Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
7606/16.4T8ALM-A.L1-8
Relator: LUÍS CORREIA DE MENDONÇA
Descritores: ACTA DA REUNIÃO DE CONDÓMINOS
TÍTULO EXECUTIVO
CÁLCULO DEVIDO POR CADA CONDÓMINO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 03/22/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE/REVOGADA A DECISÃO
Sumário: Da acta de reunião da assembleia de condóminos, para valer como título executivo, apenas terá de constar o montante certo da contribuição de modo que, pela simples aplicação da permilagem relativa a cada fracção da propriedade (ou de outro critério que haja sido aprovado) se determine o quantum devido por cada condómino.

SUMÁRIO: (elaborado pelo relator)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na Relação de Lisboa.


Questão prévia.


Ao contrário do entendimento do recorrido, a decisão é recorrível ex artigos 734.º e 853.º, 3, CPC.

A Administração do Condomínio do prédio sito na Rua (…) instaurou execução sumária contra B para haver deste o pagamento das quotas e de mais despesas em atraso, relativas aos anos de 2013, 2014, 2015 e 2016.

Juntou cópias das actas das Assembleias de Condóminos realizadas.

O executado deduziu embargos em que invoca a falta de título executivo.

O tribunal indeferiu liminarmente o requerimento executivo ex artigo 726.º, n.ºs 1 e 2, alínea a) do CPC por manifesta falta de título executivo.

Inconformado, o Condomínio interpôs competente recurso, cuja minuta concluiu da seguinte forma:
1- O presente recurso vem interposto da douta sentença proferida nos autos à margem identificados da decisão de mérito, que indefere liminarmente o requerimento executivo pondo, por dessa via, fim ao processo.
2- Decidindo como decidiu, o Meritíssimo Juíz do Tribunal a quo não fez uma correta interpretação dos factos, nem tão pouco uma adequada subsunção dos mesmos à norma jurídica tendo deixado violadas diversas normas jurídicas, entre outras, ao estatuído no Art° 6 do DL 268/84 de 25/10.
3- Entende o recorrente que as atas juntas ao requerimento executivo inicial, constituem título executivo, nos termos do artigo 6 do DL 268/84 de 25/1O, uma vez que deliberam os montantes das contribuições devidas ao condomínio pelo executado.
4- A douta sentença recorrida que concluí pela manifesta falta de título executivo e indefere liminarmente deve pois ser revogada, proferindo-se outra que considere as atas juntas pelo exequente, ora recorrente, título executivo válido e bastante.
NESTES TERMOS DEVE CONCEDER-SE PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO E, CONSEQUENTEMENTE REVOGAR-SE A DOUTA SETENÇA RECORRIDA E, EM CONSEQUENCIA, PROFERIR-SE DECISÃO QUE JULGUE AS ATAS JUNTAS COM O REQUERIMENTO EXECUTIVO INICIAL COMO TÍTULO EXECUTIVO, SEGUINDO ­SE OS DEMAIS TERMOS ATÉ FINAL ASSIM SE FAZENDO
JUSTIÇA!

O embargante contra-alegou considerando irrecorrível a decisão impugnada.
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A única questão decidenda consiste em saber se existe ou não  título executivo.
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É de considerar assente a facticidade que consta do relatório supra e que aqui se dá por inteiramente reproduzido.
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A única questão em debate é já uma vexata quaestio.

O artigo 703.º CPC contém um elenco taxativo das espécies de   títulos executivos. De entre estes, os documentos a que, por disposição especial, seja atribuída força executiva (n.º 1, alínea d). É o caso da acta de reunião do condomínio, nas condições do artigo 1.º, n.º 1, DL n.º 268/94, de 25 de Outubro.

Duas posições estão em confronto: uma que defende a posição seguida pelo primeiro grau e que exige que a acta para valer como título executivo terá de conter não só o nome do devedor, mas também o montante em dívida (cfr. por todos Ac. STJ de 10.07.2008, in www.dgsi.pt); outra, menos exigente, que apenas impõe que seja aprovado o montante certo da contribuição de modo que, pela simples aplicação da permilagem relativa a cada fracção da propriedade (ou de outro critério que haja sido aprovado) se determine o quantum devido por cada condómino (cfr. por todos Ac. STJ de 14.10.2014, in www.dgsi.pt).

Seguimos este último entendimento. 

Nos termos do disposto no art. 6º, nº1, do DL nº 268/94, de 25.10, “A acta da reunião da assembleia de condóminos que tiver deliberado o montante das contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum, que não devam ser suportadas pelo condomínio, constitui título executivo contra o proprietário que deixar de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte”.

Como se refere no Preâmbulo do citado DL as regras aprovadas “têm o objectivo de procurar soluções que tornem mais eficaz o regime da propriedade horizontal, facilitando simultaneamente o decorrer das relações entre os condóminos e terceiros’’

Extrai-se do regime legal aplicável que é a segunda interpretação a que melhor se adequa ao caso sujeito, pelas seguintes razões que destaca o citado Ac. STJ de 14.10.2014:
i) “em homenagem ao elemento literal da interpretação da lei, já que a expressão empregue pelo legislador foi a de “deixar de pagar”, o que consente uma projecção “in futurum”,quando teria sido muito mais apropriada a expressão “tenha deixado de pagar”, caso tivesse em mente a omissão de pagamento de prestações já vencidas, com possibilidade da respectiva quantificação exacta, desde logo, na própria acta que constitui a fonte da obrigação exequenda’’;
ii) “depois, e muito mais decisivamente, porque só a propugnada interpretação se compatibiliza com o propósito legislativo subjacente à criação deste novo título executivo – elemento teleológico da interpretação (art. 9º, nº1, do CC) –, dotando o condomínio dum instrumento célere e eficaz para a prossecução e realização das atribuições a seu cargo, dispensando-o do recurso a fastidiosas, longas e desgastantes acções declarativas, em ordem ao cumprimento coercivo das obrigações impendentes sobre condóminos recalcitrantes, oportunistas e relapsos’’;
iii) “ainda porque para uma acta de assembleia de condóminos constituir título executivo não é necessário que, na mesma, se encontre já liquidada a dívida do condómino executado, já que é impossível fazer constar, desde logo, do documento que cria a obrigação de efectuar pagamentos futuros o valor daqueles que, nesse mesmo futuro, virão a ser incumpridos’’;
iv) “caso o condomínio tenha incorrido em lapso, instaurando execução indevida, sempre o condómino perseguido poderá deduzir oposição à execução, nesta fazendo prevalecer a regularidade da sua situação perante o exequente, com as inerentes consequências legais’’;
v) “A interpretação perfilhada é a única que permite considerar que, no caso, o legislador consagrou a solução mais acertada e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados (art. 9º, nº3, do CC), uma vez que a adversa (…) teria o condão de estimular a tendencial eternização de conflitos surgidos no seio do condomínio por não serem, atempadamente, pagas as prestações a cargo dos respectivos condóminos’’.

Sendo esta a interpretação preferível, verifica-se que no caso vertente o exequente juntou 4 actas que aprovam o orçamento anual do condomínio para os anos de 2013 a 2016 e comparticipações mensais para o condomínio e respectivos valores com referência a permilagens que é possível claramente individualizar a partir do documento junto com o n.º 6.

É assim de extrema facilidade calcular o quantum devido pelo executado.

Pelo exposto, acordamos em julgar procedente o recurso e, consequentemente em revogar a decisão recorrida que se substitui por outra que ordena o prosseguimento dos autos.
Custas pelo recorrido, levando-se em consideração o apoio judiciário de que beneficia.



Lisboa,22.03.2018



(Luís Correia de Mendonça)
(Maria Amélia Ameixoeira)
(Rui Moura)