Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
13636/18.4T8LSB.L1-6
Relator: ANA DE AZEREDO COELHO
Descritores: INSTITUIÇÃO BANCÁRIA
INTERMEDIÁRIO FINANCEIRO
RESPONSABILIDADE CONTRATUAL
DEVER DE INFORMAÇÃO
DEPÓSITOS A PRAZO
OBRIGAÇÕES SUBORDINADAS
DOLO
PRESCRIÇÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 10/08/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I) A actividade das instituições bancárias está sujeita a normas específicas que impõem obrigações organizativas de competência e conhecimento de modo a que possam prestar aos clientes um serviço de qualidade e a especialíssima consideração dos interesses dos clientes mesmo quando confrontados com os interesses da própria instituição e do grupo em que eventualmente se insere.
II) A actividade de instituições bancárias enquanto intermediárias financeiras impõe ainda que se considerem os deveres especiais quanto à qualidade da informação a prestar, ao conhecimento do perfil do cliente, aos eventuais conflitos de interesses e à prevalência do interesse do cliente face ao da própria instituição financeira, características de informação que o artigo 312.º, do CVM, na primitiva redacção, que é a aplicável, densifica ao estabelecer que o intermediário financeiro deve prestar todas as informações necessárias para uma tomada de decisão esclarecida e fundamentada.
IV) O cumprimento do dever de informação, nomeadamente na vertente da completude da mesma, deve ser analisado segundo o princípio da proporcionalidade inversa, a estabelecer entre o âmbito e conteúdo da informação e a (i)literacia financeira do cliente.
V) Só ao nível do caso concreto, com base na factualidade provada, se poderá concluir se um intermediário financeiro forneceu toda a informação que lhe era possível e exigível fornecer, face ao perfil do cliente e às suas necessidades informacionais.
VI) A indicação de que as obrigações têm capital garantido sendo similares a depósitos a prazo, não pode ser considerada informação inexacta, face ao funcionamento do produto.
VII) Tendo a instituição bancária firmado a sua campanha de venda das obrigações na similitude das mesmas com a constituição de depósitos a prazo, estava obrigada a informar sobre a diferença específica entre aqueles e a subscrição de obrigações subordinadas.
VIII) A omissão de informação quanto a essas diferenças constitui violação do dever de informação por parte do intermediário financeiro, face a um perfil de investidor que nada indicava pudesse dominar o conceito de obrigação ou de credor obrigacionista e as suas diferenças face ao depósito bancário e à protecção do depositante bancário.
IX) Demonstrada a ilicitude decorrente da violação do dever de informação, presume-se a culpa do intermediário no incumprimento contratual, uma vez que no contexto contratual a prestação de informação assume a natureza de prestação principal e não de mero dever acessório.
X) Estando demonstrado que a violação de informação foi causa da subscrição das obrigações e que estas não foram pagas na maturidade, tem de entender-se que a subscrição das obrigações é causa adequada do dano que o não pagamento do capital constitui; a causa (normativamente adequada) pode ser, não necessariamente directa e imediata, mas indirecta, bastando que a acção causal desencadeie outra condição que, directamente, suscite o dano.
XI) O comportamento do Banco em clara violação dos seus deveres de informação enquanto instituição bancária e enquanto intermediário financeiro, não pode ser considerado mera negligência ou culpa leve, antes se devendo caracterizar como dolosa, sendo aplicável o prazo prescricional geral e não o de dois anos previsto no artigo 324.º, n.º 2, do CVM.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: ACORDAM na 6ª secção do Tribunal da Relação de Lisboa:

I) RELATÓRIO
M……, com os sinais dos autos, veio instaurar a presente acção com processo comum contra BANCO BIC PORTUGUÊS, S.A., com os sinais dos autos, pedindo a condenação do Réu a pagar-lhe o montante de € 54.645,72 (cinquenta e quatro mil seiscentos e quarenta e cinco euros e setenta e dois cêntimos), acrescido de juros à taxa supletiva legal para as operações comerciais, contados sobre € 50.000,00, desde a citação e até integral e efetivo pagamento.
Alegou para tanto e em síntese que o Réu, então com a designação de Banco Português de Negócios (doravante BPN), lhe propôs uma aplicação idêntica a um depósito a prazo, que o Autor subscreveu, descobrindo após que a mesma aplicação era uma obrigação emitida pela Sociedade Lusa de Negócios (doravante SLN), garantida por esta e não pelo BPN, tendo perdido o capital de € 50.000,00 da referida subscrição, por insolvência da SLN.
O Réu apresentou contestação excepcionando a prescrição do invocado crédito e impugnando os factos.
Cumprido o demais legal, houve audiência de julgamento após a qual foi proferida sentença que julgou procedente a acção.
O Réu interpôs o presente recurso dessa sentença e, alegando, concluiu como segue as suas alegações, apresentando ainda dois pareceres:
I. O Banco Recorrente não pode concordar com a matéria de facto dada como provada descrita nos pontos 5, 7, 8, 23 e 24.
II. Entendendo ainda que deveria ter sido dada como provada a matéria de facto vertida no ponto I dos factos dados como não provados na formulação que adiante se indica.
III.A modificação da matéria de facto impõe-se pela análise do depoimento da testemunha S …, no seu depoimento, gravado no sistema citius no ficheiro com a referência 20200128142641_19561225_2871036 nos trechos acima identificados bem como pela análise dos seguintes documentos: documentos 6, 7, 8, 9 e 14 juntos com a Petição Inicial com a relevância indicada nas alegações relativas a cada um dos factos individualmente.
IV.Tendo em conta estes elementos de prova entende o Recorrente que os factos provados 5, 23 e 24 devem ser dados como não provados.
V. Devendo ainda os factos 7 e 8 ser excluídos do rol de facto provados.
VI.Entende ainda que deverá ser dado como provado o seguinte facto:
I. Aquando da subscrição do produto em causa, o Autor foi informado de que se tratavam de Obrigações emitidas pela SLN, Sociedade Lusa de Negócios, SGPS, S.A.
VII.A putativa desconformidade entre o comportamento exigido ao Réu e o seu comportamento verificado teria que ver com a circunstância do funcionário do Banco Réu ter assegurado ao subscritor (conforme ele próprio estava convencido) que a aplicação financeira era um produto sem risco e com capital garantido, não transmitindo a característica da subordinação ou a possibilidade de insolvência da emitente, configura a prestação de uma informação falsa.
VIII.Porém, tal realidade não configura qualquer violação do dever de informação por prestação de informação falsa.
IX.O único risco que percebemos existir na emissão obrigacionista em causa é exactamente o relativo ao cumprimento da obrigação de reembolso.
X. Este risco corresponde ao incumprimento da prestação principal da entidade emitente! Ou seja, corresponde ao chamado RISCO GERAL DE INCUMPRIMENTO!
XI.A possibilidade deste incumprimento não corresponde a qualquer especial risco inerente ao modo de funcionamento endógeno do instrumento financeiro... antes corresponde ao normal e universal risco comum a todos, repete-se... a todos, os contratos!
XII.Do incumprimento da obrigação de reembolso da entidade emitente, em 2014, não podemos, sem mais, retirar que esse o risco dessa eventualidade fosse relevante – sequer concebível, à excepção de ser uma mera hipótese académica -, em 2004, dez anos antes!
XIII.A SLN era titular de 100% do capital social do Banco-R., exercendo, por isso o domínio total sobre este.
XIV.O risco associado ao reembolso das Obrigações correspondia, então ao risco de solvabilidade da SLN.
XV.E sendo esta totalmente dominante do Banco-R., então este risco de solvência, corresponderia, grosso modo, ao risco de solvabilidade do próprio Banco!
XVI.A segurança da subscrição de Obrigações emitidas pela SLN seria correspondente à segurança de um Depósito a Prazo no BPN.
XVII.O risco BPN ou risco SLN, da perspectiva da insolvência era também equivalente!
XVIII.A única diferença consistiu no facto do Banco ter sido resgatado através da sua nacionalização, numa decisão puramente política e alicerçada num regime aprovado propositadamente para atender a essa situação e não em qualquer quadro legal previamente estabelecido.
XIX.A menção do dito risco praticamente inexistente, como de resto do capital garantido, não pode senão ser entendida no contexto da atribuição de uma segurança acima da média ao produto, de confiança no normal cumprimento de todas as obrigações da emitente, sustentada em factos e juízo objectivamente razoáveis e previsíveis.
XX.A menção à expressão capital garantido não tem por si só a virtualidade de atribuir qualquer desaparecimento de todo o risco de qualquer tipo de aplicação…
XXI.A expressão capital garantido mais não é do que a descrição de uma característica técnica do produto – corresponde à garantia de que o valor de reembolso, no vencimento, é feito pelo valor nominal do titulo e correspondente ao respectivo valor de subscrição! Ou seja, o valor do capital investido é garantido!
XXII.A este propósito o Plano de Formação Financeira em site do Conselho de Supervisores Portugueses – www.todoscontam.pt! descreve as características de produtos financeiros, entre os quais as Obrigações, e explica a garantia de capital, exactamente nos termos que vimos de expor.
XXIII.Ainda que se entenda que esta expressão mereceria uma densificação ou explicação aos clientes, a fim de evitar qualquer confusão, o certo é que, transmitindo uma característica técnica, não se poderá afirmar que o banco, ou os seus colaboradores agiram com culpa, e muito menos grave!
XXIV.O Banco limitou-se a informar esta característica do produto, não sendo sua obrigação assegurar-se de que o cliente compreendeu a afirmação.
XXV.A interpretação das menções “sem risco” ou de “capital garantido” não é susceptivel de ser feita apenas com recurso à impressão do destinatário, nos termos do previsto no artº 236º do CCiv. uma vez que esta disposição aplica-se, apenas e só, às declarações negociais.
XXVI.A comercialização por intermediário financeiro de produto com a indicação de que o mesmo tem “capital garantido” não implica a corresponsabilização do referido intermediário pelo prejuízo decorrente da falta de reembolso por parte da entidade emitente.
XXVII.O dever de informação ao cliente, não se trata de um direito absoluto do cliente à prestação de informações exactas, mas apenas de um dever de esforço sério de recolha de informações o mais fiáveis possível pelo banco.
XXVIII.O grau de exactidão em relação às informações será variável, consoante o tipo de informação em causa.
XXIX.No caso dos presentes autos, ficou demonstrado, e foi assumido pelos Autores, que era do interesse e vontade do subscritor investir em produtos de com boa rentabilidade e de elevada segurança.
XXX.Apesar do subscritor não ser investidor com especiais conhecimentos técnicos na área financeira o risco do produto em causa nos presentes autos era, pelas razões já várias vezes repetidas, baixo uma vez que nada fazia antever qualquer dificuldade futura do emitente.
XXXI.Assim, não pode o Banco Recorrente senão concluir que foram salvaguardados os legítimos interesses do cliente.
XXXII.Resultou demonstrado que os funcionários sempre acreditaram - até praticamente ao momento do incumprimento - que se tratava de produto seguro e se preocupavam com os interesses dos clientes.
XXXIII.Dispunha sobre esta matéria o artigo 304º do CVM no sentido de que os intermediários financeiros estão obrigados a orientar a sua actividade no sentido da protecção dos legítimos interesses dos seus clientes e da eficiência do mercado, devendo conformar a sua actividade aos ditames da boa-fé, agindo de acordo com elevados padrões de diligência, lealdade e transparência.
XXXIV.E, quanto ao risco, há aqui que chamar à colação o art. 312º nº 1 alínea a) do CdVM, que obriga então o intermediário financeiro a informar o investidor sobre os “riscos especiais envolvidos nas operações a realizar”.
XXXV.Tal redacção refere-se necessariamente ao negócio de intermediação financeira enquanto negócio de cobertura que, depois, proporcionará negócios de execução.
XXXVI.Tal menção não pode nunca equivaler ao dever de informação sobre o instrumento financeiro em si!
XXXVII.A informação quanto ao risco dos instrumentos financeiros propriamente dito apenas veio a ser exigida prestar aos intermediários financeiros com o D.L. 357-A/2007 de 31/10, que aditou o art. 312º-E nº 1, passando a obrigar o intermediário financeiro a informar o cliente sobre os riscos do tipo de instrumento financeiro em causa.
XXXVIII.O legislador não deixou nada ao acaso e logo no número seguinte, afirmou claramente o que se devia entender por risco do tipo do instrumento financeiro em causa nas quatro alíneas do nº 2 do art. 312º-E.
XXXIX.São ESTES e APENAS ESTES os riscos do tipo do instrumento financeiro sobre os quais o Intermediário Financeiro tem que prestar informação, mesmo na actual redacção do CdVM.
XL.A alusão que a lei faz quanto ao risco de perda da totalidade do investimento está afirmada em função das características do investimento.
XLI.Trata-se, portanto, de um risco que tem que ser endógeno e próprio do instrumento financeiro e não motivado por qualquer factor extrínseco ao mesmo.
XLII.O investimento em causa foi feito em Obrigações não estando sujeito a qualquer volatilidade, sendo o retorno do investimento certo no final do prazo, por reembolso do capital investido ao valor nominal do titulo (de “capital garantido”), acrescido da respectiva rentabilidade.
XLIII.Logo, não há necessidade de que a advertência do risco de perda da totalidade do investimento seja feita, porque a mesma não é aplicável ao caso, pois que nunca resultaria do mecanismo interno do instrumento em causa!
XLIV.A informação acerca do risco da perda do investimento tem que ser dada em função dos riscos próprios do tipo de instrumento financeiro, o que deve ser feito SE E SÓ SE tais riscos de facto existirem!
XLV.Em lado algum da lei resulta estar o intermediário financeiro obrigado a analisar ou avaliar a robustez financeira do emitente na actividade de intermediação financeira de recepção e transmissão de ordens.
XLVI.E também em lado nenhum da lei resulta a obrigação de prevenir o investidor acerca das hipóteses de incumprimento das obrigações assumidas pelo emitente do instrumento financeiro ou até da probabilidade de insolvência do mesmo!
XLVII.Esse hipotético incumprimento tem que ver com as qualidades ou circunstâncias do emitente (ou obrigado) do instrumento financeiro e não com o tipo do instrumento financeiro, conforme referido no art. 312º-E nº 1 do CdVM, que é expressão que aponta claramente para uma objectivização do risco em função do próprio instrumento de investimento e não para uma subjectivação em função do emitente!
XLVIII.O artigo 312º, alínea e) do CdVM refere-se apenas aos riscos da actividade dos serviços de intermediação financeira. Os deveres de transparência, lealdade e defesa dos interesses do investidor que sobre o intermediário financeiro impendem, obrigam apenas à informação sobre os riscos endógenos ao mecanismo de funcionamento do concreto instrumento financeiro, não abrangendo o risco geral de incumprimento das obrigações. Neste sentido não estava o intermediário financeiro obrigado a informar especificamente sobre o risco de insolvência da entidade emitente de determinado produto.
XLIX.Do elenco de factos provados não resultam factos provados suficientes que permitam estabelecer uma ligação entre a qualidade (ou falta dela) da informação fornecida ao subscritor e o acto de subscrição.
L. A nossa lei consagra essa perfeita autonomia de cada um dos pressupostos ou requisitos da responsabilidade civil, apresentando-os e regulando-os de forma perfeitamente estanque.
LI.No que toca à causalidade não conseguimos sequer vislumbrar como passar da presunção de culpa – juízo de censura ético-jurídico sobre o agente do ilícito, e expressamente prevista na lei – à causalidade – nexo factual de associação de causa-efeito, como se de uma inevitabilidade se tratasse!
LII.Do texto do art. 799º nº 1 do C.C. não resulta qualquer presunção de causalidade.
LIII.E, de resto, nos termos do disposto no artº 344º do Código Civil, a inversão de ónus depende de presunção, ou outra previsão, expressa da lei!
LIV.Se em abstracto, e de jure condendo até se pode, porventura e em tese, perceber esta interpretação para uma obrigação principal de um contrato – tendo por critério o interesse contratual positivo do credor -, não se justifica já quando estão em causa prestações acessórias do mesmo contrato.
LV.Analisado o fim principal pretendido pelo contrato aqui em apreço – contrato de execução da actividade de intermediação financeira, de recepção e transmissão de ordens por conta de outrem -, parece-nos evidente que o mesmo se circunscreve à recepção e retransmissão de ordens de clientes – no caso os AA. É este o único conteúdo tipico e essencial do contrato e que é, portanto, susceptivel de o caracterizar.
LVI.Não é por um dever de prestar ser mais ou menos relevante para qualquer parte, ou até para o comércio jurídico em geral, que será quantificável como prestação principal ou prestação acessória de um contrato. Releva outrossim se o papel de uma tal prestação na economia do contrato se revela como o núcleo tipico ou não do acordo contratual entre as partes.
LVII.A única prestação principal neste contrato será a de recepção e transmissão de ordens do cliente.
LVIII.Sendo uma obrigação acessória, a prestação de informação não estaria nunca, nem no entender do Prof. Menezes Cordeiro, ao abrigo da proclamada presunção de causalidade.
LIX.Estamos perante uma situação em que e configuram dois contratos distintos e autónomos entre si: por um lado, (i) um contrato de execução de intermediação financeira, e por outro, (ii) a contratação de um empréstimo obrigacionista do cliente a entidade terceira ao primeiro contrato!
LX.Neste caso, estaremos perante uma falta de resultado no âmbito da emissão obrigacionista e não do contrato de execução de intermediação financeira.
LXI.O contrato de intermediação financeira foi já cumprido no acto de subscrição, tendo-se esgotado nesse momento.
LXII.É esta uma óbvia dificuldade: como pode a falta do resultado normativamente prefigurado de um contrato desencadear uma presunção de ilicitude, culpa e causalidade no âmbito de um outro contrato?
LXIII.O juízo de verificação de causalidade mecânica, aritmética ou hipotética tem inevitavelmente de se fundar em factos concretos que permitam avaliar da referida probabilidade, e não apenas em juízos abstratos ou meras impressões do julgador!
LXIV.A causalidade resume-se a uma avaliação de um dano hipotético apenas em casos em que esse dano não seja efectivo, como é o caso do citado dano da perda da chance! Em todos os restantes casos, o juízo deverá ser feito, não numa perspectiva probabilidade, mas sim de adequação entre uma causa e um efeito.
LXV.No âmbito da responsabilidade contratual, presumindo-se a culpa, caberá a quem alega o direito demonstrar a ilicitude, o nexo causal e o dano, que em caso algum se presumem!
LXVI.O nexo causal sujeito a prova será necessariamente entre um concreto ilícito – uma concreta omissão ou falta de explicação de uma determinada informação - e um concreto dano (que não hipotético)!
LXVII.Não basta afirmar-se genericamente que eles não foram informados do risco de insolvência ou da falta de liquidez das obrigações ou da característica da subordinação e que é essa causa do seu dano!
LXVIII.Num primeiro momento é indispensável que o investidor prove que, sem a violação do dever de informação, não celebraria qualquer negócio, ou celebraria um negócio diferente do que celebrou.
LXIX.Num segundo momento é necessário provar que aquele concreto negócio produziu um dano.
LXX.E, num terceiro momento é necessário provar que esse negócio foi causa adequada daquele dano, segundo um juízo de prognose objectiva ao tempo da lesão.
LXXI.E nada disto foi feito!
LXXII.A origem do dano dos Recorrentes residiria na incapacidade da SLN em solver as suas obrigações, circunstância a que o Banco Recorrido é alheio!
Termos em que se requer a V. Exas. que alterem a decisão sobre a matéria de facto nos termos acima expostos, revogando a decisão recorrida e absolvendo o Recorrente do pedido deduzido pelos Autores
Ainda que assim não se entenda sempre se requer a V. Exa. que, com base na matéria dada como provada na primeira instância, revoguem a decisão recorrida absolvendo o Recorrente do pedido deduzido pelos Autores.
O Autor contra-alegou defendendo o julgado.
O recurso foi admitido com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.
Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
II) OBJECTO DO RECURSO
Tendo em atenção as conclusões da Recorrente - artigo 635.º, n.º 3, 639.º, nº 1 e 3, com as excepções do artigo 608.º, n.º 2, in fine, ambos do CPC -, cumpre apreciar as seguintes questões:
1) Da impugnação da decisão de facto
2) Dos pressupostos da responsabilidade civil imputada ao Réu
3) Da prescrição da obrigação
III) FUNDAMENTAÇÃO
1. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
1.1. Impugnação
O Recorrente impugnou a decisão quanto à factualidade provada e não provada, por considerar que os factos provados 5, 7, 8, 23 e 24, deveriam ter sido julgados não provados, e o facto não provado I) deveria ter sido julgado provado.
Factos julgados provados objecto da impugnação:
5. Ao nível do conselho de administração do banco (BPN), em setembro de 2004, foi gizado um plano assente em três pilares fundamentais, plano considerado “(…) de importância estratégica para o Grupo”; a saber:
- Captação pela SLN – Sociedade Lusa de Negócios, SGPS, S.A., de até cinquenta milhões de euros através de um empréstimo obrigacionista, denominado de SLN – Rendimento Mais 2004, através da “Emissão de até 1.000 obrigações subordinadas, em forma escritural, ao portador, com o valor nominal de € 50.000,00 cada (…)”;
- Emissão de obrigações a dez anos, a amortizar, ao par, de uma só vez, em 25 de outubro de 2014;
- Instruções aos funcionários do banco, nomeadamente aos gerentes e gestores de conta, para captarem depositantes do banco para o novo produto, que devia ser vendido como sucedâneo de um depósito a prazo (cfr. documentos de fls. 127 a 165);
7. A “Nota interna” desta operação consistiu numa reprodução da nota referente a uma operação semelhante, lançada pelo banco em 2003 (cfr. documento de fls. 166 a 172);
8. Vigorava, na altura, a “Instrução de Serviço (I.S.) n.º 19/01”, de 5 de fevereiro de 2003, cujo tema era “Mercado de Capitais e Papel Comercial”, a qual determinava que a entidade que garantia a solvabilidade do papel comercial emitido era o banco Réu (BPN) e/ou o Banco Efisa (cfr. documento de fls. 173 a 185);
23. (…) E não lhe transmitiu os riscos reais inerentes a tal operação financeira, ocultando a verdadeira natureza do produto financeiro em causa, designadamente a não segurança do capital na maturidade;
24. Ao subscrever o produto em causa, o Autor julgava estar a celebrar um negócio sem riscos e com o capital garantido (à semelhança de um depósito a prazo), assim tendo sido induzido pelos funcionários do banco – subscrição essa que jamais ocorreria caso conhecesse suficientemente a natureza do mesmo e a não segurança do capital.
Facto julgado não provado objecto da impugnação:
I. Aquando da subscrição do produto em causa, o Autor foi informado de que o mesmo fora emitido pela sociedade detentora do banco Réu (BPN) e que o reembolso antecipado só era possível por iniciativa da sociedade emitente e sujeito a acordo prévio do Banco de Portugal.
1.2. Prova
1.2.1. Foi ouvido nesta Relação o depoimento da única testemunha inquirida, S ..., bancário que trabalha para o Réu, desde que o banco adquiriu o BPN e que já vinha do BPN, onde trabalhava desde setembro de 1998. Disse que foi o comercial do BPN que vendeu ao Autor a Obrigação SLN 2004.
A testemunha depôs com o conhecimento de facto que a sua intervenção justifica, com memória dos factos e de forma clara, coerente e sincera, manifestando o seu incómodo por ter “convencido” o Autor a comprar uma aplicação que lhe resultou em prejuízo.
Foi taxativo na indicação de que identificou a aplicação como correspondendo a um depósito a prazo, com obstáculos à liquidez imediata que justificavam a maior taxa de juro, Indicando que esses obstáculos, que comunicou ao Autor, consistiam em, até à maturidade, não poder ocorrer um mero levantamento do capital, apenas podendo recorrer à compra por terceiros ou financiamento do BPN, sendo certo que indicava também que as Obrigações tinham muita procura, o que facilitava a compra por terceiros, e que o BPN concedia o financiamento sem dificuldade.
Constam dos autos diversos documentos que seguidamente resumimos.
Documentos da Petição:
Doc 1 e 2  – Certidão permanente do Banco BIC Português, SA, e de BPN, SGPS, SA, .
 Doc 3 e 4  – Certidão permanente de Galilei, SGPS, SA, e SLN – Sociedade Lusa de Negócios, SGPS, SA,  .
Doc 5 – Cópia de aviso 12/92 do Banco de Portugal relativo aos fundos próprios das instituições sujeitas a sua supervisão
Doc 6 – Nota informativa sobre a aplicação SLN Rendimento Mais 2004 (Emissão de Obrigações Subordinadas ao Portador e Escriturais com o Valor Nominal de €50.000 cada), com a menção de que a organização e montagem estava a cargo do Banco Efisa, SA, constando a descrição da oferta, a ficha técnica, a forma de emissão, modalidade de subscrição, deliberação, colocação e representação dos obrigacionistas, método de cálculo da taxa de juro e informações sobre o Emitente, que, na parte relativa ao montante e natureza indica que trata-se de Emissão de até 1.000 obrigações subordinadas, em forma escritural, ao portador, com o valor nominal de €50.000 cada perfazendo um montante total de até €50.000.000, constando ainda que as obrigações objecto desta emissão serão colocadas pelo BPN – Banco Português de Negócios, S.A., através da sua rede comercial.
Doc 7 – É nota interna do BPN, datada de 7 de Outubro de 2004, tendo como destinatários os administradores e os directores coordenadores, emitida em razão da decisão do Conselho de Administração de lançar uma emissão de Obrigações Subordinadas a 10 anos, denominada “SLN Rendimento Mais 2004”, para consolidação da dívida da SLN, SGPS, SA, indicando que a total subscrição desta emissão é, assim, de importância estratégica para o Grupo, mais referindo que a operação foi integrada no campeonato de prémios do BPN de 2004.
