Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
16496/19.4T8LSB.L1-4
Relator: CELINA NÓBREGA
Descritores: SINDICATO
IRREGULARIDADE DE CONSTITUIÇÃO
EXTINÇÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 09/14/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: N
Texto Parcial: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA A SENTENÇA
Sumário: 1Aos tribunais de recurso cabe reapreciar as questões decididas pelo Tribunal a quo, podendo apreciar as questões novas que sejam de conhecimento oficioso.

2Se nas alegações e nas conclusões o Recorrente não apresenta quaisquer argumentos ou motivos de ordem jurídica que, na sua óptica, determinam um juízo diverso daquele que teceu a sentença recorrida sobre a existência de irregularidades na constituição do Réu e de nulidades das cláusulas dos Estatutos, tal determina a improcedência da sua pretensão.


(Sumário elaborado pela relatora)

Decisão Texto Parcial:Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa
Relatório


O Ministério Público veio, ao abrigo do disposto nos artigos 5.º-A, al.a) do Código  de Processo do Trabalho e 447.º n.ºs 4 b) e 8 do Código do Trabalho, instaurar acção declarativa para Extinção de Associação, com processo especial, contra BBB, com sede na …Lisboa, pedindo que, julgada procedente a acção, seja, em consequência, declarada a extinção do Réu nos termos do art.º 447.º, n.º 8 do Código do Trabalho, devendo ser comunicada tal decisão ao Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social, para registo e publicação no BTE, conforme artigos 447.º n.º 9 e 456ºn.º3 do Código do Trabalho.

Invocou para tanto, em suma, que:
O presidente da mesa da assembleia constituinte do BBB …, requereu à DGERT, em 16 de Outubro de 2018, o registo da respectiva constituição e a publicação dos estatutos aprovados, em assembleia constituinte, realizada em 22 de Setembro de 2018, tal como dispõe o art.º 447º e seguintes do Código do Trabalho;
Encontrando-se o pedido de registo da constituição do sindicato e dos seus estatutos formalmente instruído de acordo com o n.º 2 do artigo 447.º do CT e não conhecendo ou vislumbrando a DGERT, à data do mesmo, qualquer fundamento de facto ou de direito que obstasse à sua aceitação, foi o supra citado requerimento deferido pela DGERT em 23/10/2018, sem prejuízo de posterior apreciação da legalidade da constituição nos termos e para os efeitos previstos na alínea b) do n.º 4 e no n.º 8 do artigo 447.° do CT;
Assim, o registo da constituição do supra mencionado Sindicato foi efectuado e enviado para publicação no BTE n.º 41, de 8 de Novembro de 2018, in http://bte.gep.msess.gov.pt/, de acordo com a alínea a) do n.º 4 do artigo 447º do CT;
A DGERT emitiu a Apreciação Fundamentada sobre a legalidade da constituição e dos estatutos do BBB e remeteu-a, nos termos e para os efeitos do disposto na al. b) do nº 4 e nº8 do art.º 447º do CT, ao Ministério Público;
Compulsada a documentação da assembleia constituinte verifica-se que nela tomou parte o Dr. …, que é advogado inscrito na Ordem dos Advogados e que não detém relação jurídica de trabalho subordinado, no âmbito profissional indicado nos estatutos;
Aferiu a DGERT que parte das pessoas intervenientes na constituição do sindicato são membros de uma associação profissional - constituída ao abrigo do regime geral do direito de associação (Decreto-Lei n.º 594/74, de 7 de Novembro), isto é, sem natureza sindical - denominada por …
Embora a cópia do registo de presenças da Assembleia Constituinte e da eleição esteja autenticada por advogada como estando conforme "o original e extraída da lista de presenças da Assembleia Geral Constitutiva do BBB", tem o logo e sigla da BBB pelo que não é possível atestar com rigor se pertence efectivamente ao acto de constituição e da eleição dos membros dirigentes do BBB, para além de que do referido documento não consta a data e local;
A morada da sede da associação sindical (tal como da assembleia constituinte) corresponde à morada do escritório da sociedade de advogados …, bem como ao domicílio profissional, nomeadamente do Dr. …, o que pode colocar em causa o princípio da autonomia e independência da associação sindical (artigo 405.º do CT);
As alíneas b) e c) do n.º2 do artigo 8.º suscitam dúvidas de legalidade, pois  a sua redacção permite a inscrição como associados de pessoas que não exercem, de facto, a actividade de motorista de matérias perigosas, o que afronta a al. a) do n.º 1 do artigo 442.º do CT e o n.º 2 do artigo 444.º do CT;
Os estatutos não regulam o funcionamento (quóruns) da Comissão de Recursos a qual faz parte dos órgãos sociais violando, assim, o disposto na alínea b) do n.º 1 e n.º 5 do artigo 450.º do CT;
Os estatutos da Ré são omissos quanto à regulação da sua extinção, o que viola o disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 450° do CT;
Os estatutos não regulam o exercício do direito de tendência, em violação do disposto na alínea e) do n.º 1 do artigo 55.º da CRP e no n.º 2 do artigo 450.º do CT;
A eleição dos delegados sindicais não prevê que seja feita por voto directo e secreto;
Nem está previsto que a destituição é por voto directo e secreto;
O artigo 51.º dos Estatutos coloca em causa o princípio da gestão democrática da associação, nomeadamente por não assegurar para todos os associados do sindicato o direito de elegerem e serem eleitos, bem como da igualdade de oportunidades entre associados e a da imparcialidade dos membros da comissão e das listas concorrentes aos novos corpos sociais, em conformidade com o disposto nas alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 451.° do CT;
O n.º 3 do artigo 53.º e a al.a) do artigo 52.º dos Estatutos, que regem sobre a Comissão de Gestão, colocam em causa o princípio da gestão democrática da associação, e por não estar garantido o disposto nas alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 451.° do CT, relativamente a todos os membros da referida comissão, por o seu mandato não se encontrar temporalmente devidamente delimitado, permitindo-se com tal facto que a mesma se substitua nas competências atribuídas a outros órgãos;
O artigo 56.º dos Estatutos viola o disposto no n.º 1 do artigo 47.º do CT; e
No n.º 5 do artigo 21º é feita referência ao disposto no “n.º 11 deste Artigo", o qual não existe.
Foi ordenada a citação do Réu, tendo a carta com aviso de recepção sido endereçada para a … Lisboa, carta que foi entregue a … em 05.09.2019.

O Réu não apresentou contestação.

Foi proferido despacho que determinou  a notificação do Réu para vir aos autos informar: i)-se o Sr. Dr…, à data da sua constituição, era sujeito de uma relação jurídica de trabalho subordinado no âmbito profissional indicado nos estatutos; e ii)-se as demais pessoas que participaram na constituição do BBB tinham, nessa data, a qualidade de trabalhadores por conta de outrem, com a categoria de motoristas de matérias perigosas.

A carta veio devolvida com a menção de “não atendeu”

Mais foi determinado que se oficiasse à …, com cópia da acta de fls. 19 a 22, solicitando informação sobre se as pessoas ali identificadas eram, à data, seus membros e, na afirmativa, quais os cargos que exerciam.

A carta veio devolvia com a menção “mudou-se”.

Foi solicitado ao Exmo. Presidente do Conselho Regional de Lisboa da Ordem dos Advogados que informasse se, à data de 22/09/2018, o Sr. Dr. … era detentor de cédula profissional para o exercício de advocacia, tendo sido junta informação da qual consta que o Exmo. Advogado está inscrito desde 06.06.2017 e que, à data da informação (31.01.2020), a inscrição estava no estado activo.

Foi proferido saneador sentença que finalizou com o seguinte dispositivo:
“Pelo que ficou exposto e nos termos das disposições legais citadas, julgo a presente acção totalmente procedente e, em consequência, declaro a extinção do …BBB”.
Custas pelo réu – art. 527, nºs 1 e 2, do CPC.
Fixo à causa o valor de € 30.000,01 - art. 306º, nº 2, do CPC.
Registe, notifique e, após trânsito, remeta cópia da presente sentença, para efeitos de registo e publicação no BTE, nos termos do disposto nos arts. 447º, nº 9 e 456º, nº 2, ambos do CT.
D.N.”

O Réu veio apresentar reclamação arguindo a falta e nulidade da citação invocando, para tanto, em suma, desconhecer que sobre si corria acção judicial para a qual nunca foi citado e de que tomou conhecimento através da comunicação social, sendo que a carta que foi enviada para a morada … Lisboa, nunca foi recebida pelo Réu e que, a não se entender assim, não foi cumprido o disposto no artigo 233.º do CPC, o que determina a nulidade da citação.
Mais invocou a prescrição do direito de intentar a acção e já terem sido corrigidas a larga maioria (senão todas) as inconformidades suscitadas (ainda que tardiamente) pelo Ministério Publico.
Finalizou pedindo que a reclamação fosse recebida e que, em consequência, fossem anulados todos os actos subsequentes à Petição Inicial, ordenando-se a citação do BBB, para que este pudesse exercer o seu direito ao contraditório.
Mais pediu a absolvição do pedido por estar verificada a excepção peremptória da prescrição.

O Ministério Público respondeu à reclamação concluindo, por um lado, que o Réu foi devidamente citado e, por outro, que a acção foi interposta dentro do prazo legal.

O Réu, não se conformando com o saneador sentença, recorreu e sintetizou as suas alegações nas seguintes conclusões:
(…)
O Tribunal a quo proferiu o seguinte despacho:

Venerandos Desembargadores.
Entendo que, no caso, não se verifica a falta ou nulidade da citação, arguida pelo réu.
Na verdade, à data da propositura da acção, a morada da sede do réu era na … Lisboa, onde também teve lugar a assembleia que levou á sua constituição e era também morada da sociedade de advogados “…”.
E morada profissional do ilustre advogado que ora o representa, o qual participou na assembleia de constituição do sindicato.
Assim, não é crível que a carta de citação do réu não lhe tenha sido entregue.
Acresce que do aviso de recepção de fls. 79 resulta que a carta foi entregue na sede do sindicato a 05/09/2019, sendo recebida pela pessoa ali identificada.
Mostra-se, deste modo, cumprido o formalismo previsto nos arts. 246º, nºs 1 e 2, e 230º, ambos do CPC.
No entanto, e como sempre, esse Tribunal melhor decidirá. “

E no mesmo despacho admitiu o recurso.

Subidos os autos a este Tribunal da Relação, o Exmo. Relator proferiu despacho que considerou ser o recurso o próprio, ter sido interposto em prazo e com o efeito legalmente previsto.

Mais foi relegado para o Acórdão o conhecimento da questão relativa ao teor e forma das conclusões da apelação que foi suscitada pelo Ministério Público nas contra-alegações.

A 24.03.2021 foi proferido Acórdão que entendeu não ser de rejeitar o recurso com base em falta de conclusões, nem ser de convidar o Recorrente a formulá-las de forma mais curta e contida e que, a final,  determinou “a descida dos autos ao Tribunal recorrido com vista ao mesmo apreciar efectivamente, através de despacho judicial fundamentado, recorrível e devidamente notificado às partes as questões suscitadas na reclamação no que concerne à verificação das nulidades principais de falta ou nulidade de citação do Réu Sindicato.”

Baixaram os autos à 1.ª instância tendo o Tribunal a quo proferido o seguinte despacho:
“Em obediência ao ordenado no acórdão proferido nos autos pelo Tribunal da Relação de Lisboa, passo a apreciar as questões da nulidade ou falta de citação, suscitadas pelo réu no requerimento de fls. 109 a 120 (Refª 36699577).
O réu alega, em síntese:
- Que quando teve conhecimento, pela comunicação social, da pendência deste processo, já a sentença tinha sido proferida;
-Que, consultado o processo, constatou que a carta enviada para citação, endereçada para a morada “… Lisboa”, foi recebida por pessoa que desconhece e que nunca lhe deu conhecimento da mesma;
- Que verificou ainda, nessa mesma consulta, que a secretaria não deu cumprimento ao disposto no art. 233º do CPC, uma vez que a citação foi entregue a pessoa diversa do citando;
- Que não tendo sido cumprido o formalismo prescrito na lei para aquele acto, ficou impedido de exercer o direito ao contraditório, consagrado na lei, por falta de citação.
Vejamos.
O art. 246º do CPC, sob a epígrafe Citação de pessoas colectivas, dispõe:
1.Em tudo o que não estiver especialmente regulado na presente subsecção, à citação de pessoas coletivas aplica-se o disposto nas subsecções anteriores, com as necessárias adaptações.
2.A carta referida no n.º 1 do artigo 228.º é endereçada para a sede da citada inscrita no ficheiro central de pessoas coletivas do Registo Nacional de Pessoas Coletivas.
3.(…)”.
Por sua vez, o art. 228º, nº 1, do mesmo diploma, estabelece que “A citação de pessoa singular por via postal faz-se por meio de carta registada com aviso de receção, de modelo oficialmente aprovado, dirigida ao citando e endereçada para a sua residência ou local de trabalho, incluindo todos os elementos a que se refere o artigo anterior e ainda a advertência, dirigida ao terceiro que a receba, de que a não entrega ao citando, logo que possível, o faz incorrer em responsabilidade em termos equiparados aos da litigância de má fé”.
Por seu turno, o nº 1 do art. 230º do mesmo código, prescreve que “A citação postal efectuada ao abrigo do artigo 228.º considera-se feita no dia que se mostre assinado o aviso de receção e tem-se por efetuada na própria pessoa do citando, mesmo quando o aviso de receção haja sido assinado por terceiro, presumindo-se, salvo demonstração em contrário, que a carta foi oportunamente entregue ao destinatário”.
Neste particular, não basta a alegação pelo réu de que não teve conhecimento do acto de citação, revelando-se ainda necessário que alegue e demonstre não só que tal aconteceu, mas ainda que sucedeu devido a circunstâncias que não lhe são imputáveis, de modo a poder verificar-se a falta de citação – art. 188º, nº 1, al. e), do CPC.
É que, estabelecendo a lei, no art. 230º, nº 1, do CPC, a presunção da entrega da carta de citação ao destinatário, mesmo quando o aviso de recepção se mostre assinado por terceiro, impenderia sobre o réu não só o ónus da contraprova, mas sim o ónus da prova do contrário, o qual, manifestamente, não cumpriu.
Na verdade, à data da propositura da acção, a morada da sede do réu era na … Lisboa, onde também teve lugar a assembleia que levou á sua constituição e era também morada da sociedade de advogados “…”.
E morada profissional do ilustre advogado que ora o representa, o qual participou na assembleia de constituição do sindicato.
Assim, não é crível que a carta de citação do réu não lhe tenha sido entregue.
Acresce que do aviso de recepção de fls. 79 resulta que a carta foi entregue na sede do sindicato a 05/09/2019, sendo recebida pela pessoa ali identificada.
Mostrando-se, deste modo, cumprido o formalismo previsto nos arts. 246º, nºs 1 e 2, e 230º, ambos do CPC.
***
DECISÃO
Pelo exposto e sem necessidade de mais alongadas considerações, indefiro à arguição pelo réu da nulidade ou falta de citação, no requerimento em epígrafe.
*
Notifique.
*
D.N.”
Deste despacho não foi interposto recurso.

