Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
9902/17.4T8LSB-A.L1-6
Relator: ANTÓNIO SANTOS
Descritores: CÓDIGO DO IRS
TRIBUTAÇÃO
OBRIGAÇÃO DE INDEMNIZAÇÃO
JUROS MORATÓRIOS
JUROS COMPENSATÓRIOS
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 10/11/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: 5.1 - Tem o Código do IRS por desiderato regular a tributação dos acréscimos patrimoniais das pessoas, isto é o "enriquecimento" alcançado durante o período de tributação.
5.2. - Os juros moratórios decorrentes de obrigação de  indemnização por facto ilícito e fixados em decisão judicial têm natureza compensatória, fazendo também parte integrante do capital, logo, não estão os mesmos sujeitos à incidência de IRS, sendo-lhes inaplicável o preceituado no artigo 5º, nº2, alínea g) do CIRS.
5.3 - Os montantes atribuídos a título de indemnização e em sede de incidência objectiva para efeitos de IRS mostram-se abrangidos pela Categoria G - Incrementos patrimoniais ( artº 9º, do CIRS ) , impondo-se ainda e para o mesmo efeito considerar a norma de delimitação negativa de incidência do 12.º do mesmo Código.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os Juízes na 6ª Secção CÍVEL Do Tribunal da Relação de LISBOA

1.- Relatório.      

Na sequência da instauração de acção executiva – baseada em SENTENÇA - movida por A, contra B [BANCO…, SA.], com vista à cobrança coerciva da quantia de €24.600,44 [ liquidada da seguinte forma  : €165.773,65  ( de CAPITAL ) + €75.153,86  ( de JUROS ) + €2.448,00 ( de CUSTAS DE PARTE ) – 218.775,07 ( de PAGAMENO PARCIAL ) = €24.600,44 ] , veio a executada deduzir oposição à execução, pugnando pela respectiva desobrigação de efectuar o pagamento da quantia total supra referida, apenas admitindo estar em dívida para com a exequente de montante no valor de €2.448,00.
1.1. - Para tanto, alegou  a  executada/embargante, em síntese, que :
- A executada pagou já, integralmente, a quantia em que foi condenada na sentença dada à execução, quer a título de capital, quer de juros ;
- É que, incumbindo-lhe proceder à retenção na fonte do imposto sobre o rendimento das pessoas singulares, deduziu o respectivo e devido montante - que entregou ao ESTADO - , quer em sede de juros moratórios ( de 16,5% ), quer em sede de juros remuneratórios  ( de 28% ), e em obediência e cumprimento do disposto nos artºs  5º, n.° 2, alínea g) , 5º, n.° 3, 71º, nº 1 e 3, alínea c), 5º, n.° 2, e art. 101°, alínea a), todos do CIRS;
- Assim, apenas está em divida perante a exequente da quantia de € 2.448,00 a título de custas de parte
1.2. - Notificada a exequente da oposição à execução, apresentou a mesma articulado/contestação, no essencial deduzindo “defesa” por impugnação motivada, sustentando a inevitável improcedência in totum dos embargos, e isto porque, no seu entender, uma vez que a executada/embargante foi condenada na sentença dada à execução no pagamento de uma indemnização decorrente da prática de acto ilícito, a verdade é que não prevê a lei FISCAL que a violação ilícita e culposa de um contrato de intermediação financeira possa desencadear o pagamento de um imposto.
1.3. – Dispensada a realização de uma audiência prévia – com a anuência das partes - , foi de seguida proferida decisão/sentença que de imediato conheceu do mérito da oposição à execução, e sendo o respectivo excerto decisório do seguinte teor :

V – DECISÃO
Em face do exposto, decide o Tribunal julgar os presentes embargos de executado improcedentes e, em consequência, determinar o prosseguimento da execução.
VI - CUSTAS PROCESSUAIS
Custas a cargo do embargante ( art. 527°, n.°s 1 e 2, do Cód. Proc. Civil).
Registe e notifique.
Comunique à agente de execução.
 Lisboa, 23 de Abril de 2018
1.4.- Inconformada com a sentenciada improcedência da oposição, veio então a executada/embargante B, da referida sentença interpor recurso de apelação, que admitido foi e com efeito devolutivo, formulando na respectiva peça recursória as seguintes conclusões:
1) O Apelante cumpriu integralmente a obrigação a que foi condenado pela decisão dada à execução;
2) Para esse efeito, entregou directamente à exequente 218.775,07€ e, tendo retido na fonte valor de IRS sobre os juros de mora, fez entregar o respectivo valor ao Estado, junto da AT - facto indisputado pela exequente, ou sequer pelo Tribunal a quo.
3) Tendo o Tribunal recorrido dado como provado a dita retenção na fonte sobre os juros moratórios, tendo o embargante alegado expressamente ter entregue o valor retido ao Estado, e não tendo esse facto sido disputado até ao momento, deveria igualmente ter considerado como provado que:
O EXECUTADO/EMBARGANTE PAGOU AO ESTADO O VALOR DE IRS RETIDO NA FONTE NO PAGAMENTO À EXEQUENTE , Facto que se deve aditar aos factos provados.
Acresce que,
4) Incluindo-se na condenação a liquidação de juros de mora, o Embargante reteve na fonte IRS à taxa legal aplicável sobre tais juros moratórios, valor que entregou ao Estado por conta e interesse da Exequente. 
5) Em face da lei em vigor, não conseguimos perceber a razão que presidiu à não consideração dos juros de mora como rendimentos de capitais.
6) De facto, o artº 5 do CIRS dispõe que:
1- Consideram-se rendimentos de capitais os frutos e demais vantagens económicas, qualquer que seja a sua natureza ou denominação, sejam pecuniários ou em espécie, procedentes, directa ou indirectamente, de elementos patrimoniais, bens, direitos ou situações jurídicas, de natureza mobiliária, bem como da respectiva modificação, transmissão ou cessação, com excepção dos ganhos e outros rendimentos tributados a noutras categorias.
2- Os frutos e vantagens económicas referidos no número anterior compreendem, designadamente:
(...)
g) Os juros ou quaisquer acréscimos de crédito pecuniário resultantes da dilação do respectivo vencimento ou de mora no seu pagamento, sejam legais seja contratuais, com excepção dos juros devidos ao Estado ou a outros entes públicos por atraso na liquidação ou mora no pagamento de quaisquer contribuições, impostos ou taxas e dos juros atribuídos no âmbito de uma indemnização não sujeita a tributação nos termos do nº 1 do artº 12º ;
7) Da mesma forma, na previsão do artº 12 nº 1 do CIRS, a propósito da exclusão do âmbito de aplicação daquela disposição não se faz qualquer tipo de referência a indemnizações por mora, por incumprimento sequer, ou até por responsabilidade geral aquiliana geral... o que implica naturalmente que se mantém a aplicabilidade da citada al. g) do nº do artº 5º do CIRS.
8) Verifica-se das citadas normas que a letra da lei reflectiu, de forma clara e exaustiva, a vontade e espírito do legislador.
9) Assim, não restam dúvidas que os juros moratórios são, desde logo, considerados rendimentos de capitais.
Por outro lado, 
10) Manda o artº 71º, nº 1, al. a) do mesmo CIRS que estão sujeitos a retenção na fonte, a título liberatório, "os rendimentos de capitais obtidos em território português, por residentes ou não residentes, pagos por ou através de entidades que aqui tenham sede, direcção efectiva ou estabelecimento estável a que deva imputar-se o pagamento e que disponham ou devam dispor de  contabilidade organizada" (sublinhado nosso).
11) Mais uma vez, o legislador demonstra cabalmente a exaustividade das suas previsões. Basta atentar que faz excluir do âmbito de aplicação daquela alínea a) certos rendimentos de capitais ,tal qual prevê no nº 4, aplicando taxa distinta! 
12) Mas se dúvidas restassem, e ficariam desfeitas com o teor do artº 101º -B do mesmo CIRS - esta disposição dispensa de retenção na fonte dos rendimentos da categoria E (em que se incluem, entre outros, rendimentos de capitais) desde que não superiores a 5€.
13) Claramente somos forçados a concluir que acima desse valor, como na situação dos autos, estarão sujeitos a tal retenção!
14) Em suma, nos estritos termos da lei:
c) Os juros moratórios são, desde logo, rendimentos capitais;
d) Sendo rendimentos de capitais, estão sujeitos a retenção na fonte a uma taxa liberatória.
15) O Banco mais não fez, portanto, do que cumprir estritamente a lei nesta matéria aplicável! E, fazendo-o, pagou integralmente o valor devido à exequente, fosse pelo pagamento directo, fosse pela entrega ao Estado, por conta e no interesse daquela, do valor que reteve na fonte a título de IRS sobre os juros moratórios liquidados.
16) A decisão recorrida violou por errónea interpretação ou aplicação o disposto nos artºs 5º nºs 1 e nº 2 al. g), 71º, nº 1 al. a) todos do CIRS.
Sem prescindir,
17) Além de tudo o mais, o certo é que o Banco-apelante, convicto da obrigação de reter IRS na fonte, entregou o valor retido no pagamento à exequente à AT por conta e no interesse daquela, sendo que tal valor é considerado, e tratado, para todos os efeitos como pagamento por conta - vide 97º , n º3 do CIRS.
18) A entrega de tal valor retido é, por força de lei, creditada à exequente no valor do imposto apurado para o período em causa, constituindo, portanto, um crédito ou valor pecuniário com uma óbvia vantagem pecuniária e patrimonial para a exequente, na medida da redução do imposto a pagar.
19) A improcedência dos presentes embargos implicaria necessariamente um locupletamento ilegítimo e sem causa justificativa da exequente à custa do embargante.
20) A decisão recorrida, mais uma vez, violou o disposto nos artºs 473º do Código Civil
Termos em que se conclui pela procedência do presente recurso de apelação, e em consequência pela revogação da decisão recorrida e sua substituição por outra que considere os embargos de executado procedentes, arquivando a execução dos autos principais.
1.5.- A apelada/exequente A, tendo apresentado contra-alegações, veio na referida peça impetrar a total improcedência da apelação da executada, para tando concluindo da seguinte forma :
A. O título dado à execução é uma sentença condenatória já transitada em julgado.
B. Cujo objecto é o direito da autora/embargada a ser indemnizada pelo réu/embargante no montante de € 168.773,65, acrescido de Juros de mora, em consequência do incumprimento de um contrato de intermediação financeira.
C. Tendo solucionado as seguintes questões:
- Se o Banco violou, ilícita e culposamente, o contrato de intermediação financeira;
- quais os danos sofridos pela autora/embargada e a consequência dessa violação.
D.  E, em consequência, condenou o recorrente a pagar € 165.773,65, acrescido de juros de mora vencidos desde 2 de Setembro de 2010.
E. À recorrida foi pois reconhecido o direito de ser indemnizada, em consequência da violação de um contrato de intermediação financeira, ressarcindo-a dos danos sofridos em consequência cessa violação.
F. A reparação desse prejuízo implica o pagamento dos juros de mora, pelo que a questão a solucionar reconduz-se a saber se os juros que o recorrente foi condenado a pagar à recorrida estão sujeitos a retenção na fonte para efeitos de IRS.
G. A indemnização fixada na sentença executada tem por finalidade repor, no possível, a situação do lesado anterior à lesão sofrida, nos termos dos artºs 562, 563, 564 e 566 do Código Civil, compensando-o dos efeitos económicos do facto lesivo.
H. Ou seja, a indemnização não constitui em si uma divida pecuniária, nem um ganho, porque o seu objecto originário reside no dano, que somente é traduzido numa expressão pecuniária porque a
reconstituição natural não é possível.
I. Integram essa indemnização os juros moratórios, a chamada mora artificial, que corresponde aos juros compensatórios pela demora na liquidação do dano.
J. Estes juros incidentes sobre o valor da indemnização não constituem pois um acréscimo do crédito pecuniário resultante da dilação do respectivo vencimento ou da mora no pagamento, pelo que não constituem rendimento dos capitais, antes são igualmente capital.
K. Não se está pois perante um rendimento ou um acréscimo patrimonial da recorrida, pelo que não estão abrangidos pelo artº 5, nº 1 al g) do CIRS.
L. Para que houvesse obrigação de pagamento do imposto era  necessário facto tributário, fixando-se a matéria colectável e a liquidação do Imposto.
M.  Ora no caso os autos,  do que se trata é da violação ilícita e culposa de um contrato de intermediação financeira, que a lei fiscal, de forma abstracta e típica, não prevê como geradora do direito ao imposto
N. Dispõe o artº 4, nº 1 da Lei Geral Tributária que os impostos assentam na capacidade contributiva recebida através do rendimento, sendo que sem essa capacidade não há tributação.
O. Acresce que de acordo com o artº 11, nº 1 da Lei Geral Tributária na interpretação de normas fiscais e na qualificação dos factos a que as mesmas se aplicam, têm de ser observadas as regras e princípios gerais da interpretação e aplicação da lei.
P. E o nº 3 acrescenta que na dúvida sobre o sentido das normas de incidência a aplicar, deve atender­-se à substância económica dos factos tributários.
Q. Ora, face ao prejuízo causado pela violação ilícita e culposa de um contrato de intermediação financeira, os juros consubstanciam-se em lucro cessante, em dano acrescido, que esses juros procuram compensar não estando assim sujeitos a tributação.
R. Na douta sentença recorrida deu-se como provado que o recorrente tinha deduzido aos juros moratórios em dívida o montante relativo à retenção na fonte para efeitos de IRS.
S. Nada mais se provou, não havendo qualquer facto ou documento de que resulte que o recorrente entregou ao Estado, em substituição da recorrida, o montante deduzido.
T. Sendo que essa dedução foi feita sem o conhecimento e o consentimento da recorrida, nunca tendo sido notificada pelo Estado da sobre dita entrega.
U. Carece pois de fundamento a reapreciação pedida, pelo que deve ser indeferida.
V. Como se deixou já demonstrado o recorrente ilegalmente fez uma dedução aos juros devidos à recorrida.
W. O que vale por dizer que a recorrida ao não receber o montante a que tem direito empobreceu.
X. No limite o recorrente poderia ter entregue ao Estado o montante ilegalmente retido.
Y. Se o fez, deve requerer a devolução desse montante, em nada empobrecendo.
Z. Por último o direito da recorrida a receber os juros emerge da sentença judicial, pelo que não se pode dizer que não haja causa translativa para o reclamado pagamento.
AA. Não se verificam pois os requisitos previstos no artº 473 do Código Civil, pelo que carece de fundamento o presente recurso.
                                          *
Thema decidendum
1.6. - Colhidos os vistos, cumpre decidir, sendo que , estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões [ daí que as questões de mérito julgadas que não sejam levadas às conclusões da alegação da instância recursória, delas não constando, têm de se considerar decididas e arrumadas, não podendo delas conhecer o tribunal ad quem ] das alegações dos recorrentes ( cfr. artºs. 635º, nº 3 e 639º, nº 1, ambos do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei nº 41/2013, de 26 de Junho ), e sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, as questões a apreciar e a decidir  são as seguintes  :
I -  Aferir se à factualidade provada e fixada pelo tribunal a quo, importa adicionar um outro, porque  não controvertido, antes admitido pelas partes ;
II - Se em face da factualidade assente, se impõe revogar o saneador- sentença apelado, sendo a oposição à execução julgada como procedente  e, consequentemente :
a) Apenas devendo a execução prosseguir termos com vista à cobrança coerciva do montante de  €2.448,00.
                                              *
2.- Motivação de Facto
Mostra-se fixada pelo tribunal a quo a seguinte factualidade :
2.1.- Na acção declarativa de condenação com o n.° …/…, que correu termos na Instância Central de Lisboa, 1ª Secção, J4, em que foi autora A e réu B, foi proferida sentença em 6.01.2017, transitada em julgado em 13.02.2017, nos termos da qual o ali réu foi condenado a pagar à ali autora:
a) a quantia de €165.773,65 (cento e sessenta e cinco mil e setecentos e setenta e três euros e sessenta e cinco cêntimos);
b) juros de mora sobre a quantia de € 146.592,60, vencidos desde 2 de Setembro de 2010, à taxa supletiva de juros moratórios relativamente aos créditos de que sejam titulares empresas comerciais, até efectivo e integral pagamento;
c) juros de mora sobre a quantia de €19.180,97, vencidos desde a data da citação do réu, à taxa supletiva de juros moratórios relativamente aos créditos de que sejam titulares empresas comerciais, até efectivo e integral pagamento.
2.2. - Nos autos de execução a que coube o n.° …/…, em que é exequente A e executado B, ora embargante, vem apresentado como título executivo, a sentença referida em 2.1.;
2.3. - O executado/embargante pagou à exequente a quantia de € 218.775,07, tendo deduzido nos juros moratórios em dívida o montante relativo à retenção na fonte para efeitos de IRS.
                                                  *
3.- Se à factualidade provada e fixada pelo tribunal a quo, importa adicionar um outro, porque  não controvertido, antes admitido pelas partes.
Em sede de impugnação da decisão de facto proferida pelo tribunal a quo, e para tato invocando que na referida parte incumpriu o tribunal a que regra vinculativa do direito probatório ( o artº 574º,nº2, do CPC ), máxime acordo estabelecido entre as partes nos articulados, impetra a apelante B… que ao elenco dos factos provados seja acrescentado um outro, e com a seguinte redacção :
O EXECUTADO/EMBARGANTE PAGOU AO ESTADO O VALOR DE IRS RETIDO NA FONTE NO PAGAMENTO À EXEQUENTE”.
Em boa verdade, no artº 29º do seu articulado inicial,  e tendo em artigos antecedentes alegado ter procedido à retenção sobre os juros liquidados e devidos à apelada/exequente, os montantes devidos e em cumprimento de disposições legais do CIRS, diz a apelante que os referidos montantes retidos entregou-os ao ESTADO PORTUGUÊS.
Ora Bem.
Regulando os termos da oposição à execução , reza o nº 2, do artº 732º, do CPC, que “ Se forem recebidos os embargos, o exequente é notificado para contestar, dentro do prazo de 20 dias, seguindo-se, sem mais articulados, os termos do processo sumário de declaração”.
Já o nº 3 do mesmo dispositivo, dispõe que  “à falta de contestação é aplicável o disposto no n.º 1 do artigo 567º e no artigo 568.º, não se considerando, porém, confessados os factos que estiverem em oposição com os expressamente alegados pelo exequente no requerimento executivo”.
À contrario sensu, e não olvidando ainda o disposto no artº 551º,nº 1, do CPC, temos assim que, os factos alegados pelo embargante no articulado de oposição à execução e que não forem pelo exequente/embargado objecto de impugnação no âmbito da sua contestação [ a do nº 2, do artº 732º, do CPC ], devem considerarem-se como estando admitidos por acordo, mas apenas quando não estejam em oposição com os expressamente alegados pelo exequente/embargado no requerimento executivo.
Em rigor, em sede de instância dos embargos de executado, tem lugar o efeito cominatório semi-pleno, qual seja o de se considerarem confessados os factos alegados pelo executado na petição de embargos, mas sem prejuízo de se terem sempre por impugnados os factos alegados pelo exequente no requerimento executivo . (1)
Isto dito, porque em bom rigor a exequente A não impugnou que tenha o EXECUTADO/EMBARGANTE PAGO AO ESTADO O VALOR DE IRS RETIDO NA FONTE NO PAGAMENTO À EXEQUENTE”, isto por um lado e, por outro, de facto se trata que não deve considerar-se como tendo sido de antemão objecto – em razão de tudo o alegado pelo exequente no seu requerimento inicial da execução - de impugnação pelo exequente no requerimento executivo, deve portanto o aludido facto fazer também parte do rol dos factos provados .
Acresce que, de facto não se trata, também , que só possa/deva ser provado por documento ( cfr. Artº 574º, nº2, do CPC ).
Em suma, procedem portanto as conclusões recursórias da apelante nºs 2 a 4 .
                                                     *
4 -  Motivação de Direito
4.1. - Se em face da factualidade assente, se impõe revogar o saneador- sentença apelado, sendo a oposição à execução julgada como procedente  e, consequentemente , apenas devendo a execução prosseguir termos com vista à cobrança coerciva do montante de €2.448,00.
Veio a executada B , em sede de oposição, insurgir-se contra a exigida - pela exequente - cobrança coerciva de quantia exequenda que reclamada foi a título de JUROS remuneratórios e moratórios.
Para tanto, alegou  a executada apelante, em síntese, que pagou já a quantia em que foi condenado na sentença dada à execução, a título de capital e de JUROS ,e isto porque, incumbindo-lhe proceder à retenção na fonte do imposto sobre o rendimento das pessoas singulares, veio a deduzir o respectivo montante nos juros moratórios em dívida, agindo assim em cumprimento de obrigação legal, máxime em face do que obriga o disposto nos art.s 5º, n.° 2, alínea g) e art. 101°, alínea a), ambos do CIRS.
Logo, concluiu a embargante, apenas podia e devia a execução prosseguir termos com vista à cobrança coerciva da quantia de €2.448,00 a título de custas de parte.
Tendo a oposição “naufragado” na referida parte, e para o efeito ,alicerçou-se o tribunal a quo , no essencial, nos seguintes fundamentos:
 “ (…)
O imposto sobre o rendimento das pessoas singulares (IRS) incide sobre o valor anual dos rendimentos, nomeadamente os provenientes dos rendimentos de capitais.
Estabelece o art. 5º, n.° 2, alínea g) do CIRS ( aprovado pelo DL 442-A/88, de 30/11,com as alterações posteriores ) que consideram-se rendimentos de capitais os juros ou quaisquer acréscimos de crédito pecuniário resultantes da dilação do respectivo vencimento ou de mora no seu pagamento, sejam legais sejam contratuais, com excepção dos juros devidos ao Estado ou a outros entes públicos por atraso na liquidação ou mora no pagamento de quaisquer contribuições, impostos ou taxas e dos juros atribuídos no âmbito de uma indemnização não sujeita a tributação nos termos do n.° 1 do artigo 12.°.
Tendo em conta a sua função ou finalidade, os juros podem ser remuneratórios, moratórios e compensatórios.
Ora, a indemnização da ora exequente, fixada na sentença dada à execução, tem por finalidade repor, no possível, a situação do lesado anterior à lesão sofrida, nos termos dos art.s 562°, 563°, 564° e 566° do Cód. Civil. E os juros incidentes sobre o valor da indemnização não constituem um acréscimo de crédito pecuniário resultantes da dilação do respectivo vencimento ou da mora no pagamento, pelo que não constituem rendimentos de capitais, mas têm uma natureza essencialmente compensatória ou indemnizatória
Os juros são devidos nos termos do art. 805°, n.° 3, do Cód. Civil como forma de manter íntegra a indemnização. Não mais representam que uma parcela ou uma actualização da indemnização; não constituem uma remuneração de capital ou um incremento patrimonial, qualificável como rendimento, sujeito a imposto sobre o rendimento.
Esses juros ( moratórios nos termos da lei - arts. 804°, 805° e 806° do CC ) não correspondem a verdadeira situação de mora em sentido técnico ( antes uma mora artificial ), daí que se entenda que os " juros a introduzir no montante indemnizatório dos danos concretos não deverão reputar-se como juros moratórios, juros de mora, mas antes como juros compensatórios ou indemnizatórios ( hoc sensu ), isto é, como fazendo parte ainda da indemnização devida, sua parte integrante; são assim, também capital" ( cfr. Correia das Neves, Manual dos Juros, 3ª ed., pág. 319 ).
Com efeito, estando em causa a responsabilidade por facto ilícito ou pelo risco, os juros devidos visam contrabalançar a desvalorização monetária e manter intocável a indemnização que seja devida.
Por isso, estes juros não são verdadeiramente moratórios, mas compensatórios, integrando a indemnização pelo dano.
Fazendo estes juros parte integrante da indemnização, não são passíveis de IRS .
Como tal, não podia o executado/embargante retê-los na fonte.
Por conseguinte, há que concluir que o executado/embargante não efectuou a prestação integral a que se encontrava adstrito, assim improcedendo os presentes embargos de executado”.
Conhecidas que estão as razões da discordância da apelante [ em face do conteúdo das respectivas conclusões recursórias ], e adiantando desde já o nosso veredicto, é para nós de alguma forma pacífico que, no tocante ao objecto e ponto crucial dos embargos decidiu o tribunal a quo com acerto, tudo indicando que é a apelante que incorre em erro de interpretação de disposições legais aplicáveis ao thema decidendum e emergentes do CÓDIGO DO IMPOSTO SOBRE O RENDIMENTO DAS PESSOAS SINGULARES (2) [ doravante designado apenas por CIRS ].
Senão ,vejamos.
Antes de mais, importa atentar que o título executivo ( uma sentença ) corresponde a uma decisão judicial proferida em acção declarativa de condenação e cujo pedido de condenação da aí demandada se alicerçou em causa de pedir relacionada com instituto da responsabilidade civil contratual, maxime com obrigação de indemnização que recai sobre entidade bancária ou intermediário financeiro em sede de violação do dever de informação.
E, além de o titulo executivo/sentença condenar a ora executada no pagamento de uma indemnização , acresce que, e como já decidido pelo STJ [ em Acórdão de 17/3/2016 (3) ] , se prima facie a responsabilidade do intermediário financeiro e a que alude o artigo 314º do CVM, é uma responsabilidade contratual, por outro e porque é fonte de tal responsabilidade a violação do dever de informação a que estão obrigados os bancos nos temos do artigo 75º, nº 1, do REGIME GERAL DAS INSTITUIÇÕES DE CRÉDITO E SOCIEDADES FINANCEIRAS, a responsabilidade civil aproxima-se também da delitual, logo, e em última análise, a responsabilidade indemnizatória  em apreço acaba por situar-se numa zona intermédia entre a responsabilidade contratual e a extracontratualaplicando-se em todo o caso o regime do art. 799.º do CC.
Em razão do acabado de expor, inevitável se mostra desde logo a impertinência de, para justificar o seu “comportamento” em sede de  cumprimento da sentença condenatória que consubstancia o título executivo da execução que lhe move a ora apelada, invocar – nos autos - a embargante/recorrente o Acórdão do STJ de 25.2.2009 (4), pois que, incide este último sobre questão relacionada com compensação/indemnização decorrente de cessação de contrato de trabalho, ou seja, com matéria expressis verbis tratada/abrangida pela previsão do artigo 2.°, n.º 3, al. e) e n.º 4 do CIRS.
É que, recorda-se , dispondo o Artigo 1.º [ Base do imposto],nº1, do CIRS, que o imposto sobre o rendimento das pessoas singulares (IRS) incide sobre o valor anual dos rendimentos de diversas categorias, nas quais se integra a Categoria A reportada aos  Rendimentos do trabalho dependente, logo o normativo subsequente ( o artº 2º ) dispõe no seu nº3, alínea e) que “Consideram-se ainda rendimentos do trabalho dependente quaisquer indemnizações resultantes da constituição, extinção ou modificação de relação jurídica que origine rendimentos do trabalho dependente, incluindo as que respeitem ao incumprimento das condições contratuais ou sejam devidas pela mudança de local de trabalho, sem prejuízo do disposto no número seguinte e na alínea f) do n.º 1 do artigo seguinte “ [ Redacção dada pela Lei n.º 82-E/2014, de 31 de Dezembro ] .
Ainda o mesmo normativo ( o artº 2º, do CIRS ) , mas agora no respectivo nº4, acrescenta que Quando, por qualquer forma, cessem os contratos subjacentes às situações referidas nas alíneas a), b) e c) do n.º 1, mas sem prejuízo do disposto na alínea d) do mesmo número, quanto às prestações que continuem a ser devidas mesmo que o contrato de trabalho não subsista, ou se verifique a cessação das funções de gestor público, administrador ou gerente de pessoa colectiva, bem como de representante de estabelecimento estável de entidade não residente, as importâncias auferidas, a qualquer título, ficam sempre sujeitas a tributação” [ Redacção dada pela Lei n.º 64-B/2011 de 30 de dezembro ].
Ou seja, não serve o Ac. do STJ de  25.2.2009 para justificar a pertinência de, aquando do cumprimento da sentença condenatória proferida na acção declarativa de condenação com o n.° 23736/15.7T8LSB, estar a ora apelante obrigada a observar/cumprir o disposto no artº 98º, do CIRS [ sob a epigrafe de Retenção na fonte – Regras gerais ] , isto é, a no acto do pagamento, deduzir as importâncias correspondentes à aplicação das taxas neles previstas por conta do imposto respeitante ao ano em que esses actos ocorrem.
Ex Adverso, já o Ac. do Tribunal da Relação de Lisboa (5) de 06-07-2005 e no qual o tribunal a quo se ampara  para justificar o acerto da sua decisão, mostra-se , no nosso modesto entendimento, mais apropriado para esclarecer e deslindar qual a solução adequada para o thema decidendum.
Data vénia, e porque não se descortina que outra forma exista de , com mais perfeição, elucidar qual a tese que contraria o entendimento da apelante, não resistimos a, de seguida, transcrever alguns excertos/passagens do acima identificado Ac. proferido por este mesmo tribunal a de 06-07-2005.
Diz-se nele, que :
“(…)
Os impostos caracterizam-se por serem prestações definitivas e unilaterais estabelecidas pela lei a favor de uma pessoa colectiva de direito público, para a realização de fins públicos, e a qual não constitui sanção de um acto ilícito, cfr António Braz Teixeira, in Princípios de Direito Fiscal, 3ª edição, 35.
Dispõe o normativo inserto no artigo 4º, nº1 da Lei Geral Tributária que «Os impostos assentam essencialmente na capacidade contributiva, revelada, nos termos da lei, através do rendimento ou da sua utilização e do património.».
(…)
Entre as várias categorias de rendimentos sujeitos a impostos, encontram-se os rendimentos da categoria E, nos quais se incluem , além do mais, os juros provenientes da dilação do vencimento ou da mora no pagamento de créditos pecuniários, nos termos do artigo 6º, nº1, alínea g) do CIRS.
Ora, é precisamente no sentido e alcance deste normativo que reside o aporema daqui.
Se não.
Na tese da Apelante, os juros que se venceram sobre o capital da indemnização em que foi condenada, estão sujeitos a IRS, daí o ter procedido ao desconto do mesmo aquando da satisfação daquela ao Apelado.
Mas, salvo o devido respeito, falece-lhe a razão.
«Quem estiver obrigado a reparar um dano deve reconstituir a situação que existiria, se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação», artigo 562º do CCivil.
Daqui decorre, que a indemnização tem como fim a recriação da situação em que o lesado estaria se não se tivesse verificado o facto lesivo, sendo que a indemnização, de harmonia com o normativo inserto no artigo 564º do CCivil apenas existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão, tendo a Lei consagrado, aqui, o princípio da causalidade adequada como critério do dano ressarcível.
A indemnização corresponderá ao prejuízo efectivamente sofrido pelo lesado, o qual «(…) deverá receber e só receber o necessário a remover ou compensar os efeitos económicos negativos do facto lesivo…», cfr Calvão da Silva, RLJ ano 134, pag 102 e seguintes.
Ora, a Apelante foi condenada no
pagamento de uma indemnização que traduz essa compensação pelos efeitos negativos do facto lesivo praticado pelo seu segurado e essa indemnização em dinheiro não é mais do que uma divida de valor correspondente ao valor do dano causado.
Quer isto dizer que essa indemnização não constitui, a se, uma divida pecuniária, nem um ganho, porque o objecto originário da indemnização reside no dano, que só posteriormente é traduzido na sua expressão monetária (se a reconstituição natural não for possível, como é óbvio ).
Daí a preocupação legislativa em «quantificar» a aludida dívida na data mais recente que puder ser atendida pelo Tribunal a fim de assegurar ao credor (na medida do possível) a reparação do dano efectivo, cfr artigo 566º, nº2 do CCivil.
A atribuição de juros moratórios ( mora artificial ) desde a data da sentença em primeira instância, corresponde aos juros compensatórios pela demora na liquidação do dano.
Trata-se ( no dizer de Calvão da Silva, ibidem ), de «lucros cessantes», abrangidos pelo normativo inserto no artigo 566º, nº2 do CCivil, neste sentido o Ac STJ de 9 de Março de 2004, Relator Cons. Oliveira Barros ( com o voto de vencido do Cons. Salvador da Costa com o qual se discorda face à interpretação literal efectuada), in www.dgsi.pt onde se lê «…não é o facto de a lei se lhes referir como moratórios que pode fazer esquecer a verdadeira função – compensatória – desses juros.(…)».
Efectivamente, tais juros, embora na letra da lei sejam descritos como «moratórios», cfr artigo 805º do CCivil, tratam-se de juros compensatórios ou indemnizatórios, que fazem parte integrante da indemnização devida, sendo igualmente capital, cfr Correia das Neves, in Manual dos Juros, 3ª edição, 318, Antunes Varela, in RLJ, ano 102º/90.
Ora, assim sendo, e não se estando em presença de um «rendimento», ou um mero acréscimo patrimonial do Apelado, a tributação de tais juros não está abrangida pela alínea g) do nº1 do artigo 5º do CIRS e por a tal se opor o artigo 4º, nº1 da Lei Geral Tributária.
Veja-se que na interpretação do sentido das normas fiscais e na qualificação dos factos a que as mesmas se aplicam, de harmonia com o normativo inserto no artigo 11º, nº1 da lei Geral Tributária, «…são observadas as regras e princípios gerais de interpretação e aplicação das leis.», acrescentando o seu nº3 que «persistindo a dúvida sobre o sentido das normas de incidência a aplicar, deve atender-se à substância económica dos factos tributários.».
E, essa tal substância do facto jurídico passível de tributação, em termos genéricos, consubstanciada numa indemnização proveniente de um acto ilícito extra contratual, no que tange aos juros, é um lucro cessante, um dano acrescido, que aqueles procuram compensar, não estando assim sujeitos a tributação ( como não estavam antes sujeitos a imposto de capitais, cfr Correia das Neves, ibidem, 272).”
Ora, o entendimento acabado de “transcrever”, é aquele que, é essa a nossa convicção, porque mais sustentável à luz de uma interpretação da lei efectuada em consonância com o disposto no artº 9º, nºs 1 e 3, do Código Civil, é também aquele que, em coerência, tem vindo a ser seguido de forma largamente maioritária pelas instâncias ( 1ª e 2ª )  e outrossim pelo STJ. (6)
É que, vg no Ac. do Tribunal da Relação do Porto, de 21-05-2002 (7), se concluiu do seguinte modo :
“ a indemnização por acidente de viação, o montante relativo a juros devidos desde a citação, que são juros compensatórios e não moratórios, não esta sujeito a retenção na fonte para efeito de IRS, por não serem tais juros tributáveis em IRS”.
É também assim que, vg no Ac. do Tribunal da Relação de Évora, de 14-10-2004 (8), se concluiu do seguinte modo :
I - Os juros a que se reporta o art. 805º, nº 3, 2ª parte, do Cód. Civil (na redacção introduzida pelo referido DL. nº 262/83) destinam-se, a ressarcir os prejuízos advenientes da demora do processo .
II – Tais juros ainda fazem parte da indemnização devida por facto ilícito ou pelo risco, têm natureza compensatória e por isso, não são juros de mora em sentido próprio e como tal também não podem ser considerados rendimentos de capital.
III - Tais juros não são passíveis de tributação em IRS, pois não são rendimentos de capitais, para efeitos do disposto na alínea g) do nº 1 do artigo 5º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares .”
É, finalmente, ainda assim que também no seu Ac. de 30 de Outubro de 2003 (9), concluiu o STJ que :
O artigo 5º, nº 1 alínea g) do Código do IRS viola os artigos 13º, 103º, nº. 1 e 104º, nº. 1 da Constituição da República Portuguesa ao sujeitar àquele imposto os juros de mora com função compensatória da desvalorização monetária, relativos a indemnização fixada a título de responsabilidade civil extracontratual.
Aqui chegados, e não obstante as alterações entretanto introduzidas no CIRS após a prolação das decisões judiciais acima indicadas, certo é que, continuam estas últimas a manterem a sua actualidade. (10)
Vejamos.
É antes de mais consabido que [ cfr artº 1º, do CIRS ], o imposto sobre o rendimento das pessoas singulares (IRS) incide sobre o valor anual dos rendimentos de diversas categorias seguintes, mesmo quando provenientes de actos ilícitos, depois de efectuadas as correspondentes deduções e abatimentos, ou seja, tem o Código do IRS por desiderato regular a tributação dos acréscimos patrimoniais das pessoas, isto é o "enriquecimento" alcançado durante o período de tributação.
Logo, e à partida, porque os montantes auferidos a título de indemnização têm por desiderato/função o ressarcimento de um dano [ cfr artº 562º,do CC ] , o que obriga a reconstituir a situação que existiria se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação, então e em princípio não beneficia o lesado de um qualquer acréscimo patrimonial que deva estar sujeito a tributação em sede de IRS.
Porém, certo é que o legislador tributário, e  especificamente  com vista a regular/tributar os incrementos patrimoniais insusceptíveis de tributação na qualidade de rendimentos de quaisquer outras categorias, consagra sob a Categoria G/Incrementos patrimoniais uma forma de tributação taxativa/tipificada de acréscimos patrimoniais [ afastando-se de uma definição genérica de ganhos de capital – cfr item 12, do Preâmbulo do Decreto-Lei n.º 442-A/88, de 30 de Novembro], quais rendimentos excepcionais, e em cujo âmbito inclui precisamente os rendimentos provenientes de indemnizações.
Destarte, quando na presença de montantes auferidos a título de indemnização – que visam, como vimos já, o ressarcimento de  danos sofridos pela pessoa - , e com vista à aferição da sua sujeição, ou não, a tributação em sede de IRS, importa essencialmente atender ao que resulta de especifica norma de incidência objectiva em sede de IRS , sendo a mesma a do artº 9.º [ Rendimentos da categoria G ], por sua vez conjugada com a correspondente norma de delimitação negativa de incidência do mesmo Código , a do artº 12º [ cujo nº 1, é expresso em considerar que o IRS não incide -  salvo quanto às prestações previstas no regime jurídico dos acidentes em serviço e das doenças profissionais no âmbito da Administração Pública, estabelecido pelo Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de Novembro, alterado pelas Leis nºs 59/2008, de 11 de Setembro, 64-A/2008, de 31 de Dezembro, e 11/2014, de 6 de Março - sobre as indemnizações devidas em consequência de lesão corporal, doença ou morte, pagas ou atribuídas ].
Não é, pois, a norma do Artigo 5.º [ Rendimentos da categoria E ] e direccionada para a tributação dos rendimentos de capitais -  nos  quais  têm particular relevância precisamente os juros e os lucros derivados de participações de capital , cfr item 10, do Preâmbulo do Decreto-Lei n.º 442-A/88, de 30 de Novembro - , a adequada para resolver a questão que integra o objecto essencial da presente apelação.
Ademais,  pressupondo a aplicação do acima referido artº 5 do CIRS estar-se na presença de rendimentos de capitais , máxime em face dos respectivos frutos e demais vantagens económicas, certo é que não apenas uma obrigação de indemnização não consubstancia um rendimento de capital,  como,  também , a alínea g) , do nº2, do mesmo artº 5º do CIRS (11) , é clara em excluir de tributação em sede de IRS os juros atribuídos no âmbito de uma indemnização não sujeita a tributação nos termos do n.º 1 do artigo 12.º.
Isto dito, recorda-se que reza o nº1, do Artigo 9.º [ Rendimentos da categoria G ] do CIRS, na respectiva alínea b), que constituem incrementos patrimoniais, desde que não considerados rendimentos de outras categorias, “as indemnizações que visem a reparação de danos não patrimoniais, exceptuadas as fixadas por decisão judicial ou arbitral ou resultantes de acordo homologado judicialmente, de danos emergentes não comprovados e de lucros cessantes”.
Por sua vez, e em sede de interpretação da lei fiscal, dispõem os números 1 e 2 do artigo 11.º da Lei Geral Tributária ( LGT – aprovado pelo DL n.º 398/98, de 17 de Dezembro ), que “ Na determinação do sentido das normas fiscais e na qualificação dos factos a que as mesmas se aplicam são observadas as regras e princípios gerais de interpretação e aplicação das leis “, sendo que, “ Sempre que, nas normas fiscais, se empreguem termos próprios de outros ramos de direito, devem os mesmos ser interpretados no mesmo sentido daquele que aí têm, salvo se outro decorrer directamente da lei”.
Já no tocante às regras gerais de interpretação, reza o artigo 9.º do Código Civil ( nºs 1 ,2 e 3), que a interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, sendo que, não pode ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso, isto por um lado e, por outro, e na fixação do sentido e alcance da lei, presumirá o intérprete que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados.
Aqui chegados, e em sede de IRS, serão assim de considerar como incrementos patrimoniais e consequentemente objecto de tributação, as quantias/montante provenientes de indemnizações , desde que [ cfr artº 9º, nº1, alínea b), do CIRS ] :
I) visem a reparação de danos não patrimoniais (excepto as fixadas por decisão judicial ou arbitral ou resultantes de acordo homologado judicialmente);
II) visem a reparação de danos emergentes quando estes não se encontrem devidamente comprovados ;
III) visem a reposição de lucros cessantes, mas apenas quanto à parcela destinada a ressarcir os benefícios líquidos deixados de obter em consequência da lesão.
Depois, e em face do carácter residual do normativo [ desde que não considerados rendimentos de outras categorias ], importa ainda que o montante auferido pelo contribuinte a título de indemnização  não se mostre especificamente abrangido como rendimento ao abrigo de normas de incidência de qualquer uma outra categoria, vg como rendimento/indemnização integrante da Categoria B ( artº 3º,nº2, alínea d) ).
Por último, porque como vimos supra pressupõe a obrigação de indemnização a reparação de um dano, isto por um lado e, por outro, visa o CIRS a tributação dos acréscimos patrimoniais das pessoas, isto é o "enriquecimento, então em sede de tributação das importâncias auferidas a título de indemnização devem considerar-se apenas os acréscimos patrimoniais líquidos, ou seja, os montantes que vão para além dos necessários à reposição do património inicial [ ou os não necessários à reconstituição à situação que existiria, se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação ] .
Apetrechados de todas as observações e contributos acabados de aduzir, importa desde logo afastar a susceptibilidade de integrar o crédito exequendo a previsão da primeira parte do artigo 9.º, n.º 1, alínea b) ,do CIRS, quer por em causa não estar uma indemnização que vise a reparação de danos não patrimoniais, quer porque, ainda que o estivesse, certo é que se mostra a mesma fixada por decisão judicial.
Outrossim, forçoso é afastar a susceptibilidade de integrar o crédito exequendo a previsão da segunda parte do artigo 9.º, n.º 1, alínea b) ,do CIRS, desde logo porque tem a obrigação de indemnização em que foi a ora executada condenada por objecto um dano emergente [ o prejuízo causado, ou a desvalorização do património do lesado – cfr. 1ª parte do artº 564º, do CC ] devidamente comprovado e/ou documentado em sede de acção judicial.
Por fim, e correspondendo os lucros cessantes aos ganhos que o lesado deixou de obter ( não logrando aumentar o património ) em consequência da lesão, que o mesmo é dizer, tem a subjacente indemnização por desiderato permitir ao lesado recuperar um ganho que teria obtido caso o evento que desencadeou a indemnização não tivesse ocorrido , certo é que os juros abrangidos pelo título executivo dos autos [ juros de mora ou ] visam tão só repor uma perda, logo, não desencadeiam um enriquecimento, apenas a reposição da situação patrimonial inicial
Em suma, todos os juros fixados no título executivo dado à execução são, em rigor, meramente compensatórios ou indemnizatórios [ visando a reparação pelos prejuízos resultantes do atraso no cumprimento da obrigação , que não remuneratórios e constituindo a contraprestação onerosa pela disponibilidade do capital ] , integrando a indemnização devida , e , em consequência, não desencadeando qualquer efectivo enriquecimento, mas apenas visando a reposição da situação patrimonial inicial do lesado, não são assim susceptíveis de tributação em sede de IRS.
Concluindo, porque no âmbito de responsabilidade tributária em sede de IRS, e no tocante às importâncias auferidas a título de indemnização , a regra é a de considerar como apenas susceptíveis de tributação as quantias que consubstanciem efectivos acréscimos patrimoniais líquidos, o que não sucede com os juros - de mora - fixados na sentença dos autos e dada à execução, bem andou a primeira instância em julgar improcedentes os embargos de executado no tocante aos montantes “suportados” pela devedora/executada em sede de retenção na fonte do Imposto sobre os Rendimentos das pessoas Singulares e relativo a juros de mora de indemnização fixada.
Rematando, a apelação improcede in totum.
                                                  *
5 - Sumariando  ( cfr. nº 7, do artº 663º, do cpc ) .
5.1 - Tem o Código do IRS por desiderato regular a tributação dos acréscimos patrimoniais das pessoas, isto é o "enriquecimento" alcançado durante o período de tributação.
5.2. - Os juros moratórios decorrentes de obrigação de  indemnização por facto ilícito e fixados em decisão judicial têm natureza compensatória, fazendo também parte integrante do capital, logo, não estão os mesmos sujeitos à incidência de IRS, sendo-lhes inaplicável o preceituado no artigo 5º, nº2, alínea g) do CIRS.
5.3 - Os montantes atribuídos a título de indemnização e em sede de incidência objectiva para efeitos de IRS mostram-se abrangidos pela Categoria G - Incrementos patrimoniais ( artº 9º, do CIRS ) , impondo-se ainda e para o mesmo efeito considerar a norma de delimitação negativa de incidência do 12.º do mesmo Código.
                                                     ***
5. - Decisão
Em face de tudo o supra exposto,
acordam os Juízes na 6ª Secção Cível, do Tribunal da Relação de LISBOA , em , não concedendo provimento à apelação B :
5.1. -  Manter e confirmar a sentença da primeira instância ;
                                                 *
Custas pela apelante .
                                                   ***
(1) Cfr. Rui Pinto, em Acção executiva, 2108, AAFDL, pág 419, Fernando Amâncio Ferreira, in Curso de Processo de Execução, 2010,13ª edição, Almedina, pág.185 , e J.P. Remédio Marques, Curso de Processo Executivo Comum ,Porto, 1998, pág. 159.
(2) Aprovado pelo Decreto-Lei 442-A/88, de 30 de Novembro
(3)  Proferido no processo n.º 70/13.1TBSEI.C1.S1, sendo Relatora a Exmª Juíza Consª MARIA CLARA SOTTOMAYOR, e in  www.dgsi.pt
(4)  Proferido no processo n.º 70/13.1TBSEI.C1.S1, sendo Relator o Exmº Juíz Consº SOUSA PEIXOTO, e in  www.dgsi.pt.
(5)  Proferido no processo n.º 4345/2005-2, sendo Relatora  ANA PAULA BOULAROT, e in  www.dgsi.pt.
(6)  Perfilhando o entendimento minoritário, vide o Ac do Tribunal da Relação do Porto, de 3/5/2003, proferido no processo nº 0331980 e in www.dgsi.pt
(7)  Proferido no processo n.º 0220612 , e outrossim ,no Ac. de 26-09-2006, Processo nº 0624332, e , o Ac do Tribunal da Relação de Guimarães, de 19/11/2003, proferido no processo nº 1782/03-2, todos eles acessíveis in www.dgsi.pt.
(8)   Proferido no processo n.º 513/04-2 e in www.dgsi.pt.
(9)  Proferido no processo n.º 03B2749, sendo Relator  MOITINHO de ALMEIDA, e in  www.dgsi.pt
(10) Vide ainda, com interesse para a presente questão, Joel Timóteo Ramos Pereira, in Juros de indemnizações por seguradoras
- Sujeitos à retenção de IRS ? , in Revista «O Advogado», n.º 38 - Dezembro de 2003.

(11) Reza a referida alínea que :
1 – Consideram-se rendimentos de capitais os frutos e demais vantagens económicas, qualquer que seja a sua natureza ou denominação, sejam pecuniários ou em espécie, procedentes, directa ou indirectamente, de elementos patrimoniais, bens, direitos ou situações jurídicas, de natureza mobiliária, bem como da respectiva modificação, transmissão ou cessação, com excepção dos ganhos e outros rendimentos tributados noutras categorias.
2 - Os frutos e vantagens económicas referidos no número anterior compreendem, designadamente:
(...)
g) Os juros ou quaisquer acréscimos de crédito pecuniário resultantes da dilação do respectivo vencimento ou de mora no seu pagamento, sejam legais seja contratuais, com excepção dos juros devidos ao Estado ou a outros entes públicos por atraso na liquidação ou mora no pagamento de quaisquer contribuições, impostos ou taxas e dos juros atribuídos no âmbito de uma indemnização não sujeita a tributação nos termos do nº 1 do artº 12º ;
                                                        ***
Notifique.
Lisboa, 11/10/2018

António Manuel Fernandes dos Santos  ( O Relator)

Eduardo Petersen Silva ( 1º Adjunto)

Cristina Isabel Ferreira Neves ( 2ª Adjunta)