Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
233/18.3PDVFX-A.L1-9
Relator: MARIA DO CARMO FERREIRA
Descritores: PRISÃO PREVENTIVA
REEXAME E ALTERAÇÃO DOS PRESSUPOSTOS
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 04/11/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NÃO PROVIDO
Sumário: I. A medida de coacção de prisão preventiva só pode ser alterada se se verificarem, após a sua aplicação, a modificação de quaisquer dos pressupostos que fundamentaram essa mesma aplicação;

II. A circunstância de o arguido padecer de doença é uma circunstância a ter em conta no âmbito da execução da medida de coacção e nada tem de conexo com os pressupostos que motivaram a aplicação da prisão preventiva, no sentido de provocarem qualquer alteração dos mesmos.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral:  Acordam em conferência os Juízes da 9ª. Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa:
I- RELATÓRIO.
O arguido A..., identificado nas fls. 119 destes autos à margem referenciados, não se conformando com o despacho de reexame dos pressupostos da medida de coacção de prisão preventiva que, nos termos do disposto no artigo 213 do C.P.P. lhe manteve aquela medida de coacção, vem do mesmo interpor recurso.
 É do teor que vai transcrito, o despacho em recurso:
Fls. 563 a 570:
Veio o arguido A... requerer a substituição da medida de coacção de prisão preventiva que lhe foi aplicada pela medida de coacção de obrigação de permanência na habitação, alegando que não estão a ser cumpridas as deslocações a consultas médicas necessárias atento o seu estado de saúde, nem tão pouco está a ser bem administrada a medicação a que está sujeito. Por outro lado, alega a atenuação dos perigos que estão subjacentes à aplicação da medida de coacção de prisão preventiva.
Ora, tendo em consideração os fundamentos invocados pelo arguido A… no aludido requerimento e bem assim a posição assumida pelo Ministério Público a fls. 574, último parágrafo, determino que, antes de mais, seja oficiado o E.P. nos termos aí doutamente promovidos.
***
Nos termos do art. 213°, n.° 1 al. b) do Código de Processo Penal, e uma vez que foi deduzida acusação contra os arguidos A... e B… cumpre reexaminar a subsistência dos pressupostos da medida de coacção de prisão preventiva que foi aplicada aos referidos arguidos, sem prejuízo do Tribunal vir a apreciar oportunamente, e após o esclarecimento solicitado ao E.P., o requerimento apresentado pelo arguido A... a fls. 563 a 570. Nos presentes autos é imputada ao arguido A... a prática, como autor material, de um crime de homicídio, na forma tentada, p.p. art. 131.°, com referência aos art.s 22.°, 23.° e 73.°, todos do Código Penal.
Ao arguido A... é imputada a prática, como autor material, de um crime de homicídio qualificado, p.p. art. 131.° e 132.°, n.°s 1 e 2, al. h), todos do Código Penal.
Por despacho proferido em sede de primeiro interrogatório judicial foi determinada a aplicação da medida de coacção de prisão preventiva aos referidos arguidos, estando os mesmos sujeitos a tal medida de coacção desde 10 de Outubro de 2018.
Foi efectuado o reexame trimestral da medida de coacção de prisão preventiva aplicada aos arguidos, tendo sido mantida tal medida de coacção por os pressupostos de facto e de direito que determinaram a sua aplicação permanecerem inalterados em relação aos mesmos, conforme resulta de fls. 534.
À aplicação das medidas de coacção - maxime as que implicam privação da liberdade, bem como, por maioria de razão, à sua alteração, substituição e revogação, presidem princípios fundamentais, como os princípios da legalidade, da adequação, da proporcionalidade, da precariedade e da subsidariedade, plasmados nos art.°s 191°, 193° e 204° do CPP, princípios estes que funcionam como garantias para os cidadãos, no âmbito do processo penal.
Compulsados os autos verifica-se que os pressupostos de facto e de direito que determinaram a aplicação da medida de coacção de prisão preventiva aos referidos arguidos continuam inalterados, não havendo uma diminuição das necessidades cautelares que presidiram àquela decisão e à sua manutenção (cfr. art. 204° do CPP).
De facto, cremos que até à presente data não foram carreados para os autos quaisquer elementos que nos permitam concluir pela atenuação das exigências cautelares que o caso impõe, afigurando-se-nos que se mantêm, em concreto, os perigos que estiveram subjacentes à aplicação aos arguidos da prisão preventiva. Acresce que o prazo de duração máxima desta medida não se mostra ultrapassado, ilação que se extrai do disposto no art. 215° n° 2 do C.P.P.
Nestes termos, e uma vez que se mantêm inalterados os pressupostos de facto e de direito que determinaram a aplicação da referida medida de coacção aos arguidos A....e B..., ao abrigo do disposto no art. 213° n° 1 do C.P.P., decido manter a medida de coacção de prisão preventiva aplicada aos mesmos.
**
Discordando do assim decidido, o arguido A..., vem interpor recurso daquele despacho, formulando as conclusões:
(transcrevem-se)
I. O arguido/recorrente não se conforma com o despacho de que ora se recorre e que decidiu pela manutenção da medida de coação de prisão preventiva.
II. Considera que o mesmo despacho é omisso na análise dos factos e dos fundamentos invocados pelo recorrente para a substituição da medida por outra menos gravosa, violando o dever de fundamentação a que está constitucionalmente obrigado por força do art. 205º n.º1 da CRP.
III. Considera também, que o mesmo despacho decide pela manutenção da medida de forma infundada, utilizando um “modelo tipo” como resposta a este tipo de requerimentos.
IV. Não demonstrando o seu raciocínio lógico ou legal que levou à tomada da decisão ora recorrenda, o Tribunal a quo impossibilita o recorrente de compreender e eventualmente contraditar essa mesma decisão em sede de recurso.
V. É certo que, na opinião do recorrente, este invocou e provou factos no seu requerimento com os quais deveria ter conseguido demonstrar ao Tribunal a quo que os fundamentos que serviram de base à aplicação da prisão preventiva deixaram de estar preenchidos.
VI. O despacho ora recorrendo deve pois, ser substituído por outro que, devidamente fundamentado, decida pela substituição da medida de coação de prisão preventiva pela de obrigação de permanência na habitação com vigilância eletrónica.
Nestes termos e nos mais de Direito, sem prescindir do douto suprimento de V. Exas., deve o presente recurso merecer provimento e, em consequência substituir-se o despacho por outro que, devidamente fundamentado, decida pela substituição da medida de coação de prisão preventiva pela de obrigação de permanência na habitação com vigilância eletrónica
***
 A estas alegações respondeu o MºPº. na 1ª.Instância, nos termos que constam de fls. 9 a 16, destacando-se as conclusões que se transcrevem:
- O despacho recorrido foi proferido em sede de reexame dos pressupostos da prisão preventiva, nos termos e para o efeito do disposto no art.º 213.º, n.º 1, al. b), do CPP, na sequência da prolacção de Despacho de Acusação contra o arguido, na qual lhe é imputada a prática, como autor material, de um crime de homicídio qualificado, p. e p. pelos art.ºs 131º e 132.º, n.ºs 1 e 2, al. h), do Código Penal.
- Previamente ao despacho recorrido e porque o arguido viera entretanto requerer a substituição da medida de coacção de prisão preventiva pela de obrigação de permanência na habitação, a meritíssima Juiz de Instrução, com vista à ulterior e cabal apreciação do requerido, determinou a realização de diligência tida por necessária, pronunciando-se, porém, de imediato, e como se lhe impunha, nos termos e para o efeito do disposto no art.º 213.º, n.º 1, al. b), do CPP.
- Improcede, pois, o alegado vício de omissão de apreciação do requerido, porquanto expressamente relegada para momento ulterior.
- As razões que determinaram a aplicação da medida de coacção de prisão preventiva foram ponderadas no despacho proferido nos autos, findo o primeiro interrogatório judicial de arguido detido, que teve por fortemente indiciada a prática, pelo arguido A.... de um crime de homicídio qualificado, p. e p. artº 131º e 132.º, n.º 1 e 2, al. h), ambos do Código Penal e por verificados, em concreto, os perigos de perturbação grave da ordem e tranquilidade públicas, de perturbação do decurso do inquérito, na aquisição e conservação da prova e de fuga.
- Estando em causa, no despacho recorrido, o reexame dos pressupostos de aplicação da medida de coacção, a respectiva fundamentação deverá cingir-se à apreciação da existência, ou não, de factos novos ou de uma alteração das circunstâncias que determinem uma atenuação das exigências cautelares que no caso concreto se verificam- cfr. art.º 212º, CPP -.
-Referindo o despacho recorrido que se mantém inalterada a situação que determinou a sua aplicação, não carecia a meritíssima Juiz a quo de indicar, em concreto, os pressupostos a que alude o art. 204.º do C.P.P., tidos por verificados no despacho que determinou a prisão preventiva, pelo que, mantendo, tal como ali foi definida, a situação processual do arguido, não viola qualquer dos requisitos legais enunciados nas normas que a sustentaram, nem consequentemente o disposto no art.º 205.º , da Constituição da República Portuguesa.
- Não ocorre, assim nenhuma invalidade por deficiência de fundamentação do despacho recorrido.
- No caso dos autos, da análise dos elementos deles constantes, não resulta que se tivessem alterado os pressupostos de facto e de direito, nomeadamente as concretas exigências de natureza cautelar, que determinaram a aplicação ao arguido da medida de prisão preventiva, única capaz de acautelar os perigos considerados então, de forma adequada, necessária e proporcional, nos termos do disposto nos artigos 193.º, n.º 1 e n.º 2, 202.º, n.º 1, alínea a), 204.º, alínea a), b) e c), e 212.º, todos do Código de Processo Penal.
- Em suma, as razões do recorrente não põem em causa o despacho recorrido e a medida de coacção de prisão preventiva é de considerar como continuando a mostrar-se adequada às exigências cautelares que o caso requer e proporcional à gravidade do crime e sanções aplicáveis, não se mostrando violada qualquer norma legal e preceito ou princípio constitucional.
- Quer porque nenhum dos perigos considerados verificados à data da aplicação da medida de coacção de prisão preventiva ao arguido se atenuou, quer porque nenhuma outra medida de coacção é adequada a acautelá-los e nomeadamente a evitar a fuga, a repor a tranquilidade pública e a preservar a prova ainda a produzir nas ulteriores fases do processo, bem andou a meritíssima Juiz a quo quando decidiu que o arguido ora recorrente continuasse a aguardar os ulteriores termos do processo sujeito à medida de coacção da prisão preventiva que lhe foi aplicada.
- O despacho que determinou que o arguido continuasse a aguardar os ulteriores termos do processo em prisão preventiva não merece reparo, devendo ser mantido na íntegra.
**
Foi cumprido o disposto no art. 416 do CPP, tendo o Sr. Procurador Geral Adjunto emitido visto.
Corridos os vistos, em conferência, cumpre decidir.

II- MOTIVAÇÃO.
Como resulta do enunciado supra, não está em causa o despacho que decretou a prisão preventiva do recorrente, mas aquele que a manteve posteriormente, no reexame a que se reporta o artigo 213 do C.P.P.
***
Conhecendo.
Sobre a manutenção ou alteração da medida de coacção de prisão preventiva, dispõe a lei ordinária, no C.P.P.:
Artigo 213.º
Reexame dos pressupostos da prisão preventiva e da obrigação de permanência na habitação
1 - O juiz procede oficiosamente ao reexame dos pressupostos da prisão preventiva ou da obrigação de permanência na habitação, decidindo se elas são de manter ou devem ser substituídas ou revogadas:
a) No prazo máximo de três meses, a contar da data da sua aplicação ou do último reexame; e
b) Quando no processo forem proferidos despacho de acusação ou de pronúncia ou decisão que conheça, a final, do objecto do processo e não determine a extinção da medida aplicada.
2 - Na decisão a que se refere o número anterior, ou sempre que necessário, o juiz verifica os fundamentos da elevação dos prazos da prisão preventiva ou da obrigação de permanência na habitação, nos termos e para os efeitos do disposto nos n.os 2, 3 e 5 do artigo 215.º e no n.º 3 do artigo 218.º
3 - Sempre que necessário, o juiz ouve o Ministério Público e o arguido.
4 - A fim de fundamentar as decisões sobre a manutenção, substituição ou revogação da prisão preventiva ou da obrigação de permanência na habitação, o juiz, oficiosamente ou a requerimento do Ministério Público ou do arguido, pode solicitar a elaboração de perícia sobre a personalidade e de relatório social ou de informação dos serviços de reinserção social, desde que o arguido consinta na sua realização.
5 - A decisão que mantenha a prisão preventiva ou a obrigação de permanência na habitação é susceptível de recurso nos termos gerais, mas não determina a inutilidade superveniente de recurso interposto de decisão prévia que haja aplicado ou mantido a medida em causa.

Perante o texto da norma, vejamos se ocorre a invocada nulidade do despacho recorrido, tal como vem invocado pelo recorrente.
A jurisprudência é unânime no sentido de que as exigências da fundamentação no despacho de reapreciação da medida de coacção, são menores que as exigíveis ao despacho que aplicou a medida, sobretudo quando não se verificaram, entretanto, alterações relativamente aos factos que fundaram os pressupostos da aplicação da medida.
Neste sentido e a título exemplificativo citamos:
Ac. TRG de 19-10-2009: I. Satisfaz as exigências de fundamentação, o despacho que, reexaminando os pressupostos da prisão preventiva, se limita a declarar que não se mostram alteradas as circunstâncias de facto e de direito que determinaram a aplicação daquela medida de coacção. Seria inútil exigir que nesses casos o juiz copiasse o despacho para o qual remete, o qual é do conhecimento dos interessados.
II. Aquando do reexame trimestral sobre a subsistência dos pressupostos da prisão preventiva, o cumprimento do contraditório depende de um juízo de necessidade cuja formulação compete ao juiz. Tendo o arguido sido ouvido no momento da imposição da medida de coacção que lhe foi aplicada, é compreensível que naquele reexame, em que apenas se decide que tais pressupostos antes verificados se mantêm, tal audição seja considerada desnecessária.
Ac. TRL de 25-05-2005: I.A fundamentação do despacho em que - procedendo ao reexame oficioso da subsistência dos pressupostos da prisão preventiva, em obediência ao disposto no artigo 213.º, n.º, do Código de Processo Penal - se decide pela manutenção de tal medida de coacção não tem que ser tão exaustiva e completa como a que a lei, sob pena de nulidade, exige para as sentenças finais, nos artigos 374.º, n.º 2, e 379.º, n.º 1, alínea a), do Código de Processo Penal.
II. Um tal despacho satisfaz a exigência de fundamentação, contida nos artigos 205.º, n.º 1, da Constituição da República, e 97.º, n.º 4, do Código de Processo Penal, quando nele se explicita desde quando o arguido está preso, e, remetendo para os fundamentos de facto e de direito do despacho que determinou a aplicação da prisão preventiva, se afirma que não ocorreram alterações relativamente aqueles fundamentos, e se refere a inexistência de elementos que sugiram a necessidade de audição prévia do arguido, concluindo pela manutenção da medida, com a indicação das normas aplicáveis.
III. Não contende com as garantias de defesa, a que se refere o artigo 32.º, n.º 1, da Constituição da República, a norma do artigo 213.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, na medida em que permite ao juiz prescindir da audiência do arguido, quando não há alteração do condicionalismo que determinou a aplicação da prisão preventiva, que, na reapreciação, se mantém.
IV. ….
Ora, no entendimento que vem exposto, e, face ao despacho recorrido, entendemos que não havia que analisar e fundamentar de forma exaustiva, os pressupostos da medida de coacção aplicada uma vez que não se mostram alterados, nem foram carreados para os autos factos que denotem uma alteração que justifique e fundamente a menor exigência cautelar dos pressupostos da aplicação da prisão preventiva aplicada. Claro que o recorrente entende que ao invocar razões de saúde do arguido, está a trazer aos autos factos novos que fundamentariam a diminuição das exigências cautelares que fundaram a aplicação da prisão preventiva. Mas sem qualquer razão. Se bem lermos o despacho recorrido, na sua primeira parte vemos que o Tribunal se debruçou sobre os factos alegados e, numa perspectiva e em sede de execução da medida, decretou o que deveria, ao determinar ao Estabelecimento Prisional onde o arguido se encontra que efectue as diligências necessárias a acautelar o estado de saúde do arguido. E, não lhe era exigível outra coisa, já que, repete-se, tal circunstancialismo nada tem de conexo com os pressupostos que motivaram a aplicação da prisão preventiva, no sentido de provocarem qualquer alteração dos mesmos. Inexiste pois qualquer omissão ou nulidade do despacho sob recurso.
Relembre-se agora que não está em causa o despacho que aplicou a medida de coacção, que se encontra transitado em julgado, mas apenas aquele que efectuou o reexame dos pressupostos da aplicação daquela medida.
E, assim sendo, naturalmente que, só a verificação da alteração factual dos pressupostos que fundaram a fixação daquela medida poderiam fazer diminuir as exigências cautelares e alterar os pressupostos da medida de prisão preventiva fixada: no caso, o perigo de perturbação do decurso do inquérito ou da instrução do processo e, nomeadamente, perigo para a aquisição, conservação ou veracidade da prova; ou o perigo, em razão da natureza e das circunstâncias do crime ou da personalidade do arguido, de que este continue a actividade criminosa ou perturbe gravemente a ordem e a tranquilidade públicas e o perigo de fuga à acção da justiça.
Ora, dos autos não constam, nem o arguido/recorrente indica quaisquer circunstâncias factuais, novas, concretas, que o Tribunal pudesse avaliar para consequentemente decidir pela alteração da medida de coacção anteriormente aplicada. Isto é, percorrendo o alegado na motivação do recurso não encontramos senão razões de ordem conclusiva, dirigidas em crítica à fundamentação do despacho principal que aplicou a medida de coacção, e sem qualquer apoio factual, concreto, nada de novo trazendo aos autos, por posterior à aplicação da medida coactiva, isto é, integra tão só aquela factualidade que já era conhecida do Tribunal a quando da aplicação da medida de coacção; circunstancias estas devidamente ponderadas no despacho que fixou a medida de coacção, o qual não pode estar agora em causa como atrás dissemos.
E, não será o fim do inquérito que, por si só pode considerar-se uma “novidade” e fundar e arredar os pressupostos sobre os quais assentou a aplicação da medida de coacção. Como acima referimos, ainda existe o perigo da aquisição e conservação da prova (que se mantém até ao final do julgamento), da continuação da actividade criminosa ( pelas características da prática do crime e da personalidade do arguido) e, naturalmente pela própria natureza do crime de homicídio, da perturbação da ordem e tranquilidade pública, aliados à grande insegurança e reprovação que este tipo de crimes tem na sociedade.
Com efeito,
Uma vez aplicada a medida de coacção de prisão preventiva, obriga a lei ao reexame da verificação dos pressupostos que fundamentaram a sua aplicação, de forma oficiosa e no prazo de 3 meses e nos momentos referidos na alínea b) do artigo 213-1 do C.P.P., sem prejuízo ainda de o arguido e o Mº.Pº. o requererem, e o Juíz o declarar, quando se verificar atenuação das exigências cautelares que determinaram a sua aplicação, conforme regula o disposto no artigo 212 nºs. 3 e 4 do C.P.P. Nesta situação, conforme ensina Germano Marques da Silva- Curso de Processo Penal, II, pág. 345: “ Importa promover que não seja puramente formal, de mero calendário, e por isso que o arguido deva juntar aos autos todos os elementos que possam contribuir para ilidir ou enfraquecer os indícios sobre a necessidade da manutenção da medida”. Refere ainda o autor, na obra citada que: “As medidas de coacção só devem manter-se enquanto necessárias para a realização dos fins processuais que legitimam a sua aplicação ao arguido e, por isso, podem ser revogadas ou substituídas por outras mais ou menos graves sempre que se verifique alteração das circunstâncias que determinaram a sua aplicação.”
 Da jurisprudência deste Tribunal, e a propósito, citamos: “Tratando-se de despacho que procede ao reexame dos pressupostos de anterior decisão, o dever de fundamentação reporta-se às circunstâncias que possam levar à alteração dos pressupostos dessa anterior decisão que constituem o objecto de reexame, pois que só essa alteração constitui objecto do despacho de reexame-Proc. nº. 355/09.1JAAVR-B.C1 18-11-2009.”
Conforme vem sendo sustentado pela jurisprudência “vidé Ac. TC de 30/07/2003, proferido no P.º 485/03, publicado no DR II Série de 04/02/2004 e pela própria Relação de Lisboa, vidé Ac. TRL de 13/10/2004, proferido no P.º 5558/04-3) e, bem assim, do STJ em Acórdão datado de 07/01/1998 in BMJ 473, pág. 564, a saber: “A decisão que impõe a prisão preventiva apesar de não ser definitiva, é intocável e imodificável enquanto subsistirem os pressupostos que a ditaram, isto é enquanto não houver alteração das circunstâncias que fundamentaram a prisão preventiva”.
Consigna-se ainda que, conforme vem sendo orientação jurisprudencial deste TRL, a decisão que determina a prisão preventiva, se não for objecto de recurso ou, tendo-o sido, mas mantida nos seus precisos termos, adquire força de caso julgado, sem prejuízo do princípio “rebus sic stantibus” condição a que, pelas contínuas variações do seu condicionalismo, estão sujeitas às medidas de coacção. Tal significa que: «enquanto não ocorrerem alterações fundamentais na situação existente à data em que foi determinada a prisão preventiva, não pode o tribunal reformar essa decisão, sob pena de instabilidade jurídica decorrente de julgados contraditórios», é o que se propugna no Ac. TRL de 14/8/09, sumariado em www.dgsi.pt e Ac. TRL de 3/2/93, in CJ Ano 28, 1, 247 e de 15/3/00, in CJ Ano 25, 235 e Ac. TRL de 4/11/04, In CJ Ano 29, 5, 128 e do STJ de 24/1/96 in DR I/S-A de 14/3/96 e de 7/1/98, in BMJ473, 564.
Do recurso do arguido conclui-se que os argumentos expendidos, respeitam ao fundamento do despacho que decretou a medida de coacção, não alegando agora factos novos e atenuativos das exigências cautelares que fundamentaram a aplicação da medida, sendo que as invocadas razões de saúde não são fundamento adequado á alteração da medida e, serão resolvidas em sede de cumprimento da medida no estabelecimento prisional respectivo.
Assim é forçoso concluir que o equilíbrio entre a gravidade do crime e as sanções que previsivelmente possam vir a ser aplicadas, só é possível com a medida que lhe foi fixada, pois, desta perspectiva, é aquela que melhor se adequa à prevenção dos perigos a acautelar, retendo uma melhor proporcionalidade dentro daquelas que estão legalmente previstas. E, repete-se, dos autos não constam, nem o arguido/recorrente indica quaisquer circunstâncias factuais, novas, que o Tribunal pudesse avaliar para consequentemente decidir pela alteração da medida de coacção anteriormente aplicada. O que invoca nada tem a ver com a factualidade integrante dos requisitos da respectiva medida aplicada.
Por seu turno, o despacho recorrido não enferma de qualquer vício, omissão ou nulidade que determinem a sua revogação, antes se mostrando em conformidade com o direito e os factos em causa.
Pelo exposto, consideramos improcedentes os argumentos invocados pelo recorrente, não procedendo assim o seu recurso.

III- DECISÃO.
Em face do exposto, acordam os Juízes da 9.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa em negar provimento ao recurso interposto pelo arguido, confirmando-se a decisão recorrida.
Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 3 UCs (arts. 513.º, n.ºs 1 e 3, e 514.º, n.º 1, ambos do CPP, 8.º, n.º 5, do Regulamento das Custas Processuais e Tabela III a ele anexa).
Notifique.
(Acórdão elaborado e integralmente revisto pela relatora – art.º 94º, nº 2 do CPP)
Lisboa, .../.../2019
Relatora
Maria do Carmo Ferreira

Adjunta
Cristina Branco