Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
248/14.0TCFUN.L1-6
Relator: CRISTINA NEVES
Descritores: AFETAÇÃO FUNCIONAL
PERDA DE RENDIMENTO
ESFORÇOS SUPLEMENTARES
PERDAS PATRIMONIAIS FUTURAS
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 09/20/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Sumário: I-A afectação da pessoa do ponto de vista funcional, ainda que não se traduza em perda de rendimento de trabalho efectiva, releva para efeitos indemnizatórios – como dano biológico – porque é determinante de consequências negativas ao nível da actividade geral do lesado e, especificamente da sua actividade laboral, diminuindo as alternativas que lhe seriam possíveis ou oferecendo menores possibilidades de progressão na carreira, bem como uma redução de futuras oportunidades no mercado de trabalho, face aos esforços suplementares necessários para a execução do seu trabalho.

II-Estes esforços suplementares constituem perdas patrimoniais futuras, ressarcíveis à luz do disposto no art. 564º, nº2, do Cód. Civil, tendo por base o rendimento efectivamente percebido pelo lesado.

III- As tabelas financeiras a que a jurisprudência recorre destinam-se a alcançar um minus indemnizatório, a corrigir e adequar às circunstâncias do caso através de juízos de equidade, que permitam a ponderação de variáveis não contidas nas referidas tabelas.

IV- Devendo a seguradora colocar à disposição do lesado veículo de substituição ou ressarcir este dano, tal não verifica quando, oferecendo-se a seguradora para efectuar a perícia 3 dias após o acidente, esta se não realiza por impedimento dos AA. e quando ordenada a reparação, esta se não realiza por não aceitação dos AA., manifestando estes perante a seguradora não pretender a reparação, não necessitarem deste veículo, pretendendo antes a entrega do valor da reparação.

Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os Juízes na 6ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:

RELATÓRIO

CM…, residente na Urbanização …, …, …-… Caniço, por si e em representação, como administrador, de T…–T..., S.A., com sede no Caminho …, n.º …, freguesia de …, …-… Funchal intentam contra … - COMPANHIA DE SEGUROS, S. A., que incorporou, por fusão, a … – Companhia de Seguros, S. A., com sede ao Largo …, …, Lisboa a presente acção declarativa de condenação, com processo comum, formulando os seguintes pedidos:
a) A condenação da ré a indemnizar o autor CA… a título de danos não patrimoniais no valor de € 194 270,60 e a título de danos patrimoniais no valor de € 534 561,41 e € 23.100,00 e a actualizar os valores e a acrescer os juros em dobro por não apresentação da proposta razoável prevista na alínea c) do n.º 1 ou na alínea b) n.º 2 do artigo 37.º e nos termos n.º 1 e 2 do art. 38º e 39º do Decreto-Lei n.º 291/2007, à taxa legal vigente, desde o dia seguinte ao acidente até o efectivo e integral pagamento;
b) A condenação da ré a indemnizar a autora T… – T… S.A. no valor de € 12 781,30 a título de danos patrimoniais e no valor € 15 000,00 e danos não patrimoniais no valor de € 250 000,00 e a actualizar os valores e acrescer os juros em dobro, nos termos do nº 1 e 2 do Artigo 38.º do Decreto-Lei 291/2007 à taxa legal vigente desde o dia seguinte ao acidente até o efectivo e integral pagamento.
Alegam para tanto, que no dia 15-01-2013, por volta das 19 h. e 45 min., no entroncamento entre o Caminho do Pilar e a saída da VR1, no Funchal, ocorreu um acidente de viação entre o veículo automóvel …-…-…, propriedade de MA… (que transferiu a sua responsabilidade decorrente dos riscos de circulação do veículo para a ré seguradora por contrato titulado pela apólice n.º …) e conduzido por AX… e o motociclo …-…-…, propriedade da autora T…, SA, conduzido pelo autor CA…, do qual resultaram ferimentos para o A., resultantes do desrespeito, por parte da condutora do BM, da regra de trânsito de aproximação de estrada com prioridade (Caminho do Pilar), onde circulava o autor CA….
Mais alegam que, em virtude dos ferimentos sofridos, o A. ficou impedido de exercer a sua actividade, tendo passado a ser auxiliado por outro engenheiro na consecução de tarefas laborais, o que se reflecte na imagem da empresa e nos ganhos actuais e futuros, o que estimam em € 510 938,36, a que acresce danos resultantes da perda do motociclo, invocando ainda a não apresentação de proposta em tempo razoável pela seguradora e danos decorrentes da não atribuição de veículo de substituição.
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Regularmente citada, a ré seguradora deduziu contestação alegando, em síntese, que o referido acidente assumiu a natureza de acidente de trabalho e de viação, tendo a Companhia de Seguros …, S.A., assumido a responsabilidade pelo pagamento das indemnizações pelos períodos de incapacidade temporária para o trabalho, despesas médicas, medicamentosas, cirúrgicas e fisioterapia, não podendo o A. cumular as pensões e indemnizações pagas por acidente de trabalho com as devidas por acidente de viação.
Mais alega que a reparação do motociclo não foi feita por discordância dos AA. e R. quanto ao valor de reparação e que o A. apenas em 4 de Junho de 2013 solicitou veículo de substituição, já após a reparação daquele motociclo que iria substituir o sinistrado, o que, juntamente com a recusa da reparação do motociclo e do acordo a que chegaram as partes, denota culpa do lesado na produção ou agravamento de danos.
Requereu ainda a intervenção principal da Companhia de Seguros … SA, para quem foi transferida pela entidade patronal do autor a responsabilidade decorrente de acidentes de trabalho, para que, intervindo como associada dos autores, possa deduzir eventual pedido de reembolso das quantias pagas.
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Foi proferido despacho que admitiu a intervenção principal da chamada Companhia de Seguros …, S. A. (cf. fls. 251 e 252 p.p.) que, uma vez citada, veio apresentar o seu articulado em que deduziu pedido de reembolso relativamente ao montante global de € 19 060,46 alegando, em síntese, que despendeu € 13 281,01 a título de indemnização por incapacidades temporárias e suportou as despesas hospitalares, tratamentos e exames, no valor de € 5 779,45, valores de que deve ser reembolsada, bem como dos montantes que vier a pagar a título de pensão.
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A ré seguradora contestou o pedido de reembolso.
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Foi citada a instituição de Segurança Social para, querendo, deduzir pedido de reembolso (cf. fls. 279 p.p.), que nada veio requerer.
Foi proferido despacho saneador, tendo sido fixado o objecto do litígio e foram enunciados os temas de prova, após o qual se procedeu à realização da audiência de julgamento, findo o qual foi proferida a seguinte
“Decisão
Com os fundamentos enunciados, decide este Tribunal julgar parcialmente procedente, por provada, a presente acção declarativa de condenação, com processo comum e, em consequência:
a. condenar a ré … – Companhia de Seguros, S. A. no pagamento ao autor CM… da quantia de € 47 549,00 (quarenta e sete mil quinhentos e quarenta e nove euros), a título de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais, acrescida de juros de mora, vencidos e vincendos, calculados à taxa legal de 4%, desde a data da presente decisão e até integral pagamento;
b. condenar a ré seguradora no pagamento ao autor das despesas que vier a efectuar com tratamento de fisioterapia e aquisição de medicação;
c. absolver a ré do demais peticionado pelo autor CA…;
d. absolver a ré do pedido deduzido pela autora T… – T…, SA;
e. condenar a ré … – Companhia de Seguros, S. A. no pagamento à interveniente principal …, SA da quantia de € 53 993,51 (cinquenta e três mil novecentos e noventa e três euros e cinquenta e um cêntimos), acrescida de juros de mora, vencidos e vincendos, à taxa legal de 4%, a calcular desde a data da notificação do pedido de reembolso e até integral pagamento, absolvendo-a do demais peticionado.
Custas a cargo dos autores, da interveniente principal e da ré, na proporção dos respectivos decaimentos.”
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Não conformados com esta decisão, impetraram os AA. recurso da mesma, formulando, no final das suas alegações, as seguintes conclusões, que se reproduzem:
“1. A condutora A…, no dia 15/01/2013, à saída da via rápida, no cruzamento com o Caminho do Pilar, onde existem placas de cedência de prioridade, desrespeitou essa regra de trânsito, e avançou e bloqueou a passagem do A., que circulava de mota, na sua mão de
trânsito, e, em estrada com prioridade, provocando embate entre a frente direita do carro conduzido pela A… e a frente da mota conduzida pelo A..
2. Do acidente resultaram lesões no A. CA…, e danos materiais no veículo/moto pertencente à A. T….
3. CA… fracturou as duas rótulas, pelo que foi submetido a cirurgia para fixação das mesmas.
4. CA…, no pós-operatório, esteve totalmente incapacitado profissionalmente durante 122 dias, tendo de usar canadianas.
5. CA…, quando regressou ao trabalho, continuou a usar canadianas durante muito tempo.
6. O A. tem direito a ser indemnizado pelos danos não patrimoniais sofridos, tendo em conta a intensidade das dores e a gravidade das sequelas e a inerente angustia e incerteza que se projectam na sua actividade de engenheiro e na sua gestão da empresa, que deve ser enérgica e não pode vacilar.
7. O A. era bem-humorado, alegre, trabalhador e, em consequência do acidente, perdeu o humor, tornou-se triste e ficou impedido de subir e descer andaimes, o que é indispensável na fiscalização das obras e no controle dos trabalhadores, que é trabalho que lhe compete.
8. E a A. T…, igualmente, ficou lesada, porque, antes, CA… acompanhava a execução das obras, dava ordens directas e enérgicas e imprimia celeridade, segurança e bem-estar aos subordinados, o que deixou de acontecer após o acidente.
9. A clientela, antes do acidente, tratava directamente, tudo com o A. CA…, que lhes gerava confiança e respeito, como engenheiro civil e como dono da empresa, com força e empenho, que lhes dava a garantia da eficiência e da alta qualidade dos serviços prestados.
10. E o exercício da actividade profissional de engenheiro, à data do acidente, é indissociável, do exercício da gestão e da administração da empresa, tanto no plano interno, na relação com os trabalhadores, como no plano externo, angariação e contacto directo com a clientela.
11. O défice funcional permanente de integridade físico-psíquico é de 15 pontos e não de 10.
12. As sequelas que ficaram registadas no A., CA…, são impeditivas do exercício da sua actividade profissional habitual de engenheiro civil.
13. A Meritíssima Juíz, “a quo” não considerou, e deveria ter considerado, o dano futuro, para efeitos de cálculo da indemnização, na medida em que houve, efectivamente, perda de ganho, tal como ficou demonstrado nos autos.
14. CA…, além das dores físicas, posteriores, sofreu ansiedade e medo, nos momentos que imediatamente antecederam o acidente.
15. A Meritíssima Juíz, “a quo”, não considerou, como deveria considerar, que os danos do A. eram previsíveis, em razão da perda de ganho, ou da diminuição efectiva de rendimentos, dadas as sequelas impeditivas.
16. As sequelas apresentadas pelo A., CA…, rigidez dolorosa a flexão de ambos os joelhos, e artrose pós-traumática integram-se na Tabela de Incapacidades em Direito Civil, no ponto MCO616 e no ponto MF1309 – o que lhe confere um índice funcional permanente de
integridade físico-psíquica de 15,084 pontos, sendo uma previsão fisiopatologicamente certa e segura o agravamento das sequelas com necessidade de artroplastia por artrose pós-traumática.
17. A Meritíssima Juíz “a quo”, ao calcular a indemnização não considerou o salário efectivo do A., que deveria considerar, porque houve perda de ganho, e optou pelo salário médio nacional, que só deveria optar quando não há perda de ganho.
18. A Meritíssima Juíz entendeu que a seguradora não é responsável pela entrega de veículo de substituição, e, esse entendimento viola as disposições legais já indicadas que regulam a matéria em causa.
19. O facto de tratar-se de acidente de viação e de trabalho não exclui a responsabilidade da seguradora.
20. A Meritíssima Juíz “a quo” julgou, como se o veículo/mota fosse propriedade individual do A. CA…, e tal veículo é propriedade exclusiva da T….
21. E o pedido do veículo de substituição foi feito pela A. T…, e não pelo A. CA….
22. O veículo da A. T… foi considerado como reparável, no entanto, tal veículo é irreparável, sob pena de não oferecer as condições de segurança que oferecia antes do acidente em causa.
23. Há perda total do referido veículo, uma vez que se constatou que o valor estimado para a reparação, adicionado ao valor do salvado, ultrapassa 120% do valor venal, dado que se trata de veículo com mais de 2 anos.
24. Foram impugnados e dever-se-á, proceder à alteração dos seguintes concretos pontos de facto, dados por provados:
a) Ponto 16;
b) Ponto 21;
c) Ponto 33;
d) Ponto 35;
e) Ponto 52;
f) Ponto 54;
g) Ponto 55;
25. Dever-se-á, ainda, proceder à alteração dos seguintes concretos pontos de facto, dados por não provados:
a) Ponto 8
26. Devem ser julgados provados (admitidos por acordo) os seguintes concretos pontos de facto:
a) Com a velocidade a que seguia, CA… foi arremessado para cima, caindo de joelhos (artigo 17º da petição inicial, parte final);
b) Temendo pela própria vida, pois, sentiu muitas dores ao tentar mobilizar-se e não tinha noção da gravidade das lesões que o acometeram (artigo 18º da petição inicial);
c) CA… foi informado pelo médico que o atendeu que deveria fazer uma cirurgia de imediato (artigo 18º da petição inicial);
d) Como não havia bloco operatório disponível no hospital Dr. Nélio Mendonça, o A. foi transferido (artigo 19º da petição inicial);
e) Teve dores na bacia e não conseguia dormir por não conseguir encontrar posição que lhe desse conforto (artigo 21º da petição inicial);
f) O tratamento com fisioterapia manteve-se até 08-07-2013; o tratamento prescrito não foi autorizado pela seguradora, facto que está a causar agravamento das sequelas (artigo 23º da petição inicial);
g) O A. apresenta grande amiotrofia dos quadricípites; instabilidade subjectiva dos joelhos; possível artrose fémur-patelar bilateral (provável necessidade de prótese total dos joelhos); anca dolorosa à esquerda; incapacidade permanente geral de 22 pontos, acrescido de 8 pontos
pelos danos futuros (artigo 24º da petição inicial);
h) As sequelas são impeditivas da profissão habitual, embora compatível com outras profissões na área de sua preparação técnico-profissional (artigo 24º da petição inicial);
i) É iminente o desenvolvimento de artroses nas articulações e a necessidade de nova cirurgia para colocação de prótese total dos joelhos (artigo 24º da petição inicial);
j) O A. CA… tem dores diárias e intensas nos joelhos esquerdo e direito e na bacia; necessidade de usar canadianas; caminha coxeando de forma bem visível; tem alterações do equilíbrio, pois, não tem força nos joelhos para levantar-se e tem que se apoiar nas canadianas em razão da instabilidade das pernas; para subir e descer escadas tem que ter apoio de terceiros ou das canadianas; tem redução da sua massa muscular nas pernas; ficou com encurtamento da perna; ficou com instabilidade subjectiva dos joelhos (artigo 25º da petição
inicial);
k) O A. CA… sente dores na frente dos joelhos, seguidas da sensação de que os joelhos vão deslocar a cada momento (artigo 26º da petição inicial);
l) As sequelas e lesões causam impossibilidade de controlo no andar (instabilidade subjectiva dos joelhos) e de levantar-se sem ajuda; impossibilidade de levar compras da garagem da sua casa para a cozinha, mesmo que não existissem escadas, como existem, que ligam esses recintos; apresenta limitações para conduzir, pois, só o pode fazer em breves percursos; ficou com estrutura muscular deficitária nas pernas; sente vergonha pela sua apresentação física após o acidente; tem passado a evitar actividade sexual em virtude das dores que sente durante e após o relacionamento sexual, facto que lhe causa grande mal-estar (artigo 27º da petição inicial);
m) Após o acidente, CA… tornou-se uma pessoa revoltada, apreensiva e triste, em razão das limitações físicas com que ficou, e sente grande desgosto por se ver diminuído (artigo 29º da petição inicial);
n) CA…, em razão das lesões e sequelas fica exposto a perigo, em situação de risco que necessite de marcha rápida (artigo 30º da petição inicial);
o) CA… ficou com instabilidade subjectiva dos joelhos, facto que lhe causa descontrolo no andar e já lhe causou acidentes, tendo por vezes caído e sofrido arranhões e outras lesões, que têm sido tratadas com auxílio de fármacos (artigo 31º da petição inicial);
p) As limitações físicas reduziram as actividades sociais e de lazer em família e que constituíam momentos de aproximação e carinho e fortaleciam os laços entre seus membros (artigo 32º da petição inicial);
q) CA… não consegue afastar de si a ideia de que, devido à sua incapacidade, não mais conseguirá desenvolver com competência as actividades compatíveis com as suas profissões de administrador e engenheiro civil, o que lhe causa angústia e medo do futuro (artigo 33º da petição inicial);
r) O A. tem dificuldade em realizar trabalhos que exijam muitas horas em posição sentado (trabalhos no computador, elaboração de projectos) pois sente dores nos joelhos quando ficam muito tempo dobrados; passou a ter de ser auxiliado por outro engenheiro nas tarefas laborais;
a importância do A. ficou fragilizada como engenheiro e como administrador, o que se reflecte nos ganhos actuais e futuros (artigo 45º da petição inicial);
s) O A. deverá ter que se submeter a outra cirurgia para fixação de próteses dos joelhos, conforme prescrição médica (artigo 54º da petição inicial);
t) Para o pagamento das referidas cirurgias, há uma previsão de gastos no valor de € 23 000,00 (artigo 54º da petição inicial).
Disposições violadas
Cód. Civil: art.º 483º, art.º 562º, art.º 562º, art.º 566º, art.º 569º, art.º 805º e art.º 1305º.
Dec. Lei nº 291/2007: art.º 36º, art.º 37º, art.º 38º, art.º 39º, art.º 40º, art.º 41º e art.º 42º
Termos em que deve ser dado provimento ao presente
recurso e, consequentemente, revogada a doutra
decisão recorrida e proferida nova decisão, que
considere procedente e prova a matéria de facto
impugnada, e julgando-se a acção procedente, nos
termos em que foi requerida na P.I.”
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Pela R. foram interpostas contra alegações, formulando afinal as seguintes:
IV - CONCLUSÕES:
1.Em face à fundamentação constante de fls. 584 verso e 591 verso da douta sentença, onde foi exposto o raciocínio referente à data do início do cálculo dos juros, no que se refere à indemnização arbitrada ao Autor CA…, ocorreu erro material na al. a) do dispositivo da sentença, cuja rectificação se requer, nos termos do disposto nos art.s 613º, nº2 e 614º, nºs 1 e 2 do C.P.C. e art. 249º do Código Civil, por forma a que onde conste no dispositivo “a. condenar a ré … – Companhia de Seguros, S. A. no pagamento ao autor CA… da quantia de € 47 549,00 (quarenta e sete mil quinhentos e quarenta e nove euros), a título de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais, acrescida de juros de mora, vencidos e vincendos, à taxa legal de 4%, a calcular desde a data da citação e até integral pagamento; (…)” passe a constar “a. condenar a ré … – Companhia de Seguros, S. A. no pagamento ao autor CA… da quantia de € 47 549,00 (quarenta e sete mil quinhentos e quarenta e nove euros), a título de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais, acrescida de juros de mora, vencidos e vincendos, à taxa legal de 4%, a calcular desde a data da presente decisão e até integral pagamento; (…)”
2.Caso assim não se entenda, dir-se-á que a sentença incorreu em nulidade, nos termos do disposto no art. 615º, nº1, al. c) do C.P.C, porquanto os fundamentos encontram-se em oposição com a decisão proferida, devendo a nulidade ser sanada, rectificando-se a al. a) do dispositivo, por forma a que os juros sejam calculados desde a data da sentença e não da citação.
3. A Recorrida adere à fundamentação fáctica e de direito constante da douta sentença recorrida, a qual fez uma correcta subsunção dos factos provados às normas aplicáveis, devendo confirmar-se a douta sentença recorrida, com ressalva da al. a) do dispositivo, que deverá ser rectificada, nos termos supra expostos, por forma a que os juros sejam calculados desde a prolação da sentença e não desde a data da citação.
Termos em que, deverá julgar-se improcedente o presente recurso e, em consequência, deverá ser mantida a douta sentença recorrida, com ressalva da al. a) do dispositivo, que deverá ser rectificada, por forma a que os juros sejam calculados desde a prolação da sentença e não desde a data da citação, porquanto só assim será feita,
JUSTIÇA!
Pede deferimento.”
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QUESTÕES A DECIDIR

Nos termos do disposto nos Artigos 635º, nº4 e 639º, nº1, do Código de Processo Civil, as conclusões delimitam a esfera de atuação do tribunal ad quem, exercendo uma função semelhante à do pedido na petição inicial. Esta limitação objetiva da atuação do Tribunal da Relação não ocorre em sede da qualificação jurídica dos factos ou relativamente a questões de conhecimento oficioso, desde que o processo contenha os elementos suficientes a tal conhecimento (cf. Artigo 5º, nº3, do Código de Processo Civil). Também não pode este Tribunal conhecer de questões novas que não tenham sido anteriormente apreciadas porquanto, por natureza, os recursos destinam-se apenas a reapreciar decisões proferidas.
Nestes termos, as questões a decidir que delimitam o objecto deste recurso, rectificada que foi a decisão proferida nos termos requeridos pela R. recorrida, consistem em apurar:
a) Da verificação dos requisitos para reapreciação da matéria de facto apurada no tribunal recorrido.
a) Se os danos sofridos pelos AA. decorrentes do acidente descrito nos autos, são valorizáveis, quer a nível de dano não patrimonial, quer a nível de dano moral, em montante superior ao fixado pelo tribunal recorrido;
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Corridos que se mostram os vistos aos Srs. Juízes adjuntos, cumpre decidir.
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FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

O tribunal recorrido considerou a seguinte matéria de facto:
1. No dia 15-01-2013, por volta das 19 h. e 45 min., no cruzamento ou entroncamento entre Caminho do Pilar e saída da VR1, localizado na cidade e concelho do Funchal, na Região Autónoma da Madeira, ocorreu um acidente de viação (artigo 1º da petição inicial).

