Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
2190/03.1TBCSC-B.L1-7
Relator: ARNALDO SILVA
Descritores: DIREITO DE VISITA
MENOR
PROVA PERICIAL
ABUSO SEXUAL
AUDIÇÃO DE CRIANÇAS
NULIDADE
ADVOGADO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 05/19/2009
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: 1. A alteração do regime de visitas não se baseou inteiramente na audição das menores.
2. As menores conhecem o pai.
3. A ansiedade é um sentimento misto de receio e de apreensão ou inquietação sobre o futuro, é um estado de alerta, um estado afectivo desagradável, exprime a expectativa perante um perigo, e pode apresentar graus, desde um leve receio até a um pânico sem conteúdo definido. Assim a ansiedade de uma menor centrada na figura paterna justifica o medo que a menor sente pelo pai.
Os medos infantis podem ter causas variadas, podem ser racionais ou irracionais, e uma criança, tal como um adulto, pode ter medo do que desconhece, se o estado afectivo violento e passageiro que é o medo, for o resultado de uma criação no espírito de conteúdos psíquicos que não tenham qualquer correspondência com conteúdos reais previamente percebidos. E isto, claro está, com a ressalva de toda a problemática em torno da origem, valor e natureza do conhecimento.
4. O direito de visita é um direito-dever, um direito-função, um direito a ser exercido não no exclusivo interesse do seu titular, mas, sobretudo, no interesse da criança. Não é, pois, um direito de carácter absoluto, visto que está subordinado ao interesse da criança. Por isso, pode ser limitado ou excluído, ou suspendido provisoriamente.
5. A consideração da vontade do menor depende da sua idade, do seu discernimento, e do grau da sua maturidade. Tratando-se de um adolescente, a lei (art.º 10º, n.º 1 da LPCJP) aponta a idade de 12 anos, como idade a partir da qual a opinião do jovem é relevante. É este também o critério seguido no Cód. Civil em matéria de adopção [art.º 1981º, n.º 1 al. a) e 1984º al. a) do Cód. Civil, alterados pelo Dec. Lei n.º 120/98, de 08-05]. Abaixo desta idade é importante analisar o grau de maturidade do menor e da questão de saber se a sua vontade foi livremente determinada ou resultou de influências ou manipulações externas.
6. A vontade das menores tem de ser ponderada, atento o estado do seu desenvolvimento e amadurecimento já às portas da puberdade (2.ª infância, período de latência ou quarto estádio), já que não há indícios de que tenham sido objecto de coacção moral e indução psicológica da mãe, nem se pode afirmar a existência de síndrome de alienação parental (SPA), se é que o mesmo tem base científica. Donde se tem de concluir que a vontade das menores em se recusarem a ver o pai foi livremente determinada e, por isso, tem de ser respeitada.
7. Os depoimentos das crianças é muito complexo e está sujeito a muitas condicionantes. Aquilo que elas afirmam com sinceridade, espontaneidade e simplicidade e que parece credível, pode não o ser. É muito difícil à criança fixar a linha divisória entre a verdade e a mentira, entre a ficção e a realidade, entre os seus pensamentos e a verdade objectiva. A criança mente frequentemente, consciente ou inconscientemente, podendo mesmo os seus relatos apresentar muitos pormenores e coloridos. Por tudo isto, assume especial relevância que os seus inquiridores sejam técnicos especializados, psicólogos e pedopsiquiatras, uma vez que se está perante factos a averiguar (a existência ou não de abuso sexual de menores) que exigem especiais conhecimentos no domínio da psicologia e pedopsiquiatria que os julgadores, em virtude da sua formação académica, não possuem.
8. As perícias destes técnicos é livremente apreciada com as restantes provas que forem produzidas sobre os factos que dela são objecto (art.º 389º do Cód. Civil), podendo o juiz controlar as perícias e afastar-se mesmo delas se as reputar incorrectas, desde que o faça fundamente. Neste caso, o juiz exerce a sua insubstituível função de peritus peritorum.
9. Havendo perícias de peritos diferentes que se contradizem, tem o julgador, à luz do supra referido em 8., de dar prevalência às perícias realizadas “a quente” sobre a ocorrência dos alegados abusos sexuais e não sobre as realizadas a “frio” e que se encontram feridas pelo decurso do tempo e pelas sucessivas e múltiplas entrevistas, observações e exames efectuados às menores, que prejudicam a observação dos peritos, se aquelas estiverem devidamente fundamentadas e se lhe afigurarem correctas.
10. Verificando-se que uma destas perícias que concluiu “parecerem existir actualmente maiores indícios da ocorrência de abuso sexual sobre as menores” e de que uma teria sido mais abusada do que a outra pelo pai, não está devidamente fundamentado, nem os esclarecimentos posteriores da perita removeram a essa falta de fundamentação, não pode ser atribuído a essa perícia qualquer valor. Verificando-se igualmente que a última perícia realizada a “frio” conclui que a menor mais velha foi abusada sexualmente pelo pai e que os relatos desta menor são credíveis, por razões que aponta, mas verificando-se que os relatos desta menor são idênticos aos da mãe, que a menor utiliza as mesmas palavras e expressões que a mãe, e que a mãe e a avó materna exerceram pressões sobre as menores relativas às acções do pai de forma constante e excessivamente focalizada na temática genital e sexual, como se houvesse da sua parte uma procura incessante da confirmação dos alegados abusos sexuais, numa primeira fase em que se encontrava perturbada emocionalmente devido à ruptura da sua relação conjugal com o pai das menores e da suspeita dos ditos abusos sexuais, estamos perante um sinal evidente de que a menor mais velha e alegadamente mais abusada foi sugestionada.
11. Verificando-se que os exames de sexologia forense e biologia forense realizados a “quente” sobre a alegada ocorrência dos factos abusivos não confirmaram os abusos sexuais, e verificando-se que de três perícias a “quente” duas delas não verificam a existência de sinais ou sintomas de abusos sexuais e, uma terceira, aponta à menor, alegadamente mais abusada, uma sintomatologia que pode corresponder a uma perturbação de adaptação com predomínio de ansiedade, não querendo ou não podendo afirmar a existência de abusos sexuais sobre a menor, e referindo que a menor está pressionada pela mãe e pela avó materna a falar do que seriam os relatos feitos por ela à mãe e à avó materna relativos às acções do pai; e verificando-se ainda uma outra perícia que diz que não há sinais indiciadores de abuso sexual sobre a menor alegadamente menos abusada, há que, atento o supra referido em 10., de concluir que não se provam os alegados abusos sexuais do pai sobre as menores.
12. Uma vez que não se provam os alegados abusos sexuais do pai sobre as menores, e uma vez que estas se recusam a ver o pai e a sua vontade tem de ser respeitada, pelas razões supra referidas em 6., impõe-se a suspensão provisória do direito de visita do pai até que se atenue ou desapareça a recusa das menores. O que terá de ser obviamente averiguado pelos peritos.
13. Nos termos do art.º 668º, n.º 1 al. b) do Cód. Proc. Civil ex vi art.º 666º, n.º 2 do mesmo código, é nulo por falta de fundamentação, o despacho que decidiu que as menores seriam ouvidas sem a presença dos progenitores nem dos seus advogados sobre se queriam ou não reatar a convivência com o pai.
14. Não obstante ser nulo, tal despacho é legal, e não viola o disposto nos art.ºs 61º, n.º 3 e 83º, n.º 1 do EOA (Lei n.º 15/2005, de 26-01), art.º 36º, n.º 1 do Cód. Proc. Civil e 208º da C.R.P., não só porque não se está, in casu, a impedir o exercício do mandato judicial nem a contrariar a indispensabilidade do mandato judicial __ o que se está é a impedir os pais e os seus advogados de assistirem à dita audição __, mas também porque o processo de regulação do poder paternal é um processo tutelar cível [art.º 146º al. d) da OTM)] e é considerado um processo de jurisdição voluntária (art.º 150º da OTM), e, por isso, o tribunal não está sujeito a critérios de legalidade estrita, podendo o juiz proferir a decisão que lhe pareça mais justa, atendendo apenas às características da situação e sem recurso à lei eventualmente aplicável, e porque aquele despacho se justifica com o fim de permitir às menores manifestarem livremente a sua vontade sem qualquer pressão ou constrangimento, já que a Relação tinha determinado a sua audição, e, porque, havia indícios nos autos de anteriores pressões maternas sobre as menores no sentido de as mesmas falarem em relação aos alegados abusos sexuais perpetrados pelo pai e de que elas teriam sido vítimas, e porque as menores têm medo do pai.

