Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
22927/20.3T8LSB-A.L1-6
Relator: VERA ANTUNES
Descritores: CONVENÇÃO DE ARBITRAGEM
PRODUÇÃO DE PROVA
COMPETÊNCIA DOS TRIBUNAIS JUDICIAIS
DESPACHO DE APERFEIÇOAMENTO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 11/04/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Sumário: I – Nos termos dos artigos 573.º (Obrigação de informação) e 575.º (Apresentação de documentos) do Código Civil, são distintas as obrigações aí previstas e prevê ainda a Lei distintos requisitos para cada uma delas.
II - Em sede processual, igualmente são distintos os meios processuais a que a parte pode recorrer conforme a obrigação em causa; o direito à obtenção de informações é exercido através de uma acção comum de condenação e o direito a exigir a apresentação de coisas ou documentos é exercido através do processo especial de Apresentação de coisas ou documentos.
III - Validamente celebrada a convenção de arbitragem entre as partes, resulta da mesma o efeito negativo da convenção de arbitragem previsto pelo art.º 5º da LAV e ainda, de acordo com o art.º 19º da LAV, nas matérias reguladas por este Lei, os tribunais estaduais só podem intervir nos casos em que esta o prevê.
IV – Nos termos do art.º 18º da LAV o tribunal arbitral pode decidir sobre a sua própria competência; a decisão interlocutória pela qual o tribunal arbitral declare que tem competência pode, no prazo de 30 dias após a sua notificação às partes, ser impugnada por qualquer destas perante o tribunal estadual competente, e enquanto a impugnação referida no número anterior do presente artigo estiver pendente no tribunal estadual competente, o tribunal arbitral pode prosseguir o processo arbitral e proferir sentença sobre o fundo da causa.
V - Entendeu o Tribunal Arbitral “autorizar o Demandado a solicitar a intervenção do tribunal estadual na medida do necessário à produção da prova documental determinada e não cumprida”, o que fez ao abrigo do disposto pelo art.º 38º da LAV que regula a solicitação aos tribunais estaduais na obtenção de provas.
VI - O art.º 38º da LAV não determina nem impõe qual o meio processual a utilizar para a produção de prova pelo que, intentada uma acção, não deixa se impor ao Tribunal estadual averiguar da adequação do meio processual que o requerente decidiu utilizar.
VII - Com o presente processo especial de apresentação de documentos apenas prevê o Legislador que se determine a apresentação de coisas ou documentos que o possuidor ou detentor não queira facultar ao requerente, que deve justificar a necessidade da diligência, não sendo este o meio processual adequado a solicitar a prestação de informações.
IX - De acordo com o artigo 30º, n.º 4 da LAV, os poderes conferidos ao Tribunal Arbitral compreendem o de determinar a admissibilidade, pertinência e valor de qualquer prova produzida ou a produzir pelo que não cumpre ao Tribunal Estadual sindicar a admissibilidade, necessidade, pertinência ou ajuizar do valor probatório das diligências de prova determinadas ou das provas obtidas ou a obter.
X - Mas diversamente relativamente aos requisitos - A existência do documento e Saber quem o tem - tem o Tribunal Estadual competência para proferir despacho a convidar a A. para, em aperfeiçoamento ao seu requerimento inicial, concretizar devidamente todos os documentos cuja apresentação requer, esclarecendo, designadamente, todas as dúvidas suscitadas pela requerida na sua contestação, nomeadamente, que o documento não existe – conf. art.º 431º do Código de Processo Civil; ou qualquer causa justificativa – conf. art.º 434º do mesmo diploma, nas quais se entende poder incluir-se a questão das cláusulas de confidencialidade invocadas pelo Recorrente.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os Juízes na 6ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa:

I. Relatório:
C… intentou processo especial de apresentação de coisas ou documentos contra B…  pedindo que:
1) A Requerida seja citada e intimada a apresentar neste Tribunal a Informação Devida, de uma forma completa, verdadeira, clara, organizada e objetiva, com exceção dos 6 Documentos, em data, dia e hora a ser designada pelo Tribunal.
2) Seja fixada uma sanção pecuniária compulsória a pagar pela Requerida, de valor não inferior a € 4.500,00 (quatro mil e quinhentos euros) por cada dia de atraso no cumprimento pontual e completo do requerido em 1), por cada elemento que fique em falta.
3) Remeter os resultados obtidos no presente processo para o Tribunal Arbitral.
Alegou, em resumo, que;
Em 5 de Dezembro de 2012, o Requerente e a Requerida celebraram um acordo denominado por «Protocolo de Repartição de Direitos e Obrigações», no qual, na cláusula 18.ª, o Requerente e a Requerida estipularam uma convenção de arbitragem, nos termos da qual eventuais litígios seriam definitivamente resolvidos de acordo com o Regulamento do Tribunal Arbitral do Centro de Arbitragem Comercial da Câmara de Comércio e Indústria (doravante designada por «Convenção de Arbitragem»).
Em 7 de janeiro de 2019, a Requerida apresentou um requerimento de arbitragem ao abrigo da Convenção de Arbitragem, dando origem ao processo n.º 1/2019/INS/ASB do Centro de Arbitragem Comercial da Câmara de Comércio Indústria
Em 5 de Abril de 2019, o Senhor Presidente do aludido Centro de Arbitragem Comercial proferiu o despacho de composição do Tribunal Arbitral e em 10 de Outubro de 2019, teve lugar a audiência prévia onde, entre outras matérias e com o acordo dos mandatários do Requerente e da Requerida, o Tribunal Arbitral determinou o seguinte:
«b) Findos os articulados, o tribunal proferirá despacho sobre a produção de prova requerida nos articulados».
Nos respetivos articulados, o Requerente e a Requerida requereram mutuamente a junção de elementos e documentos na posse da parte contrária.
Findos os articulados, em 13 de Julho de 2020, o Tribunal Arbitral proferiu o Despacho n.º 6 pelo qual, entre outras matérias, o Tribunal Arbitral  apreciou a pertinência dos requerimentos probatórios e ordenou à Requerida que juntasse os seguintes elementos e documentos (de ora em diante designada conjuntamente por «Informação Devida»):
1. Cópia dos mapas financeiros apresentados na Liga Portuguesa de Futebol Profissional respeitantes aos jogos em casa da Autora com o Benfica, Sporting e Porto nas épocas 2014/2015, 2015/2016, 2016/2017 e 2017/2018.
2. Informação sobre o montante de IVA liquidado sobre os convites respeitantes a todos os jogos referidos no número anterior.
3. Informação sobre os montantes recebidos ao abrigo do fundo/mecanismos de solidariedade da UEFA respeitantes às épocas 2016/2017 e 2017/2018, acompanhada da correspondente documentação de suporte;
4. Cópia de todos os contratos, qualquer que seja a sua natureza, que tenham sido celebrados com os atletas …, mesmo aqueles que já não estejam em vigor, nomeadamente por terem sido modificados ou revogados.
5. Cópia de todos os contratos, qualquer que seja a sua natureza, incluindo de transferência, agenciamento, comparticipação em negócio ou outro, que tenham sido celebrados com terceiros e que digam respeito aos atletas…, incluindo (mas sem limitar) os que digam respeito aos respetivos direitos de formação desportiva, direitos económicos, direitos de imagem, mesmo aqueles que já não estejam em vigor, nomeadamente por terem sido modificados ou revogados.
6. Cópia de todas as faturas, recibos ou quaisquer outros elementos contabilísticos integrados na contabilidade da Autora, emitidas pela Autora ou por terceiras entidades e que digam respeito às realidades referidas em 4. e 5., independentemente de existir contrato escrito.
7. Cópia de todos os contratos, de todas as faturas, de todos os recibos e referência de todas as datas de pagamento da correspondente contrapartida devida pela Autora, respeitante à utilização, pela Autora, do Complexo Desportivo .. (relvado principal e adjacentes, bem como zonas técnicas ou outras) e do Estádio … durante as épocas 2017/2018 e 2018/2019.
8. Informação sobre os montantes recebidos pela participação na Liga Europa na época 2015/2016, acompanhada da correspondente documentação de suporte.”
Na referida decisão contida no Despacho n.º 6, o Tribunal Arbitral considerou que os documentos e informações contidas na Informação Devida «são potencialmente relevantes para a decisão dos factos controvertidos que podem influenciar o desfecho da causa».
Notificada do Despacho n.º 6, a Requerida nada disse e nada juntou, pelo que, em 1 de Setembro de 2020, o Tribunal Arbitral proferiu o Despacho n.º 7, constatando isso mesmo e solicitando ao Requerente para requerer o que tivesse por conveniente.
Contudo, em 7 de Setembro de 2020, a Requerida requereu que lhe fosse concedida a possibilidade de juntar aos autos a Informação Devida até ao dia 16 de Setembro de 2020, pretensão à qual o Requerente não se opôs e que foi deferida pelo Tribunal Arbitral pelo seu Despacho n.º 8.
Em 16 de Setembro de 2020, a Requerida procedeu à junção de apenas 6 (seis) documentos (numerados como A90 a A96, de ora em diante, os «6 Documentos»), recusando-se a juntar os restantes elementos.
No seu requerimento, a aqui Requerida diz juntar um sétimo documento (a que atribuiu o número A97), mas não procedeu à sua efetiva junção e também não o fez posteriormente, quando processualmente foi indicada essa omissão.
Em 9 de Outubro de 2020, o Requerente requereu autorização ao Tribunal Arbitral para solicitar a intervenção do tribunal estadual (artigo 38.º n.º 1 da Lei da Arbitragem Voluntária) e, em 21 de Outubro de 2020, o Tribunal Arbitral proferiu o Despacho n.º 10, reconhecendo o direito do Requerente em solicitar a intervenção do tribunal estadual na medida do necessário à produção da prova documental determinada e não cumprida pela Requerida, concedendo a sua autorização para esse efeito.
Compete apenas ao Tribunal Arbitral (e não à Requerida ou a qualquer outra entidade) determinar a admissibilidade e a pertinência da prova a produzir (artigo 30.º n.º 4 da Lei da Arbitragem Voluntária e artigos 18.º n.º 1 e 31.º n.º 1 e n.º 3 alínea b) do Regulamento), o qual decidiu e ordenou legitimamente à Requerida a entrega da Informação Devida.
O Requerente tem um interesse legítimo na entrega da Informação Devida, o qual foi reconhecido pelo Tribunal Arbitral que também exigiu essa entrega, no uso das suas atribuições legais.
A Requerida, para além do dever de pontual entrega da Informação Devida, é responsável pelos danos causados pelo seu incumprimento (artigo 798.º do Código Civil), incluindo todos os custos e despesas decorrentes de procedimentos que não seriam iniciados se tivesse ocorrido uma situação de cumprimento.
Adicionalmente, a Requerida demonstra uma vincada resistência em cumprir a determinação que legitimamente lhe foi dirigida pelo Tribunal Arbitral, pelo que se justificam a imposição de medidas visando o constrangimento ao cumprimento célere da obrigação incumprida e a cessação deste comportamento que desprestigia a administração e a realização da justiça.
***
Citada, a Requerida contestou, referindo em primeiro lugar que:
- Um Tribunal Arbitral constituído sob a égide do Centro de Arbitragem da Câmara de Comércio de Lisboa decidiu, por unanimidade dos 3 árbitros, incluindo o árbitro nomeado pelo A., que a atuação do A. para com a R. constituiu justa causa de resolução do acordo parassocial celebrado em 2012 entre o A. e a sociedade que tem uma posição de domínio da R. desde esse mesmo ano.
- Levou já, também, a que os Juízos do Comércio de Lisboa considerassem legítima a recusa do Conselho de Administração da R. a prestar informação societária ao A. enquanto seu acionista, dizendo, por sentença transitada em julgado, o seguinte:
- Não subsistem dúvidas, por tal estar demonstrado à saciedade (e à sociedade), que os órgãos sociais do C… atuam de forma a causar prejuízo relevante à SAD, não obstante aquele ser desta acionista enquanto clube fundador e, como tal, detentor de capital social mínimo previsto na lei: 10%.
- Estão em causa, na presente ação, requerimentos probatórios produzidos pelo aqui A. numa arbitragem em curso que opõe as partes, os quais visam a apresentação dum conjunto de documentos impertinentes para a boa decisão da arbitragem, ou seja, com total irrelevância para o preenchimento dos factos constitutivos dos direitos alegados ou das exceções e que a aqui A. vislumbrou no meio de obtenção de prova da junção de documentos aos autos pela parte contrária a oportunidade de obter documentos que não têm rigorosamente nada a ver com o litígio, sendo o A. certamente movido por intenções como as que lhe foram travadas pelos Juízos do Comércio de Lisboa, justificaram a resolução do acordo parassocial e o motivaram a tentar burlar a aqui R.
- Salvo o devido respeito pelos Senhores Árbitros, por quem a aqui R. tem a maior consideração pessoal e profissional, foi com surpresa que a R. viu serem deferidos requerimentos de prova totalmente impertinentes para a boa decisão da causa, sob qualquer solução plausível da questão de direito, estando também em causa, em certos casos, documentos que se reportam a matérias para a qual o Tribunal Arbitral não tem competência.
- É patente, como se verá, que a maior parte dos requerimentos probatórios do A. que a R. não cumpriu não foram deduzidos para prova ou contraprova de factos relevantes para a resolução do litígio submetido ao Tribunal Arbitral.
- A única explicação razoável para a atuação do A. é a de que este os deduziu para produção de efeitos alheios ao litígio submetido a arbitragem, daí tendo resultado a convicção da R. – frustrada – de que esses requerimentos seriam indeferidos pelo Tribunal Arbitral e a sua surpresa por não o terem sido.
- Por outro lado, no seu despacho, o Tribunal Arbitral manteve a determinação de junção aos autos de documentos que não existem, e manteve a determinação de junção aos autos de documentos que a aqui R. já havia juntado à arbitragem.
Deduz de seguida a R. oposição ao deferimento do requerido, sendo em primeiro lugar que:
- A intervenção do Tribunal estadual prevista no art. 34º, n.º 1, da LAV deve ocorrer à luz do CPC, ou seja, o Tribunal deve apreciar os requerimentos probatórios do aqui A. à luz das regras de obtenção de prova do C.P.C., nomeadamente os artigos 429º; 430º; 431º; 417º, n.º 2.
- Que deste modo deve improceder o pedido de condenação em sanção pecuniária compulsória, um dos pedidos formulados pelo A., uma vez que a regulação do processo especial de apresentação de coisas ou documentos tem uma solução diferente para a recusa de colaboração, distinta da sanção pecuniária compulsória, que é a prevista no art. 1047º do CPC.
- Invoca a incompetência do tribunal arbitral para matérias que são objeto de parte dos documentos requeridos pelo A. e seus efeitos, uma vez que a convenção de arbitragem em que se baseou a constituição do Tribunal Arbitral consta do Protocolo celebrado, referindo-se exclusivamente a litígios emergentes desse Protocolo;  O objeto da arbitragem, para o que ora releva, é: Valor do saldo da conta corrente entre as partes instituída na cláusula 10ª, n.º 3, do Protocolo datado de 5 de Dezembro de 2012, à data da cessação da mesma;
- Embora esta descrição não indique a data da cessação da conta-corrente, tal data não é controvertida: quer o A., quer a R. concordam em que a conta-corrente terminou em 30 de Junho de 2018, por cessação do Protocolo por denúncia unilateral operada pelo aqui A.
- Os créditos reclamados na arbitragem pelo aqui A. são créditos que este integra na conta-corrente: v. secção X.III da sua contestação, pgs. 97 e sgs., e págs. 140 desse articulado, em que o aqui A. diz o seguinte:
1. Em XIII, cujos artigos se dão aqui por integralmente reproduzidos, o Réu identificou um conjunto de créditos de que é titular face à Autora ao abrigo da conta-corrente e que aí devem ser lançados em seu favor.
2. A Autora deve ser condenada no seu pagamento ao Réu.
- Assim, a competência do Tribunal Arbitral, quer por via de a convenção de arbitragem se reportar a litígios emergentes do Protocolo e este ter cessado em 30 de Junho de 2018 por denúncia unilateral do aqui A. efetuada em 5 de fevereiro de 2018, quer por via de o contrato de conta-corrente entre as partes ter também cessado em 30 de Junho de 2018, fechando definitivamente nesta data, está circunscrita aos créditos que, segundo o Protocolo, devam constar da conta-corrente fechada em 30 de Junho de 2018, não podendo assim, é claro, eventuais créditos posteriores integrar essa conta-corrente já fechada, e estando o seu conhecimento subtraído à competência do Tribunal Arbitral.
- O que fundamenta o indeferimento do pedido de junção de documentos relativo a pretensos créditos que se teriam constituídos após esta data – não tem a R. o dever de colaborar com actos para os quais o Tribunal Arbitral não tem competência, dado, nomeadamente, que esses requerimentos têm efeitos dilatórios.
Finalmente, a R. veio pronunciar-se sobre cada uma das alíneas mencionadas no pedido formulado, nomeadamente:
- Quanto ao requerido em 1) e 2); nada, na alegação pela aqui R. do direito que invoca e na defesa do aqui A. se reporta ao IVA, seja dos convites, seja do que for; a matéria em questão nos articulados da arbitragem reporta-se a um único jogo, ao passo que este requerimento probatório do aqui A. se reporta a esse jogo, mas também a um conjunto de outros jogos (onze! 11) totalmente alheios à arbitragem e às posições das partes na arbitragem.
- Assim, com exceção do mapa financeiro desse jogo, o requerido pelo R. é absolutamente impertinente para a prova de qualquer facto relevante para a arbitragem.
- Acresce que, mesmo que pudesse ser ordenado à R. que prestasse informações (e manifestamente não o pode ser, pelas razões que a R. acabou de apresentar), essa informação é absolutamente irrelevante para a decisão da arbitragem, sendo certamente um caso em que o A. pretende fazer um uso anormal da arbitragem, tendo qualquer tipo de intenção oculta, inconfessável ou até criminosa para apresentar esse requerimento.
- Quanto ao requerido em (3): Informação sobre os montantes recebidos ao abrigo do fundo/mecanismos de solidariedade da UEFA respeitantes às épocas 2016/2017 e 2017/2018, acompanhada da correspondente documentação de suporte;
- Na arbitragem, a R. alegou os valores que recebeu a este título e juntou os respetivos documentos no dia 16 de Setembro de 2020;
- Reproduz-se aqui a parte relevante do requerimento da aqui R. (na arbitragem, A.): Os procedimentos em que intervêm os clubes que recebem esta compensação são apenas o crédito do valor dessa compensação por transferência efetuada pela LPFP para a conta bancária do clube com. Nada mais.
No que respeita aos procedimentos em que a A. não tem intervenção, a A. sabe, basicamente, aquilo que os jornais publicam sobre o tema. Ou seja, desde há alguns anos, em cada época, a UEFA entrega a cada Liga de Clubes ou Federação nacional uma certa verba para que esta a distribua pelos clubes que não participaram nas competições organizadas pela UEFA. A UEFA torna públicos esses valores.
- A nível nacional, a Liga ou Federação define os critérios de repartição dessa verba, e transfere para cada clube, segundo esses critérios, uma determinada quantia.
- No caso de Portugal, a Liga ou a FPF tornam públicos os valores que são entregues a cada clube, e esses valores são publicados na imprensa desportiva, clube a clube.
- Os clubes recebem esse valor por transferência bancária efetuada pela Liga.
- A A. junta como doc. A90 o documento bancário relativo ao valor que recebeu em Outubro de 2017, no valor que indicou ao processo em anterior requerimento, mantendo a posição de que o R. não tem qualquer direito a haver este valor ou parte dele.
- A A. junta como doc. A91 o documento bancário relativo ao valor que recebeu em Novembro de 2018, no valor que indicou ao processo em anterior requerimento. A A. mantém a posição de que o R. não tem qualquer direito a haver este valor, além de que, sendo este recebimento posterior a 30 de Junho de 2018, não integra a conta-corrente (que encerrou em 30 deJjunho de 2018, por ato unilateral do R.), estando assim subtraído à competência do Tribunal Arbitral.
- Não existe qualquer outro ato que a R. possa fazer para cumprir o requerimento probatório do A. a este respeito: ao contrário do que diz o A., a R. cumpriu o determinado pelo Tribunal Arbitral, a que se não opôs, mediante a junção à arbitragem de todos os documentos relacionados com esses recebimentos, sendo certo que está em causa informação do domínio público, pois, como se evidenciou, a FPF informa a imprensa dos valores que atribui a cada clube.
- Quanto ao requerido em 4): Cópia de todos os contratos, qualquer que seja a sua natureza, que tenham sido celebrados com os atletas … mesmo aqueles que já não estejam em vigor, nomeadamente por terem sido modificados ou revogados; o A. fundamenta a relevância destes documentos para “apuramento de 15% da mais valia realizada ou a realizar pela Autora [aqui R.] pela transferência dos jogadores em causa”.
- O A. reporta-se assim a uma figura criada no Protocolo celebrado entre as partes em 5 de Dezembro de 2012, sem correspondência na regulamentação do futebol (contrariamente ao que acontece com as figuras dos direitos de formação e do mecanismo de solidariedade, que estão previstas e reguladas na regulamentação do futebol), concretamente na sua cláusula 7ª, n.º 3, cláusula essa que tem o seguinte teor:
“SÉTIMA
(Formação de futebol)
1. As receitas da compensação por formação e do mecanismo de solidariedade, nos termos dos regulamentos aplicáveis, serão auferidas pelo CFB e pela SAD em função de, em cada época relevante, a formação do jogador ter sido ministrada pelo CFB ou pela SAD. Em qualquer caso, o pagamento será reclamado ao terceiro pela SAD, devendo esta pagar ao CFB a receita correspondente ao prazo de 5 (cinco) dias após o recebimento da respetiva compensação.
2. A SAD terá direito de preferência na aquisição de jogadores vindos do futebol de formação do CFB caso o CFB tenha alguma proposta de venda.
3.Sempre que a SAD ceda, a título oneroso, os direitos federativos de registo e inscrição de um jogador formado pelo CFB, ou os seus correspondentes direitos económicos, ou parte destes, o CFB terá direito ao valor que corresponda a 15% (quinze por cento) da mais-valia líquida registada pela SAD, relevando para efeitos de apuramento dessa mais-valia líquida, entre outros, os montantes pagos a clubes ou sociedades terceiros a título de compensação pela formação ou mecanismo de solidariedade.
4. Ainda que o jogador frequente uma equipa de formação do CFB, a SAD tem direito a celebrar com ele um contrato de formação ou de trabalho desportivo, arcando a SAD com todos os custos emergentes desse contrato, e considerando-se nesse caso, nomeadamente para efeitos do n.º 1 e n.º 3 deste artigo, que as receitas da compensação por formação e do mecanismo de solidariedade relativamente ao período do contrato serão da SAD.”
- O sentido da cláusula 7ª, n.º 3, do Protocolo foi determinado numa outra arbitragem entre as partes, com força de caso julgado material, da qual resulta que é falsa, e constitui até litigância de má fé, a pretensão do A. de reclamar 15% da mais valia, pois, tal como foi decidido nessa outra arbitragem, o direito do CFB é proporcional ao tempo de formação do jogador no próprio CFB, não sendo assim de 15% para todos os jogadores. Na realidade, nunca aconteceu o A. ter direito a 15%, em virtude de todos os jogadores a que se aplicou esta cláusula não terem tido o seu tempo de formação integral no A.
- Por outro lado, o Tribunal Arbitral constituído para dirimir o litígio do qual resultou a presente ação considerou, por manifesto lapso, que o sentido dessa cláusula foi determinado numa arbitragem que não decorreu entre as partes, pelo que não produz efeitos de caso julgado entre as partes – como se disse, este juízo decorre dum manifesto lapso, pois a arbitragem que determinou o sentido desta provisão contratual correu termos, efetivamente, entre os aqui A. e R., e mais ninguém.
- Resulta desta cláusula do Protocolo que o A. terá direito a haver uma parte da mais valia realizada pela R. com a transferência de jogadores da R. para outros clubes, desde que esses jogadores tenham tido formação no A.. Para este efeito somente releva:
- Que o jogador em questão tenha tido formação como jogador no A.;
- Que tenha sido contratado pela R.;
- Que a R. tenha transferido onerosamente o jogador para um terceiro clube;
- O preço da transferência que a R. tenha recebido desse terceiro clube;
- Para o cálculo da mais-valia, e apenas para efeitos de redução do valor a que o R. teria direito segundo o Protocolo, são deduzidos certos encargos suportados pela R., entre outros, os montantes pagos a clubes ou sociedades terceiros a título de compensação pela formação ou mecanismo de solidariedade.
- Interessa ter presente que, no futebol, existe a figura do passaporte desportivo, isto é, o “documento emitido pela FPF ou por federação congénere contendo todos os elementos relevantes relativos ao jogador e com indicação de todos os clubes e períodos pelos quais o jogador foi registado, pelo menos desde os 12 anos” (v. art. … do mencionado Regulamento da FPF. Com a sua resposta à réplica, ou tréplica, na arbitragem, o aqui A. juntou os passaportes desportivos dos jogadores em causa nos seus requerimentos probatórios, e esses documentos serão juntos adiante nesta contestação.
- Sucede que, no futebol, nem o contrato de transferência é necessário para essa prova.
- Como o contrato de transferência tem de ser registado nas instituições do futebol (em Portugal, na FPF), estas instituições informam os clubes formadores sobre se houve ou não houve transferência e o respetivo preço, para que estes possam reclamar o mecanismo de solidariedade.
- Um espelho disto revela-se na própria contestação que o aqui A. apresentou na arbitragem, em que a A. reclama, sem fundamento, 15% do preço das transferências, que a R. refere na contestação.
- Assim, não sendo parte nos contratos de transferência celebrados entre a R. e o V… e o F…, nem por isso o A. desconhece os preços das transferências. O A. não necessitou dos contratos de transferência para conhecer o valor base para cálculo da usa percentagem da mais valia, indicando valores líquidos, porque, naturalmente, disso foi informado pela FPF.
- Por outro lado, interessa também ter presente que essa cláusula deixou de produzir efeitos em 30 de Junho de 2018 por um ato unilateral imputável do A., que foi a denúncia unilateral do Protocolo.
- O requerimento probatório do A. inclui jogadores que nunca foram transferidos pela R. para clubes terceiros e jogadores que a R. transferiu para um clube terceiro após 30 de Junho de 2018.
- Mas mais: o requerimento probatório do A. inclui jogadores que a R. só contratou posteriormente a 30 de Junho de 2018, quando a referida cláusula 7ª do Protocolo nem sequer estava em vigor porque o A. lhe pôs fim pelo seu ato voluntário de denunciar o Protocolo.
- Só se consegue qualificar como litigância de má fé que o A. invoque direitos:
- Ao abrigo do Protocolo;
- Por situações constituídas após o termo do Protocolo;
- Termo do Protocolo que ocorreu por ato unilateral voluntário do A.
- Ou seja, o A. atua na arbitragem, e agora no tribunal estadual, como se, para o que lhe interessa, o Protocolo tivesse terminado em 30 de Junho de 2018; e em simultâneo, para o que lhe interessa, nomeadamente para receber dinheiro da R., como se o Protocolo não tivesse terminado em 30 de Junho de 2018.
- Ora, é inconcebível que se exija à R. que colabore com a violação da boa fé; que colabore com a litigância de má fé.
- Existe, pois, motivo mais do que fundado para a R. se recusar a juntar documentos quando o pedido de junção se funda a violação da boa fé e na litigância de má fé.
- Acresce que o A. requer todos os contratos, qualquer que seja a sua natureza… Ora, já se viu que só o passaporte desportivo e o contrato de transferência têm relevância para o apuramento do pretenso direito do A., e este é suprido por informação da FPF.
- A R. celebrou contratos de trabalho desportivo com cada um desses jogadores. Sucede que esses contratos são irrelevantes para o apuramento do pretenso direito do A.; todos esses contratos têm ima cláusula de confidencialidade; revelam dados pessoais sobre terceiros, nomeadamente a remuneração dos jogadores; e constituem segredo de negócio: na sua ânsia de conhecer esses contratos, o A. não mais pretende do que conhecer essa informação para fazer dela mau uso contra a R., nomeadamente informar os concorrentes da R. sobre os salários dos jogadores da R.
- Pelo conjunto de razões anteriormente apresentadas, não pode esse requerimento deixar de ser indeferido no que se respeita a “outros contratos”, nomeadamente ao abrigo do disposto do art. 417º, n.º 3, do CPC, o que a R. invoca – avultando a irrelevância desses contratos para a prova do pretenso direito do A., que deve arrumar definitivamente esta questão.
