Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
52/19.0JDLSB-A.L1-9
Relator: MARGARIDA VIEIRA DE ALMEIDA
Descritores: PRISÃO PREVENTIVA
RECONHECIMENTO FOTOGRÁFICO
VALOR PROBATÓRIO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 07/16/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: PROCEDENTE
Sumário: 1. De um não facto não se pode extrair um facto.
 2. A inexistência de registos de presença inequívocos, sem mais prova, permite ter dúvidas quanto à atribuição da autoria dos factos à pessoa do arguido.
3. Pode ter havido falha informática (ultimamente, passaram a ter muito uso) mas essa afirmação não pode ter tal relevo que substitua a prova a efectuar, tanto mais que sendo essas falhas da responsabilidade do Clube, este tem um interesse directo em afastar uma eventual responsabilidade.
4. A validade da prova quanto à identificação do presumível autor dos crimes indiciados nos autos fica, pois, condicionada pela inexistência de actividade criminosa na sua obtenção.
5. O reconhecimento por fotografia só pode valer como meio de prova se tiver sido realizado no âmbito da investigação criminal, ou seja, pelas autoridades que deviam ter intervindo de imediato, e que deveriam ter sindicado a forma como as fotografias dos sócios foram exibidas aos ofendidos, quais as fotografias que foram exibidas, e demais procedimentos até final.
6.Analisada a forma como se chegou à identificação do suspeito, sem intervenção das autoridades policiais, de imediato, sem que essa obtenção tenha sido feita por particular (no sentido de pessoa que estava a ser vítima, ou testemunha da prática de um crime, dadas as circunstâncias que rodearam a prática dos factos, logo, com intuito de se defender, e obter prova do crime ou com o intuito de o denunciar e facilitar a prova da prática de um crime) permanecem dúvidas sobre a fiabilidade desse reconhecimento.
7. A investigação cabal não deve acolher, sem mais, e sem qualquer sentido crítico, o teor das diligências efectuadas no sentido de identificar o seu autor, como não deve dispensar a inquirição dos menores feita como deve ser, se necessário com declarações para memória futura, em condições que os resguardem da devassa, e protejam a sua personalidade adolescente.
8. Na dúvida sobre a autoria atribuída nos autos, não se pode concluir pela existência de fortes indícios e pela aplicação da medida de coacção de prisão preventiva.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Relatório:
1.B.M.C. G. veio interpor o presente recurso da decisão judicial que após a realização de primeiro interrogatório judicial entendeu ser de aplicar a medida de coacção de prisão preventiva por ter concluído pela existência de indícios fortes da prática de 1 crime de abuso sexual de criança na forma tentada, p.p. nos termos do artº 171º, nº 1, 22º, 23º e 73º do Código Penal, praticados  na pessoa do menor B. A. C., 2 crimes de abuso sexual de criança , p.p. nos termos do disposto no artº171º, nº 1 do Código Penal na pessoa do menor LBSNL, e de 3 crimes de abuso sexual de crianças, p.p. pelo artº171º, nº 1 do C.Penal, na pessoa do menor SMRSN.
O recurso tem por objecto a totalidade da matéria constante do despacho porquanto em seu entender não só os indícios recolhidos não são fortes, como não há um concreto perigo de continuação da actividade criminosa e de perigo de perturbação do inquérito para a recolha e conservação da prova.
Entende que não foram indicadas datas concretas dos alegados actos agora imputados aos arguidos, apesar de constarem datas concretas no auto de denúncia, quer nos relatos dos menores juntos àquele, quer nas inquirições dos mesmos menores, e que através dessa omissão das datas dos alegados factos foi reduzido o direito de defesa do arguido, pois nas datas constantes dos autos o agora arguido não podia ter praticado os mesmos.