(Sumário do Relator)
Decisão Texto Integral: Acordam os juízes, em conferência, na 7.ª Secção Cível, do Tribunal da Relação de Lisboa:

I. Relatório:
1. Nos autos de regulação do exercício do poder paternal referentes às menores “A” e “B”, intentados pela requerente “C” contra “D”, a fls. 1414 foi proferido o seguinte despacho:
«Em obediência à decisão do Venerando Tribunal da Relação de Lisboa, designa-se o dia 7-7-2008, pelas 10h30, para audição das menores.
Consigna-se que as menores serão ouvidas sem a presença dos progenitores nem dos ilustres advogados».
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2. Inconformada com este despacho, na parte em que decidiu que o advogado da mãe das menores não podia estar presente, agravou a requerente. Nas suas alegações, em síntese nossa, conclui:
1.ª O despacho não está fundamentado;
2.ª O despacho é ilegal em dois sentidos: a) é ilegal porque violou o art.º 158º, n.º 1 do Cód. Proc. Civil, que impõe a fundamentação da decisões judiciais __ ilegalidade que envolve a nulidade prevista no art.º 668º, n.º 1 al. b) do Cód. Proc. Civil; b) é ilegal, porque violou o disposto nos art.ºs 61º, n.º 3 e 83º, n.º 1, ambos da Lei n.º~15/2005, de 26-01, e art.º 36º, n.º 1 do Cód. Proc. Civil;
3.ª O despacho é inconstitucional, porque violou o disposto nos art.ºs 205º, n.º 1 e 208º da C.R.P.. Aquele, na medida em que impõe a obrigatoriedade de fundamentação das decisões judiciais. Este, na medida em que determina a essencialidade do patrocínio forense na administração da justiça.
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3. Não houve contra-alegações.
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4. O tribunal manteve o despacho recorrido.
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5. Os presentes prosseguiram os seus termos, tendo sido realizada a conferência de pais em 27-01-2002, na qual não foi possível chegar a acordo.
Foi fixado regime provisório, atribuindo a guarda das menores à mãe. Face às suspeitas de abuso sexual apresentadas pela progenitora, não foi fixado regime de visitas.
Foi determinada a realização de exames médico-legais, a realizar pelo IML.
Foi determinada a realização de inquéritos sociais.
Os progenitores alegaram e apresentaram provas
Dos autos constam diversos relatórios periciais.
Produzidas as provas respondeu-se à matéria de facto pela forma que consta de fls. 1452 e segs.
Foi proferida sentença que regulou o exercício do poder paternal pela seguinte forma:
a) As menores “A” e “B” ficam entregues à guarda e cuidados da mãe, que exercera o poder paternal;
b) Não se fixa regime de visitas ao pai;
c) O pai contribuirá, a título de alimentos, para as menores a quantia de 750,00 (setecentos e cinquenta) euros por mês (trezentos e setenta e cinco para cada uma), quantia esta que será entregue à mãe até ao dia 30 de cada mês, através de transferência para conta que a mesma indicara nos autos no prazo de 5 dias;
O montante da pensão a pagar pelo pai será actualizado anualmente, por aplicação do índice geral de preços no consumidor publicado pelo INE, relativo ao ano económico anterior, tendo a primeira actualização lugar em Setembro de 2009.
Mais condenou a requerente e o requerido nas custas, na proporção de ¼ para a requerente e de ¾ para o requerido.
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6. Inconformado com esta sentença, apelou o requerido. Nas suas alegações[1], em síntese nossa, conclui:
1.ª Ao Tribunal a quo não ocorreu como é que a “B” pode ter medo do pai __ ela afirmou que não quer conviver com ele, porque tem medo dele __ se não o conhece __ a “B” afirmou que não se lembrava do pai, dos avós, tios e primos paternos, nem sabia o nome deles;
2.ª Ao Tribunal a quo também não ocorreu que a “B” não conhece de facto o pai, porque, desde Janeiro de 2004 __ tinha ela na altura três anos __ este nunca mais a viu;
3.ª A “B” vive só com a mãe e a família materna, e depende exclusivamente desse núcleo, e sabe o que todo núcleo queria que ela dissesse em Tribunal;
4.ª Isto na hipótese inocente, de pensar que não foi industriada para dizer o que disse. Tanto mais se foi, como de certeza foi;
5.ª Não se seguiu um processo correctamente. O Tribunal a quo foi inapto para compreender, integrar e aplicar a lei à situação de duas crianças indefesas, entregues a uma doente, totalmente alienadas, induzidas, manipuladas, numa cena “politicamente correcta”, mas de arrepiar! duas crianças formalmente protegidas, mas totalmente violentadas, umas infelizes que o Sistema produziu;
6.ª Dos Senhores Peritos (que tanto cita e gosta) o Tribunal a quo só se lembrou que a vontade da criança deve ser respeitada. E não se lembrou que a menor “B” não demonstra qualquer perturbação emocional em relação ao pai, e que demonstra disponibilidade psíquica para conviver com o pai. E seria útil que a menor reintroduzisse tais convívios;
7.ª Não foi detectado qualquer medo. Os peritos não o disseram;
8.ª O Sr. Juiz a quo não soube interpretar a discrepância entre o que disse a menor __ que disse “não querer estar com o pai” __ e a “disponibilidade psíquica” para estar com ele, descrita pelo Perito, nem isso lhe levantou qualquer dúvida;
9.ª O Tribunal a quo não soube pensar, agiu maquinalmente, visto que há tanta coisa nos autos, essencialmente o relatório clínico relativo à mãe das menores e que confirma que ela é doente. E isto não levantou qualquer problema ao Tribunal;
10.ª Deve manter-se para a “B” o regime de visitas ao pai, como decidido na 1.ª sentença.
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7. Nas suas contra-alegações, a requerente apelada, em síntese nossa, conclui:
1.ª O recurso só pode ser apreciado e decidido com base na alegação de recurso ora produzida pelo recorrente, pois a alegação produzida na apelação da anterior sentença entretanto anulada para poder ser atendida haveria que ter sido fundida com a alegação do recurso ora em apreço.
É que, tratando-se de uma só decisão e de um único recurso, não cabem ao caso duas alegações;
2.ª Por outro lado, o recorrente concluiu o que alegou e alegou o que concluiu, não cumprindo o ónus de alegar e concluir, segundo o bom entendimento técnico que destas duas partes da alegação de recurso deve ter-se (n.ºs 1 e 2 do art.º 690º do Cód. Proc. Civil).
A alegação envolve vício que justifica a rejeição do recurso;
3.ª De todo o modo, verdade é que as menores manifestaram de forma inequívoca, fundamentada, a vontade de não quererem reatar a convivência com o pai e, na circunstância, tal vontade deve ser acatada.
Donde, não justificando crítica a decisão em recurso deve a mesma ser mantida.
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8. As questões essenciais a decidir:
Na perspectiva da delimitação pelo recorrente[2], os recursos têm como âmbito as questões suscitadas pelos recorrentes nas conclusões das alegações (art.ºs 690º, n.º 1 e 684º, n.º 3 do Cód. Proc. Civil)[3], salvo as questões de conhecimento oficioso (n.º 2 in fine do art.º 660º do Cód. Proc. Civil), exceptuando-se do seu âmbito a apreciação das questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras (n.º 2 1.ª parte do art.º 660º do Cód. Proc. Civil).
Nas suas alegações o recorrente diz que oferece as anteriores alegações, porque a nova sentença exarada nos autos é igual em tudo à anterior. Mas tal não pode ser. A anterior sentença foi anulada e a única sentença que existe os autos è a sentença recorrida. As alegações supra referidas em I. 6. têm de ser auto-suficientes não se compadecendo com remissão para as alegações anteriormente produzidas em recurso antes do julgado, e o julgado[4], nos presentes autos, é só e apenas só a sentença recorrida. 
Logo é esta e não aquela que é objecto do presente recurso.
Pelo exposto, o que consta das anteriores alegações não fazem parte do objecto do presente recurso.
Atento o exposto e o que flui das conclusões das alegações[5] __ e só se devem conhecer as questões que tenham sido suscitadas nas alegações e levadas às conclusões, ainda que outras, eventualmente, tenham sido suscitadas nas alegações propriamente ditas[6] __, da requerente agravante e apelada supra descritas em I. 2. e do requerido agravado e apelante supra descritas em I. 6., e que as anteriores alegações do recurso da sentença que foi anulada __ a sentença de 16-11-2007 de fls. 1260 a 1278, que foi anulada por decisão individual do relator da 1.ª Secção desta Relação de 08-05-2008 (fls. 1382 a 1402) __ estão excluídas do âmbito do presente recurso, as questões essenciais a decidir são as seguintes:
α) Agravo: se o despacho recorrido é ou não nulo por falta de fundamentação, nos termos do art.º 668º, n.º 1 al. b) do Cód. Proc. Civil ex vi n.º 3 do art.º 666º do mesmo código; e se o despacho violou ou não o disposto nos art.ºs 61º, n.º 3 e 83º, n.º 1 do EOA (Estatuto da Ordem dos Advogados – Lei n.º 15/2005, de 26-01) e art.º 36º, n.º 1 do Cód. Proc. Civil.
β) Apelação: se deve ou não ser mantido o regime de visitas da menor “B” ao pai, como foi decidido na sentença que foi anulada por decisão desta Relação. O que passa pela averiguação da natureza do direito de visita e da questão se há ou não abuso sexual das menores pelo pai.
Nos termos do art.º 710º, n.º 1 1.ª parte do Cód. Proc. Civil, subindo com a apelação os agravos que se encontravam retidos, aguardando essa subida, devem todos eles, em princípio, ser julgados pela ordem da sua interposição.
No caso do agravo interposto pelo apelado (parte vencedora) só se impõe o conhecimento do mesmo, se o agravo interessar à decisão da causa, e se a sentença não for confirmada (art.º 710º, n.º 1, 2.ª parte do Cód. Proc. Civil). Daí que só se conheça do agravo depois do julgamento da apelação: se a sentença é confirmada, não se aprecia o agravo; se a sentença é revogada ou alterada, conhece-se então do agravo.
Assim e pelo exposto, vai-se começar pelo conhecimento da apelação e só se conhecerá do agravo se se verificarem os pressupostos acima referidos para o conhecimento do mesmo.
Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir:
***
II. Fundamentos:
α) Apelação do pai das menores:
A) De facto:
Na 1.ª instância foram dados como provados os seguintes factos:
1. “C” e “D”a casaram um com o outro no dia 14-12-1996.
2. “A” nasceu no dia 12-11-1998 e foi registada como filha de “C” e “D”.
3. “B” nasceu no dia 28-05-2000 e foi registada como filha de “C” e “D”.
4. As menores viviam com os pais na Rua x, lote y, em (….).
5. Em Outubro do ano de 2001, a progenitora disse ao progenitor que a “A” lhe tinha dito que o pai lhe “mexia no pipi”. Em datas posteriores mas anteriores a 19-06-2002, a progenitora voltou a dizer ao progenitor que a “A” dizia que o pai lhe “mexia no pipi”.
6. No dia 19-06-2002, na sequência das conversas referidas no artigo anterior, o requerido saiu da casa de morada de família, tendo ido viver para casa de seus pais.
7. Desde então, as menores têm vivido, de forma ininterrupta, na companhia da mãe.
8. Após ter saído da casa de morada de família e até Dezembro de 2002, o progenitor ia buscar as menores e saía com as mesmas, indo, com frequência, visitar os avós paternos ou a tia paterna.
9. Por vezes, o progenitor ia buscar as menores a casa da mãe acompanhado dos pais ou da irmã. Neste período, as mesmas nunca pernoitaram em casa do pai (dos avós paternos), dado que a mãe não permitiu.
10. Em 27-01-2003, realizou-se conferência de pais, na qual foi fixado regime provisório que atribuiu a guarda e o exercício do poder paternal à mãe, não tendo sido atribuído ao pai direito de visita.
11. A partir de Janeiro de 2003, as menores deixaram de ter contacto com o pai.
12. Em 16-07-2003, em aditamento ao regime provisório fixado na conferência, foi decidido que:
«1. As menores poderão estar com a mãe nas férias de Verão durante 15 dias, em período a acordar entre os progenitores. Em caso de desacordo, a mãe passara a 2.ª quinzena de Agosto.
2. Fora daquele período, o pai poderá estar com as menores aos fins de semana, quinzenalmente, entre as 10 horas e as 15 horas de sábado e as 10 horas e as 15 horas de Domingo, indo pô-las e buscá-las a casa da mãe. Este regime terá início no fim de semana de 26 e 27 de Julho ou logo após a quinzena de férias das menores com a progenitora.
3. O pai poderá estar com as menores à quarta-feira, após as actividades escolares destas, indo buscá-­las ao estabelecimento que frequentem, e pô-las a casa da mãe até às 19h30 horas. No período de férias escolares das menores, e fora da quinzena estabelecida em 1), o pai poderá estar com as menores no referido dia entre as 17 horas e as 19h30 horas, indo buscá-las e pô-las a casa da mãe.
4. As menores passarão com a mãe a véspera de Natal, sendo que o dia 25 de Dezembro será passado com o pai, que irá buscar as menores as 11 horas e pô-las a casa da mãe.
5. As menores passarão com a mãe a véspera de Natal, sendo que o dia 25 de Dezembro será passado com o pai, que as irá buscar às 11 horas e pô-las a casa da mãe às 19 horas; no dia l de Janeiro e no Domingo de Páscoa, as menores passarão com o pai nos termos referidos para o dia 25 de Dezembro.
6. No dia de aniversário das menores, estas estarão com o pai nos termos da cláusula 3).
7. No dia de aniversário da mãe, as menores as menores passarão o dia com a mãe.
8. No dia de aniversário do pai, se recair em dia útil, as menores estarão com o pai após as actividades escolares destas; se recair em fim-de-semana, as menores estarão com o pai das 14 horas as 20 horas.
9. O pai pagará a título de pensão de alimentos a favor das menores 350,00 euros, 175,00 para cada uma delas.
10. Esta pensão será actualizada anualmente segundo os índices de inflação publicados pelo INE. A primeira actualização deverá ocorrer em Julho de 2004.
Faço notar que o convívio entre as menores e o pai não será acompanhado pela progenitora nem por pessoa da confiança desta, sob pena de se comprometer a espontaneidade e afectividade que devem existir nas relações filiais».
13. As menores não passaram com o pai 15 dias do mês de Agosto de 2003, porque a mãe não permitiu.
14. De fins de Julho a Dezembro de 2003, as menores retomaram o contacto com o pai, tendo efectuado visitas ao pai aos fins-de-semana e às quartas-feiras e, posteriormente, às quintas-feiras, nos horários referidos em 12.
Habitualmente, as menores iam, com o pai, para casa dos avós paternos.
Por vezes, o pai ia buscar as menores acompanhado dos pais ou da companheira.
15. No mês de Dezembro de 2003, a “A” começou a recusar-se a ir com o pai.
16. As menores não passaram com o pai o dia de Natal de 2003.
17. Desde Janeiro de 2004 e ate ao presente, as menores não voltaram a contactar com o pai.
18. Desde Janeiro de 2004 que as menores não contactam com os avós paternos nem com a tia paterna, por a mãe não ter viabilizado tais contactos.
19. Em 25-02-2004, foi suspenso o regime de visitas ao progenitor.
20. Por várias vezes, em datas não apuradas mas que se situam entre Outubro de 2001 e Dezembro de 2003 (excepcionando-se o período de Janeiro a fins de Julho de 2003, em que não houve visitas do pai as menores), o progenitor mexeu na vulva e no ânus da menor “A” e introduziu o seu pénis na boca da referida menor, aí ejaculando[7].
21. A “A” encontra-se em grande sofrimento psíquico.
22. As menores não querem reatar o convívio com o pai.
23. A progenitora é pouco madura.
24. A progenitora vive sozinha com as filhas, com as quais mantém forte relação afectiva.
É uma mãe interessada e muito presente no acompanhamento diário de todas as necessidades das filhas, impