Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
580/14.3TVLSB.L2-8
Relator: LUÍS CORREIA DE MENDONÇA
Descritores: COOPERATIVA
EXCLUSÃO DE COOPERADOR
CONVENÇÃO DE MONTREAL
TÍTULOS DE CAPITAL
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 10/26/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: N
Texto Parcial: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Sumário: A exclusão da qualidade de cooperador não constitui a cooperativa na obrigação de reembolso de títulos de investimento por aquele subscritos.
Prevendo os Estatutos a restituição dos títulos de capital, mas ressalvando o “direito de retenção” pela cooperativa dos valores necessários a garantir a responsabilidade dos cooperadores que se demitam ou sejam excluídos, não pode aquela livrar-se da sua obrigação de restituir enquanto não houver decisão que reconheça a responsabilidade do cooperador.
O montante dos títulos de capital a restituir deverá ser reduzido na proporção das perdas acusadas no balanço do exercício no decurso do qual surgiu o direito ao reembolso.
Ordenada a liquidação da dívida em competente incidente e tendo sido accionado um pedido liquido, os juros de mora legais sobre a divida, contam-se a partir da data de citação do devedor, para a acção declarativa.

(Sumário elaborado pelo Relator)
Decisão Texto Parcial: Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa.


Relatório:


A instaurou acção contra Cooperativa pedindo a condenação desta a restituir-lhe o montante dos títulos de capital realizados segundo o seu valor nominal, a quota parte dos excedentes e reservas não obrigatórias repartíveis na proporção da sua participação e ainda os respectivos títulos de participação, em montante não inferior a € 62.493,89, acrescido de juros de mora desde 8/05/2002.

A R. admitiu, parcialmente, as quantias reclamadas pelo A. como tendo-lhe sido por este entregues impugnando, porém, a existência do direito do Autor à sua restituição, razão pela qual “o direito de restituição do cooperador excluído” foi erigido como objecto do litígio e submetidos a prova, em sede de julgamento, os temas tendentes a apurar a medida e o exacto valor do invocado direito do A.

Após audiência de discussão e julgamento foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente e, consequentemente condenou a R. a restituir ao A. a quantia que se vier a liquidar correspondente à redução do valor de € 27.452,34 na proporção das perdas acusadas no balanço da R. do exercício de 1998, quantia aquela acrescida de  juros à taxa legal desde 8 de Maio de 2002.

Inconformada a R interpôs competente recurso cuja minuta concluiu da seguinte forma :

1.ª -Constitui em primeiro lugar objecto do presente recurso a impugnação da decisão sobre a matéria de facto, com reapreciação da prova gravada, quanto aos pontos a seguir enunciados;
2.ª -Desde logo, pretende a recorrente que o ponto 9 da matéria de facto provada seja ampliado de modo a incluir o qualificativo "obrigatório" a seguir à expressão "títulos de investimento", ou seja, de modo a que o referido ponto 9 passe a ter a seguinte redacção: "As entregas referidas no ponto 4 destinavam-se à realização de títulos de investimento obrigatório";
3.ª -Na verdade, exprimir essa qualificação, na sua completude acima assinalada, afigura-se decisivo para averiguar do regime jurídico dessas entregas e sua eventual restituição, no caso de exclusão de cooperador - tanto pela sua contraposição frontal aos chamados 'títulos de participação' (estes últimos aliás totalmente inexistentes na apelante), como, sobretudo, no seu confronto com o regime dos 'títulos de capital' segundo a alternativa exposta pelo artigo 10° face ao artigo 11° dos estatutos da apelante;
4.ª -E desse artigo 10° se infere a finalidade e o carácter obrigatório das mencionadas entregas, também em contraponto aos títulos de investimento destacados no artigo 9° dos estatutos da apelante, esses meramente facultativos, que os cooperadores poderiam porventura subscrever;
5.ª -De resto, a sentença recorrida (tal como a sentença inicial) qualificou, expressamente, como título de investimento obrigatório a entrega de Esc. 150.000$00 mencionada na parte final do n° 6 da matéria provada, com base designadamente no registo contabilístico de fls. 215, e atendendo também à qualificação expressa nos docs. de fls. 255, 256 e 257 - qualificação essa que nenhuma razão haveria para omitir quanto às restantes entregas do A. a que nos referimos;
6.ª -Também da prova nomeadamente testemunhal produzida em julgamento, conjugadamente com o citado art. 10° dos estatutos da R., se retira a questionada qualificação, quanto às entregas de dinheiro a que especificamente nos reportamos;
7.ª -Assim, a testemunha P, que foi tesoureiro da R. na mesma Direcção a que pertenceu o aqui A., e que reconheceu os docs. 3 a 6 juntos pelo A. em audiência de julgamento (fls. 254 a 257), depoimento esse que foi confirmado em audiência de 30/1/2017, com esclarecimentos complementares, assim como a testemunha R, técnica oficial de contas da Cooperativa, e ainda M, representante legal da R. e que foi sua tesoureira na Direcção que se seguiu à que era presidida pelo A., nas audiências respectivas mencionam os títulos de investimento obrigatórios, para pagamento de 50% do terreno - conforme excertos respectivamente reproduzidos acima no n.º 4 do corpo desta alegação:
8.ª -Impugna-se ainda a decisão da matéria de facto, no que respeita ao ponto 3 da matéria não provada, pretendendo a apelante que o ponto 3 da matéria não provada passe a constituir o ponto 10 da matéria provada e, consequentemente, os pontos 10 e 11ª -da matéria provada passem a figurar como os n.ºs. 11 e 12 da mesma (com os inerentes ajustamentos de numeração quanto aos factos subsequentes) ;
9.ª -Na verdade, a matéria do referido ponto 3 encontra-se provada nomeadamente através das decisões judiciais mencionadas no n° 7 do corpo desta alegação, para o qual se remete brevitatis causa e com o douto suprimento de V. Exas.,
10.ª -Resultando ainda da prova testemunhal em audiência de julgamento qual o montante do desfalque ou desvio em questão e que o mesmo teve de ser colmatado pelas contribuições dos cooperadores com novas e adicionais entregas, conforme se alcança das passagens transcritas no n" 8 do corpo desta alegação;
11.ª -Assim, no seu depoimento gravado, em 23/6/2015, a testemunha do A. J afirmou que os cooperadores tiveram que entrar com o dinheiro do desfalque, tiveram que fazer entregas suplementares de dinheiro, por várias vezes, conforme excerto reproduzido no mesmo n° 8 do corpo desta alegação: (ficheiro 20150623104311_11341218_2871024 - 23/06/2015 - 10:43, m. 00:32:19 a 00:33:04);
12.ª -Também a testemunha da R. H, em depoimento da mesma data, referiu o montante aproximado do desfalque e que os cooperadores, face ao desvio, tiveram que entregar esse dinheiro, por absoluta falta de alternativa, conforme excerto reproduzido igualmente no n° 8 do corpo desta alegação: (20150623142416_11341218_2871024 00:19:29); - 23/06/2015 - 14:24, m. 00:17:56);
13.ª -Ainda, a testemunha R, técnica oficial de contas da recorrente, em depoimento da mesma data refere a imputação do desfalque aos cooperadores, segundo os respectivos programas, para além da matéria dos valores dos balanços negativos, conforme transcrição efectuada no mesmo n° 8 do texto desta alegação; e este depoimento foi confirmado em audiência de 30/1/2017: (20150623152756_11341218_2871027 - 23/06/2015 - 15:27, m. 00:02:47 a 00:05:32) (20170130135834_11341218_28710 - 30.01.2017 - m. 00:00:52 a 00:11:40);
14.ª -E a representante da apelante, M nas suas declarações de parte na citada audiência referiu nomeadamente o montante do desfalque e a situação financeira muito difícil que o mesmo importou designadamente para os cooperadores que no fundo tiveram de suportar as consequências do desfalque: (201701300141953_11341218_28710 - 30.01.2017 - m. 00:03:18 a 00:04:43) (201701300141953_11341218_28710 - 30.01.2017 - m. 00:05:10 a 00:08:06);
15.ª -Ainda sem conceder, caso se não entenda no sentido das precedentes conclusões 8.ª a 10.ª, afigurar-se-ia irrecusável que o ponto 10 da matéria provada deveria ao menos conter a quantificação do desvio de dinheiro que foi levado a cabo na Cooperativa - sob pena de, sem a explicitação desse valor, esse ponto 10, em conjugação com o subsequente ponto 11, se revelar como imprestável para a finalidade que teria determinado a inclusão desses dois pontos na matéria provada, e que só poderia ser a sujeição das efectivas entregas do A. ao mesmo rateio a que foram submetidos os restantes cooperadores;
16.ª -E essa quantificação teria de ser aferida pela mesma soma mencionada no citado ponto 3 da matéria não provada, isto é, o valor de Esc. 419.843.600$00, igualmente referido nos nos 7 e 9 supra do texto desta alegação;
17.ª -Por outro lado, omitiu totalmente a sentença em recurso pronunciar-se sobre a questão - já acima aflorada sob outro enfoque nas precedentes conclusões 8.ª a l5.ª-, que diz respeito ao desfalque praticado na Cooperativa por JC, vice-presidente na Direcção que era então presidida pelo aqui A.;
18.ª -Esse desfalque traduziu-se em ter sido desviado fraudulentamente das contas bancárias da Cooperativa, ao longo dos anos de 1997 e parte de 1998, o montante aproximado de quatrocentos e vinte milhões de escudos, que os cooperadores, face à situação catastrófica daí resultante, tiveram que colmatar através de entregas adicionais que não estavam previstas, conforme mais detidamente evidenciado no n° 8 do corpo desta alegação;
19.ª -Ora, por um princípio de igualdade e de necessidade, as entregas do A. foram e teriam que ser atingidas pela mesma vicissitude;
20.ª -O conhecimento desta questão seria impeditivo ou pelo menos fortemente limitativo do reconhecimento da existência de qualquer crédito do A. sobre a R., além de que essa questão não é coincidente com aqueloutra respeitante aos resultados negativos mostrados nos nos 7 e 8 da matéria de facto provada, e portanto por ela não prejudicada na sua apreciação;
21.ª -E a sentença tinha que conhecer, tinha que tomar uma posição definida perante essa questão, que a R. tinha submetido à sua apreciação e era, portanto, de cognição obrigatória, não podendo ser silenciada;
22.ª -Daí que a sentença em recurso se mostre, na medida correspondente, ferida de nulidade por omissão de pronúncia - artigos 608°, nº 2, e 615°, n° 1, alínea d), 1ª parte, do CPC;
Sem conceder:
23.ª -Como é bem sabido, o tribunal conhece oficiosamente do Direito e portanto é livre na qualificação jurídica da situação que é submetida à sua apreciação, embora alicerçada nos factos da causa, e essa liberdade de qualificação aplica-se à natureza e regime das entregas efectuadas por membro de cooperativa de habitação e construção com regime de propriedade individual dos fogos, nomeadamente de membro que haja sido excluído dessa qualidade;
24.ª -Na decisão da presente causa, face à definição do objecto do litígio ("o reembolso a cooperador excluído") e à questão central a solucionar ("o direito de restituição do cooperador excluído"), importaria então e em primeiro lugar indagar como se configuram e que natureza assumem os pressupostos desse eventual direito de restituição, segundo a norma ou normas jurídicas que devam ser convocadas para o efeito;
25.ª -Tornar-se-ia imperativo, nesse âmbito, apurar com segurança a que respeito foram tais entregas feitas pelo A. à Cooperativa, visto que a lei e o estatuto estabelecem, ou podem estabelecer, diferentes regimes pelo menos quanto à sua eventual restituição assim como aos termos desta;
26.ª -A sentença inicial nos presentes autos tinha mandado aplicar directamente, ao pedido de restituição das entregas a que se referia o ponto 4 da respectiva matéria provada, o artigo 24°, n° 1, do DL nº 502/99, de 19 de Novembro [regime jurídico das cooperativas do ramo de habitação e construção], segundo o qual "em caso de demissão ou exclusão) o cooperador terá direito ao reembolso previsto nos nrs 3 e 4 do artigo 36° do Código Cooperativo) acrescido do valor dos títulos de participação realizados nos termos do artigo 20° deste diploma) com os respectivos juros."
27.ª -Essa decisão, na linha da própria PI, e no que respeita às entregas de quantias que teve como provadas, tinha acolhido a dicotomia 'títulos de capital'/'títulos de participação', esquecendo que a categoria títulos de participação não existe na R., como nem sequer está prevista seja nos seus estatutos seja no Cód. Cooperativo, sendo antes privativa ou exclusiva das cooperativas que praticam o regime da propriedade colectiva dos fogos, conforme o citado DL n° 502/99, e, dentro destas, apenas daquelas em que os fogos são cedidos aos cooperadores na modalidade de "atribuição do direito de habitação" (artigo 18° do mesmo diploma);
28.ª -Sendo certo que a Cooperativa aqui recorrente se situa antes no âmbito do regime da propriedade individual dos fogos (artigo 49° dos seus estatutos);
29.ª -Aquele específico regime foi, plausivelmente, estabelecido em consideração dessa modalidade particular em que os fogos continuam de propriedade da cooperativa, (artigo 16°, nº 1, alínea b) do citado diploma), e em que, por outro lado, o que se atribui ao cooperador é um direito de habitação, como morador usuário, regulado supletivamente pelas disposições dos artigos 1484° e segs do CC (Uso e habitação), conforme se vê dos artigos 18° e 19° do mesmo DL; e é a esse direito de habitação que vão justapostos os falados títulos de participação (artigo 20° do citado DL);
30.ª -Diversamente da sentença inicial, a douta sentença recorrida faz agora valer, quanto às entregas do A. a que nos temos referido, o mesmo artigo 24°, n° 1, do citado DL 502/99, não porém por via de aplicação directa mas antes porque, e citamos da decisão recorrida, "os títulos de investimento realizados pelo A. são equiparáveis aos títulos de participação mencionados no artigo 20° do DL 502/99, atento o artigo 10° dos estatutos da R.";
31.ª -Essa invocada equiparação ou analogia não vem todavia fundamentada na decisão sob recurso, e é de todo injustificada, face aos princípios que presidem à integração das lacunas da lei (artigo 10° do Código Civil), e como, salvo melhor opinião, claramente se infere das antecedentes conclusões 27ª a 29ª assim como do explanado nos nºs 12 e 13 do corpo desta alegação;
32.ª -Mas se porventura se justificasse recorrer neste contexto à integração de lacuna por meio de analogia, alegadamente por se tratar de um caso omisso, então a regulamentação mais certeira, a aplicar ao caso não previsto, seria antes a disposição do n° 2 do artigo 24° do citado diploma, segundo o qual "em caso algum serão reembolsadas as quantias pagas a título de preço do direito de habitação de que trata o artigo 19° deste diploma.";
33.ª -Pois seria bastante mais evidente a equiparação entre o preço pago pelo direito de habitação regulado no artigo 19° do citado diploma e o montante pago na Cooperativa ré a título de contribuição para a aquisição do terreno destinado à construção da habitação para os cooperadores (artigo 10° dos estatutos);
34.ª -E os títulos de investimento obrigatório não seriam em caso algum reembolsáveis ao cooperador excluído;
35.ª -De resto, nem o A. na sua petição, nem a sentença recorrida, apontaram genuinamente uma norma do ordenamento cooperativo que mande efectuar, ao cooperador que tenha sido excluído, a restituição de títulos de investimento obrigatório ou de títulos de investimento destinados à aquisição de terrenos para edificação de fogos cooperativos;
36.ª -Aliás, que os títulos de investimento em apreço não têm que ser restituídos ao cooperador excluído decorre, a contrario, quer do artigo 36°, n" 3, do Cód. Coop., quer do artigo 11° dos estatutos da apelante;
37.ª -Não se verifica aqui, na realidade, qualquer lacuna legal ou estatutária, nem, quanto aos chamados títulos de participação, haveria qualquer razão para analogia, como se disse, por se tratar de conceitos e lugares bem diferentes;
38.ª -E também não poderia aplicar-se aos títulos de investimento obrigatório um regime que tanto o aplicável Cód. Cooperativo (artigo 36° em conjugação com o artigo 37°, n° 9) assim como os estatutos da apelante (artigo 11°) prevêem exclusivamente para os títulos de capital;
39.ª -Enferma, pois, a douta sentença de erro sobre os pressupostos de facto e de erro na determinação e interpretação da lei aplicável, tendo, pois, decidido sem a devida consideração dos factos nem do direito aplicável, e assim infringindo, nomeadamente, os arts. 16°, 20° e 24° do DL n.º 502/99, o artigo 36° do Cód. Cooperativo (em conjugação com o artigo 37°, n° 9, do mesmo), e os arts. 10° e 11 ° dos estatutos da recorrente;
40ª -Que os títulos de investimento obrigatório em apreço possam não ser legalmente restituíveis, em caso nomeadamente de exclusão de cooperador, faz parte - pode bem dizer-se - do risco incorrido pelo sócio e torna-se inteligível no âmbito do regime económico e de financiamento das cooperativas do ramo em questão;
41.ª -Veja-se, exemplificativamente, que os montantes em causa se destinavam a ser utilizados em vista da aquisição de terreno, em conjunto com as verbas igualmente proporcionadas para o mesmo fim por parte dos outros cooperadores, assim como foram concluídos os programas de construção, para os quais os cooperadores contribuíram com as verbas necessárias, segundo as proporções aplicáveis, bem como atribuídos os respectivos fogos dos quais os cooperadores se tornaram proprietários;
42.ª -Pelo que, caberia até perguntar, a que título é que a Cooperativa haveria agora de responder pelos montantes em questão, ou seja, restituir quantias investidas nos terrenos em que foram construídos os prédios de que fazem parte as casas dos cooperadores que foram membros da Cooperativa, tanto mais não dispondo naturalmente a apelante dessas quantias que verdadeiramente são parte, por assim dizer, do edificado - os prédios construídos nesses terrenos e cujas fracções pertencem aos cooperadores em propriedade individual;
43.ª -Ainda sem conceder, não se conforma a recorrente com a decisão que não reconheceu à R. o direito de retenção sobre os valores necessários a garantir a responsabilidade do cooperador excluído, conforme o disposto no art. 11.º, n.º 2, dos seus estatutos;
44.ª -O fundamento que a sentença acolheu para tal recusa foi o de que aquela disposição não se amolda ao conceito legal de direito de retenção constante do artigo 754º do CC;
45.ª -Mas o certo é que, enquanto definição estatutária, ela é inelutável ou irrefutável no seu resultado de direito de garantia, justificado, no caso, por manifesta razão de justiça e equidade, para mais tendo em conta a desproporção dos valores respectivamente em questão;
46.ª -E, assim, ao recusar reconhecer esse direito de retenção da recorrente, que lhe havia sido proposto na contestação, e que faz parte do estatuto contratual do cooperador, a sentença recorrida não atendeu ao artigo 11.º, n° 2, dos estatutos da aqui recorrente e violou, designadamente, os artigos 405.º e 406.º do CC;
47.ª -Por outro lado, e sempre sem nada conceder, discorda a recorrente de que o tribunal a quo não tenha conferido relevância, para efeito de redução do total montante da decisão condenatória, ao resultado negativo do exercício de 1999, em acumulação com o efeito que reconheceu ao resultado negativo do exercício de 1998, o que se afigura contrário aos princípios de justiça comutativa e de paridade de tratamento, sendo o mesmo o contexto temporal dos resultados em questão;
48.ª -Por fim, foi a recorrente condenada a pagar ao A. "juros [de mora] à taxa legal desde 8 de maio de 2002";
49.ª -Mas do antecedentemente concluído já decorre que não poderia haver lugar a tal condenação, porquanto não existe, para a quase totalidade das quantias em questão, qualquer norma que imponha a sua devolução, ou pelo menos uma norma equivalente à que determina a restituição dos títulos de capital, e portanto não poderia, por definição, haver lugar a mora da recorrente;
50.ª -E, muito menos, na medida em que não existiu qualquer interpelação do A. à R. para o efeito (facto 2 não provado);
51.ª -O artigo 805, nº 1, do CC estabelece como regra geral que "o devedor só fica constituído em mora depois de ter sido judicial ou extrajudicialmente interpelado para cumprir", pelo que a interpelação constituía facto constitutivo do direito alegado pelo A., que este não provou (artigo 342.º do CC);
52.ª -E, mesmo quanto ao valor dos títulos de capital - Esc. 50.000$00 - não parece que o prazo de um ano, referido nas disposições dos artigos 36°, n° 3, do Cód.Coop. e 11°, n" 3, dos estatutos da recorrente, opere automaticamente, ou seja, independentemente de interpelação, uma vez não se tratará aí, verdadeiramente, de uma obrigação com prazo certo em que seja dispensada a interpelação;
53.ª -Tem-se, para além disso, como manifestamente infundada, pois que não se apoia em qualquer dado preciso, e bem assim não tem qualquer suporte factual nos autos, a fixação da data de 8/5/2002 como sendo a do início da mora - como mais detidamente é exposto no n° 21 do corpo desta alegação;
54.a -Decidindo como decidiu, ao condenar a apelante em juros de mora, e ao julgar a mora ocorrente desde 8/5/2002, sem fundamento factual ou legal, a sentença em recurso incorreu em erro de facto e de direito, e ofendeu, nomeadamente, os artigos 804.º e 805.º, n.º 1, do CC.
Nestes termos e pelo muito que, como sempre, não deixará de ser por Vossas Excelências proficientemente suprido, deverá ser provido o presente recurso e revogada a decisão recorrida, julgando-se a acção totalmente improcedente e sendo a apelante absolvida do pedido, com o que se decidirá conforme o Direito e se fará inteira JUSTIÇA!

O autor apresentou em que pugna pela improcedência do recurso.

Constituem questões decidendas saber se:
i) A sentença é nula por omissão de pronúncia;
ii) A sentença padece de erro no julgamento da matéria de facto;
iii) É de censurar a sentença recorrida na parte em que versa sobre a matéria de direito (reembolso do valor dos títulos de investimento; direito de retenção; resultados negativos de 1998e 1999; juros de mora).

Foram julgados provados no primeiro grau os seguintes enunciados de dados de facto:
«1.-O A. foi cooperador da R. desde a sua constituição, em Fevereiro de 1996.
2.-Por deliberação da R. de 18 de Dezembro de 1998, foi aprovada a exclusão do A. como cooperador da R.
3.-Inconformado com esta deliberação, o A. intentou procedimento cautelar de suspensão da deliberação e ação de declaração de nulidade da deliberação, procedimento e ação em que não obteve vencimento.
4.-Enquanto cooperador da R., o A. entregou a esta as seguintes quantias:
-Esc. 1.721.500$00, através do cheque n.º 5031577181, datado de 15 de março de 1996;
-Esc. 1.032.900$00, através do cheque n.º 3815532865, datado de 25 de junho de 1996;
-Esc. 1.549.300$00, através do cheque n.º 3155266868, datado de 6 de janeiro de 1997;
-Esc. 1.000.000$00, através do cheque n.º 4014952212.
5.-Dos estatutos da R. constam, entre outros, os seguintes artigos:

“Artigo 10º
Realização de títulos de investimento
Serão inteiramente realizados pelos cooperadores os títulos de investimento no valor global necessário à cobertura dos encargos para a aquisição do terreno destinado à construção das habitações por aqueles membros.

Artigo 11º
Reembolso dos títulos de capital
1-Não podendo operar-se transmissão por morte os sucessíveis têm direito a receber o montante dos títulos de capital realizado pela forma de pagamento que tenha sido previamente estabelecida pela assembleia geral.
2-De igual direito beneficiam os membros que se demitem ou sejam excluídos da Cooperativa, salvo o direito de retenção pela Cooperativa dos valores necessários a garantir a sua responsabilidade.
3-Em caso de demissões ou exclusão os títulos de capital deverão ser restituídos em prazo não superior a um ano.”

Artigo 49.º
Regime de propriedade dos fogos
A Cooperativa pratica o regime de propriedade individual como regime de propriedade dos fogos que constrói.
6.-A 7 de julho de 1995, o R. entregou a quantia de Esc. 200.000$00, a título de jóia e inscrição no programa habitacional Vasco da Gama, tendo a R., a 31 de Dezembro de 1996, emitido a favor do A. título de capital no valor de Esc. 50.000$00 e título de investimento obrigatório no valor de Esc. 150.000$00.
7.-O balanço da R. relativo ao exercício de 1998 apresenta o resultado líquido negativo de Esc.93.473.225$30.
8.-O balanço da R. relativo ao exercício de 1999 apresenta o resultado liquido negativo de Esc. 113.664.347$70.
9.-As entregas referidas no ponto 4 destinavam-se à realização de títulos de investimento.
10.-Para a R. poder levar por diante os programas de construção, os cooperadores à data tiveram de colmatar o desvio, efectuando entregas adicionais que não estavam previstas.
11.-O valor do desvio foi rateado pelos cooperadores na proporção da respectiva permilagem.
12.-Enquanto o A. foi cooperador, a habitação para que se encontrava inscrito era das de maior tipologia e valor proporcional no programa de construção Vasco da Gama.
13.-É o valor do desvio que a R. procura reaver na acção que corre termos sob o n.º 12078/00.2TVLSB proposta contra entre outros, o ora A.

Matéria de facto não provada
1.- O A. entregou a R a quantia de Esc. 1.721.500$00 em data anterior a 15 de Marco de 1996; a quantia de Esc. 1.721.500$00 a 26 de Novembro de 1997; a quantia de Esc. 1.582.200$00 a 11 de Agosto de 1999; e a quantia de Esc. 2.000.000$00 a 26 de Novembro de 1997.
2.- O A interpelou a R. por diversas vezes, quer pessoalmente quer por meio dos respectivos advogados, tendo em vista o pagamento do montante em apreço
3.- A Ré ficou desapossada da quantia de Esc 419.843.600$00 que saiu fraudulentamente da sua conta através da emissão de 33 cheques assinados pelo vice-presidente e pelo tesoureiro, num lapso de tempo que se estendeu pelos anos de 1997 e 1998 durante o mandato da direcção presidida pelo A
4.- Os cooperadores eram em número de cerca de 160.

Da putativa nulidade da sentença.

Entende a recorrente que a sentença impugnada é nula, por omissão de pronúncia ex artigo 608.º, n.º 2 e 615.º, n.º 1, al. d), 1.ª parte CPC.

Na sua maneira de ver o tribunal deveria ter conhecido, o que não fez, a matéria constante da sua defesa de fls. 44 e ss. maxime nos artigos 14 e 15, 37 a 41 da contestação.

Um dos princípios da motivação das sentenças é o princípio da exaustão

Segundo este princípio, o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras (artigo 608º, n.º 2 CPC ).
A lei não prescreve que o juiz conheça de todas as questões suscitadas pelas partes, nem, m

Muito menos, que analise todos os argumentos e linhas de raciocínio por elas deduzidos ou seguidos (v.g. Acs. STJ de 26.04.84, BMJ 336:406, de 27.01.93, BMJ 423:444 e de 07.07.94, BMJ 439:299), mas sim e tão-só as questões efectivamente relevantes para a boa decisão da causa, quer as que tenham sido invocadas pelas partes, quer as que sejam de conhecimento oficioso.

Vem sendo dominantemente entendido que o vocábulo “questões’’ não abrange os argumentos, motivos ou razões jurídicas invocadas pelas partes, antes se reportando às pretensões deduzidas ou aos elementos integradores do pedido e da causa de pedir, ou seja, entendendo-se que e por “questões” as concretas controvérsias centrais a dirimir (Ac. STJ de 02.10.2003, Rec. Revista n.º 2585/03 – 2.ª Secção; Ac. STJ de 02.10.2003,  Agravo n.º 480/03 – 7.ª Secção).

O juiz tem, pois, de conhecer «todos os pedidos deduzidos, todas as causas de pedir e excepções invocadas e todas as excepções de que oficiosamente lhe cabe conhecer» (José Lebre de Freitas, A Acção Declarativa Comum, Coimbra editora, Coimbra, 2000: 299), exceptuadas as questões, quanto ao pedido, à causa de pedir ou às excepções, cuja apreciação quede prejudicada pela solução dada às outras.

A nulidade consistente na omissão de pronúncia só se verificará se o juiz não se pronunciar especificamente sobre questões invocadas pelas partes e não, como dissemos, quando deixe de apreciar qualquer argumento apresentado pelos litigantes.

O primeiro grau decidiu julgar não provado que a ré ficou desapossada da quantia de Esc 419.843.600$00 que saiu fraudulentamente da sua conta através da emissão de 33 cheques assinados pelo vice-presidente e pelo tesoureiro, num lapso de tempo que se estendeu pelos anos de 1997 e 1998 durante o mandato da direcção presidida pelo A (para além dos factos provados constantes nos n.ºs 10 e 11).

Tal julgamento mostra-se motivado. Julgar mal, como entende a recorrente que se verifica no caso, é espécie diversa de omitir pronúncia sobre questão suscitada pela parte. Como dizia Alberto dos Reis “o facto material é um elemento para solução da questão, mas não é a própria questão’’ (CPC, Anotado, V: 145).

A haver erro de julgamento tal situa-se ao nível do error in judicando e não in procedendo, o que teremos, aliás, oportunidade de sindicar neste acórdão.
Improcede a arguição.

Do putativo erro de julgamento da matéria de facto.

Entende a ré que ao n.º 9 dos factos assentes deve ser acrescentado o inciso  obrigatório; o ponto 3 dos factos não provados deve ser dado como provado passando a n.º 10, sendo que os actuais pontos 10 e 11 devem passar a ser 11 e 12.

Como resulta dos documentos de fls. 174, 175, 215 e 255 a 257, as entregas referidas no ponto 4.º destinavam-se à realização de títulos de investimento obrigatório.

Assim e, em conformidade, é alterado o ponto 9 dos factos provados.

De resto, o autor não põe em causa esta qualificação apenas opondo reservas à utilidade e necessidade da alteração.

O tribunal considerou não provado o ponto 3 da matéria de facto porquanto a prova produzida não permitiu ao tribunal, com a certeza e segurança necessárias , reconhecer a realidade dos factos vertidos naquele ponto, sendo de salientar que não foram juntos documentos, nomeadamente os alegados três cheques, que corroborassem a conclusão da testemunha M no sentido de ter a Ré sido desfalcada em € 2.266.386,80.

A recorrente, como vimos, pretende que a decisão seja precisamente a oposta desta, isto é que tal matéria seja considerada provada.

Ora, não foi feita a competente prova documental (v.g. cópia dos cheques) que demonstre tal factualidade. O depoimento da testemunha R..., técnica oficial de contas da ré, é o único que dá uma ideia do quantitativo do desfalque. O depoimento das restantes é demasiado vago a tal respeito.

Por outro lado, não é de aplicar in casu o disposto no artigo 421.º CPC que se circunscreve, como é sabido, aos depoimentos e perícias. A sentença junta aos autos, datada de 13.01.2017, que não se sabe se transitou em julgado, apenas mostra o resultado de um meio de prova não especificado, a valorara livremente pelo julgador (artigo 607.º, n.º 5, CPC).

Improcede no essencial o recurso nesta parte. Dizemos no essencial porquanto não há dúvida que a enunciação dos factos provados não é a mais perfeita, na medida em que refere que os cooperadores tiveram de “colmatar o desvio’’ (facto 10) e que “o valor do desvio foi rateado pelos cooperadores’’ (facto 11).
Desvio está empregado com o sentido e desfalque ou desvio de
fundos. Dá-se ao ponto 10 a seguinte redacção: ‘’Para a Ré poder levar por diante os programas de construção, os cooperadores à data tiveram de colmatar um desvio de fundos, efectuando entregas adicionais que não estavam previstas’’.

Do direito
i)-A exclusão do A. da qualidade de cooperador da Ré constitui ou não esta na obrigação de reembolso de títulos de capital e de investimento por aquele subscritos?
O DL n.º 502/99 só faz a distinção entre títulos de capital e títulos de participação (artigos 20.º e 24.º), sendo omisso quanto aos chamados títulos de investimento.
Acresce que o regime aplicável aos títulos de participação só surge a propósito das cooperativas sujeitas ao regime da propriedade colectiva dos fogos, e na modalidade de direito de habitação, como decorre da sistematização do diploma.
Este texto legal divide-se em três capítulos estando o segundo reservado à propriedade dos fogos; o capítulo II, por sua vez, subdivide-se em três secções – I. Disposições gerais, II. Da propriedade colectiva dos solos, III. Da propriedade individual dos fogos – contendo ainda a IIª Secção e só ela duas subsecções – Direito de habitação e Do inquilinato cooperativo. É a propósito do direito de habitação que o legislador regulamenta o reembolso dos títulos de capital e de participação.
Dispõe o artigo 1.º do citado DL que “as cooperativas de habitação e construção e as suas organizações de grau superior regem-se pelas disposições do presente diploma e, nas suas omissões, pelo Código Cooperativo’’.
Compulsando este Código (daqui em diante CC) constatamos que nele se faz a distinção entre títulos de capital, títulos de investimento e obrigações.
Aludem a títulos de capital os seguintes artigos: 15.º, n.º 1, al. e), 17.º, n.º 2, 19.º, n.º 2, 20.º, 21.º, nºs. 4 e 5, 23.º, 36.º, n.ºs 3 e 4, 37.º, 9.º 73.º, nºs 1 e 3, 79.º, n.º 1, al. c) e 91.º, n.º 7.
Referem-se a títulos de investimento os artigos 26.º, 27.º, 28.º, 79.º e 91.º, n.º 7.
Tanto os títulos de investimento como a possibilidade de emissão de obrigações (artigo 30.º) constituem instrumentos mobiliários que possibilitam a dinamização financeira das cooperativas e o consequente reforço económico-financeiro.
O artigo 20.º do CC trata dos títulos representativos do capital social das cooperativas e exige que os mesmos tenham um valor nominal mínimo de 5 euros ou um seu múltiplo (n.º 1).
Sobre o reembolso dos títulos de capital, em caso de exclusão do cooperador rege o artigo 37.º, n.º 9, que manda aplicar o disposto na parte final do n.º 1 e o disposto no n.ºs 3 e 4 do artigo anterior.
Os nº 3 e 4 do art 36º do CC preceituam: «Ao cooperador que se demitir será restituído, no prazo estabelecido pelos estatutos, ou, supletivamente, no prazo máximo de um ano, o montante dos títulos de capital realizados segundo o seu valor nominal» (3). «O valor nominal referido no número anterior será acrescido dos juros a que tiver direito relativamente ao último exercício social, da quota-parte dos excedentes e reservas não obrigatórias repartíveis, na proporção das sua participação, ou reduzido, se for caso disso, na proporção das perdas acusadas no balanço do exercício no decurso do qual surgiu o direito ao reembolso’’(4).
Em lado algum se estabelece para o reembolso dos títulos de investimento um regime paralelo ao do artigo 24.º do DL 502/99.
O artigo 26.º, n.º 3, do CC, inclusive faz depender o reembolso dos títulos de investimento emitidos nos termos da alínea a) do n.º 1 do preceito da liquidação da cooperativa “e somente depois de do pagamento de todos os outros credores da cooperativa ou, se esta assim o decidir, após terem decorrido pelo menos cinco anos sobre a sua realização, nas condições definidas quando da emissão’’.
Não encontramos pois fundamento para dar razão ao autor quanto ao reembolso dos títulos de investimento que são, como dissemos, instrumentos diferentes dos títulos de participação. Que assim é resulta ainda dos Estatutos da Cooperativa, onde só é feita a distinção entre títulos de capital e títulos de investimento, estes emitidos quando a assembleia geral o delibere, cabendo-lhe fixar a taxa de juro e demais condições de emissão e de reembolso, podendo cada cooperador subscrever mais títulos do que o valor do fogo que lhe vier a ser atribuído (artigo 9.º Estatutos), ao contrário dos títulos de participação que têm como plafond aquele valor (artigo 20.º, n.º 1 DL 502/99).
Podemos cogitar com a ré que o regime legal se compreende fazendo apelo à assunção dos riscos pelo cooperador ao aderir livremente à cooperativa, e à aludida ideia de que esteve presente na mente do legislador de 96 o reforço económico-financeiro da cooperativas aproximando-as um pouco mais das sociedades comerciais.
ii)-Terá a ré “direito de retenção’’?
A resposta é claramente negativa. O artigo 11.º dos Estatutos prevê a restituição dos títulos de capital e ressalva o direito de retenção pela cooperativa dos valores necessários a garantir a responsabilidade dos cooperadores que se demitam ou sejam excluídos.
Como é evidente não estão preenchidos os requisitos do artigo 754.º do Código Civil. Por outro lado, como sustenta e bem a sentença impugnada “atento o disposto no artigo 847 do CC não pode a R. livrar-se da sua obrigação restituir enquanto não houver decisão que reconheça a responsabilidade do A. no desfalque ocorrido durante o mandato deste na direcção da R’’. Não vislumbramos qualquer outra interpretação da cláusula estatutária que dê razão à recorrente.
iii)-Deverão levar-se em consideração os resultados negativos de 1999?
A resposta é também neste caso negativa. A exclusão do A. verificou-se em 18 de Dezembro de 1998. A parte final do artigo 36.º, n.º 4 fala  em ‘’proporção das perdas acusadas no balanço do exercício no decurso do qual surgiu o direito ao reembolso’’
iv)-Haverá lugar à condenação da Ré em juros?
Não pôde o tribunal apurar o valor liquído devido ao A. nos termos das disposições legais e estatutárias referidas. Por isso relegou para ulterior liquidação a fixação desse valor (artigo 609.º, n.º 2, CPC).
Ordenada a liquidação da dívida em competente incidente e tendo o autor começado por accionar um pedido liquido, os juros de mora legais incidentes sobre a divida, contam-se a partir da data de citação do devedor, para a acção declarativa (artigos 804 e 805.º, n.ºs. 1 e 3, CCIVIL; cfr. Ac. STJ, de 07.04.2005, www.dgsi.pt).

Pelo exposto, acordamos em julgar parcialmente procedente o recurso e, consequentemente, em revogar também parcialmente a decisão recorrida, que se substitui por outra que condena a Ré a restituir à Autora a quantia que se vier a liquidar correspondente à redução do valor de € 249,39 na proporção das perdas acusadas no balanço da Ré do exercício de 1998, quantia essa acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde 06.05.2014.
Custas por A. e R. na proporção de 4/5 e 1/5 respectivamente.



Lisboa,26.10.2017



Luís Correia de Mendonça
Maria Amélia Ameixoeira
Rui Moura
Decisão Texto Integral: