Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
76/19.7TXLSB-D.L1-9
Relator: TRIGO MESQUITA
Descritores: CONFLITO DE COMPETÊNCIA
TRIBUNAL COMPETENTE
DECLARAÇÃO DE EXTINÇÃO DE PENA DE PRISÃO EFECTIVA
TRIBUNAL DE EXECUÇÃO DE PENAS
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 12/17/2021
Votação: DECISÃO INDIVIDUAL
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: CONFLITO DE COMPETÊNCIA
Decisão: DECIDIDO
Sumário: No regime instituído pela Lei n.° 115/2009, não existem dúvidas que a competência para declarar a extinção da pena de prisão é do tribunal de execução das penas. Esta solução veio afastar, definitivamente, as dúvidas anteriormente existentes nesta matéria, face à anterior redacção do artigo 470°, n° 1, do CPP e do artigo 91°, n.° 2, al. h), da Lei n.° 3/99, de 13 de Janeiro.

Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: CONFLITO DE COMPETÊNCIA


I.–


No processo nuipc 76/19.7TXLSB-D.L1 em que é arguido AA, suscita-se a resolução de um conflito negativo de competência que opõe os Mmos Juizes do Tribunal da condenação, Juízo Local Criminal de Lisboa — Juiz 13 e do Tribunal de Execução de Penas de Lisboa - Juiz 1, porquanto ambos se declaram incompetentes para tramitar e julgar os presentes autos - declaração de extinção da pena de prisão efectiva aplicada ao arguido -, assentando a respectiva divergência no facto de se atribuírem mutuamente a competência territorial dos respectivos tribunais.

Ambos os despachos transitaram em julgado gerando-se um conflito negativo de competência (art. 34.°, n.° 1 CPP).

Neste Tribunal foi cumprido o art. 36.°, n.° 1 CPP.

O Digno Magistrado do M.ºP.º proferiu parecer no sentido de atribuição de competência ao Tribunal de Execução de Penas.

Idênticos conflitos foram recentemente dirimidos pelas três secções criminais deste Tribunal da Relação, com decisão uniforme, nomeadamente no processo 1829/20.9TXLSB-B.L1, entre precisamente os mesmos tribunais conflituantes, decisão que subscrevemos.

Neste decisão escreveu-se:
«A Lei 115/2009, de 12 de Outubro, introduziu alterações significativas em matéria de competências dos tribunais da condenação e de execução de penas privativas de liberdade.

Pode ler-se no ponto 15 da Proposta de Lei n° 252/X (Diário da Assembleia da República, Série 11-A, n.279, de 5.3.2009), que originou a Lei 115/2009 e o CEPMPL:
"No plano processual e no que se refere à delimitação de competências entre o tribunal que aplicou a medida de efectiva privação da liberdade e o Tribunal de Execução das Penas, a presente proposta de lei atribui exclusivamente ao Tribunal de Execução das Penas a competência para acompanhar e fiscalizar a execução de medidas privativas da liberdade, após o trânsito em julgado da sentença que as aplicou. Consequentemente, a intervenção do tribunal da condenação cessa com o trânsito em julgado da sentença que decretou o ingresso do agente do crime num estabelecimento prisional, a fim de cumprir medida privativa da liberdade. Este um critério simples, inequívoco e operativo de delimitação de competências, que põe termo ao panorama, actualmente existente, de incerteza quanto à repartição de funções entre os dois tribunais e, até, de sobreposição prática das mesmas. Incerteza e sobreposição que em nada favorecem a eficácia do sistema."

Daí que, em materialização dessa intenção, a Proposta da Lei, na decorrência do regime que se visava instituir pelo CEPMPL, nomeadamente no seu artigo 138°, n.° 4, al. r) —que veio a ser acolhida, nos seus precisos termos, no texto final do CEPMPL (actual al. s), por virtude da alteração introduzida pela Lei 40/2010, de 3 de Setembro) —contivesse alterações aos artigos 91° da Lei n.° 3/99, de 13 de Janeiro, e 124° da Lei n.° 52/2008, de 28 de Agosto - que reproduzem o texto daquela alínea r) - e ainda ao artigo 470°, n° 1, do CPP, que também vieram a ser acolhidas, nos seus precisos termos, no texto final da Lei 115/2009.

Decisiva, no sentido da clarificação operada, é a alteração ao n.° 1 do artigo 470° do CPP que, mantendo a regra segundo a qual a execução corre nos próprios autos perante o presidente do tribunal de P instância em que o processo tiver corrido, a restringiu fortemente no que se refere à execução de penas privativas de liberdade, estabelecendo, por aditamento do actual segmento final daquele preceito, que tal regra vale "sem prejuízo do disposto no artigo 138° do Código de Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade".

De relevo também para a decisão da questão sub judice é a circunstância de as alterações legislativas então operadas terem deixado intocado ao artigo 475.2 do CPP, segundo o qual o tribunal competente para a execução declara "extinta a pena".

Do exposto, perante o que se extrai do elemento literal, histórico (nomeadamente dos trabalhos preparatórios) e sistemático de interpretação, parece não haver margem para qualquer dúvida de que, no regime instituído pela Lei n.° 115/2009, a competência para declarar a extinção da pena de prisão é do tribunal de execução das penas.

Esta solução veio afastar, definitivamente, as dúvidas anteriormente existentes nesta matéria, face à anterior redacção do artigo 470°, n° 1, do CPP e do artigo 91°, n.° 2, al. h), da Lei n.° 3/99, de 13 de Janeiro.

Dispunha o artigo 91°, n.° 2, al. h), da Lei n.° 3/99, na redacção originária, que compete aos tribunais de execução das penas "declarar a extinção da execução da pena de prisão".

No confronto desta norma com a anterior redacção do artigo 470°, n.° 1, e com o artigo 475° do CPP foi-se formando o entendimento segundo o qual a competência do TEP se limitaria aos "casos especiais" indicados no n.° 2 do artigo 91° da Lei 3/99, em que este tribunal tenha modificado a execução da pena em virtude da actividade do TEP, nomeadamente através da concessão da liberdade condicional, entendimento que, neste caso, é seguido pelo senhor juiz do TEP no despacho em que se declara incompetente, pois que "ao recluso não foi concedida liberdade condicional" (cfr., neste sentido, o acórdão de 19.6.2007, desta Relação, proferido no Proc 1999/2007-5, www.dgsi.pt).

A este propósito convém notar as diferenças de redacção do artigo 91°, n.° 2, al. h), na redacção originária, que se manteve até às alterações introduzidas pela Lei 115/2009, e na redacção da al. s) daquele preceito, que corresponde à anterior al. h), resultante deste diploma (com a alteração da Lei 40/2010 - simples alteração de numeração). Na versão anterior, o TEP tinha competência para "declarar a extinção da execução da pena de prisão"; na actual, o TEP tem competência para "declarar extinta a pena de prisão", coincidindo com a letra do artigo 475° do CPP, que, como se referiu, se manteve inalterada. O que significa que, em rigor, o TEP não tinha, em caso algum, competência para declarar "extinta a pena", mesmo nos casos em que tivesse concedido a liberdade condicional, mas tão somente para declarar a "extinção da execução da pena"; ou seja, seria sempre da competência do tribunal da condenação, enquanto tribunal de execução (artigo 470° do CPP), declarar extinta a pena (artigo 475° do CPP) por virtude da sua execução (cumprimento) declarada finda pelo TEP (artigo 91.°, n.° 2, al. h) da Lei 3/99).

A Lei 115/2009 veio conferir coerência a este regime, eliminar as "incertezas e sobreposições" quanto à repartição de competências entre o tribunal da condenação e o TEP, por virtude das alterações introduzidas no artigo 470.2, n.° 1, do CPP no anterior n.9 2, al. h), da Lei 3/99. Isto é, se ao TEP competia declarar a "extinção da execução da pena", cabe-lhe agora, inequivocamente, declarar a "extinção da pena" uma vez que esta se mostre executada (cumprida).»

3.–Está assim evidenciada, em termos que se crêem claros e se subscrevem, a circunstância de os elementos de interpretação da lei, literal, histórico (nomeadamente dos trabalhos preparatórios) e sistemático não deixarem margem para dúvida de que no regime agora em vigor, instituído pela Lei n° 115/2009, a competência para declarar extinta a pena é do tribunal de execução das penas. E que a intenção do legislador é a de fazer cessar a intervenção do tribunal da condenação após o trânsito em julgado da decisão condenatória.

III.–
Em face do que se decide o presente conflito atribuindo ao Tribunal de Execução de Penas de Lisboa – Juiz 1, a competência para declarar a extinção da pena.
Sem tributação.
Cumpra o art. 36.°, n.° 3 CPP.



Lisboa, 17 de Dezembro de 2021

Elaborado e computador e revisto pelo signatário–TRIGO MESQUITA