Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
315/18.1T8OER-A.L1-6
Relator: MARIA DE DEUS CORREIA
Descritores: PROVIDÊNCIA CAUTELAR NÃO ESPECIFICADA
INDEFERIMENTO LIMINAR
ARRESTO
ERRO NA FORMA DO PROCESSO
CORRECÇÃO OFICIOSA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 01/10/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Sumário: O preceito legal constante do art.º 376.º n.º3 do CPC impõe ao Juiz o poder/dever de convolar a providência concretamente requerida para a que considere legalmente adequada ou mais eficaz à prevenção do dano receado, cumprindo-lhe, assim, corrigir, mesmo oficiosamente, o erro na forma do processo, consistente em se requerer procedimento cautelar comum quando a situação é subsumível aos pressupostos de determinado procedimento nominado, ou vice-versa.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na 6.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa.

      
IRELATÓRIO:


A instaurou, por apenso à acção executiva para pagamento de quantia certa que move contra B e C , o presente procedimento cautelar não especificado, requerendo que, sem audiência dos requeridos, se ordene:
A notificação do Banco …., SA, para, «imediatamente a seguir a ser levantada a penhora dos saldos bancários ou de qualquer outra aplicação financeira, das contas bancárias que se encontram penhorados à ordem do processo que corre termos no Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, Juízo do trabalho de Lisboa, Juiz 5, processo com o nº 84/14.4TTLSB.1, em que um dos executados é B, NIF 1... ... ...0, sejam os montantes aí depositados, penhorados à ordem do processo Nº 315/18.1T8OER em que um dos Executados é também B, NIF 1... ... ...0»;
A notificação do Banco BPI, S.A., para, «imediatamente a seguir a ser levantada a penhora dos saldos bancários ou de qualquer outra aplicação financeira, das contas bancárias que se encontram penhorados à ordem do processo que corre termos no Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, Juízo do Trabalho de Lisboa, Juiz 5, processo com o nº 84/14.4TTLSB.1, em que um dos Executados é B, NIF 1... ... ...0, sejam os montantes aí depositados, penhorados à ordem do processo executivo Nº 315/18.1T8OER, em que um dos Executados é também B, NIF 1... ... ...0»;
A notificação do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, Juízo do Trabalho de Lisboa, Juiz 5, processo com o nº 84/14.4TTLSB.1, para, «após a extinção da execução, que corre termos nos próprios autos, os valores que se encontram penhorados e cativos à ordem dos mesmos, não sejam devolvidos aos Executados, até decisão final a proferir no processo que corre termos no Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste, Juízo de Execução de Oeiras»; ou, em alternativa,
A notificação do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, Juízo do Trabalho de Lisboa, Juiz 5, processo com o nº 84/14.4TTLSB.1, para, «após a extinção da execução, que corre termos nos próprios autos, os valores que se encontram penhorados e cativos à ordem dos mesmos, sejam remetidos e que fiquem à ordem do processo que corre termos no Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste, Juízo de Execução de Oeiras – Juiz 2, em que um dos Executados é também B, NIF 1... ... ...0».

Alegou, em síntese, que no âmbito do processo com o nº 84/14.4TTLSB, do Juízo do Trabalho de Lisboa, Juiz 5, foram os ora requeridos absolvidos da instância executiva, sendo certo que essa execução intentada pelo requerente tinha em vista a cobrança de valor que lhe é devido a título de acordo celebrado com os requeridos por salários em atraso e cessação do contrato de trabalho, tendo a execução sido extinta quanto à entidade patronal, entretanto declarada insolvente, de que são fiadores os requeridos.

Mais alega que, na acção principal de execução (315/18.1T8OER), tendo sido indeferido o requerimento executivo, interpôs recurso, e a Relação de Lisboa, por decisão sumária, ordenou o prosseguimento dos autos.

Alega ainda que no âmbito da execução nº 84/14.4TTLSB se encontram penhoradas quantias dos requeridos suficientes para o pagamento da quantia exequenda, existindo o sério risco de, sendo levantadas tais penhoras, o seu crédito não poder ser satisfeito, dado que, até à data, não lograram os requeridos satisfazer o respectivo pagamento, apesar de nunca terem colocado em causa que o mesmo é devido. Mais invoca a existência de prejuízo sério no levantamento das penhoras realizadas no âmbito da execução laboral, uma vez que, quando tal levantamento ocorrer, os requeridos não irão depositar de novo qualquer quantia em instituição bancária.

Perante tal requerimento inicial, o Tribunal a quo proferiu decisão na qual indeferiu liminarmente o procedimento cautelar.

Inconformado com tal decisão, A interpôs o presente recurso de apelação, formulando, no essencial, as seguintes conclusões:
A presente providência visa impedir os efeitos drásticos para o Requerente da devolução dos montantes que se encontram à ordem dos autos do processo de trabalho de Lisboa, aos Requeridos.

O Requerente foi trabalhador da sociedade Projectório, sociedade que tinha como sócios gerentes os agora requeridos, Executados nos autos principais.

O Requerente, trabalhador, saiu da empresa por falta de pagamento de salários e, para pagamento dos mesmos, celebrou acordo no âmbito do processo que correu termos no tribunal de trabalho de Lisboa, Processo 84/14.4TTLSB, Juiz 5.

Os Requeridos prestaram fiança para cumprimento do referido acordo.

Acordo que não foi cumprido, nem pela sociedade, que foi declarada insolvente, nem pelos fiadores, ora Requeridos.

Estando em dívida, na presente data, o montante de € 30.695,80.

Por falta de cumprimento do acordo celebrado, o ora Requerente intentou execução que correu termos nos próprios autos do processo de trabalho, no Tribunal de Trabalho de Lisboa, contra a sociedade e os fiadores do referido acordo.

Nesta execução foram penhorados saldos bancários, único bem que foi possível identificar.

Foram deduzidos embargos de Executado que foram julgados procedentes ( por coligação ilegal de títulos).

Após a decisão proferida nos referidos embargos, de imediato o requerente / Exequente vem instaurar nova execução no Tribunal de Execução de Oeiras a do presente processo principal.

No âmbito dessa/desta Execução, a Meritíssima Juíza proferiu decisão, não entendendo a fiança prestada pelos Executados, ora Requeridos, como título executivo válido, por não autenticado.

O Requerente, Exequente, inconformado, interpôs recurso para o Venerando Tribunal da Relação de Lisboa, Tribunal que por decisão singular manda prosseguir a execução, mas tendo os Executados requerido que sobre a matéria recaia acórdão.

Estando o processo laboral de Lisboa e a referida execução finda, os valores depositados à ordem do mesmo serão entregues aos executados.

O que, a suceder, causará um prejuízo e dano irreparável, ao Requerente.

Os Requeridos/Executados não pagaram ainda a dívida ao Requerente, porque não quiseram, porque efectivamente não têm intenção de o fazer, ficando esta intenção patente em todas as manobras dilatórias com vista à entrega imediata dos montantes aos Requeridos.

Nunca se preocuparam a pagar a dívida com os montantes que se encontram penhorados.

Entende o ora Recorrente que a lesão que se pretende evitar com a entrega dos montantes depositados aos Requeridos, é grave, previsível e que justifica o decretamento da presente providência.

Após a análise crítica das peças processuais, da prova carreada para os autos, assim como dos documentos juntos aos autos de execução, do qual a presente providência corre por apenso, o procedimento não podia ser indeferido.

Encontra-se devidamente provada e alegada a urgência da situação e o perigo e a iminência de lesão grave para o requerido.

O Requerente quando intentou a execução, processo principal do presente apenso e pediu a não citação prévia dos Executados, visava precisamente solicitar de imediato a penhora dos saldos bancários e valores que se encontravam cativos e à ordem do processo de trabalho.

Mas as delongas do referido processo, não permitiram em tempo que isso fosse possível.

Não pretende o requerente impedir a produção dos efeitos de uma decisão judicial, pretende sim acautelar a eficácia da decisão a proferir na presente execução, o que é bem diferente.

O requerente efectivamente não se opõe ao levantamento da penhora que se encontra decretada nos autos de processo de trabalho, o que pretende é que seja decretada de imediato uma penhora ao abrigo do presente processo.

Há de facto e objectivamente o justo receio de lesão grave e dificilmente reparável e este justo receio fica claro e é evidente em toda a fundamentação da presente providência cautelar.

Assim como bem ressalta dos factos alegados, é indispensável e inequívoca, a urgência da situação, situação que, a concretizar-se, é objectivamente lesiva dos interesses do Requerente.

Encontra-se devidamente alegado e devidamente provado, com os inúmeros documentos que foram juntos à providência e os juntos posteriormente a requerimento do tribunal que existe objectivamente “…um fundado receio de lesão grave e dificilmente reparável, do direito do Requerente…”.

Assim, encontram-se reunidos os pressupostos exigidos por lei, para que seja decretado o presente procedimento cautelar não especificado.

Após a apreciação de toda a prova e com a fundamentação do presente recurso, deve a providência cautelar ser decretada.

A decisão de que se recorre ao decidir como decidiu, violou, por erro de interpretação e de apreciação da prova produzida, o disposto nos artigos 2079.º e 2088.º do Código Civil e artigos 362.º do CPC.

Termos em que se requer seja revogada a sentença recorrida e substituída por outra que decrete a providência cautelar
requerida.

Não foram apresentadas contra alegações.

Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir:

IIOS FACTOS.

Os elementos com relevo para a decisão são os que constam do Relatório supra, destacando-se ainda o teor da decisão recorrida, para melhor esclarecimento:
Importa proferir decisão liminar.
Conforme decorre do artigo 362º, nº 1, do Código de Processo Civil, sempre que alguém mostre fundado receio de que outrem cause lesão grave e dificilmente reparável ao seu direito, pode requerer a providência conservatória ou antecipatória concretamente adequada a assegurar a efectividade do direito ameaçado.

Constituem, assim, requisitos cumulativos de procedência do expediente processual em apreço (providência cautelar não especificada):
- A probabilidade séria da existência do direito invocado, traduzida na acção proposta ou a propor, que tenha por fundamento o direito a tutelar;
- O justo receio de que outrem cause lesão grave, e dificilmente reparável, a esse direito; e
- A não existência de providência específica tendente a acautelar o direito carecido de tutela (nº 3 do art. 362º).

Da factualidade alegada pelo Requerente, perfunctoriamente demonstrada pelos documentos juntos à petição inicial, resulta plausível a invocação da titularidade, por parte do mesmo, de um direito de crédito sobre os requeridos, traduzido no documento apresentado, nos autos de execução, como título executivo, com base no qual, por decisão singular, a Relação de Lisboa mandou prosseguir a execução, não obstante um dos requeridos haja requerido a prolação de acórdão.

Porém, «não é toda e qualquer consequência que previsivelmente ocorra antes de uma decisão definitiva que justifica o decretamento de uma medida provisória com reflexos imediatos na esfera jurídica da contraparte.

Só lesões graves e dificilmente reparáveis têm a virtualidade de permitir ao tribunal, mediante iniciativa do interessado, a tomada de uma decisão que o coloque a coberto da previsível lesão» - António Abrantes Geraldes, in “Temas da Reforma do Processo Civil”, III vol., Coimbra, Almedina, 2004, p. 99.

Com efeito, «A gravidade da lesão previsível deve ser aferida tendo em conta a repercussão que determinará na esfera jurídica do interessado». «Porém, especialmente quanto aos prejuízos materiais, o critério deve ser bem mais rigoroso do que o utilizado quanto à aferição dos danos de natureza física ou moral, uma vez que, em regra, aqueles são passíveis de ressarcimento através de um processo de reconstituição natural ou de indemnização substitutiva» - A. Abrantes Geraldes, op. Cit. pp. 100 e 101.

Ora, em vista da índole creditícia do direito de que o requerente, aparentemente, é titular perante os requeridos, o receio da sua lesão irreversível só poderia resultar, com razoabilidade, de eventual situação de precariedade patrimonial dos requeridos e de actos que, com carácter intencional, os mesmos hajam praticado com a finalidade de obstar à cobrança do crédito em causa.

Porém, o risco de lesão do direito do requerente não pode decorrer, como é evidente, do cumprimento de uma decisão judicial, como parece resultar da factualidade por si alegada. Na verdade, ao colocar a tónica na absolvição da instância decretada, quanto a um dos requeridos, nos embargos à execução a que respeita o processo 84/14.4 TTLSB, do Juízo do Trabalho de Lisboa, Juiz 5, pretende na verdade o requerente obstar à produção de efeitos dessa decisão, fazendo crer que, na prática, a mesma será similar a actos de dissipação patrimonial empreendidos pelos requeridos, com intenção de lhe causar prejuízo.

Ora, para além de não ser possível ao requerido subverter uma decisão judicial com a qual, aliás não concordou (já que da mesma interpôs recurso, não admitido por extemporâneo, conforme decorre dos documentos juntos), há que reconhecer que nenhum facto passível de ser submetido à previsão legal – o justo receio de que outrem cause lesão grave e dificilmente reparável, a esse direito – invocou. Na verdade, a alegação de que previsivelmente, com o levantamento das penhoras, os requeridos não voltarão a fazer depósitos bancários, constituem meras conjecturas, para além de que, ao contrário do que se lhe impunha, não ofereceu quaisquer meios de prova passíveis de completar as alegações genéricas e conclusivas que a tal respeito expendeu.

Inexiste, pois alegado ou comprovado, um dos requisitos cumulativos de que depende o decretamento das providências cautelares não especificadas – a existência de um fundado receio de lesão grave e de difícil reparação do direito do requerente -, pelo que se impõe, in casu, o indeferimento liminar do presente procedimento cautelar.

Decisão:
Nesta conformidade, indefiro liminarmente o presente procedimento cautelar.”

IIIO DIREITO.

Tendo em conta as conclusões de recurso que delimitam o respectivo âmbito de cognição deste Tribunal, a única questão a apreciar consiste em saber se existe fundamento legal para o indeferimento liminar do procedimento cautelar instaurado pelo Requerente.

De acordo com o alegado e comprovado pelos documentos juntos pelo Requerente, este é titular de um crédito relativamente aos Requeridos, relativo a salários devidos pelo trabalho prestado pelo ora Apelante, por conta da Projectório, Arquitectos  Consultores, Lda.. No âmbito de um processo instaurado pelo Requerente, no Tribunal de Trabalho de Lisboa, foi celebrado um acordo, homologado por sentença transitada em julgado, mediante o qual o requerente reduziu o pedido para € 30.000,00 que aceitou receber em prestações .

Para garantir o cumprimento do referido acordo, os ora Requeridos B e C constituíram-se fiadores e principais pagadores do montante acordado, renunciando ao benefício da excussão prévia. Contudo, nem a sociedade nem os Requeridos cumpriram o acordo que tinham celebrado com o trabalhador, ora Requerente.

Conforme alega, o Requerente aguardou o pagamento, pois os sócios gerentes, ora Requeridos sempre prometeram que iriam pagar apenas precisavam de mais tempo. Contudo, o tempo que precisaram foi para “esvaziar” a sociedade de todos os bens que possuía, tendo esta vindo a ser declarada insolvente, por sentença de 13 de Março de 2017.

Do montante de € 30.000,00 que acordaram pagar, os Requeridos apenas pagaram ao Requerente, a quantia de € 3.150,00.

Os Requeridos, não pagam qualquer quantia ao Requerente, desde Fevereiro de 2015.

Ora, estabelece o art.º 362.º do Código de Processo Civil, referente ao âmbito das providências cautelares não especificadas, o seguinte:

Procedimento cautelar comum
Artigo 362.º

Âmbito das providências cautelares não especificadas
1- Sempre que alguém mostre fundado receio de que outrem cause lesão grave e dificilmente reparável ao seu direito, pode requerer a providência conservatória ou antecipatória concretamente adequada a assegurar a efetividade do direito ameaçado.
2- O interesse do requerente pode fundar-se num direito já existente ou em direito emergente de decisão a proferir em ação constitutiva, já proposta ou a propor.

3- Não são aplicáveis as providências referidas no n.º 1 quando se pretenda acautelar o risco de lesão especialmente prevenido por alguma das providências tipificadas no capítulo seguinte. (…)”



Destaca-se especialmente, para a análise que importa, o disposto no art.º 362.º n.º3 do supra citado preceito legal. Nos termos daquela norma, se existir providência especialmente adequada a acautelar o risco de lesão do direito do requerente, não deverá ser requerida uma providência cautelar não especificada.

Ora, no caso em apreço, a pretensão do requerente traduz-se num pedido de apreensão de depósitos bancários, com vista a que os mesmos possam vir a ser penhorados e satisfaçam o crédito do mesmo Requerente, ora Apelante. Existe no código de processo civil uma providência cautelar que é a adequada para dar resposta à pretensão do Requerente: é o arresto, tipificado no art.º 391.º do CPC.

Artigo 391.º
Fundamentos

1- O credor que tenha justificado receio de perder a garantia patrimonial do seu crédito pode requerer o arresto de bens do devedor.
2
- O arresto consiste numa apreensão judicial de bens, à qual são aplicáveis as disposições relativas à penhora, em tudo o que não contrariar o preceituado nesta secção.

São, pois, requisitos fundamentais desta providência cautelar:
(i) - A probabilidade séria da existência de um crédito;
(ii)- O justificado receio de perda da garantia patrimonial.

Os factos alegados pelo Apelante enquadram-se perfeitamente neste tipo de providência.

Quanto ao primeiro requisito, resulta da prova documental. O crédito está declarado por sentença judicial que homologou o acordo das partes.

Quanto ao justificado receio de perda de garantia patrimonial, o mesmo resulta patente, por um lado, da declaração de insolvência da sociedade que foi entidade patronal do requerente e, por outro, do facto de os fiadores, ora Requeridos, não obstante se terem comprometido a pagar a dívida, no âmbito de processo judicial, decorridos vários anos, não demonstraram qualquer intenção de cumprir, nem enquanto obrigação voluntariamente assumida, nem enquanto condenação por sentença de homologação judicial, transitada em julgado.

Ora, estando em causa bens especialmente voláteis – como é o caso de quantias monetárias – é previsível, tal como refere o Apelante que, uma vez que aos Requeridos sejam entregues as quantias que se encontram penhoradas, os mesmos as salvaguardem de uma também previsível penhora, atenta a pendência da execução contra eles. Ao contrário do que se refere na sentença recorrida, não se trata de “meras conjecturas”, mas sim de uma probabilidade forte, em face dos factos já ocorridos, analisados à luz dos dados da experiência comum.

Também nos parece, que a pretensão do Requerido em nada subverte a decisão judicial de levantar a penhora decretada noutro processo. Do que se trata é de acautelar a eficácia da decisão de decretar a penhora na execução, já proposta, a que se refere este procedimento cautelar.

Cremos, assim, que os factos alegados integram suficientemente os requisitos legais da providência cautelar do arresto.

É certo que o ora Apelante não requereu essa providência, mas uma providência cautelar não especificada, embora o pedido tenha o exacto conteúdo de um pedido de arresto. O vício que, no máximo, poderá considerar-se que o requerimento inicial enferma será de erro no meio processual utilizado.

Ora, nos termos do art.º 193.º do CPC:
O erro na forma do processo importa unicamente a anulação dos atos que não possam ser aproveitados, devendo praticar-se os que forem estritamente necessários para que o processo se aproxime, quanto possível, da forma estabelecida pela lei.”

No caso em apreço, basta que se ordene o prosseguimento dos actos relativos ao arresto, já que nenhum acto foi praticado que importe anular.

Por outro lado, conforme estipula o art.º 376.º n.º3 do CPC, “ o Tribunal não está adstrito à providência concretamente requerida (…)”.

Este preceito impõe ao Juiz «o poder-dever de convolar a providência concretamente requerida para a que considere legalmente adequada ou mais eficaz à prevenção do dano receado, cumprindo-lhe, pois, “corrigir, mesmo oficiosamente, o erro na forma do processo, consistente em se requerer procedimento cautelar comum quando a situação é subsumível aos pressupostos de determinado procedimento nominado, ou vice-versa, bem como em ter-se requerido um destes, quando seja legalmente aplicável outro à hipótese sub judicio” (Lopes do Rego, Comentários ao Código de Processo Civil, pág. 288).»[1]

Todavia, “tal correcção oficiosa só é possível desde que os autos comportem os elementos fundamentais da providência que se mostre adequada”.[2]

E, no caso em análise, já vimos que se mostram perfeitamente verificados os requisitos do arresto.

Cremos, assim, inteiramente procedentes as conclusões de recurso, não havendo motivo legal para o indeferimento liminar do procedimento cautelar.

IVDECISÃO.
Face ao exposto, acordamos neste Tribunal da Relação de Lisboa, em julgar procedente o recurso e, por consequência, revogar a decisão recorrida, devendo a mesma ser substituída por outra que determine o prosseguimento dos autos, nos termos do procedimento cautelar de arresto.
Custas pela parte vencida a final.



Lisboa, 10 de Janeiro de 2019



Maria de Deus Correia
Maria Teresa Pardal
Carlos Marinho
      


[1]Vide Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 21-06-2007, Processo 4648/2007-6, disponível em www.dgsi.pt
[2]Idem.