Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
| ||
Relator: | MARGARIDA BACELAR | ||
Descritores: | CONVERSAS INFORMAIS CONSTITUIÇÃO DE ARGUIDO SUBSTITUIÇÃO DE PENA DE PRISÃO PRISÃO POR DIAS LIVRES | ||
Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 10/17/2017 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
Decisão: | NÃO PROVIDO | ||
Sumário: | –O arguido não tem que ser constituído como tal assim que se concretiza a intervenção policial, se foi abordado por causa de um acidente, em que a polícia interveio para o socorrer e se informar do sucedido, se apenas no momento em que, interceptado, faz a afirmação de ser o condutor de veículo, com o qual acabara de embater contra uma parede, situação para a qual a polícia fora alertada por populares e por outros agentes da polícia e para a qual se aprontaram até a obter auxílio médico uma vez que, só depois de verbalizar a prática da condução e de se ter verificado o grau de álcool no sangue de que era portador, é que surgiu a obrigação de constituição como arguido em processo crime e não antes. –Nesse caso, não houve atraso na constituição de arguido em processo crime para os efeitos do artigo 58º, nº 5 C.P.P nem a nulidade de meio de prova aí prevista. –As declarações prestadas pelo próprio no local e em momento anterior à notícia de um crime e como tal anterior à sua constituição como arguido que foram concertadamente avaliadas e valoradas conjuntamente, e de forma conjugada e crítica, com outros meios de prova constituem a uma denúncia de um crime nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 241º e seguintes do Código de Processo Penal, mais propriamente do artigo 244º. –A Lei 94/2017 de 23.8, publicada mas ainda não entrada ainda em vigor, que despenaliza a prisão por dias livres e o regime de semi-detenção, poderá permitir para casos de decisões transitadas em julgado que o condenado requeira nova audiência para os fins consentidos pelo art.º 12º da mesma. (Sumário elaborado pela Relatora) | ||
Decisão Texto Parcial: | |||
Decisão Texto Integral: | Acordam, os juízes, na 5ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa. 1.Relatório: 1.1.– No processo supra referenciado foi proferida sentença que, após julgamento, em processo comum e com intervenção do tribunal singular: –Condenou o arguido M.B. pela prática, como autor, e em concurso real: –de um crime de violação de proibições ou interdições, p. e p. nos art.º 353º do Código Penal, na pena de 8 (oito) meses de prisão; –de um crime de condução em estado de embriaguez, p. e p. nos art.ºs 292º, n.º 1, e 69º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, na pena 4 (quatro) meses de prisão; E, em cúmulo jurídico daquelas penas parcelares, condenou o arguido na pena única de 9 (nove) meses de prisão, os quais serão cumpridos por dias livres, nos termos do art.º 45º, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal, em 54 (cinquenta e quatro) períodos sucessivos correspondentes a 54 (cinquenta e quatro) fins-de-semana entre as 09H00 de Sábado e as 21H00 de Domingo com início no segundo fim de semana subsequente ao trânsito em julgado da presente sentença; –Condenou o arguido na sanção acessória de proibição de conduzir veículos com motor, pelo período de 18 (dezoito) meses, nos termos do art.º 69º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, devendo o arguido entregar a respectiva carta/licença de condução no Tribunal, ou em qualquer posto policial, no prazo de 10 (dez) dias a contar do trânsito em julgado da presente decisão, sob pena de, não o fazendo, ser determinada a apreensão daquela carta/licença, de harmonia com o disposto no art.º 500º, n.ºs 2 e 3, do Código de Processo Penal, e de incorrer na prática de um crime de desobediência; 1.2.– Interpôs recurso o arguido alegando em síntese conclusiva: –Na impugnação da decisão, na observância do disposto no Código de Processo Penal, o recorrente está onerado a indicar as normas jurídicas violadas, o sentido em que, no seu entendimento, o tribunal recorrido interpretou cada norma ou com que a aplicou e o sentido em que ela devia ter sido interpretada ou com que devia ter sido aplicada; Assim, dir-se-á o seguinte: 1.- Consta da douta decisão como provado o seguinte facto: "c) No dia 06.08.2016, pelas 00H45, no Beco M... L..., em Lisboa, o arguido conduzia o ciclomotor de matrícula ...-...-... quando foi interveniente em acidente de viação;" 2.- Resultando da douta decisão, que o julgador entendeu que tal facto seria verdadeiro, com base no depoimento da (única) testemunha J...M...V...V..., agente da Polícia de Segurança Pública. 3.- Fundamenta a douta decisão, tal convicção, dizendo: "Depôs de forma clara, isenta e coerente, merecendo credibilidade, explicou que foi chamado ao local por haver um acidente de viação com ferido, que quando lá chegou, além de colegas seus, estava o arguido e o ciclomotor, apresentando este danos que descreveu, acrescentando que também viu risco na parede do prédio que atenta as suas características ficou convencido resultar do embate do ciclomotor na mesma, mas admitindo que não deu importância a este pormenor por o prédio estar devoluto. Explicou, ainda, que o arguido apresentava várias lesões, incluindo na cabeça, tendo sido o próprio a explicar-lhe, no momento em que chegou junto do mesmo, que ia a circular "na mota" e que quando bateu naquela parede caiu, tendo-se ferido ao tentar colocar o veículo em pé, assumindo que se o arguido não tivesse logo assumido assim a condução da viatura não teria elaborado o expediente nos termos em que o fez tendo-o inclusive submetido então ao teste de pesquisa de álcool o sangue, nunca o arguido tendo então dito que não ia a conduzir. Perguntado, explicou ainda esta testemunha ser o local onde ocorreu o sinistro uma rua "estreitinha" e íngreme, onde não há qualquer local para estacionar e que seria muito difícil levar o ciclomotor à mão atenta a inclinação da via e ao local onde estava, especialmente atento o estado de embriaguez do arguido. 4.- Mas não atendeu a douta decisão ao depoimento da mesma testemunha, quando este afirma, por exemplo: –"quando lá cheguei já estavam outros colegas meus no local" (passagem 23:42) –À questão: O ciclomotor funcionava? – Responde: "não verifiquei(...) que visse nunca funcionou (...) não foi sequer experimentado " (passagem 29:25 e m. ss.) 5.- Resulta claro e inequívoco do depoimento da única testemunha ouvida em sede de audiência de discussão e julgamento, que a mesma, na qualidade órgão de policia criminal, não foi o primeiro a chegar ao local. 6.- Resulta também claro e inequívoco deste depoimento que não sabe dizer se o referido ciclomotor estava ou não a trabalhar. A testemunha afirma com toda a clareza que não ouviu o referido ciclomotor a trabalhar, nem sequer tão pouco verificou se o mesmo estaria ou não a funcionar. 7.- Posto isto, porque razão se refere que não faz sentido a versão do arguido, quando afirma que o referido ciclomotor não tinha sequer bateria, não estava a funcionar e apenas o deslocava à mão?! 8.- Também se revela, com o devido respeito, incoerente, dizer-se que o arguido se encontrava visivelmente embriagado e que terá ele próprio dito que tinha conduzido o veículo. Utilizando tal argumento para consolidar a convicção da douta decisão. 9.- O arguido, admitiu que tinha ingerido bebidas alcoólicas, e também a testemunha refere que o mesmo estava visivelmente alcoolizado. Uma taxa de alcoolemia, como aquela que o arguido apresentava, leva-nos necessariamente para uma situação de entorpecimento fisiológico de quase todos os sistemas, uma redução da capacidade de tomar decisões racionais ou de discernimento, transtornos graves dos sentidos, inclusive consciência reduzida dos estímulos externos e logicamente alterações graves da coordenação motora. 10.- Assim, como interpretar tudo o que o arguido terá dito nessa data?! Realidade? Fantasia? Deficiência de expressão? Parece-nos que o mesmo estava numa situação clara de imputabilidade diminuída, na qual não se colocou propositadamente no intuito de à sua sobra poder praticar impunemente qualquer crime (excluindo-se assim a figura chamada de actio libera in causa). Invocando-se desde já, e para os devidos efeitos, a referida situação como causa de exclusão da culpabilidade. 11.- Mas ainda em relação ao depoimento desta testemunha, diga-se também, que não resulta claro do seu depoimento a razão pela qual assumiu que o referido veiculo estava em circulação, conduzido pelo aqui arguido e terá embatido na parede de um prédio: quando não foi o primeiro a chegar ao local, não sabe dizer se a mota funcionava e ainda refere a existência de "riscos" da cor vermelha numa parede, quando o ciclomotor em causa é de cor cinza e preta, (cfr. passagem 35:15) 12.- A prova trazida aos autos, quanto muito criaria dúvida na convicção do julgador e deveria por essa razão o mesmo ser absolvido em observância ao principio in dúbio pro reo (artigo 32. °, n" 2, da Constituição da República Portuguesa). 13.- Parece-nos que dúvidas não subsistem que o Tribunal a quo não possui elementos suficientes que permitam criar a convicção que criou no que, em concreto, diz respeito à imputação que faz ao arguido ora recorrente nos factos que dá como provados em relação a este. 14.- Do princípio constitucional da presunção de inocência. 15.- Não é toda a dúvida que fundamenta o princípio in dubio pro reo, mas apenas a dúvida razoável, positiva, racional, que impeça a convicção do tribunal, a analisar pelo julgador, em cada caso concreto. Ora, no caso concreto, existe claramente o indício que permite ficar na dúvida sobre se o arguido tinha ou não estado a conduzir o referido veiculo. 16.- Note-se ainda que resulta dos autos que entre a habitação do aqui recorrente, a habitação de seu pai e o local onde foi jantar, medeia tão só a distância de 500m. Não sendo de todo descabido que efectivamente o referido veiculo estivesse imobilizado (porque não estava a funcionar) na via pública e que, por alguma razão, o aqui recorrente o estava a deslocar à mão. 17.- E sobre questão de direito, dir-se-á também, que em termos de valoração de prova, o tribunal a quo, não poderia ter valorado, tal como valorou as declarações da testemunha (órgão de policia criminal) sobre declarações prestadas pelo arguido, ainda antes de ser constituído arguido, antes de qualquer inquérito e numa mera fase que se considera de investigação ou de pré-inquérito, sendo por essa razão também de invocar uma situação de ilegalidade de prova, referindo-se a sua nulidade e proibição de valoração. 18.- " O artigo 58.° do CPP, dispõe que é obrigatória a constituição de arguido logo que for levantado auto de notícia que dê uma pessoa como agente de um crime e aquele lhe for comunicado. A constituição de arguido implica a entrega, sempre que possível no próprio acto, de documento de que constem a identificação do processo e do defensor, se este tiver sido nomeado, e os direitos e deveres processuais referidos no artigo 61.° . 19.- Em momento algum a testemunha refere ter informado o arguido que deixou de ter a qualidade de suspeito e estava a ser considerado arguido, não se encontrando por essa razão, asseguradas todas as garantias de defesa do mesmo, ao não ter sido este informado que estaria a ser já interrogado nessa qualidade. 20.- O número 5 desse normativo é claro quando dispõe: A omissão ou violação das formalidades previstas nos números anteriores implica que as declarações prestadas pela pessoa visada não podem ser utilizadas como prova. 21.- Por fim, a manter-se a decisão de condenação, sobre a medida da pena aplicada, diz-se: à luz do princípio da última ratio ou da mínima intervenção do direito penal exigida pelo artigo 18.°, n.° 2 do Constituição da República Portuguesa, considerando ainda o supra exposto, a aplicação de uma pena de pena de prisão no caso em concreto revela-se manifestamente desproporcional. 22.- Dispõe o artigo 71.° do código penal sobre a determinação da medida da pena que esta deve ser feita dentro dos limites definidos na lei, em função da culpa do agente e das exigências de prevenção. Resultando assim desde já, com o devido respeito, a necessidade de rever a pena aplicada ao ora recorrente. 23.- A considerar-se a condenação do aqui arguido, sempre seria de aplicar uma pena de multa (no máximo) em substituição da pena realizada em cúmulo das penas parcelares. 24.- Parece-nos que uma pena de multa ou uma pena suspensa na sua execução, realizará, de forma adequada e suficiente, as finalidades da punição, considerando-se mais adequada ao caso concreto, sob pena de violação das disposições constantes no código penal, sobre a determinação das penas, nomeadamente os seus artigos 40.°, 50.°, 70.° e 71.°. 25.- E sobre a suspensão da execução da pena aplicada, dir-se-á que ao contrário da douta sentença, com o devido respeito, estão reunidos os requisitos do artigo 50.° para a suspensão de uma pena de prisão, caso se opte pela mesma. Assim, nestes termos requer-se a V. Exas.: i)- Uma nova apreciação dos factos trazidos aos autos, determinando-se pela absolvição do aqui recorrente, face ao principio in dubio pro reo. ii)- Assim não se entendendo, que seja declarada nula a sentença; uma vez que não poderiam ter sido valoradas as declarações do recorrente quando ainda não tinha sido sequer constituído arguido - conhecimento da situação de proibição de valoração de prova. iii)- a manter-se a decisão de condenação que seja revista a pena aplicada em cumulo, por ser manifestamente desproporcional e excessiva, podendo e devendo ser substituída por pena de Multa ou até suspensa na sua execução. 1.3.– Respondeu o MºPº com as seguintes conclusões: 1.- A sentença sob recurso não padece de qualquer insuficiência da matéria de facto dada como provada para a decisão proferida, na medida em que os factos dados como provados autorizam a ilação jurídica tirada; 2.- Identicamente, não padece de qualquer erro (notório) na apreciação da prova, na medida em que a convicção do julgador se alicerçou, essencialmente, no depoimento consistente e verosímil prestado pela testemunha – agente da PSP – que se deslocou ao local e a quem o arguido – o qual ainda não assumira ou deveria ter assumido essa qualidade – relatou, de forma espontânea, o ocorrido em moldes idênticos ao vertido na acusação pública deduzida, quanto seja que, nas circunstâncias de tempo e de lugar dadas como provadas, conduziu um ciclomotor na via pública; 3.- A credibilidade que tal testemunho mereceu da Mma. Juiz a quo para fundamentar a decisão por si proferida quanto à matéria de facto dada como assente na sentença sob recurso é, de resto, consentâneo com as regras da experiência comum e da lógica ao invés da versão fáctica apresentada pelo arguido em audiência de discussão e julgamento, encontrando-se a primeira sustentada adicionalmente pelas lesões na cabeça que o arguido ostentava na ocasião e os estragos que o ciclomotor apresentava, os dois incompatíveis com uma simples queda de um veículo que é levado pela mão numa rua estreita e em subida íngreme; 4.