No que se refere ao argumentário para a colocação das obrigações, consta da nota informativa: a) O SLN Rendimento Mais 2004 é uma excelente oportunidade de investimento, uma vez que garante o capital investido e uma remuneração acima do mercado durante dez anos; b) O SLN Rendimento Mais 2004 assegura o pagamento semestral de juros; c) Caso o subscritor necessite de liquidez, o BPN está disponível para fazer financiamentos com condições especiais; d) Caso o subscritor pretenda vender as suas obrigações, o BPN assumirá uma atitude pró-activa, tentando identificar potenciais compradores no universo de Clientes do BPN. Contudo, o BPN não assegura a recompra desta emissão, nem garante a existência de compradores para eventuais intenções de venda das Obrigações SLN Rendimento Mais 2004.
Doc 8 – Epigrafado nota interna do BPN, constituirá um dos textos de preparação, uma vez que contém texto rasurado, está datada de 16 de Maio de 2003, tem como destinatários os administradores e os directores coordenadores, e refere ser emitida a respeito de BPN Rendimento Mais, tratando-se esta aplicação de uma emissão de Obrigações de Caixa Subordinadas a 10 anos (…) de importância estratégica para o BPN.
Doc 9 – Instrução de serviço do Grupo BPN n.º 19/01 de 5 de Fevereiro de 2003, a respeito do papel comercial e dos procedimentos da sua colocação, características, etc.
Doc 10 – Impressão de mensagem electrónica datada de 28 de Julho de 2008, encaminhada em 19 de Abril de 2010, epigrafada “funcionários do BPN apoiam clientes lesados”, constando que a mensagem encaminhada havia sido enviada por Jorge Pessoa, BPN – Direcção Coordenadora Empresas Centro, referindo-se à equivalência entre um depósito a prazo e o papel comercial da SLN Valor, SGPS, SA.
Doc 11 -   Impressão de mensagem electrónica datada de 9 de Julho de 2009, encaminhada em 19 de Abril de 2010, epigrafada “funcionários do BPN apoiam clientes lesados”, constando que a mensagem encaminhada havia sido enviada por funcionáriosbpn@sapo.pt, referindo-se à situação dos subscritores do papel comercial da SLN Valor, SGPS, SA, e à ausência de responsabilidade dos funcionários que colocaram a aplicação.
Doc 12 – depósito de valores no montante global de € 50.000,00 feito pelo Autor no BPN e por este certificado em 22 de Outubro de 2004.
Doc 13 – Extracto de conta do Autor no BPN com a movimentação dos € 50.000,00.
Doc 14 – Extracto global 1/2018 da conta do Autor epigrafado EuroBic, relativo ao período de 1 de Março a 31 de Março de 2018, indicando saldo zero de depósitos a prazo e €50.000,00 de Obrigações SLN.
Doc 15 – Cópia de artigo de jornal relativo a declarações de membro do Governo a respeito do papel comercial SLN.
Doc 16 – Anúncio do Juízo de Comércio de Lisboa publicitando a nomeação de administrador provisório a Galilei, SA, no âmbito do PER.
Doc 17 – Notificação do Juízo de Comércio de Lisboa, datada de 19 de Fevereiro de 2016, da sentença de declaração de encerramento do PER da Galilei sem aprovação de plano.
Doc 18 - Anúncio do Juízo de Comércio de Lisboa publicitando a sentença de insolvência da Galilei, SA.
Doc 19 – Documento do Banco BIC, datado de 30 de Junho de 2015, comunicando a um cliente a conclusão de perfil não adequado a determinadas aplicações.
Documento da contestação:
Doc único – Extracto da conta bancária do Autor, relativo ao período de 1 de Janeiro de 2003 a 31 de Março de 2003, com indicação da compra de SLNRendMais no montante de € 50.000,00, e depósito de pagamento de juros e cupões.
1.3. Apreciação
1.3.1. Ponto 5 provado.
5. Ao nível do conselho de administração do banco (BPN), em setembro de 2004, foi gizado um plano assente em três pilares fundamentais, plano considerado “(…) de importância estratégica para o Grupo”; a saber:
- Captação pela SLN – Sociedade Lusa de Negócios, SGPS, S.A., de até cinquenta milhões de euros através de um empréstimo obrigacionista, denominado de SLN – Rendimento Mais 2004, através da “Emissão de até 1.000 obrigações subordinadas, em forma escritural, ao portador, com o valor nominal de € 50.000,00 cada (…)”;
- Emissão de obrigações a dez anos, a amortizar, ao par, de uma só vez, em 25 de outubro de 2014;
- Instruções aos funcionários do banco, nomeadamente aos gerentes e gestores de conta, para captarem depositantes do banco para o novo produto, que devia ser vendido como sucedâneo de um depósito a prazo.
O Recorrente entende que os documentos juntos aos autos não permitem assim considerar. Alega:
O documento 6, referido na PI, trata-se da nota informativa relativa ao produto. O documento 7 é a nota interna do banco relativa ao produto. Deles não constam nenhum elemento que revele o famigerado plano gizado ao nível do conselho de administração do BPN em Setembro de 2004. Não se retira dos referidos documentos qualquer um dos supostos 3 pilares em que tal plano assentaria. Não se compreende assim como podem tais documentos ter servido de prova ao facto provado 5.
É que nenhum dos elementos de facto constantes do ponto 5 dos factos dados como provados consta de qualquer um daqueles documentos. É assim absolutamente indiferente que o Réu não tenha impugnado os referidos documentos. Desde logo porque os documentos são verdadeiros. A informação que dos mesmos consta é também ela verdadeira.
Aquilo que não se verifica é que dos mesmos conste aquilo que consta do facto provado 5.
Dir-se-ia que o Tribunal não leu os documentos, tendo-se limitado a transcrever o que sobre os mesmos o Autor apresentou na sua petição inicial.
Convimos com o Recorrente em que os documentos não permitem concluir que o plano existente tinha três pilares fundamentais, o que aliás é conclusivo e de nenhuma valia.
No mais, concordamos com a decisão de primeira instância. Contrariamente ao que é expendido no recurso, a análise dos documentos em causa, concatenada com o depoimento da testemunha, que conhecia o teor substancial dos mesmos, e, mais, o que no BPN era dito nas reuniões de directores e funcionários a respeito da matéria, permite concluir o que consta do facto provado, nomeadamente, que foi gizada a consolidação da dívida da SLN através da emissão das referidas obrigações a efectuar aos balcões do BPN, segundo um determinado argumentário e com indicação expressa de que a matéria era estratégica para o Banco e inclusão no programa de prémios dos funcionários.
Improcede a impugnação, com a indicada excepção.
1.3.2. Ponto 7 provado.
7. A “Nota interna” desta operação consistiu numa reprodução da nota referente a uma operação semelhante, lançada pelo banco em 2003.
Alega o Recorrente:
Antes de mais cumpre desde logo dizer que a matéria constante deste facto provado é, manifestamente, conclusiva.
Dizer que um documento é mera reprodução de outro não é mais do que afirmar uma conclusão, não podendo tal afirmação ser considerado um facto.
Mas ainda que se entendesse que não é uma conclusão a afirmação sempre estaria incorrecta!!
É que apenas o formato do documento é igual!
O restante é diferente! E é diferente pelo simples facto dos dois documentos tratarem de dois produtos diferentes.
Mas vejamos por partes:
- O capítulo “Introdução” é diferente;
- O nome do produto é diferente;
- A natureza do produto é diferente ;
- O emitente é diferente;
- O montante da emissão é diferente;
- O valor nominal de cada obrigações é diferente;
- Os incentivos à subscrição são diferentes;
- Etc, etc
Dir-se-ia que, uma vez mais, não foi feita qualquer análise cuidada aos dois documentos. Tendo o Tribunal sido sensível apenas à semelhança no formato e apresentação dos dois documentos.
As notas internas são ambas notas internas do banco, com o fim de apresentarem o produto.
Não será muito arriscado dizer que, no formato, todas elas, e não só as destes dois produtos, seriam iguais.
O ponto de facto é conclusivo. Não interessa saber se a nota é igual ou diferente a uma outra mas, apenas, o que contém.
O documento que a consubstancia (documento 7 da petição), não foi impugnado. Assim, o ponto de facto deve ser alterado (artigo 663.º, n.º 2, do Código de Processo Civil) passando a dele constar o seguinte:
A “Nota interna” desta operação corresponde ao documento 7 da petição, encontra-se datada de 7 de Outubro de 2004, tem como destinatários os administradores e os directores coordenadores, indica ter sido emitida em razão da decisão do Conselho de Administração de lançar uma emissão de Obrigações Subordinadas a 10 anos, denominada “SLN Rendimento Mais 2004”, para consolidação da dívida da SLN, SGPS, SA, mais referindo que a total subscrição desta emissão é, assim, de importância estratégica para o Grupo, e que a operação foi integrada no campeonato de prémios do BPN de 2004.
No que se refere ao argumentário para a colocação das obrigações, consta da nota interna: a) O SLN Rendimento Mais 2004 é uma excelente oportunidade de investimento, uma vez que garante o capital investido e uma remuneração acima do mercado durante dez anos; b) O SLN Rendimento Mais 2004 assegura o pagamento semestral de juros; c) Caso o subscritor necessite de liquidez, o BPN está disponível para fazer financiamentos com condições especiais; d) Caso o subscritor pretenda vender as suas obrigações, o BPN assumirá uma atitude pró-activa, tentando identificar potenciais compradores no universo de Clientes do BPN. Contudo, o BPN não assegura a recompra desta emissão, nem garante a existência de compradores para eventuais intenções de venda das Obrigações SLN Rendimento Mais 2004.
1.3.3. Ponto 8 provado.
8. Vigorava, na altura, a “Instrução de Serviço (I.S.) n.º 19/01”, de 5 de fevereiro de 2003, cujo tema era “Mercado de Capitais e Papel Comercial”, a qual determinava que a entidade que garantia a solvabilidade do papel comercial emitido era o banco Réu (BPN) e/ou o Banco Efisa.
Alega o Recorrente:
Antes de mais é de assinalar que nenhum meio de prova confirmou que esta instrução de serviço estava em vigor!!
E depois, uma vez mais, este facto contém uma conclusão uma vez que afirma que a entidade que garantia a solvabilidade do papel comercial emitido era o banco Réu e/ou o Banco Efisa.
Acresce que, o facto provado 8 deveria ter sido dado como não provado também porque, a realidade que descreve, não transparece do documento que cita.
Simplesmente porque não é esta a boa interpretação do documento.
Vejamos a parte do documento em causa que se debruça sobre a questão da garantia.
Diz o documento em causa (com o titulo Instrução de Serviço/Tema: Mercados de Capitais/
Sub-tema: Papel Comercial) junto com a Petição Inicial, na sua página 3, no ponto 2 (Principais Definições), 5º parágrafo: “Garante - Entidade que garante a solvabilidade do papel emitido - BPN e/ou Banco Efisa”.
O mesmo documento, na sua página 4, no ponto referente às Comissões e na parte do BPN
diz ainda o seguinte: “Comissão de Garantia, nos casos em que intervenha com garante do
reembolso das emissões, sobre a respectiva participação.”
A primeira observação a fazer este documento é que ele se refere, como o próprio nome indica, à colocação de Papel Comercial e não de Obrigações. Papel Comercial esse que tem regulamentação própria no Regime Jurídico dos Valores Representativos de Dívida de Curto Prazo estabelecido pelo DL 69/2004 de 25 de Março e sucessivas alterações.
É sobre este tipo de produto específico, Papel Comercial, que se debruça a Instrução de Serviço em causa. Qualquer interpretação do mesmo apenas poderia ter aplicabilidade às colocações de papel comercial e não de obrigações.
Mas ainda assim, entende a recorrente que a interpretação que resulta no facto provado nº 8 não está correcta.
Pelo simples facto de na comissão de garantia estar previsto que o BPN teria direito a ela nos
casos em que fosse garante da emissão, ter-se-á que concluir que o BPN nem sempre era garante. Ou seja, esta instrução de serviço, mais concretamente na parte das Principais Definições, trazia uma ideia geral a observar no momento da colocação do Papel Comercial.
As características próprias de cada emissão/colocação, teriam que ser encontradas na documentação específica sobre cada produto.
Estes factos resultam ainda da análise da documentação relativa aos produtos em causa e que serviu suporte à venda dos mesmos, concretamente a nota informativa, a nota interna e e dos quais não consta qualquer referência a uma garantia do banco.
Concorda-se com o Recorrente quanto a inexistir prova de que a instrução de serviço vigorasse ou de que o seu conteúdo tenha sido utilizado nos contactos com o Autor, pelo que se entende suprimir o ponto em causa.
Procede nesta parte a impugnação.
1.3.4. Ponto 23 provado.
23. (…) E não lhe transmitiu os riscos reais inerentes a tal operação financeira, ocultando a verdadeira natureza do produto financeiro em causa, designadamente a não segurança do capital na maturidade.
Alega o Recorrente:
Em primeiro lugar, e sobre este facto, será necessário esclarecer que, em nenhum ponto dos factos dados como provados consta quais seriam os “riscos reais” do produto.
Da mesma forma do facto consta a expressão “segurança do capital na maturidade”.
Ora, da matéria de facto dada como provada não consta também o que seria esta suposta não segurança no capital.
O produto em causa é “Obrigações”. Obrigações essas não cotadas e por isso mesmo não sujeitas a variação no seu valor. Assim, no final do prazo, o capital investido é devolvido, ou pago, a 100%, sem que, da mecânica de funcionamento do produto, possa surgir qualquer perda de capital.
Se assim é a que é que se refere o tribunal neste facto quando lança mão desta “não segurança do capital na maturidade”.
Uma vez mais estamos perante conclusões, conceitos jurídicos, que não têm lugar no repositório de factos dados como provados.
O facto, para estar correctamente formulado, deveria afirmar que não foi transmitido que o risco era, por exemplo, e porque esse era efectivamente o único risco do produto, o risco de solvabilidade da emitente. Ou eventualmente até a característica da subordinação.
Mas se o fizesse deveria ainda explicar porque é que considerava que o capital não estava seguro na maturidade.
Pergunta-se, o tribunal apurou algum relativo à robustez económica da emitente em 2004 que lhe permitisse fazer o juízo de valor ínsito na expressão “não segurança do capital na maturidade”.
A matéria que resulta provada do depoimento da testemunha, corroborado pelos documentos com o argumentário a utilizar pelos funcionários do BPN, é de que o produto deveria ser, e foi, apresentado como idêntico a um depósito a prazo.
Do depoimento da testemunha resulta ainda que apresentou ao Autor a compra das obrigações SLN Mais 2004 como uma aplicação idêntica à constituição de um depósito a prazo, com uma taxa de juro mais atractiva em razão do prazo e da menor liquidez até à maturidade, a qual podia, no entanto, ser substituída pela transacção para outros clientes, havendo muita procura, ou por financiamento do BPN com a garantia da aplicação.
O testemunho merece inteira credibilidade, pelo que é essa a factualidade apurada quanto à matéria em causa neste ponto aflorada, devendo o mesmo ser alterado para a seguinte redacção:
O funcionário do BPN apresentou ao Autor a compra das obrigações SLN Mais 2004 como uma aplicação idêntica à constituição de um depósito a prazo com uma taxa de juro mais atractiva em razão do prazo e da menor liquidez até à maturidade, a qual podia, no entanto, ser substituída pela transacção para outros clientes, havendo muita procura, ou por financiamento do BPN com a garantia da aplicação.
Nos termos do artigo 662.º, n.º 1, este facto assente impõe a alteração dos pontos de facto 21 ( quanto ao resgate), 22 (restringindo a matéria relativa ao âmbito da informação em falta), 25 e 27 (ambos quanto à informação prestada), expurgando-se ainda os factos das conclusões.
Com o fundamento de prova indicado, devem os mesmos passar a ter a seguinte redacção:
21. Em relação ao aconselhamento sobre os valores pertença do Autor, foi-lhe apresentado o dito produto financeiro designado por Obrigação SLN Rendimento Mais 2004 (de outubro de 2004) enquanto sucedâneo de um depósito a prazo.
22. Na negociação, celebração e execução do mencionado contrato, o Réu informou o Autor conforme referido em 21 e 23, mas não lhe forneceu um documento informativo sobre a natureza e as características principais do produto em questão.
25. O Autor foi informado pelos funcionários do banco nos termos constantes dos pontos de facto 21, 23, 28 e 29.
27. O Autor apenas ficou ciente dos termos específicos do negócio, para além do constante dos pontos de facto 21, 23, 28 e 29, e de que o banco Réu não assumiria qualquer responsabilidade pelo produto vendido, a partir de 30 de setembro de 2015, data em que cessaram os pagamentos pela Galilei, SGPS, S.A., dos juros contratualizados.
1.3.5. Ponto 24 provado.
24. Ao subscrever o produto em causa, o Autor julgava estar a celebrar um negócio sem riscos e com o capital garantido (à semelhança de um depósito a prazo), assim tendo sido induzido pelos funcionários do banco – subscrição essa que jamais ocorreria caso conhecesse suficientemente a natureza do mesmo e a não segurança do capital.
Alega o Recorrente:
Entende o Recorrente que também o facto 24 deveria ter sido dado como não provado. Desde logo porque também aqui se encontra o prejuízo de que não haveria segurança de capital.
E depois porque o tribunal conclui, a nosso ver sem prova, que se o Autor tivesse informação adicional sobre a natureza do produto.
São vários os factores que nos levam a acreditar que tal não corresponde á realidade.
Desde logo o Autor foi caracterizado pela testemunha S …, como alguém muito rigoroso, meticuloso e ciente do seu património e negócios.
Veja-se o que a testemunha diz sobre o Autor no seu depoimento gravado no sistema citius no ficheiro 20200128142641_19561225_2871036, a entre os minutos 5:45 a 6:25 e 7:30 a 8:22 sobre o conhecimento que tinha do Autor.
Mas ainda, e mais importante, entre os minutos 20:30 a 22:00, 30:40 a 31:08, 31:15 a 34:37, 39:55 a 40:52 e 41:00 a 43:46.
Aqui percebe-se que, das duas uma, ou o Autor não era tão rigoroso e critérios nas suas aplicações e no fundo subscreveria tudo o que o funcionário lhe desse desde que este considerasse o produto bom. E então aí não eram relevantes as concretas características do produto. O Autor sempre subscreveria!!
Ou então o Autor, ao contrário do que afirma a testemunha, sempre soube o que tinha, até porque recebia em casa, e recebeu durante 120 meses os extractos juntos como documento 14 com a petição inicial, do quais constava de forma bem visível a subscrição das obrigações, e conformou-se com essa subscrição porque o juro era mais apetecível.
Aquilo que não pode ter acontecido é o autor ser alguém muito cuidadoso, muito conservador, não lhe ter sido dada qualquer informação no momento da subscrição, ter recebido ao longo de 10 anos extratos e juros do produto, o banco ter sido nacionalizado e ele nunca ter feito qualquer reclamação e depois concluir que, se lhe tivesse sido dada mais informação ele não subscreveria.
Acresce que a informação de que o produto tinha o capital garantido era ela própria verdadeira!!!
A expressão capital garantido mais não é do que a descrição de uma característica técnica do
produto – corresponde à garantia de que o valor de reembolso, no vencimento, é feito pelo valor nominal do titulo e correspondente ao respectivo valor de subscrição! Ou seja, o valor do capital investido é garantido!
Veja-se a este propósito o Plano de Formação Financeira em site do Conselho de Supervisores Portugueses – www.todoscontam.pt! Aí são descritas as características de produtos financeiros, entre os quais as Obrigações, e é explicada a garantia de capital, exactamente nos termos que vimos de expor.
Concretamente, este site da responsabilidade do Banco de Portugal e da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários, e que se destina a melhorar a literacia financeira do comum dos cidadãos, afirma o seguinte quando define aquilo que se entende pelo produto “Obrigações”:
“As obrigações são instrumentos financeiros que representam um empréstimo contraído junto dos investidores pela entidade que os emite.
Os emitentes podem ser empresas, Estados ou outras entidades públicas ou privadas. Deter obrigações significa ser credor dessas entidades.
No fim do prazo do empréstimo definido na emissão das obrigações, o investidor tem direito a receber o valor que inicialmente investiu, uma vez que, em geral, a subscrição de obrigações tem garantia de capital investido na maturidade. Até à maturidade o investidor tem direito a receber o rendimento que lhe esteja associado.
Ao ponderar investir em obrigações, o investidor não deve considerar apenas a taxa de juro oferecida pelo investimento. Em regra, é indicada a respetiva taxa anual nominal bruta (TANB). O investidor deve considerar também as comissões e outros encargos associados, pois estes podem reduzir a rendibilidade do investimento.
Os intermediários financeiros podem cobrar diferentes comissões, mas o investidor pode estar isento em alguns casos. É importante comparar os diferentes preçários."
E mais à frente, sob a epígrafe “GARANTIA DE CAPITAL” afirma ainda: A maioria das obrigações garante capital na maturidade. Existem contudo exceções, pelo que é importante a leitura de toda a documentação específica do produto antes da subscrição. Caso o investidor pretenda alienar as obrigações antes da maturidade, fica sujeito ao risco de mercado.
Ora, se o que levou o Autor a subscrever, como transparece o facto 24, era o facto de lhe ter sido transmitido que o produto era de capital garantido, sendo essa informação verdadeira, não podemos concluir que sem ela a subscrição não seria efectuada.
De facto resulta ainda do depoimento da referida testemunha, entre os minutos 45:35 a 47:41, que desde que o produto fosse entendido como seguro pelo funcionário, este cliente sempre subscreveria pelo que a concreta natureza do mesmo seria de todo em todo indiferente.
A factualidade apurada resulta corroborada pelo depoimento de S …, sendo esta testemunha o funcionário que vendeu o produto ao Autor. Ora, a testemunha indicou claramente o perfil de investidor do Autor e que o mesmo procurava constituir um depósito a prazo, indicando também que apenas a confiança que tinha na testemunha e nos seus conselhos, aliada a essa informação de identidade com o depósito a prazo, o levou a comprar a referida aplicação.
Tal depoimento merece-nos inteira credibilidade. Todavia, dele apenas pode extrair-se que o Autor apenas subscreveu o produto por o considerar idêntico a um depósito a prazo e que se soubesse que assim não era o não subscreveria. Ora, do ponto de facto consta matéria conclusiva, a saber, a de que o produto não assegurava a segurança do capital, matéria que não resulta provada enquanto respeitante ao mecanismo interno de funcionamento do produto.
Procede por isso a impugnação quanto à supressão dessa matéria por conclusiva, passando o ponto de facto a ter a seguinte redacção:
24. Ao subscrever o produto em causa, o Autor julgava estar a celebrar um negócio semelhante a um depósito a prazo, por tal lhe ter sido informado pelos funcionários do banco, subscrição essa que jamais ocorreria caso conhecesse a natureza do produto.
1.3.6. Ponto I) não provado.
I. Aquando da subscrição do produto em causa, o Autor foi informado de que o mesmo fora emitido pela sociedade detentora do banco Réu (BPN) e que o reembolso antecipado só era possível por iniciativa da sociedade emitente e sujeito a acordo prévio do Banco de Portugal.
Alega o Recorrente:
Entende ainda que o facto constante do ponto I dos factos dados como não provados deveria
ter sido dado como provado com a seguinte redacção:
I. Aquando da subscrição do produto em causa, o Autor foi informado de que se tratavam de Obrigações emitidas pela SLN, Sociedade Lusa de Negócios, SGPS, S.A.
Este facto resulta desde logo pela forma atabalhoada como a testemunha S …, entre os minutos 19:17 a 19:45, 24:19 a 26:54, 31:15 a 34:37 e 39:55 a 40:52, tentou convencer o tribunal de que não havia mencionado a emitente SLN durante o processo de venda.
Mas resulta ainda, e porque tal contraria as palavras da testemunha da nota interna sobre o produto, junta como documento 7 com a petição inicial. É neste documento claro quem era a emitente e a testemunha afirma, entre os minutos 44:30 a 45:15 do seu depoimento que se baseava na nota interna para vender o produto em causa.
Resulta ainda do facto do Autor, empresário experiente, apesar de ter recebido 120 extractos mensais semelhantes ao documento 14 junto com a petição inicial, nunca ter, nas palavras da testemunha S …l entre os minutos 31:15 a 34:37, apresentado qualquer reclamação.
Não é minimamente crível que um empresário, a quem não foi dito que estava a comprar obrigações da SLN, tivesse permanecido impávido e sereno ao receber os referidos documentos.
Deveria assim ser dado como provado:
I. Aquando da subscrição do produto em causa, o Autor foi informado de que se tratavam de Obrigações emitidas pela SLN, Sociedade Lusa de Negócios, SGPS, S.A.
Contrariamente ao Recorrente, não vemos que tenha sido atabalhoada a forma como a testemunha se referiu à matéria em causa. Na verdade, afirmou peremptoriamente que não informou que a aplicação era da SLN e que o Pereira não sabia que estávamos a vender uma aplicação que não era o banco que estava a garantir e era a SLN. Dizendo mais adiante: para nós SLN e BPN era a mesma coisa. Era-nos transmitido que a aplicação era garantida a 100% pelo Banco. (…) Para nós era a mesma coisa. Quando era apresentado essa aplicação um dos argumentários era a possibilidade de crédito pelo BPN com a obrigação como colateral.
Ele se soubesse não teria aplicado porque o que pediam [refere-se ao Autor e aos seu sócio que também subscreveu] era um depósito a prazo. Se soubessem que havia risco não subscreviam. Se não tivesse dito que o capital era garantido não subscreviam.
E, referindo-se a 2008, eles [o Autor e o seu sócio]  abordaram-me e tentaram resgatar e foi nessa altura que deixamos de ter liquidez e não conseguimos resgatar e esperamos pelo vencimento delas. Na altura ainda tínhamos confiança em que seriam pagas. Penso que mesmo na nacionalização ainda não tínhamos consciência da subordinação da aplicação.
Em 2008 continuavam a dizer que o banco ia assumir e assumiu outras. Em 2008 ainda não sabiam que eram da SLN porque para nós continuava a ser uma aplicação do banco de responsabilidade do banco. Nunca foi confrontado em 2008 com serem obrigações da SLN. Para o Pereira tinha uma aplicação no banco. Para eles e para nós estar lá SLN ou BPN era a mesma coisa. A aplicação era do banco.
Na altura falámos e fomos aguardando porque havia várias aplicações e porque o banco foi honrando o pagamento de várias aplicações mas estas não foram pagas. Mais tarde fomos começando a ter consciência da gravidade da informação.
Improcede a impugnação.
1.4. Fixação da matéria de facto
Estão assentes os factos constantes da decisão de primeira instância, com as alterações supra decididas:
1. O Réu é um banco comercial que girava anteriormente sob a denominação social BPN – Banco Português de Negócios, S.A.;
2. Até à nacionalização do BPN – Banco Português de Negócios, S.A., operada pela Lei n.º 62-A/2008, de 11 de novembro, a totalidade do capital social do banco em causa era detida pela sociedade BPN – SGPS, S.A., a qual, por sua vez, era detida, também na íntegra, pela sociedade então denominada SLN – Sociedade Lusa de Negócios, SGPS, S.A.;
3. O capital social da SLN – Sociedade Lusa de Negócios, SGPS, S.A., era detido por um conjunto de investidores em nome individual, bem como por algumas entidades, com especial relevo para a SLN Valor, SGPS, S.A.;
4. O estatuído no artigo 3.º, alínea 12), do Aviso n.º 12/92 do Banco de Portugal, permitia a realização de fundos próprios do banco mediante “Empréstimos subordinados, cujas condições sejam aprovadas pelo Banco de Portugal”;
5. Ao nível do conselho de administração do banco (BPN), em setembro de 2004, foi gizado um plano considerado “(…) de importância estratégica para o Grupo”; a saber:
- Captação pela SLN – Sociedade Lusa de Negócios, SGPS, S.A., de até cinquenta milhões de euros através de um empréstimo obrigacionista, denominado de SLN – Rendimento Mais 2004, através da “Emissão de até 1.000 obrigações subordinadas, em forma escritural, ao portador, com o valor nominal de € 50.000,00 cada (…)”;
- Emissão de obrigações a dez anos, a amortizar, ao par, de uma só vez, em 25 de outubro de 2014;
- Instruções aos funcionários do banco, nomeadamente aos gerentes e gestores de conta, para captarem depositantes do banco para o novo produto, que devia ser vendido como sucedâneo de um depósito a prazo;
6. Na página 2 da “Nota interna”, alusiva ao referido produto financeiro, consta:  “Capital Garantido: 100 % do capital investido”;
7. A “Nota interna” desta operação corresponde ao documento 7 da petição, encontra-se datada de 7 de Outubro de 2004, tem como destinatários os administradores e os directores coordenadores, indica ter sido emitida em razão da decisão do Conselho de Administração de lançar uma emissão de Obrigações Subordinadas a 10 anos, denominada “SLN Rendimento Mais 2004”, para consolidação da dívida da SLN, SGPS, SA, mais referindo que a total subscrição desta emissão é, assim, de importância estratégica para o Grupo, e que a operação foi integrada no campeonato de prémios do BPN de 2004.
8. No que se refere ao argumentário para a colocação das obrigações, consta da nota interna referida em 7: a) O SLN Rendimento Mais 2004 é uma excelente oportunidade de investimento, uma vez que garante o capital investido e uma remuneração acima do mercado durante dez anos; b) O SLN Rendimento Mais 2004 assegura o pagamento semestral de juros; c) Caso o subscritor necessite de liquidez, o BPN está disponível para fazer financiamentos com condições especiais; d) Caso o subscritor pretenda vender as suas obrigações, o BPN assumirá uma atitude pró-activa, tentando identificar potenciais compradores no universo de Clientes do BPN. Contudo, o BPN não assegura a recompra desta emissão, nem garante a existência de compradores para eventuais intenções de venda das Obrigações SLN Rendimento Mais 2004.
9. Os funcionários do balcão onde o Autor tinha depositadas as suas quantias acreditavam que os produtos que vendiam eram seguros e que não ofereciam risco para os subscritores;
10. Em 22 de outubro de 2004, o Autor foi convidado a abrir conta no banco Réu, tendo logo depositado na sua conta à ordem a quantia global de € 50 000,00, que tinha distribuída noutras contas de outras instituições bancárias;
11. Um dos funcionários do banco Réu convenceu o Autor a aplicar a quantia que acabara de depositar na sua conta de depósitos à ordem (com o número 21097931.10.001), na subscrição do referido produto; o Autor não chegou a assinar qualquer boletim de subscrição ou qualquer outro documento similar, nem tal alguma vez lhe foi solicitado pelo banco Réu e, no dia 25 de outubro de 2004, foi debitada da sua conta à ordem a quantia de € 50 000,00, para a aquisição de um título SLN Rendimento Mais 2004;
12. O referido título encontra-se, ainda hoje, depositado na carteira de títulos do Autor, junto do banco Réu;
13. O Sr. Secretário de Estado do Tesouro e das Finanças prometeu que, antes de abril de 2010, os investidores (clientes do BPN) seriam reembolsados, o que foi noticiado a 14 de janeiro de 2010;
14. A entidade emitente SLN - Sociedade Lusa de Negócios, SGPS, S.A., pagou ao Autor os juros referentes à obrigação SLN Rendimento Mais 2004 até 30 de setembro de 2015;
15. Entretanto, o Autor soube que essa sociedade, hoje denominada Galilei, SGPS, S.A., apresentou um processo especial de revitalização, o qual correu seus termos pela 1.ª Secção de Comércio (Juiz 4), da comarca de Lisboa (Instância Central), com o número 22922/15.4T8LSB, tendo sido logo proferido o despacho a que alude o artigo 17.º-C, n.º 3, al. a), do CIRE, e tendo já sido proferida sentença que, declarando encerrado o processo negocial, sem a aprovação do plano de recuperação, determinou o encerramento do processo de revitalização;
16. A Galilei, SGPS, S.A., foi, entretanto, declarada insolvente por sentença datada de 29 de junho de 2016, proferida pelo mesmo Tribunal, no âmbito do processo com o número 23449/15.0T8LSB;
17. O Autor foi recebendo um extrato periódico onde lhe aparecia a referida obrigação como integrando a sua carteira de títulos, separada dos depósitos, com menção expressa à circunstância de se tratar de obrigação depositada na sua carteira de títulos;
18. Da mesma forma, foram-lhe sendo creditados em conta os juros relativos ao cupão da obrigação, o que também originava o registo no seu extrato periódico do banco;
19. O Autor depositava confiança na entidade BPN – Banco Português de Negócios, S.A., e nos seus funcionários ou interlocutores;
20. Quanto ao perfil do Autor como investidor, trata-se de uma pessoa com um elevado espírito de trabalho e de poupança, o que lhe permitiu amealhar algum aforro, sendo avesso a qualquer tipo de jogo ou de risco – o que sempre foi do conhecimento do banco Réu;
21. Em relação ao aconselhamento sobre os valores pertença do Autor, foi-lhe apresentado o dito produto financeiro designado por Obrigação SLN Rendimento Mais 2004 (de outubro de 2004) enquanto sucedâneo de um depósito a prazo;
22. Na negociação, celebração e execução do mencionado contrato, o Réu informou o Autor conforme referido em 21 e 23, mas não lhe forneceu um documento informativo sobre a natureza e as características principais do produto em questão;
23. O funcionário do BPN apresentou ao Autor a compra das obrigações SLN Mais 2004 como uma aplicação idêntica à constituição de um depósito a prazo com uma taxa de juro mais atractiva em razão do prazo e da menor liquidez até à maturidade, a qual podia, no entanto, ser substituída pela transacção para outros clientes, havendo muita procura, ou por financiamento do BPN, com a garantia da aplicação.
24. Ao subscrever o produto em causa, o Autor julgava estar a celebrar um negócio semelhante a um depósito a prazo, por tal lhe ter sido informado pelos funcionários do banco, subscrição essa que jamais ocorreria caso conhecesse a natureza do produto;
25. O Autor foi informado pelos funcionários do banco nos termos constantes dos pontos de facto 21, 23, 28 e 29;
 26. Aquando do vencimento do produto financeiro em questão (25 de outubro de 2014), o capital investido pelo Autor (= € 50 000,00) não lhe foi restituído pelo banco Réu, situação que perdura até hoje;
27. O Autor apenas ficou ciente dos termos específicos do negócio (para além do constante dos pontos de facto 21, 23, 28 e 29) e de que o banco Réu não assumiria qualquer responsabilidade pelo produto vendido a partir de 30 de setembro de 2015, data em que cessaram os pagamentos pela Galilei, SGPS, S.A., dos juros contratualizados;
 28. Aquando da subscrição do produto em causa, o Autor apenas foi informado de que o reembolso antecipado só era possível a partir do 5.º ano e, ainda, de que poderia endossá-lo unilateralmente a um terceiro interessado (até ao 5.º ano);
29. (…) O que, na altura, era possível, comum e rápido, uma vez que os títulos tinham elevada procura por serem rentáveis;
30. A presente ação judicial foi instaurada no dia 7 de junho de 2018 e o banco Réu foi citado para os seus termos no dia 15 de junho de 2018.
3. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
3.1. Dos pressupostos da responsabilidade civil imputada ao Réu
3.1.1. Entre o Autor e o BPN foi estabelecida relação nos termos da qual o BPN informou ao Autor da possibilidade de investimento em obrigações SLN 2004, apresentando-lhe tal produto financeiro, investimento que o Autor veio a fazer, na sequência dessa apresentação. É o que resulta da matéria de facto assente, pontos 5 e 9 a 12.
As obrigações são valores mobiliários, como resulta do artigo 1.º, n.º 1, do Código de Valores Mobiliários.
Consideramos a redacção do Código de Valores Mobiliários vigente à data dos factos, Outubro de 2004, a do Decreto-Lei 486/99, de 13 de Novembro, por ser a aplicável, visto o constante do artigo 12.º do Código Civil (redacção a que nos reportaremos sempre que outra menção não for feita), entendendo-se que a lei posterior não pode considerar-se meramente interpretativa, não integrando, por isso, a redacção indicada[1].
Está em causa um contrato de intermediação financeira como resulta do disposto nos artigos 289.º, n.º 1, alínea a), e 290.º, n.º 1, alínea a), do Código de Valores Mobiliários.
À data, o contrato de intermediação era meramente consensual, não exigindo forma escrita, exigência formal que apenas resulta da alteração ao artigo 321.º, do Código de Valores Mobiliários, operada pelo Decreto-Lei 357-A/2007, de 31 de Outubro.
O intermediário financeiro foi, no caso, um Banco, sendo-lhe admitida a prática da actividade de intermediação nos termos dos artigos 4.º, n.ª 1, alíneas e), f) e o), do Decreto-Lei 298/92, de 31 de Dezembro (Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras – doravante, RGICSF), aprovado pelo Decreto-Lei n.° 298/92, de 31 de Dezembro (RGICSF), na redação em vigor à data dos factos.
Enquanto instituição bancária, a sua actividade estava sujeita a normas específicas, de que se salientam as dos artigos 73º, 74.º e 76.º, do RGICSF[2], na redacção em vigor à época, a do Decreto-Lei n.º 252/2003, de 17 de Outubro. Normas que indicam as obrigações organizativas de competência e conhecimento que impedem sobre as instituições bancárias, de modo a que possam prestar aos clientes um serviço de qualidade e a especialíssima consideração dos interesses dos clientes mesmo quando, diríamos mesmo sobretudo quando, confrontados com os interesses da própria instituição e do grupo em que eventualmente se insere.
Importa ainda considerar, em especial, os artigos 7º, 304º, 309º e 312º do Código de Valores Mobiliários[3], aplicáveis à actividade de intermediação financeira, quanto à qualidade da informação a prestar, ao conhecimento do perfil do cliente, aos eventuais conflitos de interesses e à prevalência do interesse do cliente face ao da própria instituição financeira.
Este o enquadramento legal para a apreciação da conduta do BPN ao intermediar junto do Autor o investimento nas obrigações SLN 2004.
3.1.2. Importa apreciar as especificidades do caso concreto.
Na verdade, independentemente das construções teóricas potencialmente convocáveis para a delimitação do âmbito dos deveres de informação, só ao nível do caso concreto, com base na factualidade provada, se poderá concluir se um intermediário financeiro forneceu toda a informação que lhe era possível e exigível fornecer, face ao perfil do cliente e às suas necessidades informacionais (como se extrai do art.312º do CVM). Assim se justifica que em certos casos respeitantes ao cumprimento dos deveres de informação, em contratos de intermediação financeira, se conclua pela não responsabilização do intermediário e noutros casos se conclua de modo diverso[4].
Da matéria de facto assente nos autos resulta que o grupo em que se integrava o Réu deliberou executar uma operação de subscrição de obrigações da SLN, sociedade que detinha a totalidade do capital do BPN, subscrição a ser feita aos balcões do BPN, indicando o BPN aos seus funcionários como argumentos a utilizar junto dos potenciais clientes a rentabilidade do investimento, a sua natureza de sucedâneo dos depósitos a prazo e a possibilidade de liquidez, embora decorrente de endosso (que o Réu se dispunha a facilitar encontrando interessados) ou da disponibilidade do Réu para contratar financiamento com a garantia das obrigações.
 Mais se provou que um dos funcionários do Réu convenceu o Autor a subscrever o referido produto, o que este fez, por depositar confiança na entidade BPN e nos seus funcionários ou interlocutores.
No que se refere ao perfil do Autor como investidor, resultou provado tratar-se de uma pessoa com um elevado espírito de trabalho e de poupança, o que lhe permitiu amealhar algum aforro, sendo avesso a qualquer tipo de jogo ou de risco, factos conhecidos do Réu e que o dito produto financeiro designado por Obrigação SLN Rendimento Mais 2004 (de outubro de 2004) lhe foi apresentado enquanto sucedâneo de um depósito a prazo. Mais se provou que, na negociação, celebração e execução do mencionado contrato, o Réu não forneceu um documento informativo sobre a natureza e as características principais do produto em questão e que o funcionário do BPN apresentou ao Autor a compra das obrigações SLN Mais 2004 como uma aplicação idêntica à constituição de um depósito a prazo com uma taxa de juro mais atractiva em razão do prazo e da menor liquidez até à maturidade, a qual podia, no entanto, ser substituída pela transacção para outros clientes, havendo muita procura, ou por financiamento do BPN com a garantia da aplicação.
Provou-se ainda que o Autor julgava estar a celebrar um negócio sem riscos e com o capital garantido (à semelhança de um depósito a prazo), assim tendo sido induzido pelos funcionários do banco, subscrição essa que jamais ocorreria caso conhecesse suficientemente a natureza do mesmo.
3.1.3. Decorre das normas do RGICSF que antes citámos, que, enquanto instituição bancária, o BPN estava obrigado a manter elevados níveis de competência técnica, dotando a sua organização empresarial com os meios materiais e humanos necessários para realizar condições apropriadas de qualidade e eficiência e que nas relações com os clientes os seus agentes estavam obrigados a um procedimento com diligência, neutralidade, lealdade e discrição e respeito consciencioso dos interesses que lhes estão confiados. O BPN estava ainda obrigado a ter em conta o interesse dos depositantes, dos investidores e dos demais credores.
Ou seja, na sua intervenção junto de um cliente como o Autor, o BPN estava obrigado a ponderar as suas características de aforrista e de investidor e a propor-lhe um produto da mesma natureza do que lhe era por ele solicitado – depósito a prazo – explicitando-lhe nos termos adequados as vicissitudes possíveis do mesmo produto.
Em congruência, os artigos 304.º e 309.º, do Código de Valores Mobiliários, respeitantes aos princípios a observar e aos conflitos de interesses, pormenorizam o que já constava indicado no regime das instituições bancárias.
No que respeita especificamente às obrigações de informação, do indicado artigo 7.º do Código de Valores Mobiliários, decorre que o BPN, enquanto intermediário financeiro, estava obrigado a prestar ao Autor uma informação caracterizada pela sua completude, actualidade, objectividade e clareza.
Características de informação que o artigo 312.º, do Código de Valores Mobiliários, densifica ao estabelecer que o intermediário financeiro deve prestar todas as informações necessárias para uma tomada de decisão esclarecida e fundamentada (n.º 1), nomeadamente as que respeitem a riscos especiais envolvidos pelas operações a realizar (alínea a)) e a qualquer interesse que o intermediário financeiro ou as pessoas que em nome dele agem tenham no serviço prestado ou a prestar (alínea b)), sendo que a extensão e a profundidade da informação devem ser tanto maiores quanto menor for o grau de conhecimentos e de experiência do cliente (n.º 2).
Analisando a matéria de facto provada, não se vislumbra que tenham sido dadas informações inexactas ao Autor. Aliás, a indicação de inexactidão das informações reporta-se a ter sido o Autor informado de que o produto era de capital garantido. Ora, essa informação é formalmente exacta, face ao funcionamento do produto, uma vez que na maturidade o capital é pago, não estando sujeito a oscilações que o aumentem ou diminuam no decurso da sua vigência. Informar que o capital está garantido é por isso informar com exactidão.
Mas de tal não decorre o cumprimento do dever de informação com as qualidades assinaladas da sua completude, segundo o princípio da proporcionalidade inversa a estabelecer entre o âmbito e conteúdo da informação e a (i)literacia financeira do cliente.
Dos enunciados normativos importa reter que a relação contratual obrigacional que se estabelece entre o cliente e o intermediário financeiro, deve estar sempre pautada pela lealdade, sustentada no rigor informativo pré-contratual e contratual por parte do intermediário financeiro, condizente a uma informação objectiva, completa, verdadeira, actual, clara, e lícita, tendo em conta, sublinhamos, que entre clientes não qualificados, a avaliação do risco não é tão informada quanto a da contraparte[5].
No caso do Autor, a qualificação como investidor não institucional não oferece dúvida face aos factos provados e ao disposto no artigo 321.º, n.º 2, do Código de Valores Mobiliários.
Na verdade, o BPN promoveu e assentou a sua campanha de colocação das obrigações SLN 2004 mediante a utilização de um argumentário de identificação das mesmas com os depósitos a prazo. No caso do Autor era esse o produto que solicitara, o que explica a especial atractividade que a comparação estabelecia. Certo é que a rentabilidade era superior à do depósito a prazo, o que devia indicar a um investidor diligente que alguma diferença haveria. No entanto essa diferença era explicada pela menor liquidez, uma vez que a disponibilidade do capital antes da maturidade era menos “fácil” implicando ou o endosso ou o pedido de financiamento junto do BPN com a garantia das obrigações.
Não se vê assim que o investidor diligente devesse ter considerado que outras diferenças haveria ainda face aos depósitos a prazo.
Acontece que outras diferenças havia, as relacionadas com as características das obrigações e com a especial segurança dos depósitos a prazo.
No que às primeiras respeita, desde logo a sua natureza de crédito sobre a sociedade emitente que decorre do disposto no artigo 348.º do Código das Sociedades Comerciais (CSC), que lhe atribui a estrutura de um mútuo.
Refere Paulo Câmara[6] que o titular da obrigação é fundamentalmente um credor perante a entidade emitente e como relação jurídica subjacente na base deste valor mobiliário existe tipicamente um contrato de mútuo.
Ao que acresce como característica do título a quase ausência de controle da gestão desta, como refere Paulo Câmara[7]:
(…) há que admitir que a tutela conferida no ordenamento jurídico português à posição dos credores obrigacionistas é, a este propósito escassa.
De uma banda, é quase nula a intervenção dos obrigacionistas no processo decisório ligado ao governo societário (…).
De considerar ainda, neste domínio da incompletude da informação prestada, a ausência de referência ao carácter subordinado das obrigações em causa, matéria que não é despicienda para a opção do investidor na medida em que implica uma menor garantia de reembolso dos seus créditos face aos credores comuns.
As obrigações representativas de dívida subordinada são aquelas em que o titular da obrigação, havendo insolvência da emitente, apenas se pode pagar sobre o património do emitente depois de satisfeitos todos os credores comuns[8].
Por outro lado, a protecção concedida aos depósitos a prazo, nos termos dos artigos 164.º e 166.º do RGICSF, mesmo na redacção vigente à data, torna muito diversa a segurança do investimento que estes concedem face à concedida pelas obrigações.
No que respeita a estas diferenças essenciais das obrigações quanto aos depósitos a prazo, vejam-se os acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 7 de Fevereiro de 2019, proferido no processo 31/17.1T8PVZ.P1.S1 (ROSA TCHING) e de 26 de Março de 2019, proferido no processo 2259/17.5T8LRA.C1.S1 (ALEXANDRE REIS).
Ora, essas diferenças não foram explicadas ao Autor. Deveriam ter sido? Entendemos que sim.
Por um lado, nada permite acreditar face ao seu perfil de investidor que resulta dos factos assentes, que o Autor dominasse o conceito de obrigação ou de credor obrigacionista, as suas diferenças face ao depósito bancário e à protecção do depositante bancário, ou as suas especiais características de vulnerabilidade face à gestão da empresa emitente.
Por outro lado, porque a utilização pelo Banco do argumentário da similitude com os depósitos a prazo, favorável aos seus objectivos de colocar as obrigações SLN 2004, impunha-lhe uma especial diligência em explicar as diferenças com um depósito a prazo, nomeadamente as que se deixaram assinaladas.
Dito de outro modo, se o BPN se prevaleceu das características atractivas do depósito a prazo para seduzir o perfil de investidor do Autor, devia de igual modo indicar as diferenças entre obrigações e depósitos a prazo na parte menos atarctiva para esse perfil de investidor.
Veja-se a respeito o acórdão relatado pelo Ex.mo Primeiro Adjunto em 11 de Outubro de 2018, no processo 3771/16.9T8LRA.L1-6.
Por essa razão, só essa completa informação permitiria considerar cumprido o seu dever de prestar todas as informações necessárias para uma tomada de decisão esclarecida e fundamentada e de colocar os interesses do cliente à frente dos seus próprios e dos do grupo financeiro em que se inseria.
Consideramos por isso que não foram cumpridos pelo BPN os deveres de informação a que estava adstrito.
No mesmo sentido o acórdão desta relação relatado pela Ex.ma Senhora Segunda Adjunta em 21 de Novembro de 2019, no processo 13755/18.7 T8LSB.L1 (inédito).
 Não se ignora a existência de múltipla jurisprudência[9] contrária à posição que assumimos[10], como também de muita outra que acolhe idêntica conclusão[11].
3.1.4. Numa outra perspectiva, dir-se-á que consideramos irrelevante ponderar que os riscos de insolvência da SLN eram, à data da emissão obrigacionista, praticamente irrelevantes e correspondiam aos riscos de insolvência do BPN, que seria o garante do depósito a prazo. O mesmo é dizer, que na data da subscrição não era exigível ao BPN qualquer previsão da insolvência da SLN dez anos depois.
Certo é que nenhuma obrigação (ou até possibilidade) existia em 2004 de prever a insolvência da SLN.
Mas a diferença entre a garantia de cumprimento que a sociedade oferecia e a que oferecia o depósito a prazo num Banco, não era despicienda face ao específico regime dos depósitos a prazo a que antes aludimos.
Ao que acresce a maior disponibilidade dos Estados para assegurar a solvabilidade de um Banco face à de uma empresa, que a experiência recente voltou a lembrar.
Nesse sentido o Supremo Tribunal de Justiça já decidiu:
E nem se diga, como o faz o recorrente que, à data da subscrição desta obrigação, o intermediário financeiro não tinha o dever legal de informar o investidor sobre os riscos deste instrumento financeiro.
É que, enquanto as obrigações clássicas são tipicamente empréstimos obrigacionistas, cujas condições de reembolso e remuneração, são fixadas à partida pela entidade emitente e que, na expressão do art. 348º do Código das Sociedades Comerciais, conferem direitos de crédito iguais sobre esta entidade, as obrigações subordinadas distinguem-se destas por estarem abrangidas por uma cláusula de subordinação, isto é, no caso de insolvência ou liquidação da entidade emitente, apenas são reembolsadas após os demais credores por dívida não subordinada, tendo todavia prioridade sobre os acionistas (cfr. art. 48º, al. c) do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas – CIRE), representando, por isso, um maior risco potencial, pois, considerando o facto de, na graduação de créditos, cederem perante os créditos privilegiados e sobre os créditos comuns, facilmente se pode aceitar como certa a inviabilidade de os autores obterem no processo de insolvência o retorno do capital que a emitente se obrigou a realizar e os respetivos juros.
Deste modo, mesmo aceitando que o intermediário financeiro não estava obrigado a informar o investidor acerca do risco de insolvência da entidade emitente, nem acerca da robustez financeira da entidade emitente, temos por certo impender sobre o mesmo o dever de, em momento anterior à subscrição da obrigação DD, dar a conhecer aos autores as reais características deste produto financeiro, designadamente os maiores riscos envolvidos nesta operação, incluindo o especial risco de não retorno do capital investido em caso de insolvência da entidade emitente, factor que assume especial relevância visto estarmos perante uma obrigação subordinada com reembolso a dez anos e sem possibilidade de reembolso antecipado por iniciativa do subscritor.
Mas, não só não o fez, como, em vez disso, assegurou aos autores que a obrigação DD era equivalente a um depósito a prazo, tão segura como este, estando garantido o retorno do capital investido, o que não pode deixar de consubstanciar uma informação que, para além de incompleta, por não dar a conhecer aos autores as características da obrigação por eles subscrita nem os ter alertados para os riscos específicos da obrigação subordinada em causa, era inexata, por não ser totalmente verdadeira, violando, desse modo, disposto nos arts. 7º, nº 1 e 312º, nº 1, al. a) do CVM, tanto mais que provado ficou que os autores adquiriram a obrigação em causa, porque lhes foram dadas aquelas condições[12].
Importa apreciar das consequências que resultam da violação do dever de informar.
3.1.5. O artigo 314.º do Código de Valores Mobiliários, que regia quanto à responsabilidade civil, na redacção vigente à data, era do seguinte teor:
1 - Os intermediários financeiros são obrigados a indemnizar os danos causados a qualquer pessoa em consequência da violação de deveres respeitantes ao exercício da sua actividade, que lhes sejam impostos por lei ou por regulamento emanado de autoridade pública.
2 - A culpa do intermediário financeiro presume-se quando o dano seja causado no âmbito de relações contratuais ou pré-contratuais e, em qualquer caso, quando seja originado pela violação de deveres de informação.
Decorre desta norma, sem necessidade de recurso às normas gerais de responsabilidade civil contratual, que a violação dos deveres de informação pelo intermediário financeiro o constitui em responsabilidade civil, obrigando-o a indemnizar os danos causados, presumindo-se a culpa quando o dano seja causado por violação de deveres de informação.
No quadro geral dos pressupostos de responsabilidade civil a ilicitude corresponde à violação do dever de informação e dela decorre presunção de culpa se o dano for causado por essa violação. Anote-se que a lei prescinde do contexto contratual ou até pré-contratual, admitindo a responsabilidade extra-contratual.
Todavia, no caso vertente, como já o dissemos, a responsabilidade nasce num contexto contratual, o do contrato de intermediação financeira estabelecido entre o BPN e o Autor.
Contexto contratual em que a prestação de informação não assume a natureza de um mero dever acessório da prestação principal entendida como o estabelecimento de contacto entre o investidor e a emitente do produto financeiro. Na verdade, a informação e a sua qualidade é a principal das prestações do intermediário, enquanto assume a dimensão da prestação mais essencial para a contraparte, razão fundamental da sua decisão de contratar a intermediação.
Seguramente que do conteúdo dessa prestação principal do intermediário consta a actividade de receber e transmitir ordens de investimento, mas as demais características são tanto ou mais essenciais do que essa mera transmissão.
Interessa à decisão do caso a consideração de tais deveres enquanto deveres de informação pré-contratual: podendo ser funcionalmente ordenados como deveres acessórios de conduta relativamente ao dever de prestar emergente de determinado contrato de intermediação financeira, constituem, eles próprios, deveres de prestar, autonomamente valorados na disciplina dessa específica relação obrigacional, designadamente para efeitos do seu incumprimento, nos termos previstos no art. 314º do CVM (na redação originária do DL 486/99), adiante examinado[13].
Acresce o reforço dessa obrigação, dada a natureza de instituição bancária do BPN, com especiais conhecimentos financeiros e uma necessária posição de perícia junto do Autor.
O mesmo é dizer que a ilicitude demonstrada constitui o próprio incumprimento contratual do contrato de intermediação que, por si só, também estabeleceria presunção de culpa nos termos da lei geral consubstanciada no artigo 799.º, n.º 1, do Código Civil.
O Réu não ilidiu a presunção de culpa, tendo de tal o ónus nos termos do artigo 344.º, n.º 1, do Código Civil.
Verifica-se assim demonstrada a prática pelo Réu de um acto ilícito e culposo, importando apreciar se dele decorreu dano.
3.1.6. Entende o Réu que o dano decorre do incumprimento por parte da sociedade emitente das obrigações e não de actuação sua. Ou seja, o dano não decorre da subscrição das obrigações, mas do incumprimento da SLN.
Não se concorda com a asserção. Na verdade, decorre de ambas. O nosso regime de causalidade entre acto ilícito e culposo e dano é o de causalidade adequada, conforme resulta do artigo 563.º do Código Civil.
O conceito jurídico de causalidade, excluída que está a causalidade puramente naturalística, é e foi objecto de diversas abordagens e teorias sempre com vista a encontrar o conceito de causa apropriado à realização dos objectivos específicos do direito e, mais concretamente, tendo-se em vista os princípios que inspiram a responsabilidade civil (…)[14].
Partindo dos conceitos de condição de ocorrência de um facto e causa do mesmo, as teses dividiram-se entre dois grandes grupos, consoante aceitavam como causa todas as condições sem as quais o facto não teria ocorrido (doutrina da equivalência das condições ou da conditio sine qua non) ou, pelo contrário, distinguiam de entre as condições aquelas que podiam merecer o qualificativo de causa (doutrinas selectivas).
O legislador português consagrou no artigo 563º, do Código Civil, a denominada tese da causalidade adequada[15], a saber, considera-se causa de um prejuízo a condição que, em abstracto, se mostra adequada a produzi-lo.
(…)
Assim, deverá entender-se, no primeiro domínio [factos ilícitos], que o facto que actua como condição só deixará de ser causa do dano desde que se mostre por sua natureza de todo inadequado e o haja produzido apenas em consequência de circunstâncias anómalas ou excepcionais[16].
 Este o quadro em que deve analisar-se o facto ilícito em causa nos autos e a sua repercussão danosa.
Na perspectiva da responsabilidade civil, pode dizer-se, liminarmente, que dano ou prejuízo é toda a ofensa de bens ou de interesses alheios protegidos pela ordem jurídica[17].
Os danos podem ser classificados segundo diversos critérios[18]. Uma primeira dimensão de consideração do dano tem uma expressão naturalística, a recolher da realidade da vida, que importa integrar numa dimensão jurídica que incorpora a sua relevância indemnizatória.
Como refere o Professor Menezes Cordeiro:
O dano é a supressão ou diminuição de uma situação favorável: uma noção natural de dano, a confrontar com o correspondente conceito jurídico.
O dano jurídico, ou simplesmente dano, tem, na sua génese, a ideia naturalística atrás aludida. Simplesmente, deriva de uma valoração operada pelo Direito, de tal forma que pode não coincidir totalmente com o primeiro.
Em sentido jurídico, diremos que o dano é a supressão ou diminuição de uma situação favorável, reconhecida ou protegida pelo Direito[19].
O dano a considerar no caso concreto é a privação do montante de € 50.000,00 que o Autor tinha a expectativa de receber no final do prazo estabelecido.
Ora, a violação do dever de informação por parte do BPN foi uma das causas que determinou que o Autor se visse desapossado daquela quantia, por a ter investido em obrigações por deficiência da informação prestada pelo Réu.
Deve considerar-se que as circunstâncias determinantes são de tal modo excepcionais e anómalas que retiram a natureza causal à conduta do BPN, por se confundirem com a crise económica e financeira que assolou o mundo?
Não cremos. As circunstâncias determinantes são o sempre possível incumprimento da contraparte, que se revestem de grande normalidade, a respeito do qual não foi dada ao Réu a informação relevante quanto às diferenças entre depósitos a prazo e obrigações, como à saciedade se indicou.
Entendemos, em consequência, que a subscrição das obrigações é causa adequada do dano que o não pagamento do capital na maturidade constitui.
A respeito, refere o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 26 de Março de 2019, proferido no processo 2259/17.5T8LRA.C1.S1 (ALEXANDRE REIS):
A causa (normativamente adequada) pode ser, não necessariamente directa e imediata, mas indirecta, bastando que a acção causal desencadeie outra condição que, directamente, suscite o dano.
Todavia, por outro lado, não é suposta a existência de uma causa ou condição exclusiva na produção do dano, no sentido de que a mesma tenha, só por si, determinado o dano, porquanto podem ter intervindo outros factos, contemporâneos ou não. Na verdade, a lesão e a consequente produção do dano podem resultar de um concurso real de causas, da contribuição de vários factos, não sendo qualquer deles, singularmente considerado, suficiente para alcançar o efeito danoso, embora se imponha que um deles seja causa adequada do por ele desencadeado, imputável a outro agente.
E «[q]uando ocorre um tal concurso de causas adequadas, simultâneas ou subsequentes, qualquer dos autores é responsável pela reparação de todo o dano, como se infere do que se dispõe nos arts. 490º e 570º C. Civil (cfr. P. Coelho “O Problema da Relevância da Causa Virtual...”, 31-34)», como decidiu o mesmo Ac. de 13-01-2009.
3.1.7. Uma coisa é o dano e outra a sua medida, a respeito da qual regula o artigo 562.º, do Código Civil, ao estatuir que o obrigado a reparar um dano deve reconstituir a situação anterior à lesão.
Poderia dizer-se que estando o Autor disposto a fazer um depósito a prazo, o seu dano seria o do incumprimento resultante da insolvência do banco em que esse depósito fosse constituído, sendo a garantia a que resulta do regime legal. Em suma, o dano do Autor corresponderia a não ter a garantia de capital que teria se tivesse constituído um depósito a prazo, a saber o capital garantido nos termos do artigo 166.º, n.º 1, do RGICSF.
Não é assim, porque a informação em falta causadora do dano implicaria, se tivesse sido prestada, que o Autor não subscrevesse a obrigação, ou seja, implicaria que o Autor não se visse privado do montante que empregou nessa subscrição. É este montante do seu dano.
Consideramos por isso que bem andou a sentença recorrida ao condenar o Réu a pagar-lhe as quantias nela especificadas.
3.2. Da prescrição da obrigação
Cautelarmente, invocou o Réu a prescrição da obrigação por aplicação do disposto 324.º, n.º 2, do Código de Valores Mobiliários, com o seguinte teor:
Salvo dolo ou culpa grave, a responsabilidade do intermediário financeiro por negócio em que haja intervindo nessa qualidade prescreve decorridos dois anos a partir da data em que o cliente tenha conhecimento da conclusão do negócio e dos respectivos termos.
O comportamento do BPN em clara violação dos seus deveres de informação enquanto instituição bancária e enquanto intermediário financeiro, não pode nunca ser considerado mera negligência ou culpa leve, antes se devendo caracterizar como dolosa. Na verdade, o BPN estabeleceu toda a sua organização para a colocação das obrigações assente naquela informação incompleta a que se aludiu, ao equiparar o produto a um depósito a prazo sem esclarecer as diferenças entre ambos.
Louvamo-nos no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça  de 10 de Abril de 2018, proferido no processo 753/16.4TBLSB.L1.S1 (FONSECA RAMOS), já citado, por impossibilidade de abordar a questão de modo diverso ou mais exaustivo:
O art.324º, nº2, do CVM estabelece um prazo de prescrição de dois anos: “Salvo dolo ou culpa grave, a responsabilidade do intermediário financeiro por negócio em que haja intervindo nessa qualidade prescreve decorridos dois anos a partir da data em que o cliente tenha conhecimento da conclusão o do negócio e dos respectivos termos”. O prazo de dois anos é aplicável nos casos de culpa leve ou levíssima como resulta da ressalva inicial, “salvo dolo ou culpa grave”.
Na definição de Antunes Varela, in “Das Obrigações em Geral, Vol. I, 10ª, Edição, Almedina, 2003, pág. 577, nota 2:
“A culpa lata (a que mais frequentemente se chama culpa grave) consiste em não fazer o que faz a generalidade das pessoas, em não observar os cuidados que todos em princípio adoptam. A culpa leve seria a omissão da diligência normal (podendo o padrão da normalidade ser dado em termos subjectivos, concretos, ou em termos objectivos, abstractos). A culpa levíssima seria a omissão dos cuidados especiais que só as pessoas mais prudentes e escrupulosas observam”.
Atento o padrão de exigência imposta ao intermediário financeiro, no que concerne ao dever de informar em sede pré-contratual e contratual, e considerando que a sua actuação se afere pelo padrão do diligentissimus pater familias, o Réu é passível de um acentuado grau de censura: o seu dever de informar, integrando o cerne da prestação, implicava um escrupuloso dever de diligência, pelo que a actuação, intencionalmente omissiva de informação, que era devida, exprime culpa grave.
Sendo a sua culpa grave, não se aplica o prazo bianual do art. 342º, nº2, do CVM, mas o prazo geral do art. 309º Código Civil, neste sentido o Acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça, que citámos.
No sentido de que deve aplicar-se, fora dos casos previstos no art. 324º, nº2, do CVM, o prazo geral de prescrição do Código Civil, Fátima Gomes, no Estudo “Contratos de Intermediação Financeira, Sumário Alargado” pág. 580, in Estudos Dedicados ao Prof. Doutor Mário Júlio de Almeida Costa:
“Quanto aos prazos de prescrição da responsabilidade contratual, o Cód.VM introduz um prazo de dois anos, a contar da data em que o cliente tenha conhecimento da conclusão do negócio e dos respectivos termos, nas situações de negligência do intermediário financeiro (art. 324º/2), omitindo-se qual o prazo aplicável às restantes hipóteses. No silêncio do legislador seremos forçados a utilizar as normas subsidiárias aplicáveis, por força das regras de interpretação e integração, que conduzem ao direito comum do Código Civil [Serão aplicáveis os arts. 309º e ss. quanto ao prazo de prescrição. Rui Pinto Duarte, “Contratos de intermediação no Código dos Valores Mobiliários”, in Cadernos do MVM, Coimbra Editora, nº7, 2000, p. 364 aponta para o prazo de 20 anos. Se a responsabilidade for extracontratual vigora o disposto no art. 398º do Código Civil].[4]” 
Consideramos assim aplicável o prazo prescricional geral de 20 anos, pelo que improcede a excepção de prescrição e, com ela, o recurso.
IV) DECISÃO
Pelo exposto, ACORDAM em alterar a matéria de facto nos termos indicados e em julgar improcedente o recurso, mantendo a decisão recorrida.
Custas pelo Recorrente – artigo 527.º, n.º 2, do CPC.
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Lisboa, 8 de Outubro de 2020
Ana de Azeredo Coelho
Eduardo Petersen Silva
Cristina Neves
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[1] Vejam-se os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 14 de Março de 2019, proferido no processo 2547/16.8T8LRA.C2.S1 (MARIA DOS PRAZERES PIZARRO BELEZA) e de 21 de Fevereiro de 2019, proferido no processo 2340/16.8T8LRA.C2.S1 (ILÍDIO SACARRÃO MARTINS).
[2]Artigo 73.º
Competência técnica
As instituições de crédito devem assegurar aos clientes, em todas as actividades que exerçam, elevados níveis de competência técnica, dotando a sua organização empresarial com os meios materiais e humanos necessários para realizar condições apropriadas de qualidade e eficiência.
Artigo 74.º
Relações com os clientes
Nas relações com os clientes, os administradores e os empregados das instituições de crédito devem proceder com diligência, neutralidade, lealdade e discrição e respeito consciencioso dos interesses que lhes estão confiados.
Artigo 76.º
Critério de diligência
Os membros dos órgãos de administração das instituições de crédito, bem como as pessoas que nelas exerçam cargos de direcção, gerência, chefia ou similares, devem proceder nas suas funções com a diligência de um gestor criterioso e ordenado, de acordo com o princípio da repartição de riscos e da segurança das aplicações, e tendo em conta o interesse dos depositantes, dos investidores e dos demais credores.
[3] Artigo 7.º
Qualidade da informação
1 - Deve ser completa, verdadeira, actual, clara, objectiva e lícita a informação respeitante a valores mobiliários, a ofertas públicas, a mercados de valores mobiliários, a actividades de intermediação e a emitentes que seja susceptível de influenciar as decisões dos investidores ou que seja prestada às entidades de supervisão e às entidades gestoras de mercados, de sistemas de liquidação e de sistemas centralizados de valores mobiliários.
2 - O disposto no número anterior aplica-se seja qual for o meio de divulgação e ainda que a informação seja inserida em conselho, recomendação, mensagem publicitária ou relatório de notação de risco.
3 - O requisito da completude da informação é aferido em função do meio utilizado, podendo, nas mensagens publicitárias, ser substituído por remissão para documento acessível aos destinatários.
4 - À publicidade relativa a valores mobiliários e a actividades reguladas neste Código é aplicável o regime geral da publicidade.
Artigo 304.º
Princípios
1 - Os intermediários financeiros devem orientar a sua actividade no sentido da protecção dos legítimos interesses dos seus clientes e da eficiência do mercado.
2 - Nas relações com todos os intervenientes no mercado, os intermediários financeiros devem observar os ditames da boa fé, de acordo com elevados padrões de diligência, lealdade e transparência.
3 - Na medida do que for necessário para o cumprimento dos seus deveres, o intermediário financeiro deve informar-se sobre a situação financeira dos clientes, a sua experiência em matéria de investimentos e os objectivos que prosseguem através dos serviços a prestar.
4 - Os intermediários financeiros estão sujeitos ao dever de segredo profissional nos termos previstos para o segredo bancário, sem prejuízo das excepções previstas na lei, nomeadamente o cumprimento do disposto no artigo 382.º
5 - Estes princípios e os deveres referidos nos artigos seguintes são aplicáveis aos titulares do órgão de administração do intermediário financeiro e às pessoas que efectivamente dirigem ou fiscalizam cada uma das actividades de intermediação.
Artigo 309.º
Conflito de interesses
1 - O intermediário financeiro deve organizar-se e actuar de modo a evitar ou a reduzir ao mínimo o risco de conflito de interesses.
2 - Em situação de conflito de interesses, o intermediário financeiro deve agir por forma a assegurar aos seus clientes um tratamento transparente e equitativo.
3 - O intermediário financeiro deve dar prevalência aos interesses dos clientes, tanto em relação aos seus próprios interesses ou de empresas com as quais se encontra em relação de domínio ou de grupo, como em relação aos interesses dos titulares dos seus órgãos sociais e dos seus trabalhadores.
4 - Sempre que o intermediário financeiro realize operações para satisfazer ordens de clientes, deve pôr à disposição destes os valores mobiliários pelo mesmo preço por que os adquiriu.
Artigo 312.º
Deveres de informação
1 - O intermediário financeiro deve prestar, relativamente aos serviços que ofereça, que lhe sejam solicitados ou que efectivamente preste, todas as informações necessárias para uma tomada de decisão esclarecida e fundamentada, incluindo nomeadamente as respeitantes a:
a) Riscos especiais envolvidos pelas operações a realizar;
b) Qualquer interesse que o intermediário financeiro ou as pessoas que em nome dele agem tenham no serviço prestado ou a prestar;
c) Existência ou inexistência de qualquer fundo de garantia ou de protecção equivalente que abranja os serviços a prestar;
d) Custo do serviço a prestar.
2 - A extensão e a profundidade da informação devem ser tanto maiores quanto menor for o grau de conhecimentos e de experiência do cliente.
3 - A circunstância de os elementos informativos serem inseridos na prestação de conselho, dado a qualquer título, ou em mensagem promocional ou publicitária não exime o intermediário financeiro da observância dos requisitos e do regime aplicáveis à informação em geral.
[4] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 18 de Setembro de 2018, proferido no processo 20403/16.8T8SLB.L1.S1 (MARIA OLINDA GARCIA).
[5] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 21 de Março de 2019, proferido no processo 6059/16.1T8VIS.C1.S1 (OLIVEIRA ABREU)
[6] In Manual de Direito dos Valores Mobiliários, Almedina, 2011, 2.ª edição, p. 135.
[7] In O regime jurídico das obrigações e a protecção dos credores obrigacionistas, Direito dos Valores Mobiliários, Coimbra Editora, 2003, vol. IV, p. 331.
[8] Paulo Câmara, in Manual…, p. 137.
[9] A ter especialmente em consideração a advertência do Supremo Tribunal de Justiça, no acórdão 2406 infra para a dificuldade de encontrar situações exactamente similares que permitam a clara organização dos arestos nestas duas posições principais: É um truísmo afirmá-lo, mas, como o revela a leitura de outros arestos que têm sido publicados sobre litígios de contornos semelhantes ligados ao “Grupo DD”, não existem processos ou “casos” iguais, neles assomando diversas realidades e uma multiplicidade de questões de facto e de direito.
[10] Assim, acórdãos de 11 de Outubro de 2018, proferido no processo 2339/16.4T8LRA.C2.S1 (MARIA DO ROSÁRIO MORGADO), de 19 de Dezembro de 2018, proferido no processo 9633/16.2T8LSB.L1.S1 (OLINDO GERALDES), de 19 de Dezembro de 2018, proferido no processo 382/17.6T8VNG.P1.S1 (SOUSA LAMEIRA), de 19 de Dezembro de 2018, proferido no processo 1479/16.4T8LRA.C2.S1 (ILÍDIO SACARRÃO MARTINS), de 19 de Dezembro de 2018, proferido no processo 433/11.7TVPRT.P1.S2 (ILÍDIO SACARRÃO MARTINS), de 9 de Janeiro de 2019, proferido no processo 3845/16.6T8VIS.C2.S2 (SOUSA LAMEIRA), de 9 de Janeiro de 2019, proferido no processo 9659/16.6T8LSB.L1.S1 (OLIVEIRA ABREU), de 15 de Janeiro de 2019, proferido no processo 3831/15.3TBLRA.L1.S1 (HELDER ALMEIDA), de 24 de Janeiro de 2019, proferido no processo 2406/16.4T8LRA.C1.S1 (ABRANTES GERALDES), de 21 de Fevereiro de 2019, proferido no processo 2340/16.8T8LRA.C2.S1 (ILÍDIO SACARRÃO MARTINS), de 28 de Fevereiro de 2019, proferido no processo 2146/16.4T8LRA.C2.S1 (OLINDO GERALDES), de 28 de Fevereiro de 2019, proferido no processo 3654/16.2T8LRA.C1.S1 (OLIVEIRA ABREU), de 14 de Março de 2019, proferido no processo 2547/16.8T8LRA.C2.S1 (MARIA DOS PRAZERES PIZARRO BELEZA), de 21 de Março de 2019, proferido no processo 28438/16.4T8LSB.L1.S1 (OLIVEIRA ABREU), de 21 de Março de 2019, proferido no processo 6059/16.1T8VIS.C1.S1 (OLIVEIRA ABREU), de 28 de Março de 2019, proferido no processo 1614/17.5T8LRA.C1.S1 (MARIA DO ROSÁRIO MORGADO), de 28 de Março de 2019, proferido no processo 3771/16.9T8LRA.L1.S1 (OLIVEIRA ABREU), de 30 de Abril de 2019, proferido no processo 2632/16.6T8LRA.L1.S1 (MARIA DOS PRAZERES PIZARRO BELEZA), de 9 de Maio de 2019, proferido no processo 615/17.6T8LSB.L1.S2 (MARIA DO ROSÁRIO MORGADO), de 6 de Junho de 2019, proferido no processo 4447/17.5T8LRA.C1.S1 (MARIA DO ROSÁRIO MORGADO), de 11 de Julho de 2019, proferido no processo 901/17.7T8VRL.G2.S1 (FÁTIMA GOMES), de 7 de Novembro de 2019, proferido no processo 1616/17.1T8LRA.C1.S1 (OLIVEIRA ABREU), e de 10 de Dezembro de 2019, proferido no processo 970/18.2T8STR.E1.S2 (MARIA DO ROSÁRIO MORGADO).
[11] Assim, acórdãos de 10 de Abril de 2018, proferido no processo 753/16.4TBLSB.L1.S1 (FONSECA RAMOS), de 18 de Setembro de 2018, proferido no processo 20329/16.5T8LSB.L1.S1 (SALRETA PEREIRA), de 18 de Setembro de 2018, proferido no processo 20403/16.8T8SLB.L1.S1 (MARIA OLINDA GARCIA), de 25 de Outubro de 2018, proferido no processo 2581/16.8T8LRA.C2.S1 (BERNARDO DOMINGOS), de 6 de Novembro de 2018, proferido no processo 6295/16.0T8LSB.L1.S1 (CABRAL TAVARES), de 6 de Novembro de 2018, proferido no processo 2468/16.4T8LSB.L1.S1 (CABRAL TAVARES), de 11 de Dezembro de 2018, proferido no processo 6917/16.3T8GMR.G1.S1 (ANA PAULA BOULAROT), de 7 de Fevereiro de 2019, proferido no processo 31/17.1T8PVZ.P1.S1 (ROSA TCHING), de 26 de Março de 2019, proferido no processo 2259/17.5T8LRA.C1.S1 (ALEXANDRE REIS), e de 28 de Janeiro de 2020, proferido no processo 2142/16.1T8STR.E1.S1 (JOSÉ RAINHO).
[12] Acórdão de 7 de Fevereiro de 2019, proferido no processo 31/17.1T8PVZ.P1.S1 (ROSA TCHING).
[13] Acórdão de 6 de Novembro de 2018, proferido no processo 2468/16.4T8LSB.L1.S1 (CABRAL TAVARES).
[14] Cf. Professor Mário Júlio de Almeida Costa in Direito das Obrigações, Almedina, 1979, p. 515.
[15] A asserção não é completamente pacífica como dá nota Júlio Gomes em Ainda sobre a figura do dano da perda de oportunidade ou perda de chance, Cadernos de Direito Privado, n.º especial 2, Dezembro de 2012, p. 27.
[16] Idem, p. 518-519.
[17] Professor Mário Júlio de Almeida Costa in Direito das Obrigações, Almedina, 1979, p. 391.
[18] Professor Mário Júlio de Almeida Costa, op. cit. p. 392 e ss, Pessoa Jorge, Ensaio sobre os Pressupostos da Responsabilidade Civil, Almedina, 1999, p. 373 e ss, Professor Gomes da Silva, O dever de Prestar e o Dever de indemnizar, Lisboa, 1944, p. 117 e ss.
[19] In Tratado de Direito Civil, Almedina, 2017, vol. VIII, p. 511, indicando a p. 528 as posições tomadas pelos diversos autores portugueses mais sif«gnificativos.