Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
349215/09.4YIPRT.L1-2
Relator: EZAGÜY MARTINS
Descritores: INJUNÇÃO
INTERVENÇÃO DE TERCEIROS
ASSOCIAÇÃO
CONDOMÍNIO
DESPESAS
PROPRIETÁRIO
CENTRO COMERCIAL
REGULAMENTO INTERNO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 02/17/2011
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I – Não é admissível, em acção declarativa especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos, a dedução de incidente de intervenção de terceiros. II – O grupo de pessoas constituído pelos proprietários das lojas, que se reuniu em assembleia e criou o Regulamento Interno do Centro Comercial, deve ser entendido como o substrato pessoal de uma associação de facto, não personalizada.
III – Enquanto as obrigações relativas ao pagamento dos encargos de condomínio são propter rem, não tendo mera eficácia obrigacional, já as regras de pagamento de comparticipações nas despesas comuns de centro comercial, estabelecidas no referido Regulamento Interno são de natureza meramente obrigacional.
IV – Ainda que se conceda a “equiparação” do locatário financeiro de fracção autónoma, ao proprietário, para efeitos de responsabilidade pelo pagamento de despesas comuns, no âmbito da propriedade horizontal, não é de projectar tal equiparação no domínio da relação meramente obrigacional estabelecida entre os vários proprietários de lojas integradas em Centro Comercial.
(Sumário do Relator)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na 2ª Secção (cível) deste Tribunal da Relação


I – A Administração do Centro Comercial “A” – Edifício ..., requereu procedimento de injunção contra o Banco , S.A., ..., de quem pretende haver a quantia de € 2.442, 89, a título de comparticipações para as despesas comuns do Centro, relativas à loja n.º 8 do piso – 2 daquele centro – e que corresponde à fracção autónoma “H” do prédio respectivo, de que o Requerido é proprietário – vencidas desde Julho de 2008 inclusive, até Outubro de 2009, acrescidos de € 1.954,31, a título de sanção pecuniária prevista no Regulamento Interno para o caso de mora, e bem assim, os montantes vincendos das comparticipações para as despesas comuns e a correspondente sanção pecuniária.

Notificada, deduziu a Requerida oposição, arguindo a falta de personalidade e de capacidade judiciária da Requerente.
Mais sustentando não ser responsável pelo pagamento das quantias reclamadas, já por não ter tido intervenção na celebração dos acordos que segundo a Requerente corresponderão aos Regulamentos Internos do Centro, já por nunca desde que adquiriu a fracção autónoma respectiva se ter comprometido a cumprir quaisquer obrigações, já porque no mesmo dia em que comprou a dita fracção deu-a em locação financeira à sociedade “B” , Lda., que tem utilizado a loja em causa para o exercício da sua actividade comercial.
Para além disso e quanto à exigida indemnização, trata-se de cláusula penal manifestamente excessiva.

Enviados os autos à distribuição – passando assim a seguirem-se os termos da acção declarativa especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos – e notificada a Requerente da apresentada oposição, respondeu a mesma “à matéria das excepções”.
Requerendo ainda, embora reiterando “ser a Ré parte legítima para com ela prosseguirem os presentes autos”, “à cautela”, a intervenção principal da referida locatária financeira, a sociedade “B” – , Lda.”.

Sendo, por despacho de folhas 68 e 69, indeferida a requerida intervenção principal provocada.

Àquele se seguindo a prolação de sentença que, considerando não ser o Réu – conquanto proprietário da fracção autónoma respectiva – lojista no Centro Comercial em causa, constituindo obrigação do locatário, em caso de locação financeira, o pagamento das despesas correntes necessárias à fruição das partes comuns de edifício e aos serviços de interesse comum, julgou a acção improcedente, absolvendo o Réu do pedido.

Inconformada, recorreu a A., formulando, nas suas alegações, as seguintes conclusões:
“I. Nos termos do art.º 2° alínea b) e art.º 6 alínea m) do Regulamento Interno do Centro Comercial “A” compete aos proprietários e não aos lojistas/locatários/arrendatários a obrigação de pagar as despesas e serviços comuns.
ll. O locador também tem interesse na conservação das partes e serviços comuns na pendência do contrato de locação financeira.
III. Segundo o art° 1424 n°1 do CC e nos termos do art° 1420 n° 1 do CC as despesas de condomínio são pagas pelos condóminos que são os proprietários.
IV. O art° 60, n° 1 do DL 268/94, de 25 de Outubro também se refere ao proprietário.
V. Embora no presente recurso não se trate de despesas de condomínio justifica-se tratar da mesma forma a quota-parte nas despesas para os serviços comuns a pagar à Administração do Centro Comercial “A”.
VI. A norma do art.º 10 n°1 b) do DLI49/95 não é excepcional em relação à norma do art.º 1424 n°1 do CC e art.º 60 n°1 do DL n.º 268/94 de 5 de Outubro.
VII. O que acontece é que o seu âmbito de aplicação é diferente: aplica-se nas relações internas entre locador financeiro e locatário financeiro.
VIII. Não nos parece que o legislador ao criar o art°10 n°1 b) quisesse dificultar a satisfação do crédito de despesas e serviços comuns exonerando o proprietário dessa responsabilidade.
IX. O locador tem um direito real sobre o imóvel, e o locatário apenas tem um direito de crédito ao gozo do imóvel.
X. Parece-nos, assim, que o proprietário em virtude do direito (direito) real de propriedade de que é titular é sempre responsável pelas despesas e serviços comuns.
XI. Depois terá direito de regresso (por incumprimento do contrato de locação) imposto por lei em face do art.º 10º n°1 b) do DL n.º 149/95 de 24 de Julho.
XII. Em suma, com todo o respeito, o Exmo Senhor Juiz o Tribunal a quo, na sua aliás, douta sentença, interpretou de forma incorrecta o art° 2 b) e art° 6 m) do Regulamento Interno do Centro Comercial “A” e aplicou o art.º 10 alínea b) do DL n.º 149/95 a um caso que não devia.
XIII. Assim, e caso se entenda julgar não ser admissível a intervenção principal provocada formulada pela A., ora recorrente, deve revogar-se a sentença recorrida e substituí-Ia por outra que condene a R. no pagamento das despesas e serviços comuns peticionados.”.

Contra-alegou a Ré, pugnando pela manutenção do julgado.

II - Corridos os determinados vistos, cumpre decidir.
Face às conclusões de recurso, que como é sabido, e no seu reporte à fundamentação da decisão recorrida, definem o objecto daquele – vd. art.ºs 684º, n.º 3, 660º, n.º 2 e 713º, n.º 2, do Cód. Proc. Civil – são questões propostas à resolução deste Tribunal:
- se é admissível a intervenção de terceiros em acção declarativa especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos.
- na negativa, se a Ré é responsável pelo pagamento das importâncias reclamadas pela A..
***
Considerou-se assente, na 1ª instância, a factualidade seguinte:
1- Por deliberação dos proprietários/lojistas do empreendimento denominado por Centro Comercial “A”, sito na Rua ..., ..., implantado em parte dos edifícios com os n.os ... e ..., da freguesia de ... , concelho de ... , em reunião havida no dia 23.07.1994, foi revisto o respectivo Regulamento interno criado em 1984, e aprovado por unanimidade o novo Regulamento Interno do CENTRO COMERCIAL “A”, entrado em vigor nessa mesma data;
2- Tal Regulamento destina-se a disciplinar as actividades comerciais e as relações entre as pessoas, descrevendo as 126 fracções autónomas integrantes do Centro Comercial (101 do edifício n.º 14 e 25 do edifício n.º 15), localizadas nos pisos menos dois, menos um e zero, às quais foram atribuídas permilagens distintas das permilagens inscritas na escritura de propriedade horizontal, com o objectivo de encontrar o valor ou quota parte a pagar por cada proprietário para as despesas comuns e específicas do Centro Comercial;
3- A permilagem da fracção autónoma "H" foi estabelecida em 40,870/00 para efeitos de determinação do valor da comparticipação nas despesas comuns do Centro Comercial “A”;
4- Por escritura pública de compra e venda, outorgada no Cartório Notarial de ... , no dia 20 de Junho de 2008, a Ré declarou aceitar a venda da "Fracção autónoma, designada pela letra “H”, destinada a comércio, correspondente à LOJA N.º 8, do piso menos dois, do prédio urbano em regime de propriedade horizontal, sito na ... , ..., Rua ... , Lote... , Unidade 3-A - ... , Praça ...  n.º s 1, 1A, 1B, 1C, 1E, 2, 2A, 2B 2C, 2D, 2E, 2F, 2G, 2H, 2I, 2J, 3, 3A, 3B, 3C, 3E, 3D, com acesso pelo vão de porta para a Av. ..., n.ºs 3, 3A e 3B, freguesia de ... , concelho de ... ";
5- E, através dessa mesma escritura, deu de imediato a referida fracção "em locação financeira, à sociedade "“B” , Lda.””.
6- A loja n.º 8 está integrada no referido CENTRO COMERCIAL “A”, deste fazendo, desde sempre, parte integrante;
7- Para além dos encargos inerentes à propriedade horizontal do prédio em que se integra a loja n.º 8, prevê o Regulamento Interno do Centro Comercial que é obrigação do proprietário "satisfazer pontualmente à Administração a sua quota parte ou comparticipação mensal, para os encargos comuns do CENTRO COMERCIAL, previsto no Orçamento aprovado anualmente, por deliberação da Assembleia Geral";
8- Mais prevendo que ainda que "tal encargo...tenha sido transferido para terceiros, todavia perante a Administração, o único responsável pelo pagamento é o proprietário";
9- Devendo fazê-lo até ao dia 8 do mês a que respeitar a comparticipação nas instalações da Administração do Centro Comercial;
10- Sob pena de se constituir imediatamente em mora, independentemente de qualquer interpelação, determinando uma sanção pecuniária a partir desse dia de 50% sobre o valor em dívida;
11- E ainda, caso a Administração tenha de fazer a cobrança coerciva da dívida, pela via judicial "de todas as despesas extra-judiciais e honorários do advogado";

12- Mais se prevê ainda nesse Regulamento Interno que "Todos os proprietários das lojas do Centro Comercial “A” farão constar aos adquirentes que ficarão obrigados ao inteiro cumprimento do Regulamento interno e suas alterações...entregando-lhes um exemplar...sendo da responsabilidade dos intervenientes, todas as perdas danos, indemnizações e demais consequências que advierem de eventual omissão do supradito";
13- Em reunião havida em 1 de Março de 2005, foi deliberado, por unanimidade, reduzir o valor da comparticipação para as despesas comuns do Centro Comercial, nomeadamente, da loja n.° 8 em 40%;
14- De acordo com a Acta n.º 38, respeitante à reunião de proprietários/lojistas do CENTRO COMERCIAL, o orçamento de despesas para o ano de 2008, foi de €119.544,54.
15- A prestação mensal a pagar por essa fracção relativa a 2008 é por isso de €244,289 mensais (119.544,54 X 40,87 : 1000 : 12 - 40%);
16- De acordo com a Acta n.º 39, respeitante à reunião de proprietários/lojistas o orçamento de despesas para o ano de 2009 foi de €122.219,40;
17- Tendo-se deliberado nessa reunião não proceder a qualquer actualização das contribuições para esse ano, mantendo-se o valor da prestação mensal a pagar pela fracção "H" em €244,289 mensais para o ano de 2009.”.

Tal matéria não foi objecto de impugnação, nada impondo diversamente.
Com a excepção única relativa ao ponto n.º 5, e posto que diversamente do ali consignado, através da mesma escritura de compra e venda não foi, dada de imediato a referida fracção, em “locação financeira, à sociedade "“B” , Lda.””.
Como da escritura respectiva se alcança – e estranho seria que assim não fosse – ali apenas se consignou ter sido declarado pelo segundo outorgante – representante do Requerido – que “aceita a venda…e que o referido prédio vai ser dado em locação financeira, à sociedade ““B” , LDA.””.

O documento titulador da anunciada subsequente locação é o escrito particular de folhas 30 a 35.

Devendo pois aquele n.º 5 da matéria de facto passar a ter a redacção seguinte:
5 – E, através de escrito particular da mesma data – “contrato de locação financeira imobiliário n.º ...” – deu de imediato a referida fracção "em locação financeira” à sociedade "“B” , Lda.”.
***
II – 1 – Da requerida intervenção principal provocada.
O art.º 1º do Dec.-Lei n.º 269/98 de 01 de Setembro – na redacção introduzida pelo Dec.-Lei n.º 302/2007, de 24 de Agosto – aprovou o regime dos procedimentos destinados a exigir o cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos de valor não superior a € 15.000.
Tal regime, anexo ao sobredito Dec.-Lei n.º 269/98, consagra dois tipos de procedimentos, a saber, a acção declarativa especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos, e a injunção, cfr. art.ºs 1º a 5º e 7º a 21º, respectivamente
O procedimento de injunção terminará com a aposição da fórmula executória “Se, depois de notificado, o requerido não deduzir oposição”, cfr. art.º 14º do mesmo “regime”.
Já se for “Deduzida oposição ou frustrada a notificação do requerido, no caso em que o requerente tenha indicado que pretende que o processo seja apresentado à distribuição…”, seguir-se-ão, após esta, os termos da acção declarativa especial, vd. art.ºs 16º e 17º, n.º 1, do mesmo regime, na redacção introduzida pelo Dec.-Lei n.º 107/2005, de 1 de Julho, e remissão feita no n.º 1 daquele último para o “n.º 4 do artigo 1º e nos artigos 3º e 4º”.
Porém, tinha entretanto o Dec.-Lei nº 32/03 de 17 de Fevereiro – diploma que transpondo para a ordem jurídica interna parte das disposições da Directiva nº 2000/35/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de Junho, procedera à alteração dos art.ºs 7º, 10.º, 12.º, 12.º-A e 19.º, do regime de injunção, alargando o âmbito da sua aplicação à exigência de cumprimento de “obrigações emergentes de transacções comerciais, independentemente do valor da dívida” – introduzido uma dicotomia em matéria de processamento subsequente à distribuição.
Assim, de acordo com o art.º 7º daquele Dec.-Lei:
«1 - ….
2 - Para valores superiores à alçada da Relação, a dedução de oposição e a frustração da notificação no procedimento de injunção determinam a remessa dos autos para o tribunal competente, aplicando-se a forma de processo comum.
3 - ….
4 - As acções destinadas a exigir o cumprimento das obrigações pecuniárias emergentes de transacções comerciais, nos termos previstos no presente diploma, de valor não superior à alçada da Relação seguem os termos da acção declarativa especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos.».

Considerando-se, “Para efeitos do presente diploma”, no art.º 3º do mesmo:
“a) «Transacção comercial» qualquer transacção entre empresas ou entre empresas e entidades públicas, qualquer que seja a respectiva natureza, forma ou designação, que dê origem ao fornecimento de mercadorias ou à prestação de serviços contra uma remuneração;
b) «Empresa» qualquer organização que desenvolva uma actividade económica ou profissional autónoma, mesmo que exercida por pessoa singular;
c) (…).”.

Deste modo, atento o valor da alçada da Relação e da 1ª instância – à data da entrada do requerimento de injunção – de € 30.000 e € 5.000,00, respectivamente – e que nos presentes autos, a Requerente reclama o pagamento de uma dívida no montante de € 5.863,00, relativa à comparticipação nas despesas comuns de Centro Comercial, havendo oposição da requerida, como foi o caso, devem os autos seguir os termos da acção declarativa especial…
…Com a notificação da contestação em simultâneo com a notificação da data da audiência de julgamento, podendo o juiz, desde logo, julgar procedente alguma excepção dilatória ou nulidade que lhe cumpra conhecer ou decidir do mérito da causa, cfr. art.ºs 1º, n.º 4 e 3º, n.º 1, do Regime dos Procedimentos.
Tendo-se assim que nesta acção declarativa especial não são admitidos mais do que dois articulados (petição inicial e contestação).
Por outro lado, as provas são oferecidas na audiência final, não sendo motivo de adiamento a falta, ainda que justificada, de qualquer das partes (e, nas acções de valor não superior à alçada do tribunal de 1ª instância, também a dos seus mandatários”.
Não podendo, nas de valor superior à alçada do tribunal de 1ª instância, haver segundo adiamento, cfr. art.ºs 3º, n.º 4, e 4º, n.ºs 2 e 3, do mesmo Regime…

Ora estabelecendo o confronto dessa tramitação com a dos incidentes de intervenção de terceiros – estabelecida nos art.ºs 320º e seguintes do Código de Processo Civil – forçoso se torna concluir que este tipo de processo não comporta a dedução de tais incidentes.
Os quais – e cingindo-nos agora à intervenção principal provocada – contemplam a prévia audição da parte contrária…e, admitida que seja a intervenção, a citação do interessado…que pode oferecer o seu articulado ou declarar que faz seus os articulados do autor ou do réu, dentro do prazo facultado para a contestação…

A não ser assim, teríamos a absoluta subversão da natureza e finalidade do procedimento.

Nem colhendo a pretensão de ultrapassar tal objecção por via do apelo aos princípios da adequação formal e, ou, da economia processual.
Pois como se decidiu no Acórdão da Relação de Coimbra, de 18/05/2004,[1] conquanto a propósito da inadmissibilidade da dedução de reconvenção em acção especial para cumprimento de obrigações pecuniárias, “De outro modo, frustravam-se a desburocratização, simplicidade, singeleza e celeridade que estão associadas a este tipo de procedimentos, pensados tendo em vista o descongestionamento dos tribunais no que concerne à efectivação de pretensões pecuniárias de reduzido montante”.
No mesmo sentido, e embora ainda quanto à dita questão da inadmissibilidade da reconvenção, neste processo especial, se pronunciando Salvador da Costa.[2]
Tendo esta Relação decidido já, em Acórdão de 27-10-2009,[3] pela inadmissibilidade do incidente de intervenção de terceiros nesta espécie de acção.  
Em suma, a simplicidade da tramitação desta forma de processo especial, o seu carácter expedito, comportando apenas dois articulados, com notificação da oposição apenas aquando da notificação do despacho designativo da data para julgamento, opõem-se à admissibilidade do incidente de intervenção de terceiros.

Improcedendo pois, e nesta parte, as conclusões da Recorrente.

II – 2 – Da responsabilidade da Ré pelo pagamento das importâncias reclamadas pela A.

1. Sobre situação afim daquela que nos presentes autos se mostra hipoteseada – tratava-se de acção intentada pela mesma "Administração do Centro Comercial “A””, edifícios ... e ..., contra sociedade anónima locatária de uma loja, no mesmo edifico …, em regime de propriedade horizontal, tendo a locadora transferido para a locatária a responsabilidade dos seus encargos do condomínio ou outras despesas relativas à loja locada, pedindo que a locatária fosse condenada a pagar-lhe uma quantia referente a comparticipações (para as despesas comuns necessárias à conservação e fruição das partes comuns, aprovadas em assembleia geral de proprietários das lojas do Centro comercial) vencidas, bem como as comparticipações vincendas, e ainda a sanção pecuniária compulsória de 50% sobre a dívida que se verificasse aquando do integral pagamento – pronunciou-se já o Supremo Tribunal de Justiça em Acórdão de 09-03-2004.[4]

2. Ora, e assim acompanhando de perto a fundamentação daquele aresto, dir-se-á:
O ordenamento jurídico nacional não contempla um regime jurídico sistematizado tendo por objecto os denominados Centros Comerciais.
Não sendo mesmo possível, a partir das escassas referências legais, encontrar um conceito definidor dessa realidade jurídica comercial essencialmente caracterizada pela afectação de um espaço físico, com uma área e número de lojas mínimos, a ramos de comércio e prestação de serviços diversificados, com serviços comuns às lojas nele instaladas e submetido a uma gestão unitária.

Mas, pelo que aqui está em causa, releva – mais do que definir o conceito e regime jurídico do Centro Comercial – a circunstância de aquele ser criado por um acto jurídico como um ente comercial, gozando de um estatuto que assenta necessariamente na autonomia privada, tratando-se sempre de um regime meramente obrigacional.
É se é certo que a autonomia privada também pode intervir no acto jurídico constitutivo da propriedade horizontal, moldando-lhe o estatuto e interferindo na fixação do conteúdo do direito real, ponto também é que tal ocorre por via dos efeitos do registo da escritura respectiva, tornando aquele vinculativo para os titulares do direito real (condóminos), nele se incorporando.

Um centro comercial instalado num edifício constituído em propriedade horizontal não passa, por isso, a constituir um condomínio.
Aquele constitui uma realidade de natureza económica e comercial não submetida a qualquer regulamentação imperativa ou oponível a terceiros; o edifício, objecto de propriedade horizontal, vive sujeito a um estatuto real, consubstanciado em imperativas regras do condomínio.
Vigora para este o estatuto de natureza real a que são inerentes as regras da legalidade de reconhecimento e sujeição ao princípio da taxatividade, ou seja, a proibição de figuras de natureza real não tipificadas ou previstas pelo legislador, com o conteúdo também por ele balizado.

O Regulamento Interno do Centro Comercial “A” de Julho de 1994, em vigor, tem uma origem interna - resulta de deliberação da assembleia dos proprietários lojistas.
Como tal, não provém de declarações de vontade e vinculação dos condóminos do edifício, ou dos edifícios, em estabelecimento de regras disciplinadoras sobre o uso de coisas comuns e repartição de despesas segundo os direitos e obrigações respeitantes a cada condómino, mas provém, tão só, de proprietários de fracções de uma parte do edifício, de cada edifício, na sua qualidade de proprietários de fracções autónomas destinadas a lojas (“proprietários/lojistas”).
Um tal ordenamento, assim destinado a disciplinar a actividade dos lojistas, fora e para além do que corresponde ao uso das coisas comuns do edifício – direitos incindíveis e compropriedade indivisível, cfr. art.º 1420.º do Código Civil – não é, não pode ser equiparado a um regulamento de condomínio a que a lei atribui força vinculativa, enquanto conjunto de direitos e obrigações ligadas ao estatuto do direito real - a propriedade singular e a compropriedade que integram o condomínio.

A existência do Regulamento do condomínio é obrigatória e dele, enquanto condóminos, devem participar os donos das fracções destinadas a comércio e integradas no Centro Comercial, mas a disciplina, regulamentação e gestão dos serviços e interesses comuns dos lojistas, proprietários ou não das fracções-lojas é coisa diferente que não tem de se situar no âmbito das relações condominiais, nomeadamente quando a totalidade do edifício não está afecta à instalação do Centro Comercial.

Sendo pois de reiterar a natureza meramente obrigacional do estatuto do Centro Comercial “A”, corporizado no seu Regulamento Interno, como realidade jurídica distinta do estatuto do condomínio dos edifícios em que está instalado e seu regulamento.

Tendo-se deste modo que os titulares das fracções destinadas ao Centro Comercial detêm uma sobreposição de duas qualidades: - enquanto donos das fracções autónomas, estão sujeitos ao regime da propriedade horizontal e à disciplina estabelecida no Regulamento do condomínio e na lei quanto à sua participação no uso, fruição e conservação das partes comuns e inerentes despesas, nos termos previstos nos art.ºs 1429º-A e 1424º Código Civil - enquanto lojistas, poderão estar sujeitos a um outro regulamento, como o Regulamento Interno, que foi elaborado para regular as relações dos lojistas entre si.

3. Quanto ao grupo de pessoas constituído pelos proprietários das lojas, que se reuniu em assembleia e criou o Regulamento Interno do Centro Comercial, deve ser entendido como o substrato pessoal de uma associação, encontrando-se presentes, e agora à semelhança do que sucede com o condomínio, os demais elementos caracterizadores da figura, designadamente a prossecução de uma actividade destinada a satisfazer um interesse colectivo, de forma organizada e mediante a afectação de certos bens e fundos (elementos pessoal, teleológico e organizatório).
Confrontando-nos assim com uma associação de facto, não personalizada, já que não foram respeitados os necessários requisitos de forma, vd. art.ºs 167º, n.º 1 e 168º, n.ºs 1 e 3, do Código Civil.
Os direitos e obrigações dos proprietários/lojistas, enquanto associados devem, assim, reger-se pelo estatutos, aqui o Regulamento Interno, pelas disposições que regem as associações sem personalidade jurídica e, subsidiariamente, pelas normas relativas às associações, que não pressuponham a personalidade, vd. art.ºs 195º, n.º 1, e 167º a 184º, do Código Civil.
Perante um tal enquadramento – aliás não divergente do que corresponde ao condomínio, não fora a intervenção da natureza real deste e a incompatibilidade daí decorrente com o regime jurídico das associações – “não pode deixar de aceitar-se a regra da livre exoneração ou desvinculação da organização dos associados a todo o tempo, sem prejuízo da sua responsabilidade por todas as prestações relativas ao tempo em que foi membro da associação”, cfr. art.º 46.º, n.º 3 da Constituição da República Portuguesa e art.º 181º,  ex vi do art. 195 º, n.º 3, ambos do Código Civil.

4. De acordo com o disposto no art.º 1424º, n.º 1, do Código Civil, “Salvo disposição em contrário, as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício e ao pagamento de serviços de interesse comum são pagas pelos condóminos em proporção do valor das suas fracções.”.

Note-se que transcrito normativo não visa indicar quem responde pelas despesas do condomínio, que, como já resulta da natureza e finalidade de tais despesas – as necessárias à conservação e fruição das partes comuns – devem, naturalmente, ficar a cargo dos condóminos, enquanto proprietários das fracções pertencentes a cada um e comproprietários das partes comuns do edifício, cfr. art. 1420º, n.º 1.
O que aquele tem em vista é antes definir a medida em que cada um dos condóminos responde: salvo disposição em contrário, cada condómino responde em proporção ao valor da sua fracção.

 E, como assinala Henrique Mesquita,[5] “A obrigação de contribuir para estas despesas é uma típica obrigação propter rem – uma obrigação decorrente não de uma relação creditória autónoma, mas antes do próprio estatuto do condomínio.”.
Sendo que “Mesmo quando as obrigações que impendem sobre os condóminos resultem do título constitutivo (e não directamente da lei), a sua força vinculativa decorre da eficácia real do estatuto do condomínio e não de um acto de aceitação por parte daqueles”.[6]

  Por outro lado, nos termos do art.º 10º, n.º 1, alínea b), do Dec.-Lei n.º 149/95, de 24 de Junho – na redacção introduzida pelo Dec.-Lei n.º 265&97, de 2 de Outubro – é obrigação do locatário – entre outras – “Pagar, em caso de locação de fracção autónoma, as despesas correntes necessárias à fruição das partes comuns do edifício e aos serviços de interesse comum;”.

Tendo o Supremo Tribunal de Justiça decidido já, em Acórdão de 10.7.2008,[7] que “Por via do regime-regra consagrado no artigo 1424º do Código Civil é ao locatário financeiro que compete o pagamento da quota-parte devida pela fracção que ocupa, em homenagem ao preceituado no artigo 10º, nº 1, alínea b) do Decreto-Lei nº 149/95, de 24 de Junho, na redacção dada pelo Decreto-Lei nº 265/97, de 2 de Outubro”.
E, no Acórdão de 6.11.2008,[8] que “Estando uma fracção autónoma dada em locação financeira, é do locatário financeiro que o condomínio deve exigir o pagamento dos “encargos condominiais” respectivos: o estatuto do locatário financeiro é, em tudo, idêntico ao de qualquer condómino, sendo sobre ele, e não sobre o locador, que impende a responsabilidade por esse pagamento”.
“Também aqui se deve entender que estamos perante regras especiais, que, sem contrariarem substancialmente o regime geral acima mencionado, o adaptam a uma situação particular, cuja especificidade reclama um tratamento jurídico também especial.
Regras, pois, que não têm mera eficácia obrigacional, em termos de relevarem apenas nas relações locador-locatário, antes sendo de aplicação universal, e por isso se impondo a terceiros e, consequentemente, também ao condomínio.”.
Referindo-se Calvão da Silva,[9] à “transferência legal para o locatário dos riscos e responsabilidades conexos ao gozo e disponibilidade material da coisa que passa a ter após a entrega, incluindo a sua manutenção e conservação”.

Acolhendo-se assim a tese da oponibilidade a terceiros relativamente ao contrato de locação financeira, de uma vertente do estatuto debitório resultante desse contrato para o locatário financeiro.

O que, a considerar, com Menezes Cordeiro,[10] que “Tomando-a, na sua globalidade, a locação financeira é um contrato oneroso, sinalagmático bivinculante, temporário mas originando relações duradouras e de feição financeira", poderá suscitar algumas dificuldades.

5. Como quer que seja, trata-se, a do art.º 10º, alínea b), do Dec.-Lei n.º 149/95, de 24 de Junho, de disposição relativa à responsabilidade do locatário financeiro de fracção autónoma, pelo pagamento de encargos condominiais.
E que, oponível ao condomínio, estranha já aos membros de associação de facto que aprovou o Regulamento Interno de um Centro Comercial.
Tão pouco sendo aplicável, seja em via de interpretação extensiva, seja em via de analogia, a tal obrigação de pagamento de comparticipações para as despesas comuns do centro comercial.
Pois conforme se assinalou supra, a obrigação de pagamento das despesas de condomínio é uma típica obrigação propter rem.
A qual se estende ao locatário financeiro de fracção autónoma na consideração de o seu estatuto ser “em tudo, idêntico ao de qualquer condómino”.[11]
Enquanto que o estatuto do Centro Comercial “A”, corporizado no seu Regulamento Interno – de que emerge a obrigação de pagamento de comparticipação nas despesas comuns daquele – tem natureza meramente obrigacional.

Note-se de resto que o legislador, e nesta particular matéria, tem sido controladamente progressivo.
Assim, no domínio do Dec.-Lei n.º 171/79, de 6 de Junho a locação financeira apenas podia ter por objecto “imóveis afectados ou a afectar ao investimento produtivo na indústria, na agricultura, no comércio ou em outros sectores de serviços de manifesto interesse económico ou social.”.
Nada estabelecendo a lei em matéria de responsabilidade pelos encargos de condomínio.
O Decreto-Lei n.º 10/91, de 09 de Janeiro, e como dá nota Rui Pinto Duarte, ”alargou o âmbito possível do leasing imobiliário, permitindo passou a vigorar no nosso sistema jurídico um regime que permitiu a locação financeira de imóveis destinados a habitação própria do locatário.”.
Finalmente, em 1997, ciente da realidade, entendeu por bem, dissipar dúvidas e estabelecer “um regime uniforme para o contrato de locação financeira, independentemente do respectivo objecto” (preâmbulo do Decreto-Lei nº 265/97, de 02 de Outubro).

Sem que em diploma algum haja tido a pretensão, até ao momento, de projectar a “equiparação” do locatário financeiro ao proprietário, para efeitos de responsabilidade pelo pagamento de despesas comuns, para lá do âmbito da propriedade horizontal.

Em suma, nem as obrigações do lojista de centro comercial, definidas no Regulamento Interno do mesmo, aprovado por deliberação da associação de proprietários lojistas, estão compreendidas no espírito do art.º 10º, n.º 1, alínea b) do Dec.-Lei n.º 265/97, de 02 de Outubro, nem em qualquer caso existe lacuna a integrar.

Procedendo pois aqui as conclusões da Recorrente.

6. Questão outra sendo porém a de saber se, não podendo a locatária, ao contrário do entendido na sentença recorrida, ser responsabilizada, no confronto da A. pelo pagamento das quantias reclamadas, já o poderá ser a Ré.

Desde logo, não colhe, salvo o devido respeito, o entendimento expresso na sentença recorrida no sentido de que: ”o Réu, muito embora seja proprietário da fracção autónoma designada pela letra “H”, não é lojista no Centro Comercial “A”, uma vez que essa loja é explorada por uma outra sociedade, a quem a Ré a deu em locação financeira.”.
E “Assim é evidente que resultando a obrigação de pagamento das comparticipações para as despesas comuns do Centro Comercial do facto de ser lojista, não está a Ré obrigada a pagá-las.”.

Com efeito, começa porque a expressão “proprietários/lojistas” tem, no contexto do requerimento inicial como do dito Regulamento, o significado de proprietários de lojas integrantes do Centro Comercial.
Assim sendo que logo no ponto n.º 4 daquele – a que corresponde o n.º 6 da matéria de facto assente – se alega: “A loja n.º 8, propriedade da sociedade requerida está afecta e integrada na realidade de natureza económica e comercial que é o referido Centro Comercial “A””.
E, no ponto n.º 5 – a que corresponde o n.º 7 da matéria de facto… –  “Para além dos encargos inerentes à propriedade horizontal do prédio em que se integra a loja n.º 8 (e não a fracção correspondente…).
Mais se consignando, naquele mesmo local prever o Regulamento Interno do Centro Comercial ser “obrigação da requerida (proprietária) satisfazer pontualmente à Administração a sua quota parte ou comparticipação mensal, para os encargos comuns do CENTRO COMERCIAL, previsto no Orçamento aprovado anualmente, por deliberação da Assembleia Geral", vd. citado ponto 5  e n.º 7 da matéria de facto assente.

Para além disto – ponto este, quando ainda necessário, decisivo – mais prevendo o dito Regulamento que mesmo quando "tal encargo...tenha sido transferido para terceiros, todavia perante a Administração, o único responsável pelo pagamento é o proprietário", vd. n.º 6 do requerimento inicial e n.º 8 da matéria de facto assente.

7. Porém:
Sendo certo que a aquisição pela Ré da fracção autónoma a que corresponde a loja n.º 8 do edifício 14, teve lugar em momento ulterior seja ao da aprovação inicial do novo Regulamento Interno, seja ao da deliberação que procedeu ao aditamento do art.º 6º, alínea N) daquele, em 1 de Março de 2005 – facto é não vir alegada no requerimento de injunção factualidade de que resulte a vinculação da Ré ao dito Regulamento.
Com efeito o que apenas ali se refere é que “A requerida não desconhece que tem a obrigação de contribuir para as despesas comuns do Centro Comercial, pois, de acordo com o estabelecido na al. N.º) do Art.º 6º do referido Regulamento (…) Todos os proprietários das lojas do Centro Comercial “A” farão constar aos adquirentes que ficarão obrigados ao inteiro cumprimento do Regulamento interno e suas alterações…entregando-lhes um exemplar…sendo da responsabilidade dos intervenientes, todas as perdas danos, indemnizações e demais consequências que advierem de eventual omissão do supradito”.

Ou seja, não vem alegado que a Requerida/Ré, haja aderido ao dito Regulamento, ainda que de forma meramente tácita.
Apenas se concluindo – de facto e de direito – que por nos termos do referido Regulamento todos os proprietários das lojas do Centro Comercial “A” deverem fazer “constar aos adquirentes que ficarão obrigados ao inteiro cumprimento do Regulamento interno e suas alterações…entregando-lhes um exemplar”…a Requerida/Ré…ficou ciente de tal…obrigação…
Sequer se afirmando que o anterior proprietário da fracção autónoma correspondente à loja n.º 8 procedeu efectivamente a tal comunicação…e que a Requerida manifestou o seu acordo a propósito, ou, por qualquer forma, se comprometeu ulteriormente ao pagamento das comparticipações em causa.
Inexistindo confissão da Ré quanto ao assumir de uma tal obrigação, antes tendo alegado a mesma, na sua oposição, que “não interveio na celebração dos acordos que, segundo a requerente, correspondem aos Regulamentos internos aprovados em 1994, nem se vinculou ao cumprimento de quaisquer obrigações decorrentes de tais «regulamentos»”.
E “Por outro lado, em nenhum momento, desde que adquiriu a mencionada fracção autónoma, o requerido se comprometeu a cumprir quaisquer obrigações, designadamente pecuniárias”.
Nenhum compromisso tendo assumido, “relativo ao alegado «Regulamento Interno», que, de resto, o requerido não conhecia nem conhece”, na escritura de compra e venda da fracção.

Fracção que, recorda-se, foi dada pela Ré em locação financeira à Sociedade “B”, Lda., no mesmo dia em que a Ré a comprou a “C” e “D”.
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Assim, e presente ainda o que se considerou supra quanto à natureza jurídica do grupo de pessoas constituído pelos proprietários das lojas, que se reuniu em assembleia e criou o Regulamento Interno do Centro Comercial, não é possível responsabilizar o Requerido, enquanto proprietário, pelo pagamento das ditas “comparticipações”.
Também nada havendo sido substanciado, ou resultando dos autos, que permita recorrer ao subsidiário instituto do enriquecimento sem causa.

Improcedendo assim, por igual nesta parte, as conclusões da Recorrente.


III – Nestes termos, acordam em, alterando embora a matéria de facto, no tocante ao ponto n.º 5, nos termos que se deixaram expostos, julgar a apelação improcedente, confirmando, ainda que com diversa fundamentação, a sentença recorrida.

Custas pela Recorrente.

Taxa de justiça nos termos da tabela I-B, anexa ao Regulamento das Custas Processuais.

Em observância do disposto no n.º 7 do art.º 713º, do Código de Processo Civil, passa a elaborar-se sumário, como segue:
I – Não é admissível, em acção declarativa especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos, a dedução de incidente de intervenção de terceiros. II – O grupo de pessoas constituído pelos proprietários das lojas, que se reuniu em assembleia e criou o Regulamento Interno do Centro Comercial, deve ser entendido como o substrato pessoal de uma associação de facto, não personalizada. III – Enquanto as obrigações relativas ao pagamento dos encargos de condomínio são propter rem, não tendo mera eficácia obrigacional, já as regras de pagamento de comparticipações nas despesas comuns de centro comercial, estabelecidas no referido Regulamento Interno são de natureza meramente obrigacional. IV – Ainda que se conceda a “equiparação” do locatário financeiro de fracção autónoma, ao proprietário, para efeitos de responsabilidade pelo pagamento de despesas comuns, no âmbito da propriedade horizontal, não é de projectar tal equiparação no domínio da relação meramente obrigacional estabelecida entre os vários proprietários de lojas integradas em Centro Comercial.

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Lisboa, 17 de Fevereiro de 2011 

Ezagüy Martins
Maria José Mouro
Maria Teresa Albuquerque
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[1] Proc. 971/04, in www.dgsi.pt/jtrc.nsf.
[2] In “A Injunção e as Conexas Acção e Execução”, 5.ª edição, 2005, Almedina, págs. 78-80.
[3] Proc. 2659/08.1YXLSB.L1-1, in www.dgsi.pt/jtrl.nsf.
[4] Proc. 03A4204, in www.dgsi.pt/jstj.nsf.
[5] In “A Propriedade Horizontal no Código Civil Português”, RDES, XXIII, 130.
[6] Idem, Nota 119.
[7] Proc. 08A1057, in www.dgsi.pt.          
[8] Proc. 08B2623, in www.dgsi.pt/jstj.nsf. No mesmo sentido podendo ver-se o Acórdão daquele Tribunal, de 02-03-2010, proc. 5662/07.5YYPRT-A.S1, in www.dgsi.pt/jstj.nsf.  
[9] In “Direito bancário”, Almedina, 2001, pág. 425.
[10] In “Manual de Direito Bancário”, 2ª ed., 2001, Almedina, pág. 601.
[11] Cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 6.11.2008, citado supra.