Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
1012/12.7TVLSB.L1-6
Relator: TERESA SOARES
Descritores: RECLAMAÇÃO PARA A CONFERÊNCIA
IMPROCEDÊNCIA MANIFESTA
USO ABUSIVO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 03/20/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: RECLAMAÇÃO PARA A CONFERÊNCIA
Decisão: SOBREESTAR NA DECISÃO
Sumário: É de qualificar como destinada a provocar demora abusiva do processo, da previsão do artigo 670.º, n.º 1, do CPC, a atuação da parte que reclama de acórdão da Relação imputando-lhe fundamentação que dele não consta e não concretizando a reforma que pretende alcançar.(AAC)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: ACÓRDÃOS DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA

1. L…, SA, intentou a presente ação declarativa de condenação com processo comum sob a forma ordinária, contra C…, RL, e F…, aquela enquanto arrendatária e este enquanto fiador, pedindo a resolução do contrato de arrendamento, celebrado com a 1.ª R, relativo ao 4.º andar direito do prédio sito no n.º 7 da Avenida …, por falta de pagamento de rendas e a condenação de ambos os RR nas rendas em dívida e juros de mora.

2. Citados os Réus vieram, no prazo da contestação, apresentar comprovativo de terem pedido, junto da Segurança Social, Apoio Judiciário, na modalidade de dispensa de pagamento de taxa de justiça e nomeação de patrono.

3. Os pedidos de AJ foram indeferidos, conforme comunicação junta aos autos pela SS:

- o pedido a R. sociedade foi liminarmente rejeitado, por se tratar de pessoa colectiva com fim lucrativo-art.º 7.º n.º 3 da L 34/2004, com as alterações da L.47/2007, tendo a notificação sido enviada à R. a 17/10 de 20012.

- o pedido do R. foi indeferido dado ter sido notificado, a 7/12/2012, para juntar, em 10 dias, documentação comprovativa da sua situação económica, sob pena de indeferimento do pedido, com a cominação de que a falta de resposta implicava o indeferimento do pedido, sem nova notificação; o R não deu cumprimento ao solicitado:

4. Os RR não vieram apresentar contestação, pelo que, a 8/3 de 2013, foi proferido despacho a constatar a falta de contestação e a declarar confessados os factos, tendo as partes sido notificadas do despacho e para os efeitos do art.º 484.º CPC. Apenas a A. veio alegar. Os RR silenciaram-se.

5. De seguida foi proferida sentença que julgou a acção procedente, nos seus precisos termos.

6. Notificados da sentença vieram os RR apresentar requerimento que denominaram ”Reclamação com vista à reforma da sentença”, o qual foi indeferido e os RR condenados como litigantes de má-fé, por se ter considerado que estavam a fazer um uso reprovável do processo.

Nessa “reclamação” invocavam:

- falta de assinatura do juiz;

-falta de notificação dos RR para constituir mandatário, face ao indeferimento do AJ;

- impedimento para a apresentação de contestação;

- violação dos princípios do acesso ao direito e a uma tutela jurisdicional efectiva. 

7. Notificados deste despacho vieram então recorrer da sentença, apresentando alegações invocando, além do mais, que a sentença enferma das nulidades já invocadas e na aplicação errada dos seguintes princípios e preceitos legais: -Princípio do contraditório -Princípio do acesso ao direito e à tutela jurisdicional efectiva do direito; ao processo equitativo e do direito ao patrocínio judiciário, consagrados nos artigos 2.º e 20°, n°s 1, 2 e 4, da Constituição - Princípio do acesso ao direito (art.º 20 da CRP) -Princípio da igualdade -artigo 428.º do Código Civil. -artigo 146.º do CPC -artigo 150.º, n.º 3 do CPC -artigo 487.º n.º 2 do CPC -artigo 671.º n.º1.

8. Foi nesta Relação proferido acordão onde se julgou a apelação improcedente tendo-se discorrido:

“ Voltamos às nulidades para afirmar que a sentença, dada a sua singeleza e clareza nada contém de vícios processuais.

Assim como não enferma de qualquer erro na aplicação do direito que, aliás, o recorrente também não os concretiza.

Os princípios invocados pelos recorrentes, como tendo sido violados, só fariam algum sentido (embora sem hipótese de procedência) se invocados fossem em sede de recurso do despacho que julgou confessados os factos, em face da falta de contestação, despacho esse que foi devidamente notificado.

Seria esse o despacho que poderia ser atacado, pois foi com ele que ficou precludida a possibilidade de ser apresentada contestação, sendo ainda em defesa dessa possibilidade que os recorrentes vêm esgrimir neste recurso.

Mas o recurso está interposto da sentença e não desse despacho.

Pelo que já se discorreu e mais não se justifica, é evidente a improcedência do recurso.”

Foram ainda os recorrentes condenados na multa de 5UCs, como litigantes de má-fé, por se ter entendido que estavam a “fazer do processo um uso reprovável, obstando ao trânsito da decisão, sem qualquer argumento minimamente consistente, tentando aproveitar todos os prazos possíveis e obrigando a recorrida a despender meios para responder ao recurso, e estando impedida de obter a desocupação do arrendado e de o rentabilizar (sendo que está em causa um andar tipo T6, do prédio sito na Av. …., cuja renda em 2012 era de €1.504,50), irão os mesmos sancionados como litigantes de má-fé.- art.º 456.º do CPC.”

9. Notificados deste acordão vêm agora reclamar para a Conferência pedindo a sua “rectificação ou reforma”.

Começam por imputar ao acordão a seguinte afirmação, que dele não consta em parte alguma: “deveria ser do conhecimento dos demandados que uma sociedade de advogados com fins lucrativos não tem direito a apoio judiciário” para, a partir daí, extratar em 8 páginas uma recomendação do Sr. Provedor de Justiça sobre a questão do AJ às entidades colectivas com fins lucrativos.

Afirma então que:

- a decisão recorrida fere os princípios constitucionais e que o acórdão proferido deverá ser corrigido de acordo com esses princípios (sem discriminar que concreta correcção preconiza);

- o acórdão não se pronuncia sobre a constituição obrigatória de advogado, nos termos dos art.º 32.º e 33.º do CPC “ na medida em que, oficiosamente, face à recusa  de apoio judiciário, deveria notificar os demandados para constituir mandatário em prazo certo, sob pena dos mesmos serem absolvidos da instância”.

                                               ***

O presente requerimento apresenta-se na mesma linha de actuação que já havia sido censurada pela 1.ª instância e por este tribunal no acórdão, sendo a presente reclamação/reforma manifestamente infundada.

Os reclamantes vêm protelando de forma manifestamente ostensiva o trânsito da decisão que determina o despejo do arredando, primeiro com pedido de reforma da sentença, em 1.ª instância, depois com a interposição de uma recurso que só com boa vontade se lhe encontrou objecto e agora com um pedido de reforma, imputando-se ao acordão expressão de dele nem sequer consta e não concretizando que reforma se pretende alcançar.

O acórdão confirmou, sem qualquer dissidência e na íntegra a decisão proferida em primeira instância, pelo que dele não pode caber recurso para o STJ.

Porque os tribunais não podem nem devem pactuar com este tipo de actuações, onde se visa apenas obstar à concretização do direito já há muito definido- restituição do arrendado ao senhorio por falta de pagamento de rendas -, entende este colectivo lançar mão do disposto no art.º670.º do CPC.

Consequentemente, nos termos do art.º 670.º n.º3 do NCPC, acorda-se em qualificar o presente incidente como manifestamente infundado, determinando-se que se extraia traslado afim de ser decidida a rectificação/reforma, devendo o processo, imediatamente após a extração do traslado, ser remetido ao tribunal de 1.ª instância.

Solicite a esse tribunal que nos informe logo que o processo aí tenha sido  contado e pagas as custas e multas, uma vez que só após esse pagamento será proferida decisão no traslado, conforme dispõe o art.º 670.º n.º4 do CPC.

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Teresa Soares

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Maria de Deus Correia

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Teresa Pardal