Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
2/19.3T8LRS.L1-7
Relator: ANA RESENDE
Descritores: BANCO
INTERMEDIÁRIO FINANCEIRO
DEVER DE INFORMAÇÃO
VIOLAÇÃO
RESPONSABILIDADE CIVIL
ÓNUS DA PROVA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 09/14/2021
Votação: MAIORIA COM * VOT VENC
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: A responsabilidade do intermediário financeiro existe perante qualquer pessoa, em consequência da violação de deveres respeitantes ao exercício da sua actividade, que lhes sejam impostos por lei ou regulamento emanado da autoridade pública, pelo que e decorrentemente, evidenciando-se que a prova do facto ilícito incumbirá ao lesado, já no que respeita à culpa, a mesma presume-se se o dano for causado no âmbito das relações contratuais ou pré-contratuais, e em qualquer caso, quando seja causado pela violação de deveres de informação.

Importa ainda ficar demonstrado o dano, correspondente à perda do capital entregue para subscrição do produto financeiro, descontando o rendimento, entretanto recebido pelo lesado, bem como apreciar a existência do nexo de causalidade, que deve resultar do factualismo apurado.

O juízo concreto a efectuar, maxime em termos do grau de culpa, importa necessariamente atender ao perfil do investidor, as características dos produtos financeiros subscritos, e o conhecimento de que dispunha, ou não, o intermediário, sempre ao tempo de pré-negociação e contratualização.

Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: ACORDAM NA 7ª SECÇÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA

      
I–Relatório


1.–A e B demandaram BANCO BIC PORTUGUÊS, SA pedindo:
a)- Declare que a aquisição do produto financeiro traduzido na compra de  obrigações SNL RENDIMENTO MAIS 2006, ao R. BPN, atual BIC, foi levada a efeito no pressuposto de que o produto financeiro em causa se mostrava a coberto da garantia dada pelo Banco Réu de reembolso do capital a 100%.
b)- Declare que é da responsabilidade do Banco Bic o reembolso do capital reportado à aquisição por parte do A da obrigação SNL RENDIMENTO MAIS 2006, no valor de 50.000,00€.
c)- Condene o R. a proceder ao imediato reembolso do capital de 50.000,00€, acrescidos dos juros vencidos desde 10.05.2015 sobre a obrigação SNL 2006, à taxa legal, até integral pagamento, a pagar a quantia indemnizatória a fixar em liquidação de sentença, mas nunca inferior a 10.000,00€ por danos sofridos pelo A e a sua esposa, com o comportamento imputável ao R., traduzido na informação falsa prestada pelo gerente de conta da Agência que conduziu a situação.
No entendimento de que o contrato é nulo,
d)-Julgar-se nulo o contrato de intermediação financeira celebrado entre o A e o R que deu origem à ordem de subscrição de 10.04.2006 de uma obrigação SNL RENDIMENTO MAIS 2006 no valor de 50.000,00€.
e)-Condenando-se o R a restituir ao A o valor de 50.000,00€ a crescido de juros de mora à taxa legal, desde 10.10.2015 e até efetivo e integral pagamento.

2.–Alegam para tanto que o gerente da conta do BPN ao inteirar-se das intenções de renovar um depósito a prazo, logo lhe propôs que antes adquirissem um produto financeiro que tinha as mesmas garantias e segurança de um depósito a prazo, mas que lhe daria um maior rendimento, tendo assim a solicitação do mesmo, em Abril de 2006, adquirido uma obrigação SNL 2006, no valor de 50.000,00€, com garantia de reembolso a 100%, e segurança de um depósito a prazo, sendo uma aplicação feita pelo prazo de 10 anos, podendo eventualmente proceder ao seu resgaste antecipado.
O A marido desconhecia, e ainda desconhece o que são obrigações, tendo primeiro o BPN, até outubro de 2012, e depois o R, a partir dessa data, satisfeitos os juros até maio de 2015.
Em outubro de 2011 pretendeu resgatar o capital investido, tendo sido informado que só no fim do prazo contratual o poderia fazer.
Vencido o prazo de dez anos o A foi informado que a aplicação financeira em causa não tem cobertura de garantia de capital, que é uma subscrição de obrigações da SNL – Sociedade Lusa de Negócios, SA, e que uma vez que a referida sociedade se mostra insolvente, não lhe seria concedido o resgate, podendo e devendo reclamar o montante no processo de insolvência, pois o Banco ao vender as referidas obrigações apenas funcionou como intermediário financeiro, vendendo por conta e risco da SNL.
Para além do Banco ter assumido contratualmente o pagamento do valor nominal do título financeiro adquirido, houve por parte do exercício da atividade financeira a violação dos elementares princípios orientadores dessa atividade, como sejam os ditames da boa fé, exigentes padrões de diligência, lealdade e transparência, orientadores dos deveres de informação.
Invoca também que merecendo a qualificação de investidor não institucional, o negócio de intermediação financeira não obedeceu à exigida forma escrita, sendo nulo o negócio e também a subscrição da obrigação, devendo ser restituído pelo Réu o entregue pelos AA.
Mais alude que confrontado com a ideia de perder todo o dinheiro levou a conflitualidade e destabilização familiar, que ainda ocorre, padecendo, assim como a A de depressão e angústia, vendo o A  agravado o seu estado de saúde, requerendo especiais cuidados de apoio médico e familiar por parte da sua esposa.
3.Citado, veio o R. contestar, invocando a prescrição e impugnando a realidade aduzida pelos AA.
4.Realizado julgamento, foi proferida sentença que julgou a ação improcedente, absolvendo o R. de todo os pedidos.
5.Inconformados vieram os AA. interpor recurso de apelação, formulando, nas suas alegações as seguintes conclusões:

PRIMEIRA
A MATÉRIA DADA COMO PROVADA NO ARTIGO 2. ° DO ELENCO DOS FACTOS DADOS COMO PROVADOS DEVE SER ALTERADA PASSANDO A CONSTAR A SEGUINTE REDACÇÂO:
- Sabendo disso, o gerente de conta do "BPN”, da agência de Torres Vedras, contactou-o no sentido de ele adquirir um produto financeiro do banco, no valor de €50.000,00.

SEGUNDA
A MATÉRIA DADA COMO PROVADA NO ARTIGO 3.° DO ELENCO DOS FACTOS DADOS COMO PROVADOS DEVE SER ALTERADA PASSANDO A CONSTAR A SEGUINTE REDACÇÂO:
-... informando-o de que o referido produto trazia um rendimento proveniente de juros remuneratórios e reembolso do capital a 100%, (cem por cento), explicando-lhe qual seria a rentabilidade esperada, e que havia a expectativa do banco de reembolsar antecipadamente o produto.

TERCEIRA
A MATÉRIA DADA COMO PROVADA NO ARTIGO 4.° DO ELENCO DOS FACTOS DADOS COMO PROVADOS DEVE SER ALTERADA PASSANDO A CONSTAR A SEGUINTE REDACÇÃO:
- Em 10 de Abril de 2006 o autor adquiriu o mencionado produto financeiro do banco, no valor de € 50.000,00 (cinquenta mil euros), através da subscrição do escrito particular que constitui o documento n.º 1 junto com a p.i., do qual consta, entre aspas, no canto superior esquerdo “BPN”, no canto superior direito "SLN 2006 Boletim de Subscrição” e a seguir, os dizeres “emissão de obrigações subordinadas”, “natureza da emissão: emissão de até 1.000 obrigações subordinadas, ao portador e sob a forma escritural, com o valor nominal de € 50.000,00 cada uma, oferecidas diretamente ao publico, ao preço unitário igual ao valor nominal (...)” a “data de liquidação financeira: 8 de Maio de 2006”, o “prazo e reembolso: o prazo da emissão é de dez anos, sendo o reembolso do capital efetuado em 09 de maio de 2016. O reembolso antecipado da emissão só é possível por iniciativa da "SLN - Sociedade Lusa de Negócios, SGPC, S.A.”, a partir do 5.° ano e sujeito a acordo prévio do banco de Portugal” e a “remuneração: juros pagos semestralmente e postecipadamente, as seguintes taxas: (...)”

QUARTA
A MATÉRIA DADA COMO PROVADA NO ARTIGO 8.° DO ELENCO DOS FACTOS DADOS COMO PROVADOS DEVE SER ALTERADA PASSANDO A CONSTAR A SEGUINTE REDACÇÃO:
8-Pese embora esta aplicação em obrigações ser a única do género do autor, ao longo da sua relação com o banco, sempre teve o autor um histórico de aplicação do seu património em produtos financeiros diversos, designadamente ações ou unidades de participação em fundos de investimento.

QUINTA
A MATÉRIA DADA COMO NÃO PROVADA SOB A LETRA C) DO ELENCO DOS FACTOS DADOS COMO NÃO PROVADOS DEVE SER DADA COMO PROVADA E CONSTAR NO ELENCO DOS FACTOS DADOS COMO PROVADOS SOB O N.º 13, com a seguinte redação:
13-Por ter sido informado que os juros remuneratórios e o reembolso do capital a 100% (cem por cento) eram pagos pelo "BPN" disso ficou convencido que era garantido pelo banco, por ser um produto do banco BPN.

SEXTA
A MATÉRIA DADA COMO NÂO PROVADA SOB A LETRA d) DO ELENCO DOS FACTOS DADOS COMO NÃO PROVADOS DEVE SER DADA COMO PROVADA E CONSTAR NO ELENCO DOS FACTOS DADOS COMO PROVADOS SOB O N.º 14, com a seguinte redação: 14 - O autor marido desconhece, e ainda hoje não entende, o que são obrigações.

SÉTIMA
A MATÉRIA DADA COMO NÃO PROVADA SOB A LETRA h) DO ELENCO DOS FACTOS DADOS COMO NÃO PROVADOS DEVE SER DADA COMO PROVADA E CONSTAR NO ELENCO DOS FACTOS DADOS COMO PROVADOS SOB O N.º 15, com a seguinte redação:
N.º 15-Que o "BPN", na pessoa do seu gestor de conta vendeu o produto financeiro descrito em 4. dos pontos de facto dados como provados ao autor com recurso a informações que nada dizem respeito ao título obrigacionista subscrito.

OITAVA
A MATÉRIA DE FACTO DADA COMO PROVADA DEVE SER AMPLIADA, INTRODUZINDO-SE NELA O ARTIGO COM O NÜMERO 16 QUE DEVE SER DADOS COMO PROVADOS, com a seguinte redação:
16-O Autor não teria aplicado o montante de 50,000,00 que tinha no banco BPN, no produto que o funcionário do banco lhe sugeriu.

NONA
A MATÉRIA DE FACTO DADA COMO PROVADA DEVE SER AMPLIADA, INTRODUZINDO-SE NELA O ARTIGO COM O NÚMERO 17 QUE DEVE SER DADOS COMO PROVADOS, com a seguinte redação: 17 - Montante esse que, por opção do Autor, poderia ficar “parado” ou ter aplicado noutro tipo de investimento.

DÉCIMA
Devem ser excluídos todos os factos que se mostrem contrários aos factos dados como provados e que aqui se elencaram.

DÉCIMA PRIMEIRA
A culpa na responsabilidade contratual presume-se, nos termos do artigo 799.° do Código Civil - Esta norma contém uma dupla presunção de ilicitude e de culpa, e perante a falta de cumprimento, o Banco Réu, não cumprindo como não cumpriu, violando como violou as normas jurídicas que mandam cumprir, constitui-se em ilicitude, incorrendo pois no correspondente juízo jurídico de censura - culpa, já que na presença de um acordo entre a gerente do Banco Réu e o seu cliente a «falta do resultado, normativamente prefigurado, implica presunções de culpa, de ilicitude e de causalidade»

DÉCIMA SEGUNDA
Não se pode afirmar que não se verifica o nexo de causalidade entre a violação do dever de informação e o dano - a perda do capital - por se entender, que, não ficou provado que, à data em que foi prestada, houvesse indícios que - objetivamente - fizessem supor que a emitente estivesse em risco de insolvência, tanto mais que - durante mais de oito anos - pagou os cupões das obrigações que emitiu, já que, tal como supra se demonstrou e se mostra inequivocamente provado e é do conhecimento geral, a magnitude das patologias que determinaram a nacionalização do recorrido e que por isso não podiam ser desconhecidas dos principais responsáveis do recorrente. Anote-se que para este juízo sobre a previsibilidade do cataclismo financeiro que se avizinhava e da consequente nacionalização do BPN, releva o conhecimento dos principais responsáveis da sociedade Ré e não aquele que os seus agentes efetivamente tinham, pois que o intermediário financeiro tinha que zelar por que a informação transmitida pelos seus agentes a estes fosse verdadeira, pelo que, sô se pode concluir pelo estabelecimento de nexo de causalidade entre o facto ilícito que lhe é imputado e os danos sofridos pelo Recorrente; e, porque se mostra provado que o dano sofrido pelo Recorrente decorreu da prestação de informação falsa e que a falsidade da informação é uma forma de violação do dever de prestar informações por Acão, presume-se a culpa do Réu, nos termos previstos no n.º 2, do artigo 304.°-A do Código dos Valores Mobiliários, culpa essa que o Réu não logrou ilidir como lhe seria exigível.

DÉCIMA TERCEIRA
Das declarações do Autor, conjugadas com a demais prova produzida, conduzisse e bem, que o Autor só acedeu em proceder à sua aplicação no produto do banco, atentas as condições e garantias que lhe estavam a ser dadas pela gerente daquele Balcão do BPN.

Ipso Jure ipso facto:
DÉCIMA QUARTA
Pela prova produzida, é pois de concluir que tal garantia de reembolso de Capital lhe estava a ser dada pelo próprio Banco na pessoa do seu gerente de conta, neste circunspecto, impõe-se a revogação da douta decisão e a sua substituição por outra que declare que as garantias prestadas pelo gerente do Banco Réu, na forma como o foram, e nos termos em que o foram, porque se mostraram suficientes para que no Autor se gerasse a convicção de que estava a fazer uma aplicação com o Banco e com garantia do Banco, constituem fundamento bastante para a responsabilização do Banco Réu, que deve assim indemnizar o Autor pelos danos sofridos tal como reclamado foi na Ação.

DÉCIMA QUINTA
Tendo o artigo 304.° n.º 2 do Código dos Valores Mobiliários, introduzido um novo padrão de aferição da culpa que transcende, na sua exigência, o do bom pai de família constante do artigo 487.° n.º 2 do Código Civil, ex vi do artigo 799 °, n.º 2, do mesmo Código Civil, é por força desta disposição do artigo 304.° n.º 2, do Código dos Valores Mobiliários. que se tem que avaliar a responsabilidade do intermediário financeiro nas relações com a Autora.

DÉCIMA SEXTA
No presente caso, resultou manifestamente provada uma flagrante violação não só dos princípios orientadores da atividade de intermediação financeira, consagrados no artigo 304.° do Código dos Valores Mobiliários, como sejam os ditames da boa fé, elevados níveis de padrão de diligência, lealdade e transparência, como também dos mais elementares deveres de informação, referenciados nos citados artigo 7.° n.º 1 e 312.° n.º 1 do Código de Valores Mobiliários, comportamento esse que, foi decisivo e causal na produção dos danos, porque avançou para um aplicação financeira num montante considerável em dinheiro ( € 50.000,00), sem qualquer cobertura contratual (não houve contrato reduzido a escrito, sendo certo que estes contratos celebrados com investidores não qualificados exigem forma escrita nos termos das disposições conjugadas nos artigos. 4.° e 321.°, n.º 1 do Código de Valores Mobiliários

DÉCIMA SÉTIMA
A inobservância dos deveres do exercício da atividade de intermediário financeiro, norteando-se inclusivamente pelos princípios consagrados no artigo 304.° do Código dos Valores Mobiliários (boa fé, elevado padrão de diligência, lealdade e transparência), e bem assim pelos deveres de informação a que aludem os artigos 7.° n.º 1 e 312.°, n.º 1, ambos do Código dos Valores Mobiliários., estabelece, uma presunção legal de culpa (artigo 314.° do Código dos Valores Mobiliários), implicando, por isso responsabilidade contratual e extracontratual.

DÉCIMA OITAVA
Resulta do disposto nos artigos 73.° a 76.° do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras. (Decreto-Lei 298/ 92 de 31/12.) que a responsabilidade por informações, como problema autónomo, coloca-se, principalmente, quando o dador aparece, perante o destinatário, portador de qualidades especificas que o habilitam a fornecer tais informações, as quais induzem o mesmo destinatário a nelas fazer fé. No caso do banco, o cliente presume uma competência e organização, uma profissionalização especifica, que os bancos objetivamente possuem. Portanto, e no que concerne à responsabilidade extracontratual por informações, não se pode dispensar a mesma tutela jurídica a um destinatário de uma informação, quando esta provenha de alguém especificamente qualificado para a fornecer (como um banco) colocando-se a questão do nível da ilicitude e da culpa”, pelo que deve ser declarada a ilicitude e culpa do Réu Banco BIC, S.A., no caso dos presentes Autos.

DÉCIMA NONA
É, pois, mais do que evidente, que o Autor julgava estar a lidar apenas com o seu banco (desconhecendo mesmo a intermediação), no qual confiava porque sempre confiou no seu gerente de conta, levando-o a assinar o boletim de subscrição sem ler, mas sempre no pressuposto que tal produto do banco não comportava risco de perda do capital investido.

VIGÉSIMA
Dos documentos juntos aos autos, numa estratégia que não se pode ter como inocente de todo, em todos os documentos aparece a Sigla do BPN bem como a inscrição BPN, o que conduz a convicção do Autor de que tais documentos são do BPN e é o BPN que lhe vende o produto financeiro, e responde por elas e pelo seu cumprimento traduzido no pagamento dos juros e restituição de capital, sendo ele, BPN, o responsável único.

VIGÉSIMA PRIMEIRA
Só por erro manifesto na interpretação, por parte do douto tribunal a quo, do depoimento prestado pela testemunha e das declarações do Autor, como se pode concluir que essas informações não tivessem correspondido a verdade, fossem incorretas ou inexatas como o alegado pelo Autor, sendo que foi o próprio funcionário do banco que admitiu ter omitido algumas das características do produto, não foi comentado a questão do risco, bem como da entidade emitente da obrigação, limitando-se apenas a referir que o produto era do banco e que era seguro e que tinha uma boa rentabilidade.

VIGÉSIMA SEGUNDA
Também só por erro manifesto na interpretação, por parte do douto tribunal a quo, tendo em conta o depoimento da testemunha e das declarações do Autor, que não se descortina que possa ser imputada ao réu qualquer falha de informação sobre o produto financeiro objeto dos presentes autos, pois foi por iniciativa do funcionário do banco BPN, a habilidade de aliciar o Autor, sabendo da sua apetência na obtenção de rendimento, (quem não gosta) e que só dando a segurança e garantia do banco é que o Autor se convenceu.

VIGÉSIMA TERCEIRA
Só por erro manifesto na interpretação, por parte do douto tribunal a quo, que do depoimento da testemunha, bem como das declarações do Autor, concluir que no momento da assinatura do boletim de subscrição o Autor tomou conhecimento que, afinal tratava-se de uma obrigação emitida pela SLN e que o Banco Réu agia apenas na qualidade de mero intermediário, quando em momento algum lhe foi referido a existência de uma outra entidade na contratação.

VIGÉSIMA QUARTA
Ao decidir como decidiu, dando como provado que o Réu tenha prestado ao Autor as informações a que estava legalmente obrigado, e não dando como provado que ao Autor não foram dadas as informações sobre a natureza e características do produto, o tribunal a quo, absolvendo o Réu, como absolveu, também por esta via interpretou de forma manifestamente errada as normas dos artigos 7.° n.º 1, 312.° n.º 1, 314.°, n.º 2, do Código de Valores Mobiliários, 799.° do Código Civil, que assim foram violados, tal e tanto importa a revogação da douta decisão e a sua substituição por outra que, respeitando as citadas normas, declare não ter o Réu cumprido com o ónus de ilidir a sua presunção de culpa, importando pois a sua condenação no pedido.

VIGÉSIMA QUINTA
Ao decidir como decidiu, a Douta sentença, violou de forma clara as disposições decorrentes dos artigos 7.°, 290.° n° 1 alínea a), 304.°-A e 312.° a 314.°-D e 323.° a 323.°-D e 327.° do código dos Valores mobiliários e 4.°, 12.°, 17.° e 19.° do Decreto-Lei n.º 69/2004 de 25/02 e da Diretiva 2004/39/CE e 364°, 483° e ss., 563°, 628° e 798° e ss. do código Civil, indo contra a interpretação única que de tais disposições normativas decorre.
6.-Nas suas contra-alegações o R. pronunciou-se pela manutenção do decidido.
7.-Cumpre apreciar e decidir.

*

II– Os factos
Na sentença sob recurso foram considerados como provados os seguintes factos:
1.- Em abril de 2006 o autor detinha a quantia de € 50.000,00 (cinquenta mil euros) na sua conta do Banco "BPN”.
2.- Sabendo disso, o gerente de conta do "BPN”, da Agência de T... V..., sugeriu-lhe que adquirisse um produto financeiro que tinha como limite mínimo de aplicação € 50.000,00 (cinquenta mil euros), pelo prazo de dez anos, denominado de "SLN Rendimento Mais 2006”...
3.-... Informando-o de que o referido produto trazia um rendimento proveniente de juros remuneratórios e reembolso do capital a 100%, (cem por cento), explicando-lhe qual seria a rentabilidade esperada, e que havia a expectativa de reembolso antecipado do produto.
4.- Em 10 de Abril de 2006 o autor adquiriu o mencionado produto financeiro, designado como "SLN Rendimento Mais, 2006”, no valor de € 50.000,00 (cinquenta mil euros), através da subscrição do escrito particular que constitui o documento n.º 1 junto com a p. i., do qual consta, entre o mais, no canto superior esquerdo "BPN”, no canto superior direito "SLN 2006 Boletim de Subscrição” e, a seguir, os dizeres «emissão de obrigações subordinadas», «natureza da emissão: emissão de até 1.000 obrigações subordinadas, ao portador e sob a forma escritural, com o valor nominal de € 50.000,00 cada uma, oferecidas diretamente ao público, ao preço unitário igual ao valor nominal (...)» a «data de liquidação financeira: 08 de Maio de 2006», o «prazo e reembolso: o prazo da emissão é de dez anos, sendo o reembolso do capital efetuado em 09 de Maio de 2016. O reembolso antecipado da emissão só é possível por iniciativa da "SLN - Sociedade Lusa de Negócios, SGPS, S. A.”, a partir do 5.° ano e sujeito a acordo prévio do Banco de Portugal» e a “remuneração: juros pagos semestralmente e postecipadamente, às seguintes taxas: (...)».
5.-O autor recebeu os juros do capital investido na referida aplicação financeira até maio de 2015.
6.-Os pagamentos destes juros foram efetuados pelo “BPN” até outubro de 2012 e, posteriormente, pelo réu.
7.-Durante este período de tempo foram enviados ao autor extratos periódicos onde lhe apareciam essas obrigações como integrando a sua carteira de títulos, separadas dos depósitos e com menção expressa ao facto de se tratarem de obrigações depositadas na sua carteira de títulos.
8.-Ao longo da sua relação com o Banco, o autor sempre teve um histórico de aplicação do seu património em produtos financeiros diversos, designadamente ações ou unidades de participação em fundos de investimento.
9.-Em 9 de Dezembro de 2011, o Estado Português, então acionista único do “BPN, Banco Português de Negócios, S. A." (adiante denominado simplesmente “BPN”), no âmbito do processo de reprivatização desta Instituição, celebrou um “Acordo Quadro” com o réu, no qual foram estabelecidos os procedimentos e as ações necessárias a desenvolver por cada uma das partes, passo intermédio considerado essencial para a celebração do contrato de compra e venda das ações do “BPN”.
10.-No dia 30 de Março de 2012 foi assinado o contrato de compra e venda do “BPN” entre o Estado Português e o réu, sendo que nos termos do disposto na clausula 15.a do supra mencionado “Acordo Quadro” se mostram incluídas todas as entidades do espectro do antigo Banco “BPN”, designadamente, a “Parvalorem, S. A.”, a “Parups, S. A.”, a “Parparticipadas, S. A.”, o “Banco Efisa, S. A.”, o “BPN Serviços, S. A.”, o “BPN Imofundos, S. A.”, o “BPN Gestão de Ativos, S. A.” (factualmente "Patris, Gestão de Ativos, S. A.”), o "BPN ACE” e o "BPN, SGPS, S. A ”.
11.-O réu, enquanto instituição bancaria, resultou da fusão ocorrida em 7 de dezembro de 2012, por incorporação do "Banco BIC Português S. A.” no "BPN - Banco Português de Negócios, S. A.”, assumindo a designação social do primeiro e a personalidade jurídica do segundo.
12.- Vencido o prazo de dez anos, o autor foi informado de que a aplicação financeira em causa não tinha cobertura de garantia de capital porque era uma subscrição de obrigações da "SLN - Sociedade Lusa de Negócios, S.A.” e esta sociedade encontrava-se insolvente, podendo e devendo reclamar o montante a que se julgava com direito no processo de Insolvência da mesma.
Com relevo para a decisão da causa, foi considerado não provado:
a.-que a quantia descrito em 4. dos pontos de facto dados como provados estivesse num depósito a prazo (artigo primeiro da p. i.);
b.-que o autor tivesse sido informado que produto financeiro "SLN Rendimento Mais 2006” tinha as mesmas garantias e segurança de um depósito a prazo (artigo segundo da p. i.);
c.- que o autor tenha sido informado que os juros remuneratórios e o reembolso do capital a 100% (cem por cento) eram garantidos pelo "BPN”. (artigo terceiro da p. i.);
d.- que o autor marido desconhecesse, e ainda desconheça, o que são obrigações (artigo sexto da p. i.);
e.-o que consta alegado no artigo décimo segundo da p. i. para além do que consta do ponto de facto provado n.º 8, designadamente, que o autor tenha sido informado que podia eventualmente proceder ao resgate antecipado do referido produto financeiro ao fim de cinco anos, e que se porventura tivesse necessidade de levantar o dinheiro mais cedo, em qualquer altura o poderia fazer, bastando que avisasse com dois ou três dias de antecedência;
f.- que o autor se tenha deslocado ao "BPN” ao fim de cinco anos, com vista a proceder ao resgate do capital investido e que nessa data o autor tenha sido informado que só ao fim de 10 anos poderia proceder a tal resgate, ou seja, só no fim do prazo contratual, e não antes como lhe havia sido garantido (artigos décimo sétimo, vigésimo quarto, décimo oitavo e vigésimo quinto, todos da p. i.);
g.-que nessa altura se tenham começado a gerar nos autores angústias e receios que o futuro viria a ver mais do que justificadas (artigo décimo nono da p. i.) e
h.- que o "BPN”, na pessoa do seu gestor de conta tenha vendido o produto financeiro descrito em 4. dos pontos de facto dados como provados ao autor com recurso a falsas informações (artigo trigésimo da p. i.).

*

III–O Direito
Como se sabe, o objeto do recurso é definido pelas conclusões do recorrente, importando em conformidade decidir as questões nelas colocadas, bem como as que forem de conhecimento oficioso, com exceção daquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras, artigos 635.º, 608.º e 663.º, do vigente CPC[1], não estando o Tribunal obrigado a apreciar todos os argumentos ou fundamentos que as partes indiquem para fazer valer o seu ponto de vista, sendo que, quanto ao enquadramento legal, não está sujeito às razões jurídicas invocadas pelas mesmas, pois o julgador é livre na interpretação e aplicação do direito, artigo 5.º, n.º 3.
No seu necessário atendimento, a saber está se como pretende a Recorrente,  existe erro no julgamento da decisão sobre a matéria de facto, bem como, contrariamente ao decidido, deve o Banco Recorrido ser responsabilizado, indemnizando o Autor pelos danos sofridos, tal como foi reclamado na sentença sob recurso.
Pugna o Apelado pela manutenção do decido.

a)-Da impugnação da matéria de facto
Não se discute que a decisão sobre a matéria de facto levada a cabo pela 1.ª instância pode ser alterada conforme o disposto no art.º 662, n.º 1, se a prova produzida (ou um documento superveniente) impuserem decisão diversa, considerando que tendo ocorrido a gravação dos depoimentos prestados, a impugnação realizada deve ser feita na observância do ónus a cargo do recorrente, nos termos do art.º 640.
Temperando tal ónus a ideia de uma impugnação generalizada da matéria de facto, no sentido de um novo e integral julgamento, e a delimitação necessariamente colocada[2], importa tecer breves considerações, que surgem como elucidativas da tarefa que cumpre a este Tribunal realizar.
Assim, saliente-se, que os poderes/deveres ora em causa, já anteriormente consagrados, foram reforçados com a reforma operada pela Lei 41/2013, de 26.06, que aprovou o novo Código de Processo Civil, visando-se com a reapreciação da matéria de facto alcançar a verdade material, numa autonomia decisória[3], “ (…) competindo-lhe formar e formular a sua própria convicção na reapreciação dos meios de prova indicados pelas partes ou daqueles que se mostrem acessíveis (…)”, vigorando para a Relação o princípio da livre apreciação da prova, com exclusão dos factos que só possam ser provados por documentos, ou estejam plenamente provados por acordo das parte, confissão das mesmas ou documento, nos termos do art.º 607, n.º5, ex vi art.º 663, n.º 2.
Deste modo, o princípio que rege a (re)apreciação da prova, sendo o da livre valoração, sempre que a prova não tenha um valor legal ou tarifado, traduz-se numa (re)apreciação segundo a prudente convicção do juiz, significando que “(…) o juiz tem de formar uma convicção sobre a verdade ou plausibilidade do facto probando – ou seja, tem de adquirir um estado psíquico de convicção sobre a verdade ou plausibilidade – baseado numa convicção objetiva – isto é, num conjunto de razões que permite afirmar que um facto é verdadeiro ou é plausível (…)”[4], no atendimento de critérios de normalidade, mas também da experiência esclarecida que para o caso seja exigível, com a análise serena e objetiva da prova levada aos autos, constituindo a certeza da realidade do facto que, embora não absoluta, assente num grau elevado de probabilidade de ter ocorrido, conforme o julgador o apreendeu[5], pois tal certeza absoluta é quase sempre inatingível, devendo necessariamente ser afastados os entendimentos arbitrários, de mero capricho ou simples produto de momentos.
A tarefa a realizar pela Relação surge, como facilmente se depreende, mais dificultada, porquanto os elementos atendíveis podem surgir menos fecundos, pela falta da oralidade, mas sobretudo da imediação, na invocação de o sistema legal, tal como está consagrado[6], podendo não assegurar a fixação de todos os elementos suscetíveis de condicionar ou influenciar a convicção do julgador perante o qual foram produzidos os depoimentos.
Na verdade, e se não deverá ser desprezada a existência de inúmeros aspetos comportamentais dos depoentes não passíveis de ser registados numa gravação áudio, se a sua valorização assumir relevância preponderante na convicção plasmada na decisão da matéria de facto, deverá a mesma ser vertida na motivação[7], sob pena do seu não atendimento, na realização do necessário exame crítico dos elementos probatórios postos à consideração deste Tribunal[8].
Reconhecidas as reais dificuldades que advêm à reapreciação da prova e formação da sua convicção pela Relação, e desse modo, não sendo despicienda, na apreciação da matéria de facto realizada por este Tribunal, a limitação que a inexistência da imediação acarreta, na formulação de uma prudente convicção, as mesmas não autorizam contudo que seja formulado um juízo abstrato impeditivo da atividade judicativa passível de permitir ou não a apreciação da decisão sobre a matéria de facto.
Tais circunstâncias, embora não impeditivas, como se aludiu, não podem contudo deixar de ser ponderadas no juízo a formular resultante da reapreciação da prova realizada, pelo que chamando também à colação a referência legal que os meios de prova indicados pelo Recorrente imponham, segundo o seu entendimento, decisão diversa, art.º 640, n.º1, b), na formação da sua convicção, este Tribunal deverá conduzir-se com uma acrescida prudência[9], “(…) evitando, porventura, a introdução de alterações quando não lhe seja possível concluir, com a necessária segurança, pela existência de erro de apreciação relativamente aos concretos pontos de facto impugnados (…)”[10].
Para o labor a efetuar, sublinha-se o afirmado em recente Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça[11] “(…) a linguística deixou, hoje, de ser confinada às suas dimensões primárias – a dimensão gramatical (lógico-sintática) e a dimensão semântica – para se alcandorar, agora, numa nova dimensão, que é a dimensão pragmática, a qual relaciona a linguística com os contextos vivenciais e as estratégias comunicacionais (…)
(…) Assim, na formulação dos juízos probatórios, devem ser empregues enunciados que sejam portadores de um alcance semântico o mais consensual possível, no contexto relacional em causa, de forma a denotar a correspetiva substância factual, para além das formas meramente epidérmicas da expressão linguística.
Para tal não basta apelar ao mero significado linguístico ou etimológico de determinado vocábulo ou locução, de forma atomizada, mas antes considerar o seu alcance semântico e pragmático no contexto narrativo em que se encontram inseridos (…)”.

Balizados, em traços gerais, os termos que devem reger a reapreciação da prova neste Tribunal, vejamos a pretensão do Recorrente.

Com vista ao conhecimento da pretensão do Recorrente, consigna-se que para além dos apontados segmentos dos testemunhos, foi ouvida toda a prova produzida em sede da audiência de julgamento, bem como analisados todos os demais elementos constantes dos autos.

Retenha-se o consignado em sede de fundamentação da decisão da matéria de facto pela Mma. Juíza a quo:
Para a resposta à matéria de facto provada, o Tribunal tomou em consideração o acordo entre as partes, a prova produzida em audiência final (declarações de parte do autor e depoimento da testemunha Luís ....) e alguns dos documentos juntos aos autos (que infra se irão discriminar).
Especificamente, e no que concerne às declarações de parte do autor e ao depoimento da testemunha Luís ...., ambos prestaram as suas declarações e depoimento de forma espontânea e clara, convencendo o Tribunal da veracidade das suas afirmações na parte em que as mesmas foram coincidentes.
Contudo, nem sempre souberam recordar com clareza o que sucedeu, sobretudo no que respeita ao momento da subscrição do produto financeiro objeto dos presentes autos. Nesta parte, o depoimento da testemunha Luís .... foi vago e sem certezas, com muitas dúvidas, fruto evidente da falta de memória, atento o período de tempo entretanto decorrido. Por este motivo, e considerando o âmbito da apreciação livre das provas produzidas, o Tribunal optou por ponderar apenas as declarações de parte e o depoimento da testemunha Luís .... na parte em que foram coincidentes entre si.”

Visa o Recorrente que seja alterada a decisão sobre a matéria de facto relativamente ao art.º 2, 3, 4, 8, dos factos provados, ser dada como provada a matéria dada como não provada na letra c), d) e h), ampliando-se ainda com a introdução de dois artigos – 16 e 17, nos termos enunciados.

Vejamos.

Art.º 2 dos factos provados:
Sabendo disso, o gerente de conta do "BPN”, da Agência de T... V..., sugeriu-lhe que adquirisse um produto financeiro que tinha como limite mínimo de aplicação € 50.000,00 (cinquenta mil euros), pelo prazo de dez anos, denominado de "SLN Rendimento Mais 2006”...

Pretende o Apelante que seja considerado como provado:
Sabendo disso, o gerente da conta BPN, da agência de T... V..., contactou-o no sentido de ele adquirir um produto financeiro do banco, no valor de 50.000,00€.
A razão de ser de tal alteração, radica-se segundo alega o Recorrente, de ter subscrito o produto, confiando nas informações que lhe estavam a ser dadas pelo gerente do Banco, a Testemunha Luís ...., pessoa em quem acreditava, limitando-se a assinar o mesmo sem sequer o ler.
Apreciando, resulta que o invocado diverge do alegado, a existência de um depósito a prazo que estaria a vencer e cujo prazo prendiam os AA renovar, e na proposta decorrente dessa intenção.
Com efeito, o Recorrente declarou que não tinha depósitos a prazo, mas sim de contas à ordem, gostando de ter algum dinheiro a movimentar-se, daí a existência da carteira de títulos, desta forma porque tinha aquele dinheiro parado, foi-lhe sugerido pelo gerente do Banco, pessoa em que depositava confiança e que acompanhou quando mudou de agência, a adquirir o produto em causa, descrito como um empréstimo, com uma boa taxa, e no confronto com o boletim de subscrição, junto aos autos, reconhecendo a sua assinatura, nada referenciou sobre o desconhecimento do respetivo teor, não avultando que seja de escamotear o nome do produto, e a respetiva pertença ao Banco ou à SNL, atribuindo uma relevância que não se mostrou pertinente para a aquisição do produto, como melhor a seguir se explicitará.
Inexiste, assim fundamento para a pretendida alteração.

Art.º 3 dos factos provados:
... Informando-o de que o referido produto trazia um rendimento proveniente de juros remuneratórios e reembolso do capital a 100%, (cem por cento), explicando-lhe qual seria a rentabilidade esperada, e que havia a expectativa de reembolso antecipado do produto.
Pretendendo o Apelante seja dado como provado:
…Informando-o de que o referido produto trazia um rendimento proveniente de juros remuneratórios e reembolso do capital a 100% (cem por cento), explicando-lhe qual seria a rentabilidade esperada e que havia a expetativa do banco de reembolsar antecipadamente o produto.

Apreciando, conforme o consignado em sede de fundamentação da decisão sobre a matéria de facto, revelando-se o depoimento da testemunha Luís .... vago no sentido que maioritariamente se reportou ao que em geral era feito, sem lembrança precisa do que no caso concreto se verificou, na sequência do aludido, declarou o Recorrente que o produto proposto era, como se mencionou, um empréstimo feito ao Banco, com vista a este ser cotado em bolsa, indicada a respetiva duração, sem prejuízo da expetativa de não atingir o prazo de maturação, não havendo interesse numa duração muito longa, obtido que fosse tal propósito face aos juros remuneratórios pagos, havendo ainda mecanismos para dispor do dinheiro, caso o Apelante precisasse, como a venda do produto, antes dos dez anos, não tendo o Recorrente ficado com dúvidas que podia vender, se fosse preciso, o que não aconteceu, resolvendo esperar pelo decurso do prazo, recebendo o respetivo rendimento.
Mais declarou que era então inimaginável a insolvência de Bancos, ou empresas detentoras de bancos, confiando na sua solidez.
Compulsado com a indicação que o empréstimo era à “casa mãe”, a SNL, dona do Banco, o Recorrente não evidenciou dúvidas que levaria a cabo a aquisição, e face ao que então se conhecia, ficava mais contente.
Inexiste, assim fundamento para realizar a alteração pretendida.

Art.º 4 dos factos provados:
Em 10 de Abril de 2006 o autor adquiriu o mencionado produto financeiro, designado como "SLN Rendimento Mais, 2006”, no valor de € 50.000,00 (cinquenta mil euros), através da subscrição do escrito particular que constitui o documento n.º 1 junto com a p. i., do qual consta, entre o mais, no canto superior esquerdo "BPN”, no canto superior direito "SLN 2006 Boletim de Subscrição” e, a seguir, os dizeres «emissão de obrigações subordinadas», «natureza da emissão: emissão de até 1.000 obrigações subordinadas, ao portador e sob a forma escritural, com o valor nominal de € 50.000,00 cada uma, oferecidas diretamente ao público, ao preço unitário igual ao valor nominal (...)» a «data de liquidação financeira: 08 de Maio de 2006», o «prazo e reembolso: o prazo da emissão é de dez anos, sendo o reembolso do capital efetuado em 09 de Maio de 2016. O reembolso antecipado da emissão só é possível por iniciativa da "SLN - Sociedade Lusa de Negócios, SGPS, S. A.”, a partir do 5.° ano e sujeito a acordo prévio do Banco de Portugal» e a “remuneração: juros pagos semestralmente e postecipadamente, às seguintes taxas: (...)».

Pretende o Recorrente que seja dado como provado:
Em 10 de Abril de 2006 o autor adquiriu o mencionado produto financeiro do banco no valor de 50.000,00€ (cinquenta mil euros), através da subscrição do escrito particular que constitui o documento n.º 1 junto com a p.i. do qual consta, entre aspas, no canto superior esquerdo “BPN”, no canto superior direito “SLN 2006 Boletim de Subscrição” e a seguir os dizeres “emissão de obrigações subordinadas” “natureza da emissão: emissão de até 1.000 obrigações subordinadas, ao portador e sob a forma escritural, com o valor nominal de 50.000,00€ cada uma, oferecidas directamente ao público, ao preço unitário igual ao valor nominal (…)” a “data da liquidação financeira: 8 de Maio de 2006”, o “prazo e reembolso : o prazo de emissão é de dez anos, sendo o reembolso do capital efetuado em 09 de maio de 2016. O reembolso antecipado da emissão só é possível por iniciativa da “SNL – Sociedade Lusa de Negócios, SGPC, SA” a partir do 5.º ano e sujeito a acordo prévio do Banco de Portugal” e a “remuneração juros pagos semestralmente e postecipadamente às seguintes taxas (…)”.

Apreciando, a alteração pretendida vem na sequência das anteriores, quanto à designação e pertença do produto adquirido, pelo que face ao já explicitado, na sua abrangência, inexiste fundamento para alterar o consignado como provado, enquanto tradução da realidade efetivamente ocorrida.

Art.º 8 dos factos provados:
Ao longo da sua relação com o Banco, o autor sempre teve um histórico de aplicação do seu património em produtos financeiros diversos, designadamente ações ou unidades de participação em fundos de investimento.

Pretende o Recorrente que seja provado:
Pese embora esta aplicação em obrigações ser a única do género do autor, ao longo da sua relação com o banco, sempre teve o autor um histórico de aplicação do seu património em produtos financeiros diversos, designadamente ações ou unidades de participação em fundos de investimento.

Apreciando, a matéria em causa prende-se com o perfil do Recorrente, enquanto investidor, sedo certo que não revestindo a natureza de investidor qualificado, art.º 30 do DL 486/99, de 13.11, na redação do DL 52/2006, de 15.03, aplicável aos autos, isto é, CVM, tem considerável relevância a respetiva caracterização para aferir da intensidade do dever de informar.
No caso sob análise as partes mostraram-se parcas na alegação e prova.

Em sede de declarações de parte, o Apelante, aquando da sua identificação, indicou como profissão, comerciante, dono de uma designada “microempresa”, do ramo da confeitaria, tendo o 9.º ano de escolaridade.

Para além de PPR, referiu ser detentor de uma carteira de produtos financeiros, sobretudo ações, mencionando saber o que são[12], investindo nesses produtos desde 1997/1998, conhecendo da respetiva volatilidade, nomeadamente porque teve situações de perda, aconselhando-se junto de pessoas mais entendidas e levando em conta o que se apercebia da solidez das empresas em que resolveu investir[13], gostando de o fazer, mantendo a disponibilidade necessária para o negócio, pois trabalha muito com dinheiro “vivo”.

Não se mostrando contrariado o tido como provado, quanto à aquisição de obrigações as suas declarações não foram tão perentórias no sentido invocado, pelo que não existe fundamento para a alteração pretendida.

Alínea c) dos factos não provados:
que o autor tenha sido informado que os juros remuneratórios e o reembolso do capital a 100% (cem por cento) eram garantidos pelo "BPN”. (artigo terceiro da p. i.).
Pretende o Recorrente que seja dado como provada, nos seguintes termos:
13.- Por ter sido informado que os juros remuneratórios e o reembolso do capital a 100% (cem por cento) eram pagos pelo “BPN” disso ficou convencido que era garantido pelo banco, por ser um produto BPN.

Apreciando, da análise da prova realizada, sem prejuízo da imprecisão decorrente, nomeadamente do tempo decorrido, e no atendimento do já referenciado, de acordo com o entendido em sede de fundamentação da decisão sobre a matéria de facto, não avulta que a produção de prova realizada, presente até os apontamentos acima realizados, tenha consistência que permita considerar esse factualismo, maxime nos termos pretendidos quanto ao convencimento do Recorrente, inexistindo razão para alterar o decidido.

Alínea d) dos factos não provados:
que o autor marido desconhecesse, e ainda desconheça, o que são obrigações (artigo sexto da p. i.).
Pretende o Recorrente que seja dada como provada nos seguintes termos:
14.- O autor marido desconhece, e ainda hoje não sabe, o que são obrigações.
Apreciando, surge-nos como inverosímil, até pelo declarado pelo Recorrente, e acima aludido, que até à data não saiba o que é uma obrigação, sem prejuízo de uma demonstração de revolta/incompreensão no concerne à sua situação de credor, relativamente aos demais que puderam ser ressarcidos, face à situação de insolvência, inexistindo fundamento para a alteração pretendido.

Alínea h) dos factos não provados:
que o "BPN”, na pessoa do seu gestor de conta tenha vendido o produto financeiro descrito em 4. dos pontos de facto dados como provados ao autor com recurso a falsas informações (artigo trigésimo da p. i.).
Pretende o Recorrente que seja dada como provada nos seguintes termos:
15.- Que o “BPN”, na pessoa do seu gestor de conta vendeu o produto financeiro descrito em 4. dos pontos de factos dados como provados ao autor com recurso a informações que nada dizem respeito ao título obrigacionista subscrito.

Apreciando, do acima aludido em termos de prova produzida, não avulta que tal tenha acontecido, no reporte às declarações do Recorrente, no devido atendimento da realidade aquando da subscrição do produto, em termos do que era cognoscível à data, no qual não se incluía a possibilidade de situações de insolvência, na convicção que não lhe foi omitida informação então relevante para a aquisição realizada, sendo a transmitida a que correspondia ao então conhecido e aceite, sem invocação de outras realidades, e suficiente para então lhe dar a confiança necessária para a subscrição realizada.

Assim, mesmo com contornos diferenciados apresentados pelo Recorrente, do que foi considerado não provado, não resulta que o factualismo em causa se deva considerar como provado, inexistindo fundamento para a alteração pretendido.

Pretende o Recorrente que seja ampliada a matéria de facto nos seguintes termos:
16.- O Autor não teria aplicado o montante de 50,000,00€ que tinha no banco BPN, no produto que o funcionário do banco lhe sugeriu.
17.- Montante esse que por, por opção do Autor, poderia ter ficado “parado” ou ter aplicado noutro tipo de investimento.

Apreciando, o juízo hipotético realizado pelo Recorrente, não encontra respaldo na prova efectuada, frisando que nos reportamos à data da subscrição, com as indicações acima realizadas, carecendo tal prova da consistência necessária para dar como apurado tal factualismo, inexistindo, também, para o aditamento pretendido.

b)-da responsabilidade do Banco Recorrido
O Recorrente configurou o presente recurso, conforme resulta das conclusões formuladas, em termos de responsabilidade contratual do Banco Recorrido, no âmbito da intermediação financeira[14].
Assim, sempre nos teremos de ater à realidade específica a considerar, reportada ao mercado de valores mobiliários, tido como ponto de encontro entre a oferta, assegurada pelas entidades emitentes, e a procura levada a cabo pelos investidores, relevando para tanto a existência de agentes económicos qualificados, caso dos intermediários financeiros, como resultava do art.º 289, n.º 1, a) e 293, do CVM, nomeadamente as instituições de crédito, como a referenciada nos autos.
O intermediário financeiro atua no interesse e por conta dos seus clientes, sendo na esfera destes que se repercutem as consequências – positivas e negativas – das operações de subscrição ou transação de valores mobiliários, encontrando-se entre as atividades de intermediação financeira os serviços de investimento em valores mobiliários.
Sabido é, também, que como decorre do disposto no art.º 573, do CC, a obrigação de informação existe sempre que o titular de um direito tenha dúvida fundada acerca da sua existência ou do seu conteúdo e outrem esteja em condições de prestar as informações necessárias, na consagração de uma regra geral, de acordo com o princípio da boa fé, sem prejuízo do que possa ser estabelecida convencionalmente, ou decorrer de preceitos especiais.
No concerne aos valores mobiliários, diz-nos o art.º 7, do CVM, que deve ser completa, verdadeira, atual, clara, objetiva e lícita, nomeadamente a relativa a atividades de intermediação e emitentes que seja suscetível de influenciar as decisões dos investidores, seja qual for o meio de divulgação, aferindo-se o requisito da completude da informação em função do meio utilizado.
Por sua vez resulta do art.º 312, do CVM, que o intermediário financeiro deve prestar, relativamente aos serviços que ofereça, que lhe sejam solicitados ou que preste, todas as informações necessárias para uma tomada de decisão esclarecida e fundamentada, caso das respeitantes aos riscos especiais envolvidos pelas operações a realizar, sendo que a extensão e a profundidade da informação devem ser tanto maiores quanto menor for o grau de conhecimento e de experiência do cliente.
Na verdade, conforme também se consigna no art.º 304, do CVM, os intermediários financeiros devem orientar a sua atividade no sentido da proteção dos legítimos interesses dos seus clientes e da eficiência do mercado, observando, com todos os intervenientes no mercado, os ditames da boa fé, de acordo com elevados padrões de diligência, lealdade e transparência, informando-se, na medida em que for necessário para o cumprimento dos seus deveres, sobre a situação financeira dos clientes, a sua experiência e investimentos e os objetivos que prosseguem através dos serviços a prestar sublinhando-se que a regra da adequação do serviço prestado ao perfil do cliente não sofre qualquer desvio em virtude do meio de contratação utilizado, devendo ser formulado segundo um critério subjetivo, em termos de autodeterminação pelo investidor-cliente[15]

Compreende-se que no tipo de negócios em causa sobressaía a exigibilidade de as partes se pautarem de acordo com o princípio da confiança, essencial ao tráfico mercantil, prestando as informações necessárias à prossecução dos interesses do cliente, na medida em que se mostra adequado para tanto, ainda que em termos não tão abrangentes que posteriores quadros normativos vieram consagrar, mas sempre num atendimento de um padrão de diligência exigível a entidades especialmente autorizadas e qualificadas ao exercício das funções que se apresentam a prestar, num contexto específico de uma atividade, que se tendencialmente orientada para um grupo social restrito, veio a alargar-se, abrangendo largos setores sociais.

Diz-nos, por sua vez o art.º 314, do CVM, no que respeita à responsabilidade do intermediário financeiro, que a mesma existe perante qualquer pessoa, em consequência da violação de deveres respeitantes ao exercício da sua atividade, que lhes sejam impostos por lei ou regulamento emanado da autoridade pública, pelo que e decorrentemente, evidenciando-se que a prova do facto ilícito incumbirá ao lesado, já no que respeita à culpa, a mesma presume-se se o dano for causado no âmbito das relações contratuais ou pré-contratuais, e em qualquer caso, quando seja causado pela violação de deveres de informação, n.º2, da mesma disposição legal.

Para que se verifiquem assim os pressupostos da responsabilidade civil contratual do intermediário financeiro, importa ainda ficar demonstrado o dano, correspondente à perda do capital entregue para subscrição do produto financeiro, descontando o rendimento, entretanto recebido pelo lesado, bem como apreciar a existência do nexo de causalidade, que deve resultar do factualismo apurado.
Antes de avançar, não pode deixar de se sublinhar que o juízo concreto a efetuar, maxime em termos do grau de culpa, importa necessariamente atender ao perfil do investidor, as características dos produtos financeiros subscritos, e o conhecimento de que dispunha, ou não, o intermediário, sempre ao tempo de pré-negociação e contratualização.

Pelo que, aqui chegados releva fazer duas pequenas notas.

A primeira prende-se com o conhecido número de casos existentes nos Tribunais e as decisões proferidas, debruçando-se sobre situações em que está em causa a subscrição deste produto financeiro ou similar, certo é, que não pode ser esquecido, que cada um assenta num determinado factualismo alegado e provado, daí que não se possa considerar que há uma solução, mas sim uma para cada realidade, para além das igualmente conhecidas divergências em termos doutrinários/jurisprudenciais.
 
A segunda, ainda conectada ao tempo da pré-negociação e contratualização do produto, reporta-se nesse contexto, às vicissitudes ocorridas e que importaram a final na insolvência da emitente, que o Recorrente expende de forma muito ampla nas suas alegações, levando às conclusões, “ (…) a magnitude das patologias que determinaram a nacionalização do Recorrido e que por isso não podiam ser desconhecidas dos seus principais dirigentes,  (…) juízo de previsibilidade do cataclismo financeiro que se avizinha e da consequente nacionalização do BPN (…)”, como sendo do conhecimento geral e assim provadas de modo inequívoco. Ora contrariamente ao alegado não estamos perante factos notórios que carecessem de prova, nem esta foi realizada, sendo como tal inatendíveis.

Reportando-nos ao caso concreto, evidencia-se desde logo, face ao factualismo apurado e o ao que não logrou provar, que contrariamente ao alegado em sede de petição inicial, não estamos perante uma situação de uma aplicação por parte do Recorrente,  com equivalência a um depósito a prazo, no que em geral se entende caracterizar um investidor conservador, preocupado acima de tudo com a segurança do capital que dispõe, ainda que com menor rentabilidade, e sem que, em princípio, não haja margem de risco, o que hoje em dia constitui, face à evolução da economia mundial, um pressuposto de cariz relativo, dependente de existências de fundos de garantia, e ainda assim,  garantindo apenas até um determinado montante o reembolso do capital, sem prejuízo de tais depósitos, ou parte deles, serem alocados ao ressarcimento de créditos não cobertos por tais garantias.

Por outro lado, quanto ao perfil do Recorrente, enquanto investidor, a alegação foi, como já se reportou, muito escassa, maxime, em termo de especial vulnerabilidade decorrente de algum fator, tais como a idade, saúde ou iliteracia[16], sabemos contudo que que tem um histórico de aplicação em produtos financeiros, não se mostrando alegado ou provado que tenha requerido a sua qualificação facultativa, nos termos do art.º 110-A do CVM.

No entanto, configura-se como líquido, que o Recorrente na sua atividade de investidor não enjeitou a ideia de risco associada às aplicações realizadas, afastando a mais conservadora como o depósito a prazo, aliás, se bem atendermos às obrigações em causa aquando da subscrição, as mesmas não correspondiam a um produto financeiro cuja natureza ou características envolvessem o risco da perda total ou parcial do capital, tendo uma rentabilidade assegurada, e devolução do prazo acordado, face ao que então cognoscível, pois o risco reportava-se a uma situação de insolvência que não surgia como questão relevante, e muito menos premente.
 
Atente-se que não foi provado que o Apelante se teria deslocado ao então já nacionalizado BPN, em 2011, decorridos cinco anos, para efetuar o resgate do produto com base em informação prestada aquando da subscrição, esperando pelo vencimento do prazo de dez anos, não documentando ou mesmo alegando que tenha reclamado o montante que entendia ser credor, pese embora tal lhe tenha sido comunicado.

Resulta assim do apurado, mas também do considerado como não apurado, que inexistem razões para concluir que houve falsidade ou inexatidão das informações prestadas aquando da venda do produto, em termos que levaram o Recorrente a autodeterminar-se, reafirmando-se que não se mostra provada factualidade que, à data, permitisse afirmar a existência de quaisquer factos indiciadores da situação de insolvência da emitente das obrigações, que justificasse, mas sobretudo tornasse exigível a informação quanto à eventualidade da insolvência, na contraposição, até com a volatilidade e grau de risco presente e elevado de produtos adquiridos pelo Apelante, pelo mesmo aceite.
Atente-se, ainda que as obrigações em causa e a respetiva emissão não estava sujeito ao Registo Prévio junto da CMVM, conforme o disposto no art.º 114 do CVM, nem à publicidade e publicidade prévia nos termos dos artigos 121.º e 122.º, do CVM, nem a anúncio de lançamento, exigibilidade de prospeto, conteúdo mínimo do prospeto e divulgação do prospeto, nos termos artigos 123.º, 134.º, 136.º, 137.º e 140.º, todos do CVM, por força do art.º 111, do mesmo diploma legal, afastados ficando os deveres de fornecer quaisquer documentos para tanto e com a respetiva informação quanto ao produto em causa.

Desta forma, na concordância do decidido, não resulta que o Recorrente tenha demonstrado que possa ser imputado ao Recorrido uma falha de informação relativamente ao produto financeiro, face às prestadas no contexto enunciado, que se consubstancie numa atuação ou omissão ilícita, geradora do dever de indemnizar.

Não havendo quaisquer outras questões que importe conhecer, improcedem na totalidade, as conclusões formuladas pelo Apelante.

IV–DECISÃO

Nestes termos, acordam as Juízas deste Tribunal da Relação, em julgar improcedente a apelação, confirmando a sentença recorrida.
Custas pelo Apelante.

*

Lisboa, 14 de setembro de 2021


Ana Resende
Isabel Salgado
Dina Monteiro,- 1.ª Adjunta, vencida conforme declaração de voto seguinte:


VOTO DE VENCIDA:

De forma distinta da decisão constante do presente acórdão, entendo que a ação deveria ser julgada como procedente, de acordo com os pressupostos que passo a enunciar.
No presente caso, e com relevância para a decisão da presente ação, tenham-se em atenção os seguintes factos dados como Provados:
 - O gerente do Banco Réu sugeriu aos RR. que adquirissem o produto financeiro aqui em análise sendo que estes detinham a quantia de € 50.000,00 na sua conta daquele Banco – Pontos 1 e 2 dos Factos Provados;
- Tendo o gerente do banco Réu informando os AA. que se tratava de um produto que trazia um rendimento proveniente de juros remuneratórios e reembolso de capital a 100% (…) e de que havia a expetativa de reembolso antecipado do produto – Ponto 3 dos Factos Provados;
- Em 10 de Abril de 20006 o A. adquiriu o produto em causa em que constava, como data de “prazo e reembolso: “o prazo de emissão é de dez anos, sendo o reembolso de capital efetuado em 09 de Maio de 2016” – Ponto 4 dos Factos Provados;
- Vencido o prazo de dez anos “o A. foi informado de que a aplicação financeira em causa não tinha cobertura de capital” - Ponto 12 dos Factos Provados.
Conforme se encontra expresso no acórdão de que este Voto de Vencida faz parte integrante, e reportando-se ao perfil do aqui A., ali se conclui que o A. não reveste a natureza de investidor qualificado para efeitos do artigo 30.º do CVM, sendo “(…) dono de uma designada microempresa, do ramo da confeitaria, tendo o 9.º ano de escolaridade”.
Como “senão” desta subscrição – que já veremos que também não existia na prática – temos a indicação de que se tratava de obrigações com vencimento a dez anos, com o “capital garantido”, informação que para um subscritor não investidor qualificado sempre seria determinante para a aquisição deste produto.
Podemos assim dizer que a garantia de reembolso de capital e os juros correspondentes à aquisição do produto financeiro aqui em análise estavam, assim, garantidos, eram seguros.
Em face da ausência de uma informação clara e detalhada sobre os riscos que estavam a correr com a aquisição dos produtos financeiros aqui em causa, nunca poderíamos concluir que o Banco Réu cumpriu validamente com a sua obrigação de consultadoria para investimento de valores mobiliários, prevista pelo artigo 291.º, alínea c), do CVM, no caso, que tenha prestado aos AA. as informações relevantes que lhe são impostas pelo artigo 7.º, n.º 1, daquele mesmo diploma legal ou que tenha dado cumprimento ao que lhe era imposto pelos artigos 73.º, 74.º e 76.º do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras (RGICSF). 
Com efeito, para além do risco inerente a uma qualquer operação em Bolsa, no caso de subscrição de obrigações subordinadas, que têm contornos de risco muito específicos, o “risco” próprio desse produto tem de ser minuciosamente explicado ao cliente/investidor, situação que, neste caso, não ocorreu.
Neste, como em outros casos, é de vital importância que o cliente conheça quais são os riscos associados à aquisição de uma obrigação subordinada. Com efeito, neste tipo de obrigações, como sabemos, em caso de falência ou liquidação da entidade emitente, o capital e os juros respetivos apenas são reembolsados (ficam subordinados) após prévio reembolso dos demais credores por dívidas não subordinadas, não obstante terem prioridade sobre os acionistas da emitente, no caso, a SLN – Sociedade Lusa de Negócios, SGPS, SA (hoje denominada Galilei, SGPS, SA).
O conhecimento da natureza das obrigações subordinadas e a sua correta e esclarecida informação aos clientes, entre eles, aos aqui AA., constitui uma obrigação do Réu, enquanto intermediário financeiro, informação que, naturalmente, tinha de ser prévia à subscrição de um qualquer boletim de aquisição de tais obrigações, por parte daqueles.
Tendo na sua base o conceito de um destinatário médio, tinha ainda o Banco a obrigação de se certificar que o cliente compreendeu corretamente a informação técnica que lhe foi transmitida, de forma a permitir a formação de uma vontade esclarecida por parte dos clientes (neste caso, os aqui AA.), determinante da posterior aquisição, ou não, daqueles produtos, em face dos “riscos” que lhes eram inerentes – artigos 312.º, alínea e) e 7.º, do CVM, na redação do Decreto-Lei n.º 486/99, de 13 de Novembro e, entre outros, Menezes Cordeiro, Direito Bancário, 5.ª Ed.ª, revista e atualizada, Almedina, Coimbra, págs. 401/402 e Acs. do STJ de 16 de Junho de 2015, Proc. 1880/10.7TVLSB.L1.S1 e de 17 de Março de 2016, Proc. 70/13.1TBSEI.C1.S1, ambos disponíveis em www.dgsi.pt/jstj).
Estas preocupações do legislador com o cumprimento do dever de informação que impende sobre os Bancos, enquanto intermediários financeiros, e como contraponto da defesa e proteção dos investidores, vieram a ser reforçadas com as alterações introduzidas ao CVM pelo Decreto-Lei n.º 357-A/2007, de 31 de Outubro, mormente, com os artigos 312.º-A, n.º 2, alínea c), 312.º-C, n.º 1, alínea j) e 312.º-E, n.º 2, alínea a).
Contrariamente ao entendimento defendido pelo Tribunal de 1.ª Instância e também constante do acórdão, entendemos que os AA. não tinham as informações necessárias, suficientes e esclarecedoras, para procederem à subscrição deste produto financeiro.
Estavam os AA. convencidos, conforme os factos acima dados como provados na ação, que tinham assegurado o reembolso do investimento, correndo por conta do Banco o risco relativo à perda da coisa depositada, a quem incumbe a prova de que essa perda ocorreu por razões imputáveis ao depositante e que agiu no cumprimento dos deveres de cuidado e sem culpa – artigo 796.º, n.º 1, do Código Civil.
Porém, e como acima já referimos, não é assim que as coisas se passam no caso das obrigações subordinadas. No caso de ocorrerem situações que envolvam a concretização e avaliação dos riscos, o respetivo reembolso tem outros contornos em muito desfavoráveis aos seus subscritores.
Seja como for, neste último caso estamos perante uma situação de “risco” que tem de ser avaliada pelo investidor antes da subscrição das obrigações, situação que não ocorre no presente caso tanto mais que os AA. nem sequer sabiam que esse “risco” (das obrigações subordinadas) existia.
Concluindo, neste quadro fáctico, e com todo o respeito por posição distinta, entende-se que a ausência de prévia informação bancária do Réu com vista à aquisição daquelas obrigações por parte dos AA., tem como consequência, junto de um qualquer destinatário médio, acreditar que o produto que lhe estava a ser oferecido teria, necessariamente, o ressarcimento do capital investido findo, pelo menos, os dez anos mencionados naquelas obrigações quando, como é próprio da natureza das obrigações subordinadas, tal risco não estava protegido nem os AA. sabiam sequer da sua existência o que sempre constituiria omissão grave de informação por parte do Banco Réu  – artigo 236.º do Código Civil.
Neste quadro é imperioso concluir-se que o Banco violou o seu dever de informação em relação aos aqui AA., enquanto seus clientes, omissão que é ilícita, porquanto resultante de violação de determinação legal expressa – artigos 304.º e 312.º, n.º 1, alínea a) e n.º 2, do CVM -, e cujo resultado final, traduzido num efetivo prejuízo patrimonial para os AA., decorre, em termos de causalidade adequada, da violação do dever de informação que impendia sobre o Banco, na sua qualidade de intermediário financeiro, conforme já acima deixamos expresso.
Em face da atuação desenvolvida pelo Banco Réu, enquanto intermediário financeiro, entendemos como inquestionável a sua responsabilidade perante os aqui AA., relativamente ao compromisso com os mesmos assumido quanto à garantia de reembolso do capital investido nessa aquisição dos identificados produtos financeiros e juros – entre outros, pode consultar-se o Ac. do STJ de 10 de Janeiro de 2013, Proc. 89/10.4TVPRT.P1.S1, em www.dgsi/pt/jstj.
Como se refere no Acórdão proferido no Processo 3194/16.0T8LRA.L1, datado de 24 de Abril de 2018, desta 7.ª Secção, subscrito pela aqui subscritora, também ali na qualidade de Adjunta, em que foi decidida uma situação semelhante àquela que aqui estamos a analisar: “no mínimo, este comportamento traduz-se numa violação grosseira dos deveres impostos ao intermediário financeiro, porque é incompreensível que não tenham tido estes cuidados elementares no cumprimento da obrigação de informação respeitante a instrumentos financeiros que comercializaram, quando essa informação se quer sempre completa, atual, clara, objetiva e lícita (Art. 7.º n.º 1 e n.º 2 do CVM).
Podemos, pois, concluir que o Banco Réu incorreu, enquanto intermediário financeiro, em responsabilidade civil, presumindo-se a sua culpa que, neste caso, está amplamente demonstrada pela omissão de prestações de informações aos seus clientes, aqui AA./Apelantes – artigo 314.º, nºs. 1 e 2, do CVM.
Nestes casos, em que a violação do dever de informação por parte do Banco ocorre na fase da formação do contrato – ou seja, naquela fase em que era importante para os AA. terem a informação correta sobre os produtos a adquirir para que pudessem tomar uma decisão esclarecida e informada -, a indemnização devida deve ser medida pelo interesse contratual positivo – entre outros, Ac. do STJ de 28 de Abril de 2009, Proc. 09A0457, in www.dgsi.jstj.pt.
Entendo, assim, que os AA./Apelantes deveriam ser indemnizados pelo Réu/Apelado, no mínimo, pelo montante correspondente à diferença entre o valor nominal que os títulos tinham na data da subscrição e o não-valor atual, que neste caso se cifra no valor desembolsado pelos AA. para a aquisição do produto em questão, acrescido dos juros de mora à taxa legal, considerados desde a data da citação do Réu até integral pagamento.

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[1]Diploma a que se fará referência, se mais nada for dito.
[2]Relativa a determinados pontos da matéria de facto, quanto aos quais a parte, de forma adequada manifesta a sua discordância.
[3]Cfr, Acórdão do STJ de 9.03.2021, in www.dgsi, que aqui de perto se segue.
[4]Miguel Teixeira de Sousa, in Prova Poderes da Relação e Convicção: a lição de epistemologia, fls. 32 e segs.
[5]Cfr. Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio Nora, Manual de Processo Civil, pag. 420 e 421.
[6]Com recurso à gravação sonora dos meios probatórios oralmente produzidos.
[7]Cfr. Ac. STJ de 1 de junho de 2010, in www.dgsi.pt, referindo, A valorização de comportamentos e atitudes das testemunhas não captáveis pelo registo magnético, se tiverem influência nas respostas à matéria de facto devem constar da motivação; se tal não ocorrer, o Tribunal da Relação não deve invocar a uma imediação que acabou por não assumir expressão nas respostas aos quesitos dados.
[8]Cfr. Ac. STJ de 1 de junho de 2010, já referido, bem como mais Jurisprudência ali citada, e Ac. STJ de 2 de novembro de 2017, in www.dgsi.pt.
[9]Cfr. Decisão da matéria de facto – exame crítico das provas, Revista do CEJ, 4, 2006, pag. 173.
[10]Cfr. Acórdão do STJ de 16 de dezembro de 2010, in www.dgsi.pt.
[11]De 11.03.2021, in www.dgsi.pt.
[12]Por reporte ao capital social das empresas,
[13]Indo atrás das privatizações da REN, EDP e PT, ultimamente da SONAE, referindo que agora a situação está pior em termos de rentabilidade, apontando para o valor de cerca de 30.000,00€, no concerne aos títulos em carteira, retendo algumas porque estavam abaixo da cotação.
[14]Em sede da petição inicial, e sobretudo na resposta à contestação, no concerne à exceção da prescrição suscitada pelo Banco Recorrido, o Apelante referenciou a nulidade por falta de forma do negócio de intermediação, nulidade esta “relativa” na medida que apenas pode ser suscitada por investidores não institucionais. Dando nota que entre os designados negócios de cobertura, que servem de base à subscrição, encontram-se as “ordens” na previsão dos artigos 325 do CVM, podendo ser dadas oralmente ou por escrito, devendo no primeiro caso ser reduzidas a escrito pelo recetor, 327, n.º1, do mesmo diploma. Salienta-se que as razões que justificam a tradicional exigência de formalidades na prática de atos jurídicos e que se prendem, sobretudo, em proteger as partes contra a sua irreflexão, facilitar a prova, bem como publicitar os atos, não passam pela forma. Desde logo porque quanto à proteção das pessoas, a mesma seria menor na medida que constitui um sector específico, a que acede quem quer, sendo que apenas certas entidades podem receber as ordens, enquanto que a prova é facilitada pela posse dos títulos, beneficiando a publicidade, certo é, que existe nos autos e foi apresentado pelo Recorrente, documento para tanto. Porém, e mais relevante, é o facto de o Apelante ter apenas mencionado a inexistência de contrato escrito, em sede das suas conclusões, sem da mesma retirar qualquer conclusão, o que leva a entender que deixou  “cair” a questão no recurso apresentado, afastando a apreciação, que ainda assim pelo aludido, naufragaria.
[15]Gonçalo Castilho dos Santos, A Responsabilidade Civil do Intermediário Financeiro Perante o Cliente, e notas jurisprudenciais e doutrinárias, mencionadas no Acórdão desta Relação e Secção, processo n.º 14647/19.8T8LSB.L1, de 9.03.2021, também subscrito pela ora relatora.
[16]Vejam-se as referências aquando da identificação do Recorrente, aquando das suas declarações, dando a indicação breve que estaria na casa dos trinta anos quando subscreveu o produto, em termos, contudo que não permitem a sua consideração em termos de factualismo apurado.