Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
457-B/2002.L1-2
Relator: PEDRO MARTINS
Descritores: PENHORA
BENS IMPENHORÁVEIS
SALÁRIO MÍNIMO NACIONAL
EXECUÇÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 11/17/2011
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: AGRAVO
Decisão: PARCIALMENTE PROVIDO
Sumário: Quando uma execução já tem 9 anos (aplicando-lhe-se o CPC na redacção de 95/96) e apenas é conhecido à executada um salário mínimo nacional acrescido de subsídio de alimentação, deve ser aplicado o limite da impenhorabilidade do salário mínimo nacional resultante da jurisprudência do Tribunal Constitucional, ordenando-se a penhora só na parte que o exceda.
(Sumário do Relator)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa os juízes abaixo assinados:

Nesta execução, a entidade patronal da executada “A” informar em 17/11/ 2010 que o ordenado base desta era de 475€, com um desconto de 11% para a segurança social, que a mesma ainda tinha um subsídio de alimentação de 6,50€ por 12 dias, tendo ficado com 500,63€ de rendimento líquido e que, por isso, sendo feita a penhora, ficava com uma disponibilidade inferior à remuneração mínima garantida por lei (isto tendo em conta tudo o que consta de fls. 505 e 506 = fls. 15 e 16 deste apenso).
A exequente “B” requereu em 17/05/2011 que a entidade patronal fosse notificada para penhorar 1/3 das remunerações mensais ilíquidas da executada.
Tal requerimento foi indeferido por despacho de 19/05/2011.
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A exequente agravou de tal despacho, para que fosse substituído por outro que ordenasse a penhora das remunerações ilíquidas da executada, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões:
1. A executada aufere remunerações superiores ao salário mínimo nacional, logo penhoráveis em 1/3.
2. As remunerações a que alude o artigo 824° do CPC são ilí-quidas; logo, qualquer raciocínio deduzido a partir de premissa di-ferente, assenta em pressuposto errado redundando pois em con-clusão inaplicável ao caso.
3. Inexiste qualquer alteração de circunstância, superveniente ao contrato objecto da execução, ou qualquer circunstância excepcional, que possa justificar a impenhorabilidade das pensões.
4. Ficou demonstrado que a executada aufere quantia mensal ilíquida superior ao salário mínimo nacional.
5. A executada não se opôs à penhora das pensões, não requerendo isenção nem mesmo a sua redução.
6. O Sr. Juiz apenas excepcionalmente pode isentar de penho-ra a totalidade os rendimentos. Ora, no caso dos autos não há facto que possa ser considerado como de excepção, pois nenhum dos factos aduzidos é fortuito, de força maior ou de carácter acidental que possa por si justificar a alteração posterior das circunstâncias, designadamente para efeitos de pagamento de encargos assumidos.
7. Ao verificar-se a isenção pretendida, colocar-se-ia a execu-tada na posição de se eximir de forma inexplicável ao pagamento de uma dívida.
Não foram apresentadas contra-alegações.
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Questões que importa solucionar: se o que interessa à impenhorabi-lidade é o valor do salário ilíquido ou do salário líquido; se o subsídio de alimen-tação deve contar para esse efeito; se resultando da penhora de 1/3 um valor residual inferior ao salário mínimo nacional a penhora não deve ser deferida, mesmo nada sendo dito no sentido de que esse é o único rendimento do executado; por fim, como quem pede o mais quer também o menos, fica por saber, se for possível a penhora de uma parte menor do que a pedida, se ela deve ser ordenada nessa parte.
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Os factos que interessam são aqueles que resultam do relatório que antecede.
I
As normas a aplicar à decisão são as do CPC com a redacção em vigor em 2002, data em que a execução foi instaurada, visto que a reforma operada pelo Dec. Lei 38/2003, de 08/03, e Dec. Lei 199/2003, de 10/09, que só entrou em vigor em 15/09/2003, não se aplica aos processos pendentes (por força dos arts. 21/1 e 23 do primeiro e 4º do segundo), o mesmo se passando em relação à “reforma da reforma” (operada pelo Dec. Lei 226/2008, de 20/11, por força do seu art. 22/1) que só entrou em vigor em 31/03/2009.
II
Por força do art. 824/1a) do CPC são impenhoráveis 2/3 dos vencimentos ou salários auferidos pelo executado.
Quanto à parte penhorável, dizia o art. 824/2 do CPC (sempre naquela redacção antiga) que ela era fixada pelo juiz entre um terço e um sexto, segundo o seu prudente arbítrio, tendo em atenção a natureza da dívida e as condições económicas do executado.
No entanto, acrescentava ainda o nº. 3 do art. 824 do CPC: pode o juiz excepcionalmente isentar de penhora os rendimentos a que alude o nº. 1, tendo em conta a natureza da dívida exequenda e as necessidades do executado e seu agregado familiar.
III
Como logo resulta da lógica destes três preceitos do art. 824 do CPC, o salário que interessa é o líquido (de impostos), pois que o que se pretende é que o executado nunca fique com menos do que o valor que se entende, por norma, corresponder quase ao limiar de sobrevivência, e para isso não importa aquilo que inclui impostos, mas sim aquilo que fica para o executado (no mesmo sentido, expressamente, os acs. do TRL de 17/09/2009 (131-D/2000.L1-6) e do TRL de 02/11/2006 (8768/2006: a lei está a reportar-se ao montante líquido, pois só este constitui rendimento do executado. Na verdade, é com a parte líquida do vencimento – a que efectivamente é percebida – que o executado faz face às suas despesas, e apenas esta pode ser considerada para efei-to de penhora. Sob pena, acrescenta o acórdão da penhora incidir sobre algo que não constitui rendimento, antes encargo do executado - o correspondente aos res-pectivos descontos salariais); no mesmo sentido, implicitamente, os acs. do TRL de 03/12/2009 (4028/09.7TVLSB-A.L1-2); do TRG de 12/07/2006 (1086/06-2); do TRL de 23/05/2006 (1579/2006-1); e do TRL de 21/05/2009 (1075-A/2001. L1-2); contra, veja-se o ac. do TRL de 15/09/2009 (1108-A/2002.L1-1: baseando-se no facto da lei falar em vencimento e não em vencimento líquido, o que não convence).
IV
O subsídio de alimentação é uma prestação de natureza semelhante ao vencimento pelo que deve contar para estes efeitos. É uma questão que hoje se pode dizer expressamente resolvida pela nova redacção do art. 824/1a), mas é algo que já antes se defendia [defendendo, para um caso aná-logo, que assim é, veja-se o ac. do TRG de 12/07/2006 (1086/06-2 da base de dados do ITIJ: O subsídio de alimentação laboral é susceptível de penhora e, por consequência, sujeito a apreensão no processo de insolvência, desde que os rendi-mentos do falido, em que tal subsídio se integra, ultrapassem o montante do salá-rio mínimo nacional, à data da apreensão); ainda, expressamente, no mesmo senti-do, o ac. do TRL de 17/09/2009 (131-D/2000.L1-6); também assim, embora quan-to às ajudas de custo e já com referência ao preceituado no art. 824º/2 do CPC na redacção decorrente do DL 38/03, de 08.03, o ac. do TRP de 25/03/2010 (1139/ 07.7TBLSD-A.P1: as ajudas de custo, apesar de poderem não constituir, em rigor, “retribuição” (art. 260º/1 do Código do Trabalho), não podem deixar de conside-rar-se como um “rendimento” de que o agregado familiar do executado beneficia); contra, implicitamente, veja-se o ac. do TRL de 23/05/2006 (1579/2006-1) que entende que os subsídios não integram o salário.
V
Assim, tendo em conta estas duas últimas conclusões, o vencimento global líquido da executada era de 500,63€ líquidos, pelo que seriam impenhoráveis 333,75€.
E a parte penhorável, no caso, poderia ser fixada entre 83,44€ e 166,88€, podendo o juiz ainda, como se viu, isentar todo este valor da penhora.
VI
Como o juiz, por norma, ao ordenar a penhora, não tem conheci-mento das condições económicas do executado, designadamente se o exe-cutado tem ou não outros rendimentos, nem das necessidades do executado e do seu agregado familiar, as normas dos nºs. 2 e 3 do art. 824 do CPC não poderiam ser utilizadas sem que o executado viesse dar conhecimento de tais condições e necessidades ao processo.
E, por isso, o juiz devia deferir a penhora fixando a parte penhorá-vel no máximo possível, isto é, 1/3, ou seja, no caso dos autos, em 166,88€, restando à executada 333,75€.
VII
No entanto, depois de uma série de acórdãos do tribunal constituci-onal (apenas por exemplo, 349/91, 411/93, 318/99, 62/2002, 177/2002 e 96/2004, todos sempre publicados http://www.tribunalconstitucional.pt/tc; alguns referem-se à al. b) do nº. 1 do art. 824, outros à al. a); a diferença é irrelevante porque em todos se põe a mesma questão) a defender a inconstitucionalidade das normas que permitiam a penhora de uma parcela do salário ou pensão do executado, que não é titu-lar de outros bens penhoráveis suficientes para satisfazer a dívida exequen-da, e na medida em que priva o executado da disponibilidade de rendimento mensal correspondente ao salário mínimo nacional, começou-se a entender que o salário mínimo nacional seria impenhorável.
Estes acórdãos deviam ser lidos, entretanto, com atenção aos seus termos: os mesmos pressupõem que está demonstrado que o executado não tem outros rendimentos. Repare-se, com efeito, nos termos da declaração de inconstitucionalidade do ac. 96/2004: executado que não é titular de outros bens penhoráveis suficientes… e na medida em que priva o executado da disponibilidade de rendimento mensal correspondente ao salário mínimo nacional.
Daí que, o ac. do TC 177/2002 esclareça “como resulta do acórdão nº 318/99, os julgamentos de inconstitucionalidade cuja generalização se requer nes-te processo tiveram como pressuposto necessário a circunstância de o executado não dispor, nem de outros rendimentos (incluídas aqui quaisquer outras das pres-tações referidas na al. b) do nº 1 do artigo 824º do CPC), nem, em geral, de outros bens penhoráveis, suficientes para satisfazer a dívida exequenda. A declaração de inconstitucionalidade não vai, assim, afectar injustificadamente os interesses do exequente, já que a sua razão de ser leva a que, em casos em que o executado aufi-ra duas ou mais prestações compreendidas naquele preceito, se tenha de conside-rar, para efeitos de impenhorabilidade, a globalidade das prestações recebidas.”
VIII
Assim, dir-se-ia que pressuposto da aplicação da ideia da impenho-rabilidade do salário mínimo (ou remuneração mínima mensal garantida…) nacional seria sempre a demonstração de que o executado não tem outros rendimentos, ou seja, que a penhora o iria deixar sem a disponibilidade de, pelo menos, um valor igual ao salário mínimo nacional.
Dito de outro modo, para que o executado tivesse direito a obter uma impenhorabilidade superior à normal de 2/3 ou mesmo à isenção da penhora teria que estar demonstrado no processo, em princípio por ele, que não recebia outro rendimento (art. 342/1 do CC).
Ora, como o tribunal, quando ordena a penhora, não sabe – tal co-mo, por norma, não o saberá a exequente - se o executado tem ou não ou-tros rendimentos, não podia ter por verificados os pressupostos daquelas ex-cepções e por isso devia aplicar a regra geral da impenhorabilidade apenas de 2/3 do vencimento do mesmo [assim, por exemplo, o ac. do TRG de 12/07/2006: No caso em apreço, não vem demonstrado que o salário mensal da recorrente, nele se incluindo o questionado subsídio de alimentação, seja o seu único rendimento, pelo que poderia ser apreendida uma terça parte dele (…)”; ou o acórdão do TRP de 19/05/2010 (2205/06.1TBVCD-B.P1: a impenhorabilidade relativa de prestações pagas a título de pensão não depende apenas da circunstância de a prestação sobre que recai a penhora ser de valor equivalente a um salário mínimo nacional, sendo que também é necessário demonstrar que o executado não tem outros rendimentos); nos acs. do TRL de 03/12/2009 (4028/09.7TVLSB-A.L1-2) e do TRC de 29/06/2004 (2096/04), as coisas não se põem assim, mas de qualquer modo, parte-se do facto provado de que o executado não recebe qualquer subsídio nem tem qualquer outro rendimento].
Assim, o tribunal não deveria indeferir a penhora de 1/3 do salário ou pensão de 200€, com fundamento na impenhorabilidade de um valor igual ao salário mínimo nacional, porque não sabe se o executado não tem outro salário ou pensão do dobro ou do triplo do salário mínimo nacional.
IX
Os tribunais, no entanto, não tem seguido esta posição. Por norma, têm indeferido a penhora de vencimentos ou pensões de valores iguais ao salário mínimo nacional apenas tendo em conta esse vencimento ou pensão.
Ou seja, em vez de se pôr o ónus da prova a cargo do executado, com a consequência de que, não se demonstrando que não existem outros rendimentos ou bens, se deve decidir a dúvida em prejuízo do executado, partindo-se pois do princípio de que o salário ou a pensão em causa não serão os únicos, em vez disso, dizia-se, põe-se antes a dúvida a beneficiar o executado e, não sendo conhecidos outros bens ou rendimentos penhoráveis ao mesmo, parte-se do princípio de que o executado só tem esse salário ou essa pensão, pelo que, se a penhora o for deixar com um valor residual inferior ao salário mínimo nacional, indefere-se a mesma [neste sentido, vejam-se, apenas por exemplo, os acórdãos do TRL de 23/05/2006 (1579/2006-1); do TRL de 24/06/2010 (374-A/2001.L1-2); do TRL de 14/12/2010 (1378-C/2002.L1-7); do TRL de 18/11/2010 (1510/1996.L1-8); do TRC de 14/03/2006 (215/06); do TRG de 20/01/2011 (475-A/1996.G1)].
X
E esta última solução entende-se, pelo menos em casos idênticos aos dos autos.
Pois que a execução tem data de 2002 e decorridos que estão 9 anos, aquilo que se está a discutir é a penhora de um salário mínimo nacional acrescido de um subsídio de alimentação de 6,50€ por dia útil de trabalho.
Ou seja, utilizando os termos que são utilizados nestes últimos acórdãos referidos, não são conhecidos outros rendimentos ou bens penhoráveis à executada. É como se neste caso se utilizasse uma presunção natural ou judicial de que o salário em causa em causa é o único rendimento da executada.
XI
Justifica-se, pois, no caso, a aplicação do limite da impenhorabili-dade de um salário mínimo nacional, que no momento é de 485€ (Dec. Lei 143/2010, de 31/12).
Pelo que restariam penhoráveis à executada 15,63€ (= 500,63€ - 485€).
Tendo a exequente pedido a penhora de 1/3 das remunerações men-sais ilíquidas da executada, ou seja, pedido a penhora de 184,33€ [= 1/3 de 553€ (ordenado base ilíquido + subsídio de alimentação ilíquido), o pedido ultrapassava o valor penhorável.
Mas tal não impunha o indeferimento do pedido de penhora, mas apenas que fosse ordenada a penhora na parte possível (“deve o juiz reduzir a penhora aos limites razoáveis” dizia Castro Mendes, Acção Executiva, pág. 101 = pág. 105 da edição da AAFDL de 1980, lembrado por Lebre de Freitas, pág. 203, nota 8, da A acção executiva, Coimbra Editora, 1993), isto é, a penhora do valor que, em cada mês, ultrapassasse o valor do salário mínimo nacional vigente [no sentido de ser admitida a penhorabilidade da diferença, veja-se o ac. do TRL de 13/03/2008 (7582/2007-6: O legislador ao consagrar que a parte penhorável dos rendimento do executados era fixado pelo juiz entre 1/3 e 1/6, não teve em mente eleger, com carácter de obrigatoriedade, a fracção correspondente a 1/6 como padrão mínimo abaixo do qual não fosse possível proceder à penhora dos ditos rendimentos)].
O que se decide, procedendo, assim, parcialmente, o recurso.
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Não se faz constar o sumário do acórdão do corpo do acórdão, porque, nos termos do disposto no artigo 713º, nº7 do CPC, o sumário é exclusivamente da responsabilidade do relator. O sumário deve constar ou de uma parte prévia anterior ao inicio do acórdão, ou de uma folha solta a final do mesmo, aliás em consonância com os usos desta 2ª secção.
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Pelo exposto, julga-se parcialmente procedente o recurso, revo-gando-se o despacho recorrido e substitui-se por este que ordena a penhora da parte do vencimento total (isto é, incluindo o subsídio de alimentação) líquido da executada na parte que exceda o salário mínimo nacional vigente no momento, devendo ser proferido despacho que concretize esta decisão e lhe dê o adequado seguimento processual.
Custas do recurso pela exequente na proporção do decaimento (pe-dia a penhora de 184,33€, quando apenas seriam penhoráveis, naquele mo-mento, 15,63€).

Lisboa, 17 de Novembro de 2011.

Pedro Martins (com declaração de voto junto)
Sérgio Almeida
Ana Paula Boularot.

Declaração de voto:
A maioria deste colectivo votou a retirada do sumário que constava do meu projecto de acórdão.
O sumário tinha a seguinte teor: «quando uma execução já tem 9 anos (aplicando-lhe-se o CPC na redacção de 95/96) e apenas é conhecido à executada um salário mínimo nacional acrescido de subsídio de alimentação, deve ser aplicado o limite da impenhorabilidade do salário mínimo nacional resultante da jurisprudência do Tribunal Constitucional, ordenando-se a penhora só na parte que o exceda.»
Para essa retirada não me foram dados outros argumentos para além de que o sumário do acórdão, nos termos do disposto no artigo 713º, nº7 do CPC é exclusivamente da responsabilidade do relator, pelo não deverá fazer parte integrante do corpo da peça, devendo constar ou de uma parte prévia anterior ao inicio do acórdão, ou de uma folha solta a final do mesmo, aliás em consonância com os usos da secção.
Quanto ao argumento da responsabilidade, o mesmo é exclusivamente formal. Ora, do ponto de vista formal, o que a norma diz é que o juiz que lavrar o acórdão deve sumariá-lo. Pelo que, se a norma em causa tiver aquele sentido, então quer dizer que quer o sumário quer o acórdão são da exclusiva responsabilidade do relator. Ou seja, é um argumento que prova demais: se o sumário, por ser da exclusiva responsabilidade do relator, devesse ser elaborado numa folha à parte, então também o acórdão o deveria ser…
Quanto à referência aos usos da secção tem ainda menos força, visto que parte do pressuposto – errado - de que os usos de uma secção têm força de norma jurídica. E, para além disso, tem por base uma afirmação que não corresponde integralmente à realidade, ao menos se com os usos da secção se pretende referir uma actuação uniforme da secção nesse sentido. Isto é, como não se faz qualquer restrição, com a referência aos usos, quer-se dizer necessariamente que toda a secção assim o faz. Ora, sem ter tentado averiguar qual a posição de todos os juízes da 2ª secção, deparei-me, à medida que fui lendo a jurisprudência para outros projectos que estava a elaborar, com os acórdãos do TRL de 16/07/2009 (1919/08.6YXLSB-A.L1-2) e de 30/04/2009 (1320/08-2), ambos de juízes desta secção, que tinham um sumário (embora no último caso se lhe desse o nome de conclusões) antes da parte decisória.
Posto isto, considero improcedentes os argumentos que me foram dados contra a sumarização do acórdão no corpo do próprio acórdão.
E pegando nas regras que foram referidas a propósito do que antecede, já se sabe que a elaboração quer do acórdão quer do sumário são da responsabilidade do mesmo juiz. Se isto é assim e se estas regras constam do artigo (713 do CPC) que trata da elaboração do acórdão, não se vê qualquer razão para separar o corpo do acórdão do respectivo sumário.
Quanto a razões de fundo: o sumário do acórdão deve ser entendido como a síntese das razões que levaram à decisão do recurso pelo tribunal colectivo. Essa síntese, tal como as razões do acórdão, devem reflectir a posição tomada pelo colectivo. Ora, a síntese pode estar errada. Estando errada – por não corresponder ao que foi decidido -, os outros juízes do colectivo devem poder corrigir a desconformidade da síntese com as razões do acórdão, o que só por si justifica que o sumário do acórdão faça parte do próprio acórdão, pois que de outra forma as correcções não poderiam acontecer.
Pedro Martins