Posteriormente, na sequência da notificação da dispensa da conta, veio o Réu requerer o prosseguimento dos autos invocando manterem-se por decidir as demais questões suscitadas no recurso.

Foi proferido despacho que determinou a subida dos autos a este Tribunal da Relação.

Redistribuído o processo foram colhidos os vistos.

Cumpre, agora, apreciar e decidir.

Objecto do recurso

Como é sabido, o âmbito do recurso é delimitado pelas questões suscitadas pelo recorrente nas conclusões das suas alegações (arts. 635º nº 4 e 639º do CPC, ex vi do nº 1 do artigo 87º do CPT), sem prejuízo da apreciação das questões que são de conhecimento oficioso (art.608.º nº 2 do CPC).

Assim, no presente recurso, há que conhecer as seguintes questões:
1.ª- Da falta de citação e falta de notificação da sentença.
2.ª- Da prescrição do direito de intentar a presente acção.
3.ª- Da nulidade da constituição do Réu Sindicato e da nulidade das cláusulas do seu Estatuto.

Fundamentação de facto

Na sentença foram considerados provados os seguintes factos:

A)O presidente da mesa da assembleia constituinte do … BBB, …, requereu à DGERT, em 16 de Outubro de 2018, o registo da respectiva constituição e a publicação dos estatutos aprovados em assembleia constituinte, realizada em 22 de Setembro de 2018.
B)–O requerimento, referido em A), foi deferido pela DGERT em 23/10/2018, e o registo da constituição do BBB foi efectuado e enviado para publicação no BTE n.º 41, de 08 de Novembro de 2018.
C)A DGERT emitiu a Apreciação Fundamentada sobre a legalidade da constituição e dos estatutos do BBB, cuja cópia consta de fls. 49 a 67 dos autos e que aqui se dá por integralmente reproduzida, e remeteu-a ao Ministério Público junto deste Juízo do Trabalho.
D)–O …, é advogado inscrito na Ordem dos Advogados desde 06/06/2017 (cédula nº 57078) e tomou parte na assembleia constituinte do BBB.
E)Algumas pessoas intervenientes na constituição do BBB são membros de uma associação profissional sem natureza sindical …  tais como:
- …, membro da Mesa da Assembleia Geral da … e eleito para o cargo de Presidente do Conselho Fiscal do BBB;
- …, Secretário da Assembleia Geral da … e eleito para o cargo de Vice-presidente da Direcção do BBB;
- …, Vogal do Conselho Fiscal da … e eleito para o cargo de Secretário do Conselho Fiscal do BBB;
- …, Vogal do Conselho Fiscal da … e eleito para o cargo de Vice-presidente do Conselho Fiscal do BBB.
F)–Os estatutos do BBB mostram-se juntos por cópia a fls. 35 a 48 dos autos, dando-se o seu teor aqui por integralmente reproduzido.
*

Por resultar do documento n.º 5 junto aos autos, ao abrigo do disposto nos artigo 662.º n.º 1 e 663.º n.º 2 do CPC, adita-se aos factos provados sob a al.G) o seguinte facto:
G)No dia 5 de Agosto de 2019 deu entrada no Tribunal do Trabalho de Lisboa, dirigida ao Magistrado do Ministério Público e elaborada pela DGERT a “Apreciação fundamentada sobre a legalidade do processo de constituição e dos estatutos do Sindicato … BBB”.

Fundamentação de direito

Comecemos por apreciar a primeira questão suscitada no recurso e que se prende com a alegada falta de citação do Réu e falta de notificação da sentença.
Nas conclusões A) a I) invoca o Recorrente, em síntese, que, só no dia 6 de Outubro de 2020, tomou conhecimento da existência dum processo judicial instaurado contra si e que nunca foi citado para os seus termos e que apenas nesse dia foi notificado da sentença.
Acrescentou que, não existindo mandatário constituído no processo, a não ser no dia 6 de Outubro de 2020, o prazo para o recurso deverá contar-se a partir dessa data, pelo que o recurso deve ser admitido por tempestivo.

Contrapôs o Ministério Público, em suma, que não se verifica a arguida falta de citação e que o recurso é extemporâneo.

Vejamos:

Da alegada falta de citação:

No dia 6 de Outubro de 2020, o Recorrente apresentou reclamação junto do Tribunal a quo arguindo a falta e a nulidade da citação.
O Tribunal a quo, no despacho em que admitiu o recurso (despacho de 21.12.2020), dirigindo-se a este Tribunal da Relação, entendeu que não se verificava a alegada falta de citação do Réu nem a nulidade da sua citação.
Por Acórdão datado de 24.03.2021, entendeu o Tribunal da Relação que o Tribunal a quo não tinha conhecido da questão da nulidade e falta de citação do Réu que lhe tinha sido submetida à apreciação na mencionada reclamação. E, por isso, determinou a baixa dos autos para que tal questão fosse decidida, mediante despacho devidamente fundamentado e notificado às partes.
Tendo os autos baixado ao Tribunal de 1.ª instância, em 14.06.2021 foi proferido despacho que indeferiu as arguidas falta e nulidade da citação do Réu, concluindo que este foi regularmente citado em 05.09.2019.
O Réu, devidamente notificado de tal despacho, decorrido o prazo para tanto, não interpôs recurso, pelo que aquela decisão transitou em julgado. Com efeito, dispõe o artigo 626.º do CPC que “A decisão considera-se transitada em julgado logo que não seja suscetível de recurso ordinário ou de reclamação.”
Por conseguinte, não é possível conhecer, no âmbito do presente Acórdão, a questão da falta e nulidade de citação do Réu, na medida em que já se mostra decidida e a decisão já transitou em julgado.

Da falta de notificação da sentença:
Com a alegação de que, apenas no dia 06 de Outubro de 2020, o Réu foi notificado da sentença, pretende o Recorrente justificar a tempestividade do recurso.
O Tribunal a quo proferiu despacho que admitiu o recurso, considerando-o tempestivo.
Como se sabe, o n.º 5 do artigo 641.º do CPC, aplicável ao caso ex vi do artigo 1.º n.º 2 al.a) do CPT, determina que “ A decisão que admita o recurso, fixe a sua espécie e determine o efeito que lhe compete não vincula o tribunal superior (…)”.
Neste Tribunal da Relação, o Exmo. Relator do processo, em despacho liminar, datado de 28.03.2021, também considerou que o recurso era tempestivo, sendo certo que tal afirmação não foi posta em causa no Acórdão proferido.
Consequentemente, a questão da tempestividade do recurso já se mostra decidida e transitada em julgado, pelo que, não há que conhecê-la, novamente, no âmbito do presente Acórdão. 
Em suma, no presente Acórdão não há que conhecer das questões da nulidade e falta de citação do Réu nem da tempestividade do recurso pela simples razão de que já foram conhecidas nos termos mencionados.
*

Analisemos, agora, a segunda questão suscitada no recurso e que consiste em saber se ocorreu a prescrição do direito de intentar a presente acção.

