Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
7981/09.7T2SNT-B.L1-2
Relator: JORGE VILAÇA
Descritores: HABILITAÇÃO DE HERDEIROS
REPÚDIO DA HERANÇA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 04/28/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário:
I - A falta de contestação apenas importa a confissão dos factos alegados pelo requerente não sujeitos a prova vinculada e não abrange o direito invocado, para efeitos do disposto no art.º 567º do Código de Processo Civil.
II - No incidente de habilitação de herdeiros, a confissão referida em I não ocorre quando há mais do que um réu e quando se verifique citação edital de herdeiros incertos.
III - Não se pode falar em nulidade de sentença por omissão de pronúncia o facto de o tribunal não ter ordenado diligências requeridas por uma das partes, justificado em despacho próprio, e também quando as mesmas não sejam necessárias para a decisão da causa.
IV - A habilitação de herdeiros para efeitos fiscais, o recebimento de pensão de sobrevivência por morte do marido não tem o efeito de aceitação tácita da herança que impeça o posterior repúdio da mesma.
V - O repúdio da herança depois de decorrido o prazo para contestação do incidente de habilitação de herdeiros importa o não reconhecimento do repudiante como herdeiros, uma vez que o repúdio retroage ao momento da abertura da sucessão e por se considerar como se nunca tivesse sido chamado à sucessão aquela que repudia.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa
I

Relatório

A
Requereu a habilitação dos herdeiros do falecido B por apenso à acção de que este é autor contra:
Maria e herdeiros incertos do falecido.
Alegando o seguinte:
O R. faleceu no dia 16 de Dezembro de 2009, cfr. cópia da certidão de óbito que se junta como doc. 1.
O R. era casado com a requerida M, cfr. consta nessa certidão.
De acordo com as regras da sucessão o cônjuge é o principal herdeiro e cabeça de casal da herança, nos termos do art. 2080º, 2132º e 2133º do Código Civil.
O A. desconhece se o R., para além do cônjuge tem mais algum herdeiro legitimário.
Pelo que se requer a requerida M venha aos autos identificar outros eventuais herdeiros, caso os haja.
Pelo que, se requer a requerida seja desde já considerada habilitada, como sucessor do falecido, sem embargo de posteriormente serem indicados mais sucessores, nos termos dos art. 351º e seguintes do CPC.
O incidente é autuado por apenso, nos termos do art. 352º, nº 2 do CPC.
Ao requerente foi concedida protecção jurídica nas modalidades de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo e de nomeação de patrono com pagamento de honorários, conforme despacho da Segurança Social junto aos autos onde este apenso foi autuado.

Os requeridos foram citados, a primeira pessoalmente em 04-02-2014 e os incertos através do Ministério Público.
Em 13-02-2014, a requerida Maria veio dizer o seguinte:
1. Em 16 de Dezembro de 2009, faleceu o seu marido, B.
2. Tem conhecimento que o seu falecido marido tinha duas filhas, fruto de uma relação anterior, com as quais nunca teve, nem tem qualquer contacto.
3. Apenas sabe que uma se chamava Cristina e a outra Gracinda, desconhecendo as suas moradas ou paradeiro.

Em 17-04-2015, a requerida Maria veio juntar escritura pela qual disse que repudia a herança a que foi chamada por óbito de seu marido B e que a repudiante tem como única descendente sucessível uma filha, Filomena (fls. 52 a 56).

Foi proferida sentença julgando o incidente parcialmente procedente, “absolvendo a requerida Maria do presente incidente e porque ninguém compareceu a habilitar-se como sucessor dos falecidos no prazo fixado nos éditos, tendo em atenção o estatuído no n.º 2 do art. 355º do Cód. Proc. Civil, julgo habilitado o Ministério Publico como representante dos sucessores incertos para prosseguir no lugar dos falecidos os termos do processo apenso.".


Não se conformando com aquela sentença, dela interpôs recurso o requerente do presente incidente, que nas suas alegações formulou as seguintes “CONCLUSÕES”:
– Por sentença proferida pela 1ª Secção Cível - J3 da Instância Central de Sintra da Comarca de Lisboa Oeste foi requerida Maria, absolvida do incidente da habilitação de herdeiros, promovido pelo requerente A com o fundamento de a requerida ter repudiado a herança do marido, B, por aplicação do disposto no art. 2062º do Código Civil (CC).
- A decisão recorrida não teve em consideração o disposto no art. 567º, nº 1 do CPC sobre os efeitos da não contestação ao requerimento de habilitação de herdeiros.
- Nem tão pouco os fundamentos alegados pelo ora recorrente, sobre a extemporaneidade e legalidade desse repúdio na medida em que a requerida já teria previamente aceitado a herança do falecido marido.
- Em 31 de janeiro de 2014 a requerida foi devidamente citada, nos termos do disposto no art.º 228.º do Código de Processo Civil para, no prazo de 10 dias, contestar, querendo, a habilitação de herdeiros sob pena de, não o fazendo, vir a ser julgada sucessora do falecido para consigo prosseguir a causa principal.
- A requerida não contestou.
- Antes preferiu, em 13 de fevereiro de 2014, informar no processo ter conhecimento que o seu falecido marido tinha duas filhas, fruto de uma relação anterior, com as quais nunca teve qualquer contacto, apenas sabendo que uma se chamava Cristina e a outra Gracinda, desconhecendo as suas moradas ou paradeiros.
- Em 5 de maio de 2014, depois de notificado para se pronunciar sobre a informação prestada pela requerida, o ora apelante considerou pouco credível a informação prestada, tendo reiterado a ideia de não existir fundamento para que a ação não pudesse correr os seus tremos, desde logo, contra a requerida, atendendo à sua qualidade de herdeira legitimária por excelência, enquanto cônjuge do decesso.
- Ainda assim, requereu fossem efetuadas diligências junto da Segurança Social e dos Serviços de Finanças para apurar da existência dessas filhas indicadas pela mulher do decesso.
- Buscas efetuadas pela Secção, no SIRIC, através de pesquisa por "nome de pai" não obtiveram quaisquer resultados, desconhecendo-se a existência de qualquer Cristina ou Gracinda.
10ª - Em 21 de janeiro de 2015, o Serviço de Finanças de Lisboa 5 veio aos autos informar que por óbito de B NIF 108377067, e até essa data, não tinha sido efetuada a participação de imposto de selo a que se refere o art. 26º do respetivo o Código.
11ª - Em 17 de abril de 2015, a requerida apresentou escritura de repúdio da herança requerendo que fosse considerada parte ilegítima na ação.
12ª - Em 20 de abril de 2015, como resposta a esse repúdio, o requerente apresentou no processo o requerimento seguinte:
“1. Contrariamente ao afirmado no requerimento enviado ao processo em 6 de março de 2015, com a Rfª 18993389, a requerida tinha perfeito conhecimento da existência deste processo de habilitação de herdeiros.
2. Porquanto em 13 de fevereiro de 2014, com a Rfª 15932626, pela voz da mesma mandatária, a requerida respondeu à citação para este mesmo processo.
3. Sendo por isso incompreensível e muitíssimo estranho que nessa ocasião a requerida não tenha, desde logo, repudiado a herança.
4. Resulta assim claro para o requerente que a requerida, além de não cumprir com o dever de cooperação a que está obrigada, está a faltar à verdade dos factos.
5. Devendo, ser sancionada por essa litigância, manifestamente, de má-fé, tal como a própria mandatária da requerida que também está, manifestamente, a faltar à verdade quando afirma que “Desconhecia a Requerida a existência de qualquer pleito em Tribunal, mormenos que a viesse a habilitar no processo”.
6. Por outro lado, o requerente sabe que o decesso tinha bens cuja propriedade deve ter sido, ou deverá ser, transmitida aos seus herdeiros, nomeadamente a oficina onde trabalhava e a casa onde morava.
7. E, ainda que a habilitada ou alguém por ela, recebeu e/ou continua a receber da Segurança Social ou da Caixa Nacional de Pensões, prestações pela morte de B.
8. Pelo que, antes de ser proferida qualquer decisão sobre a não habilitação de Maria devem ser encetadas diligências no sentido de confirmar se a requerida Maria Julieta alguma vez se habilitou à herança de B.
9. Pelo que, se requer:
a) Seja notificada a Fazenda Nacional para informar se o contribuinte B com o NIF 108377067 alguma vez foi proprietário de algum bem imóvel;
b) Seja notificada a Fazenda Nacional para informar quem é o proprietário da fração sita naRua..., Lisboa.
c) Seja notificada a Fazenda Nacional para informar o artigo da matriz da fração sita naRua..., Lisboa;
d) Seja notificada a Fazenda Nacional para informar quem é o proprietário da fração sita na Rua..., Mem Martins;
e) Seja notificada a Fazenda Nacional para informar o artigo da matriz da fração sita na Rua..., Mem Martins;
f) Seja notificada a Fazenda Nacional para informar se nalguma repartição de Fianças foi entregue habilitação de herdeiros e/ou relação de bens, por morte de B com o NIF 108377067;
g) Seja notificado o Banco de Portugal para informar de que contas bancárias era titular B com o NIF 108377067 à data da sua morte (16 de dezembro de 2009);
h) Seja notificado o Banco de Portugal para informar o destino dessas eventuais contas bancárias;
i) Seja notificada a Segurança Social para informar se M recebeu e/ou continua a receber alguma prestação pela morte de B com o NIF 108377067
.j) Seja notificada a Caixa Nacional de Pensões para informar se M recebeu e/ou continua a receber alguma prestação pela morte de B com o NIF 108377067;
k) Seja notificada a Segurança Social para se alguém recebeu e/ou continua a receber alguma prestação pela morte de B com o NIF 108377067;
l) Seja notificada a Caixa Nacional de Pensões para informar se alguém recebeu e/ou continua a receber alguma prestação pela morte de B com o NIF 108377067. ….”
13ª - O Tribunal a quo decidiu não encetar as diligências requeridas por considerar que essas informações não eram relevantes para a prossecução dos autos, esquecendo-se porventura que era importante saber se a requerida já tinha recebido alguma herança do falecido marido, ou se continuaria a receber qualquer prestação pela morte deste, para poder julgar, convenientemente, o repúdio da herança por aquela apresentado e que o requerente reiteradamente impugnou.
14ª - Mais, a informação prestada pelo Serviço de Finanças de Lisboa 5 não era impeditivo de junto da Fazenda Nacional se tentar obter as informações requeridas pelo requerente em 20 de abril de 2015, por as mesmas só poderem ser facultadas por ordem do Tribunal, nomeadamente, (1) se o contribuinte B com o NIF 108377067 alguma vez foi proprietário de algum bem imóvel (2) quem é o proprietário da fração sita na Rua..., Lisboa (3) informar o artigo da matriz da fração sita naRua..., Lisboa (4) quem é o proprietário da fração sita na Rua..., Mem Martins (5) informar o artigo da matriz da fração sita na Rua..., Mem Martins (6) informar se nalguma repartição de Fianças foi entregue habilitação de herdeiros e/ou relação de bens, por morte de B com o NIF 108377067, por essa relação de bens poder ter sido entregue noutro Serviço de Finanças que não o de Lisboa 5.
15ª - Essas informações eram, como continuam a ser, essenciais para o apuramento da extemporaneidade do repúdio da herança invocado pela requerida, atendendo à irrevogabilidade da aceitação desta (art. 2061º do CC).
16ª - O ora apelante ainda obteve a informação, já transmitida nos autos, em data posterior à sentença recorrida:
− que o decesso B nunca teve quaisquer filhas;
− que o decesso apenas teve um filho entretanto já falecido e cujo falecimento ocorreu antes da morte daquele, não sendo por isso seu sucessor;
− que a única herdeira de B é a sua mulher Maria, requerida no presente incidente, a qual até herdou imóveis superiores a 156.827,96€ calculados à data do falecimento do marido.
− para além dessa herança a herdeira recebeu o subsídio de funeral pelo Centro Nacional de Pensões, departamento do Instituto de Segurança Social, IP.
− sendo igualmente beneficiária de pensão de sobrevivência do falecido marido.
17ª - Pelo exposto, a sentença recorrida fez inadequada interpretação do art. 567º, nº 1 do CPC sobre os efeitos da não contestação ao requerimento da habilitação.
18ª - Bem como inadequada interpretação e aplicação dos art. 2061º e 2062º do CC, ao mostrar alheamento pela possibilidade de a requerida já ter aceitado a herança e cujo repúdio a esta foi impugnado pelo requerente, pese embora a forma capciosa e extemporânea como foi apresentado.
19ª - Por outro lado, a sentença recorrida não se pronunciou sobre as diligências a efetuar junto do Banco de Portugal, da Caixa Nacional de Pensões, da Segurança Social e, ainda, junto da Fazenda Nacional, conforme oportunamente requerido pelo ora apelante e determinantes para aquilatar da possibilidade de a requerida já ter aceitado a herança do falecido, marido.
20ª - Tal omissão é causa de nulidade da sentença, nos termos do art. 615º, nº 1 d), primeira parte, do CPC.
21ª - Termos em que sentença recorrida deve ser anulada por inadequada interpretação:
a) do art. 567º, nº 1 do CPC;
b) dos art. 2061º e 2062º do CC e, ainda;
c) por omissão de pronúncia, nos termos do 615º, nº 1 d), primeira parte, do CPC.
22ª - Consequentemente, requer-se seja proferido acórdão que considere a requerida Maria legítima sucessora do seu falecido marido B para consigo prosseguir a causa principal.


Nas contra-alegações a recorrida defendeu não ter sido cumprido o ónus dos artºs 639º e 640º do CPC e pugnou pela improcedência do recurso.

II

- Factos
Na sentença recorrida foram considerados assentes os seguintes factos:
1) No dia 16 de Dezembro de 2009 faleceu B, autor nos autos principais.
2) O falecido morreu no estado de casado com M.
3) Não são conhecidos outros herdeiros ao falecido.
4) Maria repudiou à herança deixada por óbito do A. em 16 de Abril de 2015.

III

- Fundamentação

Cumpre apreciar e decidir.

O objecto do recurso é limitado e definido pelas conclusões da alegação do recorrente, pelo que as questões a conhecer no âmbito do recurso interposto são as seguintes:
1. Efeitos da falta de contestação;
2. Nulidade de sentença e Dever de o tribunal proceder a novas diligências;
3. Valor do repúdio da herança.


1. Efeitos da falta de contestação

Foram citados para o presente incidente a requeridaMaria e herdeiros incertos.
A primeira foi citada pessoalmente e veio intervir no processo.
Os segundos foram citados editalmente e, posteriormente, foi citado o Ministério Público para os representar nos termos do art.º 22º do Código de Processo Civil.
A requerida não apresentou formalmente contestação e veio informar existirem outros herdeiros e juntar, ainda, repúdio da herança da parte falecida.

A falta de contestação importa confissão dos factos articulados pelo requerente (art.º 567º, n.º 1, do CPC).
No entanto, o disposto no art.º 567º não se aplica aos requeridos incertos que foram citados por éditos (art.º 568º, alínea b), do CPC), o que implica serem considerados impugnados pelos requeridos incertos os factos alegados pelo requerente e que não resultem de prova documental autêntica.
A ineficácia da confissão em relação aos requeridos incertos aproveita também à requerida Maria, na parte em que não se trate de factos pessoais desta.

De qualquer modo, a confissão por força da falta de contestação é tão só relevante no que respeita aos factos e não direito, e mesmo em relação aos factos abrange apenas aqueles que não estão sujeitos a forma vinculada, ou seja, cuja prova só possa ser feita, nomeadamente, por documento.
Do alegado pelo requerente apenas não foi considerada na matéria de facto descrita em II o alegado em 3º e 5º a 8º e que se reporta, no essencial a matéria de direito.
Assim, é de todo irrelevante considerar-se ou não confessados os factos articulados no requerimento inicial do incidente por falta de contestação, porquanto todos os factos alegados foram considerados assentes.

Aproveitamos, por fim, para referir que é de todo irrelevante trazer ao processo informações ou factos após a prolação da sentença, na medida em que a sentença aprecia os factos alegados pelas partes nos termos previstos na lei, ou seja, com os articulados, sejam eles os iniciais tais como a petição/requerimento inicial, contestação/oposição ou os supervenientes, e os não alegados previstos no n.º 2 do art.º 5º do Código de Processo Civil, mas nunca trazidos ao processo após o encerramento da discussão da causa e da prolação da sentença.

Improcede, assim, a primeira questão levantada no presente recurso.


2. Nulidade de sentença e Dever de o tribunal proceder a novas diligências

A nulidade de sentença por omissão de pronúncia prevista no art.º 615º, n.º 1, alínea d), do Código de Processo Civil.
A omissão de pronúncia para efeitos de poder gerar nulidade prende-se com a obrigação do tribunal de conhecer as questões colocadas no processo pelas partes e que se tornem necessárias ou úteis para a decisão da causa.
Está em causa a necessidade de proceder às diligências requeridas pelo ora apelante após a junção ao processo da escritura de repúdio da herança por parte da requerida Maria.
O tribunal a quo considerou, em despacho autónomo, não se justificar proceder a tais diligências requeridas em 20-04-2015.
A prolação desse despacho demonstra desde logo a inexistência de omissão de pronúncia, na medida em que o tribunal se pronunciou sobre o requerimento da parte, ainda que de forma desfavorável ao requerente.

O requerimento do apelante e que aqui está em causa vem transcrito na conclusão 12ª deste recurso.
O que se pretende através de tal requerimento não é mais do que saber qual o património do falecido marido da requerida.
Trata-se de diligências próprias da partilha e sem relevância para apurar da existência de outros herdeiros da parte falecida.
A existência ou não de património do falecido réu em nada contribui para saber quais os efectivos herdeiros do mesmo.
Deste modo, consideramos que bem andou a primeira instância ao não determinar a feitura de mais diligências após várias outras antes realizadas a requerimento do requerente para apuramento de herdeiros do falecido réu da acção principal.
Por isso, improcede também esta segunda questão do recurso.


3. Valor do repúdio da herança

Conforme consta dos factos assentes e descritos em II, a requerida procedeu ao repúdio da herança aberta por óbito do falecido marido através de escritura notarial.
O meio próprio para impugnar o repúdio da herança não é através do presente processo, mas através de acção própria interposta para o efeito.
Ora, tanto quanto se sabe não foi interposta qualquer acção para o efeito referido.
Também não foi invocada a falsidade do documento autêntico que constitui a escritura de repúdio de herança.
Assim, o documento faz prova plena de que a requerida disse repudiar a herança em causa.
O repúdio da herança é livre e irrevogável (art.º 2067º do Código Civil) e os seus efeitos retrotraem-se ao momento da abertura da sucessão, considerando-se como não chamado o sucessível que a repudia (art.º 2062º do Código Civil).

É certo que o repúdio se torna incompatível com a aceitação anterior da herança, uma vez que esta é irrevogável (art.º 2016º do CC).
Mas não existe nenhum elemento no processo que permita concluir que a requerida tivesse aceite a herança que veio depois a repudiar.
Não releva para efeitos de aceitação da herança a eventual habilitação de herdeiros feita apenas para efeitos fiscais, na medida em que se tal decorre de uma obrigação legal fiscal (cfr. Acórdão da Relação de Évora de 14-07-2004, publicado em http://www.dgsi.pt - processo n.º 535/04-2 - relator desembargador Pereira Batista).
No que respeita ao eventual recebimento de pensão de sobrevivência por óbito do marido não significa que tenha existido aceitação tácita, na medida em que o direito ao seu recebimento decorre do facto de estar casada com o falecido e não da qualidade de herdeiro.
Perante o repúdio da herança por parte da requerida e os seus efeitos legais já referidos, a mesma não é herdeira do falecido réu, pelo que não pode ser habilitada como tal.
Deste modo, improcede toda a argumentação apresentada pelo apelante no presente recurso, fazendo improceder mais esta última questão que cumpria conhecer.

Em suma, a apelação terá de improceder.

IV

Decisão

Em face de todo o exposto, acorda-se em julgar improcedente a apelação, confirmando-se a sentença recorrida.
Custas pelo apelante.
Lisboa, 28 de Abril de 2016

Jorge Vilaça
Vaz Gomes
Jorge Leitão Leal