 No caso de menor B, há, na verdade, várias datas concretamente apresentadas pelo menor no seu relato de fls. 21 e 22, desde logo, a de 14 de Dezembro de 2018, data em que o agora arguido tinha passado pela via verde de C… as 10.05.40 horas, e uma segunda vez as 21.35.56 horas, …”o que significa que o arguido não esteve no clube nesse dia, pois aquele não corresponde de forma alguma ao itinerário então utilizado pelo recorrente para se dirigir ao … da …, …”
O mesmo sucede com os dias 21 e 28 Dezembro 2018, pois… de acordo com a via verde o arguido passou pela portagem às 19.55.26 desse dia, o que o impediria de estar no Clube no momento em que o menor tomava duche no balneário, a seguir à aula de natação que terminava às 20.00 horas..”
…”No dia 28 de Dezembro 2018, o recorrente passou pela Portagem de … em dois momentos, o primeiro às 18.36.32 e no segundo momento às 20.12.27, o que também demonstra a ausência no balneário aquando do duche do menor, no final da aula, pois o trajecto entre a portagem de …. e o Clube …., e vice versa, demora, pelo menos, 15 minutos de carro…”
Nestes dias, o arguido e a mulher estiveram a dar apoio ao neto enquanto o filho levava a filha ao Ballet.
Nas datas de 19 de Dezembro de 2018 e 2 de Janeiro 2019, conforme registo de entrada de sócio, apenas constam os dias 3,7 e 11.
No que se refere ao menor LBL, a data referida é de 9 de Janeiro, dia em que o recorrente não esteve no Clube …., de acordo com os referidos registos.
O próprio diretor do Clube afirma ter tido conhecimento de que dois menores foram importunados por um sócio adulto com perguntas de âmbito pessoal, que foi à procura do utente, percorrendo as instalações do Clube, inclusive na zona dos balneários, não tendo sido possível localizá-lo.
Nos registos de entrada de sócio do ora recorrente, ……, constam os dias exactos em que o mesmo frequentou as instalações, pelo que não pode a alegação de uma eventual avaria de banda magnética permitir concluir pela sua entrada, e permanência, no Clube, em outros dias.
Aliás, o mesmo resulta do depoimento de fls 90 e 91, de …. , recepcionista, …” as entradas no Clube são feitas através da passagem de cartão num dispositivo, sendo que a entrada é activada, e gravada, no sistema informático. Neste mesmo sistema, existe uma ficha de cada utente com a identificação, morada e outros elementos associados…”
Acresce que não se pode invocar engano do menor na data pois de fls 23 a 25 o dia 9 de Janeiro foi o dia em que o menor L contou à sua Mãe, … e é o mesmo dia em que outra Mãe também contou à Mãe do menor L o que se passara com o filho daquela, tendo ainda referido que no dia a seguir, 10 de Janeiro 2019, falou com o director do Estabelecimento, não havendo possibilidade de engano sobre as datas.
O menor SN, no auto de reconhecimento não reconheceu o arguido como nenhuma das pessoas que estavam junto consigo para reconhecimento – fls 147, e reconheceu como autor doa actos que alega ter sofrido a pessoa identificada a fls. 33.
Acresce que os factos teriam sido praticados à chamada “hora de ponta” na frequência do balneário.
Por outro lado,
O “reconhecimento” que o menor S fez da alegada fotografia do arguido no …. não se pode considerar válido para criar a convicção de que o arguido é o autor dos factos, não foi feito perante órgão de polícia criminal e nem sabemos de que fotografia estamos a falar.
Nos dias apontados para os factos, o arguido e a mulher costumam recolher os menores seus netos na escola que frequentam ao pé do …. para os levar à natação, sita na piscina …., onde os mesmos têm aulas das 18.45 horas às 19.30 horas, deixando-os depois em casa dos pais. (terças e quintas feiras).

TERMINA o recorrente, concluindo que não só os indícios reunidos contra a sua pessoa para lhe atribuir a prática dos referidos ilícitos se não podem considerar fortes, como não estavam reunidos os pressupostos que permitissem concluir pela aplicação da medida de coacção de prisão preventiva ao recorrente, uma vez que não há perigo de continuação da actividade criminosa (está impedido de frequentar o referido clube), e muito menos existe perigo de perturbação do inquérito.
PEDE que a decisão recorrida seja revogada e substituída por outra que dê sem efeito a medida de coacção de prisão preventiva aplicada ao recorrente, e que a substitua por outra que respeite os princípios da necessidade, adequação e proporcionalidade, como sejam as de apresentação periódica, a proibição e imposição de condutas, ou, caso se entenda não serem estas suficientes, a obrigação de permanência na habitação.

2. Na sua resposta o MºPº transcreve as conclusões a que chegou o despacho agora posto em crise, analisando a prova existente e estribando-se nas declarações do recepcionista do clube …. e do referido Director, para acolher a forma como chegaram a identificar o suposto arguido.
Refere depois a hediondez dos crimes de cariz sexual, para concluir pela necessidade de manutenção da medida de coacção.
No que concerne à substituição da medida de coacção requerida, invoca a existência da cláusula “rebus sic stantibus” para concluir pela manutenção do decidido já que, em seu entender, não ocorreu uma atenuação das exigências cautelares que determinaram a aplicação de uma medida de coacção.
3. Nesta Relação, o MºPº apôs visto.
4. Cumpre apreciar, e decidir, após vistos legais e conferência:
Como resulta do que anteriormente ficou transcrito, as questões objecto do recurso são, conforme delimitadas pelas conclusões, as seguintes:
a) inexistência de fortes indícios de que foi o recorrente a praticar os factos;
b) invalidade do “reconhecimento” efectuado pelo Clube, por não ter sido efectuado perante autoridade judiciária e por não se saber qual a fotografia usada e em que moldes foi feito o dito ”reconhecimento”,
c) Desproporcionalidade e desnecessidade das medidas de coacção aplicadas, por não se verificarem os respectivos pressupostos, de existência de perigo de continuação da actividade criminosa e de perturbação do inquérito.

Vejamos, então:
a) no que concerne à existência de fortes indícios:
analisados os elementos reunidos nos autos, duas questões se evidenciam, desde logo.
Suscitada a questão de haver alguém dentro do Clube a molestar menores, nos balneários, a Direcção, ao invés de fazer intervir imediatamente as autoridades competentes, permitiu-se pedir relatórios aos Pais dos menores sobre o sucedido, permitiu-se ainda proceder à recolha de informação com aparente devassa da vida privada dos intervenientes em causa, e do sócio, cuja fotografia (se foi a dele, pois apenas temos a esse respeito a palavra dos interessados na gestão da crise com o menor dano possível para a imagem do Clube) terão exibido, usando para tal dados pessoais sem que estivessem devidamente autorizados.
Como refere Artur Pereira (As perícias da Polícia Judiciária, in nota 9 ao artº171º CPP Comentado STJ da autoria Conselheiro STJ Dr Santos Cabral, …” o exame da cena do crime representa muitas vezes um papel fundamental e decisivo no sucesso de uma investigação…”
No caso vertente, a Direcção do Clube … deveria ter feito intervir as autoridades competentes, até para investigar as suas suspeitas sobre a identidade do sócio, e afirmação, ou infirmação, dessas suspeitas, para mais tratando-se de crimes em que as vítimas são menores.
Tal intervenção teria permitido a obtenção de prova por reconhecimento realizada de acordo com as formalidades previstas no artº 147º do CPP, quer quando foi efectuado por fotografia, quer o que se lhe seguiu.
Como se pode ler na nota 3 ao artº 147º do CPP, a única consequência de o reconhecimento fotográfico não ter seguido o caminho processual em termos de aquisição como meio de prova é o de não ter valor probatório no processo.
Por outro lado, de acordo com os elementos existentes nestes autos de recurso em separado, assiste razão ao recorrente quando afirma que se não pode presumir que esteve nas instalações do Clube em dias em que não há registo desse presença, sem mais, pois de um não facto não se pode extrair um facto.
Não se pode concluir, como pretende o recorrente, sem mais, que o facto de o veículo de sua pertença ter passado na portagem de … às horas apontadas inviabiliza, sem mais, a possibilidade de estar presente no Clube às horas referidas, mas a inexistência de registos de presença inequívocos, sem mais prova, permite ter dúvidas quanto à atribuição da autoria dos factos à sua pessoa.
À mesma conclusão se chega no que concerne ao trajecto a efectuar para o clube…., desde a sua residência.
O trajecto pode até ser outro, eventualmente, com uso da portagem de …., mas a sua entrada e o registo da sua permanência no Clube é que permitem tirar dúvidas.
E essa prova, tanto quanto consta do auto de recurso em separado, não foi feita.
Claro que o Clube adianta que pode ter havido falha informática (ultimamente, passaram a ter muito uso) mas essa afirmação não pode ter tal relevo que substitua a prova a efectuar, tanto mais que sendo essas falhas da responsabilidade do Clube este tem um interesse directo em afastar uma eventual responsabilidade.

A segunda das questões que se evidencia é a forma como foi obtida a eventual identificação do eventual suspeito dos ilícitos: exibição de fotografia constante de ficheiros pessoais com violação das regras sobre tratamento de dados pessoais.
Para além do que se referiu já sobre a não intervenção atempada das autoridades competentes, os elementos de identificação de um sócio não podem ser usados pela direcção do Clube da forma como foram.
É certo que defendemos na esteira de Ac STJ de 2016, relatado pela Exma Conselheira Drª Maria dos Prazeres Beleza, que
…”As normas processuais sobre proibição de prova se dirigem às instâncias formais de controlo, designadamente investigadores, e autoridades judiciárias, mormente MºPº e JIC.
São normas que visam disciplinar a investigação e o procedimento penal, definindo os limites de interferência na vida privada com o objectivo de recolher provas que constituem orientações a observar no processo penal.
No tocante às provas obtidas por particulares e à tutela da vida privada, não existe regulamentação que decorra da norma processual penal, antes o legislador remete para a tipificação dos ilícitos penais previstos no Código Penal, na tutela do direito fundamental à privacidade, como decorre do artº 176º, nº 1 do CPenal.
A validade da prova ficará, nestes casos, dependente da sua não ilicitude face à legislação penal.

A validade da prova quanto à identificação do presumível autor dos crimes indiciados nos autos fica, pois, condicionada pela inexistência de actividade criminosa na sua obtenção.
A primeira conclusão a retirar é que a Direcção do Clube não é, face à natureza do ilícito aqui denunciado, um particular, pelo que inexistem causas de exclusão da culpa e de justificação do facto que possam tornar a sua conduta válida, e consequentemente, admissível, a prova assim recolhida.
A segunda conclusão a retirar é a de que analisada a forma como se chegou à identificação do suspeito, sem intervenção das autoridades policiais, de imediato, sem que essa obtenção tenha sido feita por particular (no sentido de pessoa que estava a ser vítima, ou testemunha da prática de um crime, dadas as circunstâncias que rodearam a prática dos factos, logo, com intuito de se defender, e obter prova do crime ou com o intuito de o denunciar e facilitar a prova da prática de um crime) permanecem dúvidas sobre a fiabilidade desse reconhecimento.
Não foi cumprido o disposto no artº147º do CPP no que à descrição da pessoa a identificar concerne.
E o reconhecimento por fotografia só pode valer como meio de prova se tiver sido realizado no âmbito da investigação criminal, ou seja, pelas autoridades que deviam ter intervindo de imediato, e que deveriam ter sindicado a forma como as fotografias dos sócios foram exibidas aos ofendidos, quais as fotografias que foram exibidas, e demais procedimentos até final.
A lei é bem clara.
Não tendo sido efectuado no âmbito de uma investigação criminal o reconhecimento que não obedecer ao disposto no artº 147º do CPP não tem valor como meio de prova, seja qual for a fase do processo em que ocorrer, conforme dispõe o artº 147º, nº 7 do CPP.
E nem se diga que foi posteriormente dado cumprimento ao disposto no nºs 2, 3 e 4 do mesmo artigo pois a diligência para reconhecimento assentou em diligências levadas a efeito pelo Clube sem que tivesse sido sindicado qual o meio utilizado, e quais as fotografias mostradas, exactamente porque o foram fora da investigação criminal que se lhe sucedeu.
Não é este o único vício de que enferma a “investigação” no presente inquérito, pelo menos, não é o único que é possível detectar nas peças processuais que compõem a certidão que instrói o recurso em separado.
Por todos, sobre o reconhecimento como prova, sua validade, sobretudo do reconhecimento fotográfico, ver nota 3 ao artº 147º do CPP, da autoria do Exmo Senhor Conselheiro Santos Cabral, in Código Processo Penal Comentado.
Assiste razão ao MºPº quando afirma que este tipo de ilícitos merece censura, e que os menores devem deles ser protegidos.
Mas isso não dispensa a investigação cabal de quanto se passou, dada a gravidade e a perversidade das condutas descritas pelos menores, que nos levam a concluir pela existência de um predador sexual.
A investigação cabal não deve acolher, sem mais, e sem qualquer sentido crítico, o teor das diligências efectuadas no sentido de identificar o seu autor, como não deve dispensar a inquirição dos menores feita como deve ser, se necessário com declarações para memória futura, em condições que os resguardem da devassa, e protejam a sua personalidade adolescente, ao invés de acolher como substituição as declarações feitas pelos respectivos progenitores.
Aqui chegados, analisados os elementos que compõem a certidão dos autos de recurso em separado, cumpre concluir que os menores ofendidos foram confrontados com situações graves que é necessário apurar, e cujo autor pode, ou não, ter sido já identificado.
E neste pode, ou não, reside a chave de tudo, pois …”uma das formas de afastarmos as dúvidas é evitar que elas entrem na nossa cabeça”
…”há um grande paralelismo entre as grandes indignações que varrem as redes sociais e transbordam para os órgãos de comunicação social… e o velho confiteor…”
Os Tribunais devem deixar essas grandes indignações para as redes sociais e para os órgãos de comunicação social,…” e devem assegurar a todos os intervenientes processuais um processo justo e equitativo, regido pela objectividade, e despido de preconceito.
Daí que se não entenda o teor da motivação da resposta ao recurso apresentada em sede de 1ª instância.
Concluindo:
Analisadas as versões dos menores, a forma como conversaram uns com os outros, não há que estranhar, são adolescentes, e fizeram aquilo que os adolescentes fazem.
Esses depoimentos deveriam ter sido recolhidos em tempo útil pela autoridade competente para o efeito.
Quando o foram, foi dispensada a inquirição dos menores, e foi junto um documento que já não é da sua autoria, mas que se traduz em depoimento indirecto, porque prestado por quem o escreveu.
Finalmente, dada a forma como foi efectuado o reconhecimento fotográfico prévio ao inquérito e investigação policial, não há como não deixar “entrar dúvidas, evitando que elas entrem na nossa cabeça”, tanto mais que o disposto no artº 147º, nº 7 do CPP é bem claro: o reconhecimento que não obedecer ao disposto neste artigo não tem valor como meio de prova, seja qual a fase do processo em que ocorrer.

Em caso de dúvida, funciona o princípio do “in dúbio pro reo” que manda repartir qualquer dúvida em benefício do arguido, em qualquer fase do processo.
Do conjunto dos elementos que foram facultados ao tribunal de recurso, neste recurso em separado, não é possível concluir, sem qualquer margem de dúvida, que foi identificado o autor, ou o único autor dos factos ilícitos de que os menores foram vítimas.

Procede, pois, o primeiro segmento de recurso interposto pelo recorrente, a saber, não existirem nos autos indícios fortes de que praticou os factos ilícitos.
Fica assim prejudicado o conhecimento dos restantes segmentos do mesmo recurso.
Em consequência, o despacho judicial recorrido deverá ser revogado, e substituído por outro que determine a imediata restituição do arguido à liberdade, mediante TIR.

Decisão:
Termos em que acordam, após vistos e conferência, em julgar procedente o recurso interposto por … e em revogar o despacho judicial que impôs ao recorrente a medida de coacção de prisão preventiva, determinando a imediata restituição do arguido à liberdade.
O arguido aguardará os ulteriores termos do processo mediante TIR.
Não é devida taxa de justiça.
Passem-se mandados para imediata restituição do arguido à liberdade.
Registe e notifique, nos termos legais.

Lisboa, 16 de Julho 2019 (em turno)

Margarida Vieira de Almeida (Relatora)
Antero Luís (Adjunto)