A este propósito, nas conclusões J) a SS) invoca o Recorrente, em resumo, que o  prazo que o Ministério Público dispunha para intentar a acção encontra-se prescrito posto que, no dia 16 de Outubro de 2018, foi enviado à DGERT o pedido de constituição do BBB, acompanhado de todos os elementos necessários, incluindo a ACTA constitutiva e os Estatutos aprovados, que no dia 23 de Outubro, a DGERT aprovou os referidos Estatutos, tendo-os publicado no Boletim do Trabalho e Emprego no dia 8 de Novembro de 2018, o que significa que, na pior das hipóteses, e dando cumprimento ao disposto no Art.º 447.º do CT, a DGERT enviou ao Ministério Público tais Estatutos até ao dia 16 de Novembro de 2018, que a partir desta data, contam-se 15 dias para que o Ministério Público se pronuncie sobre a ilegalidade de qualquer norma estatutária, o que deveria ter acontecido até ao dia 1 de Dezembro de 2018, mas não aconteceu, que o Ministério Público foi notificado dos Estatutos e não aproveitou o prazo que a lei lhe concede para que se pronunciasse negativamente, nem a DGERT se pronunciou negativamente sobre os Estatutos, concedendo prazo para a sua correção, nem o Ministério Público se pronunciou negativamente nos 15 dias posteriores ao envio dos mesmos, tendo que o fazer (na pior das hipóteses) até ao dia 1 de Dezembro de 2018. Assim, acrescenta, tendo o Ministério Público tomado, obrigatoriamente, conhecimento da deliberação de constituição do BBB, até ao dia 16 de Novembro de 2018 (como limite máximo) e não se tendo pronunciado nos 15 dias seguintes de acordo com o Art.º 447.º do Código do Trabalho, nem nos 20 dias seguintes de acordo com o Art.º 164.º do Código de Processo do Trabalho, não pode, decorrido quase um ano, vir intentar uma acção com vista à dissolução do Sindicato e que, apesar de não existirem datas  (propositadamente ou não) nos documentos juntos ao processo, os prazos são os que decorrem da lei, não colhendo a tese de que não verificou qualquer irregularidade (a existir), nem a argumentação de que só nessa data se aperceberam que existia um advogado que também era associado do Sindicato, pois na greve de Abril de 2019 (4 meses antes da propositura da ação) já essa notícia tinha sido tornada pública, pelo que a acção não pode proceder sendo manifesto que, quando o Ministério Público propôs a acção, já estava ultrapassado o respectivo prazo.

Contrapõe o Recorrido que o Ministério Público só tem legitimidade para propor a ação com a recepção dos documentos a que alude a alínea b) do n.º 4 do artigo 447.º do CT, designadamente “apreciação fundamentada sobre a legalidade da constituição da associação e dos estatutos” e que, conforme decorre do carimbo aposto no documento n.º 5 junto com a PI, no dia 05/08/2019, deu entrada na Secretaria do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, Unidade Central, Trabalho Lisboa, a comunicação da Direção-Geral do Emprego e das Relações de Trabalho – DGERT, que remete aqueles documentos, pelo que só a partir daquela data é que o Ministério Público teve conhecimento da situação, iniciando-se o prazo de 15 dias para propor a ação a pedir a declaração judicial de extinção da associação.
Finaliza invocando que, uma vez que no dia 09/08/2019 o Ministério Público deu entrada da acção, não vislumbra como poderia estar prescrito o direito de propor a acção.
Esta a posição das partes.
Sucede, porém, que, previamente à análise da questão suscitada no recurso, impõe-se referir o seguinte:
Sustenta o Recorrente que o direito de intentar a acção já estava prescrito posto que foram ultrapassados os prazos a que se referem os artigos 447.º n.º 8 do CT e 164.º do CPT.

Nos termos do artigo 447.º n.º 8 do CT, “Caso a constituição ou os estatutos iniciais da associação sejam desconformes com a lei imperativa, o magistrado do Ministério Público no tribunal competente promove, no prazo de 15 dias a contar da recepção dos documentos a que se refere a alínea b) do n.º 4, a declaração judicial de extinção da associação ou, no caso de norma dos estatutos, a sua nulidade, se a matéria for regulada por lei imperativa ou se a regulamentação da mesma não for essencial ao funcionamento da associação.”

Por seu turno, dispõe o artigo 164.º do CPT sob a epígrafe  “Acção de declaração de nulidade”:

1As deliberações e outros actos de órgãos de instituições de previdência, associações sindicais, associações de empregadores ou comissões de trabalhadores viciados por violação da lei, quer de fundo quer de forma, ou violação dos estatutos podem ser declarados inválidos em acção intentada por quem tenha interesse legítimo, salvo se dos mesmos couber recurso.
2 A acção deve ser intentada no prazo de 20 dias, a contar da data em que o interessado teve conhecimento da deliberação, mas antes de passados 5 anos sobre esta; se, porém, a acção tiver por fim a impugnação de deliberações relativas à eleição dos corpos gerentes, o prazo é de 15 dias e conta-se sempre a partir da data da sessão em que tenham sido tomadas essas deliberações.
3(…).”

Ora, do confronto destas normas com o disposto no artigo 298.º n.º 2 do Código Civil (“Quando, por força da lei ou por vontade das partes, um direito deva ser exercido dentro de certo prazo, são aplicáveis as regras da caducidade, a menos que a lei se refira expressamente à prescrição”), entendemos, salvo o devido respeito, que, no caso, está em causa um prazo de caducidade e não de prescrição.
E ainda previamente à análise da questão suscitada pelo Recorrente, há que apurar se este Tribunal pode conhecer aquela questão.

Vejamos porquê.

Conforme já acima ficou dito, a arguição da nulidade da citação e da falta de citação do Réu foi indeferida, sendo certo que o Réu não interpôs recurso dessa decisão que, assim, transitou em julgado.
O Réu foi citado para, querendo, contestar no prazo de 10 dias e, caso não contestasse, para enviar ao tribunal os documentos a que alude o n.º 1 do artigo 165.º do CPT.
Dos autos decorre que o aviso de recepção foi entregue no dia 05.09.2019 e que o Réu não apresentou contestação.

Conforme estatui o n.º 1 do artigo 162.º do CPT: “Os processos do contencioso de instituições de previdência, abono de família, associações sindicais, associações de empregadores ou comissões de trabalhadores seguem os termos do processo comum previsto neste Código, salvo o disposto nos artigos seguintes.”
Determina o artigo 571.º do CPC, aplicável ex vi do artigo 49.º n.º 2 do CPT “Na contestação cabe tanto a defesa por impugnação como por exceção.”

E de acordo com o artigo 573.º do CPC:
1Toda a defesa deve ser deduzida na contestação, excetuados os incidentes que a lei mande deduzir em separado.
2Depois da contestação só podem ser deduzidas as exceções, incidentes e meios de defesa que sejam supervenientes, ou que a lei expressamente admita passado esse momento, ou de que se deva conhecer oficiosamente

A caducidade é uma excepção peremptória, sendo que, de acordo com o artigo 576.º n.º 2 do CPC, “As exceções perentórias importam a absolvição total ou parcial do pedido e consistem na invocação de factos que impedem, modificam ou extinguem o efeito jurídico dos factos articulados pelo autor.”

Nos termos do artigo 579.º do CPC, O tribunal conhece oficiosamente das exceções perentórias cuja invocação a lei não torne dependente da vontade do interessado.”
Em anotação a esta norma escrevem José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, no “Código de Processo Civil Anotado”, Volume 2.º, 3.ª Edição, Almedina, pag.587, “Depende da vontade do interessado a invocação dos direitos potestativos e das exceções de direito material.”