- Como se viu, para apuramento dos direitos do A. apenas releva o passaporte desportivo e o eventual contrato de transferência celebrado entre a R. e o clube terceiro, quando existe – e quando tenha sido celebrado até 30 de Junho de 2018, pois caso contrário não é matéria da competência do Tribunal Arbitral (além de não assegurar qualquer direito ao A., que pôs fim ao Protocolo com produção de efeitos em 30 de Junho de 2018, e os 15% que reclama têm fonte exclusiva nesse protocolo).
- Mesmo nos casos (raros, como se verá) em que o A. reclama fundadamente a mais-valia, as quantias que podem ser deduzidas a essa mais valia, que são os encargos da R., constituem matéria de exceção, são factos que à R. interessa alegar e provar, para reduzir o valor do crédito do A.
- Quando o A. requer a junção desses documentos (por exemplo, os contratos de agenciamento), é claro que a intenção do A. não é reduzir o valor do seu crédito, apesar de o efeito eventual desses contratos ser a redução do pretenso crédito do A.
- Ou seja, quando requer a junção desses documentos, na arbitragem e agora perante o Tribunal estadual, o A. não está a batalhar para reduzir o valor dos seus créditos, que é o único efeito que esses documentos podem ter; o A. está, é claro, a tentar obter documentos para fins alheios à arbitragem, eventualmente fins criminosos.
- Eventualmente também, para os dar a conhecer a concorrentes da R., quebrando a sua confidencialidade.
Após, a R. impugna o que foi peticionado pela aqui A. em sede de processo arbitral, com base na análise que faz dos passaportes desportivos dos jogadores e em documentos sobre os jogadores retirados da plataforma score, que naquele processo juntou e vem referir que dos jogadores referidos pelo A., continuam ao serviço da R., até à presente data, os jogadores…, pelo que estes jogadores nunca foram transferidos pela R. para um terceiro clube, e assim, não existe qualquer contrato de transferência, e não se pode juntar aos autos aquilo que não existe.
Mais refere que após 30 de Junho de 2018, a R. transferiu o jogador … para o CS… e … para o Ch…, pelo que são em tudo alheios à arbitragem.
- Já no que respeita aos jogadores …, tendo de facto havido transferência desses jogadores pela R. para um clube terceiro na vigência do Protocolo, certo é que o A., na contestação que apresentou na arbitragem, conhecia todos os factos relevantes para o apuramento do seu crédito, máxime o preço da transferência, pelo que de nenhuma prova carece.
- Quanto ao requerido em (5): Cópia de todos os contratos, qualquer que seja a sua natureza, incluindo de transferência, agenciamento, comparticipação em negócio ou outro, que tenham sido celebrados com terceiros e que digam respeito aos atletas…, incluindo (mas sem limitar) os que digam respeito aos respetivos direitos de formação desportiva, direitos económicos, direitos de imagem, mesmo aqueles que já não estejam em vigor, nomeadamente por terem sido modificados ou revogados:
- Considera-se aqui reproduzido tudo o que se alegou na secção anterior a respeito destes jogadores em matéria do tempo em que estiverem registados pelo A, pela R. e, quando é o caso, por clube terceiro: na sua tréplica, ou resposta à réplica, da arbitragem o A. desistiu de reclamar os direitos de formação, mantendo apenas o mecanismo de solidariedade e assim, actualmente só é objeto, nessa arbitragem, o mecanismo de solidariedade.
- Para o apuramento deste mecanismo de solidariedade releva tão-somente o seguinte:
- Se um jogador profissional for transferido para outro clube antes do termo do seu contrato de trabalho desportivo com um clube;
- Os clubes que tenham contribuído para a sua formação têm direito a receber uma percentagem correspondente a 5% do valor da transferência.
- A este valor deduz-se o mecanismo de solidariedade pago ao seu anterior clube.
- É absolutamente irrelevante:
- Se existiu ou não existiu algum intermediário envolvido na transferência;
- O salário do jogador, seja no clube de origem, seja no clube de destino.
- Assim, a prova dos factos constitutivos do clube que reclama a solidariedade faz-se através de:
- Passaporte desportivo do jogador, no qual estão registados os clubes pelos quais o jogador esteve inscrito e as datas dessas inscrições;
- O contrato de transferência.
- Sucede que, no futebol, nem o contrato de transferência é necessário para essa prova; como o contrato de transferência tem de ser registado nas instituições do futebol (em Portugal, na FPF), estas instituições informam os clubes formadores sobre se houve ou não houve transferência e o respetivo preço, para que estes possam reclamar o mecanismo de solidariedade.
- Bastou ao A. conhecer o preço da transferência para conhecer os seus pretensos direitos, que logo quantificou.
- Assim, são totalmente irrelevantes para a apreciação do mecanismo de solidariedade a existência ou inexistência de contratos de agenciamento (eventuais custos com agenciamento não relevam para o mecanismo de solidariedade), a existência ou inexistência de “contratos de direitos de formação” (que a R. desconhece o que seja, sendo certo, como se viu, que os direitos de formação não relevam opara o cálculo da solidariedade), ou os contratos de trabalho com o jogador.
- Sucede que quem é responsável pelo pagamento do mecanismo de solidariedade é o clube de destino do jogador, não o clube de origem; ou seja, no caso de a R. transferir o jogador para qualquer clube terceiro, e o A. tiver mecanismo de solidariedade a haver por ter participado na formação do jogador, o A. só a esse clube terceiro, e não à R., o pode reclamar.
- Ora, como resulta da sua alegação, o A. está a reportar-se a um conjunto de jogadores contratados pela R., invocando pretensos direitos a título de mecanismo de solidariedade por transferências efetuadas ou até a efetuar no futuro(!) pela R., quando bem sabe que nada pode exigir à R., mas sim, apenas, aos eventuais clubes terceiros para os quais o jogador seja transferido.
- O passaporte desportivo prova que o jogador esteve registado pelo A., esteve registado pela R. e está registado por um terceiro – e só com o preenchimento destes 3 requisitos o A. tem direito a reclamar à R. o mecanismo de solidariedade.
- O passaporte desportivo do jogador prova também a fração dos 5% de mecanismo de solidariedade a que o A. tem direito (em competição com os demais clubes pelos quais o jogador esteve registado até aos 23 anos de idade).
- Feita esta prova pelo passaporte desportivo, um único aspeto fica a faltar: o conhecimento do preço da transferência, para cálculo do valor concreto a que o A. tem direito – desde que, é claro, tenha havido um preço para a transferência, dado que no futebol há muitas transferências “a custo zero”, ou seja, sem o pagamento dum preço pelo clube de destino ao clube de origem; e também acontece o jogador terminar o seu contrato com um clube (no caso, a R.) e ser registado por outro clube sem haver transferência dum clube para outro, nomeadamente em caso de caducidade ou revogação do seu contrato de trabalho com a R.
- Não existem contratos “que digam respeito aos respetivos direitos de formação desportiva” (a R. não sabe o que possam ser esses contratos, sendo certo que nunca celebrou qualquer contrato relativo aos direitos de formação),
- A R. esclareceu o Tribunal Arbitral que já não são admitidos, e não existem no caso, desde 2015, contratos relativos a direitos económicos;
- A R. nunca celebrou contratos isolados de direitos de imagem com quaisquer jogadores, a não ser a inclusão em cada contrato de trabalho desportivo de uma cláusula sobre os direitos de imagem, como é padrão da indústria;
- Não obstante, o Tribunal Arbitral sufragou esta atuação do A., e determinou a junção ao processo pela R. de documentos que a R. informou não existirem (alguns deles) e, sobretudo, de um conjunto de documentos que não têm rigorosamente qualquer relação com o pretenso direito do A.
- Salvo o devido respeito, entende-se que o Tribunal estadual não deve alinhar com o uso anormal do processo almejado pelo A., devendo indeferir este pedido do A.
- Quanto ao requerido em (6): Cópia de todas as faturas, recibos ou quaisquer outros elementos contabilísticos integrados na contabilidade da Autora, emitidas pela Autora ou por terceiras entidades e que digam respeito às realidades referidas em 4. e 5., independentemente de existir contrato escrito:
- Do exposto nos pontos anteriores resulta a total irrelevância destes documentos. Não existem sobre esta matéria “contratos não escritos”, não há contratos de transferência não escritos
- Quanto ao requerido em 7): cópia de todos os contratos, de todas as faturas, de todos os recibos e referência de todas as datas de pagamento da correspondente contrapartida devida pela autora, respeitante à utilização, pela autora, do complexo desportivo do J…(relvado principal e adjacentes, bem como zonas técnicas ou outras) e do estádio do … durante as épocas 2017/2018 e 2018/2019:
- Na p.i., a aqui R. alegou que os preços determinados pela Direção do R. para a utilização do Estádio do Restelo eram inconcebíveis, como resulta de simples comparação com os preços praticados no Estádio …. As equipas da A. treinam atualmente no Estádio ….
A equipa profissional da A. também disputa competições oficiais, na condição de visitada, no Estádio …
- A aqui R. juntou documentação relativa a Despachos e relativa a custos com treinos e jogos
- A R. alegou os preços que pagou pela utilização do Estádio … e juntou ao processo o regulamento publicado em Diário da República que fixa os preços de utilização desse Estádio e diversas faturas, incluindo relativas aos jogos com o … e …, que são as de maior utilização do Estádio… (o que é um facto notório para qualquer adepto de futebol em Portugal).
- Em sua defesa, o A. censurou a R. por esta querer comparar o preço da utilização do Estádio …com o preço que propôs para o Estádio…, dizendo que a R. “pretende comparar o incomparável: os preços decorrentes da utilização de um estádio completo (o Estádio …) com os preços de um estádio que cobra ad-hoc em função dos sectores que a Autora solicita que sejam abertos (o Estádio …)”.
- Ainda assim, o A. quer que a R. junte à arbitragem todas as faturas relativas à utilização pela R. do Estádio ….
- Afigura-se a impertinência deste requerimento probatório, além da sua incompatibilidade com a própria defesa do A.
- No que respeita o Estádio …, nada foi alegado, por qualquer das partes, a seu respeito, como se viu pela transcrição dos articulados. Acresce que a R. não celebrou qualquer contrato escrito relativo à utilização do Estádio …nos dois jogos que nele realizou.
- Acresce que a A. não celebrou quaisquer contratos relativos à utilização do Estádio … (que, a existirem, seriam contratos públicos, mas não existem).
- O requerimento probatório do A. inclui “todos os recibos e referência de todas as datas de pagamento da correspondente contrapartida devida pela Autora”. Além de o Centro Desportivo … não emitir recibos (na prática comercial atual é rara a emissão de recibos, pois os pagamentos são feitos por meios eletrónicos de fácil prova), a referência às datas de pagamento é acintosa, não visando a prova de qualquer facto relevante para a arbitragem. Com a sua formulação, o A. acalentou a esperança de poder vir a dizer publicamente que a R. atrasa o pagamento das faturas do Estádio ….
- Salvo o devido respeito, não compreende a R. como pôde o Tribunal Arbitral deferir esta parte do requerimento do A., que apenas visa a chacota, ofender a dignidade da R. e tratá-la acintosamente na imprensa e nas redes sociais, sem qualquer pertinência para a arbitragem.
- Assim, considera-se que existe fundamento para o Tribunal não deferir este requerimento in totum.
- Quanto ao requerido em (8): Informação sobre os montantes recebidos pela participação na liga europa na época 2015/2016, acompanhada da correspondente documentação de suporte:
- Em cada ano, a UEFA divulga publicamente os prémios de participação na Champions League e na Liga Europa, em cada fase destas provas, e o valor de cada vitória e de cada empate. A imprensa publica esses valores. Esses valores são publicados na imprensa desportiva e, nas televisões, quem assiste aos jogos ouve, por exemplo, que o Benfica perdeu X milhões por não ter acedido à fase de grupos da Champions, mais Y que receberia por cada empate e Z que receberia por cada vitória. E que vai receber X por participar na fase de grupos da Liga Europa, etc. Pela sua participação na Liga Europa, a A. recebeu cerca de 3,5 milhões de euros. É claro, teve despesas com deslocações e estadas, prémios aos jogadores e treinadores, despesas com organização de jogos e as obras que realizou no Estádio do R., que alegou na p.i., entre outras. Sendo esses valores públicos, e não conseguindo descortinar qualquer sombra de relevância para qualquer facto relevante para a apreciação dos pedidos formulados, a A. considera que o pedido de junção de documentos pelo R. configura uma tentativa de uso anormal da arbitragem, pelo que não juntará qualquer documento.
- Veja-se: com os documentos que requereu, o A. pretendia provar a sua alegação de que a R. recebia mais de três milhões de euros pela sua participação na Liga Europa. A R. admitiu que recebeu mais do que isso. Assim, este facto ficou demonstrado (até por excesso, na perspetiva do A.). Não existe qualquer fundamento, pois, que justifique a sua junção pela R.
*
Por Despacho de 17/12/2020 ordenou-se a notificação das partes para se pronunciarem sobre a eventual incompetência absoluta do Tribunal, por infração das regras da competência em razão da matéria ex vi artigo 95.º, 96.º e 97.º do CPC.
*
A A. C…, veio pronunciar-se entendendo dever improceder a excepção deduzida.
*
A R. não se pronunciou.
***
A 10/5/2021 foi proferido despacho nos autos a julgar a excepção suscitada improcedente, entendendo não dispor o Tribunal de competência para apreciar da eventual incompetência do Tribunal Arbitral, não sendo este sequer o meio processual próprio para invocar tal excepção, razão pela qual não poderá o Tribunal apreciar ou pronunciar-se sobre tal questão.
No mais, proferiu-se a seguinte decisão:
II – Da alegada impertinência dos documentos
Veio ainda a requerida alegar na contestação apresentada a impertinência de parte dos documentos cuja apresentação é aqui requerida para o objeto do processo que corre termos no Tribunal Arbitral.
Conforme se alcança da alegação da requerente, em 13 de julho de 2020, o Tribunal Arbitral proferiu o Despacho n.º 6, no âmbito do processo n.º 1/2019/INS/ASB do Centro de Arbitragem Comercial da Câmara de Comércio Indústria, no qual apreciou a pertinência dos requerimentos probatórios e ordenou à Requerida que juntasse os documentos aqui em causa.
Consagra expressamente o artigo 30.º, n.º 4 da LAV que compete ao Tribunal Arbitral apreciar a pertinência da prova a produzir.
Assim sendo, considerando que o Tribunal Arbitral já se pronunciou sobre a pertinência da junção ao processo arbitral dos documentos aqui em causa, não assiste a este tribunal competência para sindicar ou pôr em causa tal decisão, razão pela qual não poderá este tribunal apreciar ou pronunciar-se sobre tal questão.
Nesta conformidade, julgo improcedente nesta parte a contestação apresentada e, consequentemente, indefiro, por desnecessária, a inquirição das testemunhas arroladas.
III – Da apresentação dos documentos
Mostrando-se preenchidos os requisitos previstos no artigo 38.º da LAV, ao abrigo de tal preceito e ao abrigo do disposto nos artigos 1045.º e 1046.º, impõe-se determinar a apresentação dos documentos.
Sucede que a requerida também suscitou dúvidas quanto à identificação dos documentos cuja apresentação é requerida.
Assim sendo, determino que antes de mais, se notifique a requerente para, em aperfeiçoamento ao seu requerimento inicial, concretizar devidamente todos os documentos cuja apresentação requer, esclarecendo, designadamente, todas as dúvidas suscitadas pela requerida na sua contestação.”
*
Não se conformando com a decisão proferida, B…, R. nos autos, veio dela interpor recurso, formulando as seguintes Conclusões:
“1º. A presente ação foi proposta na sequência de uma decisão do Tribunal Arbitral constituído para dirimir um litígio entre as partes que determinou que a Apelante deveria juntar aos autos centenas de documentos e “prestar informações”;
2º. A intervenção do Tribunal estadual prevista no art. 34º, n.º 1, da LAV deve ocorrer à luz das regras de processo aplicáveis ao processo civil, ou seja, o Tribunal deve apreciar os requerimentos probatórios do Apelado à luz das regras de obtenção de prova do CPC;
3º. Nenhuma norma, nenhum princípio existentes ou concebíveis atribuem ou atribuiriam mais poderes aos tribunais estaduais para obterem provas para uma ação pendente num tribunal arbitral do que os poderes de que dispõem para obterem provas para uma ação pendente nos próprios tribunais estaduais;
4º. A intervenção do Tribunal estadual na presente forma especial de processo deve ocorrer nos exatos termos em que ocorreria se estivesse em causa a produção de prova numa ação que corresse no próprio Tribunal estadual;
5º. Ora, in casu, pretende-se que os Tribunais Estaduais obtenham provas por meios não admitidos pela lei de processo civil;
6º. Os Tribunais Estaduais não podem auxiliar os Tribunais Arbitrais a obter documentos que a parte que é notificada para apresentar diz não existirem, quando não existe alguma comprovação da sua existência;
7º. Está pedida a junção de documentos que a parte diz não existirem e nunca terem existido, sem que o Tribunal Arbitral tenha justificado a razão pela qual não aceita, a declaração de inexistência do documento;
8º. Aliás, em rigor, o Tribunal Arbitral permaneceu em silêncio a respeito da declaração da Apelante de inexistência de um conjunto de documentos, pelo que, em rigor, nem mesmo se pode afirmar que a Apelante está notificada para os juntar;
9º. Não é da competência dos Tribunais Judiciais determinar que provas serão produzidas numa arbitragem; assim, não tendo o Tribunal Arbitral precisado os documentos que pretendia obter, quais as provas que pretendia que fossem produzidas, não podem os Tribunais Estaduais, no auxílio que prestam ao Tribunal Arbitral no âmbito do art. 38º da LAV, suprir, complementar, suplementar, concretizar ou determinar a decisão do Tribunal Arbitral;
10º. O Tribunal a quo decidiu que as determinações do Tribunal Arbitral sobre as provas a produzir nos Tribunais estaduais careciam de esclarecimento pelo Autor Apelado, o que evidencia que o Tribunal Arbitral não proferiu uma decisão que tenha determinado ou concretizado os meios de prova a obter pelos tribunais estaduais, tendo sido deixada para os tribunais judiciais essa determinação, em violação da autonomia e competência do Tribunal Arbitral;
11º. A ordenar a produção das provas, os Tribunais Judiciais estarão, não a auxiliar o Tribunal Arbitral, não a obter provas em conformidade com a decisão do Tribunal Arbitral, mas sim a obter as provas tal como foram definidas por uma das partes, em sede de “esclarecimento de dúvidas” sobre a decisão do Tribunal Arbitral, o que constitui manifesta violação do disposto no art. 38º da LAV;
12º. Em tema de prova documental, se o Tribunal Arbitral não definiu com precisão os documentos a serem apresentados, essa determinação não cabe aos Tribunais Judiciais, que se estariam a imiscuir nas competências e na autonomia do Tribunal Arbitral;
13º. A Apelante sustentou no processo arbitral a incompetência do Tribunal Arbitral para apreciar uma parte do objeto da ação. A convenção de arbitragem ao abrigo do qual o Tribunal Arbitral se constituiu está incluída no Protocolo celebrado entre as partes em dezembro de 2012, que findou por denúncia unilateral do Apelado, com produção de efeitos em 30 de junho de 2018. Está a ser pedido aos Tribunais Estaduais que obtenha documentos posteriores a essa data e que se referem a relações jurídicas exclusivamente constituídas após 30 de junho de 2018;
14º. Ora, quando a parte notificada para apresentar documentos sustente a incompetência do Tribunal Arbitral para certas matérias, não lhe pode ser exigido, pelos Tribunais Judiciais, que apresente esses documentos, sem prejuízo de se sujeitar aos efeitos que decorram da não apresentação desses documentos, em caso de o Tribunal Arbitral vir, a final, a ser declarado competente;
15º. Tomando a parte a posição de que o Tribunal Arbitral é incompetente para certos objetos, pode legitimamente recusar a junção de documentos, sujeitando-se aos efeitos de os não juntar se vier a ser decidido, a final, que o Tribunal Arbitral tem competência;
16º. Diversas das determinações do Tribunal Arbitral, concretamente as 2, 3, 8 e parte da 7, têm por objeto “informação”, ou prestação de informação”, nomeadamente a seguinte:
Informação sobre o montante de IVA liquidado sobre os convites respeitantes a todos os jogos referidos no número anterior.
17º. Se o Tribunal Arbitral não indicou quem seriam as testemunhas, nem quais seriam os documentos, nem quais as partes a serem ouvidas para se obterem as informações, não podem os Tribunais Judiciais, imiscuindo-se na competência instrutória do Tribunal Arbitral, decidir que a informação será prestada deste ou daquele modo, por este ou aquele meio de prova, como testemunhas, quais são os “documentos de suporte” das informações, ou qualquer outro meio de prova;
18º. Acresce que a forma de processo da presente ação se destina à apresentação de coisas ou documentos; não contempla a obtenção de informações; esta forma de processo não é adequada à obtenção de informações;
19º. Assim, em conclusão, deve decidir-se que os Tribunais Judiciais não podem ordenar à Apelante que preste informações, nem como as deve prestar, absolvendo-se a Apelante da instância relativamente aos pontos 2, 3, 8 e parte do ponto 7 das determinações do Tribunal Arbitral sobre as provas a obter;
20º. Quando cumpriu parcialmente as determinações do Tribunal Arbitral, a Apelante juntou alguns documentos e disse que um conjunto de documentos não existia;
21º. Não obstante, o Tribunal Arbitral não tomou posição sobre esta afirmação da Apelante, mantendo as suas determinações de prova sem justificar se considerava ou não cumpridas essas determinações, porque razão considerava ou não considerava cumprida a sua decisão anterior, sem especificar o que estava em falta e sem quaisquer razões ou considerações sobre a existência dos documentos que estariam em falta;
22º. Ora, perante uma declaração da Apelante de que certos documentos não existiam, caso a ação corresse termos nos Tribunais Judiciais, a esta declaração da Apelante seguir-se-ia o procedimento previsto no art.º 431º, n.º 1, do CPC, ou seja, se o notificado declarar que não possui o documento, o requerente é admitido a provar, por qualquer meio, que a declaração não corresponde à verdade;
23º. Mas na arbitragem nada disto aconteceu; como decorre do despacho do Tribunal Arbitral, este autorizou o recurso aos Tribunais Judiciais como se a Apelante nada tivesse dito ou juntado, e mais: sem que o Tribunal Arbitral especificasse os documentos que faltaria juntar e nada dizendo sobre se esses documentos existem ou não existem, se há ou não há indícios da sua existência;
24º. Os Tribunais Judiciais não podem, em auxílio do Tribunal Arbitral, obter provas em termos que não seriam aqueles em que as pode obter nos processos civis;
25º. Se o Tribunal Judicial desse execução a esta ordem do Tribunal Arbitral, além de estar a praticar um ato que não poderia praticar segundo as regras de processo civil a respeito dos documentos inexistentes, estaria a ordenar a junção de documentos que a Apelante já apresentou ao Tribunal Arbitral, e sem conhecimento de qualquer fundamento para o juízo de que o Tribunal Arbitral carece de documentos, e quais são esses documentos;
26º. Não deve um Tribunal Judicial ordenar a uma parte, usando o seu ius imperii, a apresentação de documentos que essa parte disse não existirem e sobre cuja existência não se produziu qualquer prova; e tanto imprópria é que, como se viu, a lei de processo civil tem uma solução totalmente diversa para o caso de o notificado declarar que o documento não existe;
27º. Assim, não deve ser ordenada à Apelante a junção de documentos que esta disse não existirem, e que o Tribunal não apresentou razões para existirem, absolvendo-se a Apelante dos pedidos que se referem à apresentação destes documentos;
Termos em que julgando procedente a presente apelação, com os efeitos legais, se fará a costumada Justiça!”
*
Contra-alegou o C…, Requerente nos presentes autos concluindo como se segue:
“1. A decisão do Tribunal Arbitral que ordena à Requerida a prestação da Informação Devida (conforme circunscrita no requerimento inicial) é lícita, é competente e é eficaz (artigo 30.º n.º 4 da Lei da Arbitragem Voluntária artigos 18.º n.º 1 e 31.º n.º 1 e n.º 3 alínea b) do Regulamento de Arbitragem).
2. O que foi ordenado pelo Tribunal Arbitral é claro, preciso e não é ambíguo e a Informação Devida foi devidamente circunscrita pelo Tribunal Arbitral «a fim de evitar ambiguidades quanto ao âmbito da intervenção do tribunal estadual» (cfr. Despacho n.º 10 do Tribunal Arbitral, junto aos autos).
3. Perceber o que é e qual é a Informação Devida é uma operação mental que está ao manifesto alcance de um qualquer declaratário diligente e que atue de acordo com os padrões da boa-fé.
4. As dúvidas expressas pela Requerida não são verdadeiras dúvidas, mas expedientes dilatórios destinados a reabrir um contraditório há muito encerrado. Até então, o Requerente não tinha tido a oportunidade processual para se pronunciar sobre tais dúvidas e o Tribunal a quo notificou o Requerente para o efeito. O Tribunal a quo absolutamente nada decidiu sobre a pertinência das dúvidas, nem tão pouco as perfilhou.
5. Chamados a intervir ao abrigo do artigo 38.º da Lei da Arbitragem Voluntária, não compete aos Tribunais Estaduais absolver a Requerida da prestação que lhe foi legitimamente ordenada pelo Tribunal Arbitral ou sindicar a decisão de produção de prova tomada pelo Tribunal Arbitral, mas fazer uso do seu ius imperi para assegurar que essa decisão é cumprida e que a prova é efetivamente produzida.
6. A decisão recorrida não merece qualquer reparo e deve ser mantida.
Termos em que deve ser julgado improcedente o recurso e mantida a decisão do Tribunal a quo. Assim se decidindo, será cumprido o direito e feita Justiça.”
*
O Recurso foi devidamente admitido, com efeitos e modo de subida adequados.
Colhidos os vistos cumpre decidir.
***
II. Questões a decidir:
Como resulta do disposto pelos artigos 5º; 635º, n.º 3 e 639º n.º 1 e n.º 3, todos do Código de Processo Civil (e é jurisprudência consolidada nos Tribunais Superiores) para além do que é de conhecimento oficioso, e porque os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, o objeto do recurso é delimitado em função das conclusões formuladas pelo recorrente.
No caso dos autos, ocorre ter sido proferido no Tribunal a quo um Despacho relativamente ao qual podemos descortinar três segmentos:
- Apreciação da invocada incompetência do Tribunal Arbitral para matérias que são objecto de parte dos documentos requeridos pela A.;
- Apreciação da alegada impertinência na junção dos documentos;
- Da apresentação dos documentos.
Lidas as Conclusões do Recurso, pese embora a Recorrente não tenha individualizado a que segmento do Despacho posto em crise se reporta, é possível porém visualizar fundamentos destinados a colocar em crise cada um dos segmentos referidos; ao que acresce ainda a invocação da incompetência do Tribunal a quo para proferir a última parte do despacho e ainda o erro na forma de processo no que aos pedidos formulados em 2; 3; parte do 7) e 8) respeitam.
Deste modo no caso concreto as questões a apreciar consistem em:
- Da apreciação da incompetência do tribunal Arbitral para parte do que foi determinado:
- Da absolvição da instância da recorrente no que aos pedidos formulados em 2; 3; parte do 7) e 8) respeitam;
- Da apreciação da alegada impertinência na junção dos documentos;
- Da competência do tribunal estadual para proferir o despacho a convidar a A. para, em aperfeiçoamento ao seu requerimento inicial, concretizar devidamente todos os documentos cuja apresentação requer, esclarecendo, designadamente, todas as dúvidas suscitadas pela requerida na sua contestação.
***
III. Fundamentação de Facto.
Com interesse para a decisão do presente recurso, há que atender:
1)
Ao que decorre do relatório supra;
2)
Por despacho de 5 de Abril de 2019 proferido nos autos n.º 1/2019/INS/ASB do Centro de Arbitragem Comercial da Câmara de Comércio e Indústria, iniciados a requerimento da aqui R., procedeu-se à composição do Tribunal Arbitral.
3)
Em 10/10/2019 realizou-se, na sede do Centro de Arbitragem Comercial, a audiência preliminar prevista no artigo 30.° do Regulamento do Centro de Arbitragem Comercial.
4)
Da respectiva Acta de audiência preliminar constam como
Questões a decidir:
1.ª Valor do saldo da conta corrente entre as Partes instituída pela cláusula décima, ri.° 3, do Protocolo datado de 5 de dezembro de 2012, à data da cessação da mesma.
2.ª Licitude da denúncia pelo Demandado do Protocolo datado de 5 de dezembro de 2 012 ou da cessação desse Protocolo por efeito da cessação do acordo parassocial datado de 12 de dezembro de 2012 celebrado entre o Demandado e sociedade Codecity Sports Management, Lda.
3.ª Direito da Demandante a ser indemnizada por prejuízos resultantes da denúncia pelo Demandado do Protocolo datado de 5 de dezembro de 2012, incluindo benfeitorias realizadas no Estádio ….
4.ª Direito da Demandante a ser indemnizada por benfeitorias realizadas no Estádio… (questão que poderá ser prejudicada pela decisão da anterior e que não representa uma ampliação do poder jurisdicional dos árbitros resultante da cláusula compromissória).
5.ª Imposição pelo Protocolo datado de 5 de dezembro de 2012 de deveres de conduta a observar após a sua vigência, incumprimento de tais deveres pela Demandante e direito do Demandado a ser indemnizado pelos prejuízos daí resultantes (questão que não representa uma ampliação do poder jurisdicional dos árbitros resultante da cláusula compromissória).
Ficou esclarecido que o enunciado das questões a decidir não prejudica a liberdade das partes de produzirem os seus articulados de acordo com as regras legais e regulamentares.”
5)
Ficou ainda definido em sede de audiência preliminar, conforme consta igualmente da respectiva Acta:
2. Articulados a apresentar
a) A Demandante apresentará a sua petição inicial até ao dia 12 de novembro de 2019;
b) O Demandado apresentará a sua contestação até ao dia 20 de dezembro de 2019;
c) A Demandante apresentará a sua resposta à eventual reconvenção do Demandado até ao dia 10 de janeiro de 2020;
d) O Demandado apresentará sua resposta a eventuais exceções constantes da resposta à reconvenção até ao dia 31 de janeiro de 2020.
3. Prova a produzir
a) Os articulados serão acompanhados dos documentos destinados à prova dos factos neles alegados, bem como da indicação dos demais meios de prova;
b) Findos os articulados, o tribunal proferirá despacho sobre a produção de prova requerida nos articulados;
c) O tribunal poderá autorizar requerimentos probatórios complementares, posteriores aos articulados, destinados à apresentação de meios de prova cuja pertinência só se revele depois de produzidos os articulados;
d) No despacho referido nas alíneas anteriores, o tribunal arbitral fixará prazo para a eventual junção de pareceres;
e) Os depoimentos testemunhais e dos representantes das Partes serão orais;
f)  As Partes numerarão sequencialmente todos os documentos que juntem durante o processo, devendo a Demandante incluir na numeração a letra A e o Demandado a letra R.
4. Audiência final
A audiência final será marcada oportunamente, em função dos meios de prova indicados pelas Partes.
6)
Em 13 de Julho de 2020 foi proferido no Processo Arbitral o Despacho n.º 6, onde, após uma recapitulação extensa do iter processual até essa data, que aqui se dá por integralmente reproduzido e após análise de várias cláusulas do Protocolo de Repartição de Direitos e Obrigações» celebrado pelas Partes com data de 5 de dezembro de 2012, e considerando os pedidos formulados, foram proferidas as seguintes decisões:
Sobre a competência do tribunal Arbitral:
Os pedidos da Demandante são:
«Termos em que deve:
a) Fixar-se o valor do saldo da conta-corrente estabelecida no Protocolo celebrado entre as partes, reportado a 30 de junho de 2018, em €259.493,23;
b) O R. ser condenado a pagar à A. o saldo dessa conta-corrente, declarando-se que a obrigação de pagamento desse saldo se venceu em 30 de setembro de 2018 e condenando-se assim o R. no pagamento dos respetivos juros moratórios, contados sobre o valor do saldo, à taxa legal supletiva para as obrigações comerciais, desde a data de vencimento até integral pagamento;
c) Declarar-se que a denúncia pelo R. do Protocolo celebrado entre as partes em 5 de dezembro de 2012 foi ilícita, não tendo fundamento;
d) Declarar-se que, mesmo após a produção dos efeitos da denúncia, o R. continuou a procurar e usufruir da qualidade de clube fundador da A., nomeadamente não pagando as suas dívidas para com a FPF, sendo estas pagas pela A., a inscrever-se num torneio de Esports organizado pela Liga enquanto clube fundador da A., e a não prescindir dos direitos especiais que tem na A.;
e) Condenar-se o R. a pagar à A. uma indemnização, de valor a fixar futuramente, por todos os danos que a A. tenha sofrido ou venha a sofrer com a denúncia do Protocolo;
f)  Condenar-se o R. a pagar à A. uma indemnização por todos os danos que a A. tenha sofrido ou venha a sofrer, pelos efeitos que essa denúncia teve e venha a ter a propósito da utilização e impedimento de utilização pela A., anteriormente ou no futuro, dos símbolos e sinais do A., incluindo o seu emblema e …., e da expressão… na denominação social da A..
g) O R. ser condenado a pagar à A. a quantia de €212.657,33 a título de indemnização pelas benfeitorias realizadas pela A. no Estádio …, acrescida dos juros moratórios, contados sobre esse capital à taxa legal supletiva para as obrigações comerciais desde 1 de julho de 2018 até integral pagamento.»
É duvidoso que os árbitros tenham competência para julgar o pedido da Demandante formulado sob d) («Declarar-se que, mesmo após a produção dos efeitos da denúncia, o R. continuou a procurar e usufruir da qualidade de clube fundador da A., nomeadamente não pagando as suas dívidas para com a FPF, sendo estas pagas pela A., a inscrever-se num torneio de Esports organizado pela Liga enquanto clube fundador da A., e a não prescindir dos direitos especiais que tem na A.»), na medida em que não respeita a factos relativos à execução do Protocolo.
Essa dúvida já foi antes debatida (a propósito do teor da resposta do Demandado ao requerimento de arbitragem, tendo-se refletido no texto da questão controvertida n.2 5 («Imposição pelo Protocolo datado de 5 de dezembro de 2012 de deveres de conduta a observar após a sua vigência, incumprimento de tais deveres pela Demandante e direito do Demandado a ser indemnizado pelos prejuízos daí resultantes (questão que não representa uma ampliação do poder jurisdicional dos árbitros resultante da cláusula compromissória»).
Não há razões para alterar agora a posição assumida na audiência preliminar.
Todos os demais pedidos da Demandante respeitam à execução do Protocolo, não parecendo suscitarem-se dúvidas sobre a competência dos árbitros para os julgarem.
Os pedidos do Demandado, na formulação do seu requerimento de 25.6.2020, são: «2) Devem ser reconhecidos os seguintes créditos a favor do Réu:
a) € 81.644,97 (respeitante ao fornecimento de água, eletricidade e gás);
b) 15% da mais valia realizada ou a realizar pela Autora com a transferência dos jogadores …(caso se tenha, de alguma forma, vinculado à Autora antes de 30 de Junho de 2018), …(caso se tenha, de alguma forma, vinculado à Autora antes de 30 de Junho de 2018), … (caso se tenha, de alguma forma, vinculado à Autora antes de 30 de Junho de 2018), …(caso se tenha, de alguma forma, vinculado à Autora antes de 30 de Junho de 2018), … (caso se tenha, de alguma forma, vinculado à Autora antes de 30 de Junho de 2018), …(caso se tenha, de alguma forma, vinculado à Autora antes de 30 de Junho de 2018), … (caso se tenha, de alguma forma, vinculado à Autora antes de 30 de Junho de 2018), … (caso se tenha, de alguma forma, vinculado à Autora antes de 30 de Junho de 2018) e … (caso se tenha, de alguma forma, vinculado à Autora antes de 30 de Junho de 2018);
c) 50% dos montantes respeitantes à época desportiva 2016/2017 e 100% dos montantes respeitantes à época desportiva 2017/2018 recebidos ou a receber pela Autora ao abrigo da comparticipação da UEFA aos clubes formadores (também conhecido por fundo/mecanismo de solidariedade da UEFA).
d) Todos os valores acima não quantificados devem ser determinados na produção de prova deste processo e/ou liquidados em execução de sentença.
O jogador … terá sido transferido pela Autora para o V… mediante o pagamento à Autora de € 400.000,00 + IVA (se assim for, terá o Réu o direito a receber da Autora 15% desse valor, ou seja, € 60.000,00 + IVA, ou seja, um total de € 73.800,00) e o jogador … terá sido transferido pela Autora para o F…no dia 29 de Janeiro de 2018 mediante o pagamento à Autora do valor de € 321.151,22 + IVA (se assim for, terá o Réu o direito a receber da Autora 15% desse valor, ou seja, € 48.172,68 + IVA calculado à taxa de 23%, ou seja, um total de € 59.252,40).
3)…
4) Os créditos reconhecidos ao Réu vencem juros de mora contados à taxa legal desde 30 de Setembro de 2018, salvo os que respeitem à obrigação de pagamento emergente da comparticipação da UEFA aos clubes formadores, devido pela Autora ao Réu, que vencem juros de mora contados à taxa legal contados a partir do 5.° dia após a data em que a Autora tenha recebido os correspondentes montantes.
5) Deve a Autora ser condenada a pagar ao Réu o montante simbólico de € 50.000,00 a título de indemnização pelos prejuízos que lhe causou, acrescido do montante de juros de mora calculados à taxa legal, contados desde data da prolação da sentença.
6) Deve a Autora ser condenada no pagamento de todos os custos e despesas incorridos ou a incorrer pelo Réu neste Tribunal Arbitral, incluindo custas, honorários dos árbitros e honorários dos advogados do Réu, tudo montantes a liquidar em execução de sentença.»
O n.° 1 da cláusula sétima do Protocolo levanta dúvidas de interpretação quanto ao que são as «receitas da compensação por formação e do mecanismo de solidariedade, nos termos dos regulamentos aplicáveis». Serão as pressupostas no pedido 2c) do Demandado ou estarão em causa outras?
O n.º 3 da cláusula sétima do Protocolo levanta dúvidas de interpretação quanto ao modo de cálculo das mais-valias nele referidas.
Sustenta a Demandante, na resposta à reconvenção, que as dúvidas levantadas pelo n.° 3 da cláusula sétima foram resolvidas em decisão tomada por outro tribunal arbitrai e o que mesmo teria acontecido quanto às pretensões do Demandado constante do pedido formulado sob 2c).
A verdade, porém, é que a Demandante não foi parte nesse processo, pelo que não existe caso julgado sobre as questões (o processo em causa teve como Demandante o Clube e como Demandada a sociedade Codecity Sport Management, Lda, como resulta do doc. 82 junto pela SAD).
Assim, impõe-se que seja permitida a discussão neste processo sobre o sentido dos n.°51 e 3 da cláusula sétima do Protocolo, bem como sobre os factos relevantes para sua aplicação. Por outras palavras: com os elementos disponíveis neste momento, os árbitros não se podem considerar incompetentes para apreciar os pedidos formulados pelo Demandado sob 2b) e 2C) e 2d). A discussão futura poderá conduzir a conclusão diferente.”
7)
Os árbitros decidiram ainda aditar às questões controvertidas as seguintes:
“- 6.º Sentido do n.° 1 da cláusula sétima do Protocolo, designadamente quanto às receitas abrangidas e quanto ao modo da sua repartição entre as Partes;
- 7.º Determinação do valor eventualmente devido pela Demandante ao Demandado por força do n.2 1 da cláusula sétima do Protocolo;
- 8.º Sentido do n.° 3 da cláusula sétima do Protocolo, designadamente quanto ao modo de cálculo da mais-valia nele referida;
- 9.º Determinação do valor eventualmente devido pela Demandante ao Demandado por força do n.° 1 da cláusula sétima do Protocolo;
- 10.º Determinação do valor eventualmente devido pelo Demandado à Demandante por força do n.° 5 da cláusula terceira do Protocolo.”
8)
Foi ainda proferida a seguinte decisão:
VIII - Informações a prestar e documentos a juntar pelas Partes
As solicitações da Demandante são as de que o Demandado:
a) Informe os valores das receitas obtidas nos dias de jogo, seja oficial ou particular, referentes à exploração de bares no Estádio … relativas ao período compreendido entre 1 de janeiro de 2017 e 30 de junho de 2018 e junte os documentos comprovativos dessas receitas;
b) Junte cópias de todos os contratos de exploração de bares e faturas passadas a pessoas coletivas e ou singulares que tenham explorado esses bares entre 1 de janeiro de 2017 e 30 de junho de 2018;
c) Junte cópia da ata da reunião da sua assembleia geral sobre a denúncia do Protocolo, bem como sobre a negociação de um novo Protocolo.
d) Junte a gravação das reuniões da sua assembleia geral em que:
a) Foi aprovada a denúncia do Protocolo;
b) Foi aprovada a expulsão de sócios do Demandado de ….
A informação sobre os valores das receitas obtidas nos dias de jogo referentes à exploração de bares no Estádio …, relativas ao período compreendido entre 1 de janeiro de 2017 e 30 de junho de 2018, os documentos comprovativos dessas receitas e as cópias dos contratos de exploração de bares e faturas emitidas às pessoas e entidades que tenham explorado esses bares entre 1 de janeiro de 2017 e 30 de junho de 2018 são elementos de prova pertinentes, designadamente para efeitos da nova questão controvertida n.° 10. Defere-se, pois, o pedido da Demandante de que o Demandado preste essas informações e junte esses documentos.
Quanto à ata da reunião da assembleia geral do Demandado cuja junção foi solicitada pela Demandante, a mesma encontra-se já junta aos autos (doc. R24) - sendo, aliás, duvidosa sua relevância para a decisão da causa, mormente por o teor de tal reunião se tratar de um ato interno do Demandado sem repercussões jurídicas externas, incluindo na esfera da Demandante. Essa irrelevância é ainda mais clara no tocante à gravação do som da mesma reunião, pelo que se indefere o solicitado pela Demandante quanto a essa gravação.
Na contestação, o Demandado solicitou que a Demandante junte:
«1. Cópia dos mapas financeiros apresentados na Liga Portuguesa de Futebol Profissional respeitantes aos jogos em casa da Autora com o Benfica, Sporting e Porto nas épocas 2014/2015, 2015/2016, 2016/2017 e 2017/2018.
2. Informação sobre o montante de IVA liquidado sobre os convites respeitantes a todos os jogos referidos no número anterior.
3. Informação sobre os montantes recebidos ao abrigo do fundo/mecanismos de solidariedade da UEFA respeitantes às épocas 2016/2017 e 2017/2018, acompanhada da correspondente documentação de suporte;
4. Cópia de todos os contratos, qualquer que seja a sua natureza, que tenham sido celebrados com os atletas …, mesmo aqueles que já não estejam em vigor, nomeadamente por terem sido modificados ou revogados.
5. Cópia de todos os contratos, qualquer que seja a sua natureza, incluindo de transferência, agenciamento, comparticipação em negócio ou outro, que tenham sido celebrados com terceiros e que digam respeito aos atletas …, incluindo (mas sem limitar) os que digam respeito aos respetivos direitos de formação desportiva, direitos económicos, direitos de imagem, mesmo aqueles que já não estejam em vigor, nomeadamente por terem sido modificados ou revogados.
6. Informação sobre quaisquer montantes recebidos ou reclamados que digam respeito aos mecanismos de solidariedade (nacional e/ou internacional) ligados à formação dos atletas …, bem como cópia de toda a documentação e correspondência trocada a esse respeito com terceiras entidades, incluindo (mas não excluindo) as que asseguram esses pagamentos.
7. Cópia de todas as faturas, recibos ou quaisquer outros elementos contabilísticos integrados na contabilidade da Autora, emitidas pela Autora ou por terceiras entidades e que digam respeito às realidades referidas em 4., 5. e 6., independentemente de existir contrato escrito.
8. Cópia de todos os contratos, de todas as faturas, de todos os recibos e referência de todas as datas de pagamento da correspondente contrapartida devida pela Autora, respeitante à utilização, pela Autora, do Complexo Desportivo …(relvado principal e adjacentes, bem como zonas técnicas ou outras) e do E… durante as épocas 2017/2018 e 2018/2019.
9. Informação sobre os montantes recebidos pela participação na Liga Europa na época 2015/2016, acompanhada da correspondente documentação de suporte.
10. Todos os demais elementos relevantes na posse da Autora ou que a Autora diligencie na sua obtenção que permitam comprovar de urna forma completa os termos e condições que existiram e que existem e que digam respeito às situações referidas nos números anteriores.»
No seu requerimento de 25.6.2020, o Demandado prescindiu da solicitação referida sob o n.° 6.
Todos os documentos e informações referidos nos n.12s 1 a 5 e 7 a 9 do elenco constante do requerimento do Demandado são potencialmente relevantes para a decisão dos factos controvertidos que podem influenciar o desfecho da causa. Defere-se, pois, o pedido do Demandado de que a Demandante junte esses documentos, com exclusão do n.° 10, tendo em vista sua indeterminação.
O mesmo não se pode afirmar quanto aos documentos e informações solicitados no articulado destinado à resposta às exceções constantes da resposta à reconvenção, a saber:
- Cópias de todas as convocatórias e das atas da assembleia geral da Demandante desde 1 de janeiro de 2017;
- Cópias de todas as atas do conselho de administração da Demandante desde 1 de janeiro de 2017;
- Montantes das remunerações pagas, relativamente a cada um dos últimos 3 anos, aos membros dos órgãos sociais da Demandante, acompanhados das deliberações da assembleia geral que as tenha definido e aprovado;
- Montantes de todas quantias pagas, relativamente a cada um dos últimos 3 anos, aos 10 empregados da Demandante com remuneração mais elevada.
Na verdade, nenhuma dessas informações ou documentos se mostra necessária à decisão da causa, pois não respeitam a factos que possam constituir, modificar ou extinguir direitos origináveis pelo Protocolo - pelo que se indefere o requerido quanto aos mesmos.”
9)
Finalmente, nesse Despacho n.º 6, em síntese e na parte pertinente:
Determina-se que o Demandado:
1. «Informe os valores das receitas obtidas nos dias de jogo, seja oficial ou particular, referentes à exploração de bares no Estádio … relativas ao período compreendido entre 1 de janeiro de 2017 e 30 de junho de 2018 e junte os documentos comprovativos dessas receitas»;
2. «Junte cópias de todos os contratos de exploração de bares e faturas passadas a pessoas coletivas e ou singulares que tenham explorado esses bares entre 1 de janeiro de 2017 e 30 de junho de 2018».
d) Determina-se que a Demandante junte:
«1. Cópia dos mapas financeiros apresentados na Liga Portuguesa de Futebol Profissional respeitantes aos jogos em casa da Autora com o Benfica, Sporting e Porto nas épocas 2014/2015, 2015/2016, 2016/2017 e 2017/2018.
2. Informação sobre o montante de IVA liquidado sobre os convites respeitantes a todos os jogos referidos no número anterior.
3. Informação sobre os montantes recebidos ao abrigo do fundo/mecanismos de solidariedade da UEFA respeitantes às épocas 2016/2017 e 2017/2018, acompanhada da correspondente documentação de suporte;
4. Cópia de todos os contratos, qualquer que seja a sua natureza, que tenham sido celebrados com os atletas…, mesmo aqueles que já não estejam em vigor, nomeadamente por terem sido modificados ou revogados.
5. Cópia de todos os contratos, qualquer que seja a sua natureza, incluindo de transferência, agenciamento, comparticipação em negócio ou outro, que tenham sido celebrados com terceiros e que digam respeito aos atletas…, incluindo (mas sem limitar) os que digam respeito aos respetivos direitos de formação desportiva, direitos económicos, direitos de imagem, mesmo aqueles que já não estejam em vigor, nomeadamente por terem sido modificados ou revogados.
6. Cópia de todas as faturas, recibos ou quaisquer outros elementos contabilísticos integrados na contabilidade da Autora, emitidas pela Autora ou por terceiras entidades e que digam respeito às realidades referidas em 4. e 5., independentemente de existir contrato escrito.
7. Cópia de todos os contratos, de todas as faturas, de todos os recibos e referência de todas as datas de pagamento da correspondente contrapartida devida pela Autora, respeitante à utilização, pela Autora, do Complexo Desportivo … (relvado principal e adjacentes, bem como zonas técnicas ou outras) e do E… durante as épocas 2017/2018 e 2018/2019.
8. Informação sobre os montantes recebidos pela participação na Liga Europa na época 2015/2016, acompanhada da correspondente documentação de suporte.”
10)
No Despacho n.º 7 proferido no Processo Arbitral, constatando-se que a Demandante não juntou quaisquer dos elementos cuja junção lhe foi solicitada, nem nada requereu, determinou-se que:
Em face disso, deve o Demandado requerer o que tenha por conveniente, nomeadamente quanto à perícia cuja realização requereu anteriormente, reiterando esse requerimento, alterando-o ou dando-o sem efeito.
11)
Em 9/9/2020 foi proferido o Despacho n.º 8 com o seguinte teor:
Por requerimento de 7.9.2020, a Demandante, além de se pronunciar sobre uma questão de competência do tribunal, veio requerer que lhe seja concedida a possibilidade de juntar aos autos até dia 16 do mês corrente os documentos (e informação presume-se) cuja junção lhe foi determinada pelo tribunal no despacho n.126.
Por e-mail de 9.9.2020, o Demandado comunicou que não se opõe ao requerido pela Demandante, «sendo, depois, devolvido ao Réu o direito de se pronunciar sobre os mesmos e requerer o que tenha por conveniente.».
Tendo em vista as posições das Partes e o interesse na boa instrução do processo, os árbitros deferem o requerimento da Demandante, esclarecendo que o Demandado se poderá pronunciar sobre os documentos e informação adicionais que a Demandante traga ao processo e deverá tomar posição sobre a suficiência dos mesmos, a fim de habilitar os árbitros a apreciar o pedido de produção de prova pericial apresentado pelo Demandado.”
12)
Em 21/10/2020 foi proferido o Despacho n.º 10 dele constando:
Pelo despacho n.° 9, foi decidido, nos termos do art. 35, n.º 3, da LAV, que o tribunal arbitral prosseguiria o processo com base na prova apresentada, a menos que o Demandado comunicasse pretender autorização do tribunal arbitrai para usar a faculdade prevista no art. 38, n.º 1, da LAV, tendo sido solicitado ao Demandado que:
A) Comunicasse se pretendia requerer produção de prova perante tribunal estadual;
B) Em caso negativo, requeresse o que tivesse por conveniente quanto à perícia cuja realização tinha requerido anteriormente, reiterando esse requerimento, alterando-o ou dando-o sem efeito.
Por requerimento de 9.10.2020, o Demandado, além do mais:
- Informou que pretende requerer produção de prova perante tribunal estadual, tendo solicitado autorização do tribunal arbitrai para o efeito;
- Deixou, nesta fase, «para o Tribunal, ao abrigo do artigo 37.° n.° 1 da LAV, a decisão sobre a necessidade de uma perícia e, se afirmativo, quais os seus pontos e qual a identidade do perito»;
- «Em todo o caso, em função da prova que venha a ser produzida junto do tribunal estadual», reservou-se o direito de requerer perícia.
Por requerimento de 19.10.2020, a Demandante pronunciou-se sobre o requerimento do Demandado, afirmando, em síntese, que:
- Os documentos que o Demandado pretende que sejam juntos ao processo pela Demandantes são inúteis para a decisão da causa;
- O Demandado tem acesso a tais documentos;
- Numa ação de inquérito judicial a sociedade, o Tribunal do Comércio de Lisboa, por decisão transitada em julgado, decidiu, além do mais, que o Demandado atuou de forma a causar prejuízo relevante à Demandante, não obstante ser acionista desta acionista enquanto clube fundador e, como tal, detentor de capital social mínimo previsto na lei 10%;
- A Demandante «irá juntar aos autos um conjunto de documentos logo que os obtenha e outro conjunto de documentos quando obtiver a autorização para quebrar a confidencialidade pelas partes perante quem se comprometeu a guardá-la (se bem que já tenha juntado aos autos as faturas relativas a esses contratos).»;
- A perícia requerida pelo Demandado é absolutamente impertinente, como já sustentado pela Demandante em requerimento anterior;
- «A A. deixa ao prudente critério do Tribunal a apreciação do pedido do R. efetuado ao abrigo do disposto no art. 38° da LAV. Sem prejuízo, no contexto processual aberto por este requerimento do R. e à luz das considerações da A. efetuadas nos requerimentos antecedentes, a A. solicita respeitosamente ao Tribunal que analise a pertinência dos requerimentos de junção de documentos do R., nomeadamente da adequação desses documentos para prova dos factos constitutivos dos direitos do R. e dos efeitos extintivos dos direitos da A..».
A Lei da Arbitragem Voluntária estabelece no seu art. 38, n.2 1, que «Quando a prova a produzir dependa da vontade de uma das partes ou de terceiros e estes recusem a sua colaboração, uma parte, com a prévia autorização do tribunal arbitrai, pode solicitar ao tribunal estadual competente que a prova seja produzida perante ele, sendo os seus resultados remetidos ao tribunal arbitral.».
Este tribunal arbitral ordenou, no despacho n.° 6, sob requerimento do Demandado constante da sua contestação (não totalmente atendido), que a Demandante juntasse certos documentos em seu poder — o que a Demandante, pelo seu requerimento de 16 de setembro do ano corrente, satisfez de modo apenas parcial.
Tem, pois, o Demandado direito a solicitar a intervenção do tribunal estadual na medida do necessário à produção da prova documental determinada e não cumprida - o que o tribunal arbitral, por este meio, autoriza.
A fim de evitar ambiguidades quanto ao âmbito da intervenção do tribunal estadual, reproduz-se a parte do despacho que ordenou à Demandante a junção dos documentos em causa:
«d) Determina-se que a Demandante junte:
1. Cópia dos mapas financeiros apresentados na Liga Portuguesa de Futebol Profissional respeitantes aos jogos em casa da Autora com o Benfica, Sporting e Porto nas épocas 2014/2015, 2015/2016, 2016/2017 e 2017/2018.
2. Informação sobre o montante de IVA liquidado sobre os convites respeitantes a todos os jogos referidos no número anterior.
3. Informação sobre os montantes recebidos ao abrigo do fundo/mecanismos de solidariedade da UEFA respeitantes às épocas 2016/2017 e 2017/2018, acompanhada da correspondente documentação de suporte;
4. Cópia de todos os contratos, qualquer que seja a sua natureza, que tenham sido celebrados com os atletas …,, mesmo aqueles que já não estejam em vigor, nomeadamente por terem sido modificados ou revogados.
5. Cópia de todos os contratos, qualquer que seja a sua natureza, incluindo de transferência, agenciamento, comparticipação em negócio ou outro, que tenham sido celebrados com terceiros e que digam respeito aos atletas…, incluindo (mas sem limitar) os que digam respeito aos respetivos direitos de formação desportiva, direitos económicos, direitos de imagem, mesmo aqueles que já não estejam em vigor, nomeadamente por terem sido modificados ou revogados.
 6. Cópia de todas as faturas, recibos ou quaisquer outros elementos contabilísticos integrados na contabilidade da Autora, emitidas pela Autora ou por terceiras entidades e que digam respeito às realidades referidas em 4. e 5., independentemente de existir contrato escrito.
7. Cópia de todos os contratos, de todas as faturas, de todos os recibos e referência de todas as datas de pagamento da correspondente contrapartida devida pela Autora, respeitante à utilização, pela Autora, do Complexo Desportivo … (relvado principal e adjacentes, bem como zonas técnicas ou outras) e do E… durante as épocas 2017/2018 e 2018/2019.
8. Informação sobre os montantes recebidos pela participação na Liga Europa na época 2015/2016, acompanhada da correspondente documentação de suporte.»
No respeitante à perícia, o tribunal entende - como resulta do despacho n.2 6 - que não há razões para a determinar por sua iniciativa. Na medida em que o Demandada relegou para momento posterior a sua posição final sobre a mesma, nada há que decidir, por ora, sobre o assunto.”
13)
O C…, Requerente nos presentes autos, notificada do despacho proferido e agora posto em crise veio expor o seguinte:
1. No que diz respeito à cópia dos mapas financeiros apresentados na Liga Portuguesa de Futebol Profissional respeitantes aos jogos em casa da Autora com o Benfica, Sporting e Porto nas épocas 2014/2015, 2015/2016, 2016/2017 e 2017/2018:
A Requerida está obrigada perante a Liga Portuguesa de Futebol Profissional a remeter um mapa financeiro por cada jogo, conforme modelo que se junta como documento em anexo.
O pedido é claro e isento de dúvidas objetivas e a Requerida sabe perfeitamente a que documento se reporta o determinado pelo Tribunal Arbitral, pelo que a Requerida deve dar cumprimento à junção determinada pelo Tribunal Arbitral.
2. Informação sobre o montante de IVA liquidado sobre os convites respeitantes a todos os jogos referidos no número anterior:
Deverá a Requerida entregar cópia da declaração periódica de IVA correspondente ao período de tributação em que tiveram lugar os jogos em casa da Autora com o Benfica, Sporting e Porto nas épocas 2014/2015, 2015/2016, 2016/2017 e 2017/2018, acompanhada da informação sobre a parte da base tributável e do imposto a favor do Estado que diz respeito a tais jogos e, dentro desta parte, a parcela respeitante aos convites desses jogos.
A Requerida está obrigada a ter uma contabilidade organizada e, por isso, as ofertas devem estar necessariamente listadas, mensuradas, documentadas e, inclusive, ter associada identificação dos clientes/destinatários a quem as mesmas foram transmitidas (nomeadamente, para justificar a sua razoabilidade, a sua conformidade com os usos comerciais e se foram feitas no âmbito da atividade da empresa ou com fins alheios à empresa), de modo a serem de objeto de justificação e de tratamento contabilístico e, por essa via, sustentarem as obrigações declarativas em sede de IRC e de IVA.
Assim, trata-se de informação que a Requerida há muito que tem preparada e o pedido é claro e isento de dúvidas objetivas, pelo que a Requerida deve dar cumprimento à junção determinada pelo Tribunal Arbitral.
3. Informação sobre os montantes recebidos ao abrigo do fundo/mecanismos de solidariedade da UEFA respeitantes às épocas 2016/2017 e 2017/2018, acompanhada da correspondente documentação de suporte
A Requerida recebeu determinados montantes ao abrigo do fundo/mecanismos de solidariedade da UEFA, respeitantes às épocas 2016/2017 e 2017/2018.
A Requerida recebeu os aludidos montantes, via Federação Portuguesa de Futebol e/ou via Liga Portuguesa de Futebol Profissional, e os mesmos foram comunicados por tais entidades à Requerida e conferidos por esta.
A contabilidade não se faz de recortes de jornais e os extratos bancários são instrumentos de reconciliação de movimentos financeiros e não de suporte de crédito de débitos.
Para que fique claro, os montantes em causa são os respeitantes às épocas 2016/2017 e 2017/2018, independentemente do momento em que foram efetivamente colocados à disposição da Requerida.
Deverá a Requerida prestar informação sobre esses valores e apresentar os documentos que, na sua contabilidade, suportam esse crédito e o seu recebimento.
4. Cópia de todos os contratos, qualquer que seja a sua natureza, que tenham sido celebrados com os atletas…, mesmo aqueles que já não estejam em vigor, nomeadamente por terem sido modificados ou revogados.
O pedido é claro e isento de dúvidas objetivas, pelo que a Requerida deve dar cumprimento à junção determinada pelo Tribunal Arbitral.
Para que fique claro, a obrigação de junção de documentos determinada pelo Tribunal Arbitral reporta-se todos os contratos, qualquer que seja a sua natureza e não está cronologicamente limitada.
5. Cópia de todos os contratos, qualquer que seja a sua natureza, incluindo de transferência, agenciamento, comparticipação em negócio ou outro, que tenham sido celebrados com terceiros e que digam respeito aos atletas…, incluindo (mas sem limitar) os que digam respeito aos respetivos direitos de formação desportiva, direitos económicos, direitos de imagem, mesmo aqueles que já não estejam em vigor, nomeadamente por terem sido modificados ou revogados.
O pedido é claro e isento de dúvidas objetivas, pelo que a Requerida deve dar cumprimento à junção determinada pelo Tribunal Arbitral.
Para que fique claro, a obrigação de junção de documentos determinada pelo Tribunal Arbitral reporta-se todos os contratos, qualquer que seja a sua natureza e não está cronologicamente limitada.
6. Cópia de todas as faturas, recibos ou quaisquer outros elementos contabilísticos integrados na contabilidade da Autora, emitidas pela Autora ou por terceiras entidades e que digam respeito às realidades referidas em 4. e 5., independentemente de existir contrato escrito.
O pedido é claro e isento de dúvidas objetivas, pelo que a Requerida deve dar cumprimento à junção determinada pelo Tribunal Arbitral.
Para que fique claro, a obrigação de junção de documentos determinada pelo Tribunal Arbitral reporta-se todos os contratos, qualquer que seja a sua natureza e não está cronologicamente limitada.
7. Cópia de todos os contratos, de todas as faturas, de todos os recibos e referência de todas as datas de pagamento da correspondente contrapartida devida pela Autora, respeitante à utilização, pela Autora, do Complexo Desportivo … (relvado principal e adjacentes, bem como zonas técnicas ou outras) e do E… durante as épocas 2017/2018 e 2018/2019.
O pedido é claro e isento de dúvidas objetivas, pelo que a Requerida deve dar cumprimento à junção determinada pelo Tribunal Arbitral.
8. Informação sobre os montantes recebidos pela participação na Liga Europa na época 2015/2016, acompanhada da correspondente documentação de suporte.
O pedido é claro e isento de dúvidas objetivas, pelo que a Requerida deve dar cumprimento à prestação de informação e à junção determinada pelo Tribunal Arbitral.
Mais se requer: para prova da falta de cumprimento do dever de cooperação por parte da Requerida, requer-se que seja oficiada a Federação Portuguesa de Futebol / Direção Financeira (Avenida das Seleções, 1495-433 Cruz Quebrada – Dafundo) e a Liga Portuguesa de Futebol Profissional (Rua da Constituição, nº 2555, 4250-173 Porto) para virem aos autos juntar cópia de toda correspondência (enviada e recebida) que mantiveram com a Requerida, B…, acerca dos montantes que lhe foram atribuídos ao abrigo do fundo/mecanismos de solidariedade da UEFA respeitantes às épocas 2016/2017 e 2017/2018.”
***
IV. Do Direito.
Enquadramento Legal.
No nosso ordenamento jurídico, concretamente na SECÇÃO IX do Código Civil, prevê o Legislador a Obrigação de informação e de apresentação de coisas ou documentos.
Essa Secção compõe-se por quatro artigos.
Assim, o artigo 573.º dispõe sobre a Obrigação de informação; esta existe, sempre que o titular de um direito tenha dúvida fundada acerca da sua existência ou do seu conteúdo e outrem esteja em condições de prestar as informações necessárias.
O artigo 574.º rege sobre a Apresentação de coisas:
“1. Ao que invoca um direito, pessoal ou real, ainda que condicional ou a prazo, relativo a certa coisa, móvel ou imóvel, é lícito exigir do possuidor ou detentor a apresentação da coisa, desde que o exame seja necessário para apurar a existência ou o conteúdo do direito e o demandado não tenha motivos para fundadamente se opor a diligência.
2. Quando aquele de quem se exige a apresentação da coisa a detiver em nome de outrem, deve avisar a pessoa em cujo nome a detém, logo que seja exigida a apresentação, a fim de ela, se quiser, usar os meios de defesa que no caso couberem.”
E o Artigo 575.º regula a Apresentação de documentos, mandando aplicar as disposições do artigo anterior, com as necessárias adaptações, aos documentos, desde que o requerente tenha um interesse jurídico atendível no exame deles.
Finalmente, estabelece o Artigo 576.º que, feita a apresentação, o requerente tem a faculdade de tirar cópias ou fotografias, ou usar de outros meios destinados a obter a reprodução da coisa ou documento, desde que a reprodução se mostre necessária e se lhe não oponha motivo grave alegado pelo requerido.
Desta análise da Lei resulta desde logo que se prevêem distintas obrigações e que a obrigação de informação é distinta da obrigação de apresentação de coisas e da apresentação de documentos, prevendo a lei distintos requisitos para cada uma delas.
Em sede processual, igualmente são distintos os meios processuais a que a parte pode recorrer conforme a obrigação em causa.
Deste modo, o direito à obtenção de informações, previsto pelo art.º 573º do Código Civil, é exercido através de uma acção comum de condenação, já que não existe qualquer norma que preveja um processo especial para o efeito – conf. art.º 546º, n.º 2 do Código de Processo Civil.
Já o direito a exigir a apresentação de coisas ou documentos, previsto pelos artigos 574º e 575º do Código Civil é exercido através do processo especial do CAPÍTULO XIII do Código de Processo Civil, precisamente de Apresentação de coisas ou documentos.
Neste, o art.º 1045.º dispõe que aquele que, nos termos e para os efeitos dos artigos 574.º e 575.º do Código Civil, pretenda a apresentação de coisas ou documentos que o possuidor ou detentor lhe não queira facultar justifica a necessidade da diligência e requer a citação do recusante para os apresentar no dia, hora e local que o juiz designar.
De acordo com o art.º 1046º:
“1 - O citado pode contestar no prazo de 15 dias, a contar da citação; se detiver as coisas ou documentos em nome de outra pessoa, pode esta contestar dentro do mesmo prazo, ainda que o citado o não faça.
2 - Na falta de contestação, ou no caso de ela ser considerada improcedente, o juiz designa dia, hora e local para a apresentação na sua presença.
3 - A apresentação faz-se no tribunal, quando se trate de coisas ou de documentos transportáveis em mão; tratando-se de outros móveis ou de coisas imóveis, a apresentação é feita no lugar onde se encontrem.”
E prevê o art.º 1047º a apreensão judicial: “Se os requeridos, devidamente notificados, não cumprirem a decisão, pode o requerente solicitar a apreensão das coisas ou documentos para lhe serem facultados, aplicando-se o disposto quanto à efetivação da penhora, com as necessárias adaptações.”
Em suma, o procedimento previsto no artigo 1476.º do Código de Processo Civil visa a apresentação para exame de documento e/ou coisa, com posterior devolução ao respectivo detentor ou possuidor.
Daqui decorre ainda a distinção entre este processo e aqueles que se destinam à consulta dos documentos nas sedes ou instalações das requeridas (para o que, consoante o que estiver em causa, deverão os requerentes lançar mão de outros procedimentos, quer o comum, como será o caso para a efectivação do direito à consulta de documentos, previsto no art.º 16º-C, n.º 7 do regime das AUGI quer, v.g., o processo especial de inquérito judicial, aplicável às sociedade, nas situações a que se refere o art.º 67º do Código das Sociedades Comerciais - não apresentação do relatório de gestão, contas de exercício e demais documentos de prestação de contas – e nas situações dos artigos 21º, n.º 1, c) direito dos sócios a obter informações sobre a vida da sociedade, nos termos da lei e do contrato; 31.º, n.º 3, relativamente à deliberação de distribuição de bens; no artigo 68.º, n.º 2, no que que respeita à recusa de aprovação de contas, no artigo 181.º, n.º 6 e 214º, relativamente ao direito dos sócios à informação, nos artigos 216.º e 292.º, no que respeita à recusa de prestação de informação; no artigo 255.º, n.º 2, em relação às remunerações dos sócios, e no artigo 450.º, relativamente ao abuso de informação).
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Posto isto, veja-se que as partes têm pendente um processo de Arbitragem, instaurado nos termos da LAV – Lei n.º 63/2011, de 14 de Dezembro.
Nos termos do art.º 1.º da LAV, “Desde que por lei especial não esteja submetido exclusivamente aos tribunais do Estado ou a arbitragem necessária, qualquer litígio respeitante a interesses de natureza patrimonial pode ser cometido pelas partes, mediante convenção de arbitragem, à decisão de árbitros”, sendo que de acordo com o n.º 3 do mesmo preceito, “A convenção de arbitragem pode ter por objecto um litígio actual, ainda que afecto a um tribunal do Estado (compromisso arbitral), ou litígios eventuais emergentes de determinada relação jurídica contratual ou extracontratual (cláusula compromissória).”
Validamente celebrada a convenção de arbitragem, que aqui não está posta em causa, resulta da mesma o efeito negativo da convenção de arbitragem previsto pelo art.º 5º da LAV:
“1 - O tribunal estadual no qual seja proposta acção relativa a uma questão abrangida por uma convenção de arbitragem deve, a requerimento do réu deduzido até ao momento em que este apresentar o seu primeiro articulado sobre o fundo da causa, absolvê-lo da instância, a menos que verifique que, manifestamente, a convenção de arbitragem é nula, é ou se tornou ineficaz ou é inexequível.
2 - No caso previsto no número anterior, o processo arbitral pode ser iniciado ou prosseguir, e pode ser nele proferida uma sentença, enquanto a questão estiver pendente no tribunal estadual.
3 - O processo arbitral cessa e a sentença nele proferida deixa de produzir efeitos, logo que um tribunal estadual considere, mediante decisão transitada em julgado, que o tribunal arbitral é incompetente para julgar o litígio que lhe foi submetido, quer tal decisão seja proferida na acção referida no n.º 1 do presente artigo, quer seja proferida ao abrigo do disposto no n.º 9 do artigo 18.º, e nas subalíneas i) e iii) da alínea a) do n.º 3 do artigo 46.º
4 - As questões da nulidade, ineficácia e inexequibilidade de uma convenção de arbitragem não podem ser discutidas autonomamente em acção de simples apreciação proposta em tribunal estadual nem em procedimento cautelar instaurado perante o mesmo tribunal, que tenha como finalidade impedir a constituição ou o funcionamento de um tribunal arbitral.”
Finalmente, de acordo com o art.º 19º da LAV, nas matérias reguladas pela presente lei, os tribunais estaduais só podem intervir nos casos em que esta o prevê.
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Da Competência do Tribunal Arbitral.
Especificamente sobre a questão da competência dispõe o art.º 18º da LAV:
“1 - O tribunal arbitral pode decidir sobre a sua própria competência, mesmo que para esse fim seja necessário apreciar a existência, a validade ou a eficácia da convenção de arbitragem ou do contrato em que ela se insira, ou a aplicabilidade da referida convenção.
2 - Para os efeitos do disposto no número anterior, uma cláusula compromissória que faça parte de um contrato é considerada como um acordo independente das demais cláusulas do mesmo.
3 - A decisão do tribunal arbitral que considere nulo o contrato não implica, só por si, a nulidade da cláusula compromissória.
4 - A incompetência do tribunal arbitral para conhecer da totalidade ou de parte do litígio que lhe foi submetido só pode ser arguida até à apresentação da defesa quanto ao fundo da causa, ou juntamente com esta.
5 - O facto de uma parte ter designado um árbitro ou ter participado na sua designação não a priva do direito de arguir a incompetência do tribunal arbitral para conhecer do litígio que lhe haja sido submetido.
6 - A arguição de que, no decurso do processo arbitral, o tribunal arbitral excedeu ou pode exceder a sua competência deve ser deduzida imediatamente após se suscitar a questão que alegadamente exceda essa competência.
7 - O tribunal arbitral pode, nos casos previstos nos n.ºs 4 e 6 do presente artigo, admitir as excepções que, com os fundamentos neles referidos, sejam arguidas após os limites temporais aí estabelecidos, se considerar justificado o não cumprimento destes.
8 - O tribunal arbitral pode decidir sobre a sua competência quer mediante uma decisão interlocutória quer na sentença sobre o fundo da causa.
9 - A decisão interlocutória pela qual o tribunal arbitral declare que tem competência pode, no prazo de 30 dias após a sua notificação às partes, ser impugnada por qualquer destas perante o tribunal estadual competente, ao abrigo das subalíneas i) e iii) da alínea a) do n.º 3 do artigo 46.º, e da alínea f) do n.º 1 do artigo 59.º
10 - Enquanto a impugnação referida no número anterior do presente artigo estiver pendente no tribunal estadual competente, o tribunal arbitral pode prosseguir o processo arbitral e proferir sentença sobre o fundo da causa, sem prejuízo do disposto no n.º 3 do artigo 5.º”
No caso dos autos, o Tribunal Arbitral entendeu em 13/7/2020, pelo Despacho n.º 6, ser o competente para apreciar os pedidos da Demandante, embora relativamente ao que ficou peticionado em d) («Declarar-se que, mesmo após a produção dos efeitos da denúncia, o R. continuou a procurar e usufruir da qualidade de clube fundador da A., nomeadamente não pagando as suas dívidas para com a FPF, sendo estas pagas pela A., a inscrever-se num torneio de Esports organizado pela Liga enquanto clube fundador da A., e a não prescindir dos direitos especiais que tem na A.»), na medida em que não respeita a factos relativos à execução do Protocolo referiu existir a dúvida sobre tal competência, pronunciando-se porém a respeito do seguinte modo:
Essa dúvida já foi antes debatida (a propósito do teor da resposta do Demandado ao requerimento de arbitragem, tendo-se refletido no texto da questão controvertida n.2 5 («Imposição pelo Protocolo datado de 5 de dezembro de 2012 de deveres de conduta a observar após a sua vigência, incumprimento de tais deveres pela Demandante e direito do Demandado a ser indemnizado pelos prejuízos daí resultantes (questão que não representa uma ampliação do poder jurisdicional dos árbitros resultante da cláusula compromissória»).
Não há razões para alterar agora a posição assumida na audiência preliminar”- ou seja, o Tribunal relegou para a final a decisão definitiva sobre esta questão, sendo que para todos os demais pedidos declarou-se desde logo competente: “Todos os demais pedidos da Demandante respeitam à execução do Protocolo, não parecendo suscitarem-se dúvidas sobre a competência dos árbitros para os julgarem”.
Sobre os pedidos formulados pelo demandando, em sede de reconvenção, igualmente referiram os Árbitros que “O n.° 1 da cláusula sétima do Protocolo levanta dúvidas de interpretação quanto ao que são as «receitas da compensação por formação e do mecanismo de solidariedade, nos termos dos regulamentos aplicáveis». Serão as pressupostas no pedido 2c) do Demandado ou estarão em causa outras?
O n.º 3 da cláusula sétima do Protocolo levanta dúvidas de interpretação quanto ao modo de cálculo das mais-valias nele referidas.
Sustenta a Demandante, na resposta à reconvenção, que as dúvidas levantadas pelo n.° 3 da cláusula sétima foram resolvidas em decisão tomada por outro tribunal arbitrai e o que mesmo teria acontecido quanto às pretensões do Demandado constante do pedido formulado sob 2c).
A verdade, porém, é que a Demandante não foi parte nesse processo, pelo que não existe caso julgado sobre as questões (o processo em causa teve como Demandante o Clube e como Demandada a sociedade Codecity Sport Management, Lda, como resulta do doc. 82 junto pela SAD).
Assim, impõe-se que seja permitida a discussão neste processo sobre o sentido dos n.°51 e 3 da cláusula sétima do Protocolo, bem como sobre os factos relevantes para sua aplicação. Por outras palavras: com os elementos disponíveis neste momento, os árbitros não se podem considerar incompetentes para apreciar os pedidos formulados pelo Demandado sob 2b) e 2C) e 2d). A discussão futura poderá conduzir a conclusão diferente.
Ora, a presente acção é um processo especial, de jurisdição voluntária, com as finalidades previstas nos artigos 1045º a 1047º do Código de Processo Civil, não sendo o processo adequado a apreciar e muito menos a declarar qualquer incompetência do Tribunal Arbitral.
O despacho proferido pelos Srs. Árbitros julgou a competência desse Tribunal em definitivo com excepção do peticionado em d) pela demandante e o peticionado em 2b) e 2c) e 2d), relativamente aos quais porém relegaram a decisão sobre a competência para final.
Deste Despacho foi dado conhecimento ás partes e não resultou demonstrado nos autos que a questão da competência sido impugnada perante os Tribunais estaduais (na terminologia da Lei) – e veja-se relativamente aos prazos para tanto o que resulta do art.º 18º, n.º 6 e n.º 9 da LAV.
Desta forma e como resulta do n.º 10 do art.º 18º da LAV, o Tribunal Arbitral pode prosseguir o processo arbitral e proferir sentença sobre o fundo da causa (conf. resulta ainda do art.º 5º, n.º 3, a contrario, da LAV).
Desta forma, improcede a alegação da recorrente de que deve ser indeferida a pretensão da Requerente com fundamento na incompetência do Tribunal Arbitral e no que aos documentos relativos ao período posterior a 30/6/2018.
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Do Erro na Forma de Processo.
Entendeu o Tribunal Arbitral “autorizar o Demandado a solicitar a intervenção do tribunal estadual na medida do necessário à produção da prova documental determinada e não cumprida”, o que fez ao abrigo do disposto pelo art.º 38º da LAV que regula a solicitação aos tribunais estaduais na obtenção de provas, como segue:
“1 - Quando a prova a produzir dependa da vontade de uma das partes ou de terceiros e estes recusem a sua colaboração, uma parte, com a prévia autorização do tribunal arbitral, pode solicitar ao tribunal estadual competente que a prova seja produzida perante ele, sendo os seus resultados remetidos ao tribunal arbitral.
2 - O disposto no número anterior é aplicável às solicitações de produção de prova que sejam dirigidas a um tribunal estadual português, no âmbito de arbitragens localizadas no estrangeiro.”
Mais entendeu o Tribunal Arbitral “A fim de evitar ambiguidades quanto ao âmbito da intervenção do tribunal estadual, reproduz-se a parte do despacho que ordenou à Demandante a junção dos documentos em causa:
«d) Determina-se que a Demandante junte:
1. Cópia dos mapas financeiros apresentados na Liga Portuguesa de Futebol Profissional respeitantes aos jogos em casa da Autora com o Benfica, Sporting e Porto nas épocas 2014/2015, 2015/2016, 2016/2017 e 2017/2018.
2. Informação sobre o montante de IVA liquidado sobre os convites respeitantes a todos os jogos referidos no número anterior.
3. Informação sobre os montantes recebidos ao abrigo do fundo/mecanismos de solidariedade da UEFA respeitantes às épocas 2016/2017 e 2017/2018, acompanhada da correspondente documentação de suporte;
4. Cópia de todos os contratos, qualquer que seja a sua natureza, que tenham sido celebrados com os…, mesmo aqueles que já não estejam em vigor, nomeadamente por terem sido modificados ou revogados.
5. Cópia de todos os contratos, qualquer que seja a sua natureza, incluindo de transferência, agenciamento, comparticipação em negócio ou outro, que tenham sido celebrados com terceiros e que digam respeito aos atletas…, incluindo (mas sem limitar) os que digam respeito aos respetivos direitos de formação desportiva, direitos económicos, direitos de imagem, mesmo aqueles que já não estejam em vigor, nomeadamente por terem sido modificados ou revogados.
 6. Cópia de todas as faturas, recibos ou quaisquer outros elementos contabilísticos integrados na contabilidade da Autora, emitidas pela Autora ou por terceiras entidades e que digam respeito às realidades referidas em 4. e 5., independentemente de existir contrato escrito.
7. Cópia de todos os contratos, de todas as faturas, de todos os recibos e referência de todas as datas de pagamento da correspondente contrapartida devida pela Autora, respeitante à utilização, pela Autora, do Complexo Desportivo … (relvado principal e adjacentes, bem como zonas técnicas ou outras) e do E…durante as épocas 2017/2018 e 2018/2019.
8. Informação sobre os montantes recebidos pela participação na Liga Europa na época 2015/2016, acompanhada da correspondente documentação de suporte.»
O art.º 38º da LAV não determina nem impõe qual o meio processual a utilizar para a produção de prova.
Intentada uma acção, não deixa se impor ao Tribunal estadual averiguar da adequação do meio processual que o requerente decidiu utilizar.
Como resulta do que acima se expôs relativamente à Obrigação de informação e de apresentação de coisas ou documentos, tal como prevista na Secção IX do Código Civil, processualmente há que distinguir consoante se pretende a apresentação de coisas ou documentos ou a prestação de informação.
Com o presente processo especial apenas prevê o Legislador que se determine a apresentação de coisas ou documentos que o possuidor ou detentor não queira facultar ao requerente, que deve justificar a necessidade da diligência.
E relativamente à obrigação de informação, prevista pelo art.º 573º do Código Civil, a forma processual adequada é a de processo comum.
Estamos assim perante uma cumulação de pedidos, tal como prevista pelo art.º 555º, n.º 1 do Código de Processo Civil, que refere que “Pode o autor deduzir cumulativamente contra o mesmo réu, num só processo, vários pedidos que sejam compatíveis, se não se verificarem as circunstâncias que impedem a coligação”; ora, no caso, dispõe o art.º 37.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, que não é admissível a coligação quando aos pedidos correspondam formas de processo diferentes.
Não foi proferido qualquer despacho a autorizar a cumulação e a adequar o processado.
Não há dúvida que o A. intentou uma acção especial para apresentação de documentos e, analisadas as pretensões do requerente, resulta que as mencionadas em 2; 3; 7, em parte e 8 não são susceptíveis de ser deferidas através do presente processo (nem a documentação aí referida, uma vez que a mesma pressupõe a prévia concretização e prestação de informação a que irão, eventualmente e em consequência do que for informado, servir de suporte), cabendo aqui razão à Recorrente.
Relativamente às restantes alíneas em causa, deve aproveitar-se o processado pertinente, face à pretensão do A. e ao meio processual do qual lançou mão, pelo que, ao abrigo do art.º 6º do Código de Processo Civil, deve ser apreciada a pretensão da A.
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Da Impertinência dos Documentos.
De acordo com o artigo 30º, n.º 4 da LAV, os poderes conferidos ao Tribunal Arbitral compreendem o de determinar a admissibilidade, pertinência e valor de qualquer prova produzida ou a produzir.
Assim, igualmente não cumpre a este Tribunal sindicar a admissibilidade, necessidade, pertinência ou ajuizar do valor probatório das diligências de prova determinadas pelo despacho n.º 10 ou das provas obtidas ou a obter.
Sintetizando o quadro legal que acima se referiu, no processo para apresentação de coisas ou documentos, verifica-se a existência dos seguintes requisitos:
- A existência do documento;
- Saber quem o tem;
- O requerente deve ter um interesse juridicamente atendível no exame da pretendida documentação:
- É ainda necessário que o possuidor ou detentor do documento não o queira facultar ao requerente e que não tenha motivos para fundadamente se opor à sua apresentação.
No caso, atenta a especificidade de esta ser uma acção intentada nos termos do art.º 38º da LAV, e como decorre sem sombra de dúvida do artigo 30º, n.º 4 do mesmo diploma, resulta que ao Tribunal não é licito averiguar sobre os dois últimos requisitos, que se pressupõem verificados pelo Tribunal Arbitral.
Mas diversamente relativamente aos dois primeiros, como a seguir se analisará.
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Da competência do Tribunal Estadual para proferir o despacho a convidar a A. para, em aperfeiçoamento ao seu requerimento inicial, concretizar devidamente todos os documentos cuja apresentação requer, esclarecendo, designadamente, todas as dúvidas suscitadas pela requerida na sua contestação.
Nos termos do art.º 1046º do Código de Processo Civil, intentada a acção para apresentação de documentos, o requerido é citado para, querendo, contestar.
Ora, nessa contestação, é lícito ao requerido expor as razões de facto e de direito por que se opõe à pretensão do autor – art.º 572º, b) do Código de Processo Civil, na falta de disposição específica para esta acção.
E julga-se que lhe é lícito opor, por exemplo, que o documento não existe – conf. art.º 431º do Código de Processo Civil; ou qualquer causa justificativa – conf. art.º 434º - na quais se entende poder incluir-se a questão das cláusulas de confidencialidade invocadas pelo Recorrente.
Por outro lado, perante uma determinação ampla como aquela que foi efectuada pelo Tribunal Arbitral e mercê igualmente da contestação da Recorrente, não está vedada ao Tribunal, ao abrigo dos seus poderes de gestão processual, proferir um despacho como aquele que proferiu (em resultado do qual poderiam até resultar ultrapassadas questões como as suscitadas pela recorrente, de inexistência de determinados documentos ou da necessidade de outros).
Já o que for decidido (ou a ausência de pronúncia) após o cumprimento do despacho em causa, é questão de que este Recurso não se ocupa, pelo que está nesta oportunidade vedado o seu conhecimento.
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Nestes termos, verifica-se a procedência parcial do Recurso, mantendo-se o Despacho Recorrido, com excepção do que respeita aos pedidos de informação contantes do peticionado pelo A. em 2; 3; parte do 7 e 8, relativamente aos quais o Recorrente deverá ser absolvido da instância (conf. art.º 576º, n.º 1; 577, f) (por aplicação deste regime ex vi art.º 555º, n.º 1) todos do Código de Processo Civil).
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Vencidos parcialmente na causa, são Apelante e Apelado responsáveis pelas custas devidas pelo Recurso, na proporção dos seus decaimentos, que se fixam em ¾ para a Apelante e ¼ para Apelado - conf. art.º 527º, n.º 1 e n.º 2 do Código de Processo Civil.
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DECISÃO:
Por todo o exposto, acorda-se em julgar parcialmente procedente o Recurso interposto e em consequência:
- Mantem-se o Despacho Recorrido, com excepção do que respeita aos pedidos de informação contantes do peticionado pelo A. em 2; 3; parte do 7 e 8, relativamente aos quais o Recorrente vai absolvido da instância.
Custas por Apelante e Apelado na proporção dos seus decaimentos, que se fixam em ¾ para a Apelante e ¼ para Apelado pela Apelada.
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Registe e notifique.

Lisboa, 4/11/2021
Vera Antunes  
Aguiar Pereira  
Teresa Soares