Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
344/18.5T8CSC-A.L1-6
Relator: NUNO LOPES RIBEIRO
Descritores: ACÇÃO DE REIVINDICAÇÃO
EXCEPÇÃO PEREMPTÓRIA
PRESTAÇÃO ESPONTÂNEA DE CAUÇÃO
ADMISSIBILIDADE
NULIDADE DE SENTENÇA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 09/26/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I. Tendo o réu, em acção de reivindicação, excepcionado a manutenção de um contrato de arrendamento relativo ao imóvel reivindicado bem como tendo deduzido pedido reconvencional de ressarcimento das benfeitorias realizadas no mesmo imóvel, carece de fundamento jurídico-processual a prestação espontânea de caução oferecida pelo autor, com vista à exclusão do direito de retenção também invocado por aquele réu, em virtude do crédito objecto da demanda reconvencional, nos termos dos arts. 754º e 756, al. d) do Código Civil.
II. Mostrando-se a apreciação do pedido de ressarcimento das benfeitorias alegadamente efectuadas no imóvel – pressuposto daquele direito de retenção – condicionado à improcedência daquela excepção.
III. Apenas a falta absoluta de fundamentação, entendida como a total ausência de fundamentos de facto e de direito, gera a nulidade prevista na al. b) do nº 1 do artigo 615º do Código de Processo Civil.
IV. A fundamentação deficiente, medíocre ou errada afeta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade.
V. Não é indispensável que na sentença se especifiquem as disposições legais que fundamentam a decisão: essencial é que se mencionem os princípios, as regras, as normas em que a sentença se apoia.
VI. A nulidade prevista na 1ª parte do nº 1, al. c) do citado art. 615º consiste na contradição entre os fundamentos e a decisão, não uma «contradição entre os factos e o direito aplicável», cujo conteúdo útil não alcançamos.
VII. O direito aplicável, pela sua natureza, nunca estará em contradição com os fundamentos (de facto) a que se aplica.
VIII. Contradição poderia existir entre o direito aplicado  e os fundamentos de facto, mas tal não consubstanciaria a nulidade prevista no preceito, antes consistindo em erro de julgamento, a apreciar em sede de recurso de mérito da decisão.
IX. A constatação pelo Tribunal a quo da invocação de matéria de excepção nos autos principais pelo recorrido – no caso, a repristinação de um contrato de arrendamento relativo ao imóvel reivindicado nesses autos –, apesar de se tratar de questão controvertida e ainda não decidida nos autos principais, não constitui questão que não possa ser apreciada, pelo que não consubstancia a nulidade da decisão prevista na al. d) in fine do nº1 do citado art. 615º.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os Juízes na 6ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa:
      
I. Relatório
A [ …. Gestão e Administração de Imóveis ] interpôs acção declarativa, com forma de processo comum, contra B [ ….. – Empreendimentos Hoteleiros, Lda. ] ,
Peticionando:
Nestes termos e nos mais de direito aplicáveis e com o douto suprimento de V. Exa., deve a presente acção ser julgada procedente por provada, condenando-se a Ré a:
a) reconhecer e respeitar o direito de propriedade da Autora sobre prédio;
b) entregar de imediato o prédio à Autora, livre e devoluto de pessoas e bens e no estado em que o recebeu;
c) pagar à Autora o montante mensal mínimo de 3.500,00 € (três mil e quinhentos euros) de indemnização pelo prejuízo arrendatício sofrido pela Autora, ou a título de enriquecimento sem causa pela ocupação e exploração comercial e lucrativa do prédio, correspondente ao valor mínimo da renda, desde 01/10/2013 até à efectiva entrega, liquidando-se até 31/01/2018 o montante de capital de 182.000,00 € (cento e oitenta e dois mil euros), acrescido de juros de mora vencidos e vincendos, desde cada um dos meses de exploração até efectivo pagamento, à taxa legal de 4%;
d) pagar à Autora o montante de 299,28 € (duzentos e noventa e nove euros e vinte e oito cêntimos), referente ao mês de Setembro de 2013, acrescido de juros de mora desde a data de vencimento até efectivo pagamento, à taxa legal de 4%;
e) pagar uma sanção pecuniária compulsória, em montante não inferior a 200,00 € (duzentos euros) por cada dia de atraso na entrega do imóvel, desde a citação até efectiva entrega à Autora; f) em custas e procuradoria.
Alega a autora, em apertada síntese, ser proprietária de prédio urbano que identifica, sendo que os antecessores proprietários deram de arrendamento a terceiro o referido prédio, tendo este cedido a sua posição contratual de arrendatário à ora ré, em 1996.
Acrescenta a autora que o contrato de arrendamento em causa cessou em 30/9/2013, por denúncia da própria arrendatária, sem que até à presente data esta tivesse procedido à restituição do imóvel.
Citada a ré contestou, impugnando motivadamente parte da factualidade vertida na petição inicial e propugnando pela improcedência da demanda. Mais deduziu pedido reconvencional, peticionando a condenação da autora:
a) A pagar  à ré as benfeitorias necessárias e quantias respectivas dadas como provadas na acção nº 4483/04.1TBCSC, do ex-1º Juízo Cível do Tribunal de Cascais, no montante de € 453.436,14.
b) A pagar à ré os juros de mora sobre tal quantia, vencidos atá 15/3/2018, à taxa leal de 4%, no montante de 90.836,30 €.
c) A pagar à ré, à taxa legal que se verificar, os juros vincendos que se verificarem até integral pagamento;
d) A pagar à ré as benfeitorias necessárias ou úteis que não possam ser levantadas sem detrimento do imóvel desde o início de 2004 até esta data, no montante de (49.505,09 €+18.185,00€) 67.690,00€.
e) A pagar à ré os juros de mora que se verificarem sobre tais quantias a partir da notificação da presente reconvenção. 
A autora replicou, propugnando pela improcedência da demanda reconvencional.
Em 26/10/2018, a ré apresentou requerimento de ampliação do pedido reconvencional, peticionando:
a) Deve ser reconhecido como em vigor o contrato de arrendamento celebrado em 1/5/1988 (doc. 3 junto pela autora com a p.i.), em que actualmente são respectivamente senhoria e inquilina as aqui autora e ré, consoante alegado nos arts. 1º a 5º da p.i.;
b) Quando assim se não entenda, deverá ser julgado procedente o pedido reconvencional anteriormente feito pela ré.
Alegou, em síntese, que considerou como declarações não sérias as emitidas por advogado em nome da A. (datadas de 27/05/2013, 20/06/2013 e 01/07/2013), pelo que, em 06/12/2017, rejeitou o negócio (leia-se a denúncia do contrato que a R. havia comunicado ao intitulado mandatário da A., por carta datada de 30/07/2013), pelo que o contrato de arrendamento se mantém em vigor, encontrando-se a depositar as rendas. A denúncia do contrato foi efetuada sem conceder quanto à exigência da prova da representação da A. da lacuna legal a que aludiu nas cartas que dirigiu ao referido advogado; sempre manteve interesse na manutenção do contrato; efetuou a denúncia por a renda exigida ser incomportável e porque tinha direito a benfeitorias.
A A. pronunciou-se no sentido de que a ampliação do pedido e da causa de pedir (não expressamente invocada) não deve ser admitida porquanto, no que concerne a causa de pedir, não concede o seu acordo (artº 264º do C.P.C.), não houve qualquer confissão da Autora, aqui na qualidade de Ré, nem qualquer aceitação da Ré, aqui na qualidade de Autora. Além do mais, mesmo que tivesse havido alguma confissão na resposta da Autora à contestação/reconvenção, o articulado de alteração e ampliação foi apresentado muito para além dos 10 dias previstos no artº 265º do C.P.C.. A ampliação do pedido que a Ré/reconvinte formula não é o desenvolvimento ou a consequência do pedido primitivo, mas o de outra matéria.
Em 21/2/2019, foi proferido despacho, de que salientamos o seguinte passo:
A R. invocou como causa de pedir, no pedido reconvencional deduzido na contestação que desde o início do arrendamento efetuou ou suportou benfeitorias necessárias, efetuou denúncia do contrato de arrendamento, pelo que tem direito a ser compensado pelo respetivo valor, conforme discriminação a que procedeu (cfr. artºs 128º a 1120º).
E na ampliação do pedido, ora em análise, a R. alegou um conjunto de factos (alguns deles novos por referência à contestação) que integram causa de pedir diversa. Com efeito, o pedido reconvencional (pagamento do valor das benfeitorias executadas no imóvel locado) assenta na cessação do contrato de arrendamento, por denúncia da R., como expressamente consta dos art.ºs 132º a 137º daquela peça processual. Ao invés, a ampliação do pedido tem como fundamento a manutenção do contrato (causa de pedir diversa/oposta), concluindo por pedido formulado em conformidade, mantendo o pedido inicial, caso o “novo” não proceda.
Se é certo que já na contestação que apresentou a R. alegou factos atinentes à manutenção em vigor do contrato de arrendamento (o que suportará a sua conclusão de que a ação deve improceder, em sede de matéria de defesa), não podemos olvidar que o direito a benfeitorias realizadas pelo arrendatário, nos termos do disposto no artº 1074º do C.C. apenas surge na esfera judicia do arrendatário no fim do contrato, e que tais factos foram alegados pela R. na contestação (cfr. artºs 51º e ss.).
Em suma, sendo a causa de pedir e pedido reconvencional (inicial) o da obtenção do valor das benfeitorias realizadas, com fundamento na manutenção do contrato de arrendamento, a causa de pedir ora alegada para sustentar a ampliação do pedido é distinta (e até algo contraditória, não fosse admissível pedidos subsidiários e respetivas causas de pedir). Isto é, não só não estão preenchidos os requisitos para a alteração da causa de pedir, exigidos pelos artº 264º e 265º (não existe acordo da A., esta não efetuou confissão relevante e mostram-se ultrapassados os 10 dias a que alude o segundo preceito legal citado), como o pedido ampliado não é consequência nem desenvolvimento do pedido inicial.
E a nova causa de pedir também não pode ser enquadrada no regime do articulado superveniente, regulado no artº 588º do C.P.C., porquanto os factos alegados de novo, não se revestem da exigida superveniência objetiva ou subjetiva.
Em síntese, não obstante na contestação a R. se defender do pedido formulado pela A., pugnando pelo “renascimento do contrato de arrendamento”, em momento posterior à denúncia que efetuou (como defesa obstativa do efeito pretendido pela A. com a presente ação) – independentemente de pedido expresso, há que proceder a interpretação hábil do conjunto da peça processual, para considerar que o seu sentido só pode ser o de, precedendo a ação (por a tese da R. quanto à manutenção do contrato de arrendamento não lograr vencimento), impõe-se conhecer do pedido reconvencional relativamente às benfeitorias (que tem como pressuposto a cessação do contrato), assim, se entendendo que este se mostra formulado em termos subsidiários (para o caso de procedência da ação).
Pelo exposto, não se admite a ampliação da causa de pedir e pedido reconvencional.
Encontram-se os autos a aguardar a realização de audiência prévia, já marcada.
                                               *
Entretanto e mediante requerimento entrado em juízo em 9/9/2018, veio a autora, ora requerente, oferecer prestação espontânea de caução, alegando para tanto, que a ré denunciou o contrato de arrendamento relativo ao imóvel reivindicado, sendo que, nestes autos, reconvenciona a condenação da ré no pagamento de benfeitorias realizadas invocando direito de retenção sobre o mesmo imóvel até satisfação da sua pretensão.
Pretende a autora, ora requerente, prestar caução, por meio de depósito, no montante de € 611.962,53, substituindo o insustentado direito de retenção, com vista a obter a imediata entrega do referido imóvel.
A ré, ora requerida, deduziu oposição à prestação de caução, excepcionando o abuso de direito e a colisão de direitos, da requerente ao pretender a entrega imediata do imóvel, ficando a requerida privada do seu gozo e obrigada a aguardar muitos anos pelo ressarcimento das benfeitorias.
Mais impugna a requerida o valor oferecido para a caução, que, no seu entendimento, não pode ser inferior a € 1.000.000,00.
Mais invoca a requerida que a pretendida entrega do imóvel encontra-se prejudicada, na medida em que ainda cumpre discutir e apreciar a subsistência do contrato de arrendamento.
Termina a requerida por peticionar que a caução não seja admitida, por ser:
a) lnidónea por não poder alcançar o fìm em vista; e, de qualquer modo, ser insuficiente;
b) Inadmissível, por:
1) constituir flagrante abuso do direito na medida em que excede os limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes e pelo fìm social ou económico desse direito;
2) ter a Ré direito a usufruir o imóvel na sua atividade, designadamente por evidente e vital necessidade;
3) E, bem assim, ter ainda a Ré direito a usufruir o imóvel por aplicação das regras da colisão de direitos, em que se constata ser o direito da ré claramente superior ao da autora;
Mantendo-se a Ré no locado até que seja apreciada a questão da subsistência do arrendamento ou até que a Autora pague à Ré as benfeitorias que realizou no locado.
Com data de 22/2/2019, foi proferida sentença no presente apenso, de que salientamos o seguinte trecho:
Os autos contêm os elementos necessários à prolação de decisão, sem necessidade de produção de prova.
Para decisão do incidente consideram-se provados os seguintes factos (admitidos por acordo e/ou resultantes de documentos):
(…)
                                                  *
A A. pretende neutralizar o efeito do direito de retenção mediante a prestação de caução pelo valor das benfeitorias reclamadas pela R., assim, visando obter a entrega do imóvel.
Se apenas estivesse em causa o valor de indemnização das benfeitorias e direito de retenção do imóvel até ao pagamento da correspondente indemnização, assistiria à A. o direito de obter a entrega do imóvel mediante prestação de caução idónea.
Todavia, nos autos principais, encontra-se em discussão a cessação/manutenção do contrato de arrendamento, como resulta do acima exposto.
Com efeito, não obstante a R. ter aceite que procedeu à sua denúncia, extinguindo-se o mesmo (v.g. artº 12º da p.i., aceite no artº 1º da contestação) alegou também que posteriormente comunicou à A. que considerava as declarações desta como não sérias (v.g. relativas ao aumento de renda), que considerava o contrato em vigor e retomou o pagamento das rendas, concluindo pela improcedência da ação.
Ora, perante as questões que se mostram em discussão nos autos principais (mormente a cessação versus manutenção em vigor do contrato de arrendamento), forçoso é concluir que a A. Não pode obter o fim visado com o presente incidente (entrega do imóvel locado) mediante prestação de caução, porquanto esta apenas seria idónea a garantir o eventual direito à indemnização por benfeitorias e conexo direito de retenção.
Pelo exposto, sem necessidade de mais considerações, julga-se improcedente, o presente incidente de prestação de caução.
Custas do incidente a cargo da A..
Notifique.
                                              *
Inconformada, a requerente interpôs recurso de apelação para esta Relação, formulando na sua alegação as seguintes conclusões:
1) A Autora alegou no art.º 1º da PI dos autos principais ser proprietária do imóvel e, tal como decorre do Ponto 12) dos factos provados, peticiona o reconhecimento do direito de propriedade sobre o prédio (que a Ré reconheceu expressamente no art.º 1º da Contestação) e, no mais, a entrega do imóvel e pagamentos indemnizatórios, sendo que a Ré na Contestação/Reconvenção e tal como decorre do Ponto 13) dos factos provados, peticiona exclusivamente pagamentos indemnizatórios de alegadas benfeitorias e juros.
2) A Ré no seu art.º 1º da Contestação dos autos principais, aceitou expressamente o alegado pela Autora nos artºs 1º a 12º da PI, sendo que neste artº 12º consta e está dado como assente que “o contrato de arrendamento cessou em 30/09/2013, por denúncia da Ré (Doc. nº 7) e esta não fez a entrega do imóvel à Autora e detém-no, usa-o e explora-o lucrativamente contra a vontade da Autora”.
3) E a Ré afirma e assume a denúncia do contrato de arrendamento e a cessação do mesmo, pelo menos nos seguintes artigos da Contestação dos autos principais:
Art.º 69º “A Ré não aceitou, por não a poder suportar, a renda exigida pela Autora no âmbito das regras do Novo Regime do Arrendamento Urbano (NRAU)”; Art.º 70º “Por isso denunciou o contrato de arrendamento”; Art.º 112º “Nunca esta, porquanto o contrato cessou precisamente por o inquilino não poder suportar”; Art.º 130º “Nos termos do NRAU, caso o inquilino não aceite a nova renda proposta pelo senhorio pode denunciar o contrato de arrendamento – cfr artº 51º, nº 3, al d)”; Art.º 131º “A Ré efectuou tal denúncia, de acordo com tal preceito e nos termos da carta de 30/7/1013, junta pela Autora com a p.i.”; Art.º 134º “A denúncia produziu efeitos dois meses depois, ou seja em 30/9/2013”.
4) De entre os 1120 artigos contraditórios, despropositados, desenquadrados e inconsequentes da Contestação/Reconvenção, para sustentar o petitório transcrito no Ponto 13) dos factos considerados provados, a ora Recorrida fez constar nos artºs 13º a 15º que “passado mais cerca de um ano, em que não se acordou uma solução, a Ré comunicou à Autora, que tendo passado quatro anos sem receber o montante das benfeitorias, considerava as comunicações da Autora, descritas nos artigos 7º a 9º da p.i, como declarações não sérias, pelo que reiniciava o pagamento das rendas”; “Ofereceu nomeadamente todas as rendas anteriores, depois da denúncia do arrendamento, em que, naturalmente, deixou de as pagar” e “A Autora não aceitou o pagamento e, consequentemente, a Ré passou a efetuar depósito liberatório, à ordem do tribunal”
5) Esta inusitada asserção, que mais não é do que uma gratuita e inconsequente tirada en passant e em desespero de causa, é inócua e contraditória com os demais 1117 artigos da Contestação, não releva e em nada sustenta o petitório, até porque encontra-se demonstrado nos autos, pelo alegado e pelos documentos que o sustentam, o sem sentido de tal alusão, que não pode ter qualquer relevo, sendo que, por um lado, ao contrário do sustentado no douto despacho recorrido, não é matéria em discussão nos autos principais e, por outro lado, também ao contrário do vertido no douto despacho, a Ré não retomou o pagamento das rendas, quanto muito e sem conceder, tentou retomar, como resulta do Doc. nº 1 junto com o requerimento de 30/10/2018 sob a refª. 30542237, do presente Apenso. 
6) A Ré assume que houve negociações para a entrega do imóvel, que não chegaram a bom porto e, segundo diz, pelo facto de terem “passado quatro anos sem receber o montante das benfeitorias, considerava as comunicações da Autora, descritas nos artigos 7º a 9º da p.i, como declarações não sérias, pelo que reiniciava o pagamento das rendas.”, o que, aqui sim, são menções e bizarro entendimento não sérios, são inconsequentes e não fazem qualquer sentido factual ou jurídico, nenhuma cobertura legal têm que possa fazer vingar tão desconcertada e incongruente pretensão,
7) até porque, para além de falso e de se tratar de um mero expediente, é contraditório com o demais alegado na Contestação/Reconvenção e com os documentos juntos aos autos e não impugnados, constituídos pela troca de correspondência entre Autora e Ré, designadamente os Docs. nº 6 e 7 juntos à PI dos autos principais, e que demonstram o sem sentido de tamanha falácia gratuita, pelo que em nada releva nos autos, não podendo ter acolhimento, quer nos autos principais quer nos presentes autos de Apenso de prestação de caução.
8) A Autora intentou o presente incidente de prestação de caução em 09/09/2018 e, em consequência disso, por requerimento de 26/10/2018, a Ré/Reconvinte veio requerer nos autos principais a ampliação do pedido reconvencional, a que a Autora se opôs e, pelo douto despacho de 21/02/2019, sob a refª. 117381836, foi o pedido de ampliação do pedido e, ainda que não peticionado mas alegado, a causa de pedir, indeferidos por inadmissíveis.
9) E, ao contrário do descrito neste douto despacho de 21/02/2019, a Ré não pugnou pelo renascimento do contrato de arrendamento, nem, aliás, sobre o que quer que seja quanto ao arrendamento, que confessadamente denunciou, pugnando, sim, pelo recebimento de indemnizações.
10) Como, aliás, decorre de todo o articulado da Contestação, designadamente dos artºs 1º a 127º, a defesa da Ré assenta em causas diversas do putativo arrendamento e da pretensa revogação da denúncia, revogação, aliás, que nunca invoca ou pede.
11) E a Ré dizer na Contestação que foram “declarações não sérias” não serve de defesa ao alegado na PI ou ao que quer que seja, desacompanhado, designadamente, do pedido de revogação, anulação ou o que for da denúncia contratual, pedido não formulado e inexistente, como resulta do Ponto 13) dos factos provados, sendo que nem tudo o que se invoca nos articulados é acolhido, pois para a discussão nos autos só seguem os factos que relevam e têm cobertura legal, o que, claramente, não é o caso em apreço.
12) Ao contrário do entendimento preconizado no douto despacho recorrido, nos autos principais não se encontra “em discussão a cessação/manutenção do contrato de arrendamento”, nem, aliás, esse é o escopo da contestação, nem é pertinente nem devido o Tribunal “proceder a interpretação hábil” para considerar subsidiário o pedido reconvencional - o que a Ré não considerou e não cabe ao Tribunal substituir-se às partes – quando o pedido em decisão, como no próprio douto despacho se afirma, não cumpre os requisitos processuais e, consequentemente, em caso algum poderia ser admitido.   
13) A novel menção da Ré das comunicações “não sérias” e reinício de “pagamento das rendas”, ardilosamente surgida para obstruir o normal andamento dos autos e perpetuar a usurpação do imóvel, lucrar com isso e causar dano irreparável à Autora, para além de infundada, está desenquadrada do objecto dos autos, é um manifesto exercício de abuso de direito e não pode servir de causa para indeferir a requerida prestação da caução.
14) Em face da inusitada e infundada invocação de falta de poderes do mandatário da Autora nas antecedentes comunicações, que agora a Ré estratégica e falsamente chama de “declarações não sérias”, as putativas dúvidas desta ficaram sanadas pela carta de 01/07/2013, que constitui o Doc. nº 6 junto à PI dos autos principais que, tal como consta do Ponto 9) supra dos factos dados por provados, “A Autora respondeu através do seu mandatário por carta de 01/07/2013, aceitando a não passagem imediata para o regime do NRAU e a não definição de prazo certo, e não aceitando a recusa de aumento legal da renda para 1/15 do VPT e, porque a Ré havia questionado a legitimidade do mandatário, este fez subscrever a mesma carta pelo gerente da ora Autora, com aposição de carimbo. (Doc. nº 6 anexo à p.i.)” – relevo nosso. 
15) E foi em resposta a esta carta da Autora de 01/07/2013, que a Ré enviou à Autora a carta de 30/07/2013 de denúncia do contrato de arrendamento, junta à PI dos autos principais sob o Doc. nº 7, pelo que, ainda que por absurdo, houvesse “declarações não sérias” na correspondência antecedente, a verdade é que, por esta carta de 30/07/2013, a Ré declarou decidida e conscientemente, tal como resulta do Ponto 10) dos factos dados por provados, que “Na resposta da Ré por carta de 30/07/2013, rececionada pelo mandatário da Autora no dia seguinte, depois de fazer algumas considerações, comunicou à Autora que: “11 – Damos, porém, essa questão, por prejudicada, na medida em que decidimos pôr termo ao arrendamento; 12 – Por este meio, informamos pois, Vª Exª de que denunciamos o contrato, nos termos previstos pela al. d) do nº 3 do artº 51º, do NRAU, na redação dada pela Lei nº 31/2012, de 14/8” – relevo nosso.
16) Por isso, tal alegação da Ré é despropositada, não é séria e não tem qualquer sustentação factual ou jurídica, tratando-se tão só – e é muito - de mero expediente dilatório para impedir a realização da justiça e perpetuar-se na exploração comercial e lucrativa abusiva do imóvel da Autora, contra a vontade e à custa desta, o que ultrapassa larga e manifestamente os limites impostos pela boa-fé e o fim social e económico do pretenso direito, o que constitui abuso de direito.  
17) A Ré denunciou formalmente o contrato de arrendamento em 30/07/2013, com efeitos em 30/09/2013 e, mais de 4 anos depois, quando as negociações desenvolvidas abortaram e se goraram as possibilidades de fazer a entrega do imóvel por acordo e ficou a saber que iria ser intentada uma acção judicial, tem o desplante de vir dizer que não foram declarações sérias, significando dizer que foi a brincar; que denunciou o contrato a brincar; que quando diz nos artºs 69º e 70º da Contestação dos autos principais “não poder suportar a renda exigida pela Autora” e “por isso denunciou o contrato de arrendamento”, foi a brincar; que pediu indemnização das obras na correspondência e nos autos principais a brincar; que não pagou renda a brincar; que foi tudo a brincar e a fazer de conta, como se não estivéssemos a tratar de assuntos sérios e fossem meras brincadeiras infantis e inconscientes.
18) Porém, para agravar esta inconsequente alusão da Ré, o douto despacho recorrido vem dar-lhe cobertura, na parte pela Ré mais desejada, que é a de continuar a perpetuar o uso e abuso do imóvel da Autora, explorá-lo comercialmente de modo gracioso, à custa da Autora, tudo fazendo para que, aproveitando a já de si demora da justiça, os autos se prolonguem e arrastem pelas instâncias, tantas quantas possível e o máximo de tempo em cada uma delas, para que perdure por muitos e longos anos, tudo, claro, com manifesto lucro injustificado e abusivo em seu exclusivo proveito e à custa exclusiva e com grande e irreparável prejuízo da Autora! 
19) A denúncia contratual é um acto declaratório unilateral por natureza, sendo que a denúncia do contrato de arrendamento pelo arrendatário é um acto unilateral e irrevogável, cf. resulta dos art.ºs 51º, nº 3 alínea d), ex vi 53º e 34º do NRAU e 1100º do Código Civil, pelo que está denunciado, definitivamente, não sendo sério e não fazendo qualquer sentido dizer agora que pretende pagar “as rendas”, para que não há qualquer causa, e dizer que as está a depositar, o que se desconhece e está impugnado, quando nenhuma relação arrendatícia ou outra existe, confessadamente, aliás, pela Ré, nem a Autora alguma vez reconheceu ou admitiu a sua repristinação.
20) A denúncia contratual consubstancia-se numa declaração unilateral do termo negocial e, nos termos do disposto no art.º 224º, nº 1 do Código Civil, “A declaração negocial que tem um destinatário torna-se eficaz logo que chegue ao seu poder ou é dele conhecida” e, o art.º 230º, nº 1 do mesmo código, determina que “Salvo declaração em contrário, a proposta de contrato é irrevogável depois de ser recebida pelo destinatário ou de ser dele conhecida”, o que, mutatis mutandis, se aplica na denúncia do contrato.
21) Aliás, o sobredito art.º 34º nº 1, do NRAU, prescreve que “Caso o arrendatário  denuncie o contrato, a denúncia produz efeitos no prazo de dois meses a contar da receção pelo senhorio da resposta prevista na alínea d) do nº 3 do artigo 31º, devendo então o arrendatário desocupar o locado e entregá-lo ao senhorio no prazo de 30 dias”.
22) Consequentemente, a denúncia produziu efeitos no final do prazo, que no art.º 134º da Contestação/Reconvenção a Ré assumiu e declarou ter operado os efeitos em 30/09/2013, pelo que está definitivamente denunciado e não é revogável ou repristinável, pelo menos sem o consentimento da Autora, que não o deu; nem é sério nem legítimo a Ré questionar infundadamente essa denúncia, que ponderada e conscientemente a própria Ré operou por aquela carta de 30/07/2013 (Doc. nº 7 da PI), não tendo, por conseguinte, tal alusão qualquer cobertura ou relevo substantivo e tão pouco qualquer enquadramento processual, e muito menos poderá ter cobertura jurisdicional.
23) O contrato de arrendamento extinguiu-se definitivamente com a produção de efeitos da denúncia, esta não é revogável, e não tem cabimento nem faz qualquer sentido a alegada, ainda que não pedida, manutenção, e o douto despacho recorrido incorreu em erro ao acolher tal alegação e ao indeferir a prestação de caução.   
24) Mal andou o Tribunal a quo no douto despacho recorrido, que fez má interpretação dos factos e do direito e enferma de vício de nulidade por falta de especificação dos fundamentos de direito, por contradição entre os factos e o direito aplicável, e pronuncia-se e toma conhecimento sobre matéria que não tem a cobertura do direito e em que sustenta a decisão, violando, designadamente, os artºs 615º, nº 1, alíneas b), c) e d) do Código de Processo Civil; artºs 224º, nº 1, 230º, nº 1, 1100º e 334º do Código Civil e artºs 51º, nº 3, alínea d), 53º e 34º do NRAU, aprovado pela Lei nº 6/2006, de 27 de Fevereiro, na redacção dada pela Lei nº 31/2012, de 14 de Agosto. 
                                           *
A recorrida apresentou as suas alegações, com as seguintes conclusões:
Iª) Em sede de Contestação na ação principal, designadamente nos seus art°s 8° a 15°, a Ré alegou que ao fim de 3 anos de silêncio, e mais um sem chegar a qualquer solução, comunicou à A. que considerava as comunicações "descritas nos artigos 7o a 9° da p. pretensamente remetidas à Ré em representação da Autora., sobre a transição do arrendamento para o NRAU, "como declarações não sérias, pelo que reiniciava o pagamento das rendas"',
2ª) Mais alegou que "Ofereceu nomeadamente todas as rendas anteriores, desde a denúncia do arrendamento, em que, naturalmente, deixou de as pagar;":
E que,
3ª) “A Autora não aceitou o pagamento e, consequentemente, a Ré passou a efetuar depósito liberatório, à ordem do tribunal;";
4ª) Os documentos, de 1 a 23, cuja junção se efectuou com o requerimento de ampliação do pedido, mostram inequivocamente as razões pelas quais a Ré declarou considerar todas as comunicações efectuadas pretensamente em representação da Autora como não sérias e, portanto, inválidas e ineficazes - o que sucedeu pelo facto de nunca ter sido remetida à Ré prova dos poderes de representação da Autora, por quem em seu nome efetuou tais declarações, insistentemente solicitada pela Ré, ao abrigo do art° 260° do Código Civil;
5ª) E uma vez que tal prova nunca lhe foi remetida, e mesmo passados cerca de quatro anos, nunca a Autora ratificou tais declarações, era lícito à Ré revogar a sua própria declaração, conforme art° 268°, n° 4, do mesmo Código Civil;
6ª) Tais documentos mostram igualmente como á Ré ofereceu à Autora todas as rendas, assim como mostram que a Autora as não aceitou; E mostram como a Ré  passou a efectuar mensalmente os depósitos liberatórios à ordem do tribunal - o que nunca até ao momento deixou de fazer;
7ª) E, pois, inequívoco que na acção está em discussão a continuidade do arrendamento, invocada pela Ré em sede de Contestação;
8ª) Inequívoca, aliás, entende a Ré também, ser a justeza da retoma do arrendamento, demonstrada pelos referidos documentos;
9ª) Assim, a douta decisão recorrida não merece nesta parte qualquer reparo;
Por mera cautela,
10ª) A Ré requer a ampliação do recurso a título subsidiário, nos termos do art° 636°, nº 1 e 2 do CPC;
Com efeito,
11ª) Na sua oposição à caução, e como supra exposto, a Ré alegou que, no caso dos autos, verificam-se várias limitações ao exercício do direito invocado pela A., designadamente o abuso do direito, o estado de necessidade e a colisão de direitos;
12ª) Sobre o abuso do direito, a Ré alegou em síntese que: é inquestionável ter a Ré direito a receber elevadas quantias a título de benfeitorias; As quantias assentes por sentenças transitadas em julgado, com os juros, ascendem no presente momento a mais iie 500.000,00€;Desse dinheiro dependem “a vida e a morte" da Ré; Com cs se dinheiro a Ré pode instalar-se em outro lugar e prosseguir a sua atividade; Sem esse dinheiro, a Ré deixará de poder exercer a sua atividade e extinguir-se-á irremediavelmente; Não tinha nem tem outra forma de pagar aos seus credores, sem receber da Autora ou prosseguir a atividade no locado; Não... tem condições para pagar salários, e/ou indemnizações devidas ao seu pessoal pela extinção dos postos de trabalho; A Ré tem ao seu serviço 15 funcionários; Se não fossem as obras constantemente efetuadas pela Ré o prédio já nem existiria; O que a Ré retém é um prédio basicamente erguido por st;
13ª) O artigo 3341’ do Código Civil, reportando-se ao abuso do direito, dispõe que “E ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito."; Ora,
14ª)A Autora excede os limites impostos pela boa-fé na medida em que alega da forma supra exposta, tanto na ação como no incidente, pretendendo não se verificar o direito de retenção (que diz mesmo não ter sido invocado), nada ter a pagar à Ré e, pelo contrário, pretender ela Autora receber quantias exorbitantes e sem qualquer causa;
15ª)A boa-fé impunha à Autora, ao menos, que reconhecesse os legítimos direitos da Ré a ser ressarcida das benfeitorias que realizou; Ao menos das que foram dadas por assentes em tribunal;
16ª)Dispondo a Autora, como revela, de tais quantias, estado estas assentes em decisões transitadas em julgado, e não as pagar e pretender litigar, por certo durante muitos anos, sobre uma tal questão, só pode ter um fim em vista: o de asfixiar financeira e economicamente a Ré, de modo a provocar a sua extinção;
17ª) A entrega do imóvel sem o recebimento do devido por parte da Ré provocará de imediato a cessação da sua atividade;
18ª) Gera de imediato a perda dos postos de trabalho dos seus funcionários, colocando em séria crise a subsistência dos respectivos agregados familiares;
19ª) E também dos agregados familiares de dois sócios da Ré, que são remunerados por esta;
20ª) O exercício de um tal direito excede manifestamente os limites impostos pela
" boa-fé e pelos bons costumes";
21ª) Não pode aceitar-se que exerça um direito de boa-fé quem, como a Autora: a) tendo visíveis disponibilidades financeiras se furta a um pagamento definido judicialmente; b) sabe que a falta desse pagamento gera as maiores dificuldades à Autora, designadamente a cessação da sua atividade e com esta a perda dos postos de trabalho dos seus funcionários; c) e pretende substituir o direito de retenção por caução, abrindo caminho a que durante muitos anos a Ré não seja ressarcida;
22ª)E "ofende o sentimento jurídico social dominante" que o "mau pagador" possa destruir a vida de uma empresa, ou impedir a sua atividade, e possa colocar em crise os direitos dos seus credores e os postos de trabalho de diversos seus funcionários, com base na negação de evidentes direitos da Ré e afirmação de direitos menores, e quando demonstra ser pessoa abastada, que pode facilmente pagar o que inquestionavelmente deve;
Conforme Acórdãos do Venerando TRL:
Proc° 16442: "Traduz abuso do direito o exercício de qualquer direito por forma anormal quanto à sua intensidade ou à sua execução de modo a poder comprometer o gozo dos direitos de terceiro e a criar uma desproporção objetiva entre a utilidade do exercício por parte do seu titular e as consequências que outrem tem de suportar.";
Proc° 67971: "O abuso do direito abrange também o exercício de direito que faça clamorosamente ofensiva do sentimento jurídico dominante de modo a colocar em causa o gozo de direitos de terceiro, criando uma desproporção objetiva entre a utilidade do exercício do direito pelo seu titular e as consequências que outros têm de sofrer..
23ª) Patente está igualmente o "abuso do direito" na modalidade de "venire contra factum proprium" na medida em que, estando clarissimamente reconhecidos os valores que a Ré reclamou, a Autora os não quer pagar, sendo certo que não tinha dificuldades em fazê-lo,
Por outro lado,
24ª) O artigo 33911 do Código Civil dispõe que "É lícita a acção daquele que destruir ou danificar coisa alheia com o fim de remover o perigo atual de um dano manifestamente superior, quer do agente quer de terceiro";
25ª) Não estão em causa a destruição nem o dano, está em causa o simples uso; Mas como é regra do Direito "quem pode o mais, pode o menos"; pelo que com o fim de acautelar o perigo da sua extinção (só equiparável à morte nas pessoas singulares) e dos interesses dos seus trabalhadores, a Ré carece de exercer a sua actividade no locado; E carece, como é bem patente, de continuar a exercê-la enquanto não lhe forem pagas as benfeitorias;
26ª) Ora, a caução em substituição do direito de retenção impede a continuação da utilização, com as mencionadas consequências, e conflitua com um verdadeiro "direito à vida" por parte da Ré;
27ª) Em tal conflito, o caso sub judice é também subsumível às regras da "colisão de direitos”, previsto pelo artigo 335° do Código Civil, nos termos do qual "Se os direitos forem desiguais ou de espécie diferente, prevalece o que deva considerar-se superior.
28ª) Ponderado o alegado pela Ré é manifesto que o direito de retenção e de utilização do locado é superior ao direito da Autora, designadamente o da entrega do prédio pela via da pretendida substituição do direito de retenção;
29ª) Assim, ainda que não estivesse em discussão a subsistência do arrendamento, nunca a caução oferecida em substituição do direito de retenção pode ser admitida;
30ª) Ainda que o fosse, o montante oferecido também não seria suficiente;
31ª) O montante oferecido é igual ao montante reclamado pela Ré; mas entretanto vêm correndo juros de mora legais de 4%; e o litígio poderá durar muitos anos;
32ª) A Autora, uma vez que lhe seja entregue o prédio, pode dar-lhe o destino que quiser, designadamente vendê-lo; e chegado o momento de efetuar reforços da caução a Autora pode não os fazer;
33ª) A Ré, nessa altura poderá readquirir o direito de retenção; Mas nessa altura, será tarde: a Ré já se terá extinguido e o prédio não será da Autora;
34ª) A Ré deve ser permitido manter o direito de retenção e de exploração do locado enquanto lhe não for pago o devido;
35ª) A douta decisão recorrida não se pronunciou sobre qualquer uma destas questões;
Assim,
36ª)- Por mera cautela e a título subsidiário, para o caso de provimento do recurso sobre a questão do arrendamento (sem conceder), a Ré pretende que sejam apreciadas estas questões, pelo que requer a ampliação do recurso;
37ª)- Estas questões têm um elevado grau de evidência, designadamente no tocante ao montante das indemnizações julgado por decisões transitadas em julgado;
38ª)- Mas, eventualmente, podem tais questões não ser susceptíveis de apreciação sem a produção de prova; Nesse caso, deverá esse Venerando Tribunal ordenar que os autos baixem à Ia Instância para a produção de prova e decisão sobre as mesmas;
39ª). por mera cautela e a título subsidiário, igualmente se argui a nulidade da douta decisão da Ia Instância;
40ª)- E certo que a douta decisão recorrida ao decidir como decidiu sobre a questão da subsistência do arrendamento, e ao nada dizer sobre estas outras questões, tem como implícito que tais questões ficaram prejudicadas;
41ª)- A Ré entende, porém, que constituem matéria relevante que igualmente deveria ser apreciada pelo douto Tribunal a quo;
42ª)- Não o tendo feito, a decisão recorrida enferma de nulidade, por omissão de pronúncia, conforme disposto no artº 615º, nº 1, al. d) do CPC.
Nestes termos,
43ª) Deve o recurso ser julgado improcedente;
44ª) Caso assim se não entenda, deve ser apreciada a matéria alegada pela Ré e não considerada pela douta decisão recorrida.

A recorrente respondeu à ampliação do recurso requerida pela recorrida, formulando as seguintes conclusões:
1 – Inexistem os invocados “abuso de direito”, “estado de necessidade” e “colisão de direitos”.
2 – Defendendo A Ré que tem uma indemnização a receber da Autora de mais de 500.000€, assente em sentença com trânsito em julgado, não é nesta prestação de caução - nem nos autos principais - que tal se discute, tão pouco nesta pode ser invocado, sendo que a Ré tem de se definir de uma vez por todas se entende que tem uma indemnização assente judicialmente e falta apenas cobrá-la, como alega, ou não.
3 – É que, a tratar-se de indemnização assente judicialmente, não pode invocá-la e peticioná-la nos presentes autos principais e apenso, como faz, por violação de caso julgado, devendo ser expurgada dos presentes autos, não sendo estes os autos próprios para a cobrança,
4 - “a vida e a morte” da Ré, segundo esta, depende da subvenção da Autora, do que erradamente diz ser um direito, que não existe e nunca existiu, mas que, por não lhe ser reconhecido e ser questionado, entende tratar-se de abuso de direito da Autora.
5 - Segundo a Ré, a sua existência depende do financiamento da Autora, visão que é contrária ao direito e à vida em sociedade, mas esta não tem vocação nem fim de caridade, nem, aliás, a lei lhe permite.
6 - Objectivamente, a Ré assume que a sua existência e a razão dessa existência, é à custa da Autora, no passado, no presente e no futuro que quer perpetuar, a todo o custo.
7 - O choradinho da Ré de falta de meios para honrar as obrigações se não for à custa da Autora, e a desgraça de não poder suportar os custos nem ter fundos para se instalar noutro local, em primeiro lugar, não é verdadeiro e, em segundo lugar, não é fundamento para nada nesta sede de prestação de caução, tornando-se anómalo. 
8 - E defende a Ré que a caução não pode substituir o direito de retenção, por “abuso de direito”, “estado de necessidade” e “colisão de direitos” e, a coberto disso, lhe assiste o direito de usar e abusar do imóvel da Autora, explorando-o comercialmente contra a vontade desta, o que é, isto sim, um efectivo abuso de direito.
9 - A questão primeira – e única – da Ré nos autos, é pretender ser ressarcida pela Autora do que diz serem benfeitorias que executou no imóvel, sendo que, ao contrário do que pretende, nenhuma indemnização lhe está reconhecida.
10 - A Autora propõe-se prestar caução da descabida totalidade peticionada pela Ré, pelo que encontra-se assegurada a putativa indemnização, não se vislumbrando onde a Ré descortina, a não ser na sua sinuosa mente, o invocado “abuso de direito”, “estado de necessidade” ou “colisão de direitos”, que inexistem.
11 - Não há pela Autora qualquer exercício anormal do direito, bem pelo contrário, pretende-se com a caução assegurar o putativo direito reclamado pela Ré; e não se vê onde esta encontra a desproporcionalidade, objectiva e subjectivamente.
12 - Pugna ainda a Ré pelo estado de necessidade que, segundo alega, “carece de exercer a sua actividade no locado”, à custa da Autora e quando já não há locado.
13 - O direito de retenção não engloba nem legitima a exploração comercial do bem, que a Ré vem defender com argumentos falsos, especulativos e contrários aos mais elementares princípios de razoabilidade e bom senso, e às regras de direito, sendo que a exploração comercial do imóvel pela Ré contra a vontade da Autora, é que é manifesto abuso de direito e enriquecimento ilegítimo e ilícito, nada justificando e não tendo qualquer sustentação o que a Ré alega.
14 - A Ré nenhum direito indemnizatório tem sobre a Autora mas, ainda que, em tese, possa vir a ter, diz a Ré que 611.932,53 € de caução para o efeito, correspondente a tudo o peticionado, “já lhe não vai valer de nada”, “perde ou corre o risco de perder tudo”, sendo que a caução oferecida satisfaz integralmente a totalidade da putativa indemnização. Enfim, só falta a Ré dizer o que porventura lhe vai na alma, de querer da Autora o prédio e a indemnização! 
15 - Para além do mau gosto da Ré em questionar a representação do mandatário da Autora que, aliás, bem conhecia, até pela representação na acção que havia então terminado, a carta de 01/07/2013 em representação da Autora (Doc. nº 6 junto à PI), está subscrita pelo então mandatário e pelo gerente da Autora, nessa qualidade, com aposição de carimbo desta [Ponto 9) dos Factos Assentes], pelo que soçobra o inquinado argumento da Ré que, em qualquer caso, sempre ficaria ultrapassado com a subsequente denúncia do contrato, pela carta da Ré de 30/07/2013 (Doc. nº 7 junto à PI).  
16 - A ampliação do pedido e da causa de pedir apresentada pela Ré foi negada, decisão com que a Ré se conformou e transitou em julgado, não podendo continuar a invocar esta matéria e muito menos para fundamentar o que quer que seja.  
17 - As questões “ampliadas” pela Ré no âmbito do presente recurso, ao contrário do por esta sugerido, não carecem de produção de prova, designadamente em sede do presente incidente de prestação de caução, tratando-se de conclusões a tirar a final em face da prova das questões inerentes ao objecto do litígio dos autos principais.
18 - E a douta sentença não enferma de nulidade nos termos invocados pela Ré, sendo que a matéria que a Ré pretendia ver acolhida com a ampliação do pedido e causa de pedir dos autos principais, e que nas contra-alegações reitera, foi indeferida in totum pelo douto despacho de 21/02/2019, sob a refª 117381836, indeferimento este já transitado em julgado, não a podendo a Ré repristinar, como parece pretender, não lhe sendo legítimo continuar a invocar os factos e pretensões que definitivamente não lhe foram admitidos.
19 - O mesmo se diga quanto à confissão da Ré ao alegado no artº 12º da PI dos autos principais, confissão que pretendeu retirar no presente incidente, mas que lhe foi negado pelo douto despacho de 22/02/2019, sendo que, quanto a este, não o pode pôr em crise com a presente “ampliação do âmbito do recurso”, encontrando-se a decisão, nesta parte, já transitada em julgado.  
20 - E vem ainda a Ré alegar que o Doc. nº 6 junto à PI não tem aposto o carimbo, o que, por um lado, não é verdade, pois, como resulta do mesmo documento em suporte electrónico, é visível o carimbo e, por outro lado, é matéria assente no Ponto 9) do douto despacho de 22/02/2019, que não pode ser atacada na ampliação do âmbito do recurso e, nesta parte, já se encontra transitada em julgado, e tal como se encontra expressamente aceite no artº 1º da Contestação dos autos principais, relativo à alegação ínsita no artº 9º da PI dos mesmos autos principais. E, por outro lado ainda, o original deste documento encontra-se na posse da Ré e esta tem plena consciência da falsidade que invoca, agindo venire contra factum proprium, o que é bem evidenciador da sua postura processual.
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O recurso foi admitido como sendo de apelação, com subida imediata nos próprios autos e com efeito suspensivo da decisão.
Mais se pronunciou a Exma. Juiz a quo relativamente às nulidades imputadas à decisão recorrida, propugnando pela sua improcedência.
                                                *
Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.
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II. Objecto e delimitação do recurso
Consabidamente, a delimitação objectiva do recurso emerge do teor das conclusões do recorrente, enquanto constituam corolário lógico-jurídico correspectivo da fundamentação expressa na alegação, sem embargo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer ex officio.
De outra via, como meio impugnatório de decisões judiciais, o recurso visa tão só suscitar a reapreciação do decidido, não comportando, assim, ius novarum, a criação de decisão sobre matéria nova não submetida à apreciação do tribunal a quo.
Por outro lado, ainda, o recurso não é uma reapreciação ‘ex novo’ do litígio (uma “segunda opinião” sobre o litígio), mas uma ponderação sobre a correcção da decisão que dirimiu esse litígio (se padece de vícios procedimentais, se procedeu a incorrecta fixação dos factos, se fez incorrecta determinação ou aplicação do direito aplicável). Daí que não baste ao recorrente afirmar o seu descontentamento com a decisão recorrida e pedir a reapreciação do litígio (limitando-se a repetir o que já alegara na 1ª instância), mas se lhe imponha o ónus de alegar, de indicar as razões porque entende que a decisão recorrida deve ser revertida ou modificada, de especificar as falhas ou incorrecções de que em seu entender ela padece, sob pena de indeferimento do recurso.
Ademais, também o tribunal de recurso não está adstrito à apreciação de todos os argumentos produzidos em alegação, mas apenas – e com liberdade no respeitante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito – de todas as “questões” suscitadas, e que, por respeitarem aos elementos da causa, definidos em função das pretensões e causa de pedir aduzidas, se configurem como relevantes para conhecimento do respectivo objecto, exceptuadas as que resultem prejudicadas pela solução dada a outras.
Assim, em face do que se acaba de expor e das conclusões apresentadas, são as seguintes as questões a resolver por este Tribunal:
1. Apreciação das nulidades imputadas à decisão recorrida.
2. Possibilidade de prestação espontânea de caução, para exclusão de direito de retenção por despesas efectuadas por causa da coisa reivindicada, quando o réu excepcionou a manutenção de contrato de arrendamento sobre o mesmo imóvel.
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III. Os factos
Da 1ª instância receberam-se, como provados, os factos:
1. A Autora é desde 05/12/1996 dona e legítima proprietária do prédio urbano sito na Praceta à Rua Joaquim Nunes Ereira, nº …, Cascais, composto de uma moradia com cave, rés-do-chão e 1º andar, com 434,00 m2 de área coberta e de implantação e 915,00 m2 de área de construção, e com  logradouro/jardim com a área de 2.012,00 m2, descrito na 1ª Conservatória do Registo Predial de Cascais sob o nº 00015 da freguesia de Cascais e inscrito na matriz predial urbana da União das Freguesias de Cascais e Estoril sob o art.º 6781 (doc. 1 anexo à p.i. dos autos principais)
2. Os antecessores proprietários, Fernando …… e mulher, Maria ……., por contrato-promessa de arrendamento comercial celebrado em 11 de Maio de 1988, deram de arrendamento o prédio supra identificado, a Luís Pereira de Jesus (Doc. nº 3 anexo à p.i. dos autos principais).
3. Luís ……. instalou no prédio uma unidade hoteleira – residencial, denominada “Albergaria ……”.
4. Em 1996 Luís ……. cedeu a sua posição contratual de arrendatário à sociedade ora Ré, e esta continuou a explorar comercialmente o imóvel como unidade hoteleira – residencial “Albergaria”.
5. Em 1997, a Ré abandonou a exploração do prédio como unidade hoteleira residencial “Albergaria” e aí instalou e passou a explorar uma Casa de Repouso-Lar de Idosos.
6. Em 2004, foi intentada uma ação de despejo pela aqui Autora contra a ora Ré, processo que correu termos neste Tribunal de Cascais, 1º Juízo Cível, sob o nº 4483/04.1TBCSC, que veio a improceder, pelo que a Ré continuou a explorar, normalmente, o Lar de Idosos no prédio (doc. 1 anexo à contestação dos autos principais).
7. Em Maio de 2013 a renda mensal era de 299,28 € e, o então mandatário da Autora (que havia patrocinado a ação de despejo), em nome e representação desta, por carta de 27/05/2013,comunicou à ora Ré a alteração contratual de transição para o NRAU com prazo certo e, atento o facto de saber tratar-se de microempresa, com a determinação do novo valor da renda limitado a 1/15 do VPT (que era e é de 382.470,00), definido nos termos do art.º 38º do CIMI, correspondente a 2.124,83 € por mês, ao abrigo do disposto no art.º 54º, nº 2 do NRAU. (Doc. nºs 2 e 4, anexos á referida p.i.)
8. A Ré respondeu por carta de 27/06/2013, invocando não aceitar as alterações propostas nem o aumento da renda (Doc. nº 5 anexo à referida p.i.).
9. A Autora respondeu através do seu mandatário por carta de 01/07/2013, aceitando a não passagem imediata para o regime do NRAU e a não definição de prazo certo, e não aceitando a recusa de aumento legal da renda para 1/15 do VPT e, porque a Ré havia questionado a legitimidade do mandatário, este fez subscrever a mesma carta pelo gerente da ora Autora, com aposição de carimbo. (Doc. nº 6 anexo á p.i.).
10. Na resposta da Ré por carta de 30/07/2013, rececionada pelo mandatário da Autora no dia seguinte, depois de fazer algumas considerações, comunicou à Autora que:
 “11 – Damos, porém, essa questão, por prejudicada, na medida em que decidimos pôr termo ao arrendamento.
12 – Por este meio, informamos pois, Vª Exª de que denunciamos o contrato, nos termos previstos pela al. d) do nº 3 do artº 51º, do NRAU, na redação dada pela Lei nº 31/2012, de 14/8.
13 – Solicitamos, assim, que nos sejam pagas as quantias apuradas no Procº 4483/04.1TBCSC, que é do V/conhecimento, e que constam das respetivas decisões judiciais, a título de benfeitorias que a Cascais Jardim executou e suportou.
14 – Mais informamos, que até ao completo ressarcimento dessas quantias, exerceremos sobre o arrendado direito de retenção” ( Doc. nº 7 anexo á p.i,).
11. A Ré não fez a entrega do imóvel à Autora e detém-no, usa-o e explora-o lucrativamente contra a vontade da Autora. 
12. A A. interpôs a presente ação, pedindo a condenação da R. a:
“a) reconhecer e respeitar o direito de propriedade da Autora sobre prédio;
b) entregar de imediato o prédio à Autora, livre e devoluto de pessoas e bens e no estado em que o recebeu;
c) pagar à Autora o montante mensal mínimo de 3.500,00 € (três mil e quinhentos euros) de indemnização pelo prejuízo arrendatício sofrido pela Autora, ou a título de enriquecimento sem causa pela ocupação e exploração comercial e lucrativa do prédio, correspondente ao valor mínimo da renda, desde 01/10/2013 até à efetiva entrega, liquidando-se até 31/01/2018 o montante de capital de 182.000,00 € (cento e oitenta e dois mil euros), acrescido de juros de mora vencidos e vincendos, desde cada um dos meses de exploração até efetivo pagamento, à taxa legal de 4%;
d) pagar à Autora o montante de 299,28 € (duzentos e noventa e nove euros e vinte e oito cêntimos), referente ao mês de Setembro de 2013, acrescido de juros de mora desde a data de vencimento até efetivo pagamento, à taxa legal de 4%;
e) pagar uma sanção pecuniária compulsória, em montante não inferior a 200,00 € (duzentos euros) por cada dia de atraso na entrega do imóvel, desde a citação até efectiva entrega à Autora.”
13. A R. apresentou contestação e deduziu pedido reconvencional, concluindo pela condenação da A. :
“a) A pagar à Ré as benfeitorias necessárias e quantias respetivas dadas por provadas na Ação nº 4483/04.1TBCSC, do ex-1º Juízo Cível do Tribunal de Cascais, no montante de 453.436,14 €;
b) A pagar à Ré os juros de mora sobre tal quantia, vencidos até 15/3/2018, à taxa legal de 4%, no montante de 90.836,30€;
c) A pagar à Ré, à taxa legal que se verificar, os juros vincendos que se verificarem até integral pagamento;
d) A pagar à Ré as benfeitorias necessárias ou úteis que não possam ser levantadas sem detrimento do imóvel desde o início de 2004 até esta data, no montante de (49.505,09€+18.185,00€)67.690,00€.
e) A pagar à Ré os juros de mora que se verificarem sobre tais quantis a partir da notificação da presente reconvenção”.
14. Na contestação e reconvenção, alegou, além do mais, que denunciou o contrato de arrendamento, a A. não efetuou o pagamento das benfeitorias, a R. não entregou o imóvel e posteriormente, comunicou à A. que considerava declarações não sérias as cartas remetidas em nome da A. para aumento de renda e consequentemente o contrato em vigor e retomou p pagamento de rendas; realizou obras no locado no valor peticionado.
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IV. O Direito
1. Da arguição de nulidade da sentença
A primeira questão a apreciar consiste na apreciação da arguição de nulidade da decisão final do presente incidente de prestação espontânea de caução.
Repare-se que, pela natureza subsidiária e condicionada à procedência das conclusões apresentadas pela recorrente, apenas cuidamos nesta fase da invocada nulidade por banda da recorrente e não da nulidade invocada pela recorrida, em sede de ampliação do âmbito do recurso, nos termos do art. 636º, nº2 do Cód. Proc. Civil.
O artigo 615º, nº1 do Código citado, sob a epígrafe «Causas de nulidade da sentença», dispõe:
1. É nula a sentença quando:
a) Não contenha a assinatura do juiz;
b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível;
d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;
e) O juiz condene em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido.
Os vícios determinantes da nulidade da sentença correspondem a casos de irregularidades que afectam formalmente a sentença a provocam dúvidas sobre a sua autenticidade, como é a falta de assinatura do juiz, ou ininteligibilidade do discurso decisório por ausência total de explicação da razão por que decide de determinada maneira (falta de fundamentação), quer porque essa explicação conduz, logicamente, a resultado oposto do adoptado (contradição entre os fundamentos e a decisão), ou uso ilegítimo do poder jurisdicional em virtude de pretender conhecer questões de que não podia conhecer (excesso de pronúncia) ou não tratar de questões de que deveria conhecer (omissão de pronúncia).
São, sempre, vícios que encerram um desvalor que excede o erro de julgamento e que, por isso, inutilizam o julgado na parte afectada.
Cumpre recordar que este preceito não versa apenas sobre as nulidades da sentença, mas de qualquer decisão seja qual for a forma que assuma, mesmo que nela não se conheça do mérito da causa (veja-se o Ac. desta Relação, de 5-6-2007, disponível em www.dgsi.pt.).
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Atribui a recorrente à decisão em crise, o vício da nulidade, “por falta de especificação dos fundamentos de direito”, previsto na alínea b) do n.º 1 do citado art.º 615.º.
Como é sabido, ao juiz cabe especificar os fundamentos de facto e de direito da decisão que profere, nos termos do disposto no art.º 607.º, n.ºs 3 e 4 do mesmo Código, para que a decisão que profere seja perceptível para os seus destinatários.
Como é entendimento pacífico, só a falta absoluta de fundamentação, entendida como a total ausência de fundamentos de facto e de direito, gera a nulidade prevista na al. b) do nº 1 do citado artigo 615º.
A fundamentação deficiente, medíocre ou errada afeta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade, na expressão utilizada pelo Tribunal da Relação de Guimarães, no Ac. de 16/6/2016 (Miguel Baldaia Morais), disponível em www.dgsi.pt.
Na doutrina, veja-se Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil Anotado, vol. V, pág. 140, Antunes Varela, in Manual de Processo Civil, pág. 687 e Lebre de Freitas, in Código de Processo Civil Anotado, vol. II, pág. 669.
Citando Antunes Varela, ob. cit., pg. 688: Por um lado, o julgador não tem que analisar todas as razões jurídicas que cada uma das partes  invoque em abono das suas posições, embora lhe incumba resolver todas as questões suscitadas pelas partes; a fundamentação da sentença contenta-se com a indicação das razões jurídicas que servem de apoio à solução adoptada pelo julgador.
Por outro lado, não é indispensável, conquanto seja de toda a conveniência, que na sentença se especifiquem as disposições legais que fundamental a decisão: essencial é que se mencionem os princípios, as regras, as normas em que a sentença se apoia.
Para exemplificar, não se tornará necessário que o juiz diga: «nos termos do disposto no artigo 219º do Código Civil», bastando que indique, nesse aspecto, ser ao abrigo do princípio da liberdade de forma que considera válido o negócio impugnado.
Nesta linha de pensamento, será natural o juízo de improcedência da arguida nulidade.
Salta à vista, com a clareza do relâmpago, o raciocínio jurídico adoptado pela Exma. Juíza a quo, sendo acessível a um entendedor médio, a reconstituição do silogismo judiciário que seguiu, aplicando à premissa menor (a situação de facto respigada dos autos) a premissa maior (a razão de direito, que não a simples citação de uma norma positiva), para chegar à conclusão a que chegou.
Repare-se que a Exma. Juíza dedicou à análise jurídica as seguintes expressões, que plasmou na decisão:
A A. pretende neutralizar o efeito do direito de retenção mediante a prestação de caução pelo valor das benfeitorias reclamadas pela R., assim, visando obter a entrega do imóvel.
Se apenas estivesse em causa o valor de indemnização das benfeitorias e direito de retenção do imóvel até ao pagamento da correspondente indemnização, assistiria à A. o direito de obter a entrega do imóvel mediante prestação de caução idónea.
Todavia, nos autos principais, encontra-se em discussão a cessação/manutenção do contrato de arrendamento, como resulta do acima exposto.
Com efeito, não obstante a R. ter aceite que procedeu à sua denúncia, extinguindo-se o mesmo (v.g. artº 12º da p.i., aceite no artº 1º da contestação) alegou também que posteriormente comunicou à A. que considerava as declarações desta como não sérias (v.g. relativas ao aumento de renda), que considerava o contrato em vigor e retomou o pagamento das rendas, concluindo pela improcedência da ação.
Ora, perante as questões que se mostram em discussão nos autos principais (mormente a cessação versus manutenção em vigor do contrato de arrendamento), forçoso é concluir que a A. Não pode obter o fim visado com o presente incidente (entrega do imóvel locado) mediante prestação de caução, porquanto esta apenas seria idónea a garantir o eventual direito à indemnização por benfeitorias e conexo direito de retenção.
Pelo exposto, sem necessidade de mais considerações, julga-se improcedente, o presente incidente de prestação de caução.
Não se pode afirmar que a decisão sob recurso elimine o papel soberano da razão ou que a Exma. Juíz  a quo tenha deixado sobrepor, no seu espírito, ao chamamento claro da inteligência, as vozes misteriosas e incontroladas do sentimento e da intuição, recorrendo às imagéticas expressões de Antunes Varela, ob. cit., pg. 674, nota (1).
É verdade que a decisão recorrida não suporta qualquer norma positiva – no trecho de aplicação do direito -, mas, como vimos, tal peso não é indispensável à reconstituição do silogismo judiciário.
Essencial será que tal silogismo tenha sido efectuado e que os seus destinatários o consigam reconstituir – não por simples curiosidade intelectual, mas para que possam entender a «razão de direito» e, discordando, possam reagir nos termos legais.
Será, pois, de improceder a arguida nulidade.
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Em segundo lugar, arguiu a recorrente a «contradição entre os factos e o direito aplicável», invocando para tanto a al. c) do nº 1 do citado art. 615º.
Ora, refere-se esta invalidade à contradição entre os fundamentos e a decisão, não a uma «contradição entre os factos e o direito aplicável», cujo conteúdo útil não alcançamos.
Não vemos como se verificará tal contradição, em tese, pois o direito aplicável, pela sua natureza, não está em contradição com os fundamentos (de facto) a que se destina…
Contradição poderia existir entre o direito aplicado  e os fundamentos de facto, mas tal não consubstanciaria a nulidade prevista no citado art. 615º, nº1, al. c), antes consistindo em erro de julgamento, a apreciar em sede de recurso de mérito da decisão.
Veja-se, na explicação deste vício, Lebre de Freitas, ob. cit., pg. 670:
Entre os fundamentos e a decisão não pode haver contradição lógica; se, na fundamentação da sentença, o julgador seguir determinada linha de raciocínio, apontando para determinada conclusão e, em vez de a tirar, decidir noutro sentido, oposto ou divergente, a oposição será causa de nulidade da sentença. Esta oposição não se confunde com o erro na subsunção dos factos à norma jurídica ou, muito menos, com o erro na interpretação desta: quando, embora mal, o juíz entende que dos factos apurados resulta determinada consequência jurídica e este seu entendimento é expresso na fundamentação, ou dela decorre, encontramo-nos perante o erro de julgamento e não perante oposição geradora de nulidade; mas já quando o raciocínio expresso na fundamentação aponta para determinada consequência jurídica e na conclusão é tirada outra consequência, ainda que esta seja a juridicamente correcta, a nulidade verifica-se.
Ainda Antunes Varela, ob. cit., pg. 690: (…) há um vício real no raciocínio do julgador (e não um simples lapsus calami do autor da sentença): a fundamentação aponta num sentido; a decisão segue caminho oposto ou, pelo menos, direcção diferente.
Sem necessidade de maiores considerações, será de afastar a invocada nulidade, nenhuma contradição existindo entre a fundamentação aduzida pela Exma. Juiz a quo e a respectiva decisão.
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Invoca, em terceiro lugar a recorrente a nulidade da sentença, em virtude de a mesma se pronunciar sobre matéria que não tem a cobertura do direito e em que sustenta a decisão, com base, na sua perspectiva, na al. d) do nº 1 do art. 615º citado.
Será nula a sentença, nos termos do sobredito preceito, quando O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento.
Antunes Varela, ob. cit., pg. 690, descreve-nos este vício da seguinte forma:
A primeira causa de nulidade abrange os casos afins da omissão de conhecimento e do conhecimento indevido.
A primeira série de casos desta categoria (…) consiste no facto de a sentença não se pronunciar sobre questões de que o tribunal devia conhecer, por força do disposto no art.º 660º, nº2.
(…)
A segunda série de casos compreendidos na mesma alínea e a de recorte inverso – a do conhecimento de questões que a sentença não podia julgar, por não terem sido postas em causa.
Já Lebre de Freitas, ob. cit., pg. 670, reconduz o vício descrito na parte final desta alínea à seguinte situação: Não podendo o juiz conhecer de causas de pedir não invocadas nem de excepções na exclusiva disponibilidade das partes(…).
Não se alcança qual terá sido a questão conhecida pelo tribunal, ao arrepio de permissão legal, antes parecendo ao intérprete das alegações apresentadas que a recorrente discorda do silogismo judiciário efectuado, ou seja, a aplicação do direito aos factos.
Para tanto, veja-se o ponto 22) das conclusões apresentadas:
22) Consequentemente, a denúncia produziu efeitos no final do prazo, que no art.º 134º da Contestação/Reconvenção a Ré assumiu e declarou ter operado os efeitos em 30/09/2013, pelo que está definitivamente denunciado e não é revogável ou repristinável, pelo menos sem o consentimento da Autora, que não o deu; nem é sério nem legítimo a Ré questionar infundadamente essa denúncia, que ponderada e conscientemente a própria Ré operou por aquela carta de 30/07/2013 (Doc. nº 7 da PI), não tendo, por conseguinte, tal alusão qualquer cobertura ou relevo substantivo e tão pouco qualquer enquadramento processual, e muito menos poderá ter cobertura jurisdicional.
Ou seja, a recorrente discorda da decisão, discorda da aplicação do direito aos factos apurados e aos alegados pela recorrida (ainda controvertidos e apesar de, antes, não ver qualquer jurisdicidade na decisão) – e, por isso, recorre.
Mas não se vê qual terá sido a questão que o tribunal a quo apreciou, estando vedada tal apreciação.
Mais, do despacho recorrido não se pode retirar que a Exma. Juiz a quo tenha dado razão à defesa da ré ou à sua argumentação quanto ao fundo da causa, nomeadamente, quanto à repristinação do contrato de arrendamento antes denunciado.
Até porque tal questão se mostra controvertida e ainda não foi proferida qualquer decisão sobre o mérito da causa, quer da instância principal quer da reconvencional.
O que releva para a decisão do incidente de caução – sob recurso – será, antes, a constatação simples de que tal foi efectivamente alegado pela ré e, como tal, deverá ser oportunamente apreciado – quer em sentido de concordância quer não.
O que não pode a recorrente pretender é que a tramitação do processo e todas as decisões nele proferidas se baseiem exclusivamente na sua alegação ou na conformidade que fez à lide, desprezando-se a matéria excepcional ou reconvencional alegada pela parte contrária.
Caso contrário, não seria necessário ouvir a parte contrária…
A recorrente – e muito menos o tribunal - não podem apagar ou considerar como inexistente a posição processual da recorrida, sem prejuízo, repete-se, da oportuna apreciação do mérito desta.
Até lá, a recorrente terá que aceitar que constitui questão controvertida nos autos a vigência de um contrato de arrendamento relativo ao prédio reivindicado.
Não se acompanhando o salto lógico, que confunde o mérito ou a razão jurídica da defesa com a nulidade emergente da apreciação de questão ilícita.
Do que se conclui também pela improcedência desta invocada nulidade.
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2. Possibilidade de prestação espontânea de caução, para exclusão de direito de retenção por despesas efectuadas por causa da coisa reivindicada, quando o réu excepcionou a manutenção de contrato de arrendamento sobre o mesmo imóvel.
Invoca, por fim, a recorrente que a decisão recorrida viola o direito aplicável, nomeadamente os arts. 224º, nº1, 230º, nº1, 1100º e 334º do Código Civil, 51º, nº3, d), 53º e 34º do NRAU, citando a sua alegação.
A apreciação supra efectuada quanto ao juízo que a recorrente faz ao direito aplicável, responde também ao mérito desta alegação, condenada ao insucesso.
Dos autos principais flui como controvertida uma questão relevante: a vigência de um contrato de arrendamento relativo ao prédio reivindicado.
Veja-se, aliás, o teor do despacho proferido nos autos principais, em 21/2/2019, relativo à pretendida ampliação do pedido reconvencional:
A R. invocou como causa de pedir, no pedido reconvencional deduzido na contestação que desde o início do arrendamento efetuou ou suportou benfeitorias necessárias, efetuou denúncia do contrato de arrendamento, pelo que tem direito a ser compensado pelo respetivo valor, conforme discriminação a que procedeu (cfr. artºs 128º a 1120º).
E na ampliação do pedido, ora em análise, a R. alegou um conjunto de factos (alguns deles novos por referência à contestação) que integram causa de pedir diversa. Com efeito, o pedido reconvencional (pagamento do valor das benfeitorias executadas no imóvel locado) assenta na cessação do contrato de arrendamento, por denúncia da R., como expressamente consta dos art.ºs 132º a 137º daquela peça processual. Ao invés, a ampliação do pedido tem como fundamento a manutenção do contrato (causa de pedir diversa/oposta), concluindo por pedido formulado em conformidade, mantendo o pedido inicial, caso o “novo” não proceda.
Se é certo que já na contestação que apresentou a R. alegou factos atinentes à manutenção em vigor do contrato de arrendamento (o que suportará a sua conclusão de que a ação deve improceder, em sede de matéria de defesa), não podemos olvidar que o direito a benfeitorias realizadas pelo arrendatário, nos termos do disposto no artº 1074º do C.C. apenas surge na esfera judicia do arrendatário no fim do contrato, e que tais factos foram alegados pela R. na contestação (cfr. artºs 51º e ss.).
Em suma, sendo a causa de pedir e pedido reconvencional (inicial) o da obtenção do valor das benfeitorias realizadas, com fundamento na manutenção do contrato de arrendamento, a causa de pedir ora alegada para sustentar a ampliação do pedido é distinta (e até algo contraditória, não fosse admissível pedidos subsidiários e respetivas causas de pedir). Isto é, não só não estão preenchidos os requisitos para a alteração da causa de pedir, exigidos pelos artº 264º e 265º (não existe acordo da A., esta não efetuou confissão relevante e mostram-se ultrapassados os 10 dias a que alude o segundo preceito legal citado), como o pedido ampliado não é consequência nem desenvolvimento do pedido inicial.
E a nova causa de pedir também não pode ser enquadrada no regime do articulado superveniente, regulado no artº 588º do C.P.C., porquanto os factos alegados de novo, não se revestem da exigida superveniência objetiva ou subjetiva.
Em síntese, não obstante na contestação a R. se defender do pedido formulado pela A., pugnando pelo “renascimento do contrato de arrendamento”, em momento posterior à denúncia que efetuou (como defesa obstativa do efeito pretendido pela A. com a presente ação) – independentemente de pedido expresso, há que proceder a interpretação hábil do conjunto da peça processual, para considerar que o seu sentido só pode ser o de, precedendo a ação (por a tese da R. quanto à manutenção do contrato de arrendamento não lograr vencimento), impõe-se conhecer do pedido reconvencional relativamente às benfeitorias (que tem como pressuposto a cessação do contrato), assim, se entendendo que este se mostra formulado em termos subsidiários (para o caso de procedência da ação).
Ou seja, entendeu a Exma. Juiz a quo que a aí ré formulou pedido reconvencional de ressarcimento das benfeitorias efectuadas no locado, condicionado à procedência da instância principal.
Procedência essa que depende, também, da improcedência da matéria de excepção invocada pela ré, ora recorrida: a manutenção de um contrato de arrendamento relativo ao imóvel reivindicado.
Face a uma acção de reivindicação, se o autor encaminhar devidamente a demonstração do seu direito, o possuidor só pode evitar a restituição da coisa se conseguir provar uma de três coisas : - que a coisa lhe pertence, por qualquer do títulos admitidos em direito ; - que tem sobre a coisa outro qualquer direito real que justifique a sua posse - v.g. usufruto, arrendamento, retenção ; - que detém a coisa por virtude de direito pessoal bastante - v.g. um direito pessoal de gozo, para quem admita essa categoria – citando Menezes Cordeiro, in Direitos Reais, II, pg. 848.
A excepção foi invocada e deverá ser apreciada; até lá, não pode a ora recorrente obter a entrega imediata do imóvel (por apreciação parcial do mérito no despacho saneador?), pois não dispõe o tribunal da segurança jurídica que lhe permita concluir pela inexistência de qualquer obstáculo jurídico a essa entrega – nomeadamente, a inexistência de um vínculo jurídico que legitime a detenção do imóvel por parte da recorrida.
Ora, o fundamento para a prestação espontânea de caução encontrou-o a recorrente nos arts. 754º e 756º, d) do Código Civil, que efectivamente prevêem a exclusão do direito de retenção do credor de despesas efectuadas por causa da coisa retida, desde que o devedor dessas despesas preste caução suficiente.
Sucede que, repete-se, a recorrida não se limitou a invocar o direito de retenção, mas também e a título de excepção, a manutenção do contrato de arrendamento.
Mostrando-se a apreciação do pedido de ressarcimento das benfeitorias alegadamente efectuadas no imóvel – pressuposto daquele direito de retenção – condicionado à improcedência daquela excepção.
Isto posto, podemos concluir que a instauração em separado de um incidente autónomo para a prestação da caução é, no caso, desprovida de fundamento jurídico-processual.
Daí que nenhuma crítica haja a fazer à decisão recorrida, na medida em que a mesma assenta na correcta avaliação das posições das partes e do estado actual dos autos, inexistindo fundamento bastante para que a recorrente preste a caução oferecida.
Improcede, pois, o recurso.
Resultando prejudicada a apreciação dos fundamentos de ampliação do recurso e da arguição de nulidade da decisão recorrida, alegados pela recorrida a título subsidiário à procedência das questões suscitadas pela recorrente.
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IV. Decisão                               
Pelo exposto, acordam os juízes deste Tribunal da Relação em julgar improcedente o recurso de apelação interposto e, em consequência, em confirmar a decisão recorrida.
Custas pela recorrente – art. 527º do Cód. Proc. Civil.
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Lisboa, 26 de Setembro de 2019
Nuno Lopes Ribeiro
Gabriela de Fátima Marques
Adeodato Brotas