Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
3646/12.0TJLSB-T.L1-2
Relator: PEDRO MARTINS
Descritores: RECURSO DE REVISÃO
DOCUMENTO SUPERVENIENTE
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 05/23/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I- O documento a que se refere o art. 696/-c do CPC tem de dizer respeito a factos que tenham sido objecto de prova e sejam fundamento da decisão de mérito da decisão a rever e não a pressupostos processuais do processo onde a decisão a rever foi proferida.
II- Se os factos a que o documento se refere dizem respeito à falta de legitimidade processual ou material do requerente da insolvência e se essas questões nem sequer foram objecto da decisão a rever, que se baseou na situação de insolvência confessada pelo devedor, o documento não serve para os fins do art. 696/-c do CPC.
III- Para além disto, o documento apresentado pelo recorrente nunca provaria, só por si (como é exigido pela norma), os factos pretendidos.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa os juízes abaixo assinados:
I. A 05/09/2012 foi requerida a insolvência de JMG.
II. Como requerente constava B, representado por uma advogada (com procuração de 14/08/2012, assinada com o nome B). Nele constava, para além do mais (que englobava dívidas de JMG executadas em 43 processos), que o requerente era cessionário de um crédito sobre JMG, proveniente de uma dívida deste para com M, pelo valor de 9500€. Uma das testemunhas arroladas era C. Juntava-se um escrito de cedência do crédito (assinado com os nomes do cedente e do cessionário) e um outro de declaração de dívida assinada por JMG.
III. Aquele requerimento deu origem ao processo principal de que este processo, supra identificado, é o apenso T.
IV. No dia 04/10/2012, JMG apresentou uma oposição ao requerimento de insolvência. Não pôs em causa a sua assinatura na declaração de dívida, mas dizia que se tratava de um negócio simulado, para evitar o pagamento de IVA. Assumia ter dívidas a dois credores no valor de 150.000€ e 35.000€, mas alegava ter créditos contra terceiros e, como meeiro, bens imóveis, tudo de valor muito superior às dívidas, incluindo um crédito “apreciável” contra o cedente a título de honorários; dizia ainda que a cessão de créditos invocada pelo requerente B era nula e ineficaz em relação a si e falso o documento que a corporizava. A oposição era subscrita pelo advogado Dr. J.
V. No dia 22/01/2013, JMG faltou à audiência de discussão e julgamento naquele processo, o que acarretou a confissão dos factos alegados na petição inicial, pelo que ele foi declarado insolvente por sentença desse mesmo dia (na acta da audiência consta como advogado do requerente [da insolvência] Dr. A e diz-se que JMG não tem mandatário constituído; no despacho diz-se que o mandatário renunciou ao mandato e que JMG, devidamente notificado, não constituiu novo mandatário no prazo legal; pelo que se determinou o normal prosseguimento dos autos nos termos do art. 39/3 do CPC. E o despacho continuava: o preceito citado tem que ser articulado com o art. 35/2 do CIRE, nos termos do qual a falta do devedor acarreta a confissão dos factos alegados na PI).
VI. JMG recorreu de tal sentença para o Tribunal da Relação de Lisboa, tendo o recurso sido julgado improcedente, por acórdão de 20/06/2013.
VII. A 16/07/2015, JMG, insolvente, representado pelo advogado Dr. J, veio nos termos das alíneas c, d e g do artigo 696 do CPC, interpor recurso de revisão da daquela sentença, alegando o seguinte:
1. O insolvente, como dos autos se colhe, nomeadamente, da sua oposição à requerida insolvência, sempre expressou de forma veemente que a demanda assentava num verdadeiro embuste e que estava a ser vítima de um nebuloso processo de tipo “camorra”
2. Invocou que assentava numa simulação jurídica urdida por um conjunto de pessoas. O requerente da insolvência, B, a sua companheira e testemunha dos autos C [desta convivência comum entre ambos, nasceu a Ma a 17/06/2006], o cedente do hipotético crédito M e ainda o Sr. Advogado Dr. A.
3. Consubstanciando o que o insolvente sempre carreou aos autos, este teve recente conhecimento do conteúdo de um documento elaborado por C que esta terá dirigido ao Procurador-Geral da República, em data anterior à elaboração da sentença prolatada e posta ora em crise por este recurso de revisão, que se junta a final e aqui se dá como integralmente reproduzido para todos os efeitos legais (doc.1 [trata-se de uma participação sem data, entrada na PGR em 03/12/2013, na qual C diz, entre o mais, que a mando do advogado para quem trabalhava, Dr. A, requeria insolvências com base em cessões de créditos em que ela falsificava a assinatura do cedente da cessionária – TRL]).
4. Ora, o conteúdo deste documento desnuda a “omertà”, a ganância, o embuste que o grupo conluiado lançou por vários tribunais, com insolvências e execuções, a maioria assentes em cessão de créditos, tal como acontece no caso dos presentes autos, que numa busca ainda não terminada nos dá a seguinte grelha: […].
5. Na identificação das posições processuais, busca que o insolvente teve oportunidade de apurar até ao momento, acção que vai continuar a levar a cabo, nota-se que existe um primeiro “testa de ferro” qual seja o B, nomeadamente até meados de 2012.
6. Depois, atento o relatado pela sua companheira C, no documento remetido à PGR [doc.1] ela começa a ocupar o lugar de testa de ferro do seu companheiro B.
7. Com certeza em decorrência dos factos relatados naquele documento sob o número 15:
“15- O tempo ia decorrendo e a denunciante não conseguia arranjar trabalho, até que o companheiro daquela foi falar com o Dr. A numa sexta-feira de Março de 2012, e na 2.ª-feira seguinte a denunciante encontrava-se já a trabalhar no escritório do Dr. A.”
8. Importa referir que em todos os processos listados para além da intervenção do B e da C, que aparecem na posição de requerentes da insolvência ou exequentes, a terceira perna do tripé aparece na pessoa do mesmo advogado, que é igualmente o mandatário nesta acção do B, o qual não raras vezes dizia:
“37- (…) Tu é maluca ou quê? Já estás aqui há algum tempo e ainda não aprendeste que o dinheirinho está melhor aqui do meu lado? Se não for assim a fazer estas filhas da putice, como é que tu achas que eu tenho estes carros todos, como é que bebo Don Perignon e como é que vou todas as semanas à lagosta? O desgraçado que tocar a minha campainha sai daqui pior do que entrou. Eu não estou aqui para resolver os problemas das pessoas, mas sim para lhes trazer mais problemas”
9. É deveras chocante o que se acaba de transcrever.
10. Doutro passo não deixa de relevar o facto demonstrado nos autos, através do documento de fls. ---, suportado no requerimento de protecção jurídica de pessoa singular formulado pela C [conforme carimbo da Segurança Social de L – Secção Local de P de 22/06/2012] no qual esta declara que o seu companheiro (B) é reformado por invalidez e que o rendimento do agregado familiar e situa em 3340,75€
11. Como compreender ou aceitar que um cidadão com tão parcos rendimentos possa adquirir elevados montantes de créditos, através da figura da respectiva cessão, com o pagamento dos mesmos, aos cedentes do respectivo valor a pronto?
12. É evidente e claro que o documento que consubstancia a cessão de créditos do qual emergiu a decisão que se pretende rescindente assenta num negócio simulado.
13. O documento de cessão de créditos data de 03/05/2005.
14. Porém, nesta altura o cessionário vivia no Alentejo, com a sua companheira C, em gravíssimas e dramáticas dificuldades económicas, conforme esta refere no doc.1.
15. É a companheira do cessionário que relata as débeis condições de vida que levava com o companheiro, conforme relata nos pontos 3 a 10 da sua denúncia à PGR, cabendo então perguntar como conseguiu arranjar o montante para comprar o crédito e pagar o mesmo a pronto?
16. O documento ora dado a conhecer ao tribunal, evidencia de forma cristalina e transparente a razão invocada pelo insolvente ao longo deste penoso calvário que se transformou num verdadeiro “tsunami” no que tange à sua vida profissional, social, familiar e social, que o transportou para uma situação gravemente penosa de saúde, apenas sustentada pela força da elevada medicação que o mantém ainda deste lado da vida.
17. O insolvente apresentou já queixa-crime perante do Sr. Procurador Adjunto do Departamento de Investigação e Acção Penal de Coimbra, contra os referidos B, C, Dr. A e Drª T, Manuel e outros, cujo inquérito corre sob o número 840/15.6T9CBR, sustentado no conhecimento e conteúdo do doc.1.
18. O insolvente na queixa apresentada dá nota que acabou por contactar C e que esta lhe referiu que o documento que titula a cessão de crédito a favor do seu companheiro B, foi por si forjado e assinado, a pedido dos Drs. A e T.
19. Mais afirmou que foi igualmente ela que forjou e assinou em nome do seu companheiro B a procuração junta aos autos, na qual este concede poderes à Drª T.
20. Isto porque o seu companheiro desde meados de 2012, logo após ter intercedido pelo emprego da C no escritório do Dr. A, ausentou-se do País ao qual não terá ainda não retornado.
21. Pelo que terá sido forjada a procuração com os poderes gerais e ainda os especiais ali referidos, que não seriam conferidos numa situação vulgar de vivência no País.
22. Finalmente no que concerne ao doc.1, segundo conhecimento oficioso que igualmente C lhe transmitiu, foi o mesmo remetido ao Conselho de Deontologia do Conselho Distrital de Coimbra da Ordem dos Advogados, tendo dado origem ao processo disciplinar 46/2015-C/D [ou melhor: 46/2014.C/D, depois com um apenso 265/2014-C/D - TRL].
23. Em resumo: o documento junto a este requerimento de recurso de revisão da decisão transitada em julgado nos termos estabelecidos no art. 696/-c do CPC preenche, cumulativamente, o requisito da novidade e o requisito da suficiência. A novidade significa que o documento não foi apresentado no processo onde se proferiu a decisão em causa porquanto o insolvente o desconhecia na sua totalidade e é manifestamente suficiente, porque o documento em causa tem que implicar uma modificação dessa decisão em sentido favorável à parte vencida, por manifesta simulação da cessão de crédito que é causa de pedir que suportou a decisão ora posta em crise.
24. De direito. O recurso de revisão enquadra-se nos vulgarmente designados recursos extraordinários, o qual, nos dizeres de Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes, in CPC, Anotado, Vol. 3.º, Coimbra Editora, 2003, a pág. 195 “visa combater um vício ou anomalia processual de especial gravidade, de entre um elenco taxativamente previsto.”
25. No ensinamento de Alberto dos Reis, in CPC anotado, vol. VI (Reimpressão), Coimbra Editora, 1981, a páginas 335 e 336, o recurso de revisão constitui “(…) uma das revelações do conflito entre as exigências da justiça e a necessidade da segurança ou da certeza. Em princípio, a segurança jurídica exige que, formado o caso julgado, se feche a porta a qualquer pretensão tendente a inutilizar o benefício que a decisão atribuiu à parte vencedora.
Mas pode haver circunstâncias que induzam a quebrar a rigidez do princípio. A sentença pode ter sido consequência de vícios de tal modo corrosivos, que se imponha a revisão como recurso extraordinário para um mal que demanda consideração e remédio.
Quer dizer, pode a sentença ter sido obtida em condições tão estranhas e anómalas, que seja de aconselhar fazer prevalecer o princípio da justiça sobre o princípio da segurança. Por outras palavras, pode dar-se o caso dos inconvenientes e as perturbações resultantes da quebra do caso julgado serem muito inferiores aos que derivariam da intangibilidade da sentença.”.
26. É certo que como ferramenta processual extraordinária que é, a ela apenas se pode recorrer nos apertados e fixados limites do artigo 696 do CPC.
27. E um de tais casos, como acima referido, é o previsto no art. 696/-c do CPC, segundo o qual o pode fundamentar a existência de documento de que a parte não tivesse conhecimento, ou de que não tivesse podido fazer uso, no processo em que foi proferida a decisão a rever e que, por si só, seja suficiente para modificar a decisão em sentido mais favorável à parte vencida.
28. Exige-se, pois, a existência de um documento novo, desconhecido da parte ou que dele não tenha podido fazer uso no processo em que foi proferida a decisão revidenda e que, por si só, possua virtualidades para modificar a decisão em sentido favorável ou mais favorável à parte vencida.
29. Colhendo, mais uma vez, os ensinamentos de Alberto dos Reis, ob. cit., a pág. 353, a novidade do documento deve referir-se ao processo anterior, no sentido de aí não ter sido apresentado.
30. Complementarmente, exige-se que a parte dele não dispusesse nem dele tivesse conhecimento ao tempo em que esteve em curso o processo anterior, pelo que é “o necessário que à parte vencida tivesse sido impossível fazer uso do documento no processo em que decaiu. “
Nestes termos, devem as alegações do presente recurso de revisão ser aceites e dadas como provadas, nos termos e para os efeitos constantes do art. 696/-c do CPC, dando-se provimento ao mesmo, e prolatando uma decisão rescisória que anule o aresto primário e absolva o requerente do pedido de insolvência, com todas as legais consequências dai decorrentes.
VIII. Em requerimento de 09/11/2015, JMG diz que o requerente B nunca emitiu qualquer procuração no âmbito destes autos, tendo sido falsificada pela sua companheira C, que foi arrolada como testemunha na PI do processo de insolvência e designadamente da falsificação da procuração.
IX. A 24/02/2017, o tribunal de 1.ª instância onde o recurso de revisão foi interposto, considerou que: (i) o documento com base no qual é pedida a revisão se baseia na queixa/participação ou exposição apresentada por C à PGR em 03/12/2013; (ii) essa queixa tinha dado origem a um inquérito criminal e a um processo disciplinar; e, por isso, (iii) suspendeu, nos termos do art. 272 do CPC, a admissão ou não do pedido de revisão até à remessa da certidões relativas às decisões finais a proferir nos mesmos, no que ao seu arquivamento e ou dedução de acusação concerne.
X. A 29/08/2017, JMG apresenta para junção ao processo a acusação deduzida pelo MP de L, no processo 1110/13.0TAPBL, contra, entre outros, o Dr. A e C na qual, entre vários outros, era imputado aos arguidos o seguinte:
187. No dia 08/11/2004 JMG assinou declaração de dívida pela qual confessava que devia a M a quantia de 9500€ a pagar até ao dia 25/11/2004.
188. No dia 06/09/2012 foi autuado a acção de insolvência e recuperação de empresa em que B figurava como requerente e era requerido JMG.
189. Que correspondeu ao processo de insolvência de pessoa singular n° 3646/12.0TJLSB do J2 de Seção Cível de Instância Local de Comarca de Lisboa (extinta).
190. Na referida acção o requerente alegava que Manuel detinha um crédito sobre JMG no valor de 9500€.
191. E que por cessão de crédito, cedia a B o referido crédito, tendo o preço da cessão sido pago, dando integral quitação.
192. No lugar correspondente à assinatura de cedente a arguida manuscreveu o nome de M como se fosse este a assinar.
193. No lugar correspondente a assinatura de cessionário a arguida manuscreveu o nome de B como se fosse este a assinar.
194. Posteriormente a arguida assinou procuração forense com o nome de B como se fosse este a assinar.
195. O que fez sempre sob mando e instruções do arguido Dr. A.
196. No dia 22/01/2013, cerca das 14h, a falta de JMG à audiência de discussão e julgamento processo de insolvência de pessoa singular 3646/12.0TJLSB acarretou a confissão dos factos alegados na petição inicial e este foi declarado insolvente.
197. Actuaram os arguidos C e Dr. A de forma livre, deliberada e consciente.
198. Previram e quiseram manuscrever as assinaturas de B e M para se apropriarem e fazerem seu o valor monetário correspondente ao montante em dívida de JMG.
XI. A pedido do tribunal, a acusação, certificada, também foi remetida a estes autos pelo próprio MP a 21/11/2017, com a informação de que tinha sido requerida instrução por 4 dos arguidos (fls. 123 e segs) e de que nestes autos não existiu qualquer exame pericial à letra, o que respondia às perguntas do tribunal que acompanhavam o pedido, entre elas as seguintes:
Solicite ainda informação sobre se nesses autos houve perícia à letra e assinaturas constantes do documento da alegada cessão de crédito por M a B e referente a alegado débito de JMG ao primeiro e, designadamente, perícia à letra e assinatura aposta em tal documento como alegadamente de M e de B como cedentes e cessionário e na procuração mencionada na acusação como emitida por este último e, tendo havido perícia nos termos referidos, solicite a remessa de cópia do respectivo relatório pericial.
XII. A 02/02/2018 (fls. 170 a 172 do PP) foi proferido o seguinte despacho pelo tribunal de 1.ª instância:
Cumpriria proferir, neste momento, despacho liminar.
Não obstante, a verdade é que nos termos do art. 697/1 do CPC, o recurso é interposto no tribunal que proferiu a decisão a rever.
Ora o entendimento jurisprudencial desta norma e, designadamente, do STJ, é no sentido de que o recurso de revisão deve ser decidido, na hipótese de, da decisão revidenda, ter sido interposto recurso, pelo tribunal que decidiu o recurso - neste sentido ver acs. do STJ de 19/10/2017, proferido no âmbito do processo 181/09.8TBAVV-A, de 18/12/2003 e de 19/09/2013, no primeiro mencionados.
O entendimento referido decorre do facto de aquele órgão jurisdicional entender que a decisão a rever é aquela que já não é passível de recurso ordinário ou de reclamação, independentemente de a decisão do tribunal superior ter sido de confirmação ou de revogação da decisão da instância imediatamente inferior por, em suma, a decisão transitada ser a do tribunal superior.
Esclarece-se que se sufraga o referido entendimento do STJ por, a não ser assim, a decisão do recurso de revisão poder implicar a revogação, por um tribunal hierarquicamente inferior, de uma decisão de um tribunal hierarquicamente superior.
Neste caso, o insolvente interpôs recurso da sentença que declarou a respectiva insolvência, julgado improcedente pelo TRL por ac. de 20/06/2013 (ver apenso C destes autos).
Do exposto decorre que a competência para proferir despacho liminar de admissão ou rejeição do recurso de revisão ora em causa e para o decidir, em caso de admissão, compete ao TRL.
O facto de o requerimento de interposição de recurso ter sido dirigido ao J2 da Instância Local Cível da Comarca de Lisboa não interfere com a competência para a decisão do recurso, sendo mera irregularidade que não interfere com o facto de o tribunal competente para a decisão do recurso ser o TRL.
Consequentemente, ordeno que este apenso seja remetido ao TRL, por ser esse o tribunal competente para decidir o recurso de revisão, admitindo-o ou rejeitando-o liminarmente, decidindo-o, no primeiro caso, atento, designadamente, o teor dos arts. 67, 68 e 697/1 do CPC.
XIII. A 06/02/2018, na conclusão dessa data com o seguinte teor:
Com a informação de que me surgem dúvidas de qual mandatário do requerido será notificado da decisão anterior, atento o despacho de fl.32 e a procuração outorgada pelo requerido no apenso W em 16/05/2017 a fl.11.
é proferido o seguinte despacho:
Apesar de requerente da insolvência, em sede do apenso W, alegar não ter conferido procuração/mandato ao advogado signatário do requerimento de insolvência com vista a qualquer cobrança de crédito do aqui insolvente, certo é que a procuração de fl. 11 do mencionado apenso W constitui, pelo menos, a revogação tácita, pelo requerente da insolvência, do alegado mandato – ver art. 1171 do CC.
Consequentemente e tendo presente que o autor desse apenso W (advogado Dr. A) tomou conhecimento da constituição, pelo requerente da insolvência, do advogado de fl. 11 do mesmo apenso com a notificação da oposição do requerido nesses autos (e requerente da insolvência do processo principal), julgo cessado, por revogação tácita, o alegado (e ora impugnado) mandato de B a favor do Dr. A, assumindo a qualidade de mandatário de B o advogado de fl. 11 do apenso W que, doravante, será notificado nessa qualidade, como advogado do requerente da insolvência e requerido no Apenso W.
XIV. A 21/02/2018, JMG vem requerer a junção dum pedido de substituição do patrono, Dr. JO, e depois ainda há notícia de outros pedidos de apoio judiciário para propor acções que são mandados desentranhar por despacho de 01/03/2018.
XV. Com data de 26/02/2018, JMG veio requer a junção aos autos de dois pedidos de apoio judiciário que mereceu o seguinte despacho de 01/03/2018: requerimentos do recorrente/insolvente de 26/02/2018: JMG pode requerer os pedidos de apoio judiciário que entender com vista à propositura das acções que bem entender mas tais acções, a serem instauradas, não correrão por apenso a estes autos. Assim, os requerimentos em causa são absolutamente impertinentes à tramitação destes autos e, por isso, ordeno o seu desentranhamento dos autos e devolução ao apresentante, deixando cópia apensa por linha. Notifique.
XVI. A 12/03/2018, JMG veio requerer a junção de mais um pedido de apoio judiciário, que mereceu o seguinte despacho, de 22/03/2018:
O insolvente beneficia de apoio judiciário, ao mesmo concedido, inclusive na modalidade de nomeação de patrono e tal benefício estende-se a todos os apensos do processo – arts. 16, al. als. a a c e 18 da Lei 34/2004, de 29/07. Não pode, por isso, pretender, com êxito, paralisar ou suspender o andamento dos autos com sucessivos requerimentos de pedido de apoio judiciário (porque inexiste causa para suspensão de quaisquer prazos eventualmente em curso), de que já beneficia, tratando-se a insistência de tais pedidos e sua junção aos autos de incidente processual anómalo, ao mesmo imputável. Assim e sem mais, decide-se: (a) ordenar que se oficie à Segurança Social - de modo a evitar a prática, por essa entidade, de actos inúteis - informando que o requerente do apoio judiciário a que se refere o requerimento aí entrado em 09/03/2018 já goza, nos autos, do benefício do apoio judiciário, inclusive na modalidade de nomeação de patrono e, (b) ordenar o desentranhamento do requerimento do insolvente de fls. 195 e seguintes dos autos e sua restituição ao apresentante, deixando cópia apensa por linha, desde já o condenando na multa de 1 UC pelo incidente anómalo, multa que, se persistir no mesmo tipo de conduta processual, se renovará, com agravamento.
XVII. A 24/04/2018 (fl. 221 do PP) é proferido o seguinte despacho:
Extraia e junte a estes autos certidão das seguintes peças do processo principal e apenso C, para instrução do recurso e compreensão do mesmo pelo tribunal superior: (a) p. i. da insolvência e documentos à mesma anexos, oposição do insolvente e documentos com a mesma juntos, acta de julgamento e sentença declaratória da insolvência do recorrente (fls. 2 a 17, 29 a 77 e 175 a 201 dos autos principais), (b) fls. 2 a 11 e 55 a 58 do Apenso C.
XVIII. A 16/05/2018 é proferido o seguinte despacho:
“Encontrando-se junta, no apenso W, simples cópia da alegada decisão instrutória proferida em sede do proc. 1110/13.0TAPBL [de não pronúncia do arguido Dr. A, segundo consta da certidão junta ao PE com a referência 376617568 - TRL], extraia certidão dessa cópia de tal decisão (que se ignora se transitada em julgado) e junte-a a estes autos e subam os autos ao Tribunal da Relação de Lisboa.”
XIX. A 07/06/2018 este apenso T é remetido para este TRL.
XX. A 26/06/2018 é proferido um despacho, pelo Sr. Juiz Desembargador a quem o processo foi inicialmente distribuído, que diz que o processo devia ser conhecido pela conferência do desembargador que proferiu o acórdão que confirmou a sentença de insolvência, pelo que o mandou redistribuir ao actual.
XXI. Por despacho de 24/08/2018 foi dado seguimento ao recurso determinando-se a citação dos interessados (todos os potenciais prejudicados com a revisão da sentença de declaração de insolvência) para contestarem, querendo, a petição de revisão.
XXII. Por e-mail de 28/09/2018, JMG, através do seu advogado, juntou de novo a certidão da acusação proferida no processo 1110/13.13.0TAPBL para, segundo diz, prova de que ele não esteve presente na audiência de julgamento de 22/01/2013 e que esse facto acarretou a confissão dos factos alegados nesse processo em que foi declarado insolvente.
XXIII. Por e-mail de 02/10/2018, a fls. 497 a 502, a AT apresenta contestação, excepcionando a sua ilegitimidade passiva ou o seu irregular chamamento ao processo, porque é um serviço executivo da administração indirecta do Estado cuja representação no processo de insolvência compete ao MP, nem tem personalidade jurídica que lhe permita ser parte passiva num processo.
XXIV. Por requerimento de 08/10/2018, de fls. 506 a 589, JMG, através do seu advogado, vem juntar, pela 3ª vez, certidão daquela acusação.
XXV. A 02/04/2019, JMG vem dizer que no apenso V foi proferido em 8/05/2017 um despacho a suspender a liquidação do activo até à decisão de tal apenso [sic] e que no apenso T [ou seja, neste… - TRL] foi decidido, por despacho de 23/’2/2017, suspender a instância até que no inquérito ou no processo disciplinar sejam proferidas decisões finais no que ao seu arquivamento e ou dedução de acusação concerne. Pelo que, este TRL devia aguardar que fossem prestadas as informações solicitadas, as quais, até ao momento, não foram prestadas, por ainda não terem sido proferidas decisões nos respectivos processos, conforme informação da OA e do processo-crime. Da certidão do apenso V consta que o apenso que motivou a suspensão do apenso V foi este apenso T.
(A)
Está o processo suspenso?
A 02/02/2018, ponto XII do relatório que antecede, o Juízo Local Cível de Lisboa, onde JMG interpôs este recurso, disse que a competência, para o admitir ou não, era do TRL, o que tem implícito que se considerou incompetente para o efeito e, por outro lado, é a interpretação autêntica do despacho de 24/02/2017 (ponto IX), isto é, de que a suspensão que tinha sido decretada era apenas da questão de saber se o recurso devia ou não ser admitido liminarmente.
Quer isto dizer que o recurso de revisão não estava suspenso porque nem sequer ainda tinha sido admitido, ou seja, ainda não tinha sido proferido o despacho do art. 669/1 do CPC.
Aliás, o tribunal competente para o efeito era este TRL, como foi reconhecido sem recurso, pelo Juízo Local, e este TRL não suspendeu o processo, antes pelo contrário, admitiu o recurso dando-lhe seguimento.
Assim sendo, o processo não está suspenso e por isso não há fundamento para ficar a “aguardar informações.”
De qualquer modo, diga-se que já foi proferida decisão instrutória no processo a que o inquérito deu origem, como se vê do ponto XVIII do relatório, pelo que, um dos processos referidos já nem sequer estava pendente e, por outro lado, o resultado do processo disciplinar não tem interesse para estes autos, como se verá mais à frente. Por fim, o juízo de suspender um processo está sempre sujeito a posterior reponderação, ao abrigo do art. 272/1 do CPC, o que, no caso, face ao tempo já decorrido, sempre justificaria que, se o processo estivesse suspenso, tal situação fosse agora alterada.
(B)
Da citação da AT
A AT foi citada por ser um interveniente neste processo que podia ser prejudicada com a decisão de revisão da sentença de declaração de insolvência, já que tinha créditos identificados. Tal como teve que ser citada para o processo principal por força do art. 37/5 do CIRE. Se foi citada no âmbito do processo onde foi proferida a decisão a rever, entende-se que tem legitimidade passiva para o processo onde se pretende rever essa decisão. Isto sem prejuízo de a AT se poder ter limitado a nada dizer ou a tomar posição no processo através do MP se assim o entendesse.
(C)
Multas
Como a acusação apresentada pelo e-mail do ponto XXII já constava dos autos, em duplicado, terá de ser desentranhada e JMG condenado em multa (art. 443/1 do CPC e 27/4 do RCP).        
Como é a 3ª vez que JMG apresenta para junção aos autos a certidão referida no ponto XXIV, ela terá de ser desentranhada e JMG condenado em multa (art. 443/1 do CPC e 27/4 do RCP). 
(D)
Qual é a hipótese legal da revisão pedida e termos a seguir
Dispõe o art. 700 do CPC que, salvo nos casos das alíneas b, d e g do art. 696, o tribunal, logo em seguida à resposta do recorrido ou ao termo do prazo respectivo, conhece do fundamento da revisão, precedendo as diligências consideradas indispensáveis.
JMG começa por alegar o preenchimento da previsão das alíneas c, d e g do art. 696 do CPC, mas termina limitando-se à alínea c, o que se traduz no reconhecimento de que aquilo que invoca não tem nada a ver com as alíneas d e g do art. 696, o que é evidente, já que a alínea d se refere “a confissão, desistência ou transacção em que a decisão se fundou” e nada do que é alegado põe em causa a confissão dos factos por falta do devedor/insolvente tal como previsto no art. 35/2 do CIRE (sendo que essa falta só se deve ao próprio JMG, o que não é posto em causa pelo alegado, nem, minimamente, pelo documento junto), e a alínea g refere-se a “litígio assente sobre ato simulado das partes”, ou que pressupõe um acordo/conluio (art. 612 do CPC) entre as partes, ou seja, pelo menos entre o devedor/insolvente e o requerente da insolvência, o que não é o caso dos autos nos termos como ele foi configurado por JMG.
Não é também caso da al. b do art. 696 (que aliás nem sequer foi invocada por JMG), nem que mais não fosse porque JMG já alegava a inexistência da cessão de crédito e da falsidade do documento e isto só não chegou a ser discutido devido a JMG ter confessado a situação de insolvência, pelo que a questão não pode ser retomada agora no recurso de revisão. Ou seja, houve possibilidade de discussão, daquelas questões, o que só não ocorreu devido a facto imputável a JMG. Isto também decorre do facto de se considerar que a falsidade, para servir de fundamento à revisão, tinha que ser desconhecida da parte (Alberto dos Reis, CPC anotado, vol. VI, Coimbra, 1981, pág. 346 e na pág. 347 em que refere 4 hipóteses típicas em que a falsidade chegou a ser arguida mas não chegou a ser conhecida e em que apesar disso a revisão não deve ser admitida); ora, JMG já alegava que o documento era falso. Para além disso, e também por isso, não haveria nexo de causalidade entre os factos alegados e a decisão de mérito a rever que tem a ver com a situação de insolvência confessada.
Resta a previsão da al. c do art. 696 do CPC. Assim sendo, como não se está nalgum dos casos das alíneas b, d e g do art. 696, este TRL deve, desde já, conhecer do fundamento da revisão, precedendo as diligências consideradas indispensáveis.
(E)
A que é que o documento superveniente se refere no caso em concreto
A alínea c do art. 696 dispõe para o caso em que se “apresente documento de que a parte não tivesse conhecimento, ou de que não tivesse podido fazer uso, no processo em que foi proferida a decisão a rever e que, por si só, seja suficiente para modificar a decisão em sentido mais favorável à parte vencida.”
JMG não faz nenhuma construção jurídica para demonstrar que é este o caso dos autos, limitando-se a repetir os termos da hipótese normativa.
De tudo o que existe nos autos, pode-se dizer o seguinte para preenchimento da previsão da alínea em causa:
JMG tinha uma dívida para com M. B veio requerer a insolvência de JMG baseando a sua legitimidade para o efeito no facto de lhe ter sido cedido o crédito de M contra JMG. Essa cedência era falsa, tendo sido C (de acordo com o arguido advogado Dr. A) a assinar em vez quer do cedente quer do cessionário. E o próprio crédito seria uma simulação, embora acordada entre ele próprio, JMG, e M, para prejudicar o Estado. A procuração passada a favor do Dr. A também seria falsa.
Ora, assim sendo, a insolvência teria sido requerida por quem não teria legitimidade, quer material, quer processual, para o efeito.
Ora, se a insolvência não tivesse sido requerida por quem não tinha legitimidade para o fazer, a insolvência não podia ter sido declarada.
Por isso, poderia ser-se tentado a dizer que foi apresentado documento de que JMG não tinha conhecimento e que, se tivesse sido usado, poderia ter evitado a declaração de insolvência, sendo que a improcedência do pedido de declaração de insolvência é uma decisão notoriamente mais favorável a JMG do que aquela que foi proferida.
(F)
O documento em causa não preenche a previsão do art. 696/-c do CPC
Contra isto, pode-se desde logo responder que a norma do art. 696/-c do CPC refere-se a um documento que tenha a ver com o conteúdo da decisão proferida (ou seja, no caso, tenha a ver com os fundamentos substantivos da declaração de insolvência), não com um pressuposto processual do início do processo onde a decisão foi proferida.
Isso também resulta do art. 701/1-b do CPC, pois que a norma respectiva pressupõe que, sendo o recurso procedente, seja proferida nova decisão, o que implica que esta possa ser proferida, o que não aconteceria se estivesse em causa a possibilidade da verificação da falta de um pressuposto processual que implicasse a absolvição da instância.
Também nesse sentido, aponta a consideração, aceite por todos, de que o documento tem de fazer prova de um facto inconciliável com a decisão a rever (ac. do STJ de 22/05/1979, BMJ. 287, pág. 244, citado por Lebre de Freitas, CPC anotado, vol. 3, tomo 1, 2.ª edição, Coimbra Editora, 2008, pág. 226) e um facto relativo a um pressuposto processual não é inconciliável com a situação de insolvência declarada na sentença.
Neste mesmo sentido, aponta a ideia de que “não se destinando o recurso de revisão à alegação de matéria nova, resulta igualmente da conjugação dos citados requisitos que o documento que releva – caracterizado pela novidade e pela especial força probatória – é apenas o que vise demonstrar factos que tenham sido alegados e discutidos na acção na qual foi proferida a decisão transitada em julgado.” (ac. do STJ de 19/01/2017, proc. 39/16.4YFLSB).
Neste sentido, diz o ac. do STJ de 24/05/2018, proc. 412/12.7TBBRG-G.S1, que: IV – Quando o fundamento da revisão é constituído pela apresentação de documento novo – alínea c do art. 696 -, este tem de respeitar a factos em que a decisão de mérito se tenha fundado e relativamente aos quais o documento, por si só, seja bastante para modificar a decisão em sentido mais favorável ao recorrente, assim viabilizando a superação do erro cometido na decisão revidenda.”
Por outro lado, a decisão de insolvência baseou-se numa situação de facto confessada por JMG, confissão que resultou de um comportamento processual de não comparência de JMG à audiência de discussão e julgamento no processo de insolvência, depois de ter deduzido oposição ao requerimento de insolvência, conjugado com uma norma legal que prevê para este caso a consequência da confissão dos factos (art. 35/2 do CIRE), situação de insolvência que não é posta em causa pelo documento em causa (como se dirá mais abaixo).
Mais ainda, a declaração de insolvência é proferida num processo de natureza com traços inquisitórios (art. 11 do CIRE: Princípio do inquisitório: No processo de insolvência, embargos e incidente de qualificação de insolvência, a decisão do juiz pode ser fundada em factos que não tenham sido alegados pelas partes), em que, independentemente do que for alegado e por quem o for, o tribunal poderia averiguar, oficiosamente, da situação de insolvência (CIRE anotado por Carvalho Fernandes e João Labareda, 3.ª edição, Quid Juris, 2015, págs. 118/119). Ou seja, o requerimento de insolvência é pressuposto do desencadear do processo da insolvência, mas não da decisão da declaração de insolvência, pois que, sublinha-se, ela pode ser declarada fundada em factos que não tenham sido alegados. Pelo que, a falta de legitimidade do requerente da insolvência, não evitaria a declaração de insolvência. Esta, se a respectiva situação de facto existisse, não deixaria de ser proferida apenas porque aquele requerente não tinha legitimidade para a ter requerido. Ora, quanto à situação de facto que levou à declaração de insolvência, repete-se, o documento apresentado por JMG não a põe em causa.
Note-se também que se o requerente da insolvência não comparecer na audiência de discussão e julgamento, tal vale como desistência do pedido, excepto se o devedor também comparecer, pois que nesses factos se têm por confessados os factos e a não comparência do requerente não vale como desistência do pedido (art. 35/2 e 3 do CIRE e autores e obra acabada de citar, em anotação a este artigo 35). Ou seja, mesmo numa situação que, por regra geral, tem como efeito de desistência do pedido – e em que, portanto, supervenientemente teria desaparecido o pedido de insolvência, decorrente da “retirada” do requerente por força da falta de comparência –, tal não retira a base da declaração da insolvência desde que se esteja provada a mesma. Pelo que o mesmo deve ocorrer quando se constate que o requerente da insolvência não tinha legitimidade, desde que a situação de insolvência esteja verificada.
Tudo isto seria suficiente para conduzir à improcedência da pretensão do requerente.
(G)
Para além disso o documento não provaria, só por si,
a inexistência da cessão do crédito
Seja como for, a verdade é que o doc.1 apresentado pelo requerente de modo algum prova, só por si (como é exigido pela norma em causa), isto é, sem recurso a outros elementos de prova, que a cedência do crédito não existisse ou estivesse corporizada em documento falso (e muito menos que o próprio crédito cedido não existisse; quanto à falsidade da procuração do advogado do requerente da insolvência, também é evidente que, por um lado, ela não resulta provada pelo doc.1 e, por outro, quem assinou a petição inicial de insolvência foi outra advogada e não o advogado indicado por JMG).
Como se diz no ac. do STJ de 02/06/2016,  proc. 13262/14.7T8LSB-A.L1.S1: O fundamento previsto no art. 696/-c do CPC refere-se a um documento escrito dotado de força probatória plena, que seja suficiente para, por si só (alheando-se assim da margem de apreciação do julgador – trata-se de um julgamento produzido pela lei, embora com reflexo na matéria de facto), destruir a prova em que se fundou a decisão.” (citado pelo ac. do TRP de 11/04/2018, proc. 402/12.0TTVNG-C.P2; no mesmo sentido, ainda, apenas por exemplo, o já citado ac. do STJ de 19/01/2017, proc. 39/16.4YFLSB; significativo também é o ac. do STJ de 11/09/2007, proc. 07A1332: IV - Não preenche o fundamento do recurso de revisão do art. 771/-c do CPC [na redacção anterior, equivalente ao art. 696/1-c na redacção actual - TRL], a apresentação de documentos com relevância para a causa mas que, apenas em conjugação com outros elementos de prova produzidos, ou a produzir em juízo, poderiam modificar a decisão transitada em julgado).
A denúncia é um elemento indiciário da inexistência da cedência de crédito e da falsidade do documento que a corporiza, mas não é prova suficiente disso. Mesmo a acusação contra os arguidos seria também apenas um elemento indiciário a apontar nesse sentido. E entretanto o arguido Dr. A foi despronunciado.
E note-se que o doc.1 só dizia respeito a isso, já que, obviamente, o doc.1 (denúncia de C à PGR) não prova minimamente, nem sequer indicia, que JMG não se encontrasse, à data, impossibilitado de cumprir as suas obrigações vencidas, nem que ele tivesse bens com que pudesse pagar as dívidas que tinha, nem que não tivesse as várias dívidas que foram reconhecidas. Aquilo que JMG diz a este respeito, na petição de recurso de revisão, não tem qualquer correspondência com o doc.1, esquecendo JMG que o recurso de revisão é uma possibilidade excepcional relacionada, no caso, com aquilo que o documento comprovaria e não com aquilo que ele se limita a alegar sem qualquer suporte no documento.
(H)
Deverá o processo ser suspenso?
Deveria este tribunal aguardar o eventual resultado final, com trânsito em julgado, da acusação do processo 1110/13? Não, porque aquele resultado final apenas poderia vir a levar a concluir que o requerente da insolvência não tinha legitimidade para o efeito. E já se disse acima que, mesmo que assim fosse, a declaração de insolvência não deveria cair. Assim sendo, não é de esperar por esse resultado, isto é, o processo em causa não é prejudicial deste.
De resto, o processo penal depois da acusação ou da instrução é público e JMG nunca se preocupou em vir dar notícia aos autos do estado do mesmo, apesar de não poder deixar de saber – nem que seja porque já interveio no processo por variadíssimas vezes depois disso – que existe nos autos notícia da despronúncia do arguido A.
E deveria este TRL esperar pelo resultado do processo disciplinar contra o advogado Dr. A? Também não, porque apenas poderia conduzir, quando muito, ao mesmo resultado referido acima (a insolvência ter sido requerida por quem não tinha legitimidade para o efeito, representado por um advogado que não tinha poderes para representar o requerente), sendo certo, no entanto, que nem sequer se prova que a insolvência tenha sido requerida em requerimento subscrito pelo advogado em causa.
Em suma, a suspensão da instância apenas é possível quando o autor do recurso de revisão o intenta com base em alguma das hipóteses das alíneas a, f e g do art. 696 do CPC e esteja já pendente uma acção prevista ou pressuposta nessas alíneas e o autor requeira a suspensão com base nos pressupostos do art. 697/5 do CPC, o que não é o caso dos autos. Pelo que nunca haveria de os suspender com o fim pretendido por JMG.
*
Pelo exposto, julga-se improcedente o recurso de revisão.
Sem custas, porque JMG beneficia de apoio judiciário na modalidade da sua dispensa.
Porque a certidão do acórdão deste TRL que se encontra a seguir ao despacho referido no ponto XVIII está incompleta, junte ao processo electrónico deste apenso T certidão electrónica completa do acórdão de 20/06/2013 (proferido no apenso C do processo principal e ainda acessível electronicamente neste TRL)
JMG vai condenado nas multas de 1,5UC + 2UC pela apresentação das certidões referidas nos pontos XXII e XXIV e parte C deste acórdão, devendo as mesmas ser desentranhadas e devolvidas a JMG.

Lisboa, 23/05/2019
Pedro Martins
Laurinda Gemas
Gabriela Cunha Rodrigues