão judicial insusceptível de impugnação,  pudesse mais tarde voltar a ser discutida, e ainda que com fundamento em causa de pedir diferente, bastando tão só que ambas as causas petendi apresentem uma qualquer conexão relevante.
 Ou seja, e recordando João de Castro Mendes , não é necessário que entre os dois processos exista total identidade de objecto , bastando que uma questão decidida se renove no segundo processo em termos idênticos .
De resto, revemo-nos nesta matéria e sem hesitações no parecer/entendimento sufragado e defendido por Rui Tavares Correia (24), quando, analisando/comentando o Ac do STJ de 16/2/2012 (25) [  douto Aresto que aborda com inegável e manifesta proficiência toda a problemática de uma pretensa execução injusta, acabando no final por negar ao executado a possibilidade de lançar mão do instituto do enriquecimento sem causa para lograr a restituição por enriquecimento do que pagou em execução que lhe fora movida pelo pretenso enriquecido, e isto porque, tendo a acção de restituição por enriquecimento sem causa natureza subsidiária,  e , porque  o autor/empobrecido deduziu embargos na execução referida, o meio idóneo para reagir contra o referido enriquecimento eram os embargos de executado] , salienta que  “na realidade a causa da pedir da oposição à execução é conformada, não apenas pela petição da oposição, mas, antes desta e nos mesmos termos em que ocorre nas acções de mera apreciação negativa, pelo requerimento executivo”  .
É que, acrescenta, “ a oposição à execução, como ocorria com os embargos de executado, tem uma estrutura equivalente à de uma acção declarativa, mas o seu objecto está limitado à discussão das questões que possam apenas ter relevância a respeito da obrigação exequenda. A sua causa de pedir está, pois, funcionalizada pela obrigação exequenda, não sendo admitida em oposição à execução a discussão de quaisquer questões que careçam de relevância para definir a existência, validade ou exigibilidade dessa obrigação. Ora, a causa de pedir da acção executiva é constituída pelo título executivo, mas esse conceito reporta-se, não ao documento em si mesmo, mas à obrigação exequenda que, corporizada nesse documento, permite a instauração da execução e define os seus limites”.
Logo, conclui  Rui Tavares Correia “ estando a causa de pedir da oposição limitada à discussão da obrigação exequenda, e sendo esta, por seu lado, a causa de pedir da acção executiva, não pode, de modo mais abrangente, deixar de admitir-se que a causa da pedir daquela e desta são uma e a mesma. Aliás, quando se trate de uma execução fundada em título extrajudicial, a dedução da oposição não se encontra limitada, sendo legítimo ao executado apresentar qualquer dos meios de defesa de que pudesse lançar mão em processo declarativo. Assim, sendo a causa de pedir definida pelo requerimento inicial da execução e pelo título que com esse requerimento é junto, tal articulado corresponde a uma petição inicial que fosse apresentada em processo declarativo.”
Por último, e ainda no entender de Rui Tavares Correia, não deixa desde logo o requerimento inicial da oposição de delimitar o objecto do litígio que vai desencadear, definindo os contornos da causa de pedir daquela , razão porque, “quaisquer fundamentos que não sejam invocados pelo executado na sua oposição, pese embora não venham a ser objecto de julgamento, não podem deixar de considerar-se incluídos na causa de pedir e que, como se apontou, corresponde à obrigação exequenda. Essa não invocação não só preclude, como sucede a respeito da execução em sede declarativa, o direito de mais tarde invocar outros fundamentos de defesa, como também, decidida a causa, não permite que tais fundamentos de defesa que deveriam ser alegados na oposição, venham mais tarde a ser objecto de diversa acção”.
Aqui chegados, temos assim que, ao julgar improcedentes os embargos de executado deduzidos pelos ora AA contra execução que lhes foi movida pelo ora Réu, e com fundamento em razões substantivas, impedidos estão os primeiros – em razão do instituto da autoridade do caso julgado material – de demandarem agora o então exequente para , ainda que com base no instituto do enriquecimento sem causa,  voltarem a discutir a inexistência da obrigação exequenda, questão que, para todos os efeitos, deve considerar-se como estado  definitivamente resolvida.
É que, a nosso ver, a assim não se entender, e com todo o respeito pelo entendimento dos AA/apelantes, temos para nós que maior e mais clarividente ofensa à autoridade do caso julgado é difícil de idealizar, pois que mais não visam os demandantes com a procedência da presente acção do que apagar/revogar/contrariar a decisão judicial proferida nos embargos de executado, almejando voltar a apreciar e a discutir a matéria de facto subjacente  à causa petendi da obrigação exequenda .
Sem necessidade de mais considerandos, porque a pretensão dos AA é, à luz do caso julgado material, de todo intolerável, como que inevitável é, em consequência, a improcedência da apelação que interpuseram .
Improcedem, portanto, todas as conclusões recursórias dos apelantes dirigidas para a revogação da decisão apelada e com fundamento na verificação de excepção do caso julgado material .
                                                    ***
6- Sumariando ( cfr. artº 663º,nº7, do Cód. de Proc. Civil ).
I – A autoridade do caso julgado, por via da qual é exercida a função positiva do caso julgado, para poder funcionar como excepção dilatória, não exige a verificação da tríplice identidade a que alude o artº 581º,nº1, do CPC, pressupondo tão só que uma concreta QUESTÃO foi já objecto de decisão judicial, não podendo assim voltar novamente a ser discutida/apreciada .
II – É que, a partir do momento em que uma sentença, transitada em julgado, não reconhece a alguém certo direito, é absolutamente indispensável , para que haja confiança e segurança nas relações sociais, que a referida decisão negatória consubstancie uma aquisição definitiva , isto é, que não possa ser contrariada por uma sentença posterior.
III – Em razão do referido em I e II, o trânsito em julgado de sentença proferida em embargos de executado ( que é o local adequado e especifico para o executado se defender de uma execução injusta, e que consubstancia uma figura quase perfeita de uma acção declarativa ) deve fazer” caso julgado sobre a matéria declaratória, ficando o executado impedido de recorrer a uma acção declarativa por fora, com o fim de obter a condenação do exequente na restituição do indevido, sob pena de ofensa do caso julgado da decisão que julgou os embargos”.
                                            ***
7. -  Decisão.
Em face de tudo o supra exposto,
acordam os Juízes na 6ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa , em , não concedendo provimento à apelação interposta pelos AA  A e B, confirmar/manter a decisão/sentença do tribunal  a quo .
                                            *
Custas pelos RR, quer na primeira instância, quer na instância recursória.
                                             ***
(1) Cfr. José Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil, anotado, 5ª , pág. 141.
(2)  In Manual de Processo Civil, 1984, Coimbra editora, pág. 671.
(3)  In ob. citada, pág. 671.
(4) In Código de Processo Civil, Anotado, Coimbra Editora, vol. II, pág. 670,
(5) Cfr. J.O. Cardona Ferreira, in Guia de Recursos em Processo Civil, 5ª Edição, pág. 71.
(6) Cfr. v.g. o Ac. do STJ de 6/5/2004, disponível in www.dgsi.pt.
(7)  In Código de Processo Civil Anotado, Vol. 2º, pág. 670.
(8) In Código do Processo Civil Anotado, vol.V, Coimbra Editora, págs. 143-145.
(9) Cfr. v.g. o Ac. do STJ de 20/11/2014, Proc. nº 810/04.0TBTVD.L1.S1, sendo Relator ÁLVARO RODRIGUES, e disponível in www.dgsi.pt.
(10) Cfr. ANTÓNIO SANTOS ABRANTES GERALDES, Juiz-Conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça, in sentença Cível, texto-base da intervenção efectuada nas “Jornadas de Processo Civil” organizadas pelo CEJ, em 23 e 24 de Janeiro de 2014).
(11) Ac. do Tribunal da Relação de Lisboa, de 23/4/2015, Proc. nº 3376/14.9T8FNC-A.L1-6, in www.dgsi.pt .
(12) Cfr. o Acórdão do STJ de 21/3/2013, Proc. nº 3210/07.6TCLRS.L1.S1, e o Ac. do Tribunal da Relação de Lisboa, Proc. nº 2204/10.9TBTVD.L1-2, ambos disponíveis in www.dgsi.pt .
(13) Cfr. Ac. do STJ de 4/12/2018, Proc. nº 190/16.0T8BCL.G1.S1, e in www.dgsi.pt.
(14) Cfr. Acs. do STJ de 8/11/2018, Proc. nº 478/08.4TBASL.E1.S1, de 07-03-2017, Proc. 2772/10.5TBGMR-Q.G1.S1 e de 27-02-2018, Proc. 2472/05.8TBSTR., todos in www.dgsi.pt
(15) In Limites Objectivos do Caso Julgado em Processo Civil, Edições Ática, pp. 43-44.
(16)  In Código de Processo Civil anotado, Coimbra Editora, vol. III, pág.s 94 e 95.
(17) In Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra Editora, 1979, págs. 306 e segs..
(18) Cfr. Miguel Teixeira de Sousa, “O Objecto da Sentença e o Caso Julgado Material”, in BMJ nº 325º, pág. 176.
(19) Em A Acção Executiva, Depois da reforma da reforma, 5ª Edição, Coimbra Editora, 2009, págs 192 e segs..
(20)   Cfr. J. Lebre de Freitas, ibidem, pág 196.
(21) In A acção executiva e a Problemática das Execuções Injustas, Edições COSMOS, 1992, págs 334 e segs .
(22) Cfr. Paulo Ramos de Faria e Ana Luísa Loureiro, in “Primeiras Notas ao Novo Código de Processo Civil”, 2014, Vol. II, Almedina, em anotação ao artº 732º
(23) Cfr Virgínio da Costa Ribeiro e Sérgio Rebelo, in A Acção Executiva Anotada e Comentada, 2016, 2 dª Edição, Almedina, em anotação ao artº 732º.
(24) In REVISTA DA ORDEM DOS ADVOGADOS - ANO 72 ABR. / SET. 2012, Editado em  Março / 2013, Jurisprudência Crítica.
(25) Proferido no Proc. nº 286/07.0TVLSB.L1.S1, sendo Relator SERRA BAPTISTA, e disponível in www.dgsi.pt.
                                            ***
LISBOA, 28/2/2019

António Manuel Fernandes dos Santos  ( O Relator)
Eduardo Petersen Silva ( 1º Adjunto)
Cristina Isabel Ferreira Neves ( 2ª Adjunta)