Como estatui o artigo 333.º do Código Civil sob a epígrafe “Apreciação oficiosa da caducidade”:
1.A caducidade é apreciada oficiosamente pelo tribunal e pode ser alegada em qualquer fase do processo, se for estabelecida em matéria excluída da disponibilidade das partes.
2.Se for estabelecida em matéria não excluída da disponibilidade das partes, é aplicável à caducidade o disposto no artigo 303.”

Nos termos do artigo 303.º do Código Civil “O tribunal não pode suprir, de ofício, a prescrição; esta necessita, para ser eficaz, de ser invocada, judicial ou extrajudicialmente, por aquele a quem aproveita, pelo seu representante ou, tratando-se de incapaz, pelo Ministério Público”

Ora, no caso, a caducidade foi estabelecida em matéria não excluída da disponibilidade das partes pelo que, nos termos do artigo 303.º do Código Civil, está vedado ao tribunal apreciá-la oficiosamente, necessitando, para ser eficaz, de ser invocada por aquele a quem aproveita.

Regressando ao caso, constata-se que o Réu suscitou a questão da prescrição (que entendemos ser caducidade) no requerimento em que reclamou da falta e da nulidade da citação.

Sucede, porém, que, uma vez que foi considerado que o Réu foi regularmente citado, naturalmente que a referida excepção, de acordo com os artigos 571.º n.º 1 e 573.º n.º 1 do CPC, deveria ter sido suscitada na contestação, donde, a sua alegação no mencionado requerimento é, manifestamente, extemporânea.

Acresce que, no recurso, o Réu veio, novamente, suscitar a excepção da prescrição (caducidade). Porém, na medida em que tal excepção nunca foi conhecida pelo Tribunal a quo, nem podia, por não ter sido suscitada no momento próprio, impõe-se concluir que estamos perante uma questão nova.

Ora, como escrevem José Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes no “Código de Processo Civil Anotado”, Volume 3.º, Coimbra Editora, pag. 5, “ Os recursos ordinários são, entre nós, recursos de reponderação e não de reexame, visto que o tribunal superior não é chamado a apreciar de novo a acção e a julgá-la como se fosse pela primeira vez, indo antes controlar a correcção da decisão proferida pelo tribunal recorrido, face aos elementos averiguados por este último.

“É, por isso, constante a jurisprudência no sentido de que aos tribunais de recurso não cabe conhecer de questões novas (o chamado ius novorum), mas apenas reapreciar a decisão do tribunal a quo, com vista a confirmá-la ou revogá-la. Os tribunais de recurso podem, porém, conhecer de questões novas que sejam de conhecimento oficioso, como é o caso, por exemplo de questões de inconstitucionalidade de normas suscitadas nas alegações de recurso ou da caducidade de conhecimento oficioso (…).”

E como se afirma no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 08.09.2010, in www.dgsi.pt “Os tribunais de recurso podem conhecer de questões novas que sejam de conhecimento oficioso, como é o caso, por exemplo, das questões de inconstitucionalidade de normas suscitadas nas alegações de recurso”.

No caso, estava vedado ao Recorrente invocar factos novos - os integrativos da caducidade - como fundamento do recurso, na medida em que a questão suscitada não pode ser conhecida oficiosamente por este Tribunal, nem se trata de uma situação que possa ser enquadrada no n.º 2 do artigo 573.º do CPC.

Em conclusão, não pode este Tribunal conhecer da invocada excepção da caducidade do direito de intentar a acção.
*

Analisemos, por fim, a questão da nulidade da constituição do Réu Sindicato e da nulidade das cláusulas do seu Estatuto.

Sobre tais nulidades pronunciou-se a sentença recorrida nos seguintes termos:

“No tocante ao processo de constituição e aprovação dos estatutos de associações sindicais, o regime previsto nos artigos 55º, nº 2, al. a), da CRP, e 404º, al. a), 440º, nº 1, 442º, nº 1, als. a) a d), do CT, reserva para os trabalhadores por conta de outrem, o direito de constituírem livremente associações sindicais para a defesa dos seus interesses no âmbito profissional e ou no(s) sector(es) de actividade onde desempenhem funções.
Assim, na apreciação da legalidade da constituição e aprovação dos estatutos das associações sindicais há aferir do cumprimento das formalidades previstas no art. 447º do CT, que visam assegurar o princípio da liberdade de constituição, designadamente se o processo decorreu de forma livre e democrática, bem como das normas materiais imperativas que estabelecem o princípio da especialidade - no sentido de que o sindicato seja constituído por pessoas singulares, que sejam trabalhadores por conta de outrem do mesmo âmbito do(s) sector(es) de actividade e ou profissional previsto nos estatutos - e do princípio da autonomia e independência (art. 405º do CT), o qual impede que a constituição seja promovida por entidades terceiras (designadamente partidos políticos, instituições religiosas ou associações de outra natureza e empregadores) ou que, por qualquer modo, estas intervenham na sua organização e gestão e ao seu financiamento.
Ora, no caso dos autos, atento o que se deixou referido em D) e E) dos factos provados, verifica-se que tomou parte na assembleia constituinte pelo menos uma pessoa que não detém relação jurídica de trabalho subordinado, no âmbito profissional indicado nos estatutos.
E como também resulta da alínea E) dos factos provados, algumas pessoas intervenientes na constituição do BBB são membros de uma associação profissional sem natureza sindical - …
Por outro lado, da análise dos estatutos do BBB, referidos a dados por reproduzidos em F) dos factos provados, extraem-se as seguintes conclusões:
1.Conteúdo obrigatório – art. 450º do CT.
1.1.- Denominação - alínea a) do nº 1 do artigo 450º do CT.
Consta do artigo 1º que o sindicato adopta a denominação de “…, abreviadamente designado por BBB”, sendo que, nos termos das disposições conjugadas do nº 1, al. a) e do nº 3 do art. 450º do CT – norma imperativa - os estatutos devem regular a respectiva denominação e esta deve identificar o âmbito subjectivo, objectivo e geográfico da associação, que não pode confundir-se com a de outra associação existente.
1.2.- Localidade da sede – al. a) do nº 1 do art. 450º do CT.
Consta do nº 1 do artigo 3º que “A associação sindical tem a sua sede na Avenida … Lisboa (...). Ora, tal morada corresponde à do escritório da sociedade de advogados …, bem como ao domicílio profissional do Dr…, o que coloca em causa o princípio da autonomia e independência da associação sindical - art. 405º do CT, que proíbe intervenção de terceiros na sua organização e gestão e financiamento, bem como na sua constituição.
1.3.-Âmbito subjectivo – al. a) do nº 1 do art. 450º do CT.
Consta do artigo 1º que a associação sindical “representa os trabalhadores que exerçam funções de motoristas profissionais de matérias perigosas, de forma individual ou concertada, perante os órgãos públicos e privados, incluindo entidades ou associações patronais”.
Todavia, nas alíneas b) e c) do nº 2 do artigo 8º prevê-se que podem fazer parte da associação sindical, para além das pessoas singulares que exerçam a actividade de motorista de matérias perigosas, as que “Tenham exercido a actividade de motorista de matérias perigosas e que, pela prática de actos relevantes, contribuam para o prestígio e desenvolvimento da associação” e as que “Desenvolvam actividades de interesse ou interligadas com os objectivos e fins da associação sindical”.
A al. a) do nº 1 do art. 442º do CT, define o sindicato como a associação permanente de trabalhadores para defesa e promoção dos seus interesses socioprofissionais, sendo que, a noção de trabalhadores a ter em conta para efeitos do disposto no referido preceito legal, diz respeito às pessoas que exercem uma actividade profissional subordinada, isto é, àquelas que são parte num contrato de trabalho celebrado com um empregador.
E o nº 2 do art. 444º do CT prescreve que “Pode manter a qualidade de associado o trabalhador que deixe de exercer a sua actividade, mas não passe a exercer outra não representada pelo mesmo sindicato ou não perca a condição de trabalhador subordinado”.
Ora, atendendo ao disposto no art. 1º e na al. a) do nº 2 do art. 8º, pretende-se representar os motoristas de matérias perigosas que exercem a sua actividade em regime de subordinação jurídica, o que se acha conforme aos preceitos legais supracitados.
Todavia, quanto ao disposto nas als. b) e c) do nº 2 do art. 8 dos estatutos, e tendo em conta os conceitos de associação sindical e de trabalhador ínsitos nos referidos preceitos legais, suscitam-se dúvidas de legalidade.
Com efeito, com a redacção dada aos referidos preceitos estatutários ao incluírem quem tenha exercido a referida actividade profissional (sem ressalvar que não deve exercer outra actividade não representada pelo sindicato ou que não tenha perdido a condição de trabalhador subordinado), bem como quem desenvolva actividades de interesse ou interligadas com os objectivos e fins do sindicato, sem especificar quais, permite a inscrição como associados de pessoas que não exercem, de facto, a actividade de motorista de matérias perigosas, o que afronta as supracitadas normas legais.
Nestes termos, quanto ao âmbito subjectivo, na parte constante das referidas als. a) e b) do art. 8º, há violação do disposto na al. a) do nº 1 do art. 450º do CT, por preterição do prescrito na al. a) do nº 1 do art. 442º e no nº 2 do art. 444º, ambos do referido Código.
1.4.- Âmbito objectivo – al. a) do nº 1 do art. 450º do CT.
Decorre do artigo 1º.
1.5.- Âmbito geográfico – al. a) do nº 1 do art. 450º do CT.
Indicado no nº 1, in fine, do artigo 3º “território nacional”.
1.6.- Fins – al. a) do nº 1 do art. 450º do CT.
Constam dos artigos 6º e 7º.
1.7.- Duração se não for constituída por período indeterminado – al. a) do nº 1 do art. 450º do CT.
Os estatutos não regulam a duração da associação sindical, pelo que se presume que esta é constituída por período indeterminado, em conformidade com a alínea a) do nº 1 do art. 450º do CT.
1.8.-Órgãos, entre os quais, uma assembleia-geral ou uma assembleia de representantes de associados, um órgão colegial de direcção e um conselho fiscal – al. b) do nº 1 do art. 450º do CT.
Os órgãos do sindicato encontram-se elencados no nº 2 do art. 14º: assembleia geral (art. 19º), mesa da assembleia (art. 16º), direcção (art. 22º), conselho fiscal (art. 28º) e comissão de recursos (art. 31º).
1.8.1.- Número de membros e funcionamento da assembleia geral ou assembleia de representantes – al. b) do nº 1 do art. 450º do CT.
Assembleia geral.
Quanto à sua composição, determina o art. 19º que “A assembleia geral da associação sindical é o órgão deliberativo máximo da associação e é constituída por todos os associados no pleno gozo dos seus direitos sindicais”.
No que respeita ao funcionamento da assembleia geral, o nº 5 do art. 21º prevê o quórum constitutivo - o número de membros ou a maioria que deve estar presente para que o órgão reúna validamente -, estabelecendo que “A assembleia geral iniciar-se-á à hora marcada com a presença da maioria dos associados ou em segunda convocatória com qualquer número de associados (...)”.
Diferente quórum constitutivo encontra-se previsto no nº 9 do mesmo artigo, no qual “Para efeitos de discussão e deliberação sobre as matérias referidas nas alíneas d) e f) do artigo 20º (...)” exige-se a participação de pelo menos 30% do total dos associados.
Do nº 7 do referido art. 21º consta o quórum deliberativo - a maioria exigida à aprovação das deliberações da assembleia geral -, sendo que “As deliberações da assembleia geral serão tomadas por maioria simples de votos dos associados participantes (...)”, exigindo o nº 9 do mesmo artigo que “Para efeitos de discussão e deliberação sobre as matérias referidas nas alíneas d) e f) do artigo 20º, é exigida uma maioria qualificada de 2/3 dos associados participantes”.
Por sua vez, o nº 10 do mesmo artigo dispõe que “Para efeitos de discussão e deliberação sobre as matérias referidas nas alíneas b) e e) do artigo 20.º é exigida uma maioria qualificada de ¾ de todos os associados”.
Mesa da assembleia geral
A composição da mesa da assembleia geral consta do nº 1 do art. 16º, o qual determina que “A mesa da assembleia é constituída por 3 membros: um presidente, um vice-presidente e um secretário”.
Quanto às regras de funcionamento da mesa da assembleia geral, os estatutos regulam no nº 2 do art. 16º o quórum constitutivo - o número de membros/ maioria que deve estar presente para que o órgão reúna validamente -, estabelecendo que: “A mesa da assembleia delibera validamente, na presença de, pelo menos 2/3 dos seus membros tendo o presidente da mesa da assembleia voto de qualidade ou na sua ausência o vice-presidente da mesa da assembleia” e tratando-se de um órgão composto por três membros tal regra é necessariamente coincidente com o quórum deliberativo - a maioria exigida à tomada de decisões/aprovação das deliberações do órgão.
1.8.2.-Número de membros e funcionamento do órgão de direcção – al. b) do nº 1 do art. 450º do CT.
Quanto ao número de membros da direcção, do nº 1 do art. 22º resulta que a mesma é constituída por cinco efectivos: um presidente, um vice-presidente, um tesoureiro, um 1º vogal e um 2º vogal.
No que concerne ao funcionamento da direcção, os estatutos regulam na primeira parte do nº 2 do art. 27º o quórum constitutivo - o número de membros/maioria que deve estar presente para que o órgão reúna validamente -, dispondo que “A direcção delibera validamente, na presença de, pelo menos 3 dos seus membros (...)”, encontrando-se o quórum deliberativo - a maioria exigida à aprovação das deliberações do órgão -, regulado na parte final do nº 2 do mesmo artigo, o qual determina que as deliberações são tomadas por maioria simples.
O modo de vinculação da associação consta do nº 4 do art. 27º, obrigando-se esta para com terceiros mediante a assinatura de dois membros da direcção e do nº 6 do art. 53º, nos termos do qual “Durante o funcionamento da comissão de gestão obrigam a associação sindical as assinaturas de dois membros da mesma”.
1.8.3.- Número de membros e funcionamento do conselho fiscal – al. b) do nº 1 do art. 450º do CT.
A composição do conselho fiscal consta do art. 28º, o qual determina que “O conselho fiscal é constituído por um presidente e dois vogais”.
No que respeita ao funcionamento do conselho fiscal os estatutos regulam na primeira parte do nº 1 do art. 30º o quórum constitutivo: “O conselho fiscal delibera validamente, na presença de, pelo menos, 2/3 dos seus membros (...)”, sendo que o quórum deliberativo encontra-se regulado na parte final do mesmo artigo, o qual determina que as deliberações são tomadas por maioria simples, tendo o presidente voto de qualidade.
1.8.4.- Outros órgãos previstos nos estatutos:
Para além dos órgãos supra identificados, os estatutos identificam, ainda, como órgão social a comissão de recursos, na al. e) do nº 2 do art. 14º e art. 31º e ss.
Comissão de recursos
A composição da comissão de recursos consta do nº 1 do art. 31º e as suas competências são as enunciadas no artigo 32º.
Quanto às regras de funcionamento do referido órgão, tratando-se o mesmo de um órgão colegial elencado na alínea e) do nº 2 do art. 14º como fazendo parte dos corpos sociais do sindicato e tendo em conta que as regras de funcionamento dos órgãos previstos nos estatutos - quóruns constitutivo e deliberativo -, é matéria de regulação obrigatória, porquanto a regulamentação da mesma é essencial ao funcionamento do órgão, os estatutos não podem deixar de regular os referidos quóruns para o órgão em causa.
Por conseguinte, a omissão de tal regulamentação, que se verifica, viola o disposto na al. b) do nº 1 do art. 450º do CT, norma imperativa que prescreve que os estatutos de associação sindical devem regular o funcionamento dos respectivos órgãos.
1.9.-Extinção e consequente liquidação da associação, bem como o destino do respectivo património – al. c) do nº 1 do art. 450º do CT.
A regulação da extinção e consequente liquidação da associação, bem como do destino do respectivo património é um imperativo legal ditado pela al. c) do nº 1 do art. 450º do CT.
O referido Código obriga ainda, por força do disposto no nº 5 do art. 450º, que se assegure que em caso de extinção judicial ou voluntária de associação sindical os bens não sejam distribuídos pelos associados.
Todavia, tais exigências não se encontram asseguradas porquanto os estatutos são omissos quanto a esta matéria, em violação do disposto no nº 5 do artigo 450º do CT, que determina que “Em caso de extinção judicial ou voluntária de associação sindical ou associação de empregadores, os respectivos bens não podem ser distribuídos pelos associados, excepto quando estes sejam associações”.
Apenas se prevê, nos termos da al. e) do art. 20º, que compete à assembleia geral “Deliberar sobre a fusão, extinção, dissolução da associação e, neste caso, também quanto à liquidação e destino do seu património”.
1.10.- Exercício do direito de tendência – nº 2 do art. 450º do CT.
O CT determina, no nº 2 do art. 450º, que os estatutos das associações sindicais regulem o exercício do direito de tendência, concretizando assim a garantia constitucional, consagrada na al. e) do nº 2 do art. 55º da CRP, nos termos da qual “no exercício da liberdade sindical é garantido aos trabalhadores, sem qualquer discriminação, designadamente (...) o direito de tendência, nas formas que os respectivos estatutos determinarem”.
Sendo o direito de tendência um corolário da liberdade sindical, a regulação do seu exercício visa assegurar a integração das posições minoritárias existentes nos sindicatos.
Os estatutos ora em apreço afloram o direito de tendência no nº 2 do art. 5º, “A associação sindical reconhece no seu seio a existência de diversas correntes de opinião politico-ideológica cuja organização é exterior ao movimento sindical e da exclusiva responsabilidade das mesmas”.
Todavia, no nº 3 do art. 5º, remetem a regulação do direito de tendência para o “Capítulo XVIII dos presentes Estatutos”, o qual não existe, sendo que os estatutos terminam no Capítulo XVII (Das disposições finais).
Constata-se, assim, que os estatutos não regulam em concreto o modo de reconhecimento/constituição das diversas correntes de opinião político partidária/ideológica no seio da associação, além de que a redacção genérica ínsita no referido preceito não concretiza o fundamental, ou seja, de que forma o direito de tendência pode ou deve exercerse.
Na verdade, os estatutos limitam-se a garantir genericamente o exercício do direito de tendência, sem que estejam integradas nos estatutos as normas que regulam a forma da sua constituição e o modo do seu exercício.
Assim, verifica-se que os estatutos não regulam o exercício do direito de tendência, em violação do disposto na al. e) do nº 1 do art. 55º da CRP e no nº 2 do art. 450º do CT.
1.11.-Em caso de existência de mais de uma assembleia de representantes de associados, a que exerce os direitos previstos na lei para a assembleia geral – nº 4 do art. 450º do CT.
Os estatutos apenas consagram uma assembleia geral, da qual fazem parte todos os associados - cfr. art. 29º.
2.Disposições sobre matérias/regras cuja regulação não é obrigatória, mas uma vez previstas nos estatutos não podem contrariar as normas legais aplicáveis.
2.1.-Direito de participação na actividade da associação – al. a) do nº 1 do art. 451º do CT
Consta do art. 9º, em particular das als. a) a c), e i) a k), bem como da al. d) do nº 2 do art. 21º e do art. 34º.
2.2.-Igualdade de oportunidades e imparcialidade no tratamento das listas concorrentes a eleições para os corpos sociais – al. b) do nº 1 do art. 451º do CT.
Os estatutos regem sobre as eleições para os corpos sociais nos arts. 33º a 38º.
Nos termos do nº 2 do art. 33º, a constituição da mesa da assembleia geral eleitoral é composta pelo presidente da mesa da assembleia, pelo vice-presidente da mesa da assembleia e por um membro por cada lista candidata ao órgão ou órgãos da associação sindical, em conformidade com o disposto na al. b) do nº 1 do art. 451º do CT.
2.3.- Duração do mandato dos membros da direcção – al. c) do nº 1 do art. 451º do CT.
Consta do nº 2 do art. 15º que “A duração dos mandatos dos membros dos órgãos gerentes da associação é de quatro anos”, de acordo com o disposto na al. a) do art. 35º e em conformidade com o estatuído na al. c) do nº 1 do art. 451º do CT.
2.4.- Participação de membros em mais de um órgão – nº 3 do art. 451º do CT.
De acordo com o previsto na al. i) do nº 1 do art. 17º, compete ao presidente da mesa da assembleia “Assistir às reuniões da direcção, quando convocado/sem direito a voto deliberativo” e na al. c) do art. 29º que ao conselho fiscal compete “Assistir às reuniões da direcção para as quais tenha sido convocado ou em relação às quais tenha oportunamente requerido a sua presença”, de acordo com o disposto no nº 3 do art. 451º do CT.
2.5.- Regime disciplinar – art. 452° do CT.
Os estatutos prevêem o regime disciplinar nos arts. 42º a 44º.
De acordo com o disposto no nº 1 do art. 452º do CT, o regime disciplinar deve assegurar o direito de defesa do associado, prever que o procedimento seja escrito e que a sanção de expulsão seja apenas aplicada em caso de grave violação de deveres fundamentais.
Tais exigências encontram-se asseguradas, nomeadamente quanto ao direito de defesa do associado e ao procedimento na forma escrita – nº 2 do art. 42º e al. a) do art. 43º.
E o disposto no nº 3 do art. 44º, ao determinar que a pena de expulsão “(...) será aplicada aos associados que infrinjam gravemente e com reincidência os preceitos estatutários”, garante o cumprimento do previsto no nº 1 do art. 452º do CT.
2.6.- Eleição e destituição de delegado sindical – nº 1 do art. 462º do CT.
A eleição dos delegados sindicais encontra-se prevista no artigo 39º e nos nºs 1 a 3 do art. 40º.
Contudo, não está expressamente previsto que a eleição dos delegados sindicais é realizada por voto directo e secreto.
Quanto à destituição dos referidos delegados, os estatutos prevêem que a sua “exoneração” é da competência da assembleia geral – nº 2 do art. 40º -, sem concretizar, contudo, que a mesma resulta de escrutínio por voto directo e secreto.
Assim, os estatutos não observam o disposto no nº 1 do art. 462º do CT, por não preverem o voto directo e secreto para a eleição e destituição dos delegados sindicais.
No que concerne ao mandato do delegado sindical, os estatutos são omissos.
Todavia, não se tratando de matéria de regulação obrigatória nos estatutos, tal omissão não consubstancia qualquer desconformidade.
2.7.- Outras disposições:
Na alínea f) do art. 20º e nos arts. 51º a 53º, prevê-se a nomeação de uma comissão de gestão que no caso de deliberação da destituição dos órgãos gerentes visa assegurar “(...) o regular funcionamento da associação até entrada em funções dos novos membros dos órgãos gerentes”, bem como “Convocar a assembleia geral eleitoral nos prazos estatutários estabelecidos”.
Pese embora o normativo refira que a comissão de gestão é nomeada pela assembleia geral destituinte, o art. 51º contraia a regra da eleição dos membros da referida comissão, ao impor expressamente que a mesma é composta “pelo presidente da mesa da assembleia, pelo tesoureiro da direcção e por um associado indicado pela assembleia geral, que corresponderão respectivamente ao presidente, vice-presidente e secretário da comissão de gestão”.
Disposição estar que coloca em causa o princípio da gestão democrática da associação, nomeadamente, por não assegurar para todos os associados do sindicato o direito de elegerem e serem eleitos, bem como a igualdade de oportunidades entre associados e a imparcialidade dos membros da comissão e das listas concorrentes aos novos corpos sociais, em conformidade com o disposto nas alíneas a) e b) do nº 1 do art. 451º do CT.
Por outro lado, embora das normas conjugadas da alínea f) do art. 20º e da al. c) do art. 36º, possa transparecer que a comissão de gestão tem carácter provisório, a previsão ínsita no nº 3 do art. 53º contraria o estatuído nos referidos preceitos, porquanto ao determinar que a comissão se mantém em funções até que as condições para a convocação da assembleia geral estejam completamente reunidas, permite que a aquela funcione, de facto, sem qualquer limite temporal do seu mandato.
Neste contexto, a existência de uma comissão de gestão nos moldes acima descritos, coloca em causa o princípio da gestão democrática da associação, por não assegurar de forma inequívoca um limite temporal para o seu mandato.
Acresce ainda o facto de os estatutos, ao não concretizarem o que se entende por “assegurar o regular funcionamento da associação sindical (...)” – al. a) do art. 52º - permitem na prática que a comissão possa substituir-se nas atribuições da mesa da assembleia geral, do órgão de direcção e do conselho fiscal, aos quais lei atribui competências próprias.
Conclui-se, assim, que as supracitadas disposições que regem sobre a comissão de gestão colocam em causa o princípio da gestão democrática da associação, por não estar garantido o disposto nas als. a) e b) do nº 1 do art. 451º do CT relativamente a todos os membros da referida comissão, por o seu mandato não se encontrar temporalmente delimitado, permitindo-se com tal facto que a mesma se substitua nas competências atribuídas a outros órgãos.
De acordo com o art. 56º, “Os presentes estatutos entram em vigor no dia da efectiva constituição da associação sindical”.
Ora, nos termos do disposto no nº 1 do art. 447º do CT, “A associação sindical (...) adquire personalidade jurídica pelo registo daqueles por parte do serviço competente do ministério responsável pela área laboral”, sendo que, conforme o nº 7 do mesmo artigo, “A associação sindical (...) só pode iniciar o exercício das respectivas actividades após a publicação dos estatutos no Boletim do Trabalho e Emprego, ou 30 dias após o registo”.
Verifica-se, assim, que a referida norma estatutária contraria as aludidas normas legais, porquanto os estatutos das associações sindicais só entram em vigor após o seu registo e publicação no Boletim do Trabalho e Emprego.
Aqui chegados, conclui-se que, quer a constituição, quer os estatutos do …sas – BBB, contendem com preceitos legais de carácter imperativo, circunstância que, nos termos do disposto no art. 447º, nº 8, do CT, tem como consequência que seja declarada a sua extinção.
Nestes termos, procede a presente acção.”
Sobre as irregularidades e nulidades apontadas na sentença recorrida invoca o Recorrente nas conclusões II), TT) e UU), respectivamente:
II)Inconformidades essas, que a serem verdade (o que não se aceita) foram já supridas há muito tempo.
TT)Sem prescindir do que acima se referiu, sempre se dirá que o BBB está disponível para a correção de toda e qualquer inconformidade legal, que coloque em causa a manutenção do mesmo.
UU)Sem prejuízo de esclarecer que a larga maioria (senão todas) as inconformidades suscitadas (ainda que tardiamente) pelo Ministério Publico, já foram corrigidas.”
E nos artigos 37, 48 e 49 das alegações, o Recorrente repete o que consta das citadas conclusões:
37.Inconformidades essas, que a serem verdade (o que não se aceita) foram já supridas há muito tempo.
48.Sem prescindir do que acima se referiu, sempre se dirá que o BBB está disponível para a correção de toda e qualquer inconformidade legal, que coloque em causa a manutenção do mesmo.
49.Sem prejuízo de esclarecer que a larga maioria (senão todas) as inconformidades suscitadas (ainda que tardiamente) pelo Ministério Publico, já foram corrigidas.”

Ora, das alegações e das conclusões que citámos não é possível extrair quais são os erros de julgamento que o Recorrente imputa à sentença recorrida. Dizendo por outras palavras, no que respeita às irregularidades e nulidades verificadas pela sentença recorrida, no recurso, não são indicados fundamentos ou argumentos que permitam a este Tribunal reapreciar a decisão em causa, pois analisadas as conclusões e as alegações ficámos sem saber em que motivos se baseia o Recorrente para pedir a revogação da sentença.

É que no caso não se trata de qualificar as conclusões como deficientes, obscuras ou complexas, o que permitiria o convite ao seu aperfeiçoamento nos termos do artigo 639.º n.º 3 do CPC.
Trata-se, sim, de não terem sido apresentados, pelo Recorrente, quaisquer argumentos ou motivos de ordem jurídica que, na sua óptica, determinam um juízo diverso daquele que teceu a sentença recorrida sobre a existência de irregularidades na constituição do Réu e de nulidades das cláusulas dos Estatutos, o que equivale, no fim de contas, a não ter apresentado quaisquer razões de discordância com o decidido, o que determina a improcedência do recurso.

Acresce que o Recorrente também não concretiza quais as irregularidades e nulidades que terão sido corrigidas “a larga maioria (senão todas)” e em que termos foram corrigidas, do que apenas podemos extrair que existiam e que, segundo o Recorrente, ainda subsistem, pelo menos, alguns dos vícios referidos na sentença.

Consequentemente, o recurso deverá ser julgado improcedente, mantendo-se a sentença recorrida por não merecer reparo.

Considerando o disposto no artigo 527.º n.º 1 do CPC, as custas do recurso são da responsabilidade do Réu.

Decisão

Face ao exposto, acorda-se em julgar o recurso improcedente e confirma-se a sentença recorrida.
Custas do recurso pelo Réu.
Registe e notifique.



Lisboa, 14 de Setembro de 2022



Maria Celina de Jesus de Nóbrega
Paula de Jesus Jorge dos Santos
Albertina Pereira


Decisão Texto Integral: