Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
9799/09.8YYLSB-A.L1-6
Relator: ANTONIO SANTOS
Descritores: OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO
TÍTULO EXECUTIVO
DOCUMENTO PARTICULAR
CONFISSÃO DE DÍVIDA
PROVA PLENA
IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
PROVA TESTEMUNHAL
ADMISSIBILIDADE
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 01/24/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÕES
Decisão: IMPROCEDENTES
Sumário: I - Em face do disposto no nº 2, do artº 393º, e  nº 1, do artº 394º, ambos do CC, inequívoco é que não pode de todo uma parte, e em sede de impugnação de decisão de facto proferida pelo tribunal a quo, servir-se de prova testemunhal  [ e também por presunção judicial, nos ternos do disposto no artº 351º, do CC ] para infirmar o âmago da força probatória plena que cobre concreta factualidade reconhecida/confessada em  documento particular [ sendo porém já admissível para prova dos vícios da vontade ( erro, dolo, coacção ) ou da divergência entre a vontade e a declaração ( falta de vontade, erro na declaração, etc. )].
II -  Perante o referido em I., e não invocando o impugnante qualquer outro meio de prova a ancorar o alegado erro do julgador em sede de julgamento de facto, inevitável é a improcedência da aludida impugnação, a qual de resto e à partida não merece sequer ser conhecida/apreciada por conduzir à violação de regras vinculativas extraídas do direito probatório.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os Juízes na 6ª Secção CÍVEL Do Tribunal da Relação de LISBOA
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1.- Relatório                         
Na sequência da instauração de acção executiva movida ( em Maio de 2009 ) por A, contra B  e  C ,e com vista à cobrança coerciva da quantia de €67.959,26 [ sendo €53.621,00, referente a capital, e €13.537,26 referente a juros calculados à taxa de 4%, desde 5/3/2003 ] com fundamento em documento particular de 4/2/203 e denominado de “Declaração “, vieram ambos os executados deduzir oposição à execução, pugnando pela respectiva desobrigação de efectuar o pagamento da quantia exequenda reclamada e respectivos juros.
1.1 – Para tanto, alegou cada um dos executados, em síntese, que :
I) O executado B
- O documento que foi oferecido como título executivo foi entregue pelo exequente ao executado aquando da celebração de um contrato promessa de cessão de quotas a que o referido documento faz referência, sendo uma decorrência do referido contrato promessa, ou seja, caso se cumprissem os termos do aludido contrato promessa de cessão de quotas, então, exequente e executados receberiam cada um uma parte do valor nele acordado;
- Ocorre que, a cessão de quotas não chegou a concretizar-se, não tendo qualquer dos outorgantes do contrato promessa recebido quaisquer valores, logo, nada tem a exequente a exigir , pois que os valores que reclama apenas lhe seriam devidos a título de percentagem pela cessão de quotas objecto do contrato promessa;
- Ou seja, estando a declaração que consubstancia o título executivo dependente da existência e validade do contrato promessa de cessão de quotas, certo é que este último acabou por ficar sem efeito, por resolução dos promitentes adquirentes, logo e como titulo executivo é a referida declaração inexequível , não podendo alicerçar a execução pelo exequente proposta;
- De resto, o pretenso crédito do exequente mencionado na referida declaração é emergente de uma relação laboral que cessou a 4/2/2003, logo a existir, está já o mesmo prescrito, nos termos do artº317º,alínea c), do CC;
- Acresce que, também  o crédito reclamado não é exigível,  porque dependente de uma prestação de terceiro, não tendo sequer o exequente demonstrado o cumprimento dessa prestação por parte de terceiro;
- Em suma, devendo a execução ser declarada extinta, forçosa é ainda a condenação do exequente como litigante de má fé, por deduzir pretensão cuja falta de fundamento não devia ignorar , justificando-se a sua condenação no pagamento de multa e de indemnização a favor do executado e em quantia não inferior a €850 pelos custos suportados com a acção.
II) O executado C
- não deve a quantia peticionada, uma vez que a declaração que assinou em 4/2/2003 justifica-se em face da celebração na mesma data e pelos executados de um contrato promessa de cessão de quotas [ no qual prometiam ceder a totalidade das quotas por si detidas na sociedade "Café …., Lda", com todo o seu passivo e activo pelo preço de €231,941,00 ] , altura em que o exequente se aproveitou de uma situação de fraqueza e fragilidade psicológica dos executados;
- Ou seja, o executado apenas assinou a referida declaração no pressuposto de se concretizar a outorga do contrato definitivo da cessão da totalidade das suas quotas na sociedade, cabendo então ao exequente uma parte proporcional do valor da venda,  negócio que todavia nunca chegou a realizar-se em razão de incumprimento dos promitentes cessionários, tendo os executados acabado por resolver o contrato promessa de cessão de quotas;
Em suma, devendo a execução ser declarada extinta, forçosa é ainda a condenação do exequente como litigante de má fé, por deduzir pretensão cuja falta de fundamento não devia ignorar.
1.2. - Notificado o exequente dos embargos à execução deduzidos pelos executados, veio o mesmo apresentar articulado/contestação, no essencial deduzindo oposição por impugnação motivada, e impetrando a condenação dos oponentes como litigantes de má fé, pugnando em suma pela total improcedência das oposições e o consequente prosseguimento da execução.
1.3. - Proferido despacho saneador, tabelar, e fixados os factos assentes e controvertidos, veio oportunamente a realizar-se a audiência de discussão e julgamento [ no âmbito da qual, uma vez concluída, proferiu-se decisão sobre a matéria de facto provada e não provada ]  , e conclusos os autos para o efeito , foi então proferida a competente sentença, sendo o respectivo excerto decisório do seguinte teor :
VII. DECISÃO
Nestes termos e com estes fundamentos, julgo totalmente improcedente as oposições deduzidas pelos executados B  e C.
Uma vez que não fixado no saneador, fixo à oposição deduzida pelo executado B  o valor da execução de €67.959,26 (sessenta e sete mil novecentos e cinquenta e nove euros e vinte e seis cêntimos), por corresponder à utilidade da presente acção - arts. 305°, 306°, n° 1, 313°, n° 1, 314° e 315° do CPC ( na redacção anterior ao NCPC aprovado em anexo à Lei 41/2013, de 26 de Junho, visto o disposto no artº 6º,nº4 , da referida Lei).
Custas de cada respectiva oposição pelos executados/Opoentes, atento  o respectivo  decaimento - art. 446°, n° s 1 e 2, do CPC.
Registe e notifique.”
1.4.- Inconformado com a sentenciada improcedência da oposição, veio  então  o executado/embargante B , da referida  sentença  interpor recurso  de apelação, que admitido foi e com efeito devolutivo, formulando na respectiva peça recursória  as seguintes conclusões :
A. Por fim, em cumprimento do disposto no número 1 do artigo 639.º do Código de Processo Civil, vem o Recorrente apresentar as suas conclusões de recurso:
B. Tendo em conta a produção da prova Testemunhal, em sede de audiência de  discussão e julgamento, o Tribunal a quo deveria ter considerado como provado a parte do quesito único no segmento: "(...) Foi convencionado entre o exequente e os executados que, apesar da sua redacção, o escrito particular referido em A) era celebrado no pressuposto de que tivesse lugar a cessão de quotas a que se refere o documento particular de fls. 22-26 - caso em que só nesse caso, o exequente iria receber o valor indicado no escrito particular de fls. 7-9 dos autos principais (...)".
C. O Recorrente impugna a decisão sobre a matéria de facto  nesta parte do quesito único, nos termos do disposto no número 1, do artigo  640.º do Código de Processo Civil, remetendo os pontos que considera incorrectamente julgados e as transcrições dos depoimentos das Testemunhas para as suas alegações de recurso supra apresentadas;
D. Deve, também ser considerado como provado a parte do quesito único no segmento “ (…) e sendo que, diversamente do que consta do documento particular id. Em A), nunca o exequente despendeu a quantia de € 63.596,00 para pagamento de dívidas da sociedade Café …., Lda (...)" ;
E. O Recorrente impugna a decisão sobre a matéria de facto, também nesta parte do quesito único, nos termos do disposto no número 1, do artigo 640.º do Código de Processo Civil, remetendo os pontos que considera incorrectamente julgados e as transcrições dos depoimentos das Testemunhas para as suas alegações de recurso supra apresentadas.
 F. O título executivo da execução é um documento particular, tendo natureza causal e não abstracta, não valendo por si próprio, estando a sua subsistência e validade sujeita à necessidade de uma relação subjacente, ou seja, uma causa que lhe alicerce o valor aí presente.
G. O título executivo não tem qualquer causa que o sustente, como se demonstrou e provou.
H. O Recorrido apenas exprimiu uma prova de primeira aparência/que se materializou com a apresentação do título executivo, não produzindo qualquer outra prova além desta, que demonstrasse a causa do valor peticionado e o direito nele incorporado, sendo que da prova testemunhal produzida, também não resultou qualquer outro facto que a corroborasse a posição do Recorrido.
I. Pelo contrário, resultou provado que quem realizava todos os pagamentos referentes ao Café …., Lda. era o Recorrente, não demonstrado o Recorrido a causa de pedir, isto é, os factos que sustentavam o pedido do pagamento pelo Recorrente-: do valor de € 63.596,00, não provando a relação substantiva que esteve na base da emissão do título executivo.
J. Improcede o argumento de que o Recorrido, tendo o título executivo, deixaria de ter de demonstrar o pagamento e a verificação da causa que subjaz ao valor por si peticionado, visto que a causa do título foi posta em causa pelo ora Recorrente, através da prova testemunhal produzida.
K. Atendendo  a que se aplicava a este processo as regras estabelecidas no Código de processo Civil de 1961, as quais não permitiam as declarações de parte do (no sentido de contrapor as declarações do Recorrido), e tomando em linha de conta que apenas o Recorrente, o Exequente A e o Recorrido tinham o integral conhecimento do negócio que tinham celebrado, o Tribunal à quo não se poderia ter bastado com a literalidade do título executivo e com as declarações de parte do Recorrido, tendo de atender, também, quer à restante prova produzida, mormente a testemunhal, quer à materialidade subjacente que ficou cabalmente demonstrada;
L. O Recorrido não só não provou que pagamentos fizeram que justificasse o valor referido no título executivo, como quando teve a oportunidade  de ficar com a quota do Café …, Lda , que serviria, como referiu, para o "compensar" pelos valores despendidos naquele estabelecimento comercial, recusou-se expressamente a fazê-lo, conforme referido no depoimento da Testemunha José …..;
M. Por outro lado, ficou demonstrado que o pagamento do valor que figurava no título estava dependente da prestação de terceiro, nos termos do disposto no artigo 804.º do Código de Processo Civil de 1961, correspondente ao actual artigo 715.º do vigente Código de Processo Civil.
N. No dia 03 de Fevereiro de 2003, isto é no mesmo dia que foi assinado o título executivo, Recorrente, o Executado C (na qualidade de cedentes)  e D e E (na qualidade de cessionários ) , celebram um contrato promessa de cessão de quotas do Café …, Lda.
O. A cláusula quarta do aludido contrato determinava que o valor da cedência da totalidade das quotas era de € 231.941,00, estando o pagamento de tal valor determinado em 60 prestações mensais e sucessivas, existindo um princípio de pagamento, no valor de € 21.448,31.
P. Compulsando a cláusula quinta do título executivo, assinado também no dia 03  de Abril de 2003, verifica-se que o pagamento ao Recorrido seria feito exactamente nos mesmos moldes do que o contrato definitivo de cessão de quotas, isto é, em 60 prestações mensais e sucessivas , existindo um princípio de pagamento, no valor de € 9.975,00.
Q. O contrato definitivo de cessão de quotas não foi assinado nem foi pago qualquer valor ao Recorrente, (veja-se o ponto V (Fundamentação de Facto), alínea D da sentença proferida pelo Tribunal a quo), pelo incumprimento dos cessionários.
R. A tarefa do intérprete-aplicador, no deslindar da interpretação do título executivo dos autos não é directa, uma vez que nenhuma das suas cláusulas apresenta epígrafe;
S. Pelo elemento literal da interpretação, não se consegue deslindar uma obrigação condicional ou dependente de prestação no aludido documento.
T. Mas, a circunstância de as cláusulas do título executivo não preverem qualquer epígrafe, não é corolário de que não exista uma obrigação dependente de prestarão no processo sub judice.
U. O Tribunal a quo não pode extrair do facto de as partes não terem aposto na cláusula quinta do título executivo, ipsis verbis o termo "condição", que a prestação dependente de terceiros/condição não tinha sido livremente convencionada entre as Partes, una vez que no âmbito da sua autonomia privada ,não o teriam de prever tal clausulado em forma escrita.
V. Fazendo uma interpretação sistemática das cláusulas terceira e quarta do documento dado à execução como título executivo, resulta que o valor de € 63.596,00 aí referenciado estava dependente do pagamento do valor de €231.94,00 relativo ao contrato de cessão de quotas definitivo com D e E, contrato e pagamento que não se realizou.
W. Confrontando a declaração dada como título executivo e o contrato promessa de cessão de quotas, verifica-se que os documentos foram assinados no mesmo dia, tem o (mesmo tipo de letra, o mesmo tamanho de letra, a mesma formatação, o que indicia claramente a interdependência de tais negócios jurídicos, uma vez que foi a mesma pessoa que redigiu ambos os documentos.
X. Quer o Contrato de cessão de quotas, quer o título executivo, preverem o pagamento dos valores aí previstos em 60 prestações mensais e sucessivas, acrescendo, ainda, que a cláusula terceira da declaração dispõe que o valor da cedência da totalidade das quotas é de € 231.914,00, referindo logo a seguir, a cláusula quarta da mesma declaração, que o Recorrido tem a receber do Recorrente e do Executado C, pelo capital disponibilizado, € 63.596.00.
Y. Fazendo uma interpretação sistemática e global do título executivo, em particular das cláusulas terceira e quarta, que a expressão, "pelo capital disponibilizado” só pode significar "pelo capital recebido pelo Recorrente referida na cláusula terceira.”;
Z. O valor a pagar ao Recorrido (em 60 meses), seria pago pelos recorrentes e pelo Executado C, se o contrato definitivo de cessão de quotas fosse cumprido, e à medida que lhe fossem sendo pagas cada uma das 60 prestações por parte dos cessionários
AA. Aliás, as próprias declarações de parte do Recorrido demonstram o conhecimento pleno da condição invocada, cujo trechos foram reproduzidos nas alegações, e para os quais se remete.
BB . O Recorrido faltou à verdade ao tribunal a quo ao afirmar que não participou da negociação, nem na elaboração do contrato promessa de cessão de quotas e que não sabe se o Recorrido fundamentou a sua decisão à celebração do contrato definitivo de cessão de quotas, quando na declaração dada por ele como titulo executivo é feito referência expressa na sua cláusula segunda ao contrato promessa de cessão de quotas, identificando pormenorizadamente! os seus Promitentes e os valores que estes iriam pagar pela cessão, tendo afirmando que "(...) ficou acordado que viabilizaria o negócio (...)".
 CC. O Recorrente e o Recorrido apuseram as suas assinaturas no aludido título executivo, referindo que por entendimento unânime e destaquemos a locução unânime, iria ser celebrado o contrato definitivo de cessão de quotas com D e E, em cumprimento do contrato promessa assinado.
DD. Atendendo à interpretação do título Executivo e das declarações de parte do Recorrido, este sabia da existência do contrato promessa de cessão de quotas celebrado entre o Recorrente e D e E, dos moldes do contrato definitivo a celebrar, em particular o modo de pagamento das quotas, sabendo igualmente, que do cumprimento deste contrato resultaria o pagamento de uma quantia a seu favor, a favor do ora recorrente e a favor do executado António Moreira.
 EE. O Recorrido deslocou-se a Santarém, juntamente com o Exequente A, no sentido de fazer com que os cessionários inadimplentes pagassem o valor a que  se tinha comprometido ao Recorrente e ao Exequente A, pois só assim potenciaria o pagamento a seu favor, facto que foi dado como provado, constando em assentada.
FF. O Recorrente e o Executado B mudaram a fechadura do Café …., Ld.ª, de maneira a que estes saíssem o mais rapidamente possível do estabelecimento comercial.
GG. O Recorrido tudo fez para que os cessionários faltosos saíssem do restaurante 2000, Lda., em virtude da condição ínsita no título executivo e sabendo que eles não tinham pago o valor devido ao Recorrente, bem sabia que o pagamento do valor de € 63.596,00, nunca lhe seria feito.
HH. Mesmo que se considerasse que tivesse havido pagamento de despesas por parte do Recorrido, o que não se admite uma vez mais, mas por mero benefício de patrocínio se refere, os pagamentos teriam sido feitos por este, conforme expressamente referiu quer nos artigos 8.º, 19.º, 31º da sua contestação e nas declarações de parte produzidas, à sociedade Café ..., Lda. e não ao Recorrente.
II. Em nenhum momento das suas declarações de parte, o Recorrido disse que entregou qualquer quantia ao Recorrente, referindo que as quantias por si pagas eram para cobrir despesas do restaurante Café …, Lda.
 JJ. O regime legal das sociedades por quotas impõe que haja responsabilidade limitada a nível externo, isto é, tendo o alegado crédito do Recorrido sido prestado à Sociedade era a sociedade comercial por quotas café …, Lda. que deveria ter sido demandada e não o Recorrente.
KK. É a conclusão que resulta do disposto no número 3 do artigo 197º do Código das Sociedades Comerciais que dispõe que apenas o património social da sociedade responde perante os credores sociais, pelo que o património do Gerente de Direito, neste caso o Recorrente, não responde por tal dívida
LL. O Recorrente apenas seria responsabilizado pelo crédito caso do disposto no artigo 78º do Código das Sociedades Comerciais, isto é, se tivesse tornando, culposamente, o património social insuficiente dívidas, o que não foi provado.
MM. O Recorrente seria sempre parte ilegítima na acção, caso hipotético de existir uma dívida, que seria o titular comercial Café ..., Lda. e não o ora Recorrente .
Nestes termos, e nos demais de Direito que V. Exas. proficientemente suprirão, requer que seja dado provimento ao presente recurso de apelação ,devendo, subsequentemente, serem declarados procedentes os embargos de Executado apresentados pelo Requerente e extinta a instância, fazendo-se apenas, deste modo, a acostumada JUSTIÇA!
1.5.- Também o executado C, inconformado com a sentenciada improcedência da sua oposição, veio da referida  sentença  interpor recurso  de apelação, que admitido foi e com efeito devolutivo, formulando na respectiva peça recursória  as seguintes conclusões :
1ª - vem o presente Recurso interposto da Douta Sentença de fls do Douto Tribunal recorrido que Julgou totalmente improcedente a Oposição a Execução deduzida pele Executado ora Apelante;
2ª - Com efeito, não pode o Apelante conformar-se com a Decisão ora em crise, uma vez que entende que a mesma, salvo melhor opinião e devido respeito não se afigura Justa enfermando, designadamente, de Erro de Julgamento da Matéria de Facto Erro na Fundamentação da Sentença, bem como omissão de Pronúncia, violando designadamente, o disposto nos artºs 607º, nº 4 (Elaboração da Sentença, 608º, nº 2 (Questões a Resolver), 615º, nº 1, al. b) e d) (Causas de Nulidade da Sentença) C P C
3ª – Impõe-se proceder à Rectificação de Erros Materiais, que emanam do Capítulo V ( Fundamentação de Facto) da Douta Sentença recorrida, remetendo os pontos que se justificam serem rectificados para as alegações supra apresentadas referentes ao Capítulo I do presente Recurso;
4ª - O Apelante Impugna a Decisão da Matéria de Facto contida na alínea II (ou alínea G) ,após eventualmente efectuada a rectificação requerida) e  que se transcreve : " Após e durante algum tempo, pelo menos uma semana, o exequente trabalhou no estabelecimento em questão, desempenhando as tarefas que assumia antes da assinatura do acordo referido em A )”  (Destaque do Apelante)
5ª O Apelante sustenta ter ocorrido um erro de Julgamento quanto ao espaço temporal que acabou por ficar provado, Já que a prova testemunhal produzida em audiência de discussão e julgamento, conjugada com a prova documental carreada para os autos demonstra à evidência, salvo melhor opinião de que não foi pelo menos uma semana, mas isso sim, "pelo menos um mês" o que é substancialmente diferente;
6ª – É pois, este o concreto ponto de facto que o Apelante considera incorrectamente Julgado ( artº 640º, nº 1, al. a) CPC) e que pretende seja reapreciado e, consequentemente alterado para reposição da verdade dos factos e do exigível
7ª No que tange aos concretos meios probatórios (artº 640º, nº 1, al. b),C.P.C.) , remete-se para os constantes do registo do sistema de gravações bem como para as transcritas passagens dessas mesmas gravações respeitantes ao depoimento de parte do Exequente A e da Testemunha José …. prestados em audiência de discussão e julgamento e que se funda o recurso ( nº 2, al. a) do mesmo artº) e que se encontram contidas nas Alegações supra apresentadas e a que corresponde o Capítulo II do presente Recurso
8ª - Entende o Apelante ter ficado plenamente demonstrada a existência de Erro de Julgamento por parte do Douto Tribunal recorrido no que tange à Alínea I da Fundamentação de Facto;
9ª - Pelo que deverá o Venerando Tribunal da Relação de Lisboa reapreciar a Matéria de facto a que alude alínea I) da fundamentação de Facto uma vez que a prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento conjugada com a documentação carreada para os autos impõe salvo melhor opinião um entendimento e consequente Decisão diversa;
10ª - Assim e nos termos do disposto no artº 640º, nº 1, al. c) C.PC, requer-se, respeitosamente, se proceda à alteração da matéria de facto contida na Alínea I), proferindo-se decisão com a seguinte redacção e com os legais efeitos :
“ Após e durante algum tempo, pelo menos um mês, o exequente trabalhou no estabelecimento em questão, desempenhando as tarefas que assumia antes da assinatura do acordo referido em A)”.
11ª - No que ao Capítulo III das presentes Alegações concerne entende o apelante ter o tribunal a quo incorrido em Erro na Fundamentação de Direito ;
12ª – Com efeito e face a toda a prova produzida ( documental e testemunhal) , a decisão do douto Tribunal recorrido só poderia ter sido urna : a total procedência da oposição à execução deduzida pelo Executado, ora Apelante
13ª –E só assim não foi porquanto, no entender do Apelante enferma a douta sentença em crise de uma errónea interpretação da matéria provada que conduziu a um consequente erro na respectiva fundamentação de direito , vindo a culminar numa decisão final, a qual salvo o devido respeito, é injusta .
14ª – Desde logo, lê-se no Capítulo IV – OUESTÕES A DECIDIR da, Sentença , que  a questão que cumpre dirimir é “  Saber se existe alguma ligação ,designadamente de dependência, entre o negócio jurídico que se consubstancia no título executivo apresentado à execução e aquele outro intitulado de “contrato promessa de cessão de quotas”, junto  por cópia de fls 22 a 26 destes autos, e se nessa decorrência os executados se  obrigaram  ao pagamento do valor expresso naquele primeiro apenas  e só se fosse celebrado o contrato prometido de cessão de quotas “.
15ª – Afigura-se ter o Douto Tribunal incorrido num lapso, já  que deveria ter escrito “… apenas e só se fosse celebrado e cumprido integralmente o contrato prometido de cessão de quotas “ e não apenas o que escreveu ;
16ª - Com efeito e no que ao Executado/Apelante estritamente respeita, em nenhum momento alegou o que quer que seja que permitisse ao tribunal recorrido extrair tal ilação, como bem decorre do alegado pelo Apelante em sede de Oposição à Execução designadamente nos artºs  22º e 24º, pelo que o texto da 'Questão a Decidir”, subscrito pelo Douto Tribunal recorrido não é rigoroso ;
17ª- No entendimento do Apelante o que verdadeiramente está em causa nos presentes autos, é apurar-se se do teor do título executivo, um documento particular, resulta apenas e tão só uma mera e formal confissão de Dívida por parte dos Executados ou, ao Invés, se dali resulta ter sido convencionado entre os ali declarantes - pese embora não escrito - a existência de uma estreita e efectiva ligação entre dois negócios, dependendo o cumprimento de um (Titulo Executivo) do Integral cumprimento do outro (Contrato Promessa de Cessão de Quotas)
18ª - Mais, se o exequente/Apelado "ab initio" sabia e como tal aceitou e se comprometeu a respeitar ao assinar esse documento de que só viria a receber o montante ali Inscrito se o contrato-promessa de cessão de quotas - celebrado na mesma data do Título Executivo - ou o contrato definitivo, viesse a ser Integralmente cumprido pelos cessionários;
19ª Mais ainda e de capital importância: se toda a conduta protagonizada pelo Exequente/Apelado em particular a posterior à celebração da Dec1aração que configura o Titulo Executivo! é ou não susceptível de fazer prova da excepção alegada pelo Apelante na sua Oposição à Execução, em vista a sua total procedência ;
20ª – Para demonstração, importará começar por analisar-se que o depoimento de parte do Exequente A, quer o da Testemunha José …, prestados em audiência de discussão e julgamento remetendo-se para os constantes do registo do sistema de gravações bem como para as transcritas passagens dessas mesmas gravações contidas nas supras Alegações do presente Recurso em sede do Capítulo III;
21ª - Da análise desses depoimentos resulta à evidencia o comportamento protagonizado pelo Exequente/Apelado, após a assinatura do Título Executivo traduzido, em traços gerais, numa ida a Santarém com o Apelante, quando tomou conhecimento que os promitentes cessionários tinham entregue ao Executado B um cheque sem provisão para princípio de pagamento desse contrato promessa de cessão de quotas e que deu lugar a uma Assentada conforme acta de Audiência de Discussão e Julgamento de 05/12/2016 ;
22ª – Bem como, quando os alegados promitentes cessionários faltaram com o pagamento da 1ª prestação (Março/2003), prevista no respectivo contrato de fls. 22 a 26 dos autos, ajudou de imediato os Executados a porem fora o aludido casal do estabelecimento conforme confessou, acompanhando os Exequentes na mudança da fechadura do estabelecimento e não mais deixando, juntamente com os Executados, o refendo casal promitente cessionário de ali entrar e continuar a exploração do restaurante (Alínea H) da Fundamentação de Facto tendo sido nestes actos a parte mais activa, "vamos mudar; estes gajos não entram aqui mais, isto vai acabar”, conforme depoimento da testemunha José Augusto Tomás e em sequência retomou no estabelecimento as funções que tinha antes da assinatura da Declaração Título Executivo) por algum tempo pelo menos uma  semana (Alínea 1) da Fundamentação de Facto,
23ª Atenta esta comprovada conduta, e à luz das mais elementares regras de experiência e do senso comum, entende o Apelante que ninguém poderá acreditar que tal comportamento se possa ter pautado por um puro e simples sentimento de generosidade para com os Executados, sendo pois  claro que a Declaração de Dívida dos autos traduzia algo mais,
24ª- Ou seja que do teor do teor do título executivo. um documento particular, não resulta apenas e tão só uma mera e formal confissão de Dívida por parte dos Executados, mas, isso sim, a existência de uma estreita e efectiva ligação entre dois negócios dependendo o cumprimento de um (Título Executivo) do Integral cumprimento do outro (Contrato Promessa de Cessão de Quotas),
25ª Analisando o Título Executivo de fls. 7 a 9, da conjugação de todas as suas cláusulas extrai-se que o Exequente/Apelado ao vincular-se ao conteúdo da Declaração, deu  seu expresso consentimento a ser pago pelos executados apertas e tão só com o exclusivo produto obtido por estes com a concretização e consequente total cumprimento da cessão de quotas a realizar;
26ª- É que se assim não fosse, ou seja, se se tratasse, repita-se de uma mera  confissão de divida por parte dos Executados, com prazos certos de pagamento isto é, não sujeita à verificação e produção de qualquer condição não se pode entender que nesse documento tivesse de ficar expresso o seu acordo para a celebração de um contrato promessa de cessão de quotas com um terceiro, atento não ser detentor de qualquer quota na sociedade, e , igualmente, não sendo sócio da sociedade logo não sendo parte na celebração do contrato promessa a celebrar também não se entende que tivesse de ficar consignado nessa Declaração o seu expresso acordo quanto ao preço da cedência total das quotas .
27ª - Facto que o Exequente afirmou não se recordar da razão de tal detalhe figurar no Documento, em lugar de, pura e simplesmente , e corno muito bem o questionou a Sra juiz a quo, terem os Executados apenas declarado "que lhe deviam X dinheiro do valor que o senhor tinha pago e que lhe iam pagar desta e daquela forma sem mencionar aqui a cessão de quotas. Porque é que ficou aqui mencionado a cessão de quotas? Podia não ter ficado a constar  “ transcrição da Intervenção da Sra Juiz. no segmento da gravação 36m -195 a 37m-02s. do seu depoimento ).
28ª - Resulta assim. no entender do Apelante, que o Exequente r conhecia ab initio, a vontade real dos declarantes Executados e com ela concordou e se Vinculou ou seja que os Executados só lhe poderiam pagar, melhor dizendo só teriam dinheiro para lhe pagar em particular o Apelante, desde que aquele concreto contrato promessa (ou definitivo) de cessão de quotas a celebrar fosse integralmente cumprido - e não foi - pelos cessionários, emanando tal quer da supra descrita e provada conduta do Exequente pós celebração da Declaração, quer inclusive. pela interpretação do clausulado do Titulo Executivo no seu todo;
29ª – E tal entendimento, salvo melhor opinião e devido respeito deveria também ter sido o do douto tribunal a quo e não foi;
30ª - Com efeito e sendo " os factos a descriminar em sede de fundamentação da sentença no termos do art.º 607º, nº 3 do C.P.C somente os factos essenciais" ( Ac. Relação de Lisboa de 12/05/2016, Relator Ezaguy Martins, in www.dgsi.pt ) mostra-se que as Alíneas F) H) e I) da fundamentação de Facto, são factos essenciais - não se podendo olvidar a Assentada - e que consubstanciam a excepção Invocada pelo Executado apelante no seu articulado de Oposição a Execução ,não merecendo, ao que se afigura , a devida e critica apreciação por parte do douto Tribunal a quo;
31ª- É o que transparece, já que, após longamente se discorrer longamente jurídica e doutrinariamente na Sentença sobre os artºs 236º a 238º pode ler-se:
Feito este excurso e revertendo ao caso concreto ,visto o teor  do documento Dado à execução e à mingua de qualquer outra factualidade Provada que nos explicite outro sentido do acordado entre as partes e/ou vontade diversa do que consta literalmente ali escrito “;
32ª- Com o devido respeito, as alíneas  F) H) e I) da Fundamentação de Facto sendo\ factos essenciais não podem ser tidas como “míngua”, bem pelo contrário importando reter que é doutrina e jurisprudência dominantes e a propósito de se saber quais as circunstâncias atendíveis para a interpretação das declarações de vontade expressas nos negócios jurídicos ,o modo de conduta por que posteriormente se prestou observância ao negócio concluído, estando bem demonstrado, por provado, o modo de conduta protagonizado pelo Executado posterior à celebração do Título Executivo ;
33ª- De igual modo a afirmação de que “  Nada aponta no sentido de uma qualquer outra relação umbilical/ou de dependência deste acordo e sua eficácia aquele outro contrato promessa de compra e venda a terceiros. Por que se assim fosse não deixaria de ter ali sido expresso a condição de pagamento daquele valor o celebração de contrato prometido de cessão de quotas e/ou de cumprimento dos pagamentos prestacionais mencionados neste contrato promessa de cessão de quota" e é claro que o não foi, vistos desde logo os termos da clausula 5ª, não faz sentido, tudo porquanto, e desde logo, se não existisse a cláusula 5ª -  ou qualquer outra de teor semelhante " então, e ab initio, nunca a Declaração ora em crise poderia ser título Executivo nos presentes autos, por lhe faltar um dos pressupostos ,o da exigibilidade, tratando-se pois o acima transcrito de uma interpretação errónea ,e de modo, algum, consentânea com a realidade dos negócios jurídicos atento as partes, muitas das vezes, por qualquer razão e dentro da sua esfera de autonomia" não consignarem nos documentos que emitem  a vontade real que presidiu à  celebração de determinados negócios jurídicos .
34ª - Não será despiciendo notar que o Documento dos autos foi redigido por 3 pessoas ( exequente e Executados), profissionais da indústria da restauração e não juristas, tendo a Srª Juiz a quo afirmado que "O Tribunal não se esqueceu disso", conforme " segmento da transcrição do depoimento de parte do Executado (38m-40s a 39m-33s );
35ª - Com o devido respeito, revela a Douta Sentença ter o Douto Tribunal recorrido, salvo melhor opinião, tido uma excessiva preocupação de tentar Interpretar o Documento (Título Executivo), irrelevando totalmente a prova produzida pelo Apelante, traduzida, essencialmente, em factos essenciais consubstanciadores da excepção a que alude a Oposição a Execução deduzida e que não foram objecto da devida e exigível ponderação, em vista à sua respectiva e correta subsunção ao direito;
36º - Por todo o exposto entende o Apelante estarmos em presença  do plasmado no artº 236º, nº 2, CC “ Sempre que o declaratório conheça a vontade real do declarante, é de acordo com ela que vale a declaração emitida" sendo pois o caso dos presentes autos. 37º - Encontrando-se provado na Alínea F) da Fundamentação de Facto que o contrate prometido de cessão de quotas não foi concretizado, por  D e E não terem efectuado pelo menos o pagamento da lª prestação e das subsequentes como acordado, daí. que o não cumprimento da obrigação contida no documento ( Título Executivo) por parte dos executados não lhes pode ser Imputado enquanto devedores, por se ter operado uma impossibilidade objectiva de cumprimento ;
38º - Logo a “obrigação extingue-se quando a prestação se torne impossível ,por causa não imputável ao devedor" (artº 790º, nº 1 CC).
39º - Destarte , entende o Apelante encontrar-se a obrigação exequenda extinta com as legais consequências:
40º -  Quanto ao Capítulo IV das presentes Alegações em sede de oposição a Execução, o Executado, ora Apelante, suscitou nos artºs  65º a 67º do seu articulado não ser licito ao Exequente/Apelado peticionar qualquer quantia a titulo de juros de mora pelo facto de no Titulo Executivo nada constar a esse propósito, estribando-se num aresto do STJ, "não ocorrendo condenação em juros no Título executivo, ainda que, face à Lei substantiva, o exequente possa ter direito a eles, não pode exigi-los  na acção executiva, já que nesta o âmbito do pedido está limitado pelo titulo (Ac. STJ de 29-03-07, www.dgsi,pt).
41º- E sobre isto o Douto Tribunal recorrido não se pronunciou na sua Sentença pelo que incorreu numa Omissão de Pronúncia, tendo sido violado o disposto no artº 608º,nº2, do CPC.
42º - Acresce que, e como douta mente decretado a fls., foi dispensada a selecção de base Instrutória no que tange a matéria alegada pelo Executado/Apelante na sua Oposição à Execução, pelo que, salvo melhor opinião, deveria a douta Sentença recorrida fazer expressa referência a eventuais Factos Não Provados dessa Oposição, bem como fundamentar, designadamente, a ilação colhida do facto Instrumental (Vidé, a Assentada que decorre da Acta da Audiência de discussão e julgamento de 05/12/2016 )  em estrita observância do disposto no artº 607°, nº 4. CP.C e nada consta.
43ª  - Assim  sendo, entende o Apelante ser a Douta Sentença a quo” NULA  ( Artº 615º, nº 1, alíneas b) e d), CPC ), o que se alega, para os devidos e legais efeitos
Nestes termos e nos demais de Direito, que V.Exªs. Venerandos Desembargadores, douta mente suprirão, deverá o presente Recurso de Apelação ser julgado procedente e, em consequência, ser revogada a Douta Sentença do Tribunal recorrido, com as legais consequências, assim se fazendo a habitual JUSTIÇA.
1.6. - Tendo o exequente/apelado A apresentado contra-alegações, nestas veio pugnar pela manutenção da sentença recorrida,  e , consequentemente, impetra que os recursos interpostos pelos executados sejam julgados improcedentes.
                                             *
Thema decidendum
1.7. - Colhidos os vistos, cumpre decidir, sendo que , estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões [ daí que as questões de mérito julgadas que não sejam levadas às conclusões da alegação da instância recursória, delas não constando, têm de se considerar decididas e arrumadas, não podendo delas conhecer o tribunal ad quem ] das alegações dos recorrentes ( cfr. artºs. 635º, nº 3 e 639º, nº 1, ambos do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei nº 41/2013, de 26 de Junho , e tendo presente o disposto no artº 5º, nº1 e 6º,nº4, ambos deste último diploma legal ), e sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, as questões a apreciar e a decidir  são as seguintes  :
- No âmbito da apelação de B
a) Se importa modificar a decisão de facto proferida pelo tribunal a quo;
b) Se, em face da modificação da decisão de facto proferida pelo tribunal a quo, ou , independentemente de quaisquer alterações, se impõe alterar o julgado, sendo declarados procedentes os embargos de Executado apresentados pelo Requerente e extinta a instância, pois que, sempre o recorrente será parte ilegítima na acção e no caso hipotético de existir uma dívida da sociedade Café …, Lda.;
II - No âmbito da apelação de C
a) Se deve este tribunal de recurso rectificar o escalonamento da factualidade provada [ eliminando algumas das suas alíneas ];
b) Aferir se a sentença recorrida é NULA, nos termos do artº 615º, nº 1, al. b) e d) ,do CPC
c) Se importa modificar a decisão de facto proferida pelo tribunal a quo;
d) Se, em face da modificação da decisão de facto proferida pelo tribunal a quo, ou , independentemente de quaisquer alterações, se impõe alterar o julgado, sendo declarados procedentes os embargos de Executado .
                                   *
2.- Motivação de Facto
Mostra-se fixada pelo tribunal a quo a seguinte factualidade :
2.1.- A acção que constitui os autos principais tem como título executivo o escrito particular constante de fls. 7-9 dos autos principais, cujo teor é o seguinte :
                                   Declaração
PRIMEIROS: B casado em regime de comunhão de bens com Fernanda …, NIF …,portador do Bilhete de Identidade nº 4… de 07-09-1999, emitido em Lisboa (…) e C, casado no regime de (…) com Aida … (…)
SEGUNDO: A, casado no regime de separação de bens (…).
                                     PRIMEIRA
Os primeiros são os único sócios e gerentes da sociedade comercial por quotas de responsabilidade limitada, que adoptou a denominação CAFÉ …,Ldª, com o NIPC …, com sede na Rua da Beira, .., Quinta do Junqueiro, freguesia de Carcavelos, Concelho de Cascais, matriculada na (…), com o capital social integralmente realizado de 5.000 euros, dona e legítima proprietária do estabelecimento comercial de restauração, denominado de “CAFÉ ….”, instalado no rés-do-chão do prédio nº .. da Rua  Coronel …, 1700-125, Lisboa, (…)
                                     SEGUNDA
Os Primeiros declaram que prometeram ao Segundo ceder parte  das suas quotas que detém na sociedade comercial identificada na cláusula anterior, e como essa promessa não passou de verbal, o segundo exerceu funções na dita sociedade desde 18.03.02 até à data da assinatura desta  declaração tendo disponibilizado verbas da sua conta pessoal para pagamentos de facturas na sociedade a título de pagamento das quotas prometidas no montante de €63.596,00 (sessenta e três mil quinhentos e noventa e seis euros).
Por entendimento unânime será feito um contrato promessa de cessão de quotas da sociedade comercial da cláusula Primeira a favor de D  NIF (…), casado no regime de comunhão geral de bens com E , NIF ..., (…).
                                    TERCEIRA
A Sociedade será cedida com todo o seu passivo e activo.
O valor da cedência da totalidade das quotas é de €231.941,00( duzentos e trinta e um mil e novecentos e quarenta e um euros).
                                    QUARTA
Tem o Segundo a receber dos Primeiros pelo capital disponibilizado na totalidade de €63.596, 00 ( sessenta e três mil quinhentos e noventa e seis euros).
                                    QUINTA
O valor acordado na cláusula quarta será pago nos seguintes termos :
UM - Como princípio de pagamento desta declaração os Primeiros pagarão ao Segundo nesta data o valor de € 9,975,00 (nove mil novecentos e setenta e cinco euros), de que lhe dão quitação.
DOIS - O remanescente do valor será pago em prestações mensais e sucessivas subsequentes à assinatura da presente declaração como segue:
a) Do 1º ao 60° mês o valor a pagar será de € 893. 67 (oitocentos e noventa c três euros c sessenta e sete cêntimos) por mês;
TRÊS - Os pagamentos mensais serão pagos até ao dia 5 (cinco) de cada mês a serem depositados em conta a indicar pelo Segundo;
QUATRO - A falta do pontual pagamento de qualquer uma das prestações acordadas será tida como incumprimento da presente declaração e da inteira responsabilidade dos Primeiros suficiente para constituir justa causa.
                                     SEXTA
Para eventuais emergentes desta declaração convenciona-se como competente o foro da comarca de Lisboa .
                                    SÉTIMA
Para os casos omissos vigorará a lei geral.
                                    OITAVA
A presente declaração elaborada em duplicado, assinada por todos os contraentes que mutuamente aceitam os direitos e obrigações emergentes do mesmo.
Lisboa, 04 de Fevereiro de 2003
OS PRIMEIROS:
        B                                   C   
O SEGUNDO:
        A
2.2.- Não foi celebrado o contrato prometido de cessão de quotas entre os executados e D e E ( resposta ao segmento "o que não veio a acontecer" do quesito único)
2.3.- Os executados B e C, assinaram, na qualidade de primeiros contraentes, com D e E , estes na qualidade de segundos contraentes, o documento particular intitulado de “ contrato promessa de cessão de quotas", datado de 4 de Fevereiro de 2003, conforme teor da respectiva cópia a fls. 22 a 26 destes autos, que se dá aqui integralmente por reproduzido para todos os efeitos legais, e no qual consta designadamente o seguinte:
                                         PRIMEIRA
Os Primeiros Contraentes são os únicos sócios e gerentes da sociedade comercial por quotas de responsabilidade Imitada, que adoptou a denominação Café …., Lda., com o NIPC … (...) dona legitima proprietária do estabelecimento comercial de restauração, denominado "CAFÉ …", instalado no rés-do-chão e cave do prédio n° .. à Rua Ricardo Jorge em Lisboa (... ).
                                         SEGUNDA
Os Primeiros Contraentes prometem ceder a totalidade das quotas que detêm na sociedade identificada na cláusula anterior, e os Segundos Contraentes, prometem adquirir através da cedência de quotas agora prometida essas mesmas quotas representativas da totalidade do capital social.
                                         TERCEIRA
Um -   A sociedade será cedida com todo o seu passivo e activo (...)
Dois - Faz parte integrante desta cessão, a transmissão do estabelecimento comercial de restauração identificado na cláusula primeira no estado de conservação em que se encontra e que não merece qualquer reparo por parte dos Segundos Contraentes.
                                         QUARTA
O valor da cedência da totalidade das quotas é de €231.941,00 (…)
                                         QUINTA
O valor acordado na cláusula quarta será pago nos seguintes termos:
UM - Como sinal e princípio de pagamento desta cessão de quotas os Primeiros Contraentes recebem dos Segundos nesta data o valor de €21.448,31 (...), de que lhe dão a correspondente quitação.
DOIS - O remanescente do valor será pago em prestações mensais e sucessivas subsequentes à assinatura do presente contrato como se segue:
a) Do 1º ao 6º mês o valor a pagar será de €2.494,00 por mês;
b) Do 7º ao 12º mês o valor a pagar será de €3.242,00 por mês;
c) Do 13º ao 60º mês o valor a pagar será de €3.678,00 por mês;
(…)
QUATRO - A falta do pontual pagamento de qualquer uma das prestações acordadas, será tida como como incumprimento do presente contrato suficiente para constituir justa causa de rescisão do mesmo, tendo como consequências a resolução imediata do presente contrato e a entrega do estabelecimento comercial nas condições estipuladas na cláusula décima número dois.
                                         SEXTA
A escritura pública de cessão de quotas, realizar-se-á durante o 60º (sexagésimo) mês de vigência do presente contrato, sendo que todas as despesas inerentes à sua realização correm por conta dos Segundos Contraentes, ficando a seu cargo a notificação à parte contrária, assistindo o direito aos Segundos Contraentes a antecipação do pagamento de todas as prestações em falta, não havendo lugar neste caso a qualquer desconto financeiro ou outro de carácter remuneratório.
                                         SÉTIMA
UM - Com a assinatura do presente contrato, os Segundos Contraentes, tomam posse da efectiva da exploração do estabelecimento de restauração denominado CAFE …., data a partir da qual serão os únicos responsáveis por quaisquer débitos da sociedade cujas quotas agora se prometem ceder.
(…)
                                DÉCIMA QUARTA
O presente contrato é provisório tendo de ser visto e corrigido por quem de direito, num prazo máximo de 10 dias a contar da data da assinatura deste.
2.4. - O contrato prometido de cessão de quotas referido em 2.3. não foi concretizado por D e E não terem efectuado o pagamento da 1ª prestação aludida e das subsequentes como acordado.
2.5. - Na data da celebração do escrito referido em 2.3.,  foi pelos executados entregue aos referidos D e E, o estabelecimento comercial denominado CAFÉ …, que estes passaram a explorar, ali desenvolvendo a sua actividade durante cerca de um mês.
2.6. - Face ao não pagamento referido em 2.4., os executados procederam à substituição da fechadura da porta do estabelecimento de Café referido, no que foram acompanhados pelo exequente que havia tomado conhecimento do facto referido em referido em 2.4., e não mais deixaram os mencionados  D e E de ali entrar e continuar a exploração do mesmo.
2.7. - Após e durante algum tempo, pelo menos, uma semana, o exequente trabalhou no estabelecimento em questão, desempenhando as tarefas que assumia antes da assinatura do acordo referido em 2.1..
                                            *
3.- Se deve este tribunal de recurso rectificar o escalonamento da factualidade provada, eliminando algumas das suas alíneas [ apelação de C ].
Não tendo o tribunal a quo, como se impunha [ no termos do nº2, do artº 614º, do CPC ], apreciado  a questão da impetrada rectificação da sentença, vai ainda assim a  mesma atendida por este tribunal [ porque alinhada e reordenada a factualidade provada em termos considerados – por este tribunal – mais convenientes e esclarecedores em sede de julgamento do mérito das apelações ], não se justificando a baixa do processo por aplicação analógica do disposto no artº 617º,nº5, do CPC.
                                                     *
4 - Da invocada NULIDADE da Sentença [ apelação de C ].
Invoca o apelante C a NULIDADE da sentença recorrida, para tanto considerando padecer a mesma dos vícios das alíneas b) e d), primeira parte, do nº1, do artº 615º, do CPC.
Fundamenta o C o vicio adjectivo aludido na circunstância de, por um lado, não constar da sentença recorrida a enunciação dos Factos Não Provados e da Oposição do recorrente C e, por outro, não ter o tribunal a quo apreciado – na sentença – a questão que suscitou no seu articulado [ nos artºs  65º a 67º ] e relacionada com o impedimento legal de o Exequente/Apelado peticionar a cobrança de juros de mora quando do Título Executivo nada constar a tal propósito.
Sobre ambas as apontadas nulidades, e como se impunha que o tivesse feito [ cfr. nº1, do artº 617º, do CPC ], nada decidiu [ omissão que, lamentavelmente, se vem revelando prática recorrente em sede de instâncias recursórias ] o tribunal a quo no âmbito do despacho em que se pronuncia sobre a admissibilidade do recurso.
Porém, porque não indispensável, importa de imediato conhecer dos vícios supra referidos,  sem necessidade portanto de se ordenar a baixa dos autos, nos termos do nº5, do artº 617º, do CPC.
E, conhecendo.
Começando pela invocada NULIDADE da sentença com fundamento em vício da alínea b), do nº1, do artº 615º, do CPC, importa não olvidar que in casu o julgamento da matéria de facto teve lugar através de Despacho proferido a montante da sentença, nos termos do artº 653º, nºs 2 /4, do pretérito CPC e, lido o mesmo, logo declararam os oponentes não terem quaisquer reclamações a fazer, vg. por deficiência [ cfr acta de fls. 149 e segs ] .
Ademais, lido o referido despacho, a verdade é que nele se indicam factos restritivamente provados, uns, e outros, in totum não provados, razão porque pertinente não é dizer-se que não especificou o tribunal a quo quais os factos julgados Não Provados e, muito menos, em sede de sentença [ como resulta do artº 659º, do pretérito CPC, da sentença constam apenas os factos considerados provados , pois que , é no despacho do artº 653º que o tribunal julga quais os factos provados e quais os que julga não provados].
Para além do exposto, recorda-se que e  tal como ocorria já com o pretérito CPC, e no que ao vício de nulidade de sentença concerne, por ausência de fundamentação ( subsumível na alínea b), do nº1, do artº 615º ), uma coisa é a total (1) falta absoluta de motivação ( quando não existe de todo), e , outra bem diferente - o que não integra já o vício de nulidade - , é a existência de alguma fundamentação, sendo porém ela escassa, deficiente ou até mesmo pobre.
Ou seja, para que ocorra o vício de nulidade a que se refere o artº. 615º, nº1, al. b), do C.P.Civil, necessário é que a falta de fundamentação seja absoluta, não bastando que a justificação da decisão – em termos de facto e de direito – seja deficiente ou incompleta, este último que, podendo é verdade afectar o valor doutrinal da sentença, sujeitando-a ao risco de ser revogada em recurso, não fulmina de nulidade. (2)
Por último, podendo é certo – e mesmo oficiosamente – o tribunal ad quem diligenciar pela alteração da decisão de facto quando a repute de deficiente [ quando factos existem que não foram objecto de julgamento , positivo ou negativo ] , para tanto exigível é que de diligência se trate que se revele indispensável, o que também não se vislumbra que seja o caso [ cfr artº 662º,nº2, alínea c), do CPC ]  e, de resto, de vício se trata que não conduz à NULIDADE da sentença [ nos termos do artº. 615º, nº1, al. b), do C.P.Civil ].
Consequentemente, manifesta é a improcedência da apelação de C no que à invocada nulidade do artº. 615º, nº1, al. b), do C.P.Civil , concerne.
Seguindo-se o conhecimento do vício da alínea d), primeira parte, do nº1, do artº 615º, do CPC, relembra-se que enuncia tal dispositivo que a sentença é nula quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento “.
O vício/nulidade referida, como se sabe, mostra-se em consonância com o dever que recai ( nos termos do nº2, do artº 608º, do CPC ) sobre o Juiz de, em sede de sentença, resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, servindo de cominação ao seu desrespeito (3).
Sobre o Juiz recai , portanto, no dizer de Lebre de Freitas e outros (4), a obrigação de apreciar/conhecer “todas as questões que lhe são submetidas, isto é, de  todos os pedidos deduzidos, todas as causas de pedir e excepções invocadas e todas as excepções de que oficiosamente lhe cabe conhecer (…), sendo que, a verificar-se uma tal omissão de apreciação/conhecimento, e , não estando em causa a mera desconsideração tão só de eventuais “(…) linhas de fundamentação jurídica, diferentes da da sentença e que as partes hajam invocado (…) “,  então o “não conhecimento do pedido, causa de pedir ou excepção cujo conhecimento não esteja prejudicado pelo anterior conhecimento de outras questões, constitui nulidade”.
Por outra banda, impondo tal norma que o juiz conheça de todas as questões que lhe foram submetidas - quer se configurem como excepções quer se situem no âmbito do pedido e da causa de pedir - , e em consonância outrossim com o nº2, do artº 608º, do CPC, mas agora com a respectiva segunda parte, certo é que já lhe está de todo vedado conhecer de questões ( pedido; causa de pedir; excepções que estejam na disponibilidade das partes ) que não tenham sido suscitadas pelas partes, ou seja, e no dizer do Prof. José A. dos Reis (5) a lei “proíbe que o juiz se ocupe de questões que as partes não suscitaram, salvo se a Lei o permitir ou impuser o seu conhecimento oficioso”.
 Em rigor, para nós e em termos conclusivos, dir-se-á que as questões a que alude a alínea d), do nº1, do artº 615º, do CPC, mais não são do que aquelas a que alude o nº2, do artº 607º, e artº 608º, ambos do mesmo diploma legal, e que ao Tribunal cumpre solucionar, delimitando-se e emergindo as mesmas da análise da causa de pedir apresentada pelo demandante e do seu confronto/articulação com o pedido que na acção é formulado.
Ou seja, e dito de um outro modo, não se confundindo é certo as questões a resolver pelo juiz em sede de sentença com quaisquer argumentos e razões que as partes invoquem em defesa das suas posições, o correcto/adequado será em rigor considerar-se que o vocábulo “questões” a que alude a alínea d), do nº1, do artº 615º, do CPC, mostra-se empregue na lei adjectiva com o sentido equivalente a “questões jurídicas” ainda carecidas de resolução, impondo-se que no âmbito das mesmas seja dada prioridade às questões de natureza processual que ainda estejam por resolver (nulidades, excepções dilatórias ainda por apreciar ou outras questões de natureza processual que interfiram no resultado), e ,sem embargo da apreciação das questões que sejam de conhecimento oficioso, deve o juiz limitar-se a apreciar as que foram invocadas, evitando, deste modo, a nulidade da sentença por excesso de pronúncia, nos temos do art. 615º, nº 1, al. d), in fine. (6)
Isto dito, e compulsados os autos, é vero que o apelante C, no âmbito da sua oposição, suscita a QUESTÃO da ausência de fundamento legal e/ou de título para se permitir o exequente e apelado A ... reclamar o pagamento de juros de mora, pois que do aludido Título Executivo nada consta a tal propósito.
Ou seja, em face do acabado de expor, manifesto é que a pronúncia pelo tribunal a quo de decisão direccionada para a referida matéria, a saber, se dispõe o apelado/exequente de titulo que lhe permita reclamar a cobrança coerciva de juros de mora, é questão cuja resolução lhe foi pedida por uma das “partes” ( cf. artº 3 ,nº1, do CPC) , o executado ,e sobre a qual obrigada estava a Exmª juiz a quo obrigada a resolver, nos termos do nº2, do artº 608º, do CPC
Não obstante, na sentença apelada, não se descobre uma qualquer pronúncia e/ou decisão sobre a referida questão, razão porque, e sem necessidade de quaisquer outros considerandos, forçosa é a procedência da apelação no que concerne à invocada NULIDADE da sentença, nos termos do artº 615º,nº1, alínea d), primeira parte, do CPC, vício este que importa declarar, porque existente.
Porém, e tal como decorre do nº1, do artigo 665° do C.P.C., certo é que, ainda que declare nula a decisão que põe termo ao processo, o tribunal de recurso não deixará de conhecer do objecto da apelação.
Ou seja, confirmando a Relação a arguição de alguma das nulidades de sentença a que aludem v.g. as alíneas b) a e), do nº1, ao artº 615º, do CPC , não se impõe inevitavelmente o reenvio do processo para o tribunal a quo para suprir a nulidade, v.g., decidindo a questão que não apreciou.
No essencial, representando o artº 665° do CPC a consagração do princípio fundamental do direito a uma tutela jurisdicional efectiva contemplado no artº 20º da Constituição da República (7) , e  não obstante ficarem os dois graus normais de jurisdição reduzidos a apenas um (8), considerou porém o legislador que este último inconveniente era largamente compensado pelos ganhos em termos de celeridade na apreciação das questões controvertidas pelo tribunal “ ad quem “. (9)
Porque in casu, dos autos constam todos os elementos úteis e necessários ao julgamento da questão suscitada pelo apelante no âmbito da nulidade da Sentença por omissão de pronúncia, e suprindo tal vício, pronunciar-se-á este tribunal – em substituição do tribunal a quo – ,oportunamente, sobre tal matéria.
                                                        *
5 – Da impetrada modificação da decisão de facto proferida pelo tribunal a quo [ no âmbito das apelações de B e de  C ].
No âmbito da impugnação do apelante B  dirigida para a decisão de facto proferida pelo tribunal a quo, e para tanto socorrendo-se essencialmente em diversa apreciação da prova Testemunhal produzida em  sede de audiência de  discussão e julgamento, é entendimento do referido recorrente que exigia-se que o Tribunal a quo tivesse julgado como PROVADO que:
- Foi convencionado entre o exequente e os executados que, apesar da sua redacção, o escrito particular referido em 2.1 foi celebrado no pressuposto de que tivesse lugar a cessão de quotas a que se refere o contrato promessa identificado em 2.3., caso em que, só nesse caso, o exequente iria receber o valor indicado na aludida declaração de 04 de Fevereiro de 2003 ;
- Diversamente do que consta do documento particular identificado em 2.1, nunca o exequente despendeu a quantia de €63.596,00 para pagamento de dívidas da sociedade Café …, Lda ".
Outrossim o executado/apelante C, impugnando a decisão de facto proferida pelo tribunal a quo, considera que diversa deve ser a redacção do ponto de acto nº 2.7. , do mesmo passando a constar que “ Após e durante algum tempo, pelo menos um mês, o exequente trabalhou no estabelecimento em questão, desempenhando as tarefas que assumia antes da assinatura do acordo referido em 2.1..
A ancorar a aludida impugnação, invoca o executado/apelante C, sobretudo, o depoimento de parte do Exequente A e o testemunho de José ….  .
Porque ambos os recorrentes, observaram e cumpriram as regras/ónus processuais a que alude o artº 640º, do CPC, quer indicando os concretos pontos de facto que consideram como tendo sido incorrectamente julgados, quer precisando quais os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo de gravação nele realizada, que impunham uma decisão diversa da recorrida, quer, finalmente , indicando quais as diferentes respostas que deveria o tribunal a quo ter proferido, nada obsta, portanto, a que proceda este Tribunal da Relação à análise do “mérito” das solicitadas/impetradas alterações das  respostas aos pontos de facto impugnados.
E, de resto, e porque gravados os depoimentos das testemunhas pelos apelantes indicadas, procederam ambos ,outrossim, à indicação, com exactidão, das passagens da gravação efectuada e nas quais ancoram a ratio das impugnações deduzidas.
Ora bem
Começando pela impugnação da decisão de facto deduzida pelo executado/apelante C, e dirigida para o julgamento ( negativo)  da  2dª parte do quesito único, impetra o executado referido que se impunha que tivesse a Exmª juiz a quo julgado provado que” diversamente do que consta do documento particular identificado em 2.1, nunca o exequente despendeu a quantia de €63.596,00 para pagamento de dívidas da sociedade Café …, Lda ".
Em rigor, o que executado/apelante C pretende é, socorrendo-se de prova testemunhal , infirmar [ provando o contrário ] o que resulta das cláusulas SEGUNDA e QUARTA da DECLARAÇÃO a que se refere o item de facto nº 2.1. [ escrito particular e titulo executivo ].
Manifestamente, de desiderato se trata que, como não deve ignorar, ao executado C se mostra vedado em razão da aplicação de regras do Direito material probatório.
Senão , vejamos.
O Documento/DECLARAÇÃO a que se refere o item de facto nº 2.1, consubstanciando um documento particular e mostrando-se assinado pelos devedores/executados, incorpora em rigor o reconhecimento por ambos os  executados de uma obrigação pecuniária, logo, de título se trata que se subsume à previsão do artº 46º,nº1, alínea c), do CPC anterior ( o aplicável ) ao aprovado pela  Lei nº 41/2013, de 26 de Junho .
Tendo o exequente/embargado atribuído a autoria do documento particular aludido a ambos os executados,  alegando que pelos dois foi assinado, a verdade é que, em sede de oposição/embargos, não foi o mesmo (a declaração ) objecto de impugnação, nos termos do disposto no nº2, do artº 374º, do Código Civil, não tendo qualquer dos executados questionado a veracidade das assinatura/s na mesma  (a declaração ) aposta/s.
Inevitável é, portanto, da referida constatação, retirarem-se as necessárias consequências legais decorrentes da mera aplicação de regras vinculativas que emanam do direito material probatório.
Vejamos , pois , quais são elas.
Sendo in casu, como vimos já, a supra referida DECLARAÇÃO um documento particular  ( cfr. artº 363º, nºs 1 e 2, do CC ), impõe-se desde logo considerar como verdadeiras as assinaturas nele apostas pelos executados B e C, porque não impugnadas , e isto porque, o  nº1, do artº 374º, do CC, é expresso em estipular  que “A letra e a assinatura, ou só a assinatura, de um documento particular consideram-se verdadeiras, quando reconhecidas ou não impugnadas pela parte contra quem o documento é apresentado, ou quando esta declare não saber se lhe pertencem, apesar de lhe serem atribuídas, ou quando sejam havidas legal ou judicialmente como verdadeiras.”
Por sua vez, provada/estabelecida a autenticidade de um  documento [autenticidade do seu teor, decorrente do estabelecimento da autenticidade das assinaturas no mesmo apostas  – cfr. Artº 374º, do CC ] ,  e no que à respectiva - do documento particular referido -  força probatória diz respeito,  rezam agora os nºs 1 e 2, do artº 376º, do Código Civil , que “ 1. O documento particular cuja autoria seja reconhecida nos termos dos artigos antecedentes faz prova plena quanto às declarações atribuídas ao seu autor, sem prejuízo da arguição e prova da falsidade do documento. 2. Os factos compreendidos na declaração consideram-se provados na medida em que forem contrários aos interesses do declarante (…). ”
Ou seja, uma vez estabelecida a autenticidade da DECLARAÇÃO/DOCUMENTO que integra o ponto de facto nº 2.1., inevitável é considerar-se como provado, desde logo , que os seus autores emitiram as declarações que do mesmo constam [ sendo in casu a declaração dos executados B e C de que tem o exequente a receber de ambos e pelo capital disponibilizado ( pelo exequente e no pagamento de facturas na sociedade a título de pagamento das quotas prometidas no montante de €63.596,00  )  a totalidade de €63.596,00 ] ,  isto  por força do disposto no nº1, do artº 376º, do CC,  e  ,por outra banda, porque inquestionável é que os factos ( a existência de um crédito do exequente de €63.596,00 ) compreendidos na referida declaração são contrários aos interesses dos declarantes/executadosin casu os apelantes - , incontornável é que se impunha ao julgador considerar ou ter como pressuposto fáctico plenamente provado que o exequente/apelado disponibilizou verbas da sua conta pessoal para pagamentos de facturas na sociedade a título de pagamento das quotas prometidas no montante de €63.596,00  ( cfr. artº 376º,  nº 2 do  Código Civil ).
É que, porque na presença de meio de prova [ documento ] que goza de força probatória plena em relação a factos contrários aos interesses do declarante  ( cfr. nº2, do artº 376º, do CC ), vinculado está o julgador ( qual prova legal ou tarifada ) a extrair do mesmo as necessárias consequências legais no tocante ao reconhecimento e/ou demonstração da realidade de determinados factos ( cfr. Artº 341º, do CC ), e a  qual não pode de todo ceder – tal como acontece com a prova bastante -  perante a mera contraprova ( nos termos do artº 346º, do CC, e perante a dúvida ) , mas tão só em face da prova do contrário ( cfr. Artº 347º, do CC ).
Ademais, e em rigor, as declarações de ambos os executados vertidas na DECLARAÇÃO/Título identificado em 2.1,  porque  efectuadas perante a parte contrária/ora exequente (cfr. artº 358º, nº1, do CC), e consubstanciando o reconhecimento pelos embargantes/declarantes de factos que lhes são inequivocamente desfavoráveis  [ porque contrários aos seus interesses – cfr. artºs 352º, 358º,nº2 e 376º, nº2, todos  do CC ],  equivalem no essencial a uma confissão extrajudicial vertida em documento particular, e , assim sendo, em face do disposto nas referidas disposições legais, gozam também de força probatória plena.
Sucede que, importa não olvidar, podendo é vero o executado alegar e provar que, não obstante o por si declarado no documento  particular que assinou, a verdade é que “ nunca o exequente despendeu a quantia de €63.596,00  para pagamento de dívidas da sociedade Café ..., Lda "  [ efectuando assim a prova do contrário , cfr. Artº 347º, do CC ], o certo é que para o fazer OBRIGA o legislador a que se socorra o declarante de meio de prova mais difícil e custoso de produzir [ vg da confissão – artº 352º, do CC  (10) ] , estando-lhe de todo vedado socorrer-se para o referido feito tão só da PROVA TESTEMUNHAL.
É assim que, como decorre expressis verbis do nº 2, do artº 393º, do CC, “ (…) não é admitida prova por testemunhas, quando o facto estiver plenamente provado por documento ou por outro meio com força probatória plena “.
E é assim também que,  como agora do nº 1, do artº 394º, do CC, “ É inadmissível a prova por testemunhas, se tiver por objecto quaisquer convenções contrárias ou adicionais ao conteúdo de documento autêntico ou dos documentos particulares mencionados nos artigos 373.º a 379.º, quer as convenções sejam anteriores à formação do documento ou contemporâneas dele, quer sejam posteriores. “.
Em suma, em razão do preceituado nas disposições legais referidas por último, inequívoco é que não pode de todo uma parte, e em sede de impugnação de decisão de facto proferida pelo tribunal a quo, servir-se de prova testemunhal  [ e também por presunção judicial, nos ternos do disposto no artº 351º, do CC ] para infirmar o âmago da força probatória plena que cobre concreta factualidade reconhecida/confessada em  documento particular [ sendo porém já admissível para prova dos vícios da vontade ( erro, dolo, coacção ) ou da divergência entre a vontade e a declaração ( falta de vontade, erro na declaração, etc. , como o sustenta o Prof. Antunes Varela (11) ].
Não se desconhece que, há muito que defende Vaz Serra (12) [ entendimento que vem sendo seguido pela nossa jurisprudência, sobretudo pela do STJ (13) ] ,que não obstante do disposto no art. 394º do C.C. não decorrer a existência de excepções à regra proibitiva estabelecida ( a inadmissibilidade da prova testemunhal ) , podem/devem as mesmas ter-se por existentes em algumas hipóteses , designadamente e por exemplo quando : a) Existe um começo de prova por escrito do facto alegado ( isto é, qualquer escrito, proveniente daquele contra quem a acção é dirigida ou do seu representante, que torne verosímil o facto alegado ) - excepção que deve valer também para qualquer outra circunstância que torne verosímil o facto alegado; b) Tiver sido impossível a obtenção de uma prova escrita ; c) Tiver sido impossível prevenir a perda da prova escrita ; d) Quando, no que concerne a convenções posteriores ao documento, as circunstâncias do caso tornem verosímil que elas tenham sido realizadas  (esta fundada no direito italiano – art. 2727 º) e quando a prova testemunhal tiver em vista fazer valer a ilicitude do contrato dissimulado.
Mas, porque nenhuma das referidas excepções são in casu aplicáveis, ou seja, não pode de todo o executado recorrente socorrer-se da prova por testemunhas   para contrariar a prova plena [ cfr artº 347º, do CC ] de que goza o facto pela mesma coberto, provando não ser o mesmo verdadeiro, tal equivale a dizer que não se nos impõe conhecer da impugnação da decisão da matéria de facto quanto ao facto negativo/contrário pelo recorrente B  mencionado  [ o de “ Diversamente do que consta do documento particular identificado em 2.1, nunca o exequente despendeu a quantia de €63.596,00 para pagamento de dívidas da sociedade Café ..., Lda " ].
É que, insiste-se, não serve a prova testemunhal que o executado convocou, em sede de impugnação/apelação, para demonstrar o contrário do que consta do título executivo [ Declaração de 04 de Fevereiro de 2003  e mencionada em 2.1 ].
Seguindo-se a aferição da pertinência de dever a decisão de facto integrar um novo facto [ conforme o desejo do impugnante  B ], com a redacção de que “ Foi convencionado entre o exequente e os executados que, apesar da sua redacção, o escrito particular referido em 2.1 foi celebrado no pressuposto de que tivesse lugar a cessão de quotas a que se refere o contrato promessa identificado em 2.3., caso em que, só nesse caso, o exequente iria receber o valor indicado na aludida declaração de 04 de Fevereiro de 2003”, importa começar por precisar que, também na referida matéria, apenas convocou o impugnante a existência de prova documental.
Logo, a considerar-se que o facto referido [ outrossim julgado não provado pelo tribunal a quo ], consubstancia no essencial uma convenção contrária ou adicional ao conteúdo de documento particular [ a DECLARAÇÃO aludida em 2.1.], então as considerações supra deduzidas a propósito do facto atinente ao não dispêndio pelo exequente da quantia de €63.596,00, aplicam-se também, aqui e agora, mutais mutandis, não sendo o mesmo igualmente passível de prova testemunhal.
É que, estando como vimos já, a proibição do nº1, do artº 394º, do CC, direccionada para as convenções contrárias ou adicionais ao conteúdo do documento, que o mesmo é dizer, para uma convenção que contraria, por oposição, o contido no referido escrito, ou que tão só configura uma convenção complementar ao conteúdo do documento ou um mero  ajuste - que traz algo de novo ao negócio – (14) , é para nós inquestionável que a convenção que tem por desiderato o apelante B reconduzir ao elenco dos factos PROVADOS se traduz num evidente pacto  que é contrário ao conteúdo da DECLARAÇÃO vertida em 2.1..
Na verdade, estando dito na DECLARAÇÃO vertida em 2.1. que tem o exequente a receber dos executados e pelo capital disponibilizado pelo primeiro,  a totalidade de €63.596,00,  e devendo este valor acordado/fixado ser pago pelos ora executados em prestações mensais e sucessivas subsequentes à assinatura da aludida declaração ( que assinada foi a 04 de Fevereiro de 2003 ), data em que logo/de  imediato liquidam os executados o valor de €9,975,00,  de que lhe dão quitação, é óbvio que o facto probando e cujo julgamento negativo pelo tribunal a quo se mostra impugnado [ o de que o valor de €63.596,00 só seria pelo exequente recebido dos ora executados após a cessão de quotas a que se refere o contrato promessa identificado em 2.3. ], consubstancia manifesta convenção contrária ao conteúdo do documento/Declaração vertida em 2.1..
Logo, e tal como o já referido a propósito do outro ponto de facto impugnado pelo recorrente B, não se mostra o mesmo capaz de ser objecto de prova testemunhal, nos termos do nº1, do artº 394º, do CC, e sabido que tem este normativo por desiderato evitar-se que a eficácia do contido num documento escrito possa ser posto em causa através de um meio de prova mais aleatório e inseguro, como o é a prova testemunhal.
É que, como é reconhecido pela doutrina conceituada e considerada (15), a admissão de prova testemunhal de pactos contrários seria perigosa dados os riscos de tal prova ( falsidade ou infidelidade ) e traduzir-se-ia, praticamente, na inutilização do documento, sendo certo que é possível às partes munirem-se de uma prova escrita dos mencionados actos, a que acresce que, segundo as regras da experiência, o recurso pelas partes à forma escrita é normalmente integral no sentido de que a adopção da forma escrita pra parte de um acto documentado demonstra e comporta a sua escolha para todo o acto. (16)
Destarte, e não sendo igualmente mero caso de simples interpretação do contexto do documento/declaração, caso em que é já o recurso à prova testemunhal “lícita” [ cfr nº 3, do artº 393º , do CC ] , ou seja, de aferição tão só de elementos do negócio, designadamente sobre o fim ou o motivo do mesmo [ porque ambos não são contrários ao conteúdo do documento, nem constituem qualquer cláusula adicional à declaração (17) ], ou até do contexto do documento rectius a prova das circunstâncias em que a declaração foi produzida (18) , temos por adequado e inevitável considerar vedada a prova testemunhal para a efectiva comprovação do facto impugnado e ora em apreciação  .
Em conclusão, implicando a apreciação do mérito da impugnação da decisão de facto da primeira instância e pelo apelante B deduzida, a apreciação tão só da prova testemunhal produzida nos autos e em violação de regras vinculativas extraídas do direito probatório, forçoso é assim que a aludida impugnação deva improceder, da mesma não se podendo conhecer/apreciar
Improcede assim, in totum, a referida impugnação.
Sendo agora a vez de apreciar o mérito da impugnação da decisão de facto da primeira instância e pelo apelante C deduzida, recorda-se que, a ancorar a impetrada alteração da redacção do item de facto nº 2.7. [ passando do mesmo a constar que “Após e durante algum tempo, pelo menos um mês, o exequente trabalhou no estabelecimento em questão, desempenhando as tarefas que assumia antes da assinatura do acordo referido em 2.1. ] , invoca o executado/apelante o depoimento de parte do Exequente A e o testemunho de José …  .
No essencial, considera o apelante C que, desde que devidamente apreciados ambos os supra referidos depoimento e testemunho, e ao invés de constar – como consta do item nº  2.7. – a referência a  “pelo menos, uma semana”, deve do mesmo passar a constar a expressão de “pelo menos, um mês”.
Ora, ainda que por diverso fundamento, também a impugnação do apelante C não merece e exige da parte deste tribunal uma qualquer actividade cognitiva, da mesma não havendo que conhecer/apreciar.
Senão, vejamos.
É há muito entendimento uniforme e consensual na jurisprudência o de que , ainda que o recorrente/impugnante cumpra todos os diversos ónus contemplados no artº 640º, do CPC, em sede de impugnação da decisão de facto, tal observância por si só não obsta a que o tribunal ad quem não conheça do mérito da referida impugnação dirigida para determinados  e  concretos pontos de facto  quando, em rigor, tal tarefa venha a revelar-se como de todo inútil, postulando em última análise a realização pelo tribunal de recurso de uma concreta actividade cognitiva judicial de todo dispensável, porque inócua e irrelevante, logo não exigível.
É que, em obediência ao princípio da limitação dos actos, e porque não é lícito realizarem-se no processo actos inúteis (cfr. artº 130º, do CPC), também em sede de impugnação de decisão proferida pela primeira instância e relativa à matéria de facto, hão-de os concretos pontos de facto impugnados poderem - segundo as diversas soluções plausíveis das variadas questões de direito suscitadas - contribuir para a boa decisão da causa, maxime a respectiva e solicitada modificação há-de minimamente relevar para a almejada alteração do julgado.
Com efeito, como bem se decidiu em Ac. do Tribunal da Relação de Lisboa (19) “ Não há que conhecer da impugnação da decisão sobre a matéria de facto, por desnecessidade, mesmo que verificados os requisitos legais, se a alteração pedida for meramente instrumental em relação à solução jurídica pretendida por via do recurso“, razão porque , ainda que ao ad quem incumba apreciar todas as questões que lhe sejam colocadas pelo respectivo recorrente ( cfr. artº 608º,nº2, ex vi artº 663º,nº2, ambos do CPC ), devem porém tais questões estar “numa relação directa com o aquilo que se pretende obter com o provimento do recurso, pelo que tudo o que seja espúrio e desnecessário ao efeito pretendido não pode, nem deve, ser apreciado.
Alinhando por igual entendimento, também o TRP (20) decidiu ( e bem ) que “Se os factos cuja reapreciação é pretendida não têm a virtualidade de influir na possível solução jurídica do caso, o tribunal ad quem, em estrita observância da regra legal de que são proibidos os actos inúteis (artigo 130º do Código de Processo Civil), deve recusar-se a conhecer dessa matéria juridicamente inócua”.
É que, diz-se na douta decisão indicada em último lugar, se a matéria de facto impugnada é inócua, então “não tem aptidão para constituir objecto de uma impugnação da decisão da matéria de facto, já que do que se trata em qualquer caso, não é do apuramento de uma qualquer verdade absoluta ou ontológica, mas sim e de modo mais modesto, de uma verdade factual prática apta a desencadear ou suportar certas consequências jurídicas”.
E, ainda o mesmo Tribunal da Relação do Porto, em nova e posterior decisão (21), refere, “ se a reapreciação de concreta matéria de facto é inócua, à luz das diversas soluções plausíveis das várias questões de direito, e atento o carácter instrumental da reapreciação da decisão da matéria de facto, no sentido de que a reapreciação pretendida visa sustentar uma certa solução para uma dada questão de direito, a inocuidade da aludida matéria de facto justifica que este tribunal indefira essa pretensão, em homenagem à proibição da prática no processo de actos inúteis”.
Este entendimento, recorda-se, foi muito recentemente considerado “lícito” por parte do STJ, em Ac. de 17/5/2017 (22), nele se decidindo que o princípio da limitação dos actos, consagrado, no artigo 130.º do CPC, para os actos processuais em geral, pode/deve igualmente ser observado no âmbito do conhecimento da impugnação da matéria de facto se a análise da situação concreta evidenciar, ponderadas as várias soluções plausíveis da questão de direito, que desse conhecimento não advirá qualquer elemento factual cuja relevância se projecte na decisão de mérito a proferir
Dito isto, e sendo portanto exigível que subjacente a uma qualquer impugnação de decisão de facto há-de estar sempre a viabilidade e a pertinência de a pretendida modificação da decisão - de facto - proferida pela primeira instância poder contribuir ( claro está, segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito ) com relevância para a alteração do julgado, a verdade é que não se descobre [ e de resto também não a indica o próprio apelante C ]  qual a relevância, para a decisão do mérito dos embargos, da alteração da redacção do ponto de facto nº 2.7, passando a mesma a aludir a um período temporal de pelo menos, um mês”, que não apenas a um período temporal de “pelo menos, uma semana.
É que, se é o apelante C, persistente, incansável e desenvolvido em justificar a ratio da pretendida alteração da redacção do ponto de facto que impugna, é já e em absoluto omisso [ não obstante o disposto no artº 5º, nº3, do CPC ] na explicação da relevância da pretendida alteração para o desencadear de determinadas  consequências jurídicas, máxime para  alteração do julgado.
Ora, porque não serve o instituto da impugnação da decisão de facto para a parte manifestar e patentear a sua insatisfação com o julgamento de facto ou, tão só e como o refere o apelante, para a “ reposição da verdade dos factos e do exigível rigor”,  pois que, como vimos supra, em causa não está “o apuramento de uma qualquer verdade absoluta ou ontológica”, mas sim, e de modo mais modesto, a fixação de uma verdade factual capaz de desencadear ou suportar certas consequências jurídicas, o que não ser vislumbra que seja o caso da impugnação deduzida por C, não se conhece da mesma, porque irrelevante e inócua.
Em conclusão, a factualidade a atender no âmbito das apelações em julgamento é a fixada pelo tribunal a quo.
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6. - Se a sentença apelada, em razão da alteração da decisão do tribunal da 1ª instância proferida sobre a matéria de facto, ou independentemente de quaisquer alterações, se impõe ser revogada.
Para melhor compreensão do presente julgamento, recorda-se que estando em causa duas apelações, interpostas por cada um dos executados/oponentes B e C, o primeiro fundamenta a almejada revogação da sentença recorrida essencialmente em razão da alteração da decisão de facto proferida pelo tribunal a quo  e, o segundo, considera que a revogação da sentença se justifica no essencial porque enferma a mesma de uma errónea interpretação da matéria provada que conduziu a um consequente erro na respectiva fundamentação de direito, vindo a culminar numa decisão final para todos os efeitos injusta.
Tendo este tribunal decidido que não se justificava introduzir quaisquer alterações na decisão de facto proferida pelo tribunal a quo,  e sendo a legitimidade dos executados manifesta [ improcedendo as conclusões – HH a MM - recursórias em contrário do apelante B ] , porque deve a execução ser instaurada contra a pessoa que no título tenha a posição de devedor [ cfr artº 55º, do CPC ], resta aferir se, e tal como o considera sobretudo o apelante C, incorre a sentença recorrida numa errónea interpretação da matéria provada que conduziu a um consequente erro na respectiva fundamentação de direito, vindo a culminar numa decisão final injusta.
Já o tribunal a quo, em sede de sentença e após pertinentes considerações da Exmª Juiz tecidas a propósito da interpretação da declaração negocial, e analisando a factualidade provada, termina por concluir pela improcedência das oposições, discorrendo para tanto e em parte nos termos seguintes :
“(…)
Feito este excurso e revertendo ao caso concreto, visto o teor do documento dado à execução e à míngua de qualquer outra factualidade provada que nos explicite outro sentido de acordado entre as partes e/ou da sua vontade diversa do que consta literalmente ali escrito, temos por certo aquele documento como contrato atípico inominado se traduz um acordo que põe  termo a um contrato promessa verbal de cessão de quotas societárias e compensa o exequente pelos valores que este entregou " para pagamentos de facturas na sociedade a quotas prometidas no montante de €63.596,00", e é esse, na verdade, o sentido útil da ali mencionada existência de um contrato promessa de compra e venda mesmas quotas societárias a terceiros nele não outorgantes , a que respeita o documento de fls 22 ss destes autos .
Nada aponta no sentido de uma qualquer outra relação umbilical ou de dependência deste acordo e sua eficácia àquele outro contrato promessa de compra e venda a terceiros. Por que se assim fosse não deixaria de ter ali sido expressa a condição de pagamento daquele valor à celebração do contrato prometido de cessão de quotas e/ou de cumprimento dos pagamentos prestacionais mencionados neste contrato promessa de cessão de quotas e é claro que o não foi, vistos desde logo os termos da cláusula 5ª.
 Assim sendo, irreleva que o contrato promessa de cessão de quotas tenha sido incumprido e não tenha sido celebrado o contrato prometido, tão pouco que os executados não tenham recebido os valores acordados naquele primeiro contrato.
À luz do título e do pelos mesmos acordado com o exequente o remanescente do valor total de €63.596,00 que confessaram ser devedores para com o exequente e que se comprometeram a pagar-lhe e que não receberam naquela data deveria ter sido pago em prestações mensais e sucessivas como enunciadas na mencionada cláusula 5ª e não o tendo sido, como alegou o exequente no seu requerimento executivo, na data de tal incumprimento, venceram as restantes prestações em consonância com o disposto no artº 781º do CC.
Impõe-se assim concluir pelo infundado das prestações dos executados.”
Ora, conhecidas que são, em traços largos, os fundamentos da sentença recorrida e as razões ( explanas nas conclusões recursórias ) da discordância dos apelantes, e adiantando desde já o nosso veredicto, temos para nós que nenhum reparo se justifica fazer à sentença recorrida, sendo manifesta a qualidade de título executivo da DECLARAÇÃO a que se refere o item de facto nº 2.1., ou seja, a exequibilidade do aludido documento particular.
Senão, vejamos.
Sendo in casu aplicável o CPC na versão anterior à aprovada pela Lei 41/13, de 26.06 [ em face do disposto no nº 3, do artº 6º, da Lei 41/13, de 26.06 ], dizem-nos os respectivos artºs 45º ( nºs 1 e 2 ) e 46º ( nº 1, alínea c) ), que tendo toda a execução por base um Título, pelo qual se determinam o seu fim e os seus limites,  e  , podendo um dos fins ser o do pagamento de quantia certa, certo é que uma espécie de título executivo consiste precisamente no documento particular, assinado pelo devedor, que importem constituição ou reconhecimento de obrigações pecuniárias, cujo montante seja determinado ou determinável por simples cálculo aritmético de acordo com as cláusulas dele constantes.
Escalpelizando ambos os supra indicados dispositivos legais do CPC, temos assim que a existência/posse de um título executivo, portanto, integra/consubstancia um pressuposto de carácter formal (23) que condiciona a exequibilidade de um direito, conferindo-lhe o grau de certeza necessária à admissibilidade da acção executiva ( nulla executio sine título ) e, podendo ele ser definido como o “ (…) instrumento que é considerado condição necessária e suficiente da acção executiva” . (24)
É que, como refere Manuel de Andrade (25), um dos principais fundamentos da exequibilidade dos títulos executivos assenta precisamente narelativa certeza ou probabilidade julgada suficiente da existência da dívida, e portanto da inutilidade do processo declaratório , enquanto se torna presumível que ele levaria ao mesmo resultado que já se pode coligir da simples inspecção do título “.
Tal equivale a dizer que, o título executivo (26), sendo condição necessária da execução [ no sentido de que permite dispensar a prévia indagação sobre se existe ou não o direito de crédito que consubstancia, presumindo a existência da obrigação exequenda ] e na medida em que os actos executivos em que esta última se desenrola apenas podem ser praticados na sua presença, é também ele que lhe baliza os respectivos fins e os seus limites.
Concluindo, constitui em suma o título executivo o documento onde consta a obrigação cuja prestação coactiva se pretende conseguir, não se confundindo porém com a causa de pedir da acção executiva , a qual , nos termos do art. 498º do CPC, é o facto jurídico concreto, simples ou complexo, do qual emerge, por força do Direito, a pretensão deduzida pelo autor, constituindo, assim, a causa de pedir um facto e o título executivo um documento (27) .
Daí que, como bem refere Castro Mendes (28),” sendo o artº 193º disposição geral e comum, parece que também o requerimento inicial para uma acção executiva deve ser tido como inepto se não contiver menção duma causa de pedir (…): se por exemplo o credor dispuser dum título meramente probatório, uma escritura pública de confissão de dívida por exemplo, que não faça referência à causa debendi, não pode instaurar a acção executiva remetendo apenas para o título, e abstendo-se de indicar no requerimento da execução a causa de pedir ”.
Analisando agora o também mencionado artº 46º, do CPC, nele (nas suas diversas alíneas) encontram-se enumerados/descritos, de uma forma taxativa, quais os títulos executivos susceptíveis de servirem de base a uma execução, podendo eles serem judiciais e/ou extrajudiciais, e incluindo-se nestes últimos , precisamente, os documentos  particulares.
Para tal, basta que, como o refere a aludida alínea c), do nº1, do  artº 46º do CPC [ na redacção introduzida pelo DL 226/2008, de 20 de Novembro, aplicável aos processos dados entrada após 31 de Março de 2009 ], e repetindo-nos, se esteja na presença de documentos “assinados pelo devedor, que importem constituição ou reconhecimento de obrigações pecuniárias, cujo montante seja determinado ou determinável por simples cálculo aritmético de acordo com as cláusulas dele constantes, ou de obrigação de entrega de coisa ou de prestação de facto”.
Ou seja, nos termos e para efeitos de integrar o tatbestand da referida alínea c), do nº1, do artº 46º, do CPC, importa que o documento particular revele a se a constituição de uma obrigação ou o reconhecimento da existência de uma obrigação anteriormente constituída, estando ainda a executoriedade das obrigações pecuniárias nele previstas dependente da respectiva liquidez ou da sua liquidação por mero cálculo aritmético.
Postas estas breves considerações, e sendo in casu inquestionável que a acção executiva instaurada pelo apelado A e com vista à cobrança coerciva de quantia certa mostra-se estar ancorada em documento/escrito particular assinado por ambos os  apelantes/executados, é assim manifesto que é por referência à al. c) do nº 1 do artigo 46º do Código de Processo Civil que pode e deve ser aferida a exequibilidade do documento com base no qual foi instaurada - pelo ora apelado - a acção executiva cuja extinção da respectiva instância é pretendida por ambos os apelantes .
Ora, tendo presente que em sede de interpretação das declarações negociais constantes e apostas no documento identificado em 2.1. da motivação de facto do presente Ac., importa lançar mão das regras que constam dos artºs 236º a 238º, do Código Civil , que é o mesmo que dizer , manda o critério objectivo de interpretação ( impressão de um declaratário normal colocado na posição do real declaratário - cfr. artigo 236º, nº 1 ) , sendo que, não pode porém a declaração valer com um sentido que não tenha um mínimo de correspondência o texto do respectivo documento ( cfr. artº 238º, nº 1, do Código Civil), manifesto é que, e desde logo, do título que suporta a execução consta, com toda a clareza e evidência, o imediato reconhecimento pelos executados da existência de uma obrigação constituída perante o exequente, isto por um lado.
É assim que, constando, como conta, da cláusula QUARTA do titulo executivo a que alude o ponto de facto nº 2.1, que “ Tem o Segundo a receber dos Primeiros pelo capital disponibilizado na totalidade de €63.596,00”, temos para nós que, um qualquer declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, só pode interpretar a aludida declaração negocial como equivalendo ao reconhecimento pelos apelantes ( os primeiros declarantes/outorgantes ) de uma obrigação pecuniária do referido montante e em relação ao apelado/credor ( o segundo declarantes/outorgante).
Acresce que, ainda do próprio título/documento, consta outrossim a indicação da causa debendi, explicando designadamente a respectiva cláusula segunda que o capital disponibilizado e da totalidade de €63.596,00 e ao qual se refere a Cláusula Quarta, relaciona-se com os montantes que o A disponibilizou para pagamentos de facturas na sociedade CAFÉ …,Ldª, desde 18.03.02  até  04 de Fevereiro de 2003.
Ex adverso, já a versão dos apelantes, no sentido de que a obrigação do pagamento ao apelado/exequente do montante de €63.596,00, só seria devida desde que cumprida com o produto obtido - pelos apelantes – após a efectiva outorga do contrato definitivo de cessão de quotas objecto do contrato promessa identificado em 2.3 , o que equivale a dizer que a efectiva outorga do contrato de cessão de quotas acaba por configurar como a condição ( suspensiva ou mesmo resolutiva, nos termos do artº 270º, do CC ) do direito do apelado, é explicação que, com todo o respeito pelo entendimento dos apelantes, está longe, e muito, de se poder basear na factualidade que se mostra provada ( que é o que importa , sendo que, os depoimentos das testemunhas, porque de mero meio de prova se trata, apenas servem em sede de julgamento da matéria de facto).
Desde logo, e sendo pacífico que a descoberta de qual a  vontade real comum dos pactuantes subjacente à emissão da declaração negocial a que alude o item de facto 2.1. , por integrar matéria de facto [ que não de Direito (29) ], deve incidir sobre pertinente factualidade que se mostre PROVADA, a verdade é que é a factualidade provada manifestamente omissa relativamente a tal matéria.
Ou seja, não existem factos, concretos e provados, que obriguem a concluir que subjacente à subscrição pelo exequente e executados da DECLARAÇÃO identificada em 2.1. esteve e/ou presidiu uma vontade real e comum de todas as partes com o conteúdo e alcance da versão defendida pelos  apelantes, ou seja, que o montante de €63.596,00 apenas ser devido ao exequente desde que efectivamente celebrado o contrato definitivo de cessão de quotas objecto do contrato promessa identificado em 2.3 .
Já lançando mão dos critérios legais de inter­pretação dos negócios jurídicos e que se mostram fixados nos artºs 236º a 238º,  do CC, também não se descortina que tenha o tribunal a quo chegado a resultados de todo indefensáveis, bem pelo contrário, tudo apontando para que a respectiva actividade interpre­tativa não seja de todo passível de qualquer reparo, antes se mostram respeitados os critérios normativos consagrados na lei .
Na verdade, não se apurando – como é o caso - a vontade real do declarante ou o conhecimento da vontade real do outro contraente [ cfr. nº2, do artº 236º, do CC ], logo, devendo a declaração negocial valer com o sentido que um declaratário normal ( medianamente instruído, diligente e sagaz ), colocado na posição do declaratário efectivo, possa depreender/compreender do que brota dos termos do conteúdo da DECLARAÇÃO identificada em 2.1, designadamente após a leitura das suas primeiras 5 cláusulas, e pensando-as e sobre as mesmas reflectindo, não se concebe como sustentar que o direito do apelado/exequente que se mostra plasmado na cláusula QUARTA tenha pelas partes ficado subordinado à verificação de uma qualquer condição, designadamente de natureza suspensiva
É que, e como acima já o salientámos, dispondo a cláusula QUINTA da DECLARAÇÃO, que do valor acordado na cláusula QUARTA, o montante/parcela de € 9,975,00  será paga ”nesta data (…), de que lhe dão quitação”, temos para nós que, qualquer declaratário normal e de diligência média, não deixaria de considerar que a interpretação pela qual se batem os apelantes não merece qualquer aceitabilidade .
De resto, e sendo verdade que aponta o conteúdo da DECLARAÇÃO dos autos para a existência de alguma ligação entre a mesma e um outro negócio ou contrato promessa , a verdade é que é a cláusula SEGUNDA clara em evidenciar que a aludida ligação existe com maior relevância com referência ao contrato promessa verbal de cessão de quotas ( estabelecido entre os actuais exequente e executados ), do que em relação ao contrato promessa de cessão de quotas identificado em 2.3..
Com efeito, a quantia de €63.596,00 e à qual se refere a cláusula QUARTA, mostra-se mais associada ao contrato promessa verbal de cessão de quotas ( estabelecido entre os actuais exequente e executados ), pois que, e tal como o explica a primeira parte da cláusula SEGUNDA, relaciona-se a mesma com verbas disponibilizadas pelo promitente cessionário do contrato promessa verbal referido.
Por último, sabendo-se que nos negócios formais, a declaração não pode valer com um sentido que não tenha um mínimo de correspondência no texto [ cfr.  artº 238, nº1, do CC ], ou seja, para que possa va­ler, o sentido atribuído pelo “declaratário normal” deverá estar expresso, ainda que de forma imperfeita, no próprio texto do documento/declaração,  também por esta razão não pode, de todo, a DECLARAÇÃO  do item 2.1. ser interpretada da forma como o fazem [ em conformidade com a defesa dos respectivos interesses ] os apelantes.
É que, lidas e conjugadas articuladamente e entre si todas as cláusulas inseridas na DECLARAÇÃO identificada no ponto de facto nº 2.1., dificilmente se poderá admitir que, ainda que imperfeitamente expresso,  tenham as partes subordinado o Direito do apelante e ao qual se refere a respectiva Cláusula QUARTA a uma condição [ potestativa, porque na dependência de um dos sujeitos da relação condicional ] suspensiva (30) , a ponto de até à concretização [ conditio pendet ] do contrato definitivo [ o evento condicionante ] objecto do contrato promessa identificado em 2.3. , apenas dispor o ora apelado de uma mera expectativa de vir a adquirir o direito a exigir dos ora apelantes o pagamento do capital disponibilizado na totalidade de €63.596,00.
Na verdade, porque existindo um negócio pendente conditione, em rigor não entra em vigor a regulação de interesses estatuído no negocio condicionado sem que se verifique o evento condicionante, a ponto de vg não estar o devedor condicional obrigado a cumprir a prestação prometida, e não dispondo também o credor de um direito exercitável [ mas tão só de uma expectativa , não existindo, correlativamente, um verdadeiro débito ( nihil interim debetur ), mas tão só uma certa probabilidade de ele vir a nascer ( spes debitum iri ) (31) ] , basta atentar na conjugação do estipulado nas cláusulas QUARTA e QUINTA da DECLARAÇÃO para, sem margem para quaisquer dúvidas, se concluir que a interpretação dos apelados não tem um mínimo de correspondência no texto daquela - DECLARAÇÃO.
Logo, no seguimento das considerações que antecedem, tudo visto e ponderado, não temos dúvida em concluir que a decisão adoptada pelo tribunal a quo foi acertada e é de manter, não sendo de acolher os fundamentos recursórios dos apelantes.
Bem andou, portanto, o tribunal a quo em concluir pela titularidade pelo apelado de título executivo, a saber, de um documento com idoneidade legal bastante para servir de base à execução que interpôs.
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7. - Se, ainda que a execução deva prosseguir, os juros reclamados não são devidos.
Sendo agora o momento de conhecer da questão suscitada mas não apreciada pelo tribunal a quo, a saber, da pertinência de o exequente reclamar a cobrança coerciva de juros de mora e quando do titulo executivo nada consta a tal propósito, importa de imediato deixar claro que há muito que de questão se trata que deixou de fazer parte do rol das vexatae quaestiones, máxime a partir do momento em que, com o Decreto-Lei n.º 38/2003 ,de 8 de Março , foi acrescentado ao artº 46º, do CPC, um nº 2, e com a redacção de “ Consideram-se abrangidos pelo título executivo os juros de mora, à taxa legal, da obrigação dele constante.”.
Ou seja, e como explica Carlos Francisco de Oliveira Lopes do Rego (32), a partir da tão desejada intervenção legislativa que clarificasse de uma vez por todas a então vexata quaestio atinente aos jutos de mora em sede de acção executiva, e relativamente a títulos executivos omissos relativamente a tal matéria, como que foi ampliado o âmbito do título executivo, de modo a considerar nele compreendidos – qualquer que seja a sua natureza – os juros de mora, à taxa legal, da obrigação dele constante, sendo, deste modo, possível ao exequente requerer a execução de tais juros moratórios – mas já não dos juros convencionais – mesmo quando o título executivo ( judicial ou extrajudicial ) seja omisso quanto à respectiva obrigação acessória, decorrente directa e automaticamente da Lei.
Em uma, face à nova redacção do art. 46º do pretérito CPC, introduzida pelo DL nº 38/2003, de 8/3, e que iniciou a sua vigência em 15/9/2003, mas apenas aplicável aos processos instaurados a partir dessa data, os juros de mora, à taxa legal, estão abrangidos pelo título executivo da obrigação dele constante, o que de resto o legislador não alterou com o NCPC aprovado pela Lei Nº 41/2013, de 26 de Junho .
Sem necessidade de mais considerações, porque de todo escusadas, e improcedendo também a apelação do executado no tocante à questão acabada de analisar, temos assim que ambas as apelações improcedem in totum.
Em conclusão, as apelações de B e de C ,improcedem, impondo-se a confirmação da sentença recorrida
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8 – Sumariando  ( cfr. nº 7, do artº 663º, do cpc ) .
8.1 - Em face do disposto no nº 2, do artº 393º, e  nº 1, do artº 394º, ambos do CC, inequívoco é que não pode de todo uma parte, e em sede de impugnação de decisão de facto proferida pelo tribunal a quo, servir-se de prova testemunhal  [ e também por presunção judicial, nos ternos do disposto no artº 351º, do CC ] para infirmar o âmago da força probatória plena que cobre concreta factualidade reconhecida/confessada em  documento particular [ sendo porém já admissível para prova dos vícios da vontade ( erro, dolo, coacção ) ou da divergência entre a vontade e a declaração ( falta de vontade, erro na declaração, etc. )].
8.2Perante o referido em 8.1., e não invocando o impugnante qualquer outro meio de prova a ancorar o alegado erro do julgador em sede de julgamento de facto, inevitável é a improcedência da aludida impugnação, a qual de resto e à partida não merece sequer ser conhecida/apreciada por conduzir à violação de regras vinculativas extraídas do direito probatório.
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9.- Decisão.
Em face de tudo o supra exposto,
acordam os Juízes na 6ª Secção Cível, do Tribunal da Relação de LISBOA , em , não concedendo provimento às apelações de B e de C:
9.1. -  Confirmar a sentença apelada, devendo assim -  tal como o decidido pelo tribunal a quo - , prosseguir a execução.
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Custas pelos apelantes .
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(1)  Cfr. o Ac. do STJ  de 5/5/2005, in www.dgsi.pt.
(2)  Cfr. o Prof. José Alberto dos Reis, in C.Proc.Civil anotado, V , Coimbra Editora, 1984, pág.139 a 141 ;  Prof. Antunes Varela e Outros, in Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág. 687 a 689 e Luís Filipe Brites Lameiras, in Notas Práticas ao Regime dos Recursos em Processo Civil,  2ª. Edição, Almedina, 2009, pág.36.
(3)  Cfr. v.g. o Ac. do STJ de 6/5/2004, disponível in www.dgsi.pt.
(4)  In Código de Processo Civil , Anotado, Vol. 2º, pág. 670.
(5) In Código de Processo Civil, Anotado, Vol. V, 1984, pág. 143/145.
(6) Cfr. ANTÓNIO SANTOS ABRANTES GERALDES, Juiz-Conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça, in sentença Cível, texto-base da intervenção efectuada nas “Jornadas de Processo Civil” organizadas pelo CEJ, em 23 e 24 de Janeiro de 2014).
(7)  Cfr. Ac. do STJ de 9/12/2004, disponível in www.dgsi.pt.
(8)  Cfr. José Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil, 1984,  anotado, Volume V,  pág. 489.
(9)  Cfr. Abílio Neto, in Código de Processo Civil anotado, 2007, pág. 1020.
(10) Vide, v.g., os Acs. do STJ de 02-11-2017 [  Processo nº  420/16.9T8STR.E1.S1, sendo Relatora ROSA RIBEIRO COELHO ] , de
02-06-2016
[ Processo 781/11.6TBMTJ.L1.S1, sendo Relatora FERNANDA ISABEL PEREIRA ] , de 17-03-2016 [ Processo nº 294/12.9TBPTB.G1.S1, sendo Relator SALAZAR CASANOVA ], e de 17-12-2015 [ Processo nº 940/10.9TVPRT.P1.S1, sendo Relator ABRANTES GERALDES ] , todos eles disponíveis in www.dgsi.pt.
(11) In Manual de Processo Civil, 1984, Coimbra Editora,  págs. 503 e segs.
(12) In R.L.J., Ano 103, págs. 10 e seguintes, e Ano 107, págs. 309 e seguintes. No mesmo sentido, também o Prof. Mota Pinto, com a colaboração do Prof. Pinto Monteiro, em Parecer, publicado na CJ, Ano X, T. 3, pp. 9 e seguintes, e Luís A. Carvalho Fernandes, in “A prova da simulação pelos simuladores”, in Estudos Sobre a Simulação, Quid Juris, 2004, págs. 53.
(13) Vide, de entre muitos outros, o Ac do STJ de 09-10-2008 , Processo nº 08B1914, sendo Relator SANTOS BERNARDINO e disponível in www.dgsi.pt.
(14) Cfr. Ac. do Tribunal da Relação de Coimbra, de 19-09-2006, Proc. nº 610-A/2002.C1, e disponível in www.dgsi.pt
(15) Cfr. Vaz Serra, in Provas, Direito Material, In Boletim do MJ nº 112, págs 178 , 193,202.
(16) Cfr  Luís  Filipe Pires de Sousa, Prova Testemunhal, 2013, pág. 218.
(17) Cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, in Código Civil Anotado, Volume I, 2ª edição, Coimbra, 1979, pág. 319, e José Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil Anotado, Volume IV, Coimbra, 1984, pág, 317.
(18) In Boletim do MJ nº 112/191ss. e na RLJ , nºs 101/270ss, 103/13ss. ou 107/311ss.
(19) Ac. de 14/3/2013, Proc. nº 933/11.9TVLSB-A.L1-2, e disponível in www.dgsi.pt.
(20) Ac. de 17/3/2014, Proc. nº 7037/11.2TBMTS-A.P1, e disponível in www.dgsi.pt.
(21) Ac. de 19/5/2014, Proc. nº 2344/12.0TBVNG-A.P1, e disponível in www.dgsi.pt.
(22) In Proc. nº 4111/13.4TBBRG.G1.S1, sendo Relatora a Exmª Juiz Conselheira FERNANDA ISABEL PEREIRA, e disponível in www.dgsi.pt.
(23) Cfr José Lebre de Freitas, in A Acção Executiva, Depois da reforma da reforma,  5 ª Edição, pág. 29.
(24) Cfr. Anselmo de Castro, in A acção Executiva Singular, Comum e Especial, Coimbra Editora, 1977, pág. 14.
(25)  In Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra Editora, pág. 60.
(26) Que consiste num documento, que constitui prova legal para fins executivos, e que a declaração nele representada tem por objecto o facto constitutivo do direito de crédito ou é, ela própria, este mesmo facto - cfr. José Lebre de Freitas, ibidem pág. 66..
(27)  Cfr. Antunes Varela, in RLJ, ano 121º, pág. 147 e 148.
(28)  In  “ Acção Executiva”, aafdl, 1980, pág. 7.
(29)  Cfr. v.g. o Ac. do STJ de 5/1/2016, Proc. nº 146/13.5TCFUN-A.L1.S1 e disponível in www.dgsi.pt
(30) Cfr Manuel de Andrade , in Teoria-Geral da Relação Jurídica, Vol. II, Facto Jurídico , em especial Negócio Jurídico, Almedina, 1964,  págs 356 e segs.
(31) Cfr Manuel de Andrade, ibidem, pág 378.
(32) In Comentário ao CPC, Vol. I, Almedina, pág. 84
                                            ***
Lisboa, 24/1/2019

António Manuel Fernandes dos Santos  ( O Relator)
                         
Eduardo Petersen Silva ( 1º Adjunto)
                 
Cristina Isabel Ferreira Neves ( 2ª Adjunta)