- Identicamente, não padece a sentença colocada em crise, da alegada contradição entre a fundamentação e a sua decisão, de resto, não concretizada pelo recorrente nas suas motivações e conclusões de recurso, mas apenas abstractamente invocada. 5.- Inexistindo duvida que pudesse razoavelmente ter surgido a respeito do ocorrido, conforme deixado expresso pela Mma. Juiz a quo na sentença recorrida, inaplicável se mostra ser o invocado princípio “dubio pro reo”; 6.- As explicações, espontaneamente, oferecidas pelo arguido – ainda sem essa qualidade - no momento em que o OPC acorreu ao local do acidente podiam, e deviam - como o foram, de resto na sentença sob recurso – ser valoradas, em virtude de não consubstanciarem conversas informais, nos termos e para os efeitos do disposto no art. 58º nº5 do Código de Processo Penal, e nada autoriza a que se conclua que tenham resultado de qualquer confabulação etílica por banda do arguido, o qual, apresentava então uma TAS que não era de molde a provocar qualquer delírio, antes evidenciando consciência e lucidez que lhe permitiram ser correctamente identificado, notificado e submetido aos testes de pesquisa de álcool no sangue realizados; 7.- A pena aplicada ao arguido é a única que se revela ajustada, porque suficiente, para salvaguardar as exigências de prevenção geral e especial, nos termos previstos pelos arts. 40º e 70º do Código Penal, em face do passado criminal do arguido, que sofrera já nove condenações, sendo quatro delas pela prática de crime de idêntica natureza aos dos presentes autos e a última em pena de prisão suspensa na sua execução e sujeita a regime de prova, circunstância essa que não demoveu o arguido de voltar a cometer o mesmo crime, justamente, no decurso do período de suspensão de que, nesses outros autos, vinha beneficiando. Termos em que entendemos dever ser mantida nos seus exactos termos a sentença proferida pela Mmo. Juiz a quo, negando-se provimento ao recurso interposto e julgando-se o mesmo, totalmente, improcedente. 1.4.– Nesta Relação, o MºPº remete para a posição do MºPº junto do tribunal a quo. 2.– 2.1.- É o seguinte teor da sentença recorrida: “ I –Relatório Para julgamento em processo comum e com intervenção do Tribunal singular, vem o arguido: M...A...S...B..., viúvo, arquitecto, nascido a 09.09.1956, filho de F...M...B... e M...E...P...S...B..., natural de São Sebastião da Pedreira, Lisboa, residente na C... dos B..., n.º ...6, Bloco ..., ...º andar, em Lisboa; Acusado(a) pela prática, em autoria, de um crime de condução em estado de embriaguez, p. e p. nos art.ºs 292º, n.º 1, e 69º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, e de um crime de violação de proibições ou interdições, p. e p. no art.º 353º do Código Penal. O arguido não contestou nem arrolou testemunhas. Mantêm-se os pressupostos de validade e regularidade da instância, não existindo excepções, quaisquer nulidades, questões prévias ou incidentais de que cumpra conhecer e que obstem à apreciação do mérito da causa. II–Fundamentação: 2.1.- Factos provados: Discutida a causa e produzida a prova, resultam assentes os seguintes factos: a)- Por sentença proferida em 07.07.2015, transitada em 22.09.2015, nos autos de Processo Singular n.º 118/13.0GEACB do Tribunal da Comarca de Leiria, Instância Local, Secção Criminal de Alcobaça, Juiz 1, o arguido foi condenado, pela prática de um crime de condução em estado de embriaguez, p. e p. nos art.ºs 292º, n.º 1, e 69º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, entre outra pena, na sanção acessória de proibição de conduzir veículos com motor, pelo período de 12 (doze) meses; b)- Em cumprimento dessa decisão, desde 21.04.2016 a sua carta de condução foi junta a esses autos; c)- No dia 06.08.2016, pelas 00H45, no Beco M... L..., em Lisboa, o arguido conduzia o ciclomotor de matrícula ...-...-... quando foi interveniente em acidente de viação; d)- Foi submetido ao teste de pesquisa de álcool no sangue, através do ar expirado, para o aparelho Dräger Alcotest 7110MKIII, tendo apresentado uma TAS registada de 1,74g/l, correspondente a uma TAS apurada de 1,65g/l; e)- O arguido não pretendia conduzir mais de 500 metros; f)- O arguido, que sabia que não podia conduzir o mencionado veículo pelos motivos constantes das alíneas a) a b), não obstante não se coibiu de conduzir tal veículo na via pública, agiu com o intuito concretizado de violar a proibição de conduzir emanada da autoridade competente e que lhe foi regularmente comunicada; g)- O arguido sabia que antes de iniciar a condução daquela viatura havia ingerido bebidas alcoólicas em quantidade suficiente para apresentar uma taxa de alcoolemia semelhante àquela que apresentou e não se tendo abstido, ainda assim, de conduzi-la; h)- O arguido agiu sempre livre e conscientemente; i)- Sabia que a sua conduta é proibida e punida por lei; j)- O arguido tem como habilitações literárias licenciatura e mestrado em arquitectura; como arquitecto aufere por mês, pelo menos, a quantia de € 1.500,00; paga prestação para amortização de empréstimo bancário para aquisição de casa própria no valor de € 350,00 por mês; k)-O arguido tem antecedentes criminais, tendo sido condenado: –Por sentença de 30.06.2004, transitada em 28.05.2007, proferida no Proc. n.º 201/03.0GALNH do Tribunal Judicial da Lourinhã, pela prática de um crime de furto qualificado, p. e p. no art.º 204º, n.º 2, alíneas a), d) e e), do Código Penal, por factos praticados em 18.04.2003, na pena de 3 anos de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 3 anos, com a condição de pagar ao lesado, no prazo de 6 meses, a quantia de € 22.086,66; –Por despacho de 14.01.2016, proferido no Proc. n.º 74/14.7TXLSB-A, do 1º Juízo do Tribunal de Execução de Penas de Lisboa, foi concedida ao arguido liberdade condicional até 15.11.2016 no âmbito do Proc. n.º 201/03.0GALNH; –Por sentença de 15.09.2005, transitada em 30.09.2005, proferida no Proc. n.º 561/03.2GTTVD do 1º Juízo do Tribunal Judicial de Torres Vedras, pela prática de um crime de desobediência, p. e p. no art.º 348º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, por factos praticados em 19.10.2003, na pena de 60 dias de multa, à taxa de € 20,00 por dia, no total de € 1.200,00, declarada extinta por pagamento; –Por sentença de 16.10.2006, transitada em 20.11.2006, proferida no Proc. n.º 593/03.0PBLSB do 2º Juízo Criminal de Lisboa, 1ª Secção, pela prática de um crime de furto qualificado, p. e p. no art.º 204º, do Código Penal, por factos praticados em 31.07.2003, na pena de 200 dias de multa, à taxa de € 10,00 por dia, no total de € 2.000,00, declarada extinta por pagamento; –Por sentença de 21.04.2010, transitada em 21.05.2010, proferida no Proc. n.º 916/05.8SILSB do 1º Juízo Criminal de Lisboa, 1ª Secção, pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. no art.º 292º do Código Penal, por factos praticados em 01.05.2005, na pena de 90 dias de multa, à taxa de € 8,00 por dia, no total de € 720,00, e na sanção acessória de proibição de condução de veículos a motor, pelo período de 3 meses e 15 dias, declaradas extintas pelo cumprimento; –Por sentença de 12.04.2011, transitada em 30.04.2012, proferida no Proc. n.º 649/11.6SILSB do 1º Juízo do Tribunal de Pequena Instância Criminal de Lisboa, 1ª Secção, pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. no art.º 292º do Código Penal, por factos praticados em 12.04.2011, na pena de 120 dias de multa, à taxa de € 5,00 por dia, no total de € 600,00, e na sanção acessória de proibição de condução de veículos a motor, pelo período de 6 meses, declarada extinta a multa pelo pagamento; –Por sentença de 20.05.2014, transitada em 19.06.2014, proferida no Proc. n.º 1642/12.7TDLSB do 2º Juízo Criminal de Lisboa, 3ª Secção, pela prática de um crime de desobediência, p. e p. no art.º 348º, n.º 1, alínea b), do Código Penal, por factos praticados em 06.2010, na pena de 80 dias de multa, à taxa de € 9,00 por dia, no total de € 720,00, declarada extinta por pagamento; –Por sentença de 29.09.2014, transitada em 31.10.2014, proferida no Proc. n.º 94/12.6S9LSB do Tribunal da Comarca de Lisboa, Instância Local, Secção Criminal, Juiz 5, pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. no art.º 292º do Código Penal, por factos praticados em 09.02.2012, na pena de 5 meses de prisão, substituída pela pena de 70 dias de multa, à taxa de € 15,00 por dia, no total de € 1.050,00, e na sanção acessória de proibição de condução de veículos a motor, pelo período de 8 meses, declarada extinta a multa pelo pagamento; –Por sentença de 29.01.2015, transitada em 02.03.2015, proferida no Proc. n.º 3221/11.7T3AMD do Tribunal da Comarca de Lisboa Oeste, Instância Local, Secção Criminal de Sintra, Juiz 3, pela prática de um crime de furto, p. e p. no art.º 203º, n.º 1, do Código Penal, por factos praticados em 16.07.2011, na pena de 4 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 1 ano, declarada extinta por cumprimento; –Por sentença de 07.07.2015, transitada em 22.09.2015, proferida no Proc. n.º 118/13.0GEACB do Tribunal da Comarca de Leiria, Instância Local, Secção Criminal de Alcobaça, pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. no art.º 292º do Código Penal, por factos praticados em 10.06.2013, na pena de 7 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 1 ano, com a condição de realizar tratamento ao consumo abusivo de álcool, com regime de prova, e na sanção acessória de proibição de condução de veículos a motor, pelo período de 12 meses. 2.2.–Factos não provados: Com relevância para a decisão da causa, nenhum. 2.3.–Motivação da decisão de facto: A convicção do tribunal quanto à factualidade provada assentou, desde logo, nas declarações do(a) arguido(a) que admitiu que naquele dia e hora constantes da acusação se encontrava naquele local também identificado na mesma com o ciclomotor cuja matrícula aí é mencionada, além da factualidade vertida nas alíneas a) e b) dos factos assentes. Negou, porém, o arguido que conduzisse tal ciclomotor, afirmando que o levava pela mão, pois que residia a cerca de 500 metros do local onde estava a jantar e onde o veículo estava estacionado, sendo este herança do seu pai, acrescentando por fim que não funcionava por a bateria ter perdido a carga. Porém, a testemunha J...M...V...V..., agente da Polícia de Segurança Pública, que depôs de forma clara, isenta e coerente, merecendo credibilidade, explicou que foi chamado ao local por haver um acidente de viação com ferido, que quando lá chegou, além de colegas seus, estava o arguido e o ciclomotor, apresentando este danos que descreveu, acrescentando que também viu risco na parede do prédio que atenta as suas características ficou convencido resultar do embate do ciclomotor na mesma, mas admitindo que não deu importância a este pormenor por o prédio estar devoluto. Explicou, ainda, que o arguido apresentava várias lesões, incluindo na cabeça, tendo sido o próprio a explicar-lhe, no momento em que chegou junto do mesmo, que ia a circular “na mota” e que quando bateu naquela parede caiu, tendo-se ferido ao tentar colocar o veículo em pé, assumindo que se o arguido não tivesse logo assumido assim a condução da viatura não teria elaborado o expediente nos termos em que o fez, tendo-o inclusive submetido então ao teste de pesquisa de álcool o sangue, nunca o arguido tendo então dito que não ia a conduzir. Perguntado, explicou ainda esta testemunha ser o local onde ocorreu o sinistro uma rua “estreitinha” e íngreme, onde não há qualquer local para estacionar e que seria muito difícil levar o ciclomotor à mão atenta a inclinação da via e ao local onde estava, especialmente atento o estado de embriaguez do arguido. Ora, perante esta prova não podem subsistir dúvidas que o arguido ia a conduzir o ciclomotor quando embateu na parede. Na verdade, a versão do arguido é por si inverosímil, não só atenta a configuração do local, mas também pela proximidade do local onde disse que estava a jantar e onde, curiosamente, tinha o ciclomotor estacionado (começando por dizer não ser seu, como insistiu, mas acabando por admitir ser o único herdeiro do mesmo que pertencera ao seu falecido pai), sendo que vivia a 500 metros dali. Ou seja, atenta a hora (passava da meia noite), atento o estado do arguido (alcoolizado mas não em estado lastimoso), atento que levava consigo - segundo disse - um saco cama (portanto ainda com mais volume, se não peso), atenta a configuração do percurso (uma rua íngreme e estreita) e atenta a proximidade do local para onde ia (500 metros), é absolutamente fantasioso que nestas condições levasse à mão, como quis fazer crer que fazia, tal ciclomotor - que ainda por cima na sua versão não tinha bateria (tornando-o também menos apelativo para que eventual furto, dificultando-o até). Na verdade, no seu afã de justificar porque não podia estar a conduzir o ciclomotor, apresentou até o arguido motivos contraditórios para a deslocação manual que alegou estar a fazer. Por outro lado, temos que a testemunha, apesar de não ter visto o arguido a conduzir, logo o abordou quando chegou junto do mesmo e, não havendo ali qualquer outro indivíduo além de colegas da Polícia de Segurança Pública, no diálogo imediato que manteve com o arguido este assumiu a condução do ciclomotor, motivando até a elaboração da Participação de Acidente de fls. 27 a 29, além do auto de notícia de fls. 24 a 25. Na verdade, além de inverosimilhança da versão do arguido nos termos apontados, temos que perante a reacção do arguido perante o agente de autoridade no momento a seguir ao sinistro, a configuração da via, a hora dos factos, o estado em que o arguido se encontrava e a proximidade da sua casa relativamente ao local onde tinha estacionado o ciclomotor, permitem concluir, afastando qualquer dúvida, com base nas regras da experiência comum que o arguido conduzia aquele veículo quando foi embater na parede do prédio. Os factos assentes resultam, ainda, da análise crítica do teor do talão junto aos autos a fls. 34, da notificação de fls. 36 e do certificado de verificação de fls. 35, conjugadas com a interpretação legal infra exposta, além da certidão de fls. 165 a 175 e informação de fls. 83. Os factos referentes ao elemento subjectivo resultaram provados também com base nas regras da experiência comum, pois que pertencendo ao foro íntimo do sujeito, o seu apuramento ter-se-á de apreender do contexto da acção desenvolvida. Os factos atinentes às condições pessoais e à situação económica do arguido, provaram-se com base nas suas declarações. Finalmente, os antecedentes criminais do(a) arguido(a) encontram-se certificados nos autos. Com a entrada em vigor da alteração ao Código da Estrada introduzida pela Lei 72/2013, de 03.09, o art.º 170º, n.º 1, alínea b), desse código passou a ser legalmente exigível deduzir ao valor registado de TAS o erro máximo admissível previsto no Regulamento de Controlo Metrológico dos Métodos e Instrumentos de Medição, resolvendo a favor desta corrente a divergência na jurisprudência e doutrina sobre a necessidade de desconto dos erros máximos admissíveis (EMA) ainda sobre os valores apurados através dos aparelhos legalmente aprovados para tanto. Com efeito, preceitua o n.º 1 alínea b) deste artigo que “quando qualquer autoridade ou agente de autoridade, no exercício das suas funções de fiscalização, presenciar contra-ordenação rodoviária, levanta ou manda levantar auto de notícia, o qual deve mencionar (…) b) O valor registado e o valor apurado após dedução do erro máximo admissível previsto no regulamento de controlo metrológico dos métodos e instrumentos de medição, quando exista, prevalecendo o valor apurado, quando a infracção for aferida por aparelhos ou instrumentos devidamente aprovados nos termos legais e regulamentares”. Ora, embora referindo-se apenas a contra-ordenações necessário é interpretar que abrange os casos em que de crime de trata. Assim, como se analisa no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 21.01.2014, em texto integral em www.dgsi.pt, se é certo que “entre nós, porém, (…) o entendimento que tem prevalecido na jurisprudência das Relações (e no S.T.J., como se alcança do acórdão de 27.10.2010, (…).), é o oposto: ao resultado de cada exame efectuado não deve ser deduzido o valor do erro máximo admissível. Acontece que, no dia 01.01.2014, entraram em vigor as alterações ao Código da Estrada aprovadas pela Lei n.º 72/2013, de 03.09. Uma dessas alterações diz respeito às menções que devem constar do auto de notícia por contra-ordenação (…). Ao aludir a «infracção (...) aferida por aparelhos ou instrumentos devidamente aprovados nos termos legais e regulamentares», afigura-se-nos indiscutível que o preceito se refere, além do mais, a infracções como a condução automóvel na via pública estando o condutor sob o efeito do álcool. Por outro lado, embora se refira, como é natural, apenas, às contra-ordenações (uma vez que o Código da Estrada não prevê crimes), não se identifica qualquer razão válida para não aplicar o disposto na alínea b) aos casos em que a condução de veículo na via pública com uma taxa de álcool no sangue acima de determinado limite constitua um crime. Seria incompreensível que para o preenchimento de um ilícito contraordenacional se procedesse à dedução do erro máximo admissível ao valor registado pelo alcoolímetro e que, quando o valor registado fosse igual ou superior a 1,2 g/l, já não se procedesse a essa dedução. A nosso ver, o novo preceito traduz-se numa verdadeira norma interpretativa, pela qual o legislador veio, por via legislativa, precisar o sentido e alcance de lei anterior. (…). Entendendo-se que o analisador quantitativo constitui um meio de obtenção de prova e que o meio de prova é o talão emitido pelo aparelho, no qual é registada, além do mais, a taxa de álcool acusada pelo condutor fiscalizado, certo é que a interpretação do resultado revelado pelo aparelho depende da interpretação das normas relativas aos instrumentos de medição, pois terá de ser sempre no respeito dos próprios limites dos equipamentos em causa - limites legalmente previstos - que a prova deve ser apreciada. O legislador não ignorava a controvérsia que se gerou a propósito da função dos erros máximos admissíveis, entre os que consideravam tratar-se de uma variável a considerar, apenas, nos momentos técnicos de aprovação e/ou verificação do(s) modelo(s) de alcoolímetro(s), e quem sustentava a sua consideração nos exames concretamente efectuados. A nosso ver, foi esta última a solução que o legislador quis consagrar no art.º 170º, n.º 1, alínea b), do Código da Estrada, ao determinar que o valor apurado após dedução do erro máximo admissível prevalece sobre o valor registado. Tratando-se, a nosso ver, de norma interpretativa, a mesma deve ser aplicada aos casos ocorridos antes da sua entrada em vigor, visto que a lei interpretativa não constitui uma nova e distinta manifestação da vontade do legislador, tudo ocorrendo como se tivesse sido publicada na data em que o foi a lei interpretada (cfr. art.º 13º do Código Civil)”. No mesmo sentido, Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 11.02.2014, do Tribunal da Relação do Porto de 15.01.2014, do Tribunal da Relação de Coimbra de 19.02.2014, do Tribunal da Relação de Évora de 17.03.2014 e do Tribunal da Relação de Évora de 18.02.2014, todos em texto integral em www.dgsi.pt. Ora, assim se entendendo, importa atentar que por remissão do art.º 158º, n.º 1, do Código da Estrada há que aplicar o Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros, aprovado pela Portaria n.º 1556/2007, de 10/12, sendo que nos termos da tabela constante do anexo para que remete o art.º 8º os erros máximos admissíveis são definidos pelos seguintes valores:
Ora, perante o exposto, há que efectuar o cálculo em referência (conforme facto(s) assente(s), considerando-se os valores da aprovação de modelo/primeira verificação) tendo por assente como a TAS apurada a resultante dessa operação aritmética, o que se fez e assim se tem por assente na respectiva factualidade. 2.4.–O Direito: 2.4.1.- Enquadramento jurídico-penal dos factos provados: 2.4.1.1.- Do crime de violação de proibições ou interdições: O(a) arguido(a) vem acusado(a) da prática de um crime de violação de imposições, proibições ou interdições, p. e p. no art.º 353º do Código Penal. Comete este crime “quem violar imposições, proibições ou interdições determinadas por sentença criminal a título de pena aplicada em processo sumaríssimo, de pena acessória ou de medida de segurança não privativa da liberdade (…)”. Com esta incriminação visa-se garantir o cumprimento de penas acessórias ou de medidas de segurança impostas por sentença criminal, bem como penas aplicadas em processo sumaríssimo, sendo, por isso, o bem jurídico tutelado a não frustração das sanções impostas por tais decisões. A questão coloca-se em saber que proibições ou interdições ou imposições são essas. Como refere Cristina Líbano Monteiro, em Comentário Conimbricense do Código Penal, tomo III, 2001, pág. 402, “com assento explícito na parte geral do Código Penal, constituem proibições passíveis de serem impostas por sentença criminal a título de pena acessória: (…) a proibição de conduzir veículos motorizados (art.º 69º)”. Assim, e analisando a factualidade assente, temos que por sentença o(a) arguido(a) foi condenado(a), pela prática de um crime de condução em estado de embriaguez, p. e p. nos art.ºs 292º, n.º 1, e 69º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, entre outra pena, na sanção acessória de proibição de conduzir veículos com motor, pelo período de 12 (doze) meses, e que em cumprimento dessa decisão transitada em julgado em 22.09.2015, em 21.04.2016 foi nesses autos junta a sua carta de condução, tendo conduzido no dia 06.08.2016. Assim, e perante a factualidade provada, há que concluir que o(a) arguido(a) preencheu objectivamente o crime de violação de proibições ou interdições. No que respeita ao tipo subjectivo, provado ficou também que o(a) arguido(a), ao actuar da forma descrita, agiu voluntária e conscientemente, bem sabendo que não podia conduzir aquele veículo e, não obstante, não se coibiu de conduzir tal veículo na via pública, agindo com o intuito concretizado de violar a proibição de conduzir emanada da autoridade competente. Nestes termos, agiu o(a) arguido(a) com dolo directo. Não existem causas que excluam a ilicitude ou a culpa. Praticou, pelo exposto, o(a) arguido(a) o crime de violação de imposições, proibições ou interdições, p. e p. no art.º 353º do Código Penal. 2.4.1.2.- Do crime de condução em estado de embriaguez: O(a) arguido(a) vem acusado(a) da prática de um crime de condução em estado de embriaguez, p. e p. nos art.ºs 292º, n.º 1, e 69º, n.º 1, alínea a), do Código Penal. Comete o crime de condução em estado de embriaguez quem, pelo menos por negligência, conduzir veículo, com ou sem motor, em via pública ou equiparada, com uma taxa de álcool no sangue igual ou superior a 1,2 g/l. O bem jurídico tutelado por esta norma é a segurança da circulação rodoviária, sendo que o crime de condução de veículo em estado de embriaguez é um crime de perigo abstracto. Com efeito, “o perigo não faz parte dos elementos típicos, existindo apenas uma presunção por parte do legislador, as mais das vezes fundada numa observação empírica, de que a situação é perigosa em si mesma, ou seja, que na maioria dos casos em que essa conduta teve lugar demonstrou ser perigosa sob o ponto de vista dos bens jurídicos penalmente tutelados“, como afirma Paula Ribeiro de Faria, em Comentário Conimbricense do Código Penal, tomo II, 1999, pág. 1093. A propósito, vejam-se as citações de Manuel Leal-Henriques e Manuel Simas Santos, Código Penal Anotado, 2º volume, 2000, pág. 1333. Assim, e em face da factualidade que ficou provada, dúvidas não existem de que o(a) arguido(a) preencheu objectiva e subjectivamente o ilícito criminal por que vem acusado(a). Com efeito, resulta assente que o(a) arguido(a) conduziu um veículo automóvel na via pública, com uma TAS apurada de 1,65 g/l, tendo decidido conduzir tal veículo, embora estando ciente que momentos antes tinha ingerido bebidas alcoólicas em quantidade suficiente para apresentar uma taxa de alcoolemia semelhante àquela que apresentou, bem sabendo que a condução de veículos na via pública, nas condições em que o fez, é proibida e é punida por lei. O(a) arguido(a) actuou, pois, com dolo, que reveste a forma de necessário. Não existem causas que excluam a ilicitude ou a culpa. Praticou, pelo exposto, o(a) arguido(a) o crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. nos art.ºs 292º, n.º 1, e 69º, n.º 1, alínea a), do Código Penal. 2.4.2.- Da opção e medida da pena: O crime de violação de proibições ou interdições, p. e p. no art.º 353º do Código Penal, é punido “com pena de prisão até 2 anos ou com pena de multa até 240 dias”. O crime de condução em estado de embriaguez, p. e p. no art.º 292º, n.º 1, do Código Penal, é punido “com pena de prisão até 1 ano ou com pena de multa até 120 dias”. Na opção pela pena há que ter por base o disposto no art.º 70º, que estabelece a preferência pelas penas não privativas da liberdade sempre que estas realizem “de forma adequada e suficiente as finalidades da punição”, finalidades previstas no art.º 40º, ambos do citado código. A prevenção geral é vista como uma prevenção positiva, de integração e de reforço da consciência jurídica comunitária e do seu sentimento de segurança face à violação da norma. A prevenção especial é encarada como de socialização, de servir a reintegração do agente na comunidade e de evitar a quebra da sua inserção social. In casu, as necessidades de prevenção geral são muito elevadas em ambos os casos, quer relativamente ao reforço da consciência jurídica comunitária, quer no que respeita ao sentimento de segurança face à violação da norma, pois que, e quanto ao primeiro crime o desrespeito pela condenação e o sentimento de impunidade provoca o descrédito na justiça, e quanto ao segundo crime, como é do conhecimento geral, Portugal tem das maiores sinistralidades rodoviárias da Europa, sendo vergonhoso o número anual de mortos e de feridos nas nossas estradas. As necessidades de prevenção especial são muito elevadas e qualquer dos casos, pois o(a) arguido(a) tem antecedentes criminais, tendo sido condenado antes da prática dos factos por nove crimes, destes sendo quatro por crime de condução em estado de embriaguez (sendo que, além de um dos crimes em apreço ter igual natureza a esses, o outro dos em apreço está com este directamente relacionado, numa relação de quase causa/efeito) e dois por crime de desobediência, além de por outros três de furto, todos por sentenças transitadas em julgado antes da prática dos factos, encontrando-se embora profissionalmente integrado. Assim, concluímos relativamente a ambos os crimes não ser suficiente para satisfação das finalidades da pena a aplicação ao(à) arguido(a) de uma pena de multa, pelo que optamos pela aplicação de uma pena de prisão. Necessário é, agora, determinar a medida da pena de prisão, nos termos do art.º 71º, sempre do mesmo Código, “em função da culpa do agente e das exigências de prevenção”. Para determinar a medida da pena deve atender-se a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, deponham a favor do agente ou contra ele, de harmonia com o disposto no art.º 71º, n.º 2, do citado Código. Assim, importa considerar o grau de ilicitude do facto, que é mediano quanto a ambos os crimes, sendo de atentar ao percurso (apenas 500 metros) que se propunha fazer e considerando tratar-se de violação de uma ordem emanada de um Tribunal, quanto ao primeiro dos crimes, e atendendo à TAS apresentada, de 1,65 g/l, tendo ainda sido interveniente em acidente de viação, quanto ao segundo dos crimes. No que respeita ao dolo do(a) arguido(a), que é directo quanto ao crime de violação de proibições ou interdições e é necessário quanto ao crime de condução em estado de embriaguez, a sua intensidade afigura-se-nos também mediana em ambos os crimes. Contra o(a) arguido(a) a existência de antecedentes criminais. Quanto às condições pessoais e à situação económica do arguido, temos as que ficaram assentes. Tudo visto e ponderado, considera-se adequado aplicar ao arguido a pena de 8 (oito) meses de prisão pelo crime de violação de proibições ou interdições e de 4 (quatro) meses de prisão pelo crime de condução em estado de embriaguez. Operando o cúmulo jurídico destas penas parcelares, e ponderando, em conjunto, os factos e a personalidade do(a) arguido(a), nos termos do disposto no art.º 77º, n.ºs 1 e 2, do Código Penal, atendendo ao carácter revelado pelo seu passado criminoso, mas considerando-se terem sido ambos os crimes praticados num mesmo momento e no mesmo contexto, decide-se condená-lo(a) na pena única de 9 (nove) meses de prisão. Entendemos, no entanto, que apesar do disposto no art.º 43º, n.º 1, do Código Penal, não sendo a pena de prisão aplicada “superior a um ano”, não pode a mesma ser substituída “por pena de multa ou por outra pena não privativa da liberdade aplicável” por a necessidade de se prevenir o cometimento de futuros crimes assim o exigir, atentos os antecedentes criminais do arguido que foi já condenado - em data anterior à prática dos factos - nove vezes, sendo que pelo crime de condução em estado de embriaguez foi condenado duas vezes em multa, uma vez em prisão substituída por multa e uma vez em prisão suspensa na sua execução com regime de prova e sujeição a tratamento ao alcoolismo, o que não foi suficiente para o levar a não praticar factos semelhantes e por que é agora condenado, estando in casu ambos os crimes co-relacionados, nomeadamente o crime de violação de proibições ou interdições e o crime de condução em estado de embriaguez. Acresce que, tendo em conta que o arguido cometeu o crime em causa nos autos após ter sido condenado por aqueles crimes, actuando inclusive no período de suspensão de uma pena de prisão que ficou condicionada a tratamento ao alcoolismo e com regime de prova, entendemos que “a simples censura do facto e a ameaça da prisão” não realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição”, nos termos do disposto no art.