Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
6388/2006-8
Relator: CAETANO DUARTE
Descritores: COMPETÊNCIA MATERIAL
INJUNÇÃO
VALOR DA CAUSA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 11/02/2006
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: AGRAVO
Decisão: CONCEDIDO PROVIMENTO
Sumário: As varas cíveis são os tribunais competentes em razão da matéria para julgar os procedimentos de injunção, de valor superior à alçada do Tribunal da Relação, que prosseguem os seus termos aplicando-se a forma de processo comum ou porque foi deduzida oposição ou porque se frustrou a notificação naquele procedimento (Lei n.º 32/2003, de 17 de Fevereiro)

(SC)
Decisão Texto Integral: S.[…] S.A. requereu processo de injunção contra António […] pretendendo receber a quantia total de € 31.335,81 acrescidos de juros relativa a fornecimento de bens e serviços. Tendo-se frustrado a notificação do requerido, foram os autos remetidos para distribuição, tendo sido distribuídos à […] Vara Cível da comarca de Lisboa. Por decisão de 28 de Abril de 2006, o juiz da […] Vara Cível declarou-se incompe­tente em razão da forma de processo por entender que os tribunais competentes para estes processos são os juízos cíveis. Desta decisão vem o presente recurso interposto pela reque­rente/Autora.

Corridos os vistos, cumpre decidir.
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A recorrente alega, em suma:
- A decisão recorrida defende que o procedimento de injunção só deve ser reme­tido às Varas Cíveis no caso de haver oposição e se ambas as partes tiverem requerido a intervenção do tribunal colectivo;
- Baseou-se o juiz a quo no n.º 2 do artigo 7º da Lei 32/2003 de 17 de Fevereiro onde se prevê que “para valores superiores à alçada da Relação, a dedução de oposição e a frustração da notificação no procedimento de injunção determi­nam a remessa dos autos para o tribunal competente, aplicando-se a forma de processo comum.”;
- Entendeu-se ainda que só compete às varas cíveis a preparação e julgamento das acções declarativas  cíveis de valor superior à alçada da Relação em que a lei preveja a intervenção de tribunal colectivo;
- Ora a discussão e julgamento  só e feita pelo tribunal colectivo se ambas as par­tes assim o tiverem requerido pelo que, sem esse requerimento, está excluída a intervenção daquele tribunal;
- Não havendo oposição e não tendo sido requerida a intervenção do tribunal colec­tivo por ambas as partes, o processo não devia ter sido remetido às varas cíveis;
- Ora, de acordo com o disposto no n.º 2 do artigo 7º do Decreto Lei 32/20003,  “a dedução de oposição e a frustração da notificação no procedimento de injun­ção determinam a remessa dos autos para o tribunal competente”;
- E caberá neste caso, depois de frustrada a notificação e atendendo ao valor da causa, a intervenção do tribunal colectivo?
- A falta de requerimento de intervenção do tribunal colectivo formulado por ambas as partes não pode levar a que se considerem os juízos cíveis competen­tes para a preparação e julgamento da causa;
- Tratando-se de acção declarativa com a forma de processo ordinário, apesar de não ter sido requerida a intervenção do colectivo, serão competentes as varas cíveis, em razão do valor e da forma do processo, podendo verificar-se a inter­venção de tribunal singular e não exclusivamente a do tribunal colectivo.
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Pode-se dar como assente que estamos perante um pedido de valor superior à alçada da Relação, emergente de transacção comercial. Para a decisão desta causa é fulcral o disposto no artigo 7º do Decreto Lei 32/2003, na redacção dada pelo Decreto Lei 107/2005 de 1 de Julho:

“2 - Para valores superiores à alçada da Relação, a dedução de oposição e a frustração da notificação no procedimento de injunção determinam a remessa dos autos para o tribunal competente, aplicando-se a forma de processo comum.
3 - Recebidos os autos, o juiz pode convidar as partes a aperfeiçoar as peças pro­cessuais.
4 - As acções destinadas a exigir o cumprimento das obrigações pecuniárias emer­gentes de transacções comerciais, nos termos previstos no presente diploma, de valor não superior à alçada da Relação seguem os termos da acção declarativa especial para cum­primento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos.»
 
Significa isto que, a partir da entrada em vigor desta nova redacção, as acções de dívida a que seja aplicável o procedimento de injunção cujo valor não seja superior à alçada da relação seguem os termos da acção declarativa especial para cumprimento de obrigações emergentes de contratos, incluindo-se as fundadas em transacções comerciais. E esta acção declarativa especial não admite, efectivamente, a intervenção do tribunal colectivo. Mas a lei não prescreve que as acções de dívida a que seja aplicável o processo de injunção seguem esta forma de processo independentemente do seu valor.

Nas injunções cuja valor exceda a alçada da relação, os autos devem ser, como vimos, remetidos ao tribunal competente, aplicando-se a forma de processo comum. Assim, a acção seguirá a forma de processo comum ordinário e nada justifica que esta acção, só por ter como génese uma injunção, não prossiga no tribunal que a lei considera especialmente vocacionado para julgamento das acções de maior valor, normalmente mais complexas.

No momento da distribuição ou, no caso dos autos, no momento da remessa para o tribunal competente, não se pode excluir a possibilidade de intervenção de tribunal colec­tivo à semelhança do que sucede com qualquer outra acção declarativa que siga a forma de processo ordinário. É certo que, mais tarde, se pode verificar a não intervenção do tribunal colectivo por não ter sido requerida ou por ser um dos casos de impossibilidade previsto nas alíneas do n.º 2 do artigo 646º do Código de Processo Civil mas isso não afasta a com­petência das varas cíveis.

O regime vigente é lógico na medida em que dá tratamento igual ao que é igual, não se justificando uma distinção entre os processo declarativos ordinários só porque, na fase inicial, o processo seguiu a tramitação do procedimento de injunção. Neste momento, vai-se proceder à discussão da pretensão, em sede declarativa, inviabilizado que ficou o acesso imediato ao regime da acção executiva com a frustração da notificação.

Em resumo, a acção declarativa de valor superior à alçada da Relação, decorrente da frustração de notificação num procedimento de injunção, é um processo comum sem qualquer especialidade pelo que, para a sua preparação e julgamento, são competentes as varas cíveis. Por outras palavras, tratando-se de acção que segue a forma do processo ordi­nário, a competência para a sua instrução e julgamento cabe às varas cíveis.
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Pelo exposto, acordam em conceder provimento ao agravo, declarando-se a 9ª Vara Cível da Comarca de Lisboa compe­tente para a instrução deste processo.
Sem custas.

 Lisboa, 2 de Novembro de 2006

José Albino Caetano Duarte
Salazar Casanova (dispensado o visto)
António Pedro Ferreira de Almeida