2. No acidente referido em 1. foram intervenientes os seguintes veículos:
= Veículo 1: veículo automóvel, ligeiro particular, com o nº …-…-… de matrícula, do ano 2003, modelo Mitsubishi, CSO (LASER) de cor cinza, Chassi: …, propriedade de MA…, conduzido por AX…, cuja responsabilidade havia sido transferida para a … – Companhia de Seguros, apólice nº …;
= Veículo 2: com o nº …-…-… de matrícula, modelo mota Yamaha RP05, de cor azul, do ano 2001, Chassi: …, propriedade de “T… – T… S.A.”, conduzido por CA…, contribuinte nº …, cuja responsabilidade havia sido transferida para a Companhia de Seguros …, S.A. (artigos 2º e 58º da petição inicial).

3. O veículo 1 encontrava-se na saída da VR1 e entrada no Caminho do Pilar, Funchal, a saída da via VR1 estava sinalizada com triângulo pintado a branco no pavimento que indicava cedência de prioridade aos veículos que circulam no caminho do Pilar, sentido Sul/Norte (artigo 3º da petição inicial).

4. Existem placas de sinalização vertical indicando as mesmas cedências de prioridade, o local do acidente estava com boa visibilidade, com a iluminação pública activada e o piso encontrava-se seco e em bom estado de conservação (artigo 4º da petição inicial).

5. O veículo 2 circulava no caminho do Pilar, no sentido Sul/Norte – Funchal/Câmara de Lobos e tinha as luzes accionadas. O caminho do Pilar é uma estrada com duas vias de circulação, com prioridade sobre as vias adjacentes, para efeito de circulação de veículos (artigo 5º da petição inicial).

6. A condutora A… estava parada na saída da via rápida, mas, ao contrário do que pensou o autor CA…, não respeitou a regra de trânsito de aproximação de estrada com prioridade (Caminho do Pilar), marcada no chão da saída da VR1, onde este circulava e deu início à sua manobra de entrada no Caminho do Pilar, sem permitir a passagem do autor e sem se certificar de que não havia trânsito prioritário que impedisse a sua passagem (artigo 6º da petição inicial).

7. O veículo 2 ao passar no local que cruzava com a saída da VR1 foi embatido pelo veículo 1 que entrou no caminho do Pilar, no sentido Norte-Sul e em direcção ao Funchal, sem observar a prioridade da via (artigo 7º da petição inicial).

8. Em razão da colisão, o veículo 2 que circulava no sentido Sul/Norte foi arremessado para a outra faixa de circulação no sentido Norte/Sul do Caminho do Pilar. O condutor do veículo 2, o autor CA…, também foi projectado pelo ar para a outra faixa de circulação (artigo 8º da petição inicial).

9. O veículo 1 conduzido pela A…, após o embate, ficou imobilizado ao meio da faixa de rodagem do Caminho do Pilar, direccionado para a faixa de rodagem do lado contrário (artigo 9º da petição inicial).

10. O embate ocorreu entre a frente dianteira do carro conduzido pela A… e a frente da moto do autor CA… e, no momento do embate, este estava à frente do automóvel conduzido pela A… e no centro do entroncamento da saída da VR1 com o Caminho do Pilar (artigo 10º da petição inicial).

11. Os condutores dos veículos 1 e 2 foram submetidos a controlo do álcool, realizado pela PSP, sendo o resultado de 0,00 (qualitativa) para ambos os intervenientes (artigo 11º da petição inicial).

12. A propriedade do motociclo com a matrícula …-…-… encontra-se inscrita a favor de T… - T… Limitada, conforme registo n.º …, em 29-06-2010 (artigo 16º da petição inicial).

13. O autor CA…, no dia 15-01-2013, por volta das 19 h. e 45 min. estava a caminho do trabalho e conduzia o veículo 2 quando foi embatido pelo veículo 1 e foi projectado (artigo 17º da petição inicial).

14. MA… transferiu para a seguradora … – Companhia de Seguros, S. A. (actualmente, … – Companhia de Seguros, S. A.) a responsabilidade civil decorrente dos riscos de circulação do veículo com a matrícula …-…-… mediante contrato de seguro titulado pela apólice n.º … (artigo 96º da petição inicial e artigo 5º da contestação da ré … – Companhia de Seguros, SA).

15. CA… nasceu no dia 28 de Abril de 1954.

16. À data do acidente, CA…, engenheiro civil, era presidente do conselho de administração da sociedade autora T… – T…, SA, que tem por objecto social a actividade de construção civil e obras públicas, sendo responsável técnico pela execução de algumas obras (artigo 39º da petição inicial).

17. Em Dezembro de 2012, o autor auferia a remuneração mensal ilíquida no valor de € 2 500,00, acrescida de subsídio de alimentação no valor de € 181,92, auferindo o rendimento líquido mensal de € 1 854,45 (artigo 48º da petição inicial e artigo 3º do articulado da interveniente principal).

18. O autor CA… sofreu enorme ansiedade e medo nos momentos que imediatamente sucederam ao acidente, tendo sido assistido e depois transportado por ambulância para o Hospital Dr. Nélio Mendonça (artigo 18º da petição inicial).

19. No referido Hospital, CA… foi submetido a radiografia dos ossos da coxa, joelho e perna, apresentando fractura fechada bilateral das rótulas, tendo sido sujeito a imobilização por talas gessadas e recebido a seguinte medicação: Dalteparina sódica 500 mg, Diazepam 5 g, Esomeprazol 40 mg, Paracetamol 500 mg, Tramadol 100 mg (artigo 18º da petição inicial).

20. CA… foi transferido no dia 18-01-2013 para a Clínica de Santa Catarina, onde foi submetido a cirurgia de fixação das rótulas fracturadas no dia 19-01-2013 (artigo 19º da petição inicial).

21. No pós-operatório o autor CA… sentiu muitas dores e fez terapêutica anti-inflamatória e analgésica pós-cirurgia, tendo de usar auxiliares de marcha durante pelo menos duas semanas (artigo 20º da petição inicial).

22. Esteve internado na Clínica de Santa Catarina de 18-01-2013 a 24-01-2013 (artigo 20º da petição inicial).
23. Na sua residência, o autor CA… teve que improvisar uma estrutura para colocar na cama de modo a que os cobertores não tocassem nas suas pernas, pois, qualquer contacto causava dores (artigo 21º da petição inicial).

24. O autor CA… continuou em tratamento médico, foi submetido a novas radiografias e foram-lhe prescritas quarenta sessões de fisioterapia, que iniciou em Fevereiro de 2013 (artigo 22º da petição inicial).

25. Por via das lesões que suportou em consequência do acidente o autor CA… apresenta dificuldades na marcha após períodos de tempo, mais ou menos longos, em piso irregular; dificuldade em subir e descer escadas; não corre, salta ou ajoelha-se; sente dor ocasional nos joelhos durante a prática do acto sexual, cuja posição exija ficar ajoelhado; tem fenómenos dolorosos intermitentes nos joelhos; não consegue subir e descer andaimes ou árvores; apresenta ainda marcha ligeiramente claudicante (artigos 24º e 25º da petição inicial).
 
26. O autor deixou de poder nadar, actividade que praticava com regularidade quase diária, assim como de cuidar da sua horta (artigo 27º da petição inicial).

27. Em consequência das lesões o autor apresenta:
Membro inferior direito – perímetro da coxa igual a 47 cm (medido a 10 cm do polo superior da patela); perímetro da perna igual a 36 cm (medido a 12 cm do polo inferior da patela); cicatriz nacarada longitudinal de características operatórias na face anterior do joelho, medindo 11 cm de comprimento; cicatriz acastanhada na face anterior do joelho, medindo 3 cm de maior eixo por 2 cm de menor eixo; dor referida à palpação do contorno da patela e da face anterior desta; crepitação à flexão/extensão do joelho; rigidez dolorosa na flexão dos joelhos, limitada a 90º;
Membro inferior esquerdo – perímetro da coxa igual a 47 cm (medido a 10 cm do polo superior da patela); perímetro da perna igual a 36 cm (medido a 12 cm do polo inferior da patela); cicatriz nacarada longitudinal de características operatórias na face anterior do joelho, medindo 12 cm de comprimento por 0,5 cm de maior largura; cicatriz acastanhada na face anterior do joelho, medindo 3 cm de maior eixo por 2 cm de menor eixo; dor referida à palpação do contorno da patela e da face anterior desta; crepitação à flexão/extensão do joelho; rigidez dolorosa na flexão dos joelhos, limitada a 90º.

28. A consolidação médico-legal das lesões suportadas pelo autor CA… ocorreu em 29-08-2013.

29. O autor esteve afectado de défice funcional temporário total no período situado entre 16-01-2013 e 7-02-2013.

30. Esteve afectado de défice funcional temporário parcial no período situado entre 8-02-2013 e 29-08-2013.

31. No período situado entre 16-01-2013 e 17-05-2013 o autor esteve totalmente incapaz para o exercício da sua profissão.

32. No período situado entre 18-05-2013 e 29-08-2013 o autor esteve parcialmente afectado para o exercício da sua profissão.

33. As sequelas apresentadas pelo autor CA… - rigidez dolorosa na flexão de ambos os joelhos - integram-se no ponto Mc0616 da Tabela Nacional de Incapacidades em Direito Civil, o que lhe confere um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 10 pontos, sendo uma previsão fisiopatologicamente certa e segura o agravamento das sequelas.

34. O quantum doloris situa-se no grau 4 numa escala de sete graus de gravidade crescente.

35. As sequelas são compatíveis com o exercício da actividade profissional habitual do autor descrita em 16., implicando esforços suplementares.

36. O dano estético permanente que o autor apresenta situa-se no grau 3, numa escala de sete graus de gravidade crescente e a repercussão permanente nas actividades desportivas e de lazer também no grau 3.

37. A repercussão permanente das sequelas na actividade sexual situa-se no grau 3 numa escala de sete graus de gravidade crescente.

38. O autor tem necessidade de tratamento regular de fisioterapia e ajuda medicamentosa com analgésicos e anti-inflamatórios.
39. CA… é pai de três filhas (artigo 32º da petição inicial).

40. O autor poderá vir a ter de se submeter a cirurgia para extracção do material de osteossíntese caso venha a ocorrer uma infecção, rejeição ou deslocação do material (artigo 54º da petição inicial).

41. O autor despendeu com medicamentos, exames, fisioterapia e consultas médicas o valor global de € 233,65 (artigo 54º da petição inicial).

42. O motociclo com a matrícula …-…-… era utilizado pelo autor CA… para realizar as actividades da empresa T…, SA (artigo 59º da petição inicial).

43. O sinistro foi participado à ré … – Companhia de Seguros, SA em 16 de Janeiro de 2013 (artigo 11º da contestação).

44. Em 18 de Janeiro de 2013, a ré iniciou diligências com vista a confirmar a ocorrência do sinistro, bem como as respectivas consequências e responsabilidades e solicitou à GEP – Gestão de Peritagens, S.A, o envio de peritos com vista a recolherem todas as informações necessárias sobre o ocorrido, bem como a realização de peritagem à viatura (artigo 12º da contestação).

45. A GEP – Gestão de Peritagens, S.A. determinou o envio do perito averiguador MM… para contactar o autor no âmbito do que foi apurado que o acidente foi participado à seguradora Companhia de Seguros …, S.A. para a qual se encontrava transferida a responsabilidade infortunística por acidentes de trabalho que viessem a ocorrer com o autor (artigo 13º da contestação).

46. Foi designado o dia 18 de Janeiro de 2013, para a realização de peritagem ao motociclo, no estabelecimento da sociedade comercial LM…, Lda., concessionária e reparador autorizado da Yamaha na Região Autónoma da Madeira, oficina escolhida pela autora proprietária (artigo 14º da contestação).

47. Com data de 30 de Janeiro de 2013, a ré dirigiu ao autor uma carta com o seguinte teor:
“Exmo. Senhor
Na sequência do acidente ocorrido no dia 15-01-2013, informamos V. Exa., nos termos do Artº 37, nº1, alínea a), do DL 291/2007, de 21 de Agosto, que nos disponibilizamos para realizar a avaliação dos danos corporais dele resultantes.
Essa avaliação, que se insere no âmbito da instrução do processo e não representa qualquer compromisso da nossa parte quanto à assunção da responsabilidade, será efectuada por perito médico a designar pela Seguradora, em local, dia e hora a informar.
Em face ao exposto, agradecemos que nos contacte, com a maior brevidade possível, para marcação do referido exame.[ ]” (artigo 15º da petição inicial).

48. No momento do embate, o autor CA… dirigia-se para o seu local de trabalho, tendo o sinistro sido considerado acidente de trabalho in itinere pela sua entidade patronal, T… – T…, S.A., bem como pela Companhia de Seguros …, S.A. para a qual se encontrava transferida a responsabilidade infortunística por acidentes de trabalho que viessem a ocorrer com o autor, e que participou o acidente ao Tribunal do Trabalho (artigo 23º da contestação).

49. A T… - T…, Lda. celebrou com a Companhia de Seguros …, S. A. um contrato de seguro do ramo Acidentes de Trabalho para trabalhadores por conta de outrem, na modalidade de prémio variável, titulado pela apólice n.º … que, em 15-01-2013, cobria os acidentes de trabalho sofridos pelo trabalhador CA… (artigos 1º e 2º do articulado da interveniente principal).

50. Com data de 6 de Fevereiro de 2013, a Companhia de Seguros …, S.A. comunicou à ré que estava a indemnizar o sinistrado CA… de acordo com o contrato de seguro de acidentes de trabalho subscrito pela sua entidade patronal, titulado pela apólice nº …, manifestando o interesse em exercer, nos termos do Art. 17º da Lei nº98/2009, o direito de regresso quanto às quantias que viesse a despender (artigo 26º da contestação).

51. A Companhia de Seguros …, S.A prestou assistência médica, cirúrgica, medicamentosa e de fisioterapia ao autor no âmbito da apólice referida em 49. (artigo 41º da contestação).
52. Após o sinistro, o motociclo foi rebocado, a pedido dos autores, para a oficina LM…, Lda., concessionária e reparadora autorizada da Yamaha na R.A.M. (artigo 50º da contestação).

53. A peritagem apenas teve início a 23 de Janeiro de 2013, por indisponibilidade dos autores para a sua realização em data anterior, tendo sido concluída com carácter definitivo a 30 de Janeiro de 2013 (artigo 52º da contestação).

54. Na sequência da peritagem fixou-se como custo de reparação do motociclo o valor de € 3 074,45, acrescido de IVA à taxa de 22%, no valor de € 676,38, no total de € 3 750,83 (artigo 53º da contestação).

55. O motociclo era técnica e materialmente reparável (artigo 56º da contestação).

56. A oficina indicada pelo autor aceitou reparar o motociclo pelo preço de € 3 750,83, com IVA incluído (artigo 57º da contestação).

57. Com data de 25 de Fevereiro de 2013, a sociedade incorporada … – Companhia de Seguros, S.A. remeteu carta ao autor a informar que a peritagem da viatura é definitiva, informação que já fora transmitida à oficina reparadora, devendo aquele articular com a oficina o início da reparação (artigo 59º da contestação).

58. Estava previsto o dia 12 de Março de 2013 para o início de reparação do motociclo ZL, na “LM…, Lda.”, sendo o prazo de reparação de dois dias (artigo 60º da contestação).

59. Os autores não deram autorização para a reparação do veículo, apesar de informados para o efeito (artigo 61º da contestação).

60. Com data de 20 de Março de 2013, os autores remeteram carta à sociedade incorporada … – Companhia de Seguros, S.A. a solicitar que lhes fosse pago o valor da reparação do veículo, ou seja, o valor proposto pagar à oficina da Yamaha (3 200,00€), mais os salvados (artigos 61º da petição inicial e 62º da contestação).
61. Com data de 21 de Março de 2013, a sociedade incorporada … – Companhia de Seguros, S.A. remeteu à sociedade autora a mensagem de correio electrónico que consta de fls. 76 p.p. e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, dando conta que estava a analisar o pedido (artigos 62º da petição inicial e 63º da contestação).

62. Com data de 26 de Abril de 2013, o autor, na qualidade de administrador da T… – T…, S.A. enviou à sociedade incorporada … – Companhia de Seguros, S.A. uma mensagem de correio electrónico com o seguinte teor: “Atendendo à minha impossibilidade de conduzir motas devido ao acidente ocorrido em 15/01/2013, venho por este meio solicitar que me seja restituído o valor venal do veículo matrícula …-…-…. Para tal solicito que me seja enviada uma proposta para este efeito, bem como uma cópia do orçamento da oficina Yamaha, para a eventual reparação.” (artigos 62º da petição inicial e 64º da contestação).

63. Com data de 29 de Abril de 2013, a sociedade incorporada … – Companhia de Seguros, S.A. respondeu, confirmando, por escrito, o teor da conversa telefónica ocorrida em 04-04-2013, ou seja, que era sua intenção proceder à reparação do motociclo (artigo 65º da contestação).

64. Com data de 2 de Maio de 2013, a autora respondeu o seguinte: “No seguimento de email de V. Exas. do dia 29/04/2013, informo que a proposta do meu segundo email é diferente do primeiro que vos foi enviado. Volto a insistir que actualmente não é do meu interesse reparar o motociclo pelo que solicito que me seja feita uma proposta alternativa à reparação, isto é, me seja restituído o valor comercial do veículo. Mais uma vez solicito que me seja enviada cópia do orçamento da reparação.[]” (artigo 66º da contestação).

65. Com data de 4 de Junho de 2013, os autores, por intermédio da ilustre advogada Dr.ª NS…, remeteram à ré uma mensagem de correio electrónico, requerendo o pagamento do valor da indemnização por perda total do veículo, a realização de avaliação corporal ao autor, a disponibilização à sociedade autora de um veículo de substituição e que seja prestada informação regular sobre o andamento do processo, conforme documento de fls. 79 a 84 p.p. cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais (artigos 63º da petição inicial e 17º e 67º da contestação).

66. Com data de 5 de Junho de 2013, às 16 h. e 50 min., a sociedade incorporada … – Companhia de Seguros, S.A. respondeu aos autores informando o seguinte:“[] No seguimento da nossa conversa telefónica de há pouco, próxima 6ª feira entrarei em contacto para uma conversa mais detalhada sobre este assunto. Melhores cumprimentos.” (artigo 64º da petição inicial e artigos 18º e 68º da contestação).

67. Com data de 7 de Junho de 2013, às 12 h. e 04 min., a sociedade incorporada … – Companhia de Seguros, S.A. contactou os autores por mensagem de correio electrónico dirigida à respectiva mandatária, informando o seguinte: “No seguimento da nossa conversa telefónica de há pouco, venho por este meio confirmar a minha proposta no valor de 3.000 Euros como indemnização por todos os danos sofridos pelo motociclo …-…-…. Os salvados deste motociclo continuam na posse do seu proprietário. Este valor será liquidado contra a entrega de uma cópia do Título de Registo de Propriedade que comprove a titularidade do veículo em causa. Fico a aguardar pelas notícias que entender convenientes. []” (artigo 64º da petição inicial e artigos 18º e 69º da contestação).

68. Ainda com data de 7 de Junho de 2013, às 19 h. e 29 min., a sociedade incorporada … – Companhia de Seguros, S.A. dirigiu à ilustre mandatária dos autores uma mensagem de correio electrónico com o seguinte teor: “Em resposta ao seu email de hoje e embora lamentando, informo não me ser possível satisfazer a vossa pretensão. Na verdade, não é aceitável pagar praticamente o valor da reparação com IVA quando o proprietário do motociclo não pretende efectuar a mesma. Não quero deixar de salientar que a oficina onde se realizou a peritagem mantém a disponibilidade para reparar o motociclo pelo valor acordado com o nosso Perito Avaliador o que me foi confirmado pelo mesmo através de conversa telefónica há pouco ocorrida. Anexo o orçamento acordado entre a oficina, concessionária da marca, e o nosso referido Colaborador (total com IVA: 3750,83 Euros). Assim sendo, apenas me é possível resolver este assunto mediante uma das seguintes alternativas: pagamos a reparação na oficina onde foi feita a peritagem e com a qual concordámos o referido valor ou então liquidamos directamente ao proprietário do motociclo o valor da reparação sem IVA, ou seja, o montante de 3.074,45 Euros com salvados do motociclo a continuar na posse do seu proprietário. Creio que é o máximo que consigo propor. Reafirmo que no caso de ser aceite a 2ª alternativa é imprescindível cópia do documento que comprove a titularidade do veículo em causa. Fico a aguardar pelas notícias que entender convenientes. []” (artigo 70º da contestação).

69. A sociedade autora comunicou ao Instituto de Seguros de Portugal os factos ocorridos por entender que a proposta da seguradora não contemplava todos os danos, conforme documento de fls. 87 e 88 p.p. cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais (artigo 65º da petição inicial).

70. Com data de 26 de Junho de 2013, a sociedade incorporada … – Companhia de Seguros, S.A. dirigiu uma carta ao autor com o seguinte teor:
“Exmo. Senhor,
No seguimento do nosso contacto telefónico e na sequência do sinistro ocorrido no dia 15-01-2013, reiteramos a informação de que, nos termos do Art.º 37, nº1, al. a), do DL 291/2007, de 21 de Agosto, estávamos disponíveis para realizar a avaliação dos danos corporais dele resultantes.
Contudo, pelos elementos recolhidos consideramos que não existe, necessidade de marcação dessa avaliação clínica, uma vez que se encontra a ser assistido (a) na Seguradora de Acidentes de Trabalho.
Estamos no entanto disponíveis para, a qualquer momento, reavaliar a situação prestando todos os esclarecimentos que entenda úteis.
Apresentando os nossos melhores cumprimentos, subscrevemo-nos,[]”(artigo 19º da contestação).

71. Com data de 27 de Junho de 2013, a ré enviou carta à mandatária dos autores com o seguinte teor: “Exma. Senhora, Dr.ª Reportamo-nos à correspondência de V. Exa., de 4/6/2013 dirigida aos nossos serviços, através de e-mail para o apoio ao cliente, e à que nos chegou através do Instituto de Seguros de Portugal cujo teor mereceu a nossa melhor atenção. No seguimento da mesma foram efectuadas as diligências necessárias para o esclarecimento rigoroso da situação relatada. Informamos, nos termos e para os efeitos previstos no DL 291/2007, de 21 de Agosto, que estamos a assumir a responsabilidade no presente sinistro. Relativamente a danos materiais da viatura do seu constituinte T…, com a matrícula …-…-…, informamos que será contactada pelo nossos colaborador Sr. RP…. com vista à resolução do assunto e diferendo em questão, com o qual até já falou e houve troca de e-mails sobre o assunto. Quanto a danos corporais, há a referir que o seu Constituinte CA…, está a ser assistido por Acidentes de Trabalho, pela nossa Congénere …, através do processo nº …. Quanto à convocatória para consulta, esclarecemos que a mesma foi efectuada a 30-01-2013, conforme cópia que anexamos. No entanto, salvo erro da nossa parte, não recepcionámos qualquer resposta à mesma. Posteriormente, tendo conhecimento que o seu constituinte estava a ser assistido por Acidentes de Trabalho, entendemos que neste momento não se justifica efectuar a avaliação clínica, em virtude de a regularização efectiva dos danos estar a cargo da nossa Congénere …. Mais se dirá, que havendo Acidentes de Trabalho a regularização dos danos corporais, compete à Companhia de Acidentes de Trabalho, a não ser que o lesado opte por regularizar por Acidente Automóvel, o que não se verificou. Mais informamos que o constituinte de V. Exa., quando foi contactado pelo perito averiguador, desde logo referiu que o acidente foi comunicado a Acidentes de Trabalho e estava a ser assistido por aqueles. Nestes termos, compete-nos acompanhar o processo de Acidentes de Trabalho e após regularização dos danos por aqueles e caso haja danos que não sejam regularizados ao abrigo de acidente de trabalho, como por exemplo danos em objectos, então ai e apenas no final daquele processo, após sabermos o que foi liquidado, é que poderemos liquidar as verbas da nossa responsabilidade. Assim informamos, que aguardamos pela conclusão do processo da nossa Congénere, a fim de quantificarmos os danos decorrentes do presente sinistro, e que sejam da nossa responsabilidade perante o seu constituinte. Ficamos, assim, na expectativas das prezadas notícias de V. Exa. e, entretanto, apresentarmos os nossos melhores cumprimentos, []” (artigos 20º e 71º da contestação).

72. No dia 2 de Julho de 2013, ocorreu uma reunião entre os representantes da sociedade incorporada … – Companhia de Seguros, S.A. e da autora, na sede desta, tendo as partes acordado que a seguradora pagaria, a título de quitação geral de danos no que se refere ao motociclo, a quantia de € 3 750,00 (sendo € 3 074,45 referente ao custo de reparação do motociclo sem o IVA e € 675,55 a título de indemnização pela paralisação da viatura), a que acresceriam os salvados, que ficavam na posse da autora (artigo 72º da contestação).

73. Com data de 2 de Julho de 2013, às 19 h. 46 min., após a realização da reunião, a autora enviou à sociedade incorporada … – Companhia de Seguros, S.A., uma mensagem de correio electrónico com o seguinte teor: “A Yamaha está a cobrar despesas pela estada e pela elaboração do orçamento dos danos do veículo, mota Yamaha RP05, matrícula nº …-…-…, de propriedade da T… – T…, S.A. que entendemos que são da responsabilidade da seguradora pelas seguintes razões de facto e de direito: A T… foi obrigada a manter o veículo na oficina da Yamaha porque, a … – Companhia de Seguros, S.A., contrariando a Lei, afirmava que só poderia reparar o veículo, inclusive dizendo que o prazo par reparação estava a se esgotar. Desse modo, de forma ilegal, meu cliente, era pressionado pela seguradora, a concordar com a reparação e por receio e mediante coacção de perder a reparação, não retirou o motociclo da Yamaha. Desse modo, a T… requer o pagamento das despesas acima mencionadas.” (artigo 73º da contestação).

74. Com data de 3 de Julho de 2013, às 14 h. e 12 min., a sociedade incorporada … – Companhia de Seguros, S.A. respondeu nos seguintes termos: “Estou a diligenciar para lhe dar uma resposta definitiva sobre este assunto. Agradeço que aguarde. Cumprimentos.” (artigo 74º da contestação).

75. No mesmo dia 3 de Julho de 2013, às 16 h. 41 min., a sociedade incorporada … – Companhia de Seguros, S.A. respondeu nos seguintes termos: “Junto da oficina onde se realizou a peritagem onde se encontra o motociclo …-…-… apurei que o valor a pagar são 210 Euros (Sr. R…) Apresentando as minhas desculpas por contrariar frontalmente o teor do seu último mail, entendo que tal valor não é da responsabilidade da Seguradora. Por esse motivo, fui forçado a pedir instruções superiores para saber se o posso considerar uma vez que é o mesmo que nos separa de um acordo definitivo para a resolução de todos os danos sofridos pelo motociclo em causa. Para já e no seguimento da nossa reunião de ontem, apenas posso confirmar a minha proposta no valor de 3.750 Euros mais salvados para se encerrar este processo. Espero ter uma resposta de Lisboa entre hoje e amanhã. Assim que tal acontecer voltarei ao contacto. []” (artigo 75º da contestação).

76. No dia 3 de Julho de 2013, às 19 h. e 49 min., a autora respondeu nos seguintes termos: “Os factos relatados no e-mail anterior podem ser provados, ou seja, que o representante da T… – T…, S.A. sofreu coacção para fazer a reparação da mota Yamaha RP05, matrícula n.º …-…-…, na oficina da Yamaha no Funchal, e que a referida reparação seria pago pela … – Companhia de Seguros, S.A. Os actos de coacção partiram de forma directa da oficina da Yamaha, que fazia parecer que agia sob as ordens da seguradora. Porém, se a oficina da Yamaha agiu em nome da seguradora, sem autorização da mesma, penso que estamos frente a responsabilidade civil e também, penal, pois, actos de coacção, constrangimento ilegal e fraude são crimes punidos com prisão e demais penas. Se assim for, ou seja, se a seguradora não tiver praticado os actos acima exarados, directa ou indirectamente, entendo que a responsabilidade poderá não ser da seguradora, como vossa Excelência afirmou no e-mail anterior. Desse modo, gostaria que nos fosse informado se os representantes da Oficina da Yamaha no Funchal não foram autorizados por esta seguradora, para tratarem do assunto da reparação da mota Yamaha RP05, matrícula n.º …-…-…, para que se possa representar uma queixa-crime contra os representantes da oficina da Yamaha pelos actos acima descritos com as demais responsabilidades legais e assim, darmos seguimento ao acordo proposto por esta seguradora.[]” (artigo 76º da contestação).

77. A sociedade incorporada … – Companhia de Seguros, S.A. respondeu a 4 de Julho de 2013, às 13 h. 15 min., nos seguintes termos: “No seguimento dos nossos anteriores contactos e da nossa conversa telefónica de há pouco, venho por este meio confirmar que estamos disponíveis para liquidar o valor de 3.960 Euros como indemnização por todos os danos sofridos pelo motociclo …-…-… propriedade da T…, T… Limitada. Os salvados deste motociclo continuam na posse da T…. Como pode verificar, no valor acima indicado já está incluída a despesa no valor de 210 Euros que é reclamada pela Oficina (Sr. R…) onde o veículo se encontra. Para que possa emitir a respectiva ordem de pagamento a favor da T…, fico a aguardar que por esta mesma via confirme a sua anuência a este nosso acordo. []” (artigo 77º da contestação).

78. Em 5 de Julho de 2013, às 22 h. 02 min., a autora respondeu nos seguintes termos: “A T… – T…, S.A. número único de matrícula e de identidade fiscal nº … está a sofrer danos materiais e morais, a partir de 15/01/2016, data do acidente automobilístico envolvendo a mota Yamaha RP05, matrícula nº …-…-… da sua propriedade: Os danos materiais envolvem o automóvel e o trabalho desta sociedade. Os danos materiais do automóvel estão exarados no laudo pericial e no orçamento. Os danos materiais envolvendo as actividades da T… são claros, pois, a mota era usado como transporte do gerente desta sociedade para resolver as actividades da T…. Além, disso, o automóvel também, era usado para resolver problemas administrativos, pois era um automóvel de baixo consumo de combustível e é de fácil estacionamento. A ausência do automóvel obrigou o gerente da T… a usar o automóvel pessoal para fazer as actividades desta sociedade; a T… teve que pagar táxi, deslocar automóvel de serviços para suprir o deficit do veículo avariado e ainda, teve que reparar outra Yamaha. O acidente em questão, além de ter causado danos materiais directos, causou também, danos materiais indirectos para a T…, pois, o gerente desta seguradora, em razão das lesões físicas, causados pelo acidente, deixou de realizar tarefas importantes para a sociedade e actualmente labora de forma limitada, facto, que causa dano à T…. Desse modo, considerando, que o valor da reparação é maior que o valor comercial do veículo e que a seguradora insistia em querer fazer a reparação em valor maior que o valor comercial do veículo, e ainda, que não houve a entrega do veículo de substituição, é dever da seguradora indemnizar os danos causados, conforme determina a Lei. Além desses danos, houve comportamentos ilegais de agentes envolvidos na reparação, que causaram danos morais e que devem ser apurados. Lei n.º 291/2007 Art. 41. - 1 — Entende -se que um veículo interveniente num acidente se considera em situação de perda total, na qual a obrigação de indemnização é cumprida em dinheiro e não através da reparação do veículo, quando se verifique uma das seguintes hipóteses: c) Se constate que o valor estimado para a reparação dos danos sofridos, adicionado do valor do salvado, ultrapassa 100 % ou 120 % do valor venal do veículo consoante se trate respectivamente de um veículo com menos ou mais de dois anos. 3 — O valor da indemnização por perda total corresponde ao valor venal do veículo antes do sinistro calculado nos termos do número anterior, deduzido do valor do respectivo salvado caso este permaneça na posse do seu proprietário, de forma a reconstituir a situação que existiria se não se tivesse verificado o evento que obriga à indemnização. Artigo 42º Veículo de substituição 1 — Verificando -se a imobilização do veículo sinistrado, o lesado tem direito a um veículo de substituição de características semelhantes a partir da data em que a empresa de seguros assuma a responsabilidade exclusiva pelo ressarcimento dos danos resultantes do acidente, nos termos previstos nos artigos anteriores. 2 — No caso de perda total do veículo imobilizado, nos termos e condições do artigo anterior, a obrigação mencionada no número anterior cessa no momento em que a empresa de seguros coloque à disposição do lesado o pagamento da indemnização. 3 — A empresa de seguros responsável comunica ao lesado a identificação do local onde o veículo de substituição deve ser levantado e a descrição das condições da sua utilização No entanto, a T…, apesar de todos os danos acima descritos, porém, para evitar maiores danos, está disposta a fazer um acordo que compreenda o seguinte: o valor comercial do automóvel que é aproximadamente 3.500 € (três mil e quinhentos euros), uma indemnização pela não entrega do automóvel de substituição, tendo em atenção o número de dias em que a Demandante esteve privado do seu automóvel e o preço médio do aluguer diário de um veículo de idêntica ou similar categoria e as despesas com a oficina da Yamaha. À quantia assim apurada, deveria ser acrescida de juros de mora, à taxa legal vigente, desde o dia seguinte ao acidente até efectivo e integral pagamento – cfr. art.ºs 804º e 805, n.º 1 do C. Civil, porém, tendo em conta os danos que a sociedade está a sofrer e para viabilizar o acordo proposto, a T… prescinde de receber os juros de mora, previsto na Lei Civil, a fim de resolver o problema o mais breve possível. De qualquer forma, caso não haja interesse desta seguradora em celebrar o acordo proposto, a T… declara que continua e espera do automóvel de substituição. Com os melhores cumprimentos.” (artigo 78º da contestação).

79. No dia 09 de Julho de 2013, às 13 h. e 54 min., a sociedade incorporada … – Companhia de Seguros, S.A. respondeu nos seguintes termos: “Informo que o teor do seu mail de 5/7/13 mereceu a nossa melhor atenção. Contudo, face ao já por nós exposto designadamente na nossa reunião de 2/7/13 e aos desenvolvimentos posteriores, venho por este meio confirmar a nossa proposta no valor de 3.960 Euros como indemnização por todos os danos sofridos pelo motociclo …-…-…. Os salvados deste veículo continuam na posse do seu proprietário. Caso este valor mereça a aceitação de V. Exa., darei de imediato instruções para que a respectiva ordem de pagamento seja enviada para a morada que nos foi indicada na nossa referida reunião. Creia que é o valor máximo que consigo atingir. Ficando a aguardar pelas notícias que entenda convenientes, apresento os melhores cumprimentos.” (artigo 79º da contestação).

80. Com data de 5 de Agosto de 2013, pelas 03 h. e 37 min., a mandatária da autora enviou uma mensagem de correio electrónico com o seguinte teor: “A T…, volta a informar que está disposta a receber o valor de 3.500 (três mil e quinhentos euros) referente ao pagamento da indemnização do motociclo …-…-…. Com melhores cumprimentos.” (artigo 80º da contestação).

81. Na sequência disso, o perito da ré, Sr. RP…, contactou telefonicamente a autora, na pessoa da sua ilustre mandatária, para aferir o motivo por que pretendia apenas o pagamento de € 3 500,00, que esclareceu que este seria apenas para reparação dos danos causados no motociclo, e, posteriormente, iria quantificar os danos referentes à imobilização do veículo, bem como as despesas pagas à oficina para o seu levantamento e solicitar o reembolso à seguradora, o que por esta foi recusado (artigos 81º a 83º da contestação).

82. Com data de 16 de Agosto de 2013, às 12 h. e 09 min., a ré dirigiu à autora uma mensagem de correio electrónico com o seguinte teor: “(…) Acusamos a recepção do seu mail de 5/8/13 que agradecemos. Em resposta ao mesmo e confirmando a nossa conversa telefónica de 8/8/13, venho por este meio reafirmar o que ficou por mim dito nos meus mails de 4 e 9 de Julho de 2013. Na verdade, na reunião que tivemos no Funchal na presença do Sr. Eng. CA…, representante da Empresa proprietária do motociclo, chegámos a acordo pelo valor de 3.750 Euros como indemnização por todos os danos, incluindo a imobilização, sofridos pelo motociclo …-…-… cujo salvado continuava na posse do seu proprietário. Posteriormente, colocou-se a questão da despesa a pagar à oficina para que a Empresa sua cliente pudesse levantar o motociclo, única situação que não foi acautelada na nossa reunião. Falámos com a oficina (Sr. R…) que nos disse que o valor em causa era no montante de 210 Euros que, imediatamente, adicionámos ao valor que tínhamos acordado na referida reunião, resultando o valor global de 3960 Euros por mim então proposto. Por razões que ainda não consegui compreender, a Empresa sua cliente decidiu não aceitar este valor. Contudo, por tudo o que já lhe transmiti tanto por mail como através das várias conversas telefónicas que tivemos, sou forçado a manter este valor – 3.960 Euros – como indemnização por todos os danos sofridos pelo motociclo …-…-… cujo salvado continua na posse do seu proprietário. Mantenho total disponibilidade para prestar qualquer esclarecimento adicional. []” (artigo 84º da contestação).

83. A sociedade autora possui vinte e dois veículos registados em seu nome, entre os quais os motociclos Yamaha …-…-… e …-…-…, sendo que à data do sinistro eram utilizados, pelos engenheiros e encarregado geral, quatro veículos automóveis ligeiros (artigo 98º da contestação).

84. A autora “T… – T… S.A.” retirou o motociclo da oficina e pagou o valor de € 210,00 pelo serviço do orçamento e armazenamento do veículo no estabelecimento (artigo 67º da petição inicial).

85. O blusão que o autor vestia ao momento do acidente ficou rasgado e o capacete riscado (artigo 70º da petição inicial).

86. A seguradora não forneceu à sociedade autora um veículo de substituição (artigo 70º da contestação).

87. As facturas n.ºs 160/13 e 192/13 emitidas pela LM…, Lda. em nome da T… – T… Lda. relativas à reparação do motociclo Yamaha com a matrícula …-…-…, com datas de 6-05-2013 e de 27-05-2013, no valor de € 206,51 e € 202,48, respectivamente, foram pagas pela autora em 27-05-21013 e 24-07-2013 (artigo 70º da petição inicial).

88. A autora procedeu ao pagamento do imposto de circulação relativo ao motociclo …-…-… atinente aos anos de 2013 e 2014, no valor total de € 243,73 (artigo 70º da contestação).

89. O administrador da sociedade autora, o autor CA…, na execução das suas actividades, acompanhava as obras e dava ordens aos empregados e tratava directamente com os fornecedores da sociedade (artigo 75º da petição inicial).
90. Os clientes da sociedade autora podiam ser contactados directamente pelo administrador para tratar das questões relativas à contratação e execução de serviços, pagamentos e quaisquer factos relativos às actividades da T…, SA, o que neles gerava confiança e segurança (artigo 75º da petição inicial).

91. Relativamente aos exercícios dos anos de 2012 e 2013 a sociedade T…- T…, SA obteve um lucro tributável no valor de € 87 404,83 e de € 103 036,29, respectivamente (artigo 77º da petição inicial).

92. O conselho de administração da T…, SA é composto pelo presidente CA… e pela vogal CS… (artigo 116º da contestação).

93. Até à presente data a Companhia de Seguros …, SA despendeu, ao abrigo do contrato de seguro referido em 50., o montante de € 1 938,00 relativo a despesas judiciais e taxas; € 20,00 relativos a despesas com transportes; € 5 972,75 a título de despesas médicas a prestadores clínicos; € 1 555,20 relativos a juros de mora, € 13 760,91 atinentes a incapacidades temporárias e € 32 684,65 relativos à pensão anual e vitalícia atribuída ao sinistrado, no valor de € 7 847,38, fixada no processo emergente de acidente de trabalho n.º …/… que correu termos no Juízo do Trabalho do Tribunal Judicial da Comarca da Madeira, cuja decisão aí proferida fixou ao autor uma Incapacidade Permanente Parcial de 30,435% (artigos 6º e 7º do articulado da interveniente principal e artigos 5º a 7º do requerimento de ampliação do pedido).
*
Factos Não Provados

a) Com a velocidade a que seguia, CA… foi arremessado para cima, caindo de joelhos (artigo 17º da petição inicial, parte final);

b) Temendo pela própria vida, pois, sentiu muitas dores ao tentar mobilizar-se e não tinha noção da gravidade das lesões que o acometeram (artigo 18º da petição inicial);

c) CA… foi informado pelo médico que o atendeu que deveria fazer uma cirurgia de imediato (artigo 18º da petição inicial);

d) Como não havia bloco operatório disponível no hospital Dr. Nélio Mendonça, o autor foi transferido (artigo 19º da petição inicial);

e) Teve dores na bacia e não conseguia dormir por não conseguir encontrar posição que lhe desse conforto (artigo 21º da petição inicial);

f) O tratamento com fisioterapia manteve-se até 08-07-2013; o tratamento prescrito não foi autorizado pela seguradora, facto que está a causar agravamento das sequelas (artigo 23º da petição inicial);

g) O autor apresenta grande amiotrofia dos quadricípites; instabilidade subjectiva dos joelhos; possível artrose fémur-patelar bilateral (provável necessidade de prótese total dos joelhos); anca dolorosa à esquerda; incapacidade permanente geral de 22 pontos, acrescido de 8 pontos pelos danos futuros (artigo 24º da petição inicial);

h) As sequelas são impeditivas da profissão habitual, embora compatível com outras profissões na área de sua preparação técnico-profissional (artigo 24º da petição inicial);

i) É iminente o desenvolvimento de artroses nas articulações e a necessidade de nova cirurgia para colocação de prótese total dos joelhos (artigo 24º da petição inicial);

j) O autor CA… tem dores diárias e intensas nos joelhos esquerdo e direito e na bacia; necessidade de usar canadianas; caminha coxeando de forma bem visível; tem alterações do equilíbrio, pois, não tem força nos joelhos para levantar-se e tem que se apoiar nas canadianas em razão da instabilidade das pernas; para subir e descer escadas tem que ter apoio de terceiros ou das canadianas; tem redução da sua massa muscular nas pernas; ficou com encurtamento da perna; ficou com instabilidade subjectiva dos joelhos (artigo 25º da petição inicial);

k) O autor CA… sente dores na frente dos joelhos, seguidas da sensação de que os joelhos vão deslocar a cada momento (artigo 26º da petição inicial);

l) As sequelas e lesões causam impossibilidade de controlo no andar (instabilidade subjectiva dos joelhos) e de levantar-se sem ajuda; impossibilidade de levar compras da garagem da sua casa para a cozinha, mesmo que não existissem escadas, como existem, que ligam esses recintos; apresenta limitações para conduzir, pois, só o pode fazer em breves percursos; ficou com estrutura muscular deficitária nas pernas; sente vergonha pela sua apresentação física após o acidente; tem passado a evitar actividade sexual em virtude das dores que sente durante e após o relacionamento sexual, facto que lhe causa grande mal-estar (artigo 27º da petição inicial);

m) Após o acidente, CA… tornou-se uma pessoa revoltada, apreensiva e triste, em razão das limitações físicas com que ficou, e sente grande desgosto por se ver diminuído (artigo 29º da petição inicial);

n) CA…, em razão das lesões e sequelas fica exposto a perigo, em situação de risco que necessite de marcha rápida (artigo 30º da petição inicial);

o) CA… ficou com instabilidade subjectiva dos joelhos, facto que lhe causa descontrolo no andar e já lhe causou acidentes, tendo por vezes caído e sofrido arranhões e outras lesões, que têm sido tratadas com auxílio de fármacos (artigo 31º da petição inicial);

p) As limitações físicas reduziram as actividades sociais e de lazer em família e que constituíam momentos de aproximação e carinho e fortaleciam os laços entre seus membros (artigo 32º da petição inicial);

q) CA… não consegue afastar de si a ideia de que, devido à sua incapacidade, não mais conseguirá desenvolver com competência as actividades compatíveis com as suas profissões de administrador e engenheiro civil, o que lhe causa angústia e medo do futuro (artigo 33º da petição inicial);

r) O autor tem dificuldade em realizar trabalhos que exijam muitas horas em posição sentado (trabalhos no computador, elaboração de projectos) pois sente dores nos joelhos quando ficam muito tempo dobrados; passou a ter de ser auxiliado por outro engenheiro nas tarefas laborais; a importância do autor ficou fragilizada como engenheiro e como administrador, o que se reflecte nos ganhos actuais e futuros (artigo 45º da petição inicial);

s) O autor deverá ter que se submeter a outra cirurgia para fixação de próteses dos joelhos, conforme prescrição médica (artigo 54º da petição inicial);

t) Para o pagamento das referidas cirurgias, há uma previsão de gastos no valor de € 23 000,00 (artigo 54º da petição inicial);

u) O motociclo …-…-… era também usado por outros empregados para a realização de outras actividades de interesse da sociedade autora, nomeadamente, em razão da facilidade de estacionamento e menor consumo de combustível (artigo 59º da petição inicial);

v) A ré seguradora não apresentou proposta razoável (artigo 62º da petição inicial);

w) O autor não respondeu, nem se disponibilizou à realização do exame médico pericial (artigo 16º da contestação);

x) No dia 17 de Janeiro de 2013, como a T…, SA não recebeu informação por parte da seguradora de como proceder para a reparação do veículo e precisava do motociclo para resolver as actividades da sociedade, enviou-o para a oficina para fazer orçamento (artigo 60º da petição inicial);

y) A Yamaha informou por telefone que o orçamento para reparação ficou no valor de € 5 081,29 e que a seguradora havia feito a peritagem e tinha dado o motociclo como perda total (artigo 60º da petição inicial);

z) A autora remeteu à sociedade incorporada … – Companhia de Seguros, S.A. orçamento de reparação n.º 21/13, no valor de € 5 081,29, elaborado pela LM…, Lda., a seu pedido, tendo a autora solicitado o pagamento da referida quantia, não tendo a sociedade incorporada … – Companhia de Seguros, S.A. concordado com o valor da reparação por excessivo (artigo 54º da contestação);

aa) O motociclo encontrava-se em bom estado de conservação (artigo 55º da contestação);

bb) O perito liquidatário da ré, Sr. RP…, esteve na Madeira no dia 1 de Outubro de 2013, tendo contactado telefonicamente a ilustre mandatária da autora com vista a continuar as negociações sobre o processo, a qual se mostrou indisponível, em virtude de não se encontrar essa semana na Madeira, sendo que referiu que iria contactar o cliente no sentido de o mesmo, caso quisesse, falasse com o perito liquidatário, o que não sucedeu (artigo 85º da contestação);

cc) Desde então, a demandada efectuou diversas tentativas para chegar a acordo quanto aos danos no motociclo, o que se revelou infrutífero, atendendo a que a autora não respondeu à proposta efectuada (artigo 86º da contestação);

dd) As actividades da “T… – T… S.A.”, foram afectadas pela falta do seu motociclo, que teve perda total causada pelo acidente; em razão de tal facto, como a autora não recebeu o veículo de substituição, foi obrigada a reparar um antigo motociclo para suprir o deficit do motociclo envolvido no acidente (artigo 68º da petição inicial);

ee) Também sofreu avaria, o guarda volumes do motociclo e seus acessórios (artigo 70º da petição inicial);

ff) O capacete, blusão e guarda-volumes são propriedade da sociedade autora; a sociedade autora teve de reparar um motociclo antigo para auxiliar nos serviços da sociedade, sendo certo que este veículo já não atendia completamente às necessidades daquela (artigo 70º da petição inicial);

gg) O valor do capacete, blusão, guarda volumes e acessórios é de € 606,43 (artigo 71º da petição inicial);
hh) CA… tem longa experiência na área da construção, tendo estado à frente da “CL…”, nesta Região Autónoma, por oito anos, antes de ser administrador da T…; nesta empresa desenvolveu muitos trabalhos que comprovam a sua capacidade profissional e de administrador cuja experiência e bom nome foram transferidos para a sociedade autora (artigo 73º da petição inicial);

ii) A T… – T… S.A. sob a administração de CA…, que era considerado um grande administrador, desenvolveu nesta Região Autónoma grandes trabalhos que se destacaram pela eficiência, qualidade, pontualidade e recuperação de edifícios antigos, nomeadamente, a recuperação da Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira, Centro de Estudos e História do Atlântico, entre outros (artigo 74º da petição inicial);

jj) Desencadeava celeridade, segurança e bem-estar na execução das tarefas pelos seus subordinados (artigo 75º da petição inicial);

kk) Na Região Autónoma da Madeira, a T…, SA era reconhecida como uma empresa respeitável pelos serviços prestados e os clientes com essa segurança confiavam os seus trabalhos a esta empresa (artigo 75º da petição inicial);

ll) A empresa, sob a administração de CA…, constituiu uma imagem de respeito pela eficiência e alta qualidade na prestação de seus serviços (artigo 76º da petição inicial);

mm) A T… – T… S.A., até à ocorrência do acidente, apesar da grande crise que atravessa o país, conseguiu cumprir as obrigações assumidas, nomeadamente, com os credores e com o pessoal, pois, o administrador, CA…, com seu dinamismo e eficiência, conseguiu fazer a empresa atravessar a crise sem grandes danos e a sociedade tinha uma boa imagem junto do mercado, facto que lhe permitia manter e obter novos clientes (artigo 77º da petição inicial);

nn) A sociedade autora perdeu o seu comando quando o autor CA… esteve de baixa e, mesmo quando do seu regresso, esteve diminuída no seu comando e na sua administração em razão da diminuição das capacidades daquele, em consequência do acidente. As actividades da empresa, após as lesões sofridas por CA…, passaram a sofrer danos, com o atraso de obras, atraso de pagamento de empregados e credores (artigo 78º da petição inicial);

oo) A sociedade autora analisou a hipótese de contratação de um novo administrador, mas concluiu que as perdas seriam maiores, caso os clientes tomassem conhecimento que o autor CA…, não era mais o administrador; a sociedade teve a sua imagem lesada, em razão da perda de confiança dos clientes e do atraso das suas obrigações (artigo 79º da petição inicial). ”

DA REAPRECIAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
 Insurge-se o recorrente contra a decisão que absolveu a recorrida do pedido formulado nos autos, impetrando a alteração da matéria de facto que o tribunal considerou como provada e a admissão de factos que o tribunal não considerou provados.

Decidindo:

a) Da apreciação do recurso quanto à matéria de facto;

Relativamente aos requisitos de admissibilidade do recurso quanto à reapreciação da matéria de facto pelo tribunal “ad quem”, versa o artº 640º, nº 1, do Código de Processo Civil, o qual dispõe que:
«Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.”
No que toca à especificação dos meios probatórios, «Quando os meios probatórios invocados tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes” (Artigo 640º, nº 2, al. a) do Código de Processo Civil).
No que respeita à observância dos requisitos constantes deste preceito legal, após posições divergentes na nossa jurisprudência, o Supremo Tribunal de Justiça tem vindo a pronunciar-se no sentido de que «(…) enquanto a especificação dos concretos pontos de facto deve constar das conclusões recursórias, já não se afigura que a especificação dos meios de prova nem, muito menos, a indicação das passagens das gravações devam constar da síntese conclusiva, bastando que figurem no corpo das alegações, posto que estas não têm por função delimitar o objeto do recurso nessa parte, constituindo antes elementos de apoio à argumentação probatória.» [1]
Assim, “O que verdadeiramente importa ao exercício do ónus de impugnação em sede de matéria de facto é que as alegações, na sua globalidade, e as conclusões, contenham todos os requisitos que constam do art. 640º do Novo CPC.
A saber:
- A concretização dos pontos de facto incorrectamente julgados;
- A especificação dos meios probatórios que no entender do Recorrente imponham uma solução diversa;
- E a decisão alternativa que é pretendida.[2]
O recorrente nas suas alegações satisfaz estes requisitos, constando das conclusões os concretos pontos que deveriam ser alterados, pelo que o recurso relativamente à impugnação da matéria de facto é de admitir.
Passando à sua apreciação concreta, impugna o recorrente nas suas conclusões recursórias as respostas dadas pelo tribunal ad quo aos pontos 16, 21, 33, 35, 52, 54, 55 e bem assim considerados como provados os constantes nos artºs 17, 1ª parte, 18º, 19º, 21º, 23º, 24º, 25º, 26º, 27º29º, 30º, 31º, 32º, 33º, 45º e 54º, (cfr. conclusão 26º)
Não cumpre o recorrente nas suas conclusões o ónus de indicar a decisão alternativa que pretende quanto a cada um dos pontos que entende incorrectamente julgados, decorrendo no entanto das suas alegações recursórias, considerando-se assim, embora de forma deficiente, cumprido o ónus previsto nos artºs 639 e 640 do C.P.C.
Posto isto, no que toca à possibilidade e limites da reapreciação da matéria de facto, não obstante se garantir um duplo grau de jurisdição[3], tem este de ser enquadrado com o princípio da livre apreciação da prova pelo julgador, previsto no artº 607 nº 5 do C. P. Civil, sendo certo que decorrendo a produção de prova perante o juiz de 1ª instância, este beneficia dos princípios da oralidade e da mediação, a que o tribunal de recurso não pode já recorrer.
De acordo com Miguel Teixeira de Sousa, in “Estudos Sobre o Novo Processo Civil”, pág. 347, “Algumas das provas que permitem o julgamento da matéria de facto controvertida e a generalidade daquelas que são produzidas na audiência final (…) estão sujeitas à livre apreciação do Tribunal (…) Esta apreciação baseia-se na prudente convicção do Tribunal sobre a prova produzida (art.º 655.º, n.º1), ou seja, as regras da ciência e do raciocínio e em máximas da experiência”.
  Assim, para que a decisão da 1ª instância seja alterada haverá que averiguar se algo de “anormal” se passou na formação dessa apontada “convicção”, ou seja, ter-se-á que demonstrar que na formação da convicção do julgador de 1ª instância, retratada nas respostas que se deram aos factos, foram violadas regras que lhe deviam ter estado subjacentes, nomeadamente face às regras da experiência, da ciência e da lógica, da sua conformidade com os meios probatórios produzidos, ou com outros factos que deu como assentes.
Nada obstando à apreciação do recurso sobre a matéria de facto, o tribunal com vista à apreciação desta impugnação, procedeu à audição integral da prova e examinou os articulados e documentos juntos aos autos.
É a seguinte a convicção do tribunal recorrido, quanto à matéria de facto:
“A convicção do Tribunal quanto aos factos descritos sob os pontos 1. a 13. da matéria de facto provada gizou-se e resultou da posição assumida pelas partes nos respectivos articulados, que assentiram no modo como ocorreu o acidente e respectiva descrição que consta do auto de participação de acidente, tal como se afere de fls. 30 verso a 32 p.p.
Para além de tal admissão pelas partes, atendeu-se ao auto de participação do acidente enquanto documento autêntico que é, emitido por um órgão de polícia criminal a quem é reconhecida competência para a sua elaboração; nos termos do disposto no art. 371º, n.º 1 do C. Civil, os documentos autênticos fazem prova plena dos factos que referem como praticados pela autoridade ou oficial público respectivo, assim como dos factos que nele são atestados com base nas percepções da entidade documentadora.
A propriedade do veículo …-…-… e a transferência de responsabilidade civil para a seguradora referidas nos pontos 2. e 12. basearam-se ainda no teor dos documentos de fls. 68 a 70 e 150 p.p.
Os factos descritos sob os pontos 14., 15. e 16. resultaram do conteúdo dos documentos que constam de fls. 149, 307 e 308 e 166 verso e 167 dos autos.
No que diz respeito à remuneração auferida pelo autor CA… mencionada no ponto 17., o Tribunal relevou, na ausência de qualquer prova testemunhal que haja incidido sobre tal matéria, o teor do recibo de vencimento que consta de fls. 51 verso e, bem assim, a informação de fls. 260 e 261 p.p..
Quanto às lesões apresentadas pelo autor ao momento da sua entrada no Hospital Dr. Nélio Mendonça subsequente à ocorrência do acidente, tratamento efectuado, transferência para a clínica, intervenção cirúrgica e terapêutica aplicada, assim como exames a que se submeteu e sessões de fisioterapia descritos nos pontos 19. a 22. e 24., o Tribunal atendeu ao conteúdo dos elementos clínicos carreados para os autos que constam de fls. 33 a 36, 418 a 422, 36 verso a 38, 423, 39 a 42, 62 a 65 e, bem assim, ao conteúdo dos relatórios periciais que constam de fls. 414 a 417 (com esclarecimentos a fls. 442 a 444 p.p.) e 482 a 486 p.p., onde se refere, no primeiro, a necessidade de utilizar auxiliares de marcha (canadianas), durante cerca de duas semanas e, no segundo, por período não determinado, situando o Tribunal, na ausência de qualquer outro elemento de prova que corrobore esse ponto (as testemunhas, nomeadamente a testemunha AM…, confirmaram apenas que usou canadianas), tal necessidade como certa pelo menos durante as mencionadas duas semanas.
A convicção do Tribunal quando aos factos descritos nos pontos 18., 23., 25. e 26. gizou-se e resultou da conjugação dos depoimentos das testemunhas JM…, engenheiro civil, funcionário da T…, SA no período situado entre 2009 e 2015; AR…, engenheiro civil, funcionário da T…, SA desde 2003; DC…, que foi empregado de escritório na T…, SA desde 2004 a 2015; FP…, carpinteiro, que exerceu funções na T…, SA até 2016; e FG…, empregada doméstica, que trabalha na casa do autor há cerca de cinco ou seis anos.
A primeira destas testemunhas deslocou-se ao local no dia do acidente e ainda verificou a colocação do sinistrado na maca para ser encaminhado para o hospital relatando o sofrimento que este revelava e confirmou a intervenção cirúrgica a que foi submetido; mais mencionou, tal como as testemunhas FC… e FV…, a necessidade de execução de uma estrutura em madeira para impedir que os lençóis tocassem nas pernas do autor, assim como aludiram ao seu internamento na Clínica de Santa Catarina.
Todas estas testemunhas relataram as dificuldades na marcha, o facto de o autor não poder correr, saltar ou ajoelhar-se e subir ou descer andaimes, assim como disseram ter conhecimento que aquele, por regra, nadava quase diariamente e cuidava da sua horta, tendo resultado claro que se encontra hoje impedido de se dedicar à natação por via das sequelas que as lesões causadas pelo acidente lhe determinaram, tal como expressamente consignado ou referido em audiência pelos senhores peritos que o avaliaram.
Na determinação das consequências do acidente advenientes para o autor em sede de integridade biológica e da condição médico-legal que o autor hoje apresenta, o Tribunal atendeu ao conteúdo dos relatórios periciais juntos aos autos a fls. 414 a 417, com esclarecimentos a fls. 442 a 444 e 482 a 486 p.p..
A prova pericial está, também ela, sujeita ao princípio da livre a apreciação da prova, e, portanto, ao princípio da liberdade de apreciação do juiz (cf. art. 389º do Código Civil). Contudo, a perícia visa a percepção ou averiguação de factos que exigem conhecimentos especiais que o julgador comprovadamente não domina (cf. art. 388º do C. Civil).
Assim, o juízo científico vertido no parecer pericial, pela especificidade que lhe é inerente, só deve ser susceptível de uma crítica material e igualmente científica. Deste modo, quando o Tribunal entenda afastar-se de tal juízo científico deve motivar com particular cuidado a divergência, indicando as razões pelas quais decidiu contra essa prova ou, pelo menos, expondo os argumentos que o levaram a julgá-la inconclusiva.
No entanto, porque a prova pericial pressupõe a insuficiência de conhecimentos do magistrado, este dificilmente se substituirá inteiramente ao perito para refazer, por si, o trabalho analítico e objectivo para o qual não dispõe de meios subjectivos. Assim, a menos que sobrevenham novos e seguros elementos de prova, maxime uma nova perícia, a liberdade do juiz não o autoriza a estabelecer, sem o concurso dos peritos, as razões da sua convicção. “Por mais que se afirme a máxima de que o magistrado é o perito dos peritos, a hegemonia da função jurisdicional em confronto com a função técnica e se queira defender o princípio da livre apreciação, não é raro que o laudo pericial desempenhe papel absorvente na decisão da causa.” – cf. acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 24-04-2012, relator Henrique Antunes, processo n.º 4857/07.6TBVIS.C1 publicado na base de dados do ITIJ já referida.
Sucede que, neste caso, foram, precisamente, realizadas duas perícias singulares que não são totalmente coincidentes nos diversos pontos que, nesta sede, cumpre apreciar, incidindo tais divergências, desde logo, quanto à data da consolidação médico-legal das lesões do sinistrado, aos períodos de défice funcional temporário, ao défice funcional permanente, à necessidade futura de artroplastia, ao exercício da actividade profissional habitual, aos graus atribuídos quando ao dano estético, à repercussão na actividade sexual e desportiva.
Cumpre notar que a segunda perícia consiste numa repetição da primeira, em que se submetem à apreciação dos peritos, exactamente, os mesmos factos que se averiguaram e apreciaram na primeira, e ocorre com base no pressuposto de que na primeira perícia terão sido emitidos juízos de valor insatisfatórios sobre os factos a apurar. Neste contexto, a segunda perícia constitui uma prova a mais que, conjugada com a primeira e com os demais elementos de prova produzidos, habilitará o Tribunal a descobrir verdade.
Assim, “[] a segunda perícia não invalida a primeira, não a substitui, não exerce sobre ela o papel de recurso da primeira, subsistindo ambas, lado a lado, submetidas ao princípio da prova livre, que permite ao Tribunal preferir o resultado da primeira em relação ao da segunda [] o valor da prova pericial civil [] não vincula o critério do julgador, que a pode rejeitar [] os dados de facto que servem de base ao parecer estão sujeitos ao princípio da livre apreciação da prova, e o juízo científico ou parecer, propriamente dito, também não requer uma crítica material e científica. [] a lei exige que a prova pericial seja apreciada pelo Juiz, segundo a sua experiência, prudência e bom senso, mas com inteira liberdade, sem se encontrar vinculado ou adstrito a quaisquer regras, medidas ou critérios legais [] o Tribunal pode [] afastar-se, livremente, deste parecer [] quer porque tenha partido de factos diferentes dos que aceitou o perito, quer porque discorde das suas conclusões ou do raciocínio lógico em que se apoia, quer porque, finalmente, os demais elementos úteis de prova existentes nos autos invalidem, na sua óptica, o laudo dos peritos [] E isto porque o juízo técnico, científico ou artístico não tem um valor probatório pleno, e, nem sequer, talvez, um valor de prova legal bastante, um valor, presuntivamente, pleno, ligado a uma presunção natural, que pode ceder perante contraprova [] mas antes e, tão-só, que a valoração diversa dos argumentos invocados pelos peritos e que são fundamento do juízo pericial é bastante para que o relatório pericial não se imponha ao julgador [] pelo que é inaceitável uma adesão automática e mecânica às conclusões do respectivo relatório pericial, sem a produção e exame crítico das demais provas carreadas pelas partes, em apreciação na audiência de discussão e julgamento, com subordinação ao princípio do contraditório []” – cf. acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 5-07-2006, relator Hélder Roques, processo n.º 1785/06; no mesmo sentido acórdão do mesmo Tribunal de 15-11-2011, relator Artur Dias, processo n.º 194/09.0TBAVZ-A.C1 e acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 19-05-2016, relator José Amaral, processo n.º 188/12.8TMBRG-F.G1, todos acessíveis na base de dados do ITIJ já referida.
Em consonância, ocorrendo divergências entre os dois relatórios periciais, como as acima identificadas, impõe-se que o Tribunal possa perceber o raciocínio lógico delineado pelos peritos médicos de modo a sindicá-lo no confronto de ambas as perícias.
Será na ponderação dos diferentes raciocínios apresentados pelos peritos médicos e da conjugação da demais prova produzida, que o juiz poderá apreciá-los criticamente e proferir uma decisão diferente, se for esse caso – cf. neste sentido, o acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 11-06-2015, relator Moisés Silva, processo n.º 1088/10.1TTGMR.2.P1.G1 publicado na base de dados do ITIJ.
Na ponderação dos respectivos raciocínios não pode o Tribunal deixar de atender aos esclarecimentos prestados pelos senhores peritos CS… e JR….
Neste enquadramento, na enunciação dos factos atinentes à identificação das lesões, data da consolidação médico-legal das lesões, à repercussão temporária, total e parcial na actividade profissional, às dificuldades na marcha, à integração das sequelas na Tabela Nacional de Incapacidades em Direito Civil, repercussão no exercício da actividade habitual, nas actividades desportivas e na actividade sexual e ainda no dano estético, e, bem assim, quanto à necessidade futura de tratamentos e novas cirurgias que se descreveram nos pontos 25. e 27. a 41. da matéria de facto provada, o Tribunal relevou os dados objectivos reflectidos nos relatórios periciais, compaginados com o apuramento dos pressupostos de facto em que cada um dos senhores peritos baseou as suas conclusões.
Assim, desde logo quanto à data da consolidação médico-legal das lesões e aos períodos de défice funcional temporário total e parcial, o Tribunal relevou, quanto à primeira, aquela que se mostra consignada na primeira perícia, por se mostrar suportada pelos diversos elementos objectivos constantes dos autos e ser coincidente com a data fixada pelo médico que o seguiu no âmbito do contrato de seguro do ramo acidentes de trabalho, tal como se extrai de fls. 265 dos autos e se aferir também do teor da sentença proferida no processo emergente de acidente de trabalho que correu termos sob o número …/… e consta de fls. 431 verso a 436 p.p.; com base nestes elementos e naquilo que resulta do teor da primeira perícia que, nessa sede, se apresenta consonante com as demais informações constantes dos autos, foram ainda fixados os aludidos períodos de incapacidade.
No que diz respeito à identificação das sequelas e sua integração na Tabela Nacional de Incapacidades em Direito Civil, o Tribunal, perante os esclarecimentos prestados pelos senhores peritos médicos, convenceu-se que, de facto, actualmente, o sinistrado apresenta rigidez dolorosa da flexão de ambos os joelhos e não também de artrose pós-trauma.
Com efeito, o perito médico Dr. CS… explicou que a indicação da artrose que efectuou ficou a dever-se ao facto de nos exames iniciais à entrada no hospital o sinistrado não apresentar evidência de artrose, pelo que, se a constatou, esta terá surgido depois do trauma; no entanto, por sua vez, o Dr. JR… foi bastante esclarecedor quanto à integração das sequelas apenas na rigidez da flexão pois que referiu que o exame TAC efectuado em 2-02-2015 a ambos os joelhos identifica alterações degenerativas sem fazer menção à existência da artrose, sendo que esse é o exame mais adequado para identificar os problemas dos joelhos; mais explicou que a fractura das rótulas envolve a superfície articular pelo que a tendência normal será que, no futuro, o paciente venha a desenvolver uma artrose, mas isso é apenas na perspectiva de dano futuro, ou seja, poderá vir a revelar-se uma artrose mas actualmente não foi constatada; esclareceu ainda que, actualmente, o que determina o prejuízo para o sinistrado é a rigidez do joelho sendo essa a causa da desvalorização, ainda que a evolução da situação possa prejudicar a superfície articular e conduzir, a final, a uma artrose.
O raciocínio aduzido por este senhor perito, a que acresce o facto de o sinistrado, tal como o próprio referiu aos peritos médicos, ter sido, anteriormente ao acidente, sujeito a uma intervenção cirúrgica no joelho direito, justificam que se atenda à realidade susceptível de ser revelada pelos exames efectuados e que demonstraram apenas as alterações degenerativas, sem artrose, tanto mais que o perito Dr. CS… referiu ter considerado a inexistência de patologia anterior, o que é insuficiente para se justificar a sua opção atenta a circunstância de ter existido uma intervenção prévia num dos joelhos (ainda que se desconheça a sua natureza).
Surge, porém, como realidade fisiopatologicamente segura o agravamento das sequelas, sem que se possa, contudo, asseverar que o sinistrado irá necessitar de uma artroplastia. Com efeito, o próprio perito que a consignou na perícia, Dr. CS…, referiu que a necessidade dessa intervenção existirá perante um agravamento da situação que pela dor imponha essa intervenção; a artroplastia poderá ocorrer ou não, dependendo da evolução da situação.
O Tribunal considerou as sequelas identificadas como sendo compatíveis com o exercício da actividade profissional do sinistrado ponderando que, tal como resultou provado, este é engenheiro civil e, à data do acidente, era presidente do conselho de administração da sociedade autora, sendo responsável técnico pela execução de algumas obras. Ainda que o autor se desloque às obras e tenha deixado de poder subir e descer andaimes ou circular em piso irregular, certo é que a conclusão a que o perito médico, Dr. JR…, chegou, no sentido de que estaria impedido do exercício da sua profissão habitual, foi baseada numa informação transmitida pelo sinistrado, conforme aquele referiu, que, omitindo ser administrador da empresa, aludiu apenas ao “trabalho de campo” que fazia no terreno. Ademais, após a alta é seguro que o autor regressou ao trabalho, com limitações, é certo, mas retomou-o conforme foi referido pelas testemunhas arroladas pelos autores.
O Tribunal considerou a marcha ligeiramente claudicante justificada cabalmente pelo Dr. JR… ao referir que, atento o quadro sequelar descrito (fractura das rótulas e intervenção cirúrgica, com rigidez dolorosa bilateral dos joelhos), tal confere uma marcha claudicante ligeira, estabelecendo o nexo de causalidade com aquelas sequelas, sendo algo que não se vê à distância por ser uma ligeira claudicação. Quanto à repercussão na actividade sexual o Tribunal considerou ser de relevar as consequências advindas para o sinistrado nessa sede, porquanto, não obstante o referido pelo Dr. CS… (as queixas respeitarem apenas a algumas posições, não sendo impeditivas do acto sexual), porque sendo queixas consonantes com as sequelas apresentadas e tratando-se de um prejuízo permanente (ainda que a dor possa ser ocasional) e o facto de se adaptar e evitar posições que lhe provoquem dor, não deixa de ter esse dano.
Tendo resultado provado que o autor nadava quase diariamente e tendo sido asseverado pelos senhores peritos que as sequelas que aquele apresenta o impedem de prosseguir essa actividade, o Tribunal relevou também o prejuízo em sede de actividade desportiva.
Na fixação do grau do dano estético relevou-se ainda as conclusões da segunda perícia considerando que, neste contexto, a ligeira marcha claudicante (não ponderada na primeira perícia) associada às cicatrizes identificadas, justifica a atribuição do grau 3.
O Dr. JR… esclareceu ainda que se apresenta como possível a necessidade de cirurgia para extracção do material de osteossíntese, caso se verifique uma infecção, rejeição do material, deslocação, não sendo obrigatório que tal suceda.
A necessidade de fisioterapia e medicação foi reiterada por ambos os senhores peritos.
Relativamente ao ponto 39. atendeu-se ao conteúdo dos documentos de fls. 47 verso a 48 verso p.p..
Os pontos 41. e 43. basearam-se nos documentos de fls. 60 e 62 a 67 e 151 p.p. (não se tendo relevado os montantes despendidos com a avaliação do dano corporal por não se enquadrarem em despesas com o tratamento).
Quanto ao ponto 42. resultou claro que o motociclo …-…-… era utilizado pelo autor nas actividades da sociedade autora, não o sendo por outros funcionários desta. Com efeito, ainda que a testemunha JM… tenha referido que o veículo era usado pelo funcionário C…, este declarou, pelo contrário, que aquele motociclo era, geralmente, usado pelo autor, sendo que ele usava um outro motociclo da empresa; também as testemunhas AG… e FP… disseram que o ZL era mais utilizado pelo autor do que por qualquer outra pessoa.
Os factos enunciados sob os pontos 44., 45. e 46. resultaram do teor dos documentos juntos aos autos a fls. 187 a 219 (relatório de averiguação da GEP – Gestão de Peritagens, SA) e 312 verso a 400 p.p.. Relevou-se ainda o depoimento da testemunha JM…, perito avaliador, gestor de cobrança que prestou serviço para a F…, SA, que participou na elaboração do orçamento para reparação do motociclo em colaboração com MR…, sócio-gerente da sociedade LM…, Lda., que referiu que o motociclo foi direccionado para o seu estabelecimento com vista à orçamentação e posterior reparação por determinação da respectiva proprietária, com base no que também se deu como provado o ponto 52..
Os pontos 47., 48., 49. e 50. basearam-se no teor de fls. 152, 154, 431 verso a 436 e 264 verso, 259 verso a 261 e 154 p.p., respectivamente.
A testemunha JM…, profissional de seguros, funcionário da interveniente principal …, SA confirmou ainda que o acidente está enquadrado como acidente de trabalho e não foi descaracterizado, tanto mais que foi já proferida sentença a fixar os valores devidos a esse título ao sinistrado; mais confirmou a prestação de assistência médica ao autor no âmbito do contrato de seguro do ramo acidentes de trabalho, conforme consignado sob o ponto 51. da matéria de facto provada.
A indisponibilidade para a realização da peritagem referida no ponto 53. afere-se do teor do relatório que consta de fls. 312 verso a 400 p.p..
Quanto aos pontos 54. a 56. e 59. o Tribunal relevou o depoimento das testemunhas JM… e MR…, que confirmaram o valor do orçamento para a reparação que veio a ser acertado entre aquele perito e o responsável da oficina que procederia à reparação (cf. fls. 154 verso a 157 p.p.), tendo sido explicado que inicialmente a oficina elaborou um orçamento no valor de € 5 081,29 (conforme documento de fls. 71 e 72 p.p.), sem intervenção do perito avaliador, sendo que posteriormente, após a peritagem, veio a ser acertado o valor de € 3 750,83, tendo a oficina considerado viável a reparação por esse preço, como o próprio responsável afirmou em juízo; ambas as testemunhas foram consonantes quanto ao facto de o motociclo ser reparável, sucedendo, porém, que o proprietário nunca veio a emitir autorização nesse sentido.
De igual modo, relevou-se o depoimento da testemunha PR…, profissional de seguros, a exercer funções na Companhia de Seguros …, S. A. há cerca de trinta e três anos, que disse ter recebido este assunto para resolução da questão atinente ao motociclo acidentado, afirmando que, daquilo que se apercebeu, o autor não queria a reparação do veículo mas dinheiro; pelo perito foi transmitido que o motociclo estava em bom estado de conservação e justificava a reparação, mais explicou que, quando o veículo entra na oficina é desde logo executada uma estimativa do preço de reparação e, feita a peritagem pela seguradora e desmontado o veículo (se autorizado pelo proprietário), é então elaborado um orçamento definitivo; mencionou que o primeiro orçamento será uma estimativa sem desmontagem; contudo, o orçamento relevante será aquele que a seguradora acorda com a oficina e que neste caso foi o de € 3 750,83.
Os factos descritos nos pontos 57., 58., 60., 61., 62., 63. e 64., 65., 66. e 67., 68., 69., 70., 71., 73., 74. e 75., 76., 77., 78. e 79., 80., 82., 83. e 84. mostram-se suportados pelo conteúdo dos documentos juntos aos autos a fls. 158 verso, 312 verso a 400, 159, 76, 77, 78, 79 a 84, 85, 159 verso, 87 e 88, 152 verso, 153, 161, 160 verso, 160, 162 verso, 162, 164, 161 verso, 284 a 286 e 89 a 91 p.p., respectivamente.
Quanto ao ponto 73. atendeu-se ainda ao depoimento da testemunha PR…, que referiu ter sido incumbido de diligenciar pela resolução da situação do motociclo acidentado, confirmando a realização da peritagem por um colega e que desde o início da sua intervenção se apercebeu que não era intenção do sinistrado proceder à reparação do veículo mas que essa reparação foi orçamentada pela seguradora e foram dadas instruções nesse sentido à oficina, o que também foi comunicado ao autor; relativamente ao ponto 83. atendeu-se ainda ao depoimento da testemunha AG…, que referiu que eram habitualmente utilizados quatro veículos ligeiros pelos dois engenheiros da empresa e pelo encarregado geral e ainda um outro utilizado pelo autor.
Quanto aos pontos 72. e 81. dos factos provados, o Tribunal relevou o depoimento da testemunha PP… que descreveu todas as diligências que empreendeu no sentido de obter um acordo com os autores quanto à reparação/indemnização pelos prejuízos atinentes ao motociclo ZL, tendo sido obtido um entendimento conforme o descrito no ponto 72., ficando a autora com os salvados, o que, porém, não foi atendido pois que, tendo inicialmente sido aceite, foi posteriormente transmitido pela autora que, afinal, pretenderia obter apenas uma indemnização que não integrasse os prejuízos pela paralisação para depois discuti-los em tribunal, o que a seguradora não aceitou.
Também do depoimento desta testemunha e da própria posição da seguradora ré se retira a conclusão que não foi facultado à autora veículo de substituição, conforme se firmou sob o ponto 86.
Quanto ao ponto 85. considerou-se o depoimento da testemunha DC… que declarou ter-se deslocado ao local do acidente após a sua ocorrência, onde recolheu o casaco e outros bens do autor, com quem ainda chegou a falar, tendo verificado que o blusão estava rasgado e o capacete riscado.
Os pontos 87., 88., 91. e 92. basearam-se no teor de fls. 93 a 96 e 100 e 101, 298 a 306 e 166 verso e 167 dos autos.
No que concerne aos factos descritos sob os pontos 89. e 90. o Tribunal relevou o depoimento das testemunhas JM…, AG…, DC… e FP…, que confirmaram que o autor CA… era um administrador sempre muito presente na execução e decurso das obras que estavam a cargo da sociedade autora, participando e promovendo as reuniões de obra e dando orientações aos encarregados, para além de preparar os orçamentos, sendo que os clientes sentiam confiança e segurança devido a esse acompanhamento muito próximo.
O ponto 93., para além de suportado pelos documentos de fls. 263 a 269, pelo teor da sentença que consta de fls. 431 verso a 436 e por fls. 512 a 526 p.p., foi integralmente descrito e confirmado, mediante a enunciação dos valores pagos pela …, S. A., com a respectiva identificação e referência, pela testemunha JM….
Os factos dados como não provados ficaram a dever-se à inconsistência da prova testemunhal, documental ou pericial que sobre eles incidiram e, bem assim, à demonstração de factos opostos.
Não foi produzida qualquer prova quanto ao arremesso do autor descrito na alínea a) dos factos não provados na sequência do embate, nem se aferiu positivamente um sentimento de receio pela vida por parte do sinistrado (mencionado na alínea b)), não obstante, é certo, a natureza das lesões que sofreu.
Quanto à necessidade de cirurgia imediata e indisponibilidade de bloco operatório no hospital, referidas nas alíneas c) e d) dos factos não provados, nenhuma testemunha o confirmou, para além de que do documento de fls. 33 verso se afere que o autor foi transferido para a Clínica a seu pedido.
Nenhuma testemunha confirmou as dores descritas na alínea e).
Resultou provado que foram prescritas quarenta sessões de fisioterapia ao autor, que as iniciou em Fevereiro de 2013 (cf. ponto 24. dos factos provados), sendo desconhecida, porém, a data até à qual tais sessões se prolongaram, sendo certo que nenhum elemento probatório foi aduzido que demonstrasse que a seguradora tenha recusado ou não tenha autorizado a continuação desse tratamento, pelo que se considerou não provado o descrito sob a alínea f).
No que diz respeito às sequelas apresentadas pelo autor e que acima foram enunciadas e enquadradas na Tabela Nacional de Incapacidades em Direito Civil, resulta já do acima expendido a valoração efectuada pelo Tribunal quanto às conclusões vertidas nos dois relatórios periciais pelo que se deram como não provados os factos descritos nas alíneas g) a j) dos factos não provados.
Não foi produzida prova documental, pericial ou testemunhal que revelasse a sensação descrita na alínea k) ou as dificuldades no controlo do andar, impossibilidade de se levantar sem ajuda, necessidade actual de canadianas para auxílio na marcha, ou o sentimento de vergonha e abstenção de prática sexual ou ainda a revolta e perigo de vida mencionados nas alíneas l) a o) dos factos não provados.
De igual modo, nenhuma alusão foi efectuada quanto à redução das suas actividades sociais e de lazer em família (alínea p)) ou a crença de que não retomará a actividade regular que exercia antes do acidente (alínea q)).
Não obstante as dificuldades relatadas pelas testemunhas quanto ao acompanhamento no terreno das obras executadas pela sociedade autora, de que o autor CA… é administrador, certo é que este retomou o trabalho, a sociedade continua a laborar, apresentou lucro tributável nos anos de 2012 e 2013 e não se apurou qualquer necessidade de recorrer ao auxílio de outro engenheiro (para além, naturalmente, daqueles que eram já funcionários da empresa).
Resulta também do acima expendido que não se apurou qualquer necessidade futura, concreta e previsível, quanto a uma eventual aplicação de próteses dos joelhos, pois que apenas no futuro e perante a evolução da situação ou das dores que o autor venha a manifestar será possível efectuar uma avaliação sobre a utilidade dessa intervenção, muito menos tendo sido apurado qualquer tipo de valor que essa cirurgia demande (alíneas s) e t)).
O facto mencionado na alínea u) mostra-se arredado em face do provado sob o ponto 42.
Toda a correspondência trocada entre as partes e descrita nos factos provados tornam inviável a afirmação positiva do vertido nas alíneas v) a x).
Nenhuma prova foi produzida quanto a uma eventual informação verbal sobre o valor da reparação ou indicação pela seguradora de que seria considerado em perda total (alíneas y) e z)).
A testemunha PP… situou a sua deslocação ao Funchal em Julho de 2013, não tendo sido mencionadas as tentativas ou diligências referidas nas alíneas bb) e cc)).
Apesar de demonstrada a reparação de um outro motociclo propriedade da sociedade autora, certo é que não resultou demonstrada qualquer conexão entre tal reparação e o facto de o ZL estar danificado, tanto mais que a testemunha DG… aludiu a essa reparação sem estabelecer qualquer ligação com o facto de ZL não poder ser utilizado e que, aliás, raramente utilizava; não foi referido por nenhuma testemunha que o capacete e blusão pertencessem à sociedade autora (alínea dd) e ff)).
Não foi feita qualquer prova quanto ao valor dos objectos danificados (alínea gg)).
Nenhuma testemunha se pronunciou sobre a experiência do autor CA… na área da construção ou sobre o tipo de trabalhos em que ele e a sua empresa tenham estado envolvidos, ou sequer sobre o tipo de imagem que a sociedade tem no mercado, não sendo concretizada qualquer situação que revele a escolha da empresa pela sua posição no meio ou reconhecimento generalizado das suas competências (alíneas hh) a ll)).
Ainda que as testemunhas arroladas pelos autores tenham mencionado que alguns clientes terão sentido receio pelo facto de o autor não estar presente no período subsequente ao acidente, nenhum dado concreto foi indicado quanto a eventual perda de uma empreitada que estivesse em negociação ou diminuição de contratações directamente relacionadas com esse facto, tanto mais que o autor estivera já ausente num determinado período devido a doença e a sociedade prosseguiu a sua actividade, sendo certo que tem ao seu serviço outros engenheiros que certamente terão acompanhado as obras em curso e transmitido orientações aos encarregados.
Por outro lado, após a recuperação, o autor continuou a deslocar-se às obras, ainda que impedido de subir os andaimes (conforme referiu a testemunha DG…), mas podendo certamente transmitir as suas orientações através das percepções que os seus funcionários lhe comunicassem pois que tinha pessoal qualificado ao seu serviço; de notar também, que a testemunha FC… aludiu ainda a uma prévia quebra de trabalho mesmo antes do acidente, o que significa que essa alegada diminuição nada terá que ver com a ausência temporária do administrador (alíneas mm) a oo))”
Passando à apreciação concreta da matéria impugnada, pretendem os recorrentes a alteração do ponto 16 da matéria de facto de molde a reproduzir o teor do artº 39 da p.i. ou seja que “O autor CA…, à data do acidente, exercia a profissão de engenheiro Civil e Administrador da autora T… – que é uma empresa de construção civil. Em razão do acidente referido no art.º 1º, tem perda ou privação da sua capacidade de ganho futuro em função da sua capacidade geral”, alegando não ter sido impugnado este facto.
Desde já se refere que constituído por duas partes, encerra uma conclusão (perda ou privação da sua capacidade de ganho futuro) que, não só constitui o cerne deste processo, na medida da efectiva averiguação da existência e percentagem desta invocada perda ou privação, discutida e objecto de perícia nos autos, como é insusceptível de constituir em si um facto.
Impõe-se assim a rejeição desta pretendida alteração, nos termos propostos.
Relativamente ao ponto 21, alegam os recorrentes que deve ser alterada a sua redacção, para a seguinte, por si alegada “No após operatório, o autor CA… sentiu muitas dores e fez terapêutica anti-inflamatória e analgésica pós-cirurgia, tendo de usar auxiliares de marcha durante, pelo menos, dezassete semanas”.
Funda a sua discordância relativamente a este período temporal, nos factos provados nos 31, 32, /ITA por um período de 122 dias e regresso ao trabalho de muletas, alegando terem as testemunhas AR…, DC…, JM…o e FP…, visto o A. de canadianas “muito tempo” e que é normal que um indivíduo que efectua uma cirurgia ás rótulas e sente dores, necessite no mínimo de 17 semanas de canadianas.
Salvo o devido respeito por opinião contrária, a argumentação dos recorrentes não suporta a pretendida alteração. Não se pretendia apurar se era normal que o A. andasse de canadianas por um período de 17 semanas, mas se andou e por quanto tempo.
Ora, este período apurado pelo tribunal recorrido, resultou do teor do relatório pericial a fls. 415, sendo que do depoimento das referidas testemunhas não resultou qualquer período de tempo em concreto, mas apenas que o viram de canadianas.
Mantém-se pois inalterado este ponto, pois que o conjunto da prova produzida e os demais factos não impõem a alteração.
Relativamente ao ponto 33, requerem os recorrentes a sua alteração de forma a dele constar “As sequelas apresentadas pelo autor CA… - rigidez dolorosa na flexão de ambos os joelhos - integram-se no ponto Mc0616, e Artrose pós-traumática (segundo limitações funcionais e dor) integram-se no ponto Mf1309 - o que lhe confere um défice funcional permanente da integridade físicopsíquica de 15,084 Pontos” sendo uma previsão fisiopatologicamente certa e segura o agravamento das sequelas, com necessidade de artroplastia por artrose pós-traumática.”
Funda a sua discordância no relatório elaborado pelo Dr. CS… e na errónea, a seu ver, não consideração da existência de dano futuro, com necessidade de artroplastia por artrose pós-traumática uma vez que, pese embora o perito Dr. JR… o não pontue, considera igualmente a sua existência como decorrência desta lesão.
Posto isto, é certo que, em sede de duas perícias realizadas nos autos, ao A. foram consideradas diferentes pontuações para o deficit funcional permanente decorrente da consideração e pontuação do designado dano futuro, que à data das perícias não existia, conforme decorre aliás dos esclarecimentos prestados pelos Srs. peritos médicos em audiência e do próprio relatório.
Posto isto, mostra-se exaustivamente explanada a convicção do tribunal recorrido no que se reporta à fixação deste deficit e sua integração no referido ponto, de acordo com os relatórios periciais, convicção que, ouvidos os depoimentos dos Srs. peritos e lidos os relatórios periciais e o doc. de fls. 456 a 467, se mantém como válida.
Ambos os peritos são unânimes na afirmação de que o recorrente não apresenta artrose pós-traumática, não sendo assim passível de pontuação neste âmbito.
Mantém-se assim a redacção deste ponto, pois que o conjunto da prova produzida e os demais factos não impõem a alteração.
Requerem ainda os recorrentes que seja considerado como provado no ponto 35 que “As sequelas são impeditivas do exercício da actividade profissional habitual, do autor, descrita em 16, sendo, no entretanto, compatíveis com outras áreas da sua preparação técnico profissional, implicando esforços suplementares.”
Funda a sua discordância no relatório pericial elaborado pelo Dr. JR… e bem, assim no depoimento das testemunhas DC…, FP… e JC…, por considerar que o A, está impedido de realizar “trabalho de campo”, subir a andaimes, não conseguia estar nas obras.
Ora, fundou o tribunal recorrido a sua convicção quer nos relatórios periciais elaborados, quer na consideração de que o A. efectivamente regressou ao seu trabalho e não foi considerado, nem em sede de acidentes de trabalho, como estando com IPATH.
Ora, reconhecendo que o A. administrador desta empresa, se desloca a obras e que actualmente se encontra com mais limitações para exercer esta parte do seu trabalho, não está impedido de exercer a sua actividade habitual, que continua aliás a exercer, na sua qualidade de administrador da T… e Eng. Civil, pelo que se não pode considerar que o A. está impedido como pretendem os recorrentes, mas apenas que sofre mais limitações e necessita de desenvolver mais esforços para o efeito.
Ou seja, está sem dúvida o A. limitado, mas não está impedido.
Mantém-se pois a redacção deste preceito, pois que o conjunto da prova produzida e os demais factos não impõem a alteração.
  Por último e ainda quanto à matéria de facto provada, requerem os recorrentes a alteração dos pontos 52, 54 e 55, relativos à reparação do motociclo, para o seguinte:
Ponto 52- “Após o sinistro, o motociclo foi rebocado, a pedido dos autores, para a oficina LM…, Lda., concessionária e reparadora autorizada da Yamaha na R.A.M. (artigo 50º da contestação), que elaborou um orçamento no valor de € 5 081,29 para reparação do motociclo motociclos …-…-…. (conforme documento de fls. 71 e 72 p.p.), sem intervenção do perito avaliador.
PONTO – 54 da matéria de facto: “A seguradora não aceitou o orçamento fixado pela oficina LM…, Lda., e na sequência da peritagem fixou-se como custo de reparação do motociclo o valor de € 3 074,45, acrescido de IVA à
taxa de 22%, no valor de € 676,38, no total de € 3 750,83 (artigo 53º da contestação).”
PONTO – 55 da matéria de facto: “O motociclo não era técnica e materialmente reparável, por não se constituir segura a reparação no valor de € 3 750,83, fixado no orçamento da seguradora e o valor da reparação ser maior que o valor comercial da mota.”
Fundam a sua discordância no depoimento das testemunhas RR… e JM…, alegando que tendo este feito um orçamento por um valor superior que considerou adequado, alterado a pedido da seguradora, esta reparação não seria segura.
Ora, ao contrário do alegado pelos recorrentes, esta afirmação e conclusão não resultam do depoimento das referidas testemunhas, nem de nenhum documento junto aos autos.
O que resulta é que elaborado um orçamento pela referida oficina, foi objecto de revisão pela companhia de seguros, para a qual afirmaram terem um desconto e que foi aceite pela oficina este orçamento como viável para reparação, com peças novas. Não referiu a testemunha Ricardo que não conseguiria reparar, ou que a reparação seria feita em termos que a tornavam pouco segura, como pretendem os recorrentes, referindo este que considerava que ficaria mais ou menos como estava antes do acidente.
A conclusão de que seria mais arriscado foi retirada pelo Ilustre Mandatário, mas não se retira do depoimento deste testemunha, nem foi referido por esta em momento algum que tenha aceite reparar um motociclo por um valor inferior, mas sem garantias de segurança (da moto e necessariamente do seu condutor).
Nem é viável a conclusão de que a oficina aceitaria a reparação nestes termos, impondo-se então que recusasse a reparação por este valor.
Por outro lado, em momento algum do seu depoimento, a testemunha Ricardo referiu o valor concreto do veículo, nem lhe foi pedida qualquer avaliação do seu valor, pelo que não se pode considerar provada tal matéria, que aliás resultou não assente, não havendo qualquer reparo a fazer à matéria adquirida pelo tribunal recorrido.
Mantém-se assim inalterada a redacção destes pontos.
Por último, requerem os recorrentes a alteração dos factos considerados como não provados, nas alíneas a) a t), considerando que a R. os não impugnou, pelo que se têm por admitidos por acordo, sobre eles não sendo necessário produzir qualquer prova.
Ora, efectivamente pela R. foi deduzida impugnação a estes factos no art 9 º da sua contestação, ou seja, que tendo assumido a responsabilidade pela produção do acidente a cargo da sua segurada, não assumiu nem reconheceu os danos alegados pelos AA., com o fundamento de que se tratavam de factos pessoais dos AA. e não dever ter conhecimento destes.
Ora, sendo certo que são estes danos, factos pessoais dos AA., não alegam estes que apesar disso a R. deles devia ter conhecimento (quer porque ocorrido na sua presença, quer porque, por via das suas funções, deles devesse ter conhecimento). Só neste caso, tal declaração equivaleria a confissão.
Por outro lado e para além do referido neste artigo, prossegue após a R. (artºs 15 e segs.) por referir que convocou, mais do que uma vez, o A., para uma avaliação do dano corporal, que este se não dispôs a realizar, não tendo respondido às missivas, sendo por esse facto que desconhece a extensão das lesões, sequelas e extensão de eventual incapacidade (artº 22, 33 e 34 da p.i.)
Estão pois impugnados estes factos e constituíram eles, aliás, o cerne deste litígio.
Mantém-se assim inalterada a matéria de facto adquirida pelo tribunal recorrido e a que considerou como não provada.
*
Assente a matéria fáctica a considerar, passemos à análise das considerações de direito elencadas pelos AA.
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FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

Fundam os recorrentes a sua discordância relativamente à decisão objecto de recurso, por considerarem, que:
-o A. CA… tem direito a ser indemnizado pelos danos morais sofridos, pois que, além das dores físicas, sofreu ansiedade e medo nos momentos que imediatamente antecederam o acidente.;
-A A. T… ficou lesada igualmente, pois que o A. deixou de poder executar as funções que antes executava;
 -O défice funcional permanente de integridade físico-psíquico é de 15 pontos e não de 10, sendo as sequelas que ficaram registadas no A., CA…, impeditivas do exercício da sua actividade profissional habitual de engenheiro civil;
-A Meritíssima Juíz, “a quo”, não considerou, como deveria considerar, que os danos do A. eram previsíveis, em razão da perda de ganho, ou da diminuição efectiva de rendimentos, dadas as sequelas impeditivas;
-O A. necessitará de efectuar uma artroplastia;
- A Meritíssima Juíz “a quo”, ao calcular a indemnização não considerou o salário efectivo do A., que deveria considerar, porque houve perda de ganho, e optou pelo salário médio nacional, que só deveria optar quando não há perda de ganho;
-A Meritíssima Juíz “a quo” julgou, como se o veículo/mota fosse propriedade individual do A. CA…, e tal veículo é propriedade exclusiva da T…, sendo o pedido de veículo de substituição feito pela A. T…, e não pelo A. CA…;
-O veículo da A. T… foi considerado como reparável, sendo, no entanto, tal veículo é irreparável, sob pena de não oferecer as condições de segurança que oferecia antes do acidente em causa.

Posto isto, não estando colocada em crise a metodologia do acidente, nem a culpa da segurada da R. na sua produção, em causa estão apenas os danos decorrentes desse acidente e o cômputo da indemnização fixada ao A., quer a título de danos não patrimoniais, quer a título de danos patrimoniais.

Cumpre-nos assim decidir

b) Se os danos sofridos pelos AA. decorrentes do acidente descrito nos autos, são valorizáveis, quer a nível de dano não patrimonial, quer a nível de dano moral, em montante superior ao fixado pelo tribunal recorrido;

Ficou a sentença recorrida a título de danos não patrimoniais ao A. a quantia de € 40.000,00, pelo deficit funcional permanente da integridade físico-psíquica (o denominado dano biológico), a que acresce o pagamento de fisioterapia e aquisição de dedicação de que o A. venha a necessitar.
 Com efeito, o mesmo facto ilícito pode provocar danos patrimoniais e não patrimoniais, distinguíveis consoante sejam ou não susceptíveis de avaliação pecuniária. Os primeiros, porque incidentes sobre interesses de natureza material ou económica, reflectem-se no património do lesado, ao contrário dos últimos, que se reportam a valores de ordem espiritual, ideal ou moral, e que apenas “podem ser compensados com a obrigação pecuniária imposta ao agente, sendo esta mais uma satisfação do que uma indemnização” (Antunes Varela, Das Obrigações Em Geral, 5ª Edição, Vol. I, pág. 561).
Por outro lado, nos termos do disposto no artº 562 do C.C., quem estiver obrigado a reparar um dano deve reconstituir a situação que existiria, se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação, devendo essa indemnização ser fixada em dinheiro sempre que a reconstituição natural não for possível (artº 566 do C.P.C.), o que é o caso em apreço.
Assim, a atribuição de uma indemnização pressupõe a demonstração da verificação de danos na esfera jurídica do autor, bem como da existência de um nexo de causalidade que os ligue ao acidente, como decorre do disposto nos arts. 562º e 563º do Cód. Civil.
De acordo com o primeiro dos artigos mencionados, que consagrou a chamada teoria da diferença, o princípio geral é o de que a indemnização deve reconstituir a situação que existiria se não se tivesse verificado o evento danoso, ou seja, a medida da indemnização corresponde à medida do dano sofrido.
De acordo com o disposto no art. 564º do Cód. Civil, o dever de indemnizar compreende não só o prejuízo causado, como os benefícios que o lesado deixou de obter em consequência da lesão e, na fixação da indemnização pode o tribunal atender aos danos futuros, desde que sejam previsíveis; se não forem determináveis, a fixação da indemnização correspondente será remetida para decisão ulterior.
Refere-se o n.º 1 ao que correntemente é designado por danos emergentes e lucros cessantes. Os primeiros correspondem aos prejuízos sofridos, ou seja, à diminuição do património (já existente) do lesado; os segundos, aos ganhos, ou á possibilidade de angariar esse ganhos em consequência da lesão, afectando o seu património. Os danos futuros, a que se refere o n.º 2, tanto podem representar danos emergentes como lucros cessantes (cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, in Código Civil Anotado, vol. I, 4ª ediç., Coimbra Editora, pág.s 579 e 580).
Assim sendo, dentro dos danos patrimoniais, podemos encontrar as seguintes espécies:
 -danos emergentes, que incluem os prejuízos directos e as despesas imediatas;
-ganhos cessantes que correspondem à perda da possibilidade de ganhos concretos do lesado;
-lucros cessantes que correspondem à perda de ganhos futuros, que o lesado não consegue obter em virtude do acto ilícito;
-danos futuros que compreendem os prejuízos que resultaram para o lesado, em consequência do acto ilícito e ainda os que poderiam resultar de uma hipotética manutenção de uma situação produtora de ganhos durante um certo período de tempo, incluindo ainda despesas que só se concretizarão em tempo incerto.
Por outro lado, tanto são computáveis os danos susceptíveis de expressão pecuniária - danos patrimoniais, como aqueles que, não o sendo, por traduzirem a violação de bens jurídicos eminentemente pessoais (como a vida, a integridade física, a liberdade, a honra) mereçam, pela sua gravidade, a tutela do Direito - os danos pessoais, que englobam os danos corporais, e os danos morais.
Ora, a título de danos não patrimoniais, “danos morais e corporais” peticionava o A. na sua p.i., com recurso ao disposto no D.L. 291/2007 e portaria 377/2008 a quantia de € 194.270,60 e a título de danos patrimoniais futuros, a quantia de € 510.938,36, correspondente a uma IPP de 76,05%, considerando que o A. ficou impedido de exercer a sua actividade profissional, embora possa exercer outras profissões compatíveis com a sua área de preparação-técnico profissional, esta última posição por si defendida igualmente em sede de recurso, com base na consideração de que ao A. deve ser considerado um índice funcional permanente da integridade físico psíquica correspondente a 15,084 pontos, mais considerando que sendo este déficit incompatível com o exercício da sua actividade, ocorreu forçosamente perda de capacidade de ganho, pelo que o salário a considerar é o salário auferido pelo A.
Conforme se refere no Ac. da R.L. de 04/06/15, proferido no Proc. nº 2207/12.9TVLSB.L1.2 (disponível para consulta in www.dgsi.pt), “por via deste dispositivo, pretendeu o legislador obviar a alguns inconvenientes derivados de anteriores procedimentos, tendo-o dito no preâmbulo do DL. 153/2008 de 06/08, pela seguinte forma: «O presente decreto-lei visa concretizar mais duas medidas do PADT II, assim continuando a contribuir para que os tribunais portugueses tenham condições para responder melhor a situações em que se verifiquem efectivos litígios que careçam da sua intervenção.
 Uma das medidas previstas na Resolução do Conselho de Ministros n.º 172/2007, de 6 de Novembro, diz respeito à “revisão do regime jurídico aplicável aos processos de indemnização por acidente de viação, estabelecendo regras para a fixação do valor dos rendimentos auferidos pelos lesados para servir de base à definição do montante da indemnização, de forma que os rendimentos declarados para efeitos fiscais sejam o elemento mais relevante”.
Posto isto, nos presentes autos foi fixada ao A. um défice funcional permanente de integridade físico-psíquica de 10 pontos.
Não resultou apurado nem que este déficit seja de 15,084, nem que seja impeditivo do exercício da sua actividade profissional habitual, mas antes que, em termos de repercussão permanente na actividade profissional, as sequelas são compatíveis com a actividade profissional habitual do A., mas implicam esforços suplementares.
Ora, ao contrário do defendido na sentença sob recurso e a que o A. parece igualmente aderir, o valor a atender para fixação do dano biológico não é o do salário médio nacional, mas antes o valor efectivamente percebido pelo lesado, sem que daí resulte qualquer tratamento desigual entre lesados.
O salário médio nacional, como um valor a considerar, apenas terá sentido em casos em que o lesado ainda não auferia, ou já não auferia qualquer rendimento (caso em que ainda assim terá direito à reparação do dano biológico).
No caso do A. existirá sempre rebate profissional, consistente na maior dificuldade na maior oneração para o lesado para realizar aquelas tarefas, devendo este rebate reportar-se à data do acidente e ao vencimento que, nessa altura, o lesado auferia e deve considerar-se o dano biológico que se concretiza no esforço suplementar que as vítimas de incapacidade têm que desenvolver para realizar o seu trabalho.
Na verdade, sendo a incapacidade permanente, “de per si”, um dano patrimonial indemnizável, pela limitação que o lesado sofre na sua situação física, quanto à sua resistência e capacidade de esforços, deve ser reparado, quer acarrete para o lesado uma diminuição efectiva do seu ganho laboral, quer implique apenas um esforço acrescido para manter os mesmos níveis dos seus proventos profissionais – cfr., entre muitos outros, os Acórdãos do STJ de 20/11/2011 e de 20/01/2010 e o Acórdão da Relação de Coimbra de 04/12/2007, todos disponíveis em www.dgsi.pt.
Esta afectação da pessoa do ponto de vista funcional, ainda que não se traduza em perda de rendimento de trabalho efectiva, releva para efeitos indemnizatórios – como dano biológico – porque é determinante de consequências negativas ao nível da actividade geral do lesado e, especificamente da sua actividade laboral, quer diminuindo as alternativas que lhe seriam possíveis ou oferecendo menores possibilidades de progressão na carreira, bem como uma redução de futuras oportunidades no mercado de trabalho, face aos esforços suplementares necessários para a execução do seu trabalho.
Acresce que, como se se refere no Ac. da R. de Coimbra de 12/04/2011, proferido no Proc. nº 756/08.2, disponível para consulta in www.dgsi.pt, “a pontuação não equivale à percentagem de incapacidade, havendo quem (bem) defenda que, enquanto “unidades de apreciação”, o juiz é livre de apreciá-los [os pontos em causa], tão livre como o perito médico, podendo saltar para fora dos limites estabelecidos nas tabelas.”
A circunstância de não ser sempre efectiva a perda de rendimento decorrente das limitações físicas permanentes do lesado tem contribuído para consolidar a figura do dano biológico, consistente numa “Implicação, para o lesado, de um esforço acrescido para manter os mesmos níveis de ganho ou exercer as várias tarefas e actividades gerais quotidianas” (Acórdão do STJ, de 16.09.08, disponível para consulta in www.dgsi.pt).
Este dano biológico tanto pode dar origem a danos patrimoniais como a danos morais (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 21.03.13, proferido no Proc. nº 565/10.9TBPVL.S1 e de 11/04/2013 proferido no Proc. nº 201/07.0TBBGC.P1.S1, disponíveis para consulta em www.dgsi.pt) e é indemnizável, independentemente da perda efectiva e actual de rendimento.
Como se refere no Ac. do STJ de 21/03/13, “saber se está em causa apenas uma perda de capacidades para o exercício de futuras e diversas actividades susceptíveis de serem exercidas pelo lesado ou se, independentemente da existência de um qualquer grau de incapacidade, da lesão resulta previsivelmente perda de oportunidades profissionais; ou saber se a perda de capacidades implica penosidade para o desempenho de qualquer actividade ou apenas de algumas: estamos sempre, em todas essas situações, a ponderar perdas patrimoniais futuras, relevando a diferença concreta de tais situações para a fixação equitativa do montante de indemnização que, por conseguinte, não deixa de ressarcir um dano futuro previsível à luz do art. 564º, nº2, do Cód. Civil (...). Se a perda implica apenas penosidade para certas actividades, mais uma vez se nos depara a questão de saber se a indemnização deve ser fixada - considerada a perda de possibilidade ou oportunidade profissional – ou se, pelo contrário, não deve ser atribuída. Cremos que em tal caso, uma não atribuição, a título de dano patrimonial, só se justifica em circunstâncias muito particulares, designadamente, quando a actividade inviabilizada ou dificultada seja uma actividade que o lesado à luz do critério legal da previsibilidade (art. 564º, nº2, do Cód. Civil), não iria exercer. Nestes casos, a indemnização seria devida a título de dano moral”. (…) Não havendo uma redução retributiva, o trabalhador tem, no entanto, uma redução real porque a penosidade do trabalho é maior e, por conseguinte, o trabalhador tem de trabalhar mais – e trabalhar com mais esforço é trabalhar mais – para receber o mesmo. (…) a vertente não patrimonial indemnizável deste dano é a que resulta do desgosto, da dor, do desespero em que uma pessoa se vê por estar sempre diminuída fisicamente, suportando dores e incómodos com lesões que permanecem e que a usura do tempo tende a agravar (art. 496º do Cód. Civil)”.
Existindo relação entre a incapacidade – dano biológico – e a perda de capacidade de ganho ou perda de proventos, menos dúvidas persistirão no cálculo de danos patrimoniais futuros.
Refira-se que já na Portaria nº 377/2008 de 26/05, no seu artº 3 se consagra a indemnização deste dano nos seguintes termos: “b) O dano pela ofensa à integridade física e psíquica (dano biológico), de que resulte ou não perda da capacidade de ganho, determinado segundo a Tabela Nacional para Avaliação de Incapacidades Permanentes em Direito Civil;”  O seu artº 4 consagra ainda “Além dos direitos indemnizatórios previstos no artigo anterior, o lesado tem ainda direito a ser indemnizado por danos morais complementares, autonomamente, nos termos previstos no anexo I da presente portaria, nas seguintes situações:  a) Por cada dia de internamento hospitalar;
b) Pelo dano estético;
c) Pelo quantum doloris;
d) Quando resulte para o lesado uma incapacidade permanente absoluta para a prática de toda e qualquer profissão ou da sua profissão habitual;
e) Quando resulte para o lesado uma incapacidade permanente que lhe exija esforços acrescidos no desempenho da sua actividade profissional habitual;”
Daqui decorre que esta Portaria n.º 377/2008, de 26/05 (alterada pela Portaria 679/2009, de 25 de Junho), veio estabelecer, conforme referem os recorrentes, um conjunto de regras destinadas a agilizar a apresentação, por parte das seguradoras, de propostas razoáveis aos sinistrados, com vista à regularização de indemnizações devidas por danos causados em acidentes.
Aliás no seu artº 1.º (Objecto da portaria) estipula-se que esta fixa «1 – … os critérios e valores orientadores para efeitos de apresentação aos lesados por acidente automóvel, de proposta razoável para indemnização do dano corporal, nos termos do disposto no capítulo III do título II do Decreto -Lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto.
2 - As disposições constantes da presente portaria não afastam o direito à indemnização de outros danos, nos termos da lei, nem a fixação de valores superiores aos propostos».
Assim é indemnizável a lesão sofrida no «bem» saúde, tratando-se de um dano que afecta a integridade físico-psíquica de forma permanente.
No mesmo sentido, defendeu-se no Ac. do T.R. Guimarães de 09/10/13 proferido no proc. nº 2686/10.9TBVCT.G1, disponível para consulta in www.dgsi.pt que “Sendo a incapacidade permanente, “de per si”, um dano patrimonial indemnizável, pela limitação que o lesado sofre na sua situação física, quanto à sua resistência e capacidade de esforços, deve ser reparado, quer acarrete para o lesado uma diminuição efetiva do seu ganho laboral, quer implique apenas um esforço acrescido para manter os mesmos níveis dos seus proventos profissionais. 3 - Esta afetação da pessoa do ponto de vista funcional, ainda que não se traduza em perda de rendimento de trabalho, releva para efeitos indemnizatórios – como dano biológico – porque é determinante de consequências negativas ao nível da atividade geral do lesado.(…)”.
 Posto isto, para cômputo da indemnização terá de se ter em linha de conta factores como a idade do lesado e a sua situação pessoal, estado de saúde e capacidades laborais, bem como outros factores relacionados com a circunstância de a indemnização arbitrada consistir na imediata entrega de capital (com rendimentos que de imediato serão usufruíveis), a taxa de inflacção, etc.
Na nossa jurisprudência, como critério para a fixação da indemnização decorrente de desvalorização, e face à ausência de uma fórmula legal, tem-se vindo a fazer apelo a fórmulas e cálculos matemáticos, com base no salário auferido, no tempo provável de vida activa, na taxa de inflação e nos ganhos anuais de produtividade. Pretende-se com estas fórmulas retirar um pouco do carácter aleatório que têm presidido a estas indemnizações, fazendo-se uso de equações matemáticas, nomeadamente a descrita no Ac. do S.T.J. de 06/07/00, in C.J.S.T.J., Tomo I, págs.144 e num Estudo de Sousa Dinis publicado na C.J.STJ de 2001, Tomo I, pág.5.
Conforme se refere no Ac. da R.L. de 18/05/06 proferido no Proc. nº 3022/2006-6, disponível para consulta in www.dgsi.pt “Como vem sendo entendimento de há muito firmado na jurisprudência, a indemnização a pagar pela diminuição da capacidade para o trabalho do lesado (IPP) deve representar um capital que se extinga no fim da vida activa da vítima e que seja susceptível de garantir, durante esta, as prestações periódicas, correspondentes à sua perda de ganho (9). Porque se trata, na espécie, de dano futuro no âmbito de um longo período de previsão, a solução mais ajustada é a de conseguir a sua quantificação imediata, embora com a inerente dificuldade de cálculo, naturalmente com a utilização de juízos de equidade. Na verdade, têm sido utilizadas para o efeito, no âmbito da jurisprudência, fórmulas e tabelas financeiras várias, na tentativa de se conseguir um critério mais ou menos uniforme, o que, como é natural, não se coaduna com a própria realidade das coisas, avessa nesta matéria a operações matemáticas, pelo que há que valorizar essencialmente nesta matéria o critério da equidade. Refere, a maioria das decisões que têm adoptado as ditas tabelas financeiras, que estas apenas devem ser utilizadas como instrumento auxiliar de quantificação do montante indemnizatório, devendo o julgador, recorrendo à equidade, corrigir os seus resultados sempre que os considerar desajustados relativamente ao caso concreto (10). “Releva essencialmente o prudente arbítrio do tribunal, nos termos do artigo 566º, n.º 2, do Código Civil, tendo em conta as regras da boa prudência, do bom senso prático, da justa medida das coisas e da criteriosa ponderação das realidades da vida” (11). 4.2. Com vista a tal cálculo, importa ter em consideração, para além do grau de incapacidade, entre outros, factores como a idade da vítima, o seu tempo provável da sua vida activa, a natureza do trabalho que realizava, o salário auferido, deduzidos os impostos e as contribuições, o dispêndio relativo a necessidades próprias, a depreciação da moeda, a evolução dos salários, as taxas de juros do mercado financeiro, a perenidade ou transitoriedade de emprego, a progressão na carreira profissional.”
Em idêntico sentido se refere no Ac. do S.T.J. de 22/09/05, proferido no Proc. nº 05-B2586, proveniente do Tribunal da Relação de Guimarães (Proc. nº 1332/04) “Têm sido utilizadas para o efeito, no âmbito da jurisprudência, fórmulas e tabelas financeiras várias, na tentativa de se conseguir um critério tanto quanto possível uniforme. As referidas fórmulas não se conformam porém, com a própria realidade das coisas, avessa a operações matemáticas, pelo que devem ser entendidas como meramente orientadoras e explicativas do juízo de equidade a que a lei se reporta. Como se trata de dano futuro no âmbito de um longo período de previsão, a solução mais ajustada é a de conseguir a sua quantificação imediata, embora com a inerente dificuldade de cálculo, naturalmente com a ampla utilização de juízos de equidade. A partir dos pertinentes elementos de facto, independentemente do seu desenvolvimento no quadro das referidas fórmulas de cariz instrumental, deve calcular-se o montante da indemnização em termos de equidade, no quadro de juízos de verosimilhança e de probabilidade, tendo em conta o curso normal das coisas e as particulares circunstâncias do caso. (...) Devem, pois, utilizar-se juízos lógicos de probabilidade ou de verosimilhança, segundo o princípio id quod plerumque accidit, com a equidade a impor a correcção, em regra por defeito, dos valores resultantes de cálculo baseado nas referidas fórmulas de cariz instrumental. No fundo, a indemnização por dano patrimonial futuro deve corresponder à quantificação da vantagem que, segundo o curso normal das coisas ou de harmonia com as circunstâncias especiais do caso, o lesado teria obtido não fora a acção e ou a omissão lesiva em causa.”
Concorda-se com o expandido nestes acórdãos, pois que o uso destas fórmulas matemáticas, pese embora possam ser utilizadas como instrumentos de cálculo meramente auxiliares, não devem retirar aplicabilidade ao critério legal, explanado nos artºs 564 e 566 do C.C.
Assim, para cômputo da indemnização terá de se ter em linha de conta factores como: a idade do lesado e a sua situação pessoal, estado de saúde e capacidades laborais, bem como outros factores relacionados com a circunstância de a indemnização arbitrada consistir na imediata entrega de capital (com rendimentos que de imediato serão usufruíveis), a taxa de inflação, etc.
Tendo em conta a idade do lesado (58 anos à data do acidente) e a sua esperança de vida activa (66 anos-Portaria 277/2014) e o valor de rendimentos efectivamente percebidos, obteríamos um valor indemnizatório de (35.000 x 8 x 0.10) €28.000.
No entanto, a este aspecto como considerou a Srº juíza do tribunal recorrido, à que acrescer a esperança média de vida que era em 2013 de 77 anos (com tendência a aumentar situando-se actualmente em média nos 82 anos), uma vez que nestes casos a actividade profissional, não cessa, ou habitualmente não cessa com a idade de aposentação e que as sequelas sofridas agravarão os esforços necessários, obteríamos o montante acrescido de € 38.500,00, no total de € 66.500,00 (€ 84.000,00 se considerarmos a esperança actual de 82 anos (site Pordata).
Ora, tendo em conta que o lesado irá receber este capital de uma só vez, que estas dificuldades ou esforços acrescidos não terão o mesmo rebate profissional após os 70 anos, mostra-se adequado a fixação de uma indemnização no montante de 60.000,00€.
Não sendo impugnada a dedução feita pelo tribunal recorrido dos montantes percebidos a nível laboral, mantém-se nesta parte a decisão recorrida.
 
Dos danos não patrimoniais:
 
Dos factos provados resultou ainda que, em consequência deste embate, conforme se refere na decisão recorrida, o autor sofreu enorme ansiedade e medo nos momentos que imediatamente antecederam e sucederam ao acidente, sofreu fractura fechada bilateral das rótulas, com necessidade de cirurgia de fixação das mesmas.
Em consequência, sentiu muitas dores, quer antes, quer no período pós operatório, com necessidade de medicação analgésica e anti-inflamatória, tendo de usar auxiliares de marcha durante pelo menos duas semanas.
Necessitou de fisioterapia e apresenta dificuldades na marcha após períodos de tempo, mais ou menos longos, em piso irregular; dificuldade em subir e descer escadas; não corre, salta ou ajoelha-se; sente dor ocasional nos joelhos durante a prática do acto sexual, cuja posição exija ficar ajoelhado; tem fenómenos dolorosos intermitentes nos joelhos; não consegue subir e descer andaimes ou árvores; apresenta ainda marcha ligeiramente claudicante; deixou de poder nadar, actividade que praticava com regularidade quase diária, assim como de cuidar da sua horta.
A isto acresce as cicatrizes que apresenta nos membros inferiores, que lhe condicionam um dano estético permanente de grau 3, numa escala de sete graus de gravidade crescente e a repercussão permanente nas actividades desportivas e de lazer também no grau 3, situando-se a repercussão permanente das sequelas na actividade sexual situa-se no grau 3 numa escala de sete graus de gravidade crescente.
São sem dúvida danos graves, em pessoa que não sendo muito jovem era pessoa até netão activa e sem dores, e que o condicionam psicologicamente, com um grau de gravidade elevado.
São assim danos indemnizáveis sendo que “A gravidade do dano há-de medir-se por um padrão objectivo (conquanto a apreciação deva ter em linha de conta as circunstâncias de cada caso), e não à luz de factores subjectivos (de uma sensibilidade particularmente embotada ou especialmente requintada).”-in anotação ao artº 496 do Código Civil anotado de Pires de Lima e Antunes Varela, pág. 499.
Com efeito, as dores sofridas pelo A., o internamento com imobilização, o sofrimento e desgosto que forçosamente lhe está ligado, as sequelas sofridas, que acompanharão o A. para toda a vida, com possibilidade de agravamento, decorrente da idade e do tipo de lesões, são danos indemnizáveis.
Por outro lado, nos termos do artº 496 nº3 do C.C., o montante da indemnização por danos não patrimoniais será fixado equitativamente, tendo em atenção o grau de culpa do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso em apreço (artº 494 do C.C.)
A este propósito, e tendo em atenção serem aplicáveis critérios de equidade, como previsto no art. 496.º n.º 3, primeira parte, do Código Civil, vejamos os padrões indemnizatórios seguidos recentemente pelo Supremo Tribunal de Justiça[4]:
· Acórdão de 07.07.2009, no Proc. 1145/05.6TAMAI.C1: adulto com 36 anos, amputação do membro inferior esquerdo, várias intervenções e tratamentos médicos, repercussões estéticas, claudicação por inadaptação à prótese, e quantum doloris de grau 6 – indemnização arbitrada por danos não patrimoniais: € 75.000,00;
· Acórdão de 04.06.2015, no Proc. 1166/10.7TBVCD.P1.S1: jovem de 17 anos, vários tratamentos médicos, intervenções e internamentos, alta mais de 4 anos depois do acidente, repercussões estéticas, quantum doloris de grau 6, e grave culpa da condutora do veículo causador do acidente – indemnização arbitrada por danos não patrimoniais: € 40.000,00;
· Acórdão de 21.01.2016, no Proc. 1021/11.3TBABT.E1.S1: jovem de 27 anos, múltiplos traumatismos, sequelas psicológicas, quantum doloris de grau 5, dano estético de 2 pontos; incapacidade parcial de 16 pontos, repercussão nas actividades desportivas e de lazer de grau 2, claudicação na marcha e rigidez da anca direita – indemnização arbitrada por danos não patrimoniais: € 50.000,00;
· Acórdão de 26.01.2016, no Proc. 2185/04.8TBOER.L1.S1: jovem de 20 anos, desportista, que ficou com várias cicatrizes em zonas visíveis e padeceu de acentuado grau de sofrimento (quantum doloris de grau 5) e relevante dano estético – indemnização arbitrada por danos não patrimoniais: € 45.000,00;
· Acórdão de 28.01.2016, no Proc. 7793/09.8T2SNT.L1.S1: quantum doloris de grau 5, sujeição a quatro operações, internamento por longos períodos, mais duas operações a que ainda teria de se sujeitar, vários tratamentos de reabilitação, dano estético de grau 4 – indemnização arbitrada por danos não patrimoniais: € 40.000,00;
· Acórdão de 17.03.2016, no Proc. 338/09.1TTVRL.P3.G1.S1: sinistrada com 36 anos de idade, deformação grave do pé direito, com amputação dos cinco dedos e do ante-pé, dificuldade na deslocação e uso de prótese para toda a vida, cicatrizes em 18% da superfície corporal e graves alterações psicológicas – indemnização arbitrada por danos não patrimoniais: € 50.000,00; e,
· Acórdão de 07.04.2016, no Proc. 237/13.2TCGMR.G1.S1: jovem de 22 anos de idade, défice funcional permanente de 8%, quantum doloris de grau 4, sequelas compatíveis com o exercício da actividade habitual mas implicando esforços suplementares, dano estético de grau 3, repercussão permanente nas actividades desportivas e de lazer de grau 1 e diversas sequelas psicológicas – indemnização arbitrada por danos não patrimoniais: € 50.000,00.
Tendo em conta estes parâmetros indemnizatórios e os danos sofridos pelo A., as cicatrizes que apresenta, as dores sofridas, as limitações a nível de lazer, a afectação da sua imagem corporal, a afectação psicológica, entende-se pertinente fixar os danos não patrimoniais em €50.000,00.

Danos patrimoniais

Insurge-se igualmente o recorrente quanto ao segmento da decisão recorrida que não considerou aplicável á R. seguradora a multa que este peticionava por falta de apresentação de uma proposta razoável, nos termos previstos nos artºs 37 e segs. do D.L. 291/2007, alegando que só em Junho de 2013 a seguradora se pronunciou sobre a matéria envolvendo os danos do A.
Ora, a este respeito, refere a decisão recorrida que “o sinistro foi participado à ré seguradora em 16 de Janeiro de 2013 e em 18-01-2013 esta deu início a diligências com vista a confirmar a ocorrência do sinistro e respectivas consequências – cf. pontos 43. e 44. da matéria de facto provada.
Em 30 de Janeiro de 2013, a seguradora dirigiu uma missiva ao autor disponibilizando-se para realizar a avaliação dos danos corporais – cf. ponto 47..
Não resultou demonstrado que o autor não tenha respondido a tal carta mas dessa circunstância não emerge a prova do facto contrário, sendo certo, por outro lado, que resulta à evidência que o sinistro foi caracterizado como acidente de trabalho e o autor foi medicamente assistido pela seguradora do ramo de acidentes de trabalho – cf. pontos 48. a 51. da matéria de facto provada.
De tal modo, não obstante as missivas trocadas entre os autores e a ré e que se aferem nos pontos 60. a 69. da matéria de facto, e onde apenas se alude à reparação do motociclo, a seguradora vem a comunicar ao autor, em 27 de Junho de 2013, que, estando ele a ser assistido por acidente de trabalho, a avaliação clínica e a regularização dos danos corporais seria assumida pela respectiva seguradora, pelo que a ré iria acompanhar o processo de acidente de trabalho e, havendo danos por regularizar, iria liquidar as verbas da sua responsabilidade – cf. ponto 71..
Na sequência desta comunicação e não obstante as múltiplas trocas de comunicação ocorridas entre as partes e sempre atinentes ao ressarcimento dos danos causados ao motociclo, o autor não tornou a solicitar o pagamento de indemnização pelos danos corporais que suportou.
Afigura-se evidente que não sendo a ré seguradora a entidade responsável pela assistência médica dispensada ao autor e estando esta a cargo da seguradora do ramo de acidentes de trabalho, não colhe aqui aplicação o cumprimento das obrigações decorrentes das normas vertidas nos art.ºs 38º, 29º e 40º do DL 291/2007, pois que a seguradora responsável civil não controla o respectivo procedimento, não sendo os seus serviços médicos quem irá atribuir a alta clínica.
Por outro lado, nem se configura que os danos aqui invocados pudessem, ainda assim, ser totalmente quantificáveis para efeitos de apresentação de uma proposta razoável, para efeitos do disposto no art. 39º, n.º 1 do DL 291/2007.
Entende-se, pois, que não se mostram demonstrados factos susceptíveis de permitirem a imputação à ré seguradora de um incumprimento dos deveres fixados nos n.ºs 1 e 2 dos art.ºs 38º e 39º do aludido diploma legal pelo que não se mostram reunidos os pressupostos para a aplicação da multa prevista no n.º 2 do art. 40º desse mesmo diploma ou para o agravamento dos juros.”
 Concorda-se com este entendimento. Tendo o R. logo em Janeiro, dias após o acidente remetido carta ao A., disponibilizando-se para realizar a avaliação do dano corporal, o que não ocorreu, passando o A. a ser seguido em avaliação pela Cª de seguros de acidente de trabalho, não se pode considerar que à R., sem elementos para tanto e sem saber o que decorreria da avaliação efectuada em sede de acidentes de trabalho, incumbia ainda o dever de apresentar proposta de ressarcimento de danos por si e sem culpa, desconhecidos.
Por outro lado, não decorre de nenhum dos factos provados que a A. T… tenha sofrido qualquer dano moral, patrimonial ou decorrente da não atribuição de veículo de substituição, ou que outros danos tenham de ser ressarcidos ao A. CA….
Por último, a respeito da privação de uso do motociclo, a sentença recorrida considerou que “É evidente que a simples privação do uso, decorrente da paralisação, implica a não fruição do veículo, o que constitui, sem mais, um dano. Na verdade, um automóvel está, em regra e por sua natureza, destinado a proporcionar ao seu proprietário ou legítimo detentor utilidades (designadamente a possibilidade de se deslocar para onde quiser e quando quiser) que só podem ser fruídas por via do uso. Ora, impedido este, há um prejuízo que se traduz na impossibilidade de fruir essas utilidades, situação que pode ou não implicar lucros cessantes e/ou danos emergentes com tradução monetária imediata, mas que, em regra, importa a frustração do gozo. Esta, mesmo quando não conduz a qualquer dispêndio, poderá induzir a necessidade de recorrer a favores de terceiros [] ou a renúncia às comodidades que a viatura proporcionava. Assim, impõe-se concluir que a disponibilidade do veículo tem um valor em si.” – cf. acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 12-02-2008, relator Costa Fernandes, processo n.º 6005/05.8TBLRA.C1 publicado na base de dados do ITIJ já referida.
Se a privação do uso do veículo durante um determinado período originou a perda de utilidades que era susceptível de proporcionar e se essa perda não foi reparada mediante a forma natural de reconstituição, impõe-se que o responsável compense o lesado na medida equivalente.
Provada a privação do uso de um veículo automóvel por força dos danos causados por um acidente de viação, basta que se afira dos autos que o seu proprietário o usaria normalmente (o que, por regra, constituirá facto notório ou resultará das presunções naturais a retirar da factualidade provada) para que possa exigir-se ao lesante uma indemnização a esse título, sem necessidade de provar directa e concretamente prejuízos efectivos.
Com efeito, o recurso a padrões de normalidade facilmente permite inferir que, em regra, aquela privação comporta um prejuízo efectivo na esfera jurídica do lesado correspondente à perda temporária dos poderes de fruição sobre o veículo. A amplitude das consequências pode variar de acordo com as circunstâncias objectivas e subjectivas, mas ainda assim raramente será indiferente para o lesado a perda do uso temporário do veículo.
Na reparação do dano consistente na privação do uso do veículo podem configurar-se duas situações distintas: uma em que se apura a concreta existência de despesas feitas pelo lesado em consequência dessa privação (designadamente, quando o lesado se socorre do aluguer de um veículo de substituição); e outra em que não se apuram gastos alguns mas apenas que o lesado utilizava o veículo nas suas deslocações habituais (para fins profissionais ou de lazer) e que não lhe foi facultada viatura de substituição pelo lesante.
No primeiro caso, o lesado tem direito à reparação integral das despesas que teve por força da privação; no segundo, a medida da indemnização deverá ser fixada com recurso à equidade, havendo que encontrar em termos quantitativos um valor adequado a indemnizar o lesado pela paralisação diária de um veículo que satisfazia as suas necessidades diárias – cf. neste sentido, acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 10-09-2013, relatora Maria José Guerra, processo n.º 438/11.8TBTND.C1 publicado na base de dados do ITIJ.
Sucede que, no caso dos autos, ao contrário do alegado pela sociedade autora no sentido de que o motociclo ZL era utilizado pelo autor e por outros empregados daquela, resultou provado que o motociclo era usado pelo autor CA… para realizar as actividades da empresa T…, SA – cf. ponto 42. –, não se provando a sua utilização por outras pessoas.
Além disso, ficou também provado que a sociedade possui vinte e dois veículos registados em seu nome, quatro deles usados pelos engenheiros e encarregado geral e um outro motociclo, que foi objecto de reparação em Maio de 2013, mas sem que se tenha estabelecido qualquer relação entre a necessidade desta e o acidente – cf. pontos 83. e 87. da matéria de facto provada.
Significa isto que, embora a simples privação do uso do veículo confira ao seu titular o direito a ser indemnizado desde que prove que o usaria normalmente, no caso em apreço, sabendo-se que apenas o administrador da autora o utilizava no desenvolvimento da sua actividade e estando demonstrado que este esteve impossibilitado de exercer a sua profissão até 18-05-2013 (não podendo, como o próprio afirma nas suas missivas, conduzir motociclos), a que acresce o facto de em 12 de Março de 2013 ter podido ser iniciada a reparação do ZL, ou seja, em 14 de Março de 2013 o veículo estaria disponível para o uso pelo administrador, não se vislumbra que a não atribuição de veículo de substituição – aliás, apenas solicitado em 4 de Junho de 2013, data em que há muito o ZL poderia estar reparado – represente um efectivo dano para a sociedade autora, posto que no período de imobilização do veículo até à data em que seria reparado não seria utilizado por qualquer outro funcionário da empresa.”
Posto isto, este D.L. 291/2007 de 21/08, transpôs parcialmente para ordem jurídica interna a Directiva n.º 2005/14/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de Maio, que alterou as Directivas n.os 72/166/CEE, 84/5/CEE, 88/357/CEE e 90/232/CEE, do Conselho, e a Directiva 2000/26/CE, relativas ao seguro de responsabilidade civil resultante da circulação de veículos automóveis, revogando o D.L. 83/2006 de 3 de maio que, por sua vez, transpusera parcialmente para a ordem jurídica nacional a Directiva n.º 2005/14/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de Maio, mantendo no essencial o conceito de proposta razoável deste diploma, mas alargando o seu âmbito de aplicação “à generalidade dos acidentes de viação ocorridos em Portugal -, a extensão, agora, do âmbito do regime de regularização de sinistros previsto nesse diploma aos sinistros com danos corporais”.
 Ora, aplica-se este diploma e seus critérios no âmbito da regularização extra-judicial, através do procedimento de apresentação da “proposta razoável”, prevista nos artºs 38 e 39 deste mesmo diploma.(neste sentido, para além dos acs. citados na decisão recorrida,  vidé Ac. desta relação de 04/07/2013, proferido no Proc. nº 3643/11.3TBSLX.L1-6, relatora Fátima Galante; de 29/04/2014, Proc. nº 70/14.4 YRLSB-6, relatora Teresa Pardal; Ac da R. Coimbra de 08/04/2014, Proc. nº 1091/12.7TJCBR.C1, relator Fonte Ramos, Ac. da Relação de Guimarães de 27/10/2016, Proc. nº 224/14.3T8FAF.G1, relatora Lina de Castro Baptista, todos disponíveis in www.dgsi.pt).
As considerações acima efectuadas sobre a aplicabilidade das disposições do D.L. 291/2007 em sede extra-judicial, mantêm-se pertinentes nesta sede.
A privação do uso do veículo, resultante de acidente de viação, traduz-se num dano patrimonial que nos termos gerais do artigo 562º do Código Civil, deve ser reparado pelo lesante, caso exista.
Tal entendimento tem acolhimento pacífico na Jurisprudência, citando-se a título de exemplo o acórdão da Relação de Coimbra de 26.04.90 - in CJ Ano XV, T2, pag. 73, que decidiu nestes termos: "A reparação do veículo não compensa o utente quanto à privação do seu uso, sendo necessário colocar à sua ordem outro veículo enquanto durar a reparação, ou proceder à liquidação das despesas que a falta dessa substituição acarretar".
Em sentido concordante defendeu-se ainda no Ac. da Relação de Lisboa de 29/06/06 proferido no Proc. nº 4899/2006-6, disponível para consulta in www.dgsi.pt, “De acordo com as regras da experiência, quando se estabelece a comparação entre a situação do proprietário que manteve intacto o seu poder de fruição e a de um outro que dele seja privado temporariamente, que não existe entre ambas uma equivalência substancial. Uma vez que a privação do uso do bem durante um determinado período origina a perda das utilidades que o mesmo era susceptível de proporcionar e se tal perda não pode ser reparada mediante a forma natural de reconstituição, impõe-se que o responsável compense o lesado na medida equivalente. A medida do ressarcimento pode variar de acordo com os reflexos casuisticamente imputáveis ao evento. Mas, salvo situações excepcionais resultantes de factos concretamente apurados, àquela situação de carência corresponderá a atribuição de uma compensação monetária. Assim, a privação de uso, merece a tutela do direito, e, nesta medida, indemnizável, isto porque o simples uso do bem constitui uma vantagem susceptível de avaliação pecuniária e, a sua privação, naturalmente, um dano.” (No mesmo sentido vidé ainda o Ac. da Relação de Lisboa de 23/06/2005, proferido no proc. Nº 6174/2005-6, os acordão acima citados desta Relação de 04/07/2013, e 29/04/2014; da R. Coimbra de 08/04/2014, da Relação de Guimarães de 27/10/2016, bem como o ac. desta Relação de Lisboa de 09/07/2014, Proc. nº 3100/12.0YXLSB.L1-1, relator Manuel Marques; Ac. da Relação do Porto de 16/03/2015, Proc. nº 224/12.8TVPRT.P1, relator Carlos Gil, disponível para consulta in www.dgsi.pt.)
Sendo a privação da coisa, um dano em si, merece a tutela do direito, independentemente de a A. ter eventualmente outros veículos, ou ter tido ou não necessidade de proceder ao aluguer de uma viatura. Por outro lado este dano apenas cessa com a atribuição de indemnização à lesada em caso de perda total, ou com a reparação da viatura de que está privada, caso não ocorra a perda total.
Só assim se considera reparado o dano consistente na privação, sem que mais uma vez este esteja limitado pelo disposto no artº 42 do D.L. 291/2007 que se refere à disponibilização de veículo de substituição, em sede de procedimento de regularização de sinistros, extra-judicial.
No entanto, no caso em apreço, o acidente ocorreu em 15 de Janeiro, tendo a seguradora designado peritagem para 18 de janeiro, que se não realizou por indisponibilidade dos AA.
Posteriormente efectuada peritagem em 23 de janeiro, os AA. não aceitaram a sua reparação, tendo em 20 de Março solicitado que, em vez da reparação, lhes fosse pago o valor equacionado para reparação e entregues os salvados.
Mantendo a R. a sua intenção de reparação do veículo (dever a que estava obrigada-de reconstituição natural) e insistindo a A. T… pela entrega do montante de reparação acrescido dos salvados, apenas em Junho, veio solicitar veículo de substituição, tendo em Julho, conforme decorre do facto nº 72, acordado na quitação total dos danos referentes a este motociclo (valor de reparação e valor de paralisação da viatura, acordo que posteriormente se denota ter ficado sem efeito, vindo afinal a a seguradora a propor o valor de € 3960 (ponto 82).
Daqui decorre que, devendo a R. colocar à disposição do lesado veículo de substituição ou ressarcir este dano, tal dano se não verifica quando, oferecendo-se a seguradora para efectuar a perícia 3 dias após o acidente, esta se não realiza por impedimento dos AA. e quando ordenada a reparação, esta se não realiza por não aceitação dos AA., manifestando estes perante a seguradora (e o A., pessoa singular, actuava perante a seguradora na qualidade de representante do proprietário, pessoa colectiva) não pretender conduzir esta moto e não necessitar deste veículo, pretendendo antes a entrega do valor da reparação (a que a R. não estava obrigada).
As negociações entabuladas pelas partes com vista à definição deste montante e a recusa dos AA. de aceitar a reparação do veículo, que era reparável, são incompatíveis com a pretensão de privação do uso do veículo.
Improcede pois este pedido.
*
DECISÃO

Pelo exposto, decidem os juízes desta relação em:
a) conceder parcial provimento ao recurso interposto pelo A. CA…, fixando os danos decorrentes do dano biológico na quantia de € 60.000,00 (abatíveis os montantes recebidos em sede de acidentes de trabalho de € 32 684,65) e os danos morais em € 50.000,00.
b) No demais, manter a decisão recorrida.
Custas pelos apelantes e apelada na proporção do respectivo decaimento.


Lisboa 20/09/18

Cristina Neves

Manuel Rodrigues

Ana Paula A.A. Carvalho

[1] Ac. STJ de 01.10.2015, proc. 824/11.3TTLRS.L1.S1, Ana Luísa Geraldes; Ac. STJ de 14.01.2016, proc. n.º 326/14.6TTCBR.C1.S1, Mário Belo Morgado; Ac. STJ de 11.02.2016, proc. n.º 157/12.8TUGMR.G1.S1, Mário Belo Morgado; Ac. STJ, datado de 19/2/2015, proc. nº 299/05, Tomé Gomes; Ac. STJ de 22.09.2015, proc. 29/12.6TBFAF.G1.S1, 6ª Secção, Pinto de Almeida; Ac. STJ, datado de 29/09/2015,proc. nº 233/09, Lopes do Rego; Acórdão de 31.5.2016, Garcia Calejo, proc. nº 1572/12; Acórdão de 11.4.2016, Ana Luísa Geraldes, proc. nº 449/410; Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 27.1.2015, Clara Sottomayor, proc. nº 1060/07.

[2] Ac. STJ. de 03.03.2016, Ana Luísa Geraldes, proc. nº 861/13.3TTVIS.C1.S

[3] Cfr. o Acórdão da Relação de Guimarães de 04.02.2016, no Proc. 283/08.8TBCHV-A.G1, disponível em www.dgsi.pt, com o seguinte sumário: «Para que a decisão da 1.ª instância seja alterada, haverá que averiguar se algo de “anormal” se passou na formação dessa apontada “prudente convicção”, ou seja, ter-se-á que demonstrar que na formação da convicção, retratada na resposta que se deu à factualidade controvertida, foram violadas regras que lhe deviam ter estado subjacentes, nomeadamente aferir da razoabilidade da convicção formulada pelo juiz da 1.ª instância, face às regras da experiência, da ciência e da lógica, da sua conformidade com os meios probatórios produzidos, sem prejuízo do poder conferido à Relação de formular, nesse julgamento, com inteira autonomia, uma nova convicção, com renovação do princípio da livre apreciação da prova.»
De igual modo, cfr. o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 31.05.2016, no Proc.1572/12.2TBABT.E1.S1, disponível na mesma base de dados, decidindo que «O Tribunal da Relação deve exercer um verdadeiro e efectivo 2.º grau de jurisdição da matéria de facto e não um simples controlo sobre a forma como a 1.ª instância respondeu à matéria factual, limitando-se a intervir nos casos de flagrante desconformidade entre os elementos de prova e a decisão, pois que só assim se assegurará o duplo grau de jurisdição, em matéria de facto, que a reforma processual de 1995 (DL n.º 329-A/95, de 12-12) visou assegurar e que o actual Código confirmou e reforçou.»

[4] Todos os arestos citados estão publicados em www.dgsi.pt.