ºs 50º, n.º 1, do Código Penal, pelo que, não existe fundamento para suspender a execução da pena de prisão aplicada ao arguido(a), nem mesmo para a substituir por trabalho a favor da comunidade nos termos do disposto no art.º 58, n.º 1, do Código Penal. Porém, nos termos do disposto no art.º 45º, n.º 1, do Código Penal, “a pena de prisão aplicada em medida não superior a um ano, que não deva ser substituída por pena de outra espécie, é cumprida em dias livres sempre que o tribunal concluir que, no caso, esta forma de cumprimento realiza de forma adequada as finalidades da punição”. No caso vertente o cumprimento da pena de prisão por dias livres assegura a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente e permite evitar que se projecte sobre o mesmo consequências sociais nefastas decorrentes da ruptura total deste com o meio social. Conforme decorre do n.º 2 do art.º 45º do Código Penal a prisão por dias livres consiste numa privação da liberdade por períodos correspondentes a fins-de-semana não podendo exceder setenta e dois períodos. Esclarece o n.º 3 do mesmo artigo que cada período tem a duração mínima de trinta e seis horas e a máxima de quarenta e oito horas, equivalendo cada período a cinco dias de prisão contínua. Nos termos do preceituado no art.º 487º, n.º 1, do Código de Processo Penal, a decisão que fixar o cumprimento da prisão por dias livres especifica os elementos necessários à sua execução indicando a data do início desta. Considerando a pena aplicada (nove meses, ou seja, 270 dias) o(a) arguido(a) deverá cumprir 54 (cinquenta e quatro) períodos correspondente a outros tantos fins-de-semana, sendo que não se justifica que a duração de cada período exceda as trinta e seis horas que se deverão situar entre as 09H00 de Sábado e as 21H00 de Domingo. Acresce que, nos termos do disposto no art.º 69º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, na redacção introduzida pela Lei 77/2001, de 13.07, “é condenado na proibição de conduzir veículos com motor por um período fixado entre três meses e três anos quem for punido por crime previsto nos artigos 291º e 292º”. Na verdade, pretende-se com a aplicação desta pena acessória um “efeito dissuasor, contribuindo do mesmo modo para a emenda cívica do condutor imprudente ou leviano”, conforme escreve Paula Ribeiro de Faria, ob. cit., pág. 1098, citando, em certa medida, Figueiredo Dias. Consideramos, ainda, que “a determinação da medida da pena acessória de inibição do direito de conduzir deverá obedecer ao preceituado no art.º 71º do Código Penal”, conforme Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 14.05.96, CJ, tomo III, pág. 286, elementos supra analisados e que se mantêm válidos. Pelo que, em conformidade com o disposto no art.º 69º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, considera-se adequado aplicar ao(à) arguido(a) a sanção acessória de proibição de condução de veículos a motor, pelo período de 18 (dezoito) meses.” 3.– 3.1.- O recorrente invocando a violação do princípio in dubio pro reo, situa a sua discordância ao nível da forma como o tribunal formou a sua convicção embora sem impugnar a matéria de factos nos termos exigidos pelo art.º 412º,n.º 3 e 4 CPP. Citando o Acórdão da Relação de Lisboa de 06/06/2017 da 5ª Secção, no processo n.º 224/13.0PTFUN.L1-5, a propósito dos requistos para a impugnação da matéria de facto: “Dispõe o artigo 428.º, n.º 1, do C.P.P., que os Tribunais da Relação conhecem de facto e de direito. A matéria de facto pode ser sindicada por duas vias: no âmbito, mais restrito, dos vícios previstos no artigo 410.º, n.º2, do C.P.P., no que se convencionou chamar de “revista alargada”; ou através da impugnação ampla da matéria de facto, a que se refere o artigo 412.º, n.º3, 4 e 6, do mesmo diploma. No primeiro caso, estamos perante a arguição dos vícios decisórios previstos nas diversas alíneas do n.º 2 do referido artigo 410.º, cuja indagação, como resulta do preceito, tem que resultar da decisão recorrida, por si mesma ou conjugada com as regras da experiência comum, não sendo por isso admissível o recurso a elementos àquela estranhos, para a fundamentar, como, por exemplo, quaisquer dados existentes nos autos, mesmo que provenientes do próprio julgamento (cfr. Maia Gonçalves, Código de Processo Penal Anotado, 16. ª ed., p. 873; Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, Vol. III, 2ª ed., p. 339; Simas Santos e Leal-Henriques, Recursos em Processo Penal, 6.ª ed., 2007, pp. 77 e ss.; Maria João Antunes, RPCC, Janeiro-Março de 1994, p. 121). No segundo caso, a apreciação não se restringe ao texto da decisão, alargando-se à análise do que se contém e pode extrair da prova (documentada) produzida em audiência, mas sempre dentro dos limites fornecidos pelo recorrente no estrito cumprimento do ónus de especificação imposto pelos n.ºs 3 e 4 do artigo 412.º do C.P. Penal. Quer isto dizer que enquanto os vícios previstos no artigo 410.º, n.º2, são vícios da decisão, evidenciados pelo próprio texto, por si ou em conjugação com as regras da experiência comum, na impugnação ampla temos a alegação de erros de julgamento por invocação de provas produzidas e erroneamente apreciadas pelo tribunal recorrido, que imponham diversa apreciação. Neste caso, o recorrente pretende que o tribunal de recurso se debruce não apenas sobre o texto da decisão recorrida, mas sobre a prova produzida em 1.ª instância, alegadamente mal apreciada. Nos casos de impugnação ampla, o recurso da matéria de facto não visa a realização de um segundo julgamento sobre aquela matéria, agora com base na audição de gravações, antes constituindo um mero remédio para obviar a eventuais erros ou incorrecções da decisão recorrida na forma como apreciou a prova, na perspectiva dos concretos pontos de facto identificados pelo recorrente. O recurso que impugne (amplamente) a decisão sobre a matéria de facto não pressupõe, por conseguinte, a reapreciação total do acervo dos elementos de prova produzidos e que serviram de fundamento à decisão recorrida, mas antes uma reapreciação autónoma sobre a razoabilidade da decisão do tribunal a quo quanto aos «concretos pontos de facto» que o recorrente especifique como incorrectamente julgados. Para esse efeito, deve o tribunal de recurso verificar se os pontos de facto questionados têm suporte na fundamentação da decisão recorrida, avaliando e comparando especificadamente os meios de prova indicados nessa decisão e os meios de prova indicados pelo recorrente e que este considera imporem decisão diversa (sobre estas questões, os acórdãos do S.T.J., de 14 de Março de 2007, Processo 07P21, de 23 de Maio de 2007, Processo 07P1498, de 3 de Julho de 2008, Processo 08P1312, de 29 de Outubro de 2008, Processo 07P1016 e de 20 de Novembro de 2008, Processo 08P3269, in www.dgsi.pt., como todos os que venham a ser indicados sem outra indicação). Precisamente porque o recurso em que se impugne (amplamente) a decisão sobre a matéria de facto não constitui um novo julgamento do objecto do processo, mas antes um remédio jurídico que se destina a despistar e corrigir erros in judicandoou in procedendo, que o recorrente deverá expressamente indicar, impõe-se a este o ónus de proceder a uma tríplice especificação, estabelecendo o artigo 412.º, n.º3, do C.P. Penal: «3.–Quando impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, o recorrente deve especificar: a)- Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados; b)- As concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida; c)- As provas que devem ser renovadas.» A especificação dos «concretos pontos de facto» traduz-se na indicação dos factos individualizados que constam da sentença recorrida e que se consideram incorrectamente julgados. A especificação das «concretas provas» só se satisfaz com a indicação do conteúdo especifico do meio de prova ou de obtenção de prova e com a explicitação da razão pela qual essas «provas» impõem decisão diversa da recorrida. Finalmente, a especificação das provas que devem ser renovadas implica a indicação dos meios de prova produzidos na audiência de julgamento em 1.ª instância cuja renovação se pretenda, dos vícios previstos no artigo 410.º, n.º2, do C.P.P. e das razões para crer que aquela permitirá evitar o reenvio do processo (cfr. artigo 430.º do C.P.P.). Relativamente às duas últimas especificações recai ainda sobre o recorrente uma outra exigência: havendo gravação das provas, essas especificações devem ser feitas com referência ao consignado na acta, devendo o recorrente indicar concretamente as passagens (das gravações) em que se funda a impugnação (não basta a simples remissão para a totalidade de um ou vários depoimentos), pois são essas que devem ser ouvidas ou visualizadas pelo tribunal, sem prejuízo de outras relevantes (n.º 4 e 6 do artigo 412.º do C.P.P.), salientando-se que o S.T.J, no seu acórdão N.º 3/2012, publicado no Diário da República, 1.ª série, N.º 77, de 18 de abril de 2012, fixou jurisprudência no seguinte sentido: «Visando o recurso a impugnação da decisão sobre a matéria de facto, com reapreciação da prova gravada, basta, para efeitos do disposto no artigo 412.º, n.º 3, alínea b), do CPP, a referência às concretas passagens/excertos das declarações que, no entendimento do recorrente, imponham decisão diversa da assumida, desde que transcritas, na ausência de consignação na acta do início e termo das declarações». Assim, o ónus processual de indicação das provas que impõem decisão diversa da recorrida, previsto na alínea b), do n.º 3, do artigo 412.º, do C.P.P., apresenta uma configuração alternativa, conforme a acta da audiência de julgamento contenha ou não a referência do início e do termo de cada declaração gravada, nos seguintes termos: – se a acta contiver essa referência, a indicação das concretas passagens em que se funda a impugnação faz-se por referência ao consignado na acta, nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 364.º (n.º 4 do artigo 412.º do C.P.P.); – se a acta não contiver essa referência, basta a identificação e transcrição nas motivações de recurso das ditas “passagens/excertos” dos meios de prova oral gravados (acórdão da Relação de Évora, de 28/05/2013, processo 94/08.0GGODM.E1). Na reapreciação da prova importa articular os poderes de conhecimento do tribunal de recurso com os princípios relativos à produção e à valoração da prova no tribunal de 1.ª instância, especialmente com o princípio da livre apreciação da prova, consagrado no artigo 127.º do C.P.P., princípio que vale também para o tribunal de recurso. Essa articulação há-de necessariamente ter em conta que as condições de que beneficia a 1.ª instância – em particular, a oralidade e a imediação – para avaliar os depoimentos prestados, no contexto de toda a prova produzida, se não verificam (pelo menos em toda a extensão) quando o tribunal de recurso vai julgar. Traduzindo-se a livre apreciação das provas numa valoração racional e crítica, de acordo com as regras comuns da lógica, da razão, das máximas da experiência e dos conhecimentos científicos, a falta de oralidade e de imediação com as provas produzidas em audiência, a não vivência do julgamento, sede do contraditório, com privação da possibilidade de intervir na produção da prova pessoal, serão, por assim dizer, limites epistemológicos a que a Relação deverá atender na sua apreciação, ainda que não barreiras intransponíveis a que faça a ponderação, em concreto e autónoma, das provas identificadas pelo recorrente, que pode conduzir à conclusão de que tais elementos de prova impõem um juízo diverso do da decisão recorrida. Resultando do recurso que se pretende sindicar a apreciação da prova, através da impugnação ampla da decisão sobre a matéria de facto, importa ter sempre em vista que, como realçou o S.T.J., em acórdão de 12 de Junho de 2008 (Processo:07P4375), a sindicância da matéria de facto, na impugnação ampla, ainda que debruçando-se sobre a prova produzida em audiência de julgamento, sofre quatro tipos de limitações, que sintetizam o que se disse supra: – a que decorre da necessidade de observância pelo recorrente do mencionado ónus de especificação, pelo que a reapreciação é restrita aos concretos pontos de facto que o recorrente entende incorrectamente julgados e às concretas razões de discordância, sendo necessário que se especifiquem as provas que imponham decisão diversa da recorrida e não apenas a permitam; – a que decorre da natural falta de oralidade e de imediação com as provas produzidas em audiência, circunscrevendo-se o “contacto” com a prova pessoal ao que consta das gravações; – a que resulta da circunstância de a reponderação de facto pela Relação não constituir um segundo/novo julgamento, cingindo-se a uma intervenção cirúrgica, no sentido de restrita à indagação, ponto por ponto, da existência ou não dos concretos erros de julgamento de facto apontados pelo recorrente, procedendo à sua correcção se for caso disso; – a que tem a ver com o facto de ao tribunal de 2.ª instância, no recurso da matéria de facto, só ser possível alterar o decidido pela 1.ª instância se as provas indicadas pelo recorrente impuserem decisão diversa da proferida [al. b) do n.º3 do citado artigo 412.º – também neste sentido o ac. da Relação de Lisboa, de 10.10.2007, proc.8428/2007-3]. Como se diz no acórdão da Relação de Évora, de 1 de Abril de 2008 (processo n.º 360/08-1.ª)”. Como é sabido, impor decisão diversa da recorrida não significa admitir uma decisão diversa da recorrida. Tem um alcance muito mais exigente, muito mais impositivo, no sentido de que não basta contrapor à convicção do julgador uma outra convicção diferente, ainda que também possível, para provocar uma modificação na decisão de facto. É necessário que o recorrente desenvolva um quadro argumentativo que demonstre, através da análise das provas por si especificadas, que a convicção formada pelo julgador, relativamente aos pontos de facto impugnados, é impossível ou desprovida de razoabilidade. É inequivocamente este o sentido da referida expressão, que consubstancia um ónus imposto ao recorrente. E o princípio “in dubio pro reo”, invocado pelo recorrente figura, no nosso processo penal, como critério positivo de prova de um facto, o parâmetro da prova além da presunção de inocência, vindo do direito processual anglo-saxónico, entendido como prova para além de toda a dúvida razoável. Articula-se com o princípio da livre convicção como se fossem «dois círculos concêntricos de salvaguarda que o sistema processual penal coloca em defesa do cidadão inocente de não correr o risco de ser condenado. Ambos incidem sobre o momento da valoração da prova pelo juiz; momento verdadeiramente crucial para tornar efectivo o direito individual a ver reconhecida a própria inocência, se não resulta provada a sua culpa. O primeiro círculo, com a afirmação do princípio da livre convicção (…) coloca o momento da valoração da prova a coberto dos efeitos devastadores produzidos pelo sistema precedente da prova legal (…).O acusado, com efeito, não pode sofrer condenação em resultado do emprego de regras probatórias formais, como as que resultam do modelo aritmético da prova e tem, sem dúvida, o direito de exigir que a garantia da sua presunção de inocência seja efectivamente accionada no caso concreto colocado à valoração do juiz. Com o segundo círculo de salvaguarda, procura evitar-se que a livre valoração do juiz se transforme em arbítrio. O juiz não está sujeito a vínculos normativos externos, mas deve chegar à formação da sua convicção através do emprego de critérios racionais, próprios da lógica, da ciência e do conhecimento comum. A certeza probatória que desse modo o juiz alcança (…) [trata-se] naturalmente de uma certeza lógica, aplicada ao caso concreto e modelada segundo um itinerário argumentativo objectivamente susceptível de controlo». O princípio in dubio é uma regra de decisão, que funciona na falta de uma convicção para além da dúvida razoável sobre os factos. «Ao pedir-se ao juiz, para prova dos factos, uma convicção objectivável e motivável, está-se a impedi-lo de decidir quando não tenha chegado a esse convencimento; ou seja: quando possa objectivar e motivar uma dúvida. Espera-se deste modo que a decisão convença. Convença o juiz no seu íntimo, mas contenha em si igualmente a virtualidade de convencer o arguido e, nele, a inteira comunidade jurídica (…). O princípio da livre apreciação da prova, entendido como esforço para alcançar a verdade material, como tensão de objectividade, encontra assim no “in dubio pro reo” o seu limite normativo: ao mesmo tempo que transmite o carácter objectivo à dúvida que acciona este último. Livre convicção e dúvida que impede a sua formação são face e contra-face de uma mesma intenção: a de imprimir à prova a marca da razoabilidade ou da racionalidade objectiva.».. Assim o impõe o processo penal da presunção de inocência, leal e respeitador da confiança legítima dos cidadãos nas decisões dos Tribunais. A sua aplicação desdobra-se em dois momentos: no da avaliação probatória directa, imediata, em primeira instância ou em sede de efectiva reapreciação de prova, na fase de recurso e no da apreciação do processo de aquisição processual da prova fixada, na vertente da avaliação sobre a existência ou não de vício de erro na sua apreciação. Numa primeira fase «o universo fáctico – de acordo com o «pro reo» passar a compor-se de dois hemisférios que receberão tratamento distinto no momento da emissão do juízo: o dos factos favoráveis ao arguido e o dos que lhe são desfavoráveis. Diz o princípio que os primeiros devem dar-se como provados desde que certos ou duvidosos, ao passo que para prova dos segundos se exige certeza». Numa segunda fase, funciona aquando da sua aplicação em Tribunal de recurso: sempre que resulta do texto da decisão recorrida a existência de dúvida sobre factos desfavoráveis ao arguido, ou ainda que não constando, ocorra que a dúvida se instala, quando apreciado o iter cognitivo do julgador. «Entendidos, assim, objectivamente, os princípios da livre apreciação da prova e do in dubio pro reo, sempre será de considerar este princípio violado quando o tribunal dá como provados factos duvidosos desfavoráveis ao arguido, mesmo que o tribunal não tenha manifestado ou sentido a dúvida que, porém, resulta de uma análise e apreciação objectiva da prova produzida à luz das regras da experiência e/ou de regras legais ou princípios válidos em matéria de direito probatório (cfr art. 127º do CPP)». O preceituado no artº 127º/CPP deve ter-se por cumprido, portanto, sempre que a convicção a que o Tribunal chegou se mostra objecto de um procedimento lógico e coerente de valoração, com motivação bastante, onde não se vislumbre qualquer assomo de arbítrio na apreciação da prova, considerando que o objecto da prova tanto inclui os factos probandos (prova directa) como factos diversos do tema de prova, mas que permitam, com o auxilio das regras de experiência, uma ilação quanto a estes (prova indirecta ou indiciária).” É o que decorre do ATRL no processo 154/15.1GDSNT.L1-3. E, nesta matéria, nada há que apontar à fundamentação da aquisição probatória exarada pelo Tribunal recorrido. O recurso em apreço não passa de uma manifestação de discordância da apreciação probatória feita, sem argumento que ataque os fundamentos dessa apreciação, que foram a dúvida insuperável que a prova produzida produziu no espírito do julgador, quanto ao que aconteceu verdadeiramente. Dizendo de outro modo, a discordância da recorrente, acerca dos termos como o Tribunal recorrido formou a convicção determinante da aquisição do provado não procede porque «A atribuição de credibilidade, ou não, a uma fonte de prova testemunhal por declarações, assente numa opção do julgador na base da imediação e da oralidade, que o tribunal de recurso só poderá criticar demonstrando que é inadmissível face às regras de experiência comum» . Para a procedência da impugnação de facto não basta que as provas invocadas no recurso “permitam” a solução propugnada na motivação e conclusões apresentadas. Tal como o art. 412.º, n.º 3, al. b), do Cód. Proc. Penal o estipula, agora de forma mais incisiva, aquelas terão que “impor” uma solução diversa da perfilhada na decisão de que se recorre, o que pela prevalência natural do julgamento efectuado na sua melhor imediação, demanda um real desapoio da leitura perfilhada pelo Tribunal recorrido em relação às provas produzidas. De harmonia com a Jurisprudência, o princípio in dubio pro reo, não significa dar relevância às dúvidas que as partes encontram na decisão ou na sua interpretação da factualidade descrita e revelada nos autos. É, antes, uma imposição dirigida ao juiz, no sentido de este se pronunciar de forma favorável ao réu, quando não houver certeza sobre os factos decisivos para a solução da causa. Mas daqui não resulta que, tendo havido versões díspares e até contraditórias sobre factos relevantes, o arguido deva ser absolvido em obediência a tal princípio. O objecto do presente recurso está em saber se o arguido conduzia, ou não, o ciclomotor referido na sentença ou se apenas o levava pela mão, como pretende o recorrente e sempre defendeu em sede de audiência de julgamento, o que levou o tribunal a fundamentar as razões para ter formado a sua convicção no sentido em que a formou. Invoca, a partir da sua análise pessoal da prova produzida, as suas razões para que devesse o tribunal ter permanecido em dúvida quanto ao facto de o arguido conduzir o ciclomotor, no momento da prática dos factos, indicando plausíveis situações que poderiam ter acontecido em vez da consignada pelo tribunal recorrido como matéria de facto provada. O que o recorrente pretende é que em lugar da versão tida como assente pelo tribunal “a quo” poderia, perante as afirmações produzidas em audiência pela testemunha da acusação que elaborou o auto e pelas afirmações do arguido seja lançada a devida e suficiente confusão acerca de elementos circunstanciais que possam fazer claudicar a necessária certeza de se ter verificado a factualidade tida como apurada. Em causa está, portanto, um pedido de reapreciação da matéria de facto, subordinado à disciplina do artº 412º/3 e 4 do CPP. Ora, a formulação válida de um pedido de reapreciação depende do cumprimento de requisitos de forma (que se verificam) e de substância, sendo que o último exige os elementos de prova apresentados imponham uma decisão diversa daquela que foi tomada pelo Tribunal recorrido. Na verdade, a intromissão da Relação no domínio factual, quando da reapreciação da prova, cingir-se-á a uma intervenção "cirúrgica", no sentido de delimitada, restrita à indagação, ponto por ponto, da existência ou não dos concretos erros de julgamento de facto apontados pelo recorrente, procedendo-se à sua correcção, se for caso disso, e apenas na medida do que resultar do filtro da documentação. A doutrina e jurisprudência penais entendem que a reapreciação da prova, na segunda instância, deverá limitar-se a controlar o processo da convicção decisória da primeira instância e da aplicação do princípio da livre apreciação da prova, tomando sempre como ponto de referência a motivação da decisão. Na apreciação do recurso da matéria de facto, o Tribunal de segundo grau vai aferir se a convicção expressa pelo Tribunal recorrido tem suporte adequado naquilo que a gravação da prova (com os demais elementos existentes nos autos) pode exibir perante si e, consequentemente, a Relação só pode alterar a decisão sobre a matéria de facto em casos excepcionais, de falta desse suporte. Ou seja, a reapreciação só pode determinar alteração à matéria de facto assente se o Tribunal da Relação concluir que os elementos de prova impõem uma decisão diversa - e não se apenas concluir que permitem uma outra decisão. Vejamos a sua argumentação: “Resulta claro e inequívoco do depoimento da única testemunha ouvida em sede de audiência de discussão e julgamento, que a mesma, na qualidade órgão de policia criminal, não foi o primeiro a chegar ao local. Resulta também claro e inequívoco deste depoimento que não sabe dizer se o referido ciclomotor estava ou não a trabalhar. A testemunha afirma com toda a clareza que não ouviu o referido ciclomotor a trabalhar, nem sequer tão pouco verificou se o mesmo estaria ou não a funcionar. Porque razão se refere que não faz sentido a versão do arguido, quando afirma que o referido ciclomotor não tinha sequer bateria, não estava a funcionar e apenas o deslocava à mão?! Também se revela, com o devido respeito, incoerente, dizer-se que o arguido se encontrava visivelmente embriagado e que terá ele próprio dito que tinha conduzido o veículo. Utilizando tal argumento para consolidar a convicção da douta decisão. O arguido, admitiu que tinha ingerido bebidas alcoólicas, e também a testemunha refere que o mesmo estava visivelmente alcoolizado. Uma taxa de alcoolemia, como aquela que o arguido apresentava, leva-nos necessariamente para uma situação de entorpecimento fisiológico de quase todos os sistemas, uma redução da capacidade de tomar decisões racionais ou de discernimento, transtornos graves dos sentidos, inclusive consciência reduzida dos estímulos externos e logicamente alterações graves da coordenação motora. Assim, como interpretar tudo o que o arguido terá dito nessa data?! Realidade? Fantasia? Deficiência de expressão?” Analisadas as provas invocadas pelo recorrente verifica-se que se limita a impor a aceitação da sua opinião sobre a versão da prova que deveria ter sido, em seu entender, considerada, com desconsideração da demais prova produzida, se avaliada esta de modo inteligível e lógico. Recorde-se o teor da decisão recorrida para ter como provada uma determinada versão dos factos em detrimento daquela que o recorrente preconiza: “A convicção do tribunal quanto à factualidade provada assentou, desde logo, nas declarações do(a) arguido(a) que admitiu que, naquele dia e hora constantes da acusação se encontrava naquele local também identificado na mesma com o ciclomotor cuja matrícula aí é mencionada, além da factualidade vertida nas alíneas a) e b) dos factos assentes. Negou, porém, o arguido que conduzisse tal ciclomotor, afirmando que o levava pela mão, pois que residia a cerca de 500 metros do local onde estava a jantar e onde o veículo estava estacionado, sendo este herança do seu pai, acrescentando por fim que não funcionava por a bateria ter perdido a carga. Porém, a testemunha J...M...V...V..., agente da Polícia de Segurança Pública, que depôs de forma clara, isenta e coerente, merecendo credibilidade, explicou que foi chamado ao local por haver um acidente de viação com ferido, que quando lá chegou, além de colegas seus, estava o arguido e o ciclomotor, apresentando este danos que descreveu, acrescentando que também viu risco na parede do prédio que atenta as suas características ficou convencido resultar do embate do ciclomotor na mesma, mas admitindo que não deu importância a este pormenor por o prédio estar devoluto. Explicou, ainda, que o arguido apresentava várias lesões, incluindo na cabeça, tendo sido o próprio a explicar-lhe, no momento em que chegou junto do mesmo, que ia a circular “na mota” e que quando bateu naquela parede caiu, tendo-se ferido ao tentar colocar o veículo em pé, assumindo que se o arguido não tivesse logo assumido assim a condução da viatura não teria elaborado o expediente nos termos em que o fez, tendo-o inclusive submetido então ao teste de pesquisa de álcool o sangue, nunca o arguido tendo então dito que não ia a conduzir. Perguntado, explicou ainda esta testemunha ser o local onde ocorreu o sinistro uma rua “estreitinha” e íngreme, onde não há qualquer local para estacionar e que seria muito difícil levar o ciclomotor à mão atenta a inclinação da via e ao local onde estava, especialmente atento o estado de embriaguez do arguido. Ora, perante esta prova não podem subsistir dúvidas que o arguido ia a conduzir o ciclomotor quando embateu na parede. Na verdade, a versão do arguido é por si inverosímil, não só atenta a configuração do local, mas também pela proximidade do local onde disse que estava a jantar e onde, curiosamente, tinha o ciclomotor estacionado (começando por dizer não ser seu, como insistiu, mas acabando por admitir ser o único herdeiro do mesmo que pertencera ao seu falecido pai), sendo que vivia a 500 metros dali. Ou seja, atenta a hora (passava da meia noite), atento o estado do arguido (alcoolizado mas não em estado lastimoso), atento que levava consigo - segundo disse - um saco cama (portanto ainda com mais volume, se não peso), atenta a configuração do percurso (uma rua íngreme e estreita) e atenta a proximidade do local para onde ia (500 metros), é absolutamente fantasioso que nestas condições levasse à mão, como quis fazer crer que fazia, tal ciclomotor que, ainda por cima na sua versão, não tinha bateria (tornando-o também menos apelativo para que eventual furto, dificultando-o até). Na verdade, no seu afã de justificar porque não podia estar a conduzir o ciclomotor, apresentou até o arguido motivos contraditórios para a deslocação manual que alegou estar a fazer. Por outro lado, temos que a testemunha, apesar de não ter visto o arguido a conduzir, logo o abordou quando chegou junto do mesmo e, não havendo ali qualquer outro indivíduo além de colegas da Polícia de Segurança Pública, no diálogo imediato que manteve com o arguido este assumiu a condução do ciclomotor, motivando até a elaboração da Participação de Acidente de fls. 27 a 29, além do auto de notícia de fls. 24 a 25. Na verdade, além de inverosimilhança da versão do arguido nos termos apontados, temos que perante a reacção do arguido perante o agente de autoridade no momento a seguir ao sinistro, a configuração da via, a hora dos factos, o estado em que o arguido se encontrava e a proximidade da sua casa relativamente ao local onde tinha estacionado o ciclomotor, permitem concluir, afastando qualquer dúvida, com base nas regras da experiência comum que o arguido conduzia aquele veículo quando foi embater na parede do prédio. Os factos assentes resultam, ainda, da análise crítica do teor do talão junto aos autos a fls. 34, da notificação de fls. 36 e do certificado de verificação de fls. 35, conjugadas com a interpretação legal infra exposta, além da certidão de fls. 165 a 175 e informação de fls. 83. Os factos referentes ao elemento subjectivo resultaram provados também com base nas regras da experiência comum, pois que pertencendo ao foro íntimo do sujeito, o seu apuramento ter-se-á de apreender do contexto da acção desenvolvida. Os factos atinentes às condições pessoais e à situação económica do(a) arguido(a), provaram-se com base nas suas declarações. Finalmente, os antecedentes criminais do(a) arguido(a) encontram-se certificados nos autos.” A decisão mostra-se fundamentada de modo completo e esclarecedor e sustenta de forma honesta e clara as razões de que lançou mão para formar a sua convicção. Ninguém questiona que a testemunha V...V... não foi o primeiro agente da polícia a chegar ao local, como o próprio afirma no auto de notícia elaborado e declarou em julgamento. A testemunha, ouvindo o arguido assim que chegou ao local foi por este informado de que ia a subir a rua e foi contra a parede do prédio, identificando-se como condutor do ciclomotor. Estavam ainda no local quatro agentes da polícia que estavam em serviço de remunerado e que tinham sido alertados por transeuntes para o acidente que ocorrera e que se deslocaram para dar apoio ao condutor e os restantes elementos do carro patrulha que também se deslocaram ao local para dar assistência aos demais. Refere ainda a testemunha no auto de notícia que o arguido recebeu socorro e tratamento pela Ambulância Lisboa 1 do INEM. Resulta ainda do auto que, após ter submetido o arguido a exame de pesquisa de álcool no sangue e te ter constatado o grau de álcool no sangue, depois de infirmado do direito de requerer contraprova, foi constituído arguido. Em sede de julgamento, a testemunha explicou, ainda, que o arguido apresentava várias lesões, incluindo na cabeça, tendo sido o próprio a explicar-lhe, no momento em que chegou junto do mesmo, que ia a circular “na mota” e que quando bateu naquela parede caiu, tendo-se ferido ao tentar colocar o veículo em pé, assumindo que se o arguido não tivesse logo assumido assim a condução da viatura não teria elaborado o expediente nos termos em que o fez, tendo-o inclusive submetido então ao teste de pesquisa de álcool o sangue, nunca o arguido tendo então dito que não ia a conduzir. Esta situação é, de acordo com as regras da experiência da vida, compatível com o facto de as pessoas que passavam no local terem alertado os agentes policiais de serviço ao Banco de Portugal, para um acidente e para estes terem acorrido ao local e para o facto de ter sido chamado o INEM. A mesma testemunha confirmou e esclareceu os dados que fizera constar do auto e descreveu o facto de o ciclomotor apresentar danos que descreveu, bem como referiu ter visto risco na parede do prédio que, “atenta as suas características ficou convencido resultar do embate do ciclomotor na mesma, mas admitindo que não deu importância a este pormenor por o prédio estar devoluto.” Esta situação corresponde à justificação que o arguido no momento lhe forneceu para o que acontecera e é consentânea com ela. Pelo contrário, e como é compreensível para qualquer cidadão comum, não encontra qualquer verosimilhança, ainda que remota, no alegado facto de o arguido ir a conduzir o ciclomotor pela mão, o que aliás foi confirmado pela versão imediata do arguido, pelo que a colher uma tese como a que o arguido sustenta revelaria gritante desconhecimento das regras da experiência da vida e uma excessiva dose de ingenuidade sem qualquer apoio nos factos adquiridos de modo incontornável como sejam o embate na parede e sinais do embate que os levaram os transeuntes a alertar as forças da polícia e estas a pedirem a vinda do INEM e levou ao agente autuante a elaborar auto de acidente, além do auto de notícia. Conforme refere a decisão, se levasse a “mota” pela mão, indo a subir a rua dificilmente teria o embate tido o efeito que teve, quer quanto aos sinais exteriores dele e que alertaram as pessoas no local, quer quanto às lesões que sofreu e que terão determinado a necessidade de alertar o apoio de paramédicos. Também o grau de álcool pesquisado não demonstra por si só, como pretende o recorrente, que este não se encontrasse em condições de medir o significado e alcance das suas afirmações, factor que foi indagado em audiência e que segundo a testemunha era o de alcoolizado mas não em estado lastimoso, o que afasta qualquer causa de exclusão de ilicitude, quer em tese abstracta o que não importa aqui academicamente analisar quer, e isso é que nos ocupa, perante a factualidade concreta apurada. Perante estas razões - e as demais indicadas pela decisão recorrida que teve o cuidado de exaustivamente analisar cada elemento da prova e cada possibilidade de interpretação e, com base nesta, de qualquer hipotético acolhimento da tese da defesa - e a análise concertada, transversal e crítica da prova, não poderia o tribunal ter ficado na dúvida de que o arguido ia a conduzir o ciclomotor quando embateu na parede. Na verdade, a versão do arguido é por si inverosímil, do mesmo passo que a versão acolhida pelo tribunal é inteiramente lógica e fundada nas provas produzidas e nas regras da experiência da vida não se impondo nem mesmo de forma remota a subsistência de qualquer dúvida como teses sustentável para o ocorrido. A comunidade, em nome de quem os juízes julgam, não se poderia rever numa opção abstractamente fantasiosa da prova como aquela que o recorrente aponta. Qualquer cidadão de conhecimento, experiência comum e de mediana boa fé decidiria como o tribunal decidiu e teve este até a preocupação de desmontar a interpretação pessoal e parcial do arguido, apesar de tão absurdamente inverosímil. Improcede, pois, esta alegação. Não tendo sido invocado nem se verificando, oficiosamente, a existência de qualquer um dos vícios do art.º 410º,n.º 2 CPP, mostra-se assente a matéria de facto tal como foi dada como provada pela decisão recorrida. 3.2.– O recorrente pede ainda que seja declarada nula a sentença, uma vez que não poderiam ter sido valoradas as declarações do recorrente quando ainda não tinha sido sequer constituído arguido - conhecimento da situação de proibição de valoração de prova. Entende o recorrente que, em momento algum a testemunha refere ter informado o arguido que deixou de ter a qualidade de suspeito e que estava a ser considerado arguido, não se encontrando por essa razão, asseguradas todas as garantias de defesa do mesmo, ao não ter sido este informado que estaria a ser já interrogado nessa qualidade. Idêntica questão é tratada no Acórdão do TRE de 4/6/2013 no processo n.º 40/11-4GTPTG.E1 para o qual se remete, transcrevendo: “Há abundante jurisprudência sobre a matéria dos eventuais “depoimentos indirectos” prestados por agentes policiais e das ditas “conversas informais”, mas a sua indicação e reprodução apenas complicaria o que é simples, pois que a nossa questão, passando pelo afastamento dessas duas questões, se centra no saber se as declarações de quem ainda não é formalmente arguido podem ser objecto de depoimento de terceiro (seja agente policial ou não). Não se trata de depoimento indirecto pois que este tem por objecto o que se ouviu dizer a outra pessoa, não assistindo o depoente ao facto relatado, ao que foi dito. Ora não é isso que se passa no caso sub judicio. Nos termos do acórdão da Relação de Guimarães de 11-02-2008 (Proc. 2181/07, rel. Cruz Bucho), “quando a testemunha relata em tribunal aquilo que ouviu da boca de outra pessoa, o depoimento é directo porque a testemunha dele teve conhecimento directo por o ter captado por intermédio dos seus próprios ouvidos”. É princípio geral relativo à prova por depoimento que a testemunha deva ser inquirida sobre factos de que tenha conhecimento directo – artigo 128º do Código de Processo Penal. Como já afirmámos no acórdão da Relação de Coimbra de 14-10-2009 (Recurso 63/09-3PECBR.C1), o depoimento por ouvir dizer (por outiva, per auditur), uma das formas de depoimento indirecto, reconduz-se à não percepção directa (sensorial) do facto objecto de prova, sim à recepção do que resulta percepcionado por outro meio de prova, por outra pessoa. E são as exigências resultantes dos princípios da imediação, oralidade e, maxime, do acusatório, a aconselharem que o iter cognoscitivo do tribunal quanto ao facto a apurar e subsequente formação da convicção do tribunal e sua motivação, se centrem no facto directamente percepcionado e não no indirectamente ouvido. Ora, no caso concreto os agentes policiais percepcionaram directamente os factos, pelo que não há depoimento indirecto. Acontece é que os factos directamente percepcionados foram o declarado pelo ainda não arguido. E são estas realidades de facto – directamente percepcionado ou não, declarações de arguido ou não – que têm causado certa instabilidade jurisprudencial. E a circunstância de serem agentes policiais não torna o seu depoimento de natureza “indirecta”, vício de raciocínio que parece surgir com inusitada frequência e que parece pretender evitar que, em muitas situações, os agentes dos OPC (os seus depoimentos) sejam importante meio de prova. Logo, não é a análise do regime do depoimento indirecto que se impõe fazer no caso em análise. Questão diversa diz respeito às chamadas “conversas informais” levadas a cabo pelos OPC na pendência do processo. Aqui, em função da qualidade do agente policial e dos deveres que lhe incumbem de formalização em actos processuais das declarações do arguido, o legislador estabelece uma barreira de proibição de valoração, a resultante do regime decorrente dos artigos 356º, nº 7 e 357º, nº 2 do Código de Processo Penal. É óbvio que essa barreira se concretiza na proibição da sua produção e valoração em audiência de julgamento, mas daí decorre a proibição da sua prática em inquérito. O que o legislador pretende é instituir a exclusividade de produção (realização) do meio de prova “declarações do arguido” através de uma forma vinculada, taxativa, típica, prevista ao pormenor nos artigos 140 a 144º do Código de Processo Penal, com o nome “interrogatório de arguido”, com exclusão de qualquer outra forma. Há, portanto, uma vinculação formal, uma taxatividade, uma tipicidade de forma nos interrogatórios de arguido, detido ou não. O meio de prova “declarações de arguido” tem que ser veiculado através de um “interrogatório” previsto nos artigos 140- a 144. O meio de prova “declarações de arguido” não pode ser veiculado por “conversas informais”. Dito de outra forma, o formalismo dos interrogatórios de arguido é uma questão central no próprio valor do meio de prova, uma vinculação à forma querida pelo legislador, produto ou resultado de uma evolução histórica processual que concluiu ser este formalismo do interrogatório a melhor forma de acautelar direitos. Portanto o que se pretende é evitar que as forças policiais consigam introduzir em audiência de julgamento um elemento de prova cujo cumprimento normativo é inexistente e, consequentemente, cuja fiabilidade é patente. Assim, as “conversas informais” são uma informalidade afrontosa, fraudulenta, que permite a violação desses direitos que se pretendem acautelar. E surgem nos processos como forma de tornear a previsão dos artigos 140 a 144º e 356º e 357º do Código de Processo Penal pouco após a entrada em vigor deste código. Ou seja, uma forma de tornear direitos e, assim, negá-los, em nome de uma suposta verdade “descoberta” pelo investigador policial que, dessa forma, pretende determinar o resultado do julgamento. São, portanto, um expediente de má policia. Um abuso. Uma fraude à lei e ao Direito. E incumbe a qualquer tribunal impedir essa fraude ao Direito. Daí que as “conversas informais” sejam habitualmente – com pouca ambição - consideradas prova nula, não apreciável em sede de livre apreciação e vedada como base motivacional de facto. Em nossa opinião devem ser mais (pelo que se acaba de dizer em sede de “tipicidade de interrogatório” de arguido), conduzindo à inexistência do meio de prova declarações de arguido, se estas surgirem através de uma “conversa informal”. Porque, de facto, só a invalidade processual “inexistência” parece ser suficiente para caracterizar a pretensão de produção de um meio de prova em tão flagrante violação das normas de produção desse meio de prova. Por outro lado, a sua consideração como prova válida conduziria ao abuso policial como sistema, ao descrédito da Justiça e à violação de direitos do arguido em inquérito – “declarações” não controladas (se é que o são pois que podem ser simulações ou falsidades) – que se podem reflectir em audiência de julgamento (“Direito ao Silêncio” ali exercido). Há variadíssima jurisprudência sobre a matéria mas limitamo-nos a afirmar que a posição praticamente unânime vai no sentido da proibição de valoração das “conversas informais” desde o acórdão do STJ de 29-01-1992 (CJ, I, pag. 20-24). A doutrina segue no mesmo sentido. Nada de novo, nada de inesperado, o contrário é que seria espantoso. Não obstante jurisprudência algo imprecisa quanto à delimitação conceptual das situações de facto (conceito de “depoimento indirecto” quando o agente percepcionou directamente factos, ou de “conversa informal” com arguido, quando ainda não há constituição como arguido), pensamos que uma adequada delimitação das situações de facto e de direito é a sufragada pelo STJ no acórdão de 15-02-2007 (Proc. 06P4593, relator o Cons. Maia Costa): I– Relativamente ao alcance da proibição do testemunho de “ouvir dizer”, pode considerar-se adquirido, por um lado, que os agentes policiais não estão impedidos de depor sobre factos por eles detectados e constatados durante a investigação e, por outro lado, que são irrelevantes as provas extraídas de “conversas informais” mantidas entre esses mesmos agentes e os arguidos, ou seja, declarações obtidas à margem das formalidades e das garantias que a lei processual impõe. II– Pretenderá, assim, a lei impedir, com a proibição destas “conversas”, que se frustre o direito do arguido ao silêncio, silêncio esse que seria “colmatado” ilegitimamente através da “confissão por ouvir dizer” relatada pelas testemunhas. III– Pressuposto desse direito ao silêncio é, no entanto, a existência de um inquérito e a condição de arguido: a partir de então, as suas declarações só podem ser recolhidas e valoradas nos estritos termos indicados na lei, sendo irrelevantes todas as conversas ou quaisquer outras provas recolhidas informalmente. IV – De forma diferente se passam as coisas quando se está no plano da recolha de indícios de uma infracção de que a autoridade policial acaba de ter notícia: compete-lhe praticar “os actos necessários e urgentes para assegurar os meios de prova”, entre os quais, “colher informações das pessoas que facilitem a descoberta dos agentes do crime” (art. 249.º do CPP). V– Esta é uma fase de pura recolha informal de indícios, que não é dirigida contra ninguém em concreto; as informações que então forem recolhidas pelas autoridades policiais são necessariamente informais, dada a inexistência de inquérito. Ainda que provenham de eventual suspeito, essas informações não são declarações em sentido processual, precisamente porque não há ainda processo. VI– Completamente diferente é o que se passa com as ditas “conversas informais” ocorridas já durante o inquérito, quando já há arguido constituído, e se pretende “suprir” o seu silêncio, mantido em auto de declarações, por depoimentos de agentes policiais testemunhando a “confissão” informal ou qualquer outro tipo de declaração prestada pelo arguido à margem dos formalismos impostos pela lei processual para os actos a realizar no inquérito”. Não nos parece que tal ocorra no caso concreto que se não pode reconduzir à noção de “conversas informais”, com o sentido habitual de “meio fraudulento de prova”. Não há conversas informais quando as forças policiais se limitam a cumprir os preceitos legais, quer pela necessidade de “documentar” a prática do ilícito e suas sequelas, designadamente providenciar os actos cautelares que se imponham (v. g. artigos 243º, 248 a 250º do C.P.P.), quer quando actuam por imposição legal ao detectarem a prática de um ilícito e o arguido decide – por sua iniciativa e sem actuação criticável das forças policiais – fazer afirmações não sugeridas, provocadas ou imaginadas por aqueles OPC. Não só as forças policiais estão a cumprir preceitos legais que lhes impõem uma actuação, como o arguido fez afirmações unilaterais (a “conversa informal” exige bilateralidade, comunicação mútua, uma provocação para a “confissão por ouvir dizer” ou, mesmo, o “relatar” fraudulento de uma “conversa” inexistente). Ao invés, no caso presente a “comunicação” reduziu-se à eventual verbalização voluntária de um “estado de alma” por parte do arguido antes de ter essa qualidade. Ou seja, as forças policiais não estão proibidas de falar com os cidadãos que podem vir a ser arguidos ou com os suspeitos, ou com quem se encontra numa “cena de crime”, que a tal resultado conduz o excesso, o radicalismo, na análise destas situações e na fase inicial do processo. Esta situação teórico-processual é de fronteira e de difícil solução em muitos casos, mas no caso concreto ela não assume tal dificuldade e é, aliás, evidente numa análise calma da situação de facto e seus significados normativos. E é de fronteira quando o ainda não arguido mas já pode ser suspeito, ainda não foi constituído arguido, podendo considerar que que há motivo para tal. O caso dos autos não ´de fronteira, pois que o arguido, antes de o ser e de haver motivos para o ser, faz uma afirmação que denuncia a prática eventual de um crime. Só após a sua afirmação surge a possibilidade – que pode não ser imediata, por necessidade de obter mais indícios – de constituição de arguido. Para este caso parece-nos, deveria valer o disposto no artigo 58º do Código de Processo Penal, sob a epígrafe “Constituição de arguido”, norma que é o cerne da nossa questão concreta (e não a questão do “depoimento indirecto” ou das “conversas informais”): 1 – Sem prejuízo do disposto no artigo anterior, é obrigatória a constituição de arguido logo que: (…) d)- for levantado auto de notícia que dê uma pessoa como agente de um crime e aquele lhe for comunicado, salvo se a notícia for manifestamente infundada. (…) 2 – A constituição de arguido opera-se através da comunicação, oral ou por escrito, feita ao visado por uma autoridade judiciária ou um órgão de polícia criminal, de que a partir desse momento aquele deve considerar-se arguido num processo penal e da indicação e, se necessário, explicação dos direitos e deveres processuais referidos no artigo 61.º que por essa razão passam a caber-lhe. (…) 5 – A omissão ou violação das formalidades previstas nos números anteriores implica que as declarações prestadas pela pessoa visada não podem ser utilizadas como prova. 6 - A não validação da constituição de arguido pela autoridade judiciária não prejudica as provas anteriormente obtidas. E, como mera decorrência do nº 5 do artigo 58º do Código de Processo Penal, a omissão ou violação das formalidades previstas nos números anteriores implica que qualquer declaração daquele que já deveria ter sido constituído como arguido não pode ser utilizada como prova. Tratar-se-ia de clara proibição de prova se tal tivesse ocorrido. Mas esta proibição de prova não abrange as declarações ouvidas pelos agentes policiais ao arguido (antes de o ser) se não houver culpa sua no atrasar da formalização daquela constituição. Como se fundamenta no Ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 11 Julho 2001: “Convém realçar que a não constituição de alguém como arguido nos casos a que se refere o citado artigo 58°, nomeadamente, a violação ou omissão das formalidades aí previstas "implica que as declarações prestadas pela pessoa visada não podem ser utilizadas como prova contra ela" (n.° 4). Naturalmente que o argumento interpretativo a contrario sensu é falível mas aqui inevitável.” No caso presente, idêntico ao relatado no acórdão da Relação de Évora acabado de transcrever parcialmente, verifica-se que o que resulta do auto de notícia é que este foi elaborado e o arguido foi constituído nessa qualidade apenas depois de se ter constatado que este fora autor de uma infracção, ou seja que as circunstâncias verificadas, directa ou indirectamente pelo autuante, vieram a culminar na verificação de uma situação de condução em estado de embriaguez. Até lá o autuante apenas verificou um sinistro, para o qual foi alertado e que lhe foi narrado pelo próprio ou seja pelas declarações informais e imediatas recolhidas junto do próprio arguido que contou de imediato ao agente autuante que contou que ia a subir a rua e foi contra a parede do prédio e que era o condutor do veículo em causa e confirmado pelos demais elementos indiciários recolhidos no local, nomeadamente pelo relato dos demais agentes da polícia que se encontravam no local e que tinham sido alertados pelos transeuntes para a existência de um acidente. Só depois se confirmou que o arguido se encontrava com excesso de álcool no sangue. Em momento algum, note-se – e o arguido tem conhecimento prático dos procedimentos habituais atinentes a este tipo de autuação – veio o arguido alegar que não ia a conduzir o ciclomotor. Não teve o agente qualquer motivo para duvidar das declarações deste ao ter assumido que conduzia o ciclomotor e que embateu com o mesmo na parede e que essa seria a razão para ter ficado ferido. Tratou-se de prova indiciária sustentada por outros elementos de prova, não proibidos, apreciados livremente pelo julgador. Como se realça no referido acórdão: “Face ao ordenamento português e no caso concreto parece-nos indubitável que simples cidadão ou cidadão suspeito não goza do direito ao silêncio e, como tal, a prova produzida pelas suas declarações, melhor, depoimento, é válido. Se ainda não havia obrigação de constituição como arguido e as entidades policiais agiam dentro dos poderes concedidos pelas normas reguladoras da aquisição e notícia do crime (artigos 241º e 242º) e de medidas cautelares e de policia (artigos 248º e segs., designadamente o artigo 250º do C.P.P.) e, sem má fé ou atraso propositado na constituição de arguido, ouvem do cidadão ou suspeito a informação da prática de um crime, isso não constitui violação de lei ou fraude à lei, nem obtenção de prova proibida. Por isso que a questão não se centra – como faz alguma jurisprudência – em saber se a proibição de “conversas informais” deve abranger afirmações anteriores ou posteriores à constituição de arguido. Que são proibidas após a constituição como arguido é do reino do óbvio. Que nunca são antes da constituição como arguido também nos parece evidente, já que aí nem existem “conversas informais”, sim afirmações de um cidadão, que pode ser suspeito ou nem isso. E o suspeito ou nem isso é, no ordenamento processual penal português, uma testemunha. Excepto se a má-fé policial tiver ilegalmente atrasado essa constituição. Por isso que o artigo 58º tenha um nº 5, que comina com a nulidade probatória uma conduta policial que conduza a um resultado não querido pelo legislador. Assim, a questão centra-se, no caso de situações de fronteira, na distinção a fazer entre as figuras de “suspeito” e “arguido”. Este goza de direitos, aquele é testemunha. O arguido goza do direito ao silêncio, o suspeito não. Numa situação de facto duvidosa em que as forças policiais não constituem logo como arguido – que o pode ser verbalmente – um suspeito da prática de um crime é de reconhecer ao suspeito o direito ao silêncio (e seus benefícios em audiência – não admissão de depoimentos policiais)? Ou seja, podemos resolver a questão através da extensão de direitos do arguido ao suspeito? Ou fazer rectrotrair a condição de arguido a momento anterior independentemente de uma situação de nulidade (fora, portanto, da operatividade do nº 5 do artigo 58)? Ou estaremos limitados – o que parece o mais adequado – à clara delimitação da situação de facto, até em função da relevância do momento de constituição como arguido?” No caso em apreço, o arguido foi abordado por causa de um acidente, em que a polícia interveio para o socorrer e se informar do sucedido e não por via de um crime ou infracção, pelo que nem sequer houve atraso na constituição de arguido em processo crime para os efeitos do artigo 58º, nº 5 C.P.P. no momento em que, interceptado, faz a afirmação de ser o condutor de veículo com o qual acabara de embater contra uma parede, situação para a qual a polícia fora alertada por populares e por outros agentes da polícia e para a qual se aprontaram até a obter auxílio médico. Ou seja, o arguido não tinha que ser constituído como tal, quando se concretiza a intercepção e só, depois de verbalizar a prática da condução e de se ter verificado o grau de álcool no sangue de que era portador, é que surgiu a obrigação de constituição como arguido em processo crime e não antes, o que aconteceu. Não há, pois, nulidade de meio de prova resultante da previsão do nº 5 do artigo 58º do Código de Processo Penal, única de que poderia beneficiar o arguido. No fundo, a declaração do arguido não passa de uma denúncia de um crime nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 241º e seguintes do Código de Processo Penal, mais propriamente do artigo 244º. De todo o modo, foi a prova directa constituída pelas declarações prestadas pelo próprio no local e em momento anterior à notícia de um crime e como tal anterior à sua constituição como arguido que foram concertadamente avaliadas e valoradas conjuntamente, e de forma conjugada e crítica, com outros meios de prova. Verifica-se, pois, que o auto não apresenta a omissão ou violação das formalidades previstas no art.º 58º CPP, nomeadamente nas alíneas indicadas pelo recorrente e pelas razões ora apresentadas. Improcede, pois, também esta argumentação. 3.3.– Por último, pretende o recorrente que, a manter-se a decisão de condenação, seja revista a pena aplicada em cúmulo, por ser manifestamente desproporcional e excessiva, podendo e devendo ser substituída por multa ou suspensa na sua execução, ao contrário do MºPº que considera que “a pena aplicada ao arguido é a única que se revela ajustada, porque suficiente, para salvaguardar as exigências de prevenção geral e especial, nos termos previstos pelos arts. 40º e 70º do Código Penal, em face do passado criminal do arguido, que sofrera já nove condenações, sendo quatro delas pela prática de crime de idêntica natureza ao dos presentes autos e a última em pena de prisão suspensa na sua execução e sujeita a regime de prova, circunstância essa que não demoveu o arguido de voltar a cometer o mesmo crime, justamente, no decurso do período de suspensão de que, nesses outros autos, vinha beneficiando.” “O crime de violação de proibições ou interdições, p. e p. no art.º 353º do Código Penal, é punido “com pena de prisão até 2 anos ou com pena de multa até 240 dias”. O crime de condução em estado de embriaguez, p. e p. no art.º 292º, n.º 1, do Código Penal, é punido “com pena de prisão até 1 ano ou com pena de multa até 120 dias”. Para fixar a pena da condenação o tribunal ponderou no caso, e em concreto, as necessidades de prevenção geral que são muito elevadas em ambos os casos, quer relativamente ao reforço da consciência jurídica comunitária, quer no que respeita ao sentimento de segurança face à violação da norma, pois que, e quanto ao primeiro crime o desrespeito pela condenação e o sentimento de impunidade provoca o descrédito na justiça, e quanto ao segundo crime, como é do conhecimento geral, Portugal tem das maiores sinistralidades rodoviárias da Europa, sendo vergonhoso o número anual de mortos e de feridos nas nossas estradas. Ponderou igualmente que as necessidades de prevenção especial são muito elevadas e qualquer dos casos, pois o arguido tem antecedentes criminais, tendo sido condenado antes da prática dos factos por nove crimes, destes sendo quatro por crime de condução em estado de embriaguez (sendo que, além de um dos crimes em apreço ter igual natureza a esses, o outro dos em apreço está com este directamente relacionado, numa relação de quase causa/efeito) e dois por crime de desobediência, além de por outros três de furto, todos por sentenças transitadas em julgado antes da prática dos factos, encontrando-se embora profissionalmente integrado. Conclui perante este quadro que “relativamente a ambos os crimes não seria suficiente para satisfação das finalidades da pena a aplicação ao arguido de uma pena de multa, pelo que optou pela aplicação de uma pena de prisão.” Todas as razões invocadas encontram suporte na matéria de facto apurada e mostram-se devidamente sopesadas e de acordo com os princípios do Direito e as necessidades da pena para que tenha sido escolhida a pena de prisão e não a de multa ou outra de substituição. A decisão considerou a existência de antecedentes criminais e as condições pessoais e referentes à situação económica do arguido e sopesou ainda o grau de ilicitude do facto, que determinou ser mediano quanto a ambos os crimes, sendo de atentar ao percurso (apenas 500 metros) que se propunha fazer e considerando tratar-se de violação de uma ordem emanada de um Tribunal, quanto ao primeiro dos crimes, e atendendo à TAS apresentada, de 1,65 g/l, tendo ainda sido interveniente em acidente de viação, quanto ao segundo dos crimes e que o arguido agiu com dolo directo quanto ao crime de violação de proibições ou interdições e necessário quanto ao crime de condução em estado de embriaguez, mostrando-se a sua intensidade mediana em ambos os crimes. Perante estas considerações, afigura-se-nos mais adequado fixar as penas em 6 meses de prisão pelo crime de violação de proibições ou interdições e em 3 meses de prisão pelo crime de condução em estado de embriaguez, que num critério de justiça relativa e ponderando o grau de culpa, que não é elevado, e atentas as circunstâncias concretas em que agiu e em que se propôs conduzir o ciclomotor ( por um tão escasso número de metros) mostram-se adequadas e proporcionais à medida da culpa e demais critérios ponderados, não ultrapassando aquela nem ficando aquém das necessidades concretas de prevenção também já definidas e, reflectindo juízos de justiça relativa, (comparativamente em situação idêntica de arguido com seis condenações anteriores por crimes de furto, condução em estado de embriagues e violação de proibições e interdições sofreu recentemente nesta mesma Secção no processo 109/17.1 GAALQ.L1, por acórdão de 10.10.2017, as penas de 4 meses de prisão pelo crime p.p. pelo art.º 292º,n.º1 CP e 3 meses de prisão pelo crime p.p. pelo art.º 353ºCP, e na pena unitária de 5 meses de prisão). Em cúmulo jurídico destas penas será condenado na pena unitária de 7 meses de prisão, medida que se prefigura adequada, considerando num juízo de prognose antecipada e em bloco, que a mesma não será substituída por multa nem por pena suspensa na sua execução ou por outra pena de substituição não detentiva, dado o elevado número de condenações anteriores reveladoras de uma maior necessidade de garantir a prática de futuros crimes, o que exige uma pena mais severa do ponto de vista do seu cumprimento mas não pode, portanto, deixar de ser reflectido na medida a aplicar, em concreto. Por essa razão sempre entendemos que a escolha da pena e a sua medida devem ser articuladas com a sua forma de cumprimento e com o antecipado prognóstico da sua eventual substituição, ou não, por outra pena. Perante estas penas parcelares, a fixação da pena unitária em 7 meses de prisão mostra-se ajustada pelas razões aduzidas anteriormente e, ponderados, em conjunto, os factos e a personalidade do arguido, nos termos do disposto no art.º 77º, n.ºs 1 e 2, do Código Penal, atendendo ao carácter revelado pelo seu passado criminoso, mas considerando-se terem sido ambos os crimes praticados num mesmo momento e no mesmo contexto. Concorda-se com a conclusão do tribunal a quo, no sentido de que “tendo em conta que o arguido cometeu os crimes em causa nos autos após ter sido condenado por aqueles crimes, actuando inclusive no período de suspensão de uma pena de prisão que ficou condicionada a tratamento ao alcoolismo e com regime de prova, entendemos que “a simples censura do facto e a ameaça da prisão” não realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição”, nos termos do disposto no art.ºs 50º, n.º 1, do Código Penal, pelo que, não existe fundamento para suspender a execução da pena de prisão aplicada ao arguido, nem mesmo para a substituir por trabalho a favor da comunidade nos termos do disposto no art.º 58, n.º 1, do Código Penal.” Verifica-se que a pena de prisão foi, nos termos do disposto no art.º 45º, n.º 1, do Código Penal, substituída por prisão a cumprir em dias livres por ter o tribunal concluído que, “no caso, esta forma de cumprimento realiza de forma adequada as finalidades da punição”. Refere o tribunal a quo que: “No caso vertente o cumprimento da pena de prisão por dias livres assegura a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente e permite evitar que se projecte sobre o mesmo consequências sociais nefastas decorrentes da ruptura total deste com o meio social. Conforme decorre do n.º 2 do art.º 45º do Código Penal a prisão por dias livres consiste numa privação da liberdade por períodos correspondentes a fins-de-semana não podendo exceder setenta e dois períodos. Esclarece o n.º 3 do mesmo artigo que cada período tem a duração mínima de trinta e seis horas e a máxima de quarenta e oito horas, equivalendo cada período a cinco dias de prisão contínua. Nos termos do preceituado no art.º 487º, n.º 1, do Código de Processo Penal, a decisão que fixar o cumprimento da prisão por dias livres especifica os elementos necessários à sua execução indicando a data do início desta. Considerando a pena aplicada (nove meses, ou seja, 270 dias) o(a) arguido(a) deverá cumprir 54 (cinquenta e quatro) períodos correspondente a outros tantos fins-de-semana, sendo que não se justifica que a duração de cada período exceda as trinta e seis horas que se deverão situar entre as 09H00 de Sábado e as 21H00 de Domingo.” É usual a categorização em penas de substituição em sentido próprio (não detentivas) e em sentido impróprio (detentivas). As primeiras agregam as penas de multa substitutiva da pena de prisão, de suspensão da execução da pena de prisão nas diversas modalidades, de trabalho a favor da comunidade e de proibição do exercício de profissão, função e atividade, pública ou privada. Quanto às segundas, abarcam o regime de permanência na habitação, a prisão por dias livres e o regime de semidetenção. Dentro das penas de substituição em sentido próprio, para além da pena de multa (artigo.43.º, n.º 1 do C.P.), também as penas de suspensão de execução da prisão (art.50.º do CP) e de prestação de trabalho a favor da comunidade (art.58.º do CP) podem substituir, em certos casos, a pena de prisão aplicada ao arguido. Há ainda que contar com penas de substituição detentivas como o regime de permanência na habitação (art.44.º do CP, a prisão por dias livres(art.45.º do CP e a prisão em regime de semidetenção (art.46.º do CP), estas duas últimas vocacionadas para obstar aos efeitos nefastos da prisão contínua. Tendo em conta a natureza e os pressupostos de cada uma das diferentes penas substitutivas, tem sido aceite jurisprudencialmente a seguinte ordem sucessiva de ponderação: Substituição da pena de prisão por: 1º - multa (artigo 43º); 2º - suspensão da pena (artigo 50º); 3º - prestação de trabalho a favor da comunidade (artigo 58º); 4º- regime de permanência na habitação (artigo 44º); 5º - prisão por dias livres (artigo 45º); 6º - regime de semidetenção (artigo 46º). Entendemos, porém, que essa ordem não é universal e poderá ser diferentemente apreciada à luz das circunstâncias do caso concreto e das particulares condições do condenado. Como se pode ler no acórdão do TRP de 10/11/2010, no processo n.º 171/10.8GHVNG.P1: “Vem a propósito referir que, no entendimento de Figueiredo Dias, na Obra Citada, pag. 333, “não existe em abstracto, pelo menos sob forma rígida e em via de princípio, uma «hierarquia legal das penas de substituição». Embora, não possamos deixar de ponderar que a privação da liberdade inerente ao regime de permanência na habitação é equiparável, no grau de lesividade da possibilidade da organização da vida pessoal, à prisão contínua efectiva. (cfr. voto de vencido no Ac. do TC 184/2007, DR, II série, de 11 de Maio de 2007, a propósito de prisão preventiva /versus/ obrigação de permanência na habitação.” Isto para concluir que, não obstante a inexistência de hierarquia declarada das medidas de substituição, se afigura mais gravosa, pelo menos em abstracto, a medida de permanência na habitação, tal como é definida pelo regime legal em vigor à data dos factos, pela continuidade que lhe é inerente e pela consequente interrupção de toda a vida social e profissional normal da pessoa sujeita a tal medida. Os factores a analisar para se concluir se é permitida a substituição da prisão por outra pena são os que fazem concluir que uma determinada pena de substituição pode realizar, suficiente e adequadamente, as finalidades da punição, assim se evitando os malefícios maiores da prisão. A decisão recorrida afastou a substituição da prisão, por multa e por suspensão da execução da pena e também por prestação de trabalho a favor da comunidade, que não considerou suficientes para alcançar tais finalidades, pelas razões que invoca e a que aderimos, face ao número de condenações anteriores e ao elevado grau de um concretizável receio de que o arguido volte a cometer crimes desta natureza e que penas anteriores, de multa ou de suspensão na execução da pena, não tiveram a virtualidade de prevenir. O tribunal considerou, no caso vertente, que o cumprimento da pena de prisão por dias livres assegura a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente e permite evitar que se projectem sobre o mesmo consequências sociais nefastas decorrentes da ruptura total deste com o meio social, pelo que a escolheu, de entre as demais, como sendo a que reunia condições para alcançar as finalidades da punição, mormente por ter menor impacto na sua vida sócio profissional. O tribunal efectuou a ponderação de substituir a prisão, que não considerou necessária para garantir a prevenção de crimes, mas considerando insuficientes a multa e suspensão da pena na sua execução e prestação de trabalho, julgando ser adequada, para a realização das finalidades da pena, a pena de prisão por dias livres, pois demonstrou, pelas razões invocadas, que, por um lado, não seriam suficientes penas substitutivas de carácter não detentivo e, por outro, que esta seria suficiente para assegurar tais fins sem perturbar intoleravelmente a sua vida sócio profissional.. O recorrente apenas pede a redução da pena de prisão e a sua substituição por multa ou pela sua suspensão na execução da prisão. Da mesma forma se presume, da sua alegação, que não concorda com a pena de prisão por dias livres como discordaria da substituição por qualquer outra pena de cariz detentivo. A apreciação em falta terá particular relevo, face à alteração legislativa entretanto operada pela publicação da Lei 94/2017 de 23.8, embora ainda não entrada em vigor, uma vez que esta alteração ao C.P. entrará em vigor 90 dias após a publicação. De todo o modo, esta lei contém uma norma transitória que prevê, no caso de decisões transitadas, que o condenado requeira a realização de audiência para que seja ponderada outra via de substituição da pena de prisão, uma vez que a prisão por dias livres deixa de constar do elenco das penas. A decisão recorrida concluiu a prisão por dias livres era a menos gravosa e seria ajustada à realização dos fins das penas. Nada refere o arguido a este propósito e não existem motivos para colocar em crise a escolha em particular da prisão por dias livres, de entre as penas detentivas de substituição. Efectivamente, perante os elementos concretos disponíveis, dado o comportamento criminal do arguido, mostram-se manifestamente insuficientes as medidas que o próprio sugere. Só penas de natureza detentiva poderão ter o efeito pretendido, de evitar a prática de futuros crimes, perante a demonstrada insensibilidade do arguido para acatar os valores ético-jurídicos em causa. E, de entre estas, a prisão por dias livres será a que representa menor sacrifício social e profissional para o arguido, perante as regras de cumprimento desta e da obrigação de permanência na habitação tal como se mostram definidas no Código Penal, contemporâneo da data dos factos. Esta pena, em concreto, será a que, realizando suficiente e adequadamente as finalidades punitivas, menos nociva se mostra, do ponto de vista pessoal, social e profissional, à situação concreta do condenado, devendo, em caso de idêntica potencialidade punitiva e ressocializadora, ser escolhida a que menos nociva e menor sacrifício social demonstrasse ter para o arguido. O tribunal deve optar pela solução que, entre as várias comportadas pelo objecto do recurso, se mostre menos gravosa para o recorrente, em homenagem, nomeadamente, ao princípio do acusatório e tendo em conta o critério que deve nortear a escolha de qualquer pena, impondo que tal escolha recaia sobre aquela pena que se apresentar menos onerosa ou que menos atente contra a liberdade, desde que com ela sejam atingidas as finalidades visadas pela condenação. A Lei 94/2017 de 23.8, publicada mas ainda não entrada ainda em vigor, que despenaliza a prisão por dias livres e o regime de semi-detenção, poderá permitir para casos de decisões transitadas em julgado que o condenado requeira nova audiência para os fins consentidos pelo art.º 12º da mesma. Note-se que, no âmbito da nova lei, a obrigação de permanência na habitação possui contornos bem mais flexíveis, em comparação com a equivalente pena, tal como esta era definida no C.P, anterior à referida versão, tornando-a socialmente mais adaptada à realidade social de quem tem inserção familiar e profissional e menos gravosa do que é no regime ainda em vigor. Sem prejuízo da referida possibilidade concedida pela referida alteração ao Código Penal, mantem-se a decisão recorrida na parte em que substituiu a pena de prisão por prisão por dias livres. A decisão recorrida condenou ainda o arguido, nos termos do disposto no art.º 69º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, na redacção introduzida pela Lei 77/2001, de 13.07, na pena acessória de proibição de condução de veículos a motor, pelo período de 18 (dezoito) meses, pelas razões e fundamentos da decisão recorrida a que se adere. 4.–Pelo exposto, acordam os juízes, nesta Secção, em dar provimento parcial ao recurso, condenando o arguido na pena de 6 meses de prisão pelo crime de violação de proibições ou interdições p.p. pelo art.º 353º CP e na pena de 3 meses de prisão pelo crime de condução em estado de embriaguez p.p. pelo art.º 292º, n.º1 C.P. Em cúmulo jurídico destas penas, condena-se o arguido na pena unitária de 7 meses de prisão, a cumprir em dias livres nos termos do art.º 45º, n.ºs 1, 2 e 3 do Código Penal, em 42 (quarenta e dois) períodos sucessivos correspondentes a 42 fins-de-semana entre as 09H00 de Sábado e as 21H00 de Domingo com início no segundo fim de semana subsequente ao trânsito em julgado da presente sentença; Em tudo o mais, mantém-se a decisão recorrida. Sem custas. Lisboa, 17-10-2017 Margarida Bacelar Agostinho Torres |