Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
1076/14.9PBCSC.L1-9
Relator: JOÃO ABRUNHOSA
Descritores: CRIME DE OFENSA À INTEGRIDADE FÍSICA SIMPLES
INDEMNIZAÇÃO POR DANOS NÃO PATRIMONIAIS
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 04/30/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: PARCIALMENTE PROVIDO
Sumário: É ajustada a indemnização por danos não patrimoniais no montante de €6.000,00, para o caso em que o Ofendido sofreu, no exercício das suas funções, empurrões, socos e pancadas desferidas com o saltos de sapatos, na cabeça e na face, que lhe provocaram três feridas incisas, pequena hemorragia incontrolável na região parietal esquerda e dores físicas, que determinaram a necessidade de receber assistência hospitalar e um período de doença de quinze dias, três dos quais com afectação da capacidade para o trabalho, bem como que se sentisse envergonhado, triste e humilhado na presença de outros colegas e demais clientes do estabelecimento, tendo os Arg. agido com dolo directo, e tendo estes uma condição económica muito superior à sua.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Nos presentes autos de recurso, acordam, em conferência, os Juízes da 9ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:

No Juízo Local Criminal de Cascais, por sentença de 07/06/2019, constante de fls. 199/218, foram os Arg.[1] WW e EE, com os restantes sinais dos autos (cf. TIR, respectivamente, de fls. 46/47 e 52), condenados nos seguintes termos:
“… Assim, pelo exposto, e tendo em conta as disposições legais consideradas, o Tribunal, decide julgar a acusação deduzida pelo Ministério Público procedente, por provada, e decide julgar parcialmente procedente, por parcialmente provado, o pedido de indemnização cível deduzido pelo demandante RR, e, consequentemente:
A) Condenar o arguido WW pela prática, em co­ autoria material, de um crime de ofensa à integridade física simples, previsto e punido pelo art.º 143.º, n.º 1 do Cód. Penal, na pena de 150 dias de multa, à taxa diária de €15,00, o que perfaz a multa de € 2.250,00 (dois mil duzentos e cinquenta euros);
B) Condenar a arguida EE pela prática, em co­ autoria material, de um crime de ofensa à integridade física simples, previsto e punido pelo artº 143.º, n.º 1 do Cód. Penal, na pena de 150 dias de multa, à taxa diária de € 5,00, o que perfaz a multa de € 750,00 (setecentos  e cinquenta euros);
C) Condenar solidariamente os arguidos/demandados WW e EE no pagamento ao demandante RR da quantia de €1250,00 (mil duzentos e cinquenta euros) a título de indemnização por danos não patrimoniais.
Mais se condenam os arguidos WW e EE nas custas do processo, fixando a taxa de justiça individual em 2 U.C.·s.
Custas cíveis a cargo do demandante RR e dos demandados WW e EE, na proporção do respectivo decaimento - art. 527.º, n.ºs 1 e 2 do Cód. Processo Civil, aplicável ex vi art. 523.º Cód. Processo Penal. ...”.
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Não se conformando, o Ofendido interpôs recurso da referida decisão, com os fundamentos constantes da motivação de fls. 221/228, com as seguintes conclusões:
“… 1ª No nosso sistema processual penal, não existe uma prova legal ou tarifada que predetermine ou hierarquize o valor dos diversos meios de apreciação da prova.
E embora sendo uma apreciação com um certo grau de discricionaridade, como diz o Prof. Figueiredo Dias ( in “ Direito Processual Penal “, 1º vol. Pág. 202 ) “ a liberdade de apreciação da prova é uma liberdade de acordo com um dever - o dever de perseguir a verdade material - de tal sorte que a apreciação há-de ser, em concreto, recondutível a critérios objectivos e, portanto, em geral, susceptível de motivação e controlo.
2ª Nesta senda, tendo a douta sentença recorrida condenado cada um dos arguidos WW e EE, pela prática em co-autoria material de um crime de ofensa à integridade física simples, p.p. pelo artº 143º do C.P., na pena de multa de € 2.250,00 e € 750,00, respectivamente,
3ª E no pagamento de uma indemnização civil no valor de € 1.250,00 ( mil e duzentos e cinquenta euros ),
4ª Facilmente concluímos que esta se revela incapaz de compensar os danos não patrimoniais causados ao demandante cível.
5ª Tanto mais, que a douta sentença recorrida dá como verificados os pressupostos da responsabilidade aquiliana ou extracontratual e sendo os danos causados pelos arguidos ao demandante cível dignos de tutela jurídica,
6ª Não se percebe atenta a gravidade dos danos causados, o suposto caminho lógico – a que é obrigado o douto tribunal recorrido – que lhe permitiu o afastamento dos valores demandado pelo lesado, isto é, € 7.000, 00, pelos danos físicos e €3.000,00 pelos danos morais sofridos.
7ª Tanto mais, que o que se pretende com o valor da indemnização pelos danos físicos e morais, causados é mais minorar o mal consumado e não restitui-lo à situação em que se encontraria se não se tivesse verificado a lesão.
8ª Há que por o lesado e demandante civil, um acréscimo de bem estar que sirva de compensação aos sofrimentos físicos e morais provocados pela lesão.
9ª Uma vez ponderado o tipo de agressão perpetrada, o grau de culpa dos arguidos, a situação económica dos mesmos, e o grau de sofrimento causado a nível físico e moral ao lesado, devidamente dados como provados na douta sentença recorrida, nos pontos 4, 5, 6, 9, 10 e 11, respectivamente, a douta decisão recorrida devia ter condenado os arguidos a pagarem solidariamente as quantias peticionadas pelo demandante cível, o que perfazem um total de € 10.000,00 (Dez mil euros).
10ª Ainda mais porque é a própria douta sentença recorrida que refere a fls 18: “(… )
O que se pretende é encontrar um expediente compensatório pela lesão do direito, de molde a proporcionar ao ofendido alegrias que compensem a dor, tristeza ou sofrimento ocasionado pelo facto danoso; o que se pretende á a atribuição ao lesado de uma soma em dinheiro que lhe permita um acréscimo de bem-estar que sirva de contraponto ao sofrimento moral provocado pela lesão.
Os elementos que resultam da matéria de facto provada e que devem ser levados em consideração, para este efeito, são: o tipo de agressão perpetrada (empurrão, socos e pancadas desferidas com o salto dos sapatos), a zona corporal visada e atingida (cabeça e face ofendido), as consequências (três feridas incisas e pequena hemorragia incontrolável na região parietal esquerda, e dores físicas, que determinaram ao ofendido um período de doença de quinze dias, três dos quais com afectação da capacidade para o trabalho, sendo certo que tais lesões determinaram para o ofendido a necessidade de receber assistência hospitalar), o grau de culpa subjacente à conduta dos arguidos (dolo directo), a situação económica dos arguidos e do demandante, descrita na matéria de facto, as dores, a humilhação e abalo psicológico que o ofendido sofreu em consequência da agressão que o vitimou, e as concretas circunstâncias em que tal conduta foi perpetrada.
Analisados os danos, conclui-se que os mesmos são consideráveis, e, como tal, merecedores de tutela jurídico-indemnizatória “
11ª Parece-nos que atenta a prova produzida, estes danos não se reconduzem a € 1.250,00.
12ª E contrariamente ao referido na douta sentença recorrida, que não fundamenta a aplicação do valor quantitativo, ou seja, não nos diz como compôs este valor, a partir de que sequelas, ou seja, corresponde um valor maior aos danos físicos ou psicológicos ? É um valor de compensação pecuniária global?
13ª A falta de fundamentação permite-nos concluir, que o valor sentenciado não é equilibrado, justo ou sequer adequado às particularidades da situação concreta
14ª E a experiência comum dita que as sequelas físicas e morais relacionadas nos pontos supra referidos, causadas pelos factos ilícitos provados, não se reconduzem a um tipo de compensação no valor de € 1.250,00, sem cair num vício da decisão, o erro notório da prova (art.º 410º/2 al. c). do C.P.P.
15ª E existindo todos elementos de prova necessários no processo, deve a douta sentença ser alterada, no sentido de permitir a compensação devida do lesado, condenando os arguidos, no valor peticionado a título indemnizatório.
16ª A douta sentença recorrida ao condenar os arguidos no pagamento solidário do valor indemnizatório de € 1.250,00, violou além do princípio da legalidade, os normativos constantes dos artºs.: 127º do C.P.P., 129º do C.P. e 496º do C.P.C.
NESTES TERMOS E NOS MAIS DE DIREITO APLICÁVEIS, E SEMPRE COM O DOUTO SUPRIMENTO DE V. EXª. DEVE ESTE RECURSO MERECER PROVIMENTO, REVOGANDO-SE A DOUTA DECISÃO RECORRIDA, NA PARTE ATINENTE À RESPONSABILIDADE CIVIL APURADA.
E POR EXISTIREM NO PROCESSO TODOS OS ELEMENTOS PROBATÓRIOS QUE A SUSTENTAM DEVE:
- SER SUBSTITUIDA POR OUTRA QUE CONDENE OS ARGUIDOS NO VALOR INDEMNIZATÓRIO DE € 10.000,00 (DEZ MIL EUROS), INICILAMENTE PETICIONADOS, ASSIM SE FAZENDO JUSTIÇA! …”.
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O Arg. WW respondeu ao recurso a fls. 267/268, concluindo nos seguintes termos:
“… A) Deve a douta sentença da primeira instância ser confirmada e manter-se na íntegra.
B) Da discussão da causa e da prova produzida não resultaram provados elementos que alterem o teor da sentença recorrida, no que à responsabilidade civil diz respeito.
C) A douta sentença recorrida fez correcta apreciação dos factos, pelo que deve manter-se a pena aplicada ao recorrido quanto à responsabilidade civil por danos não patrimoniais no valor de € 1.250,00 (mil e duzentos e cinquenta euros).
D) A condenação do arguido no pagamento ao Demandante a quantia de € 1,250,00 se mostra adequada, suficiente, justa, equilibrada, e não se verifica qualquer vício da decisão, ou erro notório da prova
Nestes termos e nos melhores de Direito ao caso aplicáveis que os Sr(s) Juízes Desembargadores melhor suprirão, a medida da pena aplicada deve permanecer nos termos em que foi decidida pelo Tribunal a “quo”, por se revelar ser a decisão consentânea com todos os critérios concretamente atendidos e valoráveis, por ausência de fundamento para a sua alteração ou agravamento e assim, deve negar-se total provimento ao recurso infundadamente interposto pelo Demandante/Recorrente da sentença condenatória que jurisdicionalmente por aquele meio recursório impugnou, a qual não merece censura alguma devendo, por conseguinte, na íntegra ser mantida e confirmada, assim se fazendo a devida e adequada, JUSTIÇA! …”.
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A Arg. EE respondeu ao recurso a fls. 280/287, concluindo nos seguintes termos:
“… I - As razões da discordância do Demandante/Recorrente cingem-se apenas relativamente ao quantum que lhe foi arbitrado a título de indemnização civil, que condenou os Demandados/Recorridos no pagamento solidário do montante de € 1.250,00 (mil duzentos e cinquenta euros), a título de danos não patrimoniais;
II - Pretendendo em consequência, a revogação da douta sentença condenatória relativamente ao pedido de indemnização cível, substituindo-a por outra, que condene os Demandados/Recorridos no valor indemnizatório inicialmente peticionado, concretamente € 10.000,00 (dez mil euros), sendo € 7.000,00 (sete mil euros) devidos pelos danos físicos e € 3.000,00 (três mil euros) pelos danos morais.
III - A questão suscitada pelo Demandante/Recorrente na sua motivação de recurso, prende-se com a alegação de erro notório na apreciação dos factos, alicerçado no facto de terem sido verificados os pressupostos da responsabilidade aquiliana ou extracontratual, e bem assim os danos causados pelos Demandados/Recorridos, serem dignos de tutela jurídica, e não se conformar com o afastamento dos valores peticionados pelo Demandante/Recorrente em sede de pedido de indemnização civil, ao condenar os Demandados/Recorridos em apenas € 1.250,00 (mil duzentos e cinquenta euros) a título de danos não patrimoniais, o que segundo o entendimento do aqui Recorrente se deveu ao facto do Tribunal recorrido só ter tido em consideração os danos morais causados ao Demandante/Recorrente, desconsiderando os danos físicos.
IV - Da leitura da sentença recorrida ressalta a enorme clareza de texto e do sentido da decisão. Clareza que resulta desde logo da simplicidade factual e jurídica do caso, não existindo a mais ténue obscuridade ou contradição.
V - Do erro notório na apreciação da prova, trata-se, como pacificamente tem vindo a ser considerado, de um erro (ignorância ou falsa representação da realidade) evidente, facilmente detectado e resultante do texto da decisão ou do encontro deste com a experiência comum.
VI - É manifesta a ausência de tal erro.
VII - A decisão ora impugnada mostra-se correctamente fundamentada, quer no aspecto de facto, quer no direito aplicado, de forma a poder apreender-se plenamente os motivos e o processo lógico-formal que o julgador usou, para, de acordo com as regras da experiência comum, formar a sua livre convicção.
VIII - O Demandante/Recorrente no seu recurso alega que a sentença não fundamenta a aplicação do valor quantitativo, ou seja não diz como compôs este valor, a partir de que sequelas, concluindo que o valor sentenciado não é equilibrado, justo ou sequer adequado às particularidades da situação concreta.
IX - No entanto atendendo aos elementos de prova carreados para o processo, o valor ora arbitrado, não nos merece censura, considerando que o mesmo não é de todo despiciendo, uma vez que o mesmo visa tão só facultar ao lesado uma justa compensação pelo mal sofrido e não o seu ressarcimento propriamente dito, mostrando-se tal montante, conforme decidido na douta sentença, perfeitamente equilibrado e ajustado às particularidades do caso em concreto.
X – O Demandante/Recorrente faz referência a danos patrimoniais, contudo sequer os peticionou em sede de pedido de indemnização civil que apresentou.
XI – Apesar do Demandante/Recorrente ter feito referência, a uma afectação para o trabalho de 3 (três) dias, certo é que nada peticionou nesta sede, ou seja não pediu qualquer montante pelos dias em que esteve incapacitado para o exercício da sua actividade profissional, ou seja nada pediu a título indemnizatório pelos benefícios que deixou de obter em razão do crime de que foi vitima.
XII – Por outro lado, pese embora, o Demandante/Recorrente tenha recebido, em consequência das lesões de que foi vítima, assistência médica de urgência no Hospital de Cascais, não peticionou qualquer custo com eventuais tratamentos hospitalares, despesas com medicamentos, deslocações a consultas médicas.
XIII - Por outro lado como justifica o Demandante/Recorrente o montante peticionado, concretamente € 7.000,00, a título de danos corporais, diga-se montante aquele bastante inflacionado atendendo às provas carreadas para o processo.
XIV - Certo é, que o Demandante/Recorrente tendo em conta a documentação clínica junta aos presentes autos, diga-se com o devido respeito, insuficiente e incompleta, sequer requereu prova pericial, por intermédio da realização de um exame médico no Instituto de Medicina Legal na sua própria pessoa, com vista à determinação de uma eventual incapacidade, indicando para o efeito os quesitos que pretendia ver esclarecidos por parte daquele Instituto.
XV - Efectivamente, a avaliação do dano corporal reveste uma enorme importância para a qualificação jurídico-penal das condutas, devendo aquela ser feita de acordo com as regras vigentes para o direito civil, com rigor e completude, de forma a habilitar o Tribunal a fixar uma indemnização justa.
XVI - Só por intermédio de uma avaliação do dano corporal rigorosa, é que se permitirá o dimensionamento da reparação do dano e se permitirá a obtenção da informação sobre as consequências do dano em ordem a colaborar com o Tribunal a arbitrar a indemnização, objectivo primordial da avaliação do dano corporal, quer no domínio patrimonial, quer no domínio moral.
XVII - A avaliação do dano corporal vai então permitir obter informação sobre as consequências da acção, sobre o dano, colaborando com o Tribunal, na determinação do tipo legal que em concreto foi cometido, pelo preenchimento ou não das realidades que aqueles termos sintetizam, o que implica rigor no trabalho do perito, tendo sempre presente o texto da lei penal.
XVIII - A avaliação do dano corporal em direito penal, deve ser feita de acordo com as regras vigentes para o direito civil, com rigor e completude, de forma a habilitar o Tribunal a fixar uma indemnização justa.
XIX - Em abono da verdade, só por intermédio da realização de prova pericial seria possível determinar com rigor e exactidão a fixação dos danos corporais, ou seja somente através da submissão por parte do Demandante/Recorrente a um exame de avaliação de dano corporal é que se procederia a uma clara fundamentação da valorização dos danos.
XX –Esta avaliação, do ponto de vista médico-legal mostrava-se essencial para que se quantificasse o dano corporal, este último enquanto violador da integridade psico-física de uma pessoa, terá de ser avaliado médico-legalmente, independentemente do facto lesivo causador ser laboral, penal, civil ou outro. As lesões e as consequências dessas lesões são uma só, as mesmas independentemente da natureza do facto lesivo.
XXI - A perícia médico-legal tem de estar orientada para a quantificação do dano em função da obrigação de indemnizar prevista na lei, ou seja, possibilitar a identificação, a avaliação e a quantificação do dano, sob o ponto de vista patrimonial e não patrimonial, descrevendo os factos que permitam ao julgador definir a indemnização justa.
XXII - Na nossa perspectiva, na ausência de uma perícia médico-legal não é possível aferir com rigor o âmbito da indemnização, pois só por intermédio daquela avaliação pericial, é que se permitiria uma descrição minuciosa dos danos, avaliando-os individualmente, ficando assim o Tribunal em condições de poder valorar e quantificar a obrigação de indemnização prevista na lei.
XXIII - Ou seja, o Demandante/Recorrente ao não se ter submetido a uma perícia médico-legal, não conseguiu fundamentar o avultado montante peticionado a título de danos físicos, pois não demonstrou:
- se ficou com alguma sequela em consequência do crime de que foi vítima,
- se ficou a padecer de alguma incapacidade permanente;
- não ficou quantificado o quantum doloris;
- se se verificou algum prejuízo de afirmação pessoal;
- se ficou com algum dano estético;
XXIV - Efectivamente a douta sentença condenou os Demandados/Recorridos no pagamento ao Demandante/Recorrente de uma quantia a título de indemnização pecuniária global por danos não patrimoniais, integrando aquele montante, quer os danos físicos, quer os danos morais do aqui Recorrente.
XXV – Quer os danos corporais, quer os danos morais integram os danos não patrimoniais, e foi com base nestes últimos que foi arbitrada a indemnização.
XXVI - E atendendo à prova carreada para os autos, o valor arbitrado para efeitos de indemnização a título de danos não patrimoniais mostra-se justo, adequado e equitativo.
XXVII - Os danos morais ou prejuízos de ordem não patrimonial são prejuízos insusceptíveis de avaliação pecuniária porque atingem bens que não integram o património do lesado (a vida, a saúde, a liberdade, a beleza).
XXVIII - Porque estes danos não atingem o património do lesado, a obrigação de os ressarcir tem mais uma natureza compensatória do que indemnizatória, sem esquecer, contudo, que não pode deixar de estar presente a vertente sancionatória (Prof. A. Varela, Das Obrigações em Geral, 1.º, 9.ª ed., p. 630).
XXIX - Por isso a lei lançou mão de uma fórmula genérica, mandando atender só àqueles danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito (art. 496.º, n.º 1, do CC).
XXX - A lei remete a fixação do montante indemnizatório por estes danos para juízos de equidade, haja culpa ou dolo (art. 496.º, n.º 3), tendo em atenção os factores referidos no art. 494.º [grau de culpabilidade do agente, situação económica deste e do lesado e quaisquer outras circunstâncias.
XXXI - Assim, o julgador deve ter em conta, todas as regras de boa prudência, do bom senso prático, da justa medida das coisas e da criteriosa ponderação das realidades da vida, sem esquecer a natureza mista da reparação, pois visa-se reparar o dano e também punir a conduta.
XXXII - A sentença recorrida encontra-se bem fundamentada, indicando os motivos de facto e de direito, que vieram dar origem à decisão, relacionando os meios de prova e efectuando o necessário exame crítico, em estrita consonância com o disposto nos n.ºs 4 e 5 do artigo 97.º conjugado com o n.º 2 do artigo 374.º, ambos do CPP.
XXXIII - A sentença recorrida não padece de falta de fundamentação, insuficiência da prova ou de qualquer contradição insanável na sua fundamentação, pelo que se deve manter nos precisos termos, devendo o recurso ser rejeitado.
XXXIV - O montante a título de indemnização civil arbitrado, concretamente € 1.250,00 (mil duzentos e cinquenta euros), revela-se adequado, proporcional e suficiente, face à prova produzida em sede de audiência de julgamento.
TERMOS EM QUE, DEVERÁ SER NEGADO PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO E, CONSEQUENTEMENTE, DEVERÁ SER MANTIDA E CONFIRMADA INTEGRALMENTE A DECISÃO RECORRIDA, APLICADA EM 1.ª INSTÂNCIA.
ASSIM SE FAZENDO A HABITUAL E COSTUMADA JUSTIÇA. …”.
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Neste tribunal, a Exm.ª Procuradora-Geral Adjunta apôs  seu visto (fls. 297).
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A sentença (ou acórdão) proferida em processo penal integra três partes distintas: o relatório, a fundamentação e o dispositivo. A fundamentação abrange a enumeração dos factos provados e não provados relevantes para a decisão e que o tribunal podia e devia investigar; expõe os motivos de facto e de direito que fundamentam a mesma decisão e indica, procedendo ao seu exame crítico e explanando o processo de formação da sua convicção, as provas que serviram para fundamentar a decisão do tribunal.
Tais provas terão de ser produzidas de acordo com os princípios fundamentais aplicáveis, ou seja, os princípios da verdade material; da livre apreciação da prova e “in dubio pro reo”. Igualmente é certo que, no caso vertente, tendo a prova sido produzida em sede de audiência de julgamento, está sujeita aos princípios da publicidade bem como da oralidade e da imediação.
O tribunal recorrido fixou da seguinte forma a matéria de facto:
“… A) MATÉRIA DE FACTO PROVADA
Da discussão da causa, com interesse para a decisão  resultou provada a seguinte matéria de facto:
1. No dia 14 de Julho de 2014, pelas 02H15, os arguidos encontravam-se no interior de estabelecimento de diversão, Bar "Copacabana", sito na Avenida Costa Pinto, nesta Comarca, acompanhados de duas  jovens raparigas.
2. O ofendido RR encontrava-se nesse estabelecimento a exercer as funções de segurança, tendo-se apercebido que os arguidos se faziam acompanhar por duas jovens que aparentavam ser menores de idade.
3. Motivo por que abordou os arguidos confrontando-os, o que gerou indignação por parte dos mesmos, tendo o arguido desferido empurrão no ofendido, que embateu com a cabeça num pilar de ferro, desferindo-lhe ainda vários socos na face, enquanto que a arguida e as duas jovens raparigas que a acompanhavam, pegaram, cada uma delas, num sapato com salto alto e com estes desferiram pancadas na cabeça do ofendido.
4. Na sequência dos factos o ofendido recebeu nesse mesmo dia, pelas 04H01, assistência médica de urgência no Hospital de Cascais, apresentando pequena hemorragia incontrolável na região parietal esquerda, decorrente de três feridas incisas que tiveram de ser suturadas.
5. Submetido a exame Medico Directo, em 18/07/2014, o ofendido apresentava à observação: "na região parietal, à esquerda da linha mediana, ferida contusa com pontos de sutura pretos, que mede 2 cm de comprimento, obliqua para a frente e para a esquerda; Na região parietal, mediana, ferida contusa com pontos de sutura pretos, que mede 2 cm de comprimento, obliqua para a frente e para a esquerda; na região occipital, mediana, ferida contusa com pontos de sutura pretos, que mede 2 cm de comprimento vertical; ferida contusa, vertical, situado no lobo da orelha esquerda com 1 cm  de comprimento vertical; equimose arroxeada situada na face lateral do terço proximal do braço esquerdo com 5x2 cm de maior eixo horizontal".
6. Na sequência das agressões sofridas o ofendido sofreu dor e traumatismo da face, crânio e membro superior, e três feridas incisas na região parietal, que terão determinado um período de doença fixável em 15 dias, com afectação da capacidade para o trabalho em 3 (três) dias.
7. Os arguidos agiram de forma livre, deliberada e consciente, em união e conjugação de esforços e objectivos, com expressa intenção de ofender corporalmente o queixoso, da forma supra descrita, o que lograram alcançar.
8. Bem sabiam os arguidos que tais condutas, eram proibidas e punidas por lei penal e que dessa forma afectavam a integridade física do ofendido.
9. O demandante RR é uma pessoa educada, recatada e meiga.
10. Em resultado dos factos a que é feita referência em 3., o demandante deixou de ter vontade de trabalhar à noite.
11. Em resultado dos factos a que é feita referência em 3., o demandante sentiu-se envergonhado, triste e humilhado na presença de outros colegas e demais clientes do estabelecimento, o que foi agudizado por um dos agressores ser uma mulher.
Mais se provou, com interesse para a decisão do mérito:
12. O demandante RR exerce, actualmente, a actividade profissional de vigilante no estabelecimento de supermercado "Lidl", auferindo o salário líquido mensal de €675,00, que, acrescido do subsídio de alimentação, se computa no valor mensal de €720,00.
13. Vive na companhia da companheira, que exerce a actividade profissional de escriturária, e do filho comum do casal, de dois anos de idade.
14. O agregado familiar vive em casa própria.
15. O arguido WW exerce a actividade profissional de técnico de telecomunicações, auferindo o salário líquido mensal de €2.500,00.
16. Vive na companhia da sua companheira, a ora arguida, e dos três filhos comuns do casal, que contam as idades de 21 anos, de 19 anos e de 13 anos, respectivamente.
17. O agregado familiar vive em casa arrendada, pagando a quantia mensal de €400,00 de renda de casa.
18. O arguido WW tem a seguinte condenação averbada no respectivo registo criminal:
- pela prática, em 20/02/2007, de um crime de resistência e coacção sobre funcionário, na pena de 6 meses de prisão, substituída por 180 dias de multa, à taxa diária de €5,00, o que perfez o total de €900,00, e de oito crimes de injúria agravada, em cúmulo jurídico, na pena única de 340 dias de multa, à taxa diária de €5,00, o que perfez o total de €1.700,00, tendo ambas as penas sido substituídas pela prestação de um total de 520 horas de trabalho a favor da comunidade.
19. A arguida EE encontra-se desempregada desde há cerca de dois anos, tendo trabalhado pela última vez como empregada de limpezas num hotel.
20. Não aufere subsídio de desemprego, nem qualquer outro tipo de apoio estatal.
21. A arguida EE  tem a seguinte condenação averbada no respectivo registo criminal:
- pela prática, em 14/08/2010, de um crime de condução sem habilitação legal, na pena de 80 dias de multa, à taxa diária de €6,00, o que perfez o total de €480,00, já declarada extinta em virtude da prescrição.
B) MATÉRIA DE FACTO NÃO PROVADA
Com relevância para a decisão da causa não se provou a seguinte factualidade enunciada no pedido de indemnização civil:
a) - que o demandante RR é uma pessoa honesta, honrada e trabalhadora e que não se intromete na vida de ninguém;
b) - que o demandante não é conflituoso e procura ser dedicado para todo e qualquer ser humano, nomeadamente colegas, superiores hierárquicos e clientes do seu local de trabalho;
e) - que, nas circunstâncias de tempo e de lugar referidas em 1. a 3., o demandante pediu a identificação das menores, com delicadeza e empatia, o que fez na presença dos acompanhantes maiores;
d) - que, na sequência dos factos a que é feita referência em 3., o demandante sentiu ansiedade, receio e angústia que os arguidos voltassem ao seu local de trabalho e voltassem a fazer o mesmo;
e) - que, em resultado dos factos a que é feita referência em 3., o demandante receou pela sua própria vida. …”.
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Como dissemos, o art.º 374º/2 do CPP[2] determina que, na sentença, ao relatório se segue a fundamentação que consta da enumeração dos factos provados e não provados, bem como de uma exposição tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos, de facto e de direito, que fundamentam a decisão, com indicação e exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do tribunal.
A redacção deste preceito inculca a ideia, que a obediência a regras de bom senso, clareza e precisão apoiam, de que a fundamentação da decisão se repartirá pela enumeração dos factos provados, depois dos não provados e, seguidamente, pela exposição dos motivos de facto e de direito que fundamentam a decisão com o exame crítico das provas.
Necessário e imprescindível é que o tribunal indique os fundamentos suficientes para que, através das regras da ciência, da lógica e da experiência se possa controlar a razoabilidade da convicção sobre o julgamento do facto provado ou não provado.
No cumprimento desse dever, o tribunal recorrido fundamentou a sua decisão de facto, para além do mais, da seguinte forma:
“… Nos termos do art. 205.º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa, as decisões dos tribunais são fundamentadas na forma prevista na lei, consagrando o Código de Processo Penal a obrigação de fundamentar a sentença nos artigos 97.º, n.º 5 e 374.º, n.º 2, exigindo que sejam especificados os motivos de facto e de direito que fundamentam a decisão, com indicação e exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do tribunal.
No caso vertente, a decisão relativa ao preenchimento dos elementos integradores do tipo legal de crime fundou-se, em primeira linha, nas declarações do demandante Raul Gomes, que se revelaram logicamente coerentes com o envolvimento histórico da situação concreta, tendo sido prestadas de um modo sincero e objectivo, e sendo o demandante peremptório em descrever a ocorrência dos factos, a atitude por si adaptada face à agressão dos arguidos e as lesões de que padeceu. Apesar de ter sido  o sujeito passivo do tipo legal em causa, logrou descrever a dinâmica da actuação dos arguidos, de forma que se ajuizou de credível, tanto mais que o seu relato é corroborado pela análise crítica da globalidade da demais prova produzida, pelo que dúvidas não teve o tribunal de que os arguidos agrediram o ofendido da forma que este relatou, sendo que as lesões de que padeceu, e que se traduziram em três feridas incisas com pequena hemorragia incontrolável na região parietal esquerda, são compatíveis com as agressões descritas pelo ofendido. Neste particular, o ofendido referiu que, na data dos factos, quando se encontrava no estabelecimento de diversão nocturna "Bar Copacabana", onde, à data, trabalhava como vigilante/segurança, num momento em que se encontrava na porta do estabelecimento, foi alertado pela gerente do espaço, de nome CC, que se lhe dirigiu na companhia dos ora arguidos e de duas jovens de que estes se faziam acompanhar, para a circunstância de estas serem menores de idade, tendo nesta ocasião o arguido apelidado a gerente de "cabra" e de "és uma merda", o que o levou a ordenar ao arguido que abandonasse o estabelecimento, tendo-lhe então o arguido desferido um empurrão, que o fez embater num pilar de ferro, o que o levou a empurrar o arguido pelo peito, no intuito de o afastar, tendo-lhe nesse momento o arguido desferido um soco, que o atingiu na parte esquerda da face, fazendo-o embater com as costas, uma vez mais, na calha de ferro, após o que o arguido lhe desferiu diversos socos na face e pontapés que o atingiram nas pernas e no tronco, tendo-lhe, ao mesmo tempo, a arguida, que se encontrava nas suas costas, desferido uma primeira pancada  na parte de trás da cabeça, e, acto contínuo, a arguida e as duas jovens que a acompanhavam desferido várias pancadas com os saltos dos sapatos na cabeça, enquanto o arguido as incentivava a desferirem mais pancadas com os saltos dos sapatos na cabeça do ofendido, afirmando "deem com força". Foram outros clientes do estabelecimento que ocorreram em seu auxílio e puseram termo às agressões. No momento em que cessaram as agressões, viu que tanto a arguida como as duas jovens que a acompanhavam se afastavam do local levando os sapatos nas  mãos, tendo-se-lhe, nessa altura, a arguida dirigido e afirmado "levaste com os saltos, ó português, segurança de merda". Acrescentou que, em consequências das lesões de que foi vítima, padeceu de três feridas na cabeça e ficou com a cabeça e com a cara cobertas de sangue, tendo carecido de receber assistência hospitalar.
Com relevância nesta sede mostrou-se, igualmente, o depoimento testemunhal da referida CC, que deu conta ao tribunal de, à data dos factos, ser dona do estabelecimento "Copacabana", e de o arguido, que pertencia aos quadros da empresa "Luís Branco - Segurança Privada", trabalhar no estabelecimento nas funções de segurança/vigilante. Acrescentou que, nesta data, ao tomar conhecimento que os arguidos se faziam acompanhar de duas jovens menores de idade, convidou-os a abandonarem o estabelecimento, o que os mesmos recusaram, motivo pelo qual conduziu os quatro junto do ofendido, que se encontrava no hall de entrada do estabelecimento, junto à porta, e o inteirou do sucedido, tendo regressado para o balcão do bar. Momentos depois apercebeu-se de um alvoroço e de clientes do estabelecimento a gritar, o que a levou a dirigir-se, de novo, ao hall de entrada do bar, tendo nessa altura encontrado o ofendido caído no chão, a sangrar da cabeça, e visto os ora arguidos e as duas menores na rua, a fugir, recordando-se que a arguida e as duas jovens subiam a rua descalças,  levando os sapatos na mão, o que permite corroborar a versão dos factos apresentada pelo arguido, no sentido de ter sido agredido, quer pela arguida, quer pelas menores, com pancadas desferidas com os saltos dos sapatos na cabeça, só assim se explicando que as menores, ao fugirem do estabelecimento, levassem os sapatos na mão e não calçados, como seria usual.
Embora sem conhecimento directo dos factos, foi relevante  o depoimento testemunhal de RR, agente da P.S.P., que adiantou que, na data dos factos, encontrando-se em serviço de patrulhamento automóvel, na zona de Cascais, recebeu instruções da central rádio para se dirigir ao estabelecimento "Copacabana", por haver notícia de aí terem ocorrido agressões. Recorda-se de, no momento em que chegou ao local, ter encontrado o ofendido com ferimentos, e a sangrar do rosto. No decurso da sua inquirição a testemunha Ricardo Patrício foi confrontada com o auto de notícia de fls. 3 e 4, por si lavrado, cujo teor confirmou.
Todos os referidos depoimentos testemunhais, na matéria aludida, foram relevantes, tendo ambas as testemunhas deposto com isenção, de forma explicativa, circunstanciada e sem qualquer outro desígnio que não o de colaborar com o tribunal na descoberta da verdade dos factos, motivo pelo qual nos mereceram credibilidade.
O tribunal valorou, igualmente, a documentação clínica, que integra fls. 16 e 17 e fls. 23 e 24 dos autos, de onde resulta que no dia 14/07/2014, pelas 04H01, ou seja, menos de duas horas após os factos a que é feita menção na acusação, o ofendido RR deu entrada nos serviços de urgência do Hospital de Cascais Dr. José de Almeida, apresentando "três feridas incisas na região parietal e occipital' e "ferida sangrante na região parietal esquerda, occipital com evolução de 2 horas", que foram suturadas, lesões estas que de acordo com os autos de exame médico de fls. 9 e 10 e de fls. 73, terão resultado de traumatismo de natureza contundente e determinado um período de doença fixável em 15 dias, 3 dos quais com afectação da capacidade para o trabalho habitual.
As lesões constantes da documentação clínica  a que é feita referência no parágrafo que antecede permitem concluir que decorreram  directamente das agressões perpetradas pelos arguidos, e pelas duas jovens de que estes se faziam acompanhar, as quais, segundo as regras da experiência comum, constituem causa adequada para produzir tais resultados.
Em face da análise crítica e conjugada da globalidade destes elementos probatórios não nos puderam merecer credibilidade as declarações dos arguidos WW e EE, quando referiram que, na ocasião, foi o ofendido quem se dirigiu ao arguido e o empurrou, e ter-se o arguido limitado a agarrar o ofendido pela roupa, para não cair, o que, ainda assim, não conseguiu evitar, tendo caído de costas no chão e o ofendido caído em cima de si, altura em que este o agrediu  com socos no braço, tendo-se por este motivo a arguida dirigido ao ofendido e batido com o sapato, porquanto tal versão dos factos, que omite qualquer intervenção das menores na agressão ao ofendido, se apresenta em manifesta contradição com o relato dos factos por este efectuado e em quem o tribunal, pelos motivos apontados, acreditou.
Em suma, atentas as declarações do ofendido/demandante Raúl Gomes e das testemunhas CC e RR, conjugadas com a análise crítica da prova pericial e documental a que acima se fez menção, o tribunal ficou convencido que os factos ocorreram nos exactos termos que considerou provados nos pontos 1. a 6. da Matéria de Facto.
O tribunal socorreu-se, ainda, de uma presunção natural no que tange aos factos subjectivos constantes dos pontos 7. e 8., porquanto os factos objectivos provados, de acordo com as regras da experiência comum,  permitem inferir estes factos subjectivos. Que os arguidos WW e EE agiram com vontade livre e consciente corresponde ao normal do agir humano, nada tendo sido alegado que ponha em causa essa liberdade de decisão.
No que respeita à factualidade a que é feita menção no ponto 9., o tribunal sedimentou a sua convicção no depoimento da testemunha SS, companheira do ofendido, tendo-se, ainda, atendido  às declarações do próprio ofendido e aos depoimentos testemunhais de CC e de SS, quanto às sequelas emocionais da conduta dos arguidos na pessoa do ofendido, a que é feita menção nos pontos 1O. e 11., já que, em virtude das relações de proximidade existentes, lograram depor sobre essa factualidade, de modo coerente com as regras da experiência comum, de acordo com as quais é possível inferir um juízo baseado na cultura das  pessoas de que a vítima de ofensas à integridade física, com os contornos de que se revestiram aquelas que constituem objecto dos presentes autos, sofre dores, sente-se humilhado, psicologicamente abalado e tem  receio  da repetição da agressão.
Os factos dos pontos 12. a 14., 15. a 17. e 19. e 20. resultaram  provados, tendo por base as declarações do demandante e as declarações dos arguidos, quanto às respectivas condições pessoais, laborais e económicas, que se consideraram credíveis, não sendo postas em causa, mostrando-se os antecedentes criminais de cada um dos arguidos certificados no respectivo C.R.C.,  com datas de emissão de 20/11/2018 e de 23/04/2018, respectivamente.
Os factos que se deram como não provados, a que é feita menção nas als. a) a e), foram excluídos por não ter sido produzida prova que os confirmasse, importando salientar que sobre eles não foi produzido qualquer meio de prova concludente, em ordem a fundamentar a convicção do tribunal, à luz das regras da experiência comum. Na verdade, nem os arguidos, nem o demandante, nem nenhuma das testemunhas inquiridas confirmou a factualidade em causa e os demais elementos probatórios carreados para os autos também não comprovam os factos dados como não provados acima descritos. …”.
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É pacífica a jurisprudência do STJ[3] no sentido de que o âmbito do recurso se define pelas conclusões que o recorrente extrai da respectiva motivação[4], sem prejuízo, contudo, das questões do conhecimento oficioso.
Da leitura dessas conclusões e tendo em conta as questões de conhecimento oficioso, afigura-se-nos que a questão fundamental a decidir no presente recurso é a seguinte:
Valor da indemnização.
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Cumpre decidir.
Não vislumbramos na decisão recorrida, aliás muito bem elaborada e fundamentada, qualquer dos vícios previstos no art.º 410º/2 do CPP, que são de conhecimento oficioso[5] e têm que resultar do próprio texto da decisão recorrida, por si só ou conjugado com as regras da experiência comum[6].
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Entende o Recorrente que a indemnização que lhe foi fixada por danos não patrimoniais é insuficiente, devendo ser aumentada.
O tribunal recorrido fundamentou a determinação da indemnização, para além do mais, da seguinte forma:
“... A indemnização por perdas e danos emergentes de um crime é regulada pela lei civil (art. 129.º Cód. Penal).
O princípio geral que rege nesta matéria é o consignado  no art. 483.º, n.º 1 Cód. Civil, segundo o qual "Aquele que com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação". Em articulação  com este princípio, dispõe o art. 487.º, n.º 1 Cód. Civil que "É ao lesado que incumbe provar a culpa do autor da lesão, salvo havendo presunção legal de culpa".
A causa de pedir nas acções destinadas a exigir a responsabilidade civil é frequentemente classificada como causa de pedir complexa, integrada pelos diversos pressupostos de facto que condicionam a aplicabilidade do tipo de responsabilidade civil invocado pelo lesado.
Na linha de uma longa tradição doutrinária, vislumbra-se na norma supra citada a existência dos seguintes pressupostos para a existência de um dever de reparação resultante da responsabilidade civil por actos ilícitos: o facto, a ilicitude, a imputação do facto ao lesante (culpa), o dano e um nexo de causalidade entre o facto e o dano - nesse sentido, cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol. 1, 4.ª ed., 1987, pp. 471.
Tendo em conta todo o, factualismo dado como provado, resulta que a conduta dos arguidos/demandados WW e EE integra a prática, em co-autoria material, de um crime de ofensa à integridade física simples, previsto e punido pelo artº 143.0 1 do Cód. Penal, nos exactos termos acima apreciados.
Com base na prática deste facto ilícito, veio o demandante Raúl Gomes pedir a condenação solidária dos arguidos WW e EE a pagar-lhe uma indemnização, no montante de€ 10.000,00, a título de danos não patrimoniais, que no seu articulado o arguido denomina de "danos físicos" de "danos morais".
O critério para fixação do montante que compense danos dessa  natureza encontra-se previsto no n.0 4 do artº 496.º do Cód. Civil, na redacção que lhe foi conferida pela Lei n.º 23/2010, de 30/08, de acordo com o qual "o montante da indemnização é fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no art. 494º. Assim, o montante compensatório deve ser fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em conta a extensão e gravidade dos prejuízos, o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso, ou, nas palavras de Antunes Varela, "todas as regras  de boa  prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas, de criteriosa ponderação das realidades da vida" - Das Obrigações em Geral, 1.º vol., Almedina, 9.ª ed.ª, pp. 627 e 628.
O ressarcimento destes danos baseia-se "(... ) na generosa formulação do art. 496.º do Cód. Civil, que confia ao julgador a tarefa de determinar o que é equitativo e justo em cada caso, no que fundamenta/mente releva, não o rigor algébrico de quem faz a adição de custos, despesas, ou de ganhos (como acontece no cálculo da maior parte dos danos de natureza patrimonial), mas, antes, o desiderato de, prudentemente, dar alguma correspondência compensatória ou satisfatória entre uma maior ou menor quantia de dinheiro a arbitrar à vítima e a importância dos valores de natureza não patrimonial em que ela se viu afectada" - neste sentido, cfr. Ac. RP, de 09/07/1998, relatado por Teixeira Ribeiro, in C.J., ano XXIII, t. IV, pp. 185 a 187, citando Pessoa Jorge, in Ensaio sobre os Pressupostos da Responsabilidade Civil, pp. 376.
Não sendo os danos não patrimoniais materialmente mensuráveis e visando a quantia a atribuir a esse título ao lesado, não propriamente indemnizá-lo mas, antes, compensá-lo com uma quantia em dinheiro, cuja aplicação em bens materiais ou morais possa de algum modo contribuir para minorar o seu sofrimento, a quantificação de dano dessa natureza tem de ser feita pelo recurso aos critérios de equidade, em que se terão em devida conta o grau de culpa do lesante, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias atendíveis como, por exemplo, a gravidade da lesão, a desvalorização da moeda e os padrões normalmente utilizados nos casos análogos.
Esta indemnização destina-se, portanto, a minorar o mal consumado e não a restituir o lesado à situação em que se encontraria se não se tivesse verificado a lesão. O que se pretende é encontrar um expediente compensatório pela lesão do direito, de molde a proporcionar ao ofendido alegrias que compensem a dor, tristeza ou sofrimento ocasionado pelo facto danoso; o que se pretende á a atribuição ao lesado de uma soma em dinheiro que lhe permita um acréscimo de bem-estar que sirva de contraponto ao sofrimento moral provocado pela lesão.
Os elementos que resultam da matéria de facto provada e que devem ser levados em consideração, para este efeito, são: o tipo de agressão perpetrada (empurrão, socos e pancadas desferidas com o salto dos sapatos), a zona corporal visada e atingida (cabeça e face ofendido), as consequências (três  feridas incisas e pequena hemorragia incontrolável na região parietal esquerda, e dores físicas, que determinaram ao ofendido um período de doença de quinze dias, três dos quais com afectação da capacidade para o trabalho, sendo certo que tais lesões determinaram para o ofendido a necessidade de receber assistência hospitalar), o grau de culpa subjacente à conduta dos arguidos (dolo directo), a situação económica dos arguidos e do demandante, descrita na matéria de facto, as dores, a humilhação e abalo psicológico que o ofendido sofreu em consequência da agressão que o vitimou, e as concretas circunstâncias em que tal conduta foi perpetrada.
Analisados os danos, conclui-se que os mesmos são consideráveis, e, como tal, merecedores de tutela jurídico-indemnizatória.
Posto isto, e não esquecendo que a indemnização por danos não patrimoniais não visa, propriamente, o ressarcimento do lesado, mas antes oferecer-lhe uma compensação que seja justo contrabalanço para o mal sofrido (neste sentido, Rui Alarcão, Direito das Obrigações, Livraria Almedina, 1983, pp. 270), devendo, para cobrar efeito dignificante, ser significativa e não meramente simbólica, tendo em consideração a globalidade do quadro que se nos apresenta, designadamente a extensão e natureza dos danos, julgamos adequada, num juízo de equidade, à luz do critério da ponderação das realidades da vida e com o melindre que sempre acarreta a quantificação de tais danos, uma indemnização no montante de € 1.250,00 (mil duzentos e cinquenta euros), por tal montante se nos afigurar perfeitamente equilibrado e ajustado às particularidades da situação em análise.
Não são devidos juros, por não terem sido peticionados, e por a isso obstar o disposto no art. 609.º, n.º 1 do Cód. Processo Civil. ...”.
No presente caso, o tribunal recorrido fixou os danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos pelo Ofendido com recurso a critérios de equidade, o que podia fazer, porque previsto legalmente (art.º 4º/1-a), 494º/1e 496º/3 do CC[7]).
Embora os tribunais de recurso possam alterar o valor do dano fixado com recurso a critérios de equidade, só o devem fazer quando o tribunal recorrido afronte, manifestamente, “as regras de boa prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas e de criteriosa ponderação das realidades da vida”[8].
No presente caso, entendemos que, tendo em conta a motivação da acção dos Arg.; a extensão e consequências dos danos; os rendimentos do Ofendido e dos Arg. e a dimensão punitiva da indemnização por danos não patrimoniais[9], a indemnização fixada afronta, manifestamente, as regras da justa medida das coisas e de criteriosa ponderação das realidades da vida, pelo que, nessa parte, alteraremos a decisão recorrida, fixando a indemnização em €6.000,00.
*****
Nestes termos e nos mais de direito aplicáveis, julgamos parcialmente provido o recurso e, consequentemente, alteramos a decisão recorrida, fixando a indemnização por danos não patrimoniais, a pagar pelos Arg. ao Ofendido, em €6.000,00 (seis mil euros).
Custas pelo Recorrente e pelos Recorridos, na proporção do decaimento.
*
Notifique.
D.N..
*****
Elaborado em computador e integralmente revisto pelo relator (art.º 94º/2 do CPP).

Lisboa, 30/04/2020
João Abrunhosa
Maria Leonor Botelho
_______________________________________________________
[1] Arguido/a/s.
[2] Código de Processo Penal.
[3] Supremo Tribunal de Justiça.
[4]Cfr. Ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 05.12.2007; proferido no proc. nº 1378/07, disponível in Sumários do Supremo Tribunal de Justiça; www.stj.pt. “O objecto do recurso é definido e balizado pelas conclusões extraídas da respectiva motivação, ou seja, pelas questões que o recorrente entende sujeitar ao conhecimento do tribunal de recurso aquando da apresentação da impugnação – art. 412.º, n.º 1, do CPP –, sendo que o tribunal superior, tal qual a 1.ª instância, só pode conhecer das questões que lhe são submetidas a apreciação pelos sujeitos processuais, ressalvada a possibilidade de apreciação das questões de conhecimento oficioso, razão pela qual nas alegações só devem ser abordadas e, por isso, só assumem relevância, no sentido de que só podem ser atendidas e objecto de apreciação e de decisão, as questões suscitadas nas conclusões da motivação de recurso, questões que o relator enuncia no exame preliminar – art. 417.º, n.º 6, do CPP –, a significar que todas as questões incluídas nas alegações que extravasem o objecto do recurso terão de ser consideradas irrelevantes. Cfr. ainda Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 24.03.1999, CJ VII-I-247 e de 20-12-2006, processo 06P3661 em www.dgsi.pt) no sentido de que o âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões formuladas [Ressalvando especificidades atinentes à impugnação da matéria de facto, na esteira do doutrinado pelo acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17-02-2005, quando afirma que :“a redacção do n.º 3 do art. 412.º do CPP, por confronto com o disposto no seu n.º 2 deixa alguma margem para dúvida quanto ao formalismo da especificação dos pontos de facto que no entender do recorrente foram incorrectamente julgados e das provas que impõem decisão diversa da recorrida, pois que, enquanto o n.º 2 é claro a prescrever que «versando matéria de direito, as conclusões indicam ainda, sob pena de rejeição» (...), já o n.º 3 se limita a prescrever que «quando impugne a decisão proferida sobre matéria de facto, o recorrente deve especificar (...), sem impor que tal aconteça nas conclusões.” -proc 04P4716, em www.dgsi.pt; no mesmo sentido o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16-06-2005, proc 05P1577,] (art.s 403º e 412º do Código de Processo Penal), sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (art. 410º nº 2 do Código de Processo Penal e Acórdão do Plenário das secções criminais do STJ de 19.10.95, publicado no DR Iª série A, de 28.12.95).” (com a devida vénia, reproduzimos a nota 1 do acórdão da RC de 21/01/2009, relatado por Gabriel Catarino, no proc. 45/05.4TAFIG.C2, in www.dgsi.pt).
[5] Cf. Ac. 7/95 do STJ, de 19/10/1995, relatado por Sá Nogueira, in DR 1ª Série A, de 28/12/1995, que fixou jurisprudência no sentido de que é oficioso o conhecimento, pelo tribunal de recurso, dos vícios indicados no art.º 410.º/2 CPP, nos seguintes termos: “É oficioso, pelo tribunal de recurso, o conhecimento dos vícios indicados no artigo 410.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, mesmo que o recurso se encontre limitado à matéria de direito.”.
[6] Assim, o Ac. do STJ de 19/12/1990, proc. 413271/3.ª Secção: " I - Como resulta expressis verbis do art. 410.° do C.P.Penal, os vícios nele referidos têm que resultar da própria decisão recorrida, na sua globalidade, mas sem recurso a quaisquer elementos que lhe sejam externos, designadamente declarações ou depoimentos exarados no processo durante o inquérito ou a instrução ou até mesmo no julgamento (...). IV É portanto inoperante alegar o que os declarantes afirmaram no inquérito, na instrução ou no julgamento em motivação de recursos interpostos".
[7] Código Civil.
[8] Neste sentido, veja-se a seguinte jurisprudência:
- Acórdão do STJ de 09/06/2010, relatado por Fernando Frois no proc. 562/08.4GBMTS.P1.S1, do qual citamos: “…Estando em causa a fixação do valor da indemnização por danos não patrimoniais com apelo a um julgamento segundo a equidade, em que os critérios que «os tribunais devem seguir não são fixos» – Antunes Varela/Henrique Mesquita, Código Civil Anotado, 1.º vol., anotação ao art. 494.º - «devem os tribunais de recurso limitar a sua intervenção às hipóteses em que o tribunal recorrido afronte, manifestamente, “as regras de boa prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas e de criteriosa ponderação das realidades da vida”» – só se justificando uma intervenção correctiva se a indemnização se mostrar exagerada por desconforme a esses elementos.
Neste sentido podem ver-se os acórdãos deste Supremo Tribunal de Justiça de 16-10-2000, processo n.º 2747/00-5ª; de 29-11-2001, processo n.º 3434/01-5ª; de 16-05-2002, processo n.º 585/02-5ª; de 14-11-2002, processo n.º 3316/02-5ª; de 08-05-2003, processo n.º 4520/02-5ª; de 17-06-2004, processo n.º 2364/04-5ª; de 09-12-2004, processo n.º 4118/04-5ª; de 24-11-2005, processo n.º 2831/05-5ª; de 13-07-2006, processo n.º 2172/06-5ª; de 07-12-2006, processo n.º 3053/06-5ª; de 27-11-2007, processo n.º 3310/07 -5ª; de 06-12-2007, processo n.º 3160/07-5ª; de13-12-2007, processo n.º 2307/07-5ª; de 13-03-2008, processo n.º 2589/07-5ª; de 03-07-2008, processo n.º 1226/08-5ª; de 11-09-2008, processo n.º 587/08-5ª; de 11-02-2009, processo n.º 313/09-3ª; de 25-02-2009, processo n.º 390/09-3ª; de 12-03-2009, processo n.º 611/09-3ª; de 15-04-2009, processo n.º 3704/08-3ª.
No acórdão de 11-07-2006, revista n.º 1749/06-6ª, consignou-se que salvo caso de manifesto arbítrio na fixação da indemnização, o STJ não pode sobrepor-se ao Tribunal da Relação na apreciação do quantum indemnizatório por esta julgado equitativo.
O juízo equitativo é critério primordial e sempre corrector de outros critérios. …”;
- Acórdão do STJ de 28/10/2010, relatado por Lopes do Rego no proc. 272/06.7TBMTR.P1.S1, do qual citamos: “…Temos entendido que – quando o cálculo da indemnização haja assentado decisivamente em juízos de equidade, - ao Supremo não compete a determinação exacta do valor pecuniário a arbitrar, já que a aplicação de puros juízos de equidade não traduz, em bom rigor, a resolução de uma «questão de direito», mas tão somente a verificação acerca dos limites e pressupostos dentro dos quais se situou o referido juízo equitativo, formulado pelas instâncias face à ponderação casuística da individualidade do caso concreto «sub juditio».
Como se afirma, por ex., no ac. de 5/11/09, proferido no p. 381-2002.S1:
Finalmente – e no nosso entendimento – não poderá deixar de ter-se em consideração que tal «juízo de equidade» das instâncias, alicerçado, não na aplicação de um critério normativo, mas na ponderação das particularidades e especificidades do caso concreto, não integra, em bom rigor, a resolução de uma «questão de direito», pelo que tal juízo prudencial e casuístico das instâncias deverá , em princípio, ser mantido, salvo se o julgador se não tiver contido dentro da margem de discricionariedade consentida pela norma que legitima o recurso à equidade – muito em particular, se o critério adoptado se afastar, de modo substancial, dos critérios que generalizadamente vêm sendo adoptados, abalando, em consequência, a segurança na aplicação do direito, decorrente da adopção de critérios jurisprudenciais minimamente uniformizados, e , em última análise, o princípio da igualdade. …”;
- Acórdão do STJ de 07/12/2011, relatado por Santos Carvalho no proc. 461/06.4GBVLG.P1.S1, do qual citamos: “…Além de que não só «escapam à admissibilidade de recurso “as decisões dependentes da livre resolução do tribunal”» como, em caso de julgamento segundo a equidade, «devem os tribunais de recurso limitar a sua intervenção às hipóteses [que não é a dos autos] em que o tribunal recorrido afronte, manifestamente, “as regras de boa prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas e de criteriosa ponderação das realidades da vida”» (STJ 16-10-2000, recurso n.º 2747/00-5, 17-06-2004, recurso n.º 2364/04-5 e STJ 27-11-2007, recurso n.º 3310/07-5). …”;
- Acórdão da RC de 01/02/2012, relatado por Maria Pilar de Oliveira, no proc. 6/06.6PTLRA.C1, do qual citamos: “…Como o dano não patrimonial consiste num prejuízo que atinge bens imateriais, insusceptível de avaliação pecuniária, é irreparável mas susceptível de ser compensado por um equivalente monetário, residindo a dificuldade em encontrá-lo, por apelo, sempre imperfeito, ao que o dinheiro pode propiciar e que constitua um lenitivo no sentido de encontrar um equilíbrio entre a dor psicológica e física e o que o dinheiro em substituição pode propiciar. No encontro desse ponto de equilíbrio reside o exercício da equidade, critério para que a lei aponta.
E nesta matéria, ao invés de buscar exemplos que possam servir de comparação, entende-se mais significativo salientar que o Supremo Tribunal de Justiça vem acentuando que estando em causa critério de equidade, as indemnizações arbitradas apenas devem ser reduzidas quando afrontem manifestamente as regras da boa prudência, do bom senso prático, da justa medida das coisas e de criteriosa ponderação das regras da vida (cfr. entre outros o Acórdão de 7.12.2011 proferido no processo 461/06.4GBVLG.P1.S1 publicado em www.dgsi.pt), como igualmente acentua que o valor indemnizatório deve ter carácter significativo, não podendo assumir feição meramente simbólica (cfr. entre outros o Acórdão proferido no processo 526/08.4TMS.P1.S1 de 8.6.2010). …”.
[9] Nesse sentido, vejam-se os seguintes acórdãos:
- do STJ de 14/11/2006, relatado por Faria Antunes, no proc. 06A2899, in www.dgsi.pt;
- do STJ de 15/04/2009, relatado por Raul Borges, no proc. 08P3704, in www.dgsi.pt;
- do STJ de 13/01/2010, relatado por Santos Carvalho, no proc. 476/09.0PBBGC.P1.S1, in www.dgsi.pt;