Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
539/13.8TTCSC.L1-4
Relator: PAULA SÁ FERNANDES
Descritores: CONTRATO A TERMO
RENOVAÇÃO EXTRAORDINÁRIA
PRESTAÇÃO COMPLEMENTAR
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 10/07/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: N
Texto Parcial: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA A DECISÃO
Sumário: 1. Num contrato de trabalho a termo as renovações extraordinárias têm de obedecer a requisitos de forma, não bastando que o documento inicial tenha sido celebrado pela forma escrita.
2. Se a ré pretendia lançar mão de uma renovação extraordinária tinha que ter informado atempadamente o autor, caso contrário, e de acordo com o regime jurídico previsto no Código do Trabalho, o contrato convertia-se num contrato sem termo, por excesso de prazo e de renovações, em obediência ao disposto no n.º1 do artigo 148 do CT.
3. A base de cálculo da prestação complementar ou acessória é constituída pela retribuição base e diuturnidades, designadamente para efeitos do cálculo das férias e subsídios de férias e de Natal, como resulta do disposto nos artigos n.ºs 262 a 264 do CT.
(Sumário elaborado pela Relatora)
Decisão Texto Parcial: Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa:



1-RELATÓRIO:



AA, residente (…) São Domingos de Rana
veio propor acção declarativa, sob forma ordinária, contra,
BB, S.A., com sede na Rua (…) Carnaxide,
Peticionou o autor o seguinte :  

a) Que se declare a ilicitude do despedimento, por não se ter verificado a caducidade do contrato de trabalho, na medida em que o mesmo, fruto das renovações ocorridas já se tinha convolado em contrato de trabalho sem termo e que em consequência seja ordenada a reintegração do Autor ao seu posto de trabalho;
b) e/ou em alternativa, e apenas com o expresso consentimento do trabalhador, proceder à substituição da reintegração pelo pagamento de uma compensação ao Autor em valor a arbitrar nos termos do art.º 391.º do Código de Trabalho; c) a condenação da R. no pagamento das seguintes quantias:

- €1.718,85 - proporcionais dos prémios não pagos nas férias, subsídio de férias e subsídio de Natal de 7.4.2010 a 6.10.2012; - €21.901,88 - 1 ano de retribuições (1.09.2012 a 30.9.2012) - art.º 390.º n.º 1 do C.T., - €4.140,00 - parte da remuneração, parte em dinheiro e outra em espécie, que o Autor deixou de receber durante um ano em virtude da invocada ilicitude da caducidade do contrato de trabalho; - €38.800,00 - a título de danos patrimoniais;  - €5.000,00 - danos não patrimoniais sofridos; - €477,77 - Juros de mora vencidos, tudo num total: €72.038,50;
d) a condenação da R. no pagamento das retribuições que o Autor venha a ter direito que se vierem entretanto a vencer, bem como nos juros de mora vincendos, custas e demais procuradoria, bem como de todos os encargos do processo.

Para o efeito, invocou que o contrato de trabalho do A. já se tinha convolado em definitivo quando a R. o veio denunciar, pelo que se trata de despedimento ilícito, com as legais consequências; em virtude dessa cessação com que não contava, o A. sofreu danos patrimoniais porquanto assumiu compromissos bancários, que depois ficou como sem ter como cumprir; sofreu psicologicamente com a situação, desde logo por não ter conseguido honrar os seus compromissos; não lhe foram pagos os proporcionais dos subsídios relativamente aos prémios auferidos.
           
Na contestação a ré invocou que o contrato de trabalho foi celebrado com termo, porquanto se destinava à abertura de um novo stand da R.; foi objecto de três renovações normais e de uma quarta ao abrigo da Lei n.º 3/2012, de 10 de Janeiro; as comissões pagas estavam dependentes do alcance de objectivos específicos; relativamente aos prémios, eram montantes que discricionariamente a R. decidia dar aos seus colaboradores, sem que os mesmos pudessem ser exigidos pelos trabalhadores; a atribuição de viaturas aos vendedores era um instrumento de trabalho, sendo a R. a principal interessada em que os seus trabalhadores circulassem nas viaturas que deveriam promover e vender; inexistência de qualquer nexo de causalidade entre a cessação do contrato e os danos patrimoniais que o A. alega ter tido.
         
Após a realização da audiência de discussão e julgamento foi proferida sentença que decidiu nos seguintes termos:

Pelo exposto, julgo a presente acção parcialmente procedente, por provada, e, em consequência:

a) Declaro que entre A. e R. existe um contrato de trabalho sem termo;
b) Declaro que a R. despediu ilicitamente o A.;
c) Consequentemente, condeno a R. a reintegrar o A. no mesmo estabelecimento sem perda de antiguidade e de categoria;
d) Condeno a R. a pagar ao A.:

1. retribuições que aquele deixou de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da presente decisão, a que serão deduzidas: a) as importâncias que o A. aufira com a cessação do contrato e que não receberia se não fosse o despedimento; b) A retribuição relativa ao período decorrido desde o despedimento até 30 dias antes da propositura da acção, uma vez que esta foi intentada nos 30 dias subsequentes ao despedimento; e c) O subsídio de desemprego atribuído ao trabalhador no período referido no n.º1, devendo o empregador entregar essa quantia à segurança social.
2. € 2.500,00 (dois mil e quinhentos euros), a título de indemnização por danos não patrimoniais;
3. juros legais à taxa de 4%, desde a data do trânsito da presente sentença até integral pagamento.  
e) Absolvo a Ré do mais peticionado.

Inconformados, Autor e Ré interpuseram recursos de apelação, tendo ambos deduzidos as respectivas contra-alegações.

O Exmº Procurador-geral Adjunto deu parecer cf. fls. 456.

Cumpre apreciar e decidir:

Tal como resulta das conclusões dos respectivos recursos que delimitam o seu objecto as questões suscitadas nos recursos interpostos são as seguintes:

Recurso da Ré :

a) - Impugnação da matéria de facto (factos provados sob os n.ºs 5, 9, e 10, que deviam ter sido dados como não provados);
b) - Validade da última renovação do contrato a termo, ao abrigo da renovação extraordinária permitida na Lei n.º3/2012;
c) - Licitude da comunicação da caducidade do contrato e a consequente inexistência de qualquer despedimento ilícito.

Recurso do Autor:

Prestações em dívida relativas: - ao direito ao valor correspondente aos proporcionais dos prémios não pagos nas férias, subsídios de férias e de Natal entre 7.04.2010 a 6.10.2102; - ao  direito a parte da remuneração que deixou de auferir durante um ano  em virtude da ilicitude da caducidade do contrato de trabalho; - ao direito à quantia peticionada a título de danos patrimoniais sofridos.


Fundamentos de facto:

Foram considerados provados os seguintes factos:

 1. Em 7 de Abril de 2010, o Autor, na qualidade de trabalhador, celebrou com a Ré, na qualidade de entidade empregadora, um contrato ao qual as partes atribuíram o nome de “Contrato de Trabalho a Termo Certo”.
2. A partir de 7 de Abril de 2010, o Autor começou a trabalhar para a Ré sob a sua autoridade e direcção, tendo começado a exercer funções de vendedor, mediante o pagamento de um vencimento mensal base no valor de €485,00, de um subsídio de alimentação diário no montante de €6,17.
3. O A. recebia ainda, por vezes, prémios e comissões, estas últimas calculadas sobre as vendas efectuadas por aquele.
4. O Autor recebia um montante de €125,00 para combustível e um saldo em telecomunicações, bem como um automóvel de marca Mercedes, que o A. usava para além do horário de trabalho, o qual constituía o seu único meio de transporte.
5. Em 20 de Setembro de 2012, a Ré enviou uma carta ao Autor invocando a caducidade do contrato de trabalho supra referido, com efeitos a partir de 6 de Outubro de 2012.
6. Na referida carta, alegou a Ré, em síntese, que o aludido contrato de trabalho teria atingido o máximo de renovações legais previstas no n.º 1 do art.º 148.º do C.T., mas que em virtude da entrada em vigor da Lei n.º 3/2012, de 10 de Janeiro, o contrato teria tido a sua primeira renovação extraordinária novamente por igual período (de seis meses), nos termos da conjugação do disposto no artigo 5.º da Lei n.º 3/2012 e do artigo 149.º do Código do Trabalho.
7. Tendo o referenciado contrato de trabalho sido celebrado pelo período de 6 meses tendo o respectivo termo sido justificado pela alegada necessidade de satisfazer necessidades temporárias da Ré, nomeadamente, pelo facto de aquela ter implementado um novo estabelecimento na localidade de Abuxarda, o que em face das “condições de mercado” e dos “riscos típicos de cada negócio” sempre caracterizaram como de duração incerta o lançamento do estabelecimento.
8. A Ré, no 2.º parágrafo da carta que endereçou ao Autor em 20.9.2012 reconheceu que a duração máxima do contrato de trabalho legalmente admissível, era, à data da celebração do referido contrato de 2 anos, ao abrigo do disposto na alínea b), do n.º 1 do art.º 148.º do Código de Trabalho.
9. Argumenta a Ré na missiva, que em virtude da entrada em vigor da Lei n.º 3/2012, de 10 de Janeiro, o contrato teria tido a sua primeira renovação extraordinária novamente por igual período (de seis meses), nos termos da conjugação do disposto no artigo 5.º da Lei n.º 3/2012 e do artigo 149.º do Código do Trabalho, na data de 7 de Abril de 2012.
10. Até 7 de Abril de 2012, a Ré não comunicou ao Autor que pretendia que o respectivo contrato de trabalho fosse alvo de uma renovação extraordinária ao abrigo do disposto na nova Lei n.º3/2012, de 10 de Janeiro entretanto publicada.
11. A Ré veio entretanto a admitir ainda outros trabalhadores, para exercer as mesmas funções das do Autor.
12. A empresa Ré continua com o seu estabelecimento em franca actividade, actividade essa superior à da data da sua abertura.
13. O Autor pelas vendas dos carros usados ou de serviço que realizava sempre recebeu da Ré as respectivas comissões ou de prémios.
14. Os prémios não entravam na retribuição do A., para efeito de retribuição de férias, subsídio de férias e de Natal:
15. O Autor, em virtude de ter ficado numa situação de desemprego involuntário face à invocada caducidade do contrato de trabalho por parte da Ré, Autor passou a receber mensalmente a título de subsídio de desemprego a quantia de € 1.510,50.
16. O despedimento em causa fez com que o A., tenha ficado com o seu sistema nervoso afectado, o que determinou por diversas vezes manifestar-se em comportamentos um pouco agressivos para com terceiros, e donde resultou uma quase total falta de paciência seja para o que fosse, designadamente para conviver com o seu único filho menor.
17. O contrato de trabalho a termo certo celebrado entre o A. e a R. teve como fundamento o facto de, à data da admissão do A., a R. ter muito recentemente iniciado a laboração de um novo stand (estabelecimento) na Abuxarda, Cascais:
18. As partes estipularam que o contrato de trabalho a termo certo teria a duração inicial de 6 meses:
19. Não foi acordado entre as partes que o contrato em questão não estaria sujeito a renovações.
20. No termo dos 6 meses iniciais de duração e na ausência de promoção de caducidade por qualquer uma das partes, o contrato de trabalho foi renovado uma primeira vez.
21.O contrato de trabalho celebrado entre as partes foi, aliás, objecto de quatro renovações (ou seja 3 renovações para além da recordada no artigo anterior).
22. Tal como resulta da cláusula quarta do contrato de trabalho celebrado entre as partes, ficou acordado que o A. auferiria.
a) Uma retribuição base no valor de € 475,00 ilíquidos (cláusula 4.ª, n.º 1 do contrato de trabalho);
b) Um subsídio de refeição no valor ilíquido de € 6,17 por cada dia de trabalho efectivo (cláusula 4.ª, n.º 3 do contrato de trabalho).
23. No n.º 1, da cláusula 4.ª do contrato de trabalho pode ler-se: “todos e quaisquer prémios, subsídios ou gratificações que a Primeira Contraente confira ao Segundo Contraente têm natureza facultativa e precária, pelo que poderá a empresa alterá-los ou retirá-los em qualquer altura e sem necessidade de aviso prévio”:
24. Atentas as funções a desempenhar pelo A., que se dedicava à venda de viaturas automóveis comercializadas pela R., o mesmo passou a estar sujeito ao regime de comissões vigente na empresa.
25. O regime de comissões incidia sobre a venda de viaturas novas, e viaturas usadas.
26. As percentagens das comissões aplicáveis no caso de vendas de viaturas eram conhecidas dos vendedores da R., aqui se incluindo o A.
27. Contanto que se verificassem todos os requisitos de atribuição e apenas nesse caso, as comissões eram pagas mensalmente, juntamente com a retribuição base do A.
28. Particularmente, a partir do 6.º mês de execução do contrato, é evidente o pagamento de comissões ao A. pela venda de viaturas aos clientes da R.:
29. Sendo que, até ao sexto mês de execução do contrato, tratando-se de uma fase de ambientação do A. às suas funções, à empresa e às viaturas por esta comercializadas, não existiu pagamento de comissões.
30. Sendo que, por esse fato, a R., por sua própria iniciativa, decidiu compensar o A., atribuindo-lhe um prémio extraordinário e temporário para lhe assegurar uma retribuição bruta de € 1.000,00, sob a designação “prémio”.
31. As comissões eram incluídas na retribuição de férias, subsídio de férias e de Natal do A.  
32. Refira-se que as comissões estavam sujeitas a objectivos comunicados aos trabalhadores, variando em função de grau de alcance dos mesmos, sendo que havendo desvio relevante, nenhuma comissão seria paga pela empresa.
33. O sistema vigente na empresa para os vendedores era o do pagamento de uma retribuição base, complementada pelo eventual pagamento de comissões por viaturas vendidas.  
34. Não estava assim contratualizado o pagamento de quaisquer prémios por parte da R. ao A.
35. Mas como são os vendedores que, em permanente contacto com os clientes, impulsionam as vendas da empresa e, consequentemente, o rendimento desta última, a R., por vezes, premiava os seus vendedores pela venda de viaturas.  
36. Quando tal ocorria, era através da atribuição de prémios extraordinários e de valor e periodicidade discricionária e incerta.
37. Com efeito, essa rubrica começou por ser utilizada pela empresa nos primeiros meses do contrato do A. para lhe atribuir, discricionariamente, os valores necessários para que este recebesse todos os meses € 1.000,00 brutos.
38. A empresa entendeu que, atentas as funções a desempenhar pelo A. e a maior dificuldade que o mesmo teria nos primeiros meses de execução do contrato em realizar vendas, deveria atribuir-lhe, a título transitório e precário, um prémio de forma, a que o mesmo pudesse auferir, nos primeiros meses de execução do contrato, um valor bruto mínimo de € 1.000,00.
39. Tendo sido criada, no início da execução do contrato, a rúbrica “prémio”, a mesma (sujeita aos legais descontos) veio a ser aproveitada, posteriormente para proceder ao pagamento de outros montantes.
40. Assim, a dada altura de 2010 essa rubrica passou a ser usada para efectuar outros pagamentos ao A., por exemplo por horas de trabalho suplementar prestadas pelo mesmo.
41. O A. foi contratado para exercer as funções inerentes à categoria profissional de Vendedor.
42. Como o próprio nome indica, os vendedores dedicam-se essencialmente à actividade comercial e promocional da empresa, dos bens e serviços que esta comercializa e/ou presta e, em última instância, da marca “Mercedes”.
43. Nesse sentido, no exercício das suas funções, os vendedores têm de estar em permanente contacto com clientes ou potenciais clientes da R., sejam eles clientes particulares ou empresas.
44. Os contactos com os clientes – essencialmente promovidos pelos vendedores da R., como era o caso do A. – desenvolvem-se na sua maioria das vezes telefonicamente.
45. Ou através de visitas aos clientes.
46. No mesmo sentido, os vendedores da R. têm também uma actividade promocional intensa, pelo que é bastante comum os mesmos comparecerem em feiras de automóveis, roadshows, ou outros eventos relacionados com a indústria automóvel.
47. Qualquer colaborador que exerça funções de vendedor na R. passa grande importante do seu tempo fora das instalações da empresa.
48. Sendo que, durante essas viagens, os mesmos têm de estar permanentemente contactáveis e disponíveis para os clientes.
49. Resulta assim evidente que, para o exercício das suas funções, os vendedores tenham de ter disponível uma viatura de serviço e um telemóvel de serviço.
50. No que diz particularmente respeito aos automóveis de serviço, o facto de a R. ser uma empresa que se dedica à comercialização de viaturas automóvel da marca Mercedes não pode, evidentemente, deixar de ser tido em conta.
51. Por esse motivo, as viaturas de serviço que são atribuídas aos seus colaboradores são da marca Mercedes.
52. As viaturas de serviço, bem como os telemóveis de serviço, são atribuídas aos vendedores para fins profissionais, enquanto instrumentos de trabalho, sendo-lhes contudo, permitido que usem ambos aos fins-de-semana e mesmo durante as férias.
53. Com efeito, tendo novamente em conta a actividade comercial desenvolvida pelo A., a R. tinha consciência que o mesmo tinha de estar permanentemente contactável.
54. A utilização de viatura e de telemóvel da R., não consta do contrato de trabalho como retribuição.
55. No caso da viatura de serviço, uma vez que os vendedores são o principal interface da R. perante os seus clientes, devem circular nas diversas viaturas que vão sendo comercializadas pela Ré.  
56. Além da retribuição base do A., a R. incluía ainda no cálculo do subsídio de Natal a média das comissões auferidas.
57. Assim, nos meses de Novembro de 2010 e 2011, o subsídio de Natal foi processado ao A. em várias rubricas, uma referente ao cálculo sob a retribuição base do A., e outras referentes ao cálculo das médias das comissões vendidas.
58. No que diz respeito ao ano de 2012, tendo o A. saído da empresa antes de Novembro desse ano (mês em que é processado o subsídio de Natal aos colaboradores), os proporcionais do subsídio de Natal foi pago com o fecho de contas.
59. Sendo que aí, mais uma vez, foram incluídos nos cálculos deste subsídio não só a retribuição base (numa rubrica), como até a média das comissões (noutra rubrica).  
60. A R. efectivamente incluía no cálculo do subsídio de férias, as médias das comissões auferidas.
61. Tendo em conta o facto de o A. estar vinculado ao A. mediante um contrato de trabalho a termo certo de 6 meses, o pagamento do subsídio de férias era feito de forma proporcional, ao fim de cada termo do contrato.
62. Assim, no fim de cada termo era pago ao A. o proporcional de subsídio de férias referente ao período de execução do contrato.
63. Nesses meses (Outubro de 2010, Abril de 2011, Novembro de 2011, Março de 2012 e Outubro de 2012), o subsídio de férias era, à semelhança do que ocorria com o subsídio de Natal, pago em várias rubricas.
64. Numa das rubricas o subsídio de férias era pago com referência à retribuição base do A. (uma vez que este não auferia diuturnidades.
65. E nas demais com referência à média das comissões realizada nos últimos meses.
68. Acontece porém que, como os vendedores da R. tinham uma parte da sua retribuição variável (as comissões por vendas de viaturas, nestes casos, calculava-se a parte variável da retribuição por referência à média dos últimos meses.
69. Nos contratos de trabalho a termo referentes aos vendedores, a R. optou por ir pagando os dias de férias referentes à retribuição variável periodicamente (que normalmente coincidia com a renovação do termo).
70. Sendo que nos meses em que os trabalhadores gozavam efectivamente dias de férias a retribuição base continuava a ser-lhe processada.
71. Deste modo, nos meses de novembro de 2010, maio de 2011, julho de 2011, novembro de 2011, abril de 2012, agosto de 2012 lhe foram pagas os dias de férias por referência à média das comissões auferidas nos últimos meses (rubrica “Med.Com.Férias”).
72. Por fim, no fecho de contas, com o último recibo de vencimento, foram-lhe pagos os valores ainda em dívida referente a dias de férias não gozados.
73. E, mais uma vez, os dias de férias foram pagos em duas rubricas, sendo que uma delas integrava as médias das comissões.


Fundamentos de direito:

Questão prévia:

Existe um manifesto lapso, tal como foi invocado pela ré/recorrente e aceite pelo autor, na decisão recorrida, na sua alínea d) n.º1 b)  que por isso passará a ter a seguinte redacção:
“d) Condeno a R. a pagar ao A.:

1. retribuições que aquele deixou de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da presente decisão, a que serão deduzidas:
a) As importâncias que o A. aufira com a cessação do contrato e que não receberia se não fosse o despedimento;
b)A retribuição relativa ao período decorrido desde o despedimento até 30 dias antes da propositura da acção, uma vez que esta não foi intentada nos 30 dias subsequentes ao despedimento;
c) O subsídio de desemprego atribuído ao trabalhador no período referido no n.º1, devendo o empregador entregar essa quantia à segurança social.”
         
Recurso interposto pela Ré:

Importa agora apreciar a 1ª questão suscitada no recurso interposto pela ré, relativa à impugnação da matéria de facto. Alega a Ré que os factos provados sob os n.ºs 5, 9, e 10, no seu entendimento, deviam ter sido dados como não provados.

Vejamos então.
(…)
Face ao exposto, por falta de fundamento improcede a deduzida impugnação à matéria de facto.

A 2ª questão que é a questão crucial suscitada no recurso interposto pela Ré é relativa à natureza do contrato à data em que a Ré lhe pôs termo, e que consiste em saber se, nessa altura, era ainda um contrato a termo ou se já era um contrato sem termo, como decidiu a sentença recorrida.

Vejamos então.

Resulta da factualidade provada:

- A. e R. celebraram, em 7 de Abril de 2010, um contrato de trabalho a termo com a duração de 6 meses, sendo o motivo justificativo para o termo o facto de a R. ter aberto um novo stand.
- Em 20 de Setembro de 2012, a R. denunciou o contrato, a produzir efeitos em 6 de Outubro de 2012, invocando para o efeito a Lei n.º3/2012, de 10 de Janeiro, que estabeleceu um regime de renovação extraordinária dos contratos de trabalho a termo certo.  
Importa assim apurar se os últimos seis meses do contrato podem ser considerados como uma renovação extraordinária do contrato a termo inicialmente celebrado, ao abrigo da invocada Lei n.º3/2010, como defende a Ré.

Tendo resultado apurado que a contratação a termo do A. se prendeu com a abertura de novo stand, a R. podia ter celebrado o contrato com o A. nos termos em que o fez, ao abrigo do disposto nos artigos 140º, nº4 b) 141º, e 148º n.º1b) do CT. O contrato de trabalho em causa foi reduzido a escrito e tinha indicado o termo,
bem como os factos que consubstanciavam o motivo justificativo para esse mesmo termo.
 
Todavia, o artigo 149.º do mesmo Código, relativamente à renovação do contrato de trabalho a termo, estabelece:

1. As partes podem acordar que o contrato de trabalho a termo certo não fica sujeito a renovação.
2. Na ausência de estipulação a que se refere o número anterior e de declaração de qualquer um das partes que o faça cessar, o contrato renova-se no final do termo, por igual período se outro não for acordado pelas partes.
3. A renovação do contrato está sujeita à verificação da sua admissibilidade, nos termos previstos para a sua celebração, bem como iguais requisitos de forma no caso de se estipular período diferente.
4. Considera-se como único contrato, aquele que seja objecto de renovação.

Assim, tendo o contrato de trabalho tido início em 7 de Abril de 2010, pelo período de 6 meses, significa que em 7 de Outubro de 2010 teve lugar a primeira renovação; em 7 de Abril de 2011, teve lugar a segunda renovação; e em 7 de Outubro de 2011, teve lugar a terceira renovação.

Em 7 de Abril de 2012, o tribunal recorrido considerou que, pela conjugação do disposto no artigo 147.º, n.º 2, al. b) com o artigo n.148.º, n.º 1, al. b), o contrato se convolou em contrato sem termo, porquanto a invocada quarta renovação já não seria admissível, nos termos do n.º1 do artigo 148º do CT que dispõe: “1- O contrato de trabalho a termo certo pode ser renovado até três vezes e a sua duração não pode exceder…”

Afigura-se-nos correcta esta conclusão. Com efeito a Lei n.º3/2012, de 10 de Janeiro, introduziu um regime de renovação extraordinária dos contratos termo certo, estipulando o seu art.º2, n.º1: “Podem ser objecto de duas renovações extraordinárias os contratas de trabalho a termo certo que, até 30 de Junho de 2013, atinjam os limites máximos de duração estabelecidos no n.º 1 do artigo 148.º do Código do Trabalho”.

Na verdade, perante um clima de crise e de desemprego elevado, o legislador veio permitir mais duas renovações dos contratos a termo, quando este atingisse os limites máximos de duração, previstos no n.º1 do artigo 148º do CT. Importa saber se, no presente caso, ocorreu ou ão uma renovação extraordinária do
contrato, nos termos do disposto no art.º149º nº2 do CT, ex.vi do art.º5 da Lei n.º3/2012 de 10-01.

À renovação extraordinária prevista na Lei n.º3/2012 é aplicável o CT em tudo o que não está nela previsto, sendo que este diploma legal cuidou apenas de formular um desvio ao regime geral no que concerne às renovações. Dado que o contrato de trabalho a termo é um contrato formal e as suas renovações por período diferente do contrato inicial estão sujeitas à verificação da sua admissibilidade, nos termos previstos para a sua celebração, de acordo com o disposto nos art.º149, n.º3 e 141º do CT, para que possa haver renovações extraordinárias não basta que o documento inicial tenha sido celebrado pela forma escrita, sob pena de subverter as finalidades do formalismo estabelecido para as renovações por período diverso do inicialmente estipulado que têm de obedecer a requisitos de forma (n.º3 do art.º147), ou seja, se a R. pretendia lançar mão de uma renovação extraordinária tinha que ter informado atempadamente o A. pois, caso contrário, e de acordo com o regime jurídico previsto no Código do Trabalho, o contrato convertia-se num contrato sem termo, por excesso de prazo e de renovações, em obediência ao disposto no art.º147 n.º2 b) e 149 do CT.

Assim, não pode a Ré invocar retroactivamente uma renovação extraordinária, quando isso não tinha sido acordado, constituindo uma surpresa para o trabalhador, cujas legítimas expectativas eram a de que a sua permanência ao serviço da ré, após o termo da última renovação significava que o seu contrato se havia convolado em contrato sem termo.

O regime jurídico da renovação extraordinário não pode ser de aplicação automática por colidir com regime normal das renovações, no qual o contrato se converteria contrato sem termo decorrido o número de três renovações, cf. n.º1 do artigo 148 do CT, não podendo assim substituir-se automaticamente a um regime legal imperativo e à vontade das partes. 

Tal como se concluiu na sentença recorrida, a referida conduta da ré ao invocar a retroatividade da renovação extraordinária configura um abuso de direito, na medida em que pretende usar uma medida legislativa extraordinária, que visava dentro do âmbito de uma política de emprego diminuir o desemprego, tornar
precário o que à luz do Código do Trabalho já se havia tornado definitivo.
 
Assim sendo, se a R. pretendia usar de tal prerrogativa, tinha que aquando do termo da 3ª e última renovação informar o A. que estava a operar a mais uma renovação, ao abrigo da referida lei, cabendo a este aceitar ou não que a Ré a utilizasse, sob pena de não o fazendo o contrato se converter num contrato sem termo, por força do n.º3 b) do artigo 147º em conjugação com o n.º1 do art.º 148 do CT, que aquela lei extraordinária não pôs em causa. Na mesma linha de entendimento já decidiu este Tribunal da Relação no acórdão proferido em 21 de Maio de 2014, no processo n.º 665/12.0TTBRR.L1-4.

Deste modo, deverá improceder este recurso, também, quanto a esta questão, em que a Ré pretende que o contrato de trabalho em causa se renovou extraordinariamente em 7 de Abril de 2012 por mais 6 meses. 

Assim, não tendo havido a renovação extraordinária do contrato, mas antes a sua conversão num contrato sem termo há que concluir-se pela ilicitude do despedimento que não foi precedido de processo disciplinar, tal como foi apreciado e decidido na sentença recorrida, sendo por isso improcedentes as questões relativas à licitude da comunicação da caducidade do contrato e a consequente inexistência de qualquer despedimento ilícito.
 
Recurso do Autor:

O autor pretende que lhe seja reconhecido: o valor correspondente aos proporcionais dos prémios não pagos nas férias, subsídios de férias e de Natal entre 7.04.2010 a 6.10.2102 – no montante de 1 718,85; a parte da remuneração que deixou de auferir durante um ano em virtude da ilicitude da caducidade do contrato de trabalho; a quantia peticionada a título de danos patrimoniais sofridos, tendo para o efeito impugnado a matéria de facto requerendo a sua reapreciação
 
Quanto à reapreciação da matéria de facto não identificou o autor/recorrente quais os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, nem qual a decisão que deveria ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, assim, não tendo o recorrente especificado tais pontos, rejeita-se liminarmente a
apreciação da impugnação à matéria de facto, ao abrigo do disposto nos n.º1 a) e c) do artigo 640º do CPC.

Quanto ao pagamento dos valores correspondente aos proporcionais dos prémios não pagos nas férias, subsídios de férias e de Natal entre 7.04.2010 a 6.10.2102, também não se nos afigura que a recorrente tenha razão, pois ao abrigo do disposto no artigo 262º do CT/2003 e 2007, a base de cálculo da prestação complementar ou acessória é constituída pela retribuição base e diuturnidades, designadamente para efeitos do cálculo das férias e subsídios de férias e de Natal, como resulta do disposto nos artigos n.ºs 263 e 264 do CT .

Quanto à parte da remuneração que deixou de auferir durante um ano, em virtude da ilicitude da caducidade do contrato de trabalho, está já incluída na condenação que resulta das normas legais imperativas relativas à declaração da ilicitude do despedimento e que se consubstanciou na condenação da Ré a reintegrar o A. no mesmo estabelecimento, sem perda de antiguidade e de categoria e na condenação da Ré a pagar ao A. as retribuições que aquele deixou de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da sentença recorrida.

No que respeita à quantia peticionada a título de danos não patrimoniais sofridos, também se nos afigura que sentença recorrida decidiu com acerto, face à matéria de facto apurada, pois não se apuraram todos os danos alegados pelo autor mas, apenas, os que resultaram descritos no facto n.º16 dos fundamentos de facto.  

            Decisão:

Face ao exposto, julgam-se improcedentes os recurso interpostos e confirma-se a sentença recorrida com a rectificação acima enunciada, pelo que a decisão recorrida, na alínea d) n.1b) passará a ter a seguinte redacção: “… b) A retribuição relativa ao período decorrido desde o despedimento até 30 dias antes da propositura da acção, uma vez que esta não foi intentada nos 30 dias subsequentes ao despedimento.”         
Custas na proporção.


Lisboa, 7 de Outubro de 2015


Paula Sá Fernandes
Filomena Manso
Duro Mateus Cardoso
         
Decisão Texto Integral: