Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
307/17.8T8LSB.L1-4
Relator: PAULA SANTOS
Descritores: PROCEDIMENTO DISCIPLINAR
RESPOSTA À NOTA DE CULPA
DECLARAÇÃO RECEPTÍCIA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 10/25/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA A SENTENÇA
Sumário: I–A resposta à nota de culpa não constitui uma declaração receptícia.

II–Considerar que tem aplicação o disposto no artigo 224º nº1 do C.Civil à apresentação da resposta à nota de culpa é, no fundo, restringir parcialmente o prazo concedido ao trabalhador para contestar a acusação do empregador, com prejuízo evidente para o exercício do direito de audição.

III–É tempestiva a resposta à nota de culpa remetida por via postal no último dia do prazo, sendo irrelevante a data em que chega ao conhecimento do Réu.

(Sumário elaborado pela relatora)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa.


I–Relatório:


AAA intentou a presente acção de impugnação de decisão disciplinar, sob a forma de processo especial, contra o BBB, pedindo seja declarada nula a decisão disciplinar impugnada, por falta da sua audição e por omissão da realização das diligências instrutórias que requereu. Caso assim se não entenda, pede seja anulada a dita decisão disciplinar com fundamento em erros de facto e de direito.

Alega, em síntese, que:
- é sócio do Réu;
- por ofício datado de 7 de Junho de 2016 e recebido em 14 de Junho de 2016, o Réu comunicou-lhe que lhe havia instaurado procedimento disciplinar com intenção de aplicar a sanção prevista no art. 53º dos seus Estatutos, mais o notificando da nota de culpa deduzida no âmbito daquele procedimento;
- solicitou a consulta do processo, a consulta das actas da Direcção, da Comissão Executiva e do Conselho Geral do Réu, desde 1 de Janeiro de 2010 até 14 de Junho de 2016, a consulta dos Relatórios de Contas do Réu desde 2010 e dos pareceres do Conselho Fiscal e certificação do Revisor Oficial de Contas,  e a fixação de prazo não inferior a 20 dias para que pudesse responder à nota de culpa, tendo em consideração a sua complexidade;
- em 16 de Junho de 2016, o instrutor do procedimento comunicou que o procedimento estaria disponível para consulta no dia 21 de Junho de 2016, que lhe seria facultada a consulta dos documentos que entendesse necessários à sua defesa, e que lhe era concedido o prazo de dezassete dias para responder à nota de culpa;
- o prazo par responder à nota de culpa terminava a 1 de Julho de 2016;
- as actas da Comissão Executiva desde 1 de Janeiro de 2010 até 14 de Junho de 2016, bem como as actas da Direcção e do Conselho Geral de 2016 do Sindicato Réu, incluindo as que terão deliberado a comunicação dos factos ao Conselho de Disciplina do Réu, não constam do processo disciplinar e não foi facultado ao Autor, nem o acesso, nem cópia das mesmas;
- no dia 1 de Julho de 2016, remeteu ao Réu a resposta à nota de culpa, por correio registado, na qual suscitava: a nulidade do procedimento, mormente por lhe não terem sido facultados, para consulta, os documentos que havia requerido; a prescrição do procedimento disciplinar em relação aos factos ocorridos antes de Junho de 2015; a caducidade do procedimento disciplinar em relação a todos os factos que tivessem sido levados ao conhecimento de qualquer órgão do réu em data anterior a 15 de Abril de 2016; impugnou os factos imputados e/ou a sua relevância disciplinar; requereu a audição de dez testemunhas;
- o Réu não realizou nenhuma das diligências probatórias que requereu;
- no dia 19 de Outubro de 2016, foi notificado da decisão da Direcção do Réu no âmbito do procedimento disciplinar, tendo-lhe sido aplicada a sanção disciplinar de inelegibilidade no processo eleitoral imediato;
- dessa decisão recorreu para o Conselho Geral do Réu, que julgou improcedente o recurso interposto;
- o procedimento disciplinar é nulo em virtude de não lhe terem sido facultados documentos essenciais; por não ter sido admitida, por extemporânea, a sua resposta à nota de culpa, para além de, nessa sequência, não terem sido realizadas as diligências probatórias que requereu;
- a decisão disciplinar padece de erros de facto e de direito por se mostrar caduco o direito a aplicar a sanção, por estar prescrito o exercício do poder disciplinar relativamente a todos os factos ocorridos em data anterior a 14 de Junho de 2015, por estar caduco o procedimento disciplinar, e por os factos imputados não consubstanciarem qualquer infracção disciplinar.
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Foi proferido despacho que ordenou a citação do Réu para, querendo, responder ao requerimento apresentado pelo Autor e, bem assim, para proceder à junção aos autos do procedimento disciplinar instaurado.
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O Réu respondeu ao requerimento do Autor e juntou o procedimento disciplinar.


Alega, em síntese, que:
- o Autor teve oportunidade de consultar o procedimento disciplinar e todos os documentos, enquanto arguido em procedimento disciplinar, direito que não se confunde com o do sócio a consultar actas e outros documentos do Réu;
- a resposta à nota de culpa apenas foi recepcionada no dia 4 de Julho de 2016, logo depois do prazo de que o Autor dispunha para o efeito, posto que este terminava no dia 1 de Julho de 2016;
- todas as decisões tomadas no âmbito do procedimento disciplinar instaurado foram-no pelos órgãos estatutariamente competentes;
- inexistiu qualquer extensão da matéria disciplinar, conforme aduz o Autor, e ainda que tivesse existido, estaria ratificada pela postura dos órgãos sociais estatutariamente responsáveis, ao extraírem as consequências do procedimento disciplinar;
- a decisão disciplinar foi proferida tempestivamente;
- o procedimento disciplinar não se mostra extinto, por prescrição, uma vez que os factos imputados ao Autor ora revestem matéria criminal ora traduzem-se numa prática continuada; - o procedimento disciplinar não padece de caducidade uma vez que os órgãos com competência disciplinar apenas tiveram conhecimento dos factos no dia 14 de Abril de 2016, sendo que a nota de culpa foi remetida ao autor no dia 7 de Junho de 2016;
- os factos imputados ao Autor constituem clara desobediência ao que dispõem os Estatutos do Réu, sendo que a sua actuação feriu de forma grave os seus deveres enquanto sócio e enquanto tesoureiro, sendo, assim, lícita e inteiramente justificada a sanção que lhe foi aplicada.
Conclui pela improcedência da acção.
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Notificado da resposta do Réu e dos documentos juntos, alegou o Autor que o procedimento disciplinar se mostra desordenado e sem numeração, desconhecendo se está completo, impugnando a sua genuinidade e fidedignidade.
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O Réu, em resposta, pugnou pela fidedignidade do procedimento junto aos autos.
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Foi dispensada a realização de audiência prévia.
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Foi proferido despacho saneador, o qual conheceu da validade e regularidade da instância.
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Foi proferido saneador-sentença, que julgou “procedente a acção e, consequentemente, julga nulo o procedimento disciplinar movido pelo réu ao autor por violação do seu direito de audição e por não terem sido efectuadas as diligências por este requeridas.
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Custas a cargo do réu (art. 527.º, n.º 1, do Código de Processo Civil).”
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Inconformado, o Réu interpôs recurso, concluindo que
1.Caso o acórdão que recaia sobre o presente recurso, venha a confirmar a sentença recorrida, pelos mesmos ou diferentes fundamentos, deverá então ser submetido à decisão do Plenário da Relação de Lisboa, dado conflituar com jurisprudência anteriormente citada o que preventivamente e por mera cautela de patrocínio se suscita.
2.De facto a sentença do M. Juízo a quo, que considera tempestiva a Resposta à Nota de Culpa não tem qualquer respaldo na Lei nem na Jurisprudência corrente pacífica firmada.
3.De facto a abundante Jurisprudência citada na presente apelação é inequívoca no sentido de caracterizar a Resposta à Nota de Culpa como uma declaração receptícia.
4.Desta caraterização jurídica da Resposta à Nota de Culpa resultam óbvias e manifestas consequências também de natureza jurídica.
5.Não pode o M. Juízo a quo numa atitude “pioneira” e inusitada , tomar uma decisão que não tem qualquer correspondência com a realidade fáctica e de Jure.
6.De facto a decisão da primeira instância considera que a Resposta à nota de Culpa não é uma declaração receptícia, e deste postulado infere uma série de consequências que não têm qualquer consequência com a realidade.
7.Ou seja, ao considerar que a Resposta à Nota de Culpa não tem natureza receptícia, bastando a data da emissão da receção e não o seu conhecimento, infere erradamente que a tempestividade da Resposta à Nota de Culpa nos presentes Autos, a sua consequente admissibilidade e na sequência que houve omissão na realização dos diligências probatórias requeridas.
8.Insiste o Recorrente que tal entendimento é manifestamente contra-legem e a Jurisprudência firmada.
9.Recorde-se que o Recorrente ao invés do prazo de 10 dias que estipulam os respetivos Estatutos concedeu um prazo de 17 dias, período mais do que suficiente para o Recorrido e Ex-Tesoureito responder à Nota de Culpa.
10.Tendo a Respetiva Resposta à Nota de Culpa natureza receptícia não cabe ao recorrente sindicar se mesma é remetida via email, por fax, ou por entrega presencial, podendo o recorrido remetê-lo da forma que entender, desde que seja conhecida do destinatário dentro do prazo concedido.
11.É no mínimo caricato referir como faz a sentença a quo que a alusão a uma morada se destina a indicar que apenas pode comunicar por essa via, o que aliás é desmentido pela prática do recorrido que comunicou na pendência do processo por email e fax.
12.O que diria a M. Juiz a quo se não houvesse menção a morada da arguente…
13.Se o prazo para responder à Nota de Culpa da então arguente e ora Recorrente terminava no dia 1 de Julho de 2016 e só é por esta recepcionada e conhecida no 4 de Julho de 2016, dada a natureza receptícia da referida declaração é manifesta a sua extemporaneidade, sendo neste caso irrelevante a data do registo postal mas o seu conhecimento pelo recorrente, o qual foi intempestivo.
14.Assim sendo agiu o Recorrente corretamente e de acordo ao não admitir a Resposta à Nota de Culpa e consequentemente não realizar as diligências peticionadas.
Termos em que deve ser revogada a douta sentença recorrida e consequente decretada a validade do procedimento disciplinar, por só o Recorrido ser responsável pela não admissão da resposta à nota de culpa, conforme jurisprudência corrente e pacifica firmada, seguindo-se os ulteriores termos do processo, até final.
Assim se fará Justiça!
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O Autor contra-alegou, concluindo nas suas alegações que
A.A resposta à Nota de Culpa em processo disciplinar, na medida em que não encerra qualquer declaração destinada a constituir, modificar ou resolver negócio jurídico existente entre declarante e declaratário, não pode ser arvorada em declaração negocial a que seja aplicável o disposto na 1ª parte do nº 1 do art. 224º, do Cód. Civil, isto é, que possa ser qualificada como receptícia.
B.A resposta à Nota de Culpa, precisamente porque não visa nem é susceptível de produzir qualquer efeito jurídico no negócio jurídico em que se insere, deve ser havida como não receptícia, atento o disposto na 2ª parte do nº 1 do art. 224º, do mesmo diploma, pelo que se torna eficaz no momento em que é emitida.
C.No caso dos autos, terminando o prazo concedido para a resposta à Nota de Culpa em      1 de Julho de 2016 e tendo, nessa data, o Recorrido expedido, por correio registado, para o endereço indicado pelo Recorrente na notificação da Nota de Culpa, a sua resposta a esta, é a mesma oportuna, sendo ilegal e geradora de nulidade do processo disciplinar, a decisão de não receber, por extemporânea, tal resposta e de recusar as diligências de prova na mesma requeridas, como bem se decidiu na Sentença impetrada.
D.É escassa e contraditória a jurisprudência nacional sobre a questão da qualificação da natureza da resposta à Nota de Culpa e do cômputo do prazo para a mesma, no que concerne ao seu termo final; porém, em questão conexa, a que não se deve deixar de atender, considerando a unidade do sistema jurídico, é basta e concordante a jurisprudência no que concerne ao prazo para prolação pela entidade arguente da decisão final no processo disciplinar, a que se refere o nº 1 do art. 357º, do Cód. Trabalho, no qual considera não se incluir o tempo necessário para a comunicação da decisão ao arguido, pelo que mal se entenderia que igual entendimento não se aplicasse ao prazo de que o arguido dispõe para o exercício dos seus direitos de defesa, diminuindo este.
E.O nº 1 do art. 355º, do Cód. Trabalho, tal como qualquer outra disposição que fixe prazo para a resposta à Nota de Culpa em processo laboral ou conexo, como é o caso dos autos, deve ser interpretado no sentido de que aquele prazo é o de que o arguido dispõe para preparar a sua defesa, podendo utilizá-lo na íntegra para esse efeito, não se contando no mesmo o período que eventualmente seja necessário para assegurar o tempo de correio, caso tal resposta seja expedida por essa via; só assim se assegura a igualdade entre todos os arguidos, nomeadamente entre os que possam fisicamente proceder à sua entrega na sede ou instalações do arguente e os que, por residirem em local distante, não o podem fazer, sem grave incómodo ou despesa.
F.A entrega da resposta à Nota de Culpa deve ser efectuada por meio que permita ao arguido obter comprovação da referida entrega, ou seja, em mão, com recibo ou protocolo, por correio registado ou por fax para número autorizado para o efeito; tal não impede o arguido de proceder à entrega por outro meio, mas cabendo-lhe o ónus da prova da apresentação da resposta, suportará as consequências de não lograr tal prova, caso a resposta se extravie ou o destinatário negue a respectiva recepção, pelo que não lhe é exigível o recurso a um destes meios.
G.De qualquer modo, se o Sindicato arguente, aqui Recorrente, pretendia permitir que a resposta à Nota de Culpa lhe fosse remetida por fax ou por outro meio, nomeadamente correio electrónico, devia na notificação da Nota de Culpa ter comunicado ao arguido, ora Recorrido, o número de fax ou o endereço de correio electrónico para os quais tal resposta podia ser remetida, o que não fez, cingindo a informação do local de entrega daquela resposta ao seu endereço postal e assim condicionando a forma da mesma.
H.Pelo que não merece a Sentença impetrada, em qualquer dos aspectos referidos pelo Recorrente ou noutro, qualquer censura.
Termos em que, negando provimento ao presente recurso e mantendo a Sentença recorrida, fará esse Tribunal a costumada JUSTIÇA.”
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A Exma Procuradora-Geral Adjunta, junto deste Tribunal da Relação, emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
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O recorrente exerceu o direito ao contraditório.
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Os autos foram aos vistos às Exmas Desembargadoras Adjuntas.

Cumpre apreciar e decidir
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II–Objecto
A única questão a decidir, de acordo com as conclusões de recurso apresentadas pelo Recorrente, consiste em saber se a resposta à nota de culpa foi ou não apresentada tempestivamente.
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III–Fundamentação de Facto
São os seguintes os factos considerados provados pela primeira instância
1.O Autor é sócio do Sindicato Réu, nele estando inscrito com o n.º 4516.
2.O Autor exerceu no Sindicato Réu as funções de tesoureiro da Direcção entre 24 de Julho de 2008 e 30 de Dezembro de 2015.
3.–Eliminado porquanto comportava matéria de Direito.
4.Por missiva datada de 16 de Maio de 2016, endereçada ao Exmo. Sr. Dr. (…) pelo Conselho de Disciplina, foi-lhe comunicado o seguinte: “(…)
Assunto: Instauração de Processo Disciplinar
Exmo. Sr. Dr.
Informamos que o Conselho de Disciplina do Sindicato (…), na sequência de participação que lhe foi efectuada por órgãos sociais deliberou na sessão de hoje, a instauração de processo disciplinar com intenção de expulsão a (…), sócio com o n.º (…).
Mais se informa que recaiu sobre V/ Exa. a instrução do referido processo disciplinar. Remetemos a V/ Exma. Documentação sobre o assunto, para que possa dar início às correspondentes diligências. (…)”.
5.No dia 25 de Maio de 2016, o Instrutor do Procedimento Disciplinar elaborou o respectivo termo de abertura, aí tendo o mesmo feito constar que “[a] instauração do processo disciplinar foi ordenada pelo Conselho de Disciplina em acta de 16 de Maio de 2016, tendo o ora signatário sido nomeado instrutor do mesmo”.
6.Por missiva datada de 7 de Junho de 2016, recebida pelo Autor no dia 14 de Junho de 2016, foi-lhe comunicado o seguinte: “(…) Assunto: Procedimento disciplinar Relativamente ao assunto em epígrafe, sou, por este meio, a comunicar que lhe foi mandado instaurar procedimento disciplinar por parte do Sindicato (…), tendo o signatário sido nomeado instrutor do respectivo processo.
Nessa medida, remeto, em anexo, Nota de Culpa com a descrição dos factos que lhe são imputados reiterando que, provando-se os mesmos, é intenção da entidade arguente aplicar a sanção disciplinar, nos termos do disposto no n.º 1, do art.º 53.º dos Estatutos do (…).
Pelo exposto, querendo, poderá V. Exa. consultar o processo disciplinar nas instalações do (…), mediante aviso prévio, bem como responder à Nota de Culpa e requerer as diligências probatórias que entender adequadas no prazo de 10 dias a contar da data de recepção daquele documento, devendo tal documento ser remetido para a Rua (…), ao cuidado de (…)”.
7.–Juntamente com a missiva referida em 6., foi remetida ao Autor a Nota de Culpa que consta de fls. 513 a 535, do procedimento disciplinar apenso.
8.Por fax datado de 14 de Junho de 2016, enviado no dia 15 de Junho de 2016, o Autor, através do mandatário que constituiu, o Exmo. Sr. Dr. (…), remeteu ao instrutor do procedimento disciplinar a seguinte missiva:
(…)
ASSUNTO: Procedimento disciplinar ao associado Dr. (…)
Ex.mo. Senhor,
Tendo sido encarregue pelo Dr. (…), associado do Sindicato (…), de o representar no âmbito do processo disciplinar que lhe foi movido por deliberação do Conselho de Disciplina daquele Sindicato, venho solicitar-lhe que transmita ao Sr. Instrutor do referido processo, infelizmente não identificado na notificação expedida ao m/constituinte, o seguinte:
a) Que me seja facultada e ao arguido, a consulta do processo na próxima 2.ª feira, dia 20 de Junho de 2016, a partir das 10h00;
b) Que na mesma data, me seja facultada e/ou ao arguido a consulta das actas da Direcção, da Comissão Executiva e do Conselho Geral do Sindicato, desde 1 de Janeiro de 2010 até à presente data, por tais documentos serem essenciais à defesa do arguido;
c) Que na mesma data me seja ainda facultada e/ou ao arguido a consulta dos Relatórios e Contas do Sindicato desde o exercício do ano de 2010, inclusive, acompanhadas dos pareceres do Conselho Fiscal e da Certificação Legal de Contas, por tais documentos serem essenciais à defesa do arguido;
d) Considerando que o prazo fixado para a resposta à Nota de Culpa corresponde ao mínimo estipulado no art. 52.º dos Estatutos do Sindicato, pelo que corresponderá ao adequado à salvaguarda das garantias de defesa dos arguidos em casos de reduzida complexidade, e atenta a circunstância dos factos imputados ao arguido se revestirem de elevada complexidade, bem patente na circunstância de terem sido necessários quase dois meses para a elaboração da Nota de Culpa, requer-se em nome do princípio da igualdade e da garantia dos direitos de defesa que seja fixado prazo não inferior a 20 (vinte) dias para a resposta do arguido à Nota de Culpa. (…)”.
9.Em resposta ao fax referido em 8., o instrutor do procedimento disciplinar remeteu ao mandatário do Autor email, datado de 16 de Junho de 2016, sendo o seguinte o seu teor:
“(…)
Exmo Sr. Dr. (…)
Acuso a recepção do S/fax datado de 14.06.2016 bem como da procuração que o acompanha.
No que toca ao que solicita e na qualidade de Instrutor do presente procedimento disciplinar informo o seguinte:
1)-Conforme combinado telefonicamente o processo poderá ser consultado no dia 21 de Junho a partir das 11h;
2)-Será facultado ao arguido a consulta dos documentos necessários à sua defesa, atendendo às datas dos atos que lhe são imputados, sendo que a informação que peticiona no que concerne a Relatórios e Contas do (…) (acompanhados dos pareceres do Conselho Fiscal e de Certificação Legal de Contas) está disponível no site do sindicato (…) onde deverá ser consultada
3)-Sem mais considerandos quanto ao argumento utilizado para peticionar a prorrogação de prazo, defere-se um prazo de 17 dias para que o arguido possa responder à Nota de Culpa. (…)”.
10.O Autor remeteu, via postal registada, em 1 de Julho de 2016, a resposta à Nota de Culpa, a qual foi recepcionada em 4 de Julho de 2016.
11.A resposta do Autor à nota de culpa foi envida para o Exmo. Sr. Dr. (…), para a morada sita na (…), em Lisboa.
12.Aos 4 de Julho de 2016, o instrutor do procedimento disciplinar exarou no mesmo o seguinte despacho:
No dia 7 de Junho de 2016 foi remetido ao sócio arguido a carta registada com aviso de recepção (…), a qual foi recepcionada por este no dia 14 de Junho de 2016.
O sócio arguido procedeu à consulta dos Autos acompanhado do seu ilustre mandatário Dr. (…).
Foi solicitado prorrogação do prazo de Resposta à Nota de Culpa em prazo não inferior a 20 dias (fax remetido em 15.06.2016) tendo sido concedido pelo instrutor signatário um prazo de 17 dias (comunicado via email no dia 16.06.2016) em vez dos 10 dias que se encontram previstos nos Estatutos do (…), tendo o prazo terminado no dia 1 de Julho de 2016.
Ora, foi recebido na sede do (…) envelope contendo Resposta à Nota de Culpa do sócio arguido (…), apenas no dia 4 de Julho de 2016.
Considerando que a Resposta à Nota de Culpa constitui uma declaração receptícia, que é eficaz logo que chegue ao destinatário, ou seja dela conhecida – conforme artigo 224.º do Código Civil, e que o sócio arguido só coloca a Resposta à Nota de Culpa no correio no dia em que terminava o prazo para a sua apresentação e ela só chega ao conhecimento do Sindicato arguente em data posterior, ou seja, no dia 4 de Julho de 2016, tem de concluir-se que foi apresentada fora de prazo.
Termos em que determino a não junção aos Autos de Resposta à Nota de Culpa dada a sua intempestividade, juntando, no entanto, o envelope exterior para prova da não recepção da mesma dentro de prazo”. 
13.Na resposta à nota de culpa por si deduzida, o Autor requereu a inquirição de 10 testemunhas.
14.No âmbito do procedimento disciplinar não foram realizadas as diligências probatórias requeridas pelo Autor, maxime, a inquirição das testemunhas que arrolou.
15.Por missiva datada de 12 de Outubro de 2016, a Direcção do Réu comunicou ao Autor como segue:
(…)
Exmo. Senhor,
Relativamente ao assunto em epígrafe, e na sequência do processo disciplinar instaurado contra V. Exa., vimos, por este meio, informar que o Conselho de Disciplina deste Sindicato deliberou sufragar as conclusões do relatório final, relatório esse que se considera integralmente reproduzido e se anexa à presente missiva, propondo, nos termos do art. 51.º dos Estatutos do (…) a aplicação da sanção correspondente à Inelegibilidade no processo eleitoral imediato.
Nos termos do citado preceito estatutário, compete à Direcção proceder à execução da sanção ora proposta pelo Conselho de Disciplina, pelo que, nos termos da alínea b) do nº 1 do art. 53º dos Estatutos do (…), V. Exa. é ficará na situação de Inelegibilidade no processo eleitoral imediato, enquanto associado deste Sindicato, a partir do dia seguinte ao da recepção da presente missiva. (…)”.
16.Juntamente com a missiva referida em 15., foi ao Autor remetido o Relatório Final elaborado no âmbito do procedimento disciplinar que lhe foi movido, datado de 6 de Outubro de 2016, dele constando, com relevo, que:
(…)
III–DELIMITAÇÃO DA MATÉRIA A AVERIGUAR
- Através de carta datada de 7 de Junho de 2016 (RD 546937300PT) a qual foi rececionada pelo sócio arguido em 14 de Junho de 2016, é remetido carta comunicando ser intenção da entidade arguente, provados os factos que lhe são imputados, a aplicação de uma das sanções disciplinares, que se encontra prevista no n.º 1, do artigo 53.º dos Estatutos do (…), bem como a respectiva Nota de Culpa.
- Tendo o Sócio Arguido solicitado prorrogação do prazo de resposta a Nota de Culpa pelo prazo não inferior a 20 dias, foi-lhe concedido pelo Instrutor um prazo de 17 dias para que possa responder à Nota de Culpa (da qual foi notificada via email no dia 16 de Junho de 2016 (…), prazo este que terminava no dia 1 de Julho de 2016.
- Só no dia 4 de Julho de 2016 o Instrutor rececionou resposta à Nota de Culpa, data em que o prazo já tinha terminado (…).
- A Nota de Culpa constitui uma declaração receptícia – cfr., Art.º 224.º do Código Civil.
- Assim sendo, se o sócio arguido coloca uma resposta no correio próprio dia em que terminava o prazo para a apresentação da respetiva Resposta à Nota de Culpa e ela só chegue ao conhecimento da arguente posteriormente, tem de concluir-se que a apresentação da referida Resposta à Nota de Culpa se encontra fora de prazo.
- E por ter sido recebida nessa data, não foi, por isso, admitida a sua junção aos autos do processo (…).

IV–ACTOS DA INSTRUÇÃO
- Não tendo tomado conhecimento pelas razões supra aduzidas do teor da Resposta a nota de culpa do sócio arguido, a arguente procedeu a diversos atos de instrução da sua iniciativa que se encontram junto aos autos, e que vão desde da inquirição de prova testemunhal arrolada pela arguente (…) e solicitação de informações e documentação aos serviços financeiros as quais foram juntos aos autos no dia 20 de Setembro de 2016. (…)”.
17.No dia 24 de Outubro de 2016, o Autor interpôs recurso para o Conselho Geral do Sindicato Réu da decisão disciplinar que lhe havia sido comunicada pela Direcção do Réu.
18.Por notificação do Presidente da Mesa Unificada do Sindicato Réu, dirigida ao mandatário do Autor, expedida em 16 de Dezembro de 2016 e recebida em 20 de Dezembro de 2016, foi comunicado que o Conselho Geral do Réu havia julgado improcedente o recurso, mantendo-se a decisão apelada.
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IV–Apreciação do Recurso
A única questão a decidir é se a resposta à nota de culpa foi ou não apresentada tempestivamente.
A primeira instância decidiu pela tempestividade da resposta, com os seguintes fundamentos: “Ponderando, pois, a matéria de facto provada, entende-se que a conduta do réu, ao não aceitar, com fundamento na sua extemporaneidade, a resposta à nota de culpa apresentada pelo autor, se subsume, em rigor, na preterição do direito do mesmo a ser ouvido, uma vez que as razões que estiveram subjacentes à conclusão a que chegou – que reitera, agora, na sua contestação – não merecem acolhimento.
E tanto pela seguinte ordem de argumentos. Desde logo, quer os Estatutos do réu quer o próprio Código do Trabalho concedem ao arguido em procedimento disciplinar um prazo para resposta à nota de culpa – que, no caso concreto, foi entendido ser prorrogado para 17 (dezassete) dias – sendo certo que nem os Estatutos do réu nem Código do Trabalho aludem à necessidade de, no prazo dado para esse efeito, se compreender o seu conhecimento por banda da entidade que promove o procedimento disciplinar. Vale o exposto por dizer que esse prazo é o que a lei reputa adequado para que o arguido em procedimento disciplinar possa organizar a sua defesa podendo, por conseguinte, ser, em toda a sua duração, usado para esse efeito. Considerar-se que, nesse prazo, se compreenderia a necessidade de a resposta à nota de culpa chegar ao conhecimento da entidade que promove o procedimento disciplinar redundaria, em bom rigor, na retirada de prazo para o exercício da defesa – o que se não crê tenha na lei o mínimo de correspondência ou seja consonante com a respectiva ratio –, a menos que o arguido entregasse a resposta em mão, sendo certo que a lei não prevê qual a forma como o acto há-de ser praticado e, por conseguinte, poderá o arguido utilizar, para esse efeito, qualquer forma idónea, como, por exemplo, e como sucedeu, a expedição pelo correio. Por outro lado, e ao contrário do aduzido pelo réu, entende-se que a resposta à nota de culpa não se traduz numa declaração receptícia. É, sem dúvida, uma declaração que tem um destinatário – no caso, a entidade que promove o procedimento disciplinar – mas que não carece, para ser eficaz, de chegar ao seu conhecimento, visto que se não trata de qualquer declaração negocial. E, quanto às declarações não negociais vale o disposto na segunda parte do art. 224.º, n.º 1, do Código Civil: a declaração é eficaz logo que a vontade do declarante se manifesta na forma adequada.
Isto é, a resposta à nota de culpa, na medida em que se traduz na defesa do arguido aos factos que lhe são imputados na nota de culpa, não visa e não tem por função produzir qualquer efeito jurídico negocial, visando fins diversos, tal como decorre da sua natureza[1] . Destarte, e como dito, é eficaz logo que a vontade do declarante, no caso, o autor, se manifeste da forma adequada, como se manifestou, e tornando-se susceptível de ser conhecida[2] , como o seria posto que foi enviada pelo correio, registado, para a morada que, para o efeito, lhe foi comunicada pelo réu.
Doutro passo, prevendo a lei ou, neste caso, os Estatutos, prazo determinado para o exercício de um direito não faria sentido, no ver do tribunal, onerar o respectivo titular com a necessidade da sua prática prevendo todas as vicissitudes que, porventura, ocorressem desde que emite a sua declaração até que a mesma chegasse ao conhecimento do destinatário, revelando-se um critério idóneo e adequado, sempre que a declaração seja enviada pelo correio, a data do seu registo, como sucede, por exemplo, para a validade da prática do actos processuais, em que, à semelhança, releva a data da expedição (art. 144.º, n.º 1, do Código de Processo Civil).
Finalmente, e em reforço do que vimos de expor, veja-se que, e à semelhança do que sucede com o prazo para o exercício do direito de resposta à nota de culpa, também a lei concede ao empregador, em moldes idênticos, o prazo de 30 dias para proferir a decisão de despedimento, sem que condicione a tempestividade dessa decisão à necessidade de chegar ao conhecimento do trabalhador adentro daquele prazo (cfr., o art. 357.º, n.º 1, do Código do Trabalho).
Tendo, pois, por base, as premissas enunciadas, conclui-se que o autor exerceu, tempestivamente, o seu direito de defesa no âmbito do procedimento disciplinar que lhe foi movido pelo réu, posto que o fez justamente no último dia que dispunha para o efeito – 1 de Julho de 2016 – posto que foi nesta data que, por correio registado, remeteu a resposta à nota de culpa ao réu, sendo, por isso, irrelevante, atenta a natureza deste acto, a data em que a mesma chegou ao poder do réu.
Aliás, a posição assumida em sede de procedimento disciplinar e reiterada pelo réu na sua defesa na presente acção encontra-se no limite da boa-fé e do que, em termos de defesa, é admissível. Na verdade, veja-se que, em sede de procedimento disciplinar, o autor foi expressamente notificado, pelo instrutor, no sentido de a resposta à nota de culpa dever ser remetida para a Rua (…) Lisboa, ao cuidado de (…), o que, manifestamente, induz no sentido de o autor dever remeter aquela resposta pelo correio. Ora, praticando o autor o acto justamente pela forma que lhe foi indicada – como emerge do facto provado sob o ponto 11. – e, depois, ser esse acto desconsiderado com fundamento no lapso de tempo que decorreu desde o registo até ao recebimento é, no mínimo, temerário, como temerário é, agora, sugerir a ré que o autor poderia ter respondido à nota de culpa via email quando expressamente o instruiu, sem sede de procedimento disciplinar, quanto ao modo como deveria praticar o acto.
Concluindo-se, pois, como se concluiu, pela tempestividade do exercício do direito de defesa por parte do autor, a sua desconsideração por banda do réu equivale, como dito acima, à sua não audição e, por conseguinte, à nulidade do procedimento disciplinar, por violação do disposto no art. 52.º, dos seus Estatutos.
Por maioria de razão, o procedimento é, também, nulo por não ter o réu efectuado as diligências probatórias requeridas pelo autor no âmbito do procedimento disciplinar. Na verdade, rejeitando a resposta à nota de culpa, com fundamento numa extemporaneidade que, em bom rigor, não existia, rejeitou, ainda que tacitamente, a realização das diligências requeridas pelo autor, sem que, para o efeito, tivesse aduzido qualquer argumentação, maxime, quanto à sua não essencialidade. (sic)

A Ré insurge-se, defendendo que a resposta à nota de culpa constitui uma declaração receptícia e, por conseguinte, não basta, para interromper o prazo em curso com vista ao exercício do contraditório, atentar na data em que a mesma foi enviada ao empregador, sendo necessário que este tome conhecimento do seu conteúdo.

Não acompanhamos a Recorrente.

A declaração negocial receptícia é aquela que carece de ser dada a conhecer a um destinatário; pressupõe um destinatário, por quem deve ser conhecida. Não é essencial o efectivo conhecimento da declaração recebida pelo destinatário, bastando a sua cognoscibilidade, traduzida na circunstância de ser possível ao mesmo destinatário apreender o conteúdo da declaração, por ela haver chegado à sua esfera de conhecimento ou de controle[3].

Trata-se, em regra, de declarações com importância directa na constituição de direitos e que, por essa razão, a lei rodeia de cautelas acrescidas, dando ênfase ao seu conhecimento ou, pelo menos, à sua cognoscibilidade pela parte a quem se destinam. Outras declarações há, não receptícias ou não recipiendas, cuja validade e eficácia se bastam com a manifestação de vontade do autor da declaração.

Assim, não há dúvida de que a nota de culpa, que é uma peça fundamental do procedimento disciplinar, delimitando o seu objecto e pedra angular da defesa do trabalhador[4], constitui “uma declaração receptícia, que se torna eficaz quando chega ao poder do trabalhador seu destinatário ou é dele conhecida (art.224º do CC)[5]. Aplica-se também aqui - como de resto aos atos de idêntica natureza que integram o procedimento de despedimento – a doutrina do nº 2 daquele artigo do Código Civil, segundo a qual a eficácia da declaração não é prejudicada quando « só por culpa do destinatário não foi por ele oportunamente recebida.» Aliás a solução consta também do artigo 357º, 7, a propósito da decisão final de despedimento, onde se esclarece que esta produz efeitos, determinando a cessação do contrato «logo que chega ao poder do destinatário ou é dele conhecida ou, ainda, quando só por culpa do trabalhador não foi por ele oportunamente recebida.”[6] 
 
Como refere Menezes Cordeiro[7], há princípios cogentes que devem ser respeitados na articulação entre os factos que merecem a censura da entidade patronal e a aplicação da sanção – são eles: o princípio da defesa, da boa-fé, da celeridade e da igualdade, sendo de referir que basta a violação dum deles para, em regra, surgirem violações dos demais, dado que a repartição é meramente conceitual.
Para o que à presente decisão interessa, o princípio da defesa impõe a audição prévia do trabalhador, que pressupõe o direito deste a apresentar a sua alegação na resposta à nota de culpa, a qual, porém, não constitui para o empregador qualquer declaração de índole negocial, antes um marco procedimental com vista ao exercício do contraditório, no âmbito do qual o trabalhador alega os factos que sustentam a sua defesa, podendo solicitar a realização de diligências probatórias.
Têm assim diferente natureza a nota de culpa e a decisão disciplinar, por um lado, e a resposta à nota de culpa, por outro, embora integrando todos esses actos o procedimento disciplinar. E isso justifica que as regras que subjazem à sua produção e comunicação sejam diferentes.
No que respeita à resposta à nota de culpa estamos em presença de um direito do apresentante/trabalhador (cfr. art. 329º nº6 do CT), enquadrado num prazo peremptório. Trata-se do momento próprio para o exercício do contraditório, não contendo a ratio da lei espaço para o entendimento de que tal direito possa ser encurtado com a antecipação do momento da respectiva comunicação ao empregador. E dado que a lei, diferentemente do que acontece no processo civil, não estabelece qualquer presunção de notificação, e não impõe ao trabalhador a opção por um meio de transmissão da peça procedimental em causa, taxativamente previsto, em detrimento de outro ou outros, considerar que tem aplicação o disposto no artigo 224º nº1 do C.Civil à apresentação da resposta à nota de culpa é, no fundo, restringir parcialmente o prazo concedido ao trabalhador para contestar a acusação do empregador, com prejuízo evidente para o exercício do direito de audição.
Como salienta, com acerto, o Recorrido, “em relação a outro acto procedimental e prazo inseridos também no processo disciplinar, a saber a decisão final do procedimento a tomar pela entidade patronal e o prazo para a mesma (30 dias – art. 357º, nº 1,Cód. Trabalho), a jurisprudência, essa sim, basta e unânime, estabelece que tal prazo não compreende a comunicação da decisão ao trabalhador, dispondo, portanto, a entidade patronal de todos os 30 dias para preparar, tomar e emitir a decisão.
(…)
Ora, seria do todo inadmissível que, ponderado o justo equilíbrio entre os direitos e interesses das partes, em processo disciplinar, se entendesse que a entidade patronal dispunha integralmente do prazo que a lei lhe confere para preparar e tomar a decisão sobre o despedimento ou outra sanção disciplinar a aplicar ao arguido e este tivesse o seu prazo para responder à Nota de Culpa amputado do tempo necessário para fazer chegar o seu teor ao conhecimento da arguente.
Sendo certo que a decisão do arguente sobre o processo disciplinar e a sua comunicação ao arguido é de qualificação bem mais duvidosa no que concerne ao seu enquadramento no conceito de “declaração negocial”, na medida em que aqui já se pode vislumbrar um efeito jurídico, modificativo ou mesmo resolutivo, da declaração sobre o negócio jurídico (seja ele um contrato de trabalho ou uma relação associativa) subjacente; o que, porém, não tem suscitado dúvidas à jurisprudência dominante quanto à sua natureza não receptícia.”
De facto, o termo final do prazo referido no artigo 357º nº1 do CT, de 30 dias, coincide com a prolação da decisão de despedimento, independentemente da data em que ela é recebida pelo trabalhador (cfr. artigo 357º nº 6). A estes diferentes tempos subjazem diferentes efeitos: a comunicação da decisão ao trabalhador tem um efeito específico – cessação do contrato (artigo 357º nº7) – e a sua efectivação pode estar sujeita a acontecimentos incertos que a protelem, pelo que este acto não deve contribuir para a eventual preclusão do direito do empregador, a exercer num prazo que é curto, peremptório, e fundamental para o desfecho do procedimento disciplinar. É o que acontece também quanto ao prazo de tramitação previsto para a resposta à nota de culpa.
Os acórdãos indicados pela Ré, à excepção do acórdão da Relação do Porto de 12-04-2010-Processo 489/08.0TTMAI.P1 – não se referem a esta questão, antes à regras de contagem do prazo de resposta à nota de culpa, que não estão em causa neste recurso. O que está em causa é saber qual o acto determinante da interrupção desse prazo, se a data da remessa dessa peça procedimental ao empregador, quando a mesma não é entregue presencialmente, ou a data do conhecimento do seu conteúdo por parte deste.
Quanto ao citado Acórdão da Relação do Porto de 12-04-2010[8]/[9], único que encontramos e que se refere a esta questão, não perfilhamos a tese nele vertida, pelas razões que acabamos de expor.
Improcede assim o presente recurso.
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Quanto ao peticionado na primeira conclusão do recurso, indefere-se por falta de suporte legal.
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V–Decisão.
Face a todo o exposto, acorda-se na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa, em julgar totalmente improcedente o presente recurso de apelação interposto pelo Sindicato AAA, mantendo a sentença recorrida.
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Custas a cargo do Apelante.
Registe e notifique.
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Lisboa, 25-10-2017



(Paula de Jesus Jorge dos Santos)
(1º adjunta – Maria João Romba)
(2ª adjunta – Paula Sá Fernandes)
                                                                

[1]Cfr., neste sentido, e embora abordando questão diversa mas cujos considerandos são transponíveis para o caso sub iudice, o Acórdão do STJ de 24 de Outubro de 2006, proferido no Processo n.º 06S2186, acessível em www.dgsi.pt. – Nota de rodapé do texto transcrito.
[2]Cfr., quanto às declarações não receptícias, Rodrigues Bastos, in Notas ao Código Civil, vol. I, Lisboa, 1987, pág. 292; cfr., igualmente, Pires de Lima e Antunes Varela, in, Código Civil Anotado, vol. I, 4.ª Edição Revista e Actualizada, Coimbra Editora, 1987, pág. 214. – Nota de rodapé do texto transcrito.
[3]Cfr. Rui Alarcão – A Confirmação, 1ª-178-179.
[4]Nas palavras do acórdão da Relação de Guimarães de 16-03-2017 – Processo 1299/15.3T8BRG-A.L1.
[5]Artigo 224º: “1- A declaração negocial que tem um destinatário torna-se eficaz logo que chega ao seu poder ou é dele conhecida; as outras, logo que a vontade do declarante se manifesta na forma adequada.
2- É também considerada eficaz a declaração que só por culpa do declaratário não foi por ele oportunamente recebida.
3- A declaração recebida pelo destinatário em condições de, sem culpa sua, não poder ser conhecida, é ineficaz.”.
Como referem Pires de Lima e Antunes Varela (in Código Civil Anotado, Vol.1º, pág. 213) “ [A]doptaram-se quanto às primeiras, simultaneamente os critérios da recepção e do conhecimento. Não se exige por um lado, a prova do conhecimento por parte do destinatário; basta que a declaração tenha chegado ao seu poder. O conhecimento presume-se neste caso, juris e de jure. Mas provado o conhecimento, não é necessário provar a recepção para a eficácia da declaração.
… [N]o nº2, como medida de protecção do declarante, considera-se eficaz a declaração que não foi recebida por culpa do declaratário. É o caso por ex., de este se ausentar para parte incerta ou de se recusar a receber a carta, ou de a não ir levantar à posta-restante como o fazia usualmente”. – Nota de rodapé da relatora
[6]Cfr. Pedro Furtado Martins, in Cessação do Contrato de Trabalho, 3ª Edição, pág.210.
[7]Manual de Direito do Trabalho, 1991, pág. 754.
[8]Processo 489/08.0TTMAI.P1.
[9]Na verdade, não faria sentido que, para despedir, acto de decisão final do procedimento disciplinar, existissem umas regras e para um acto semelhante ou de menor importância, mas do mesmo procedimento, as regras a observar fossem outras.
Daí a doutrina firmada pelo Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 1990-03-30[4], cujo sumário se transcreve:
I - A resposta à nota de culpa constitui uma declaração receptícia que carece de ser dada a conhecer ao destinatário e é eficaz logo que chegue ao poder do destinatário ou dele é conhecida - artigo 224.º do Código Civil.
II - Se o trabalhador só coloca essa resposta no correio no dia em que terminava o prazo para a sua apresentação e ela só chega ao conhecimento da entidade patronal no dia imediato, tem de concluir-se que a apresentação ocorreu fora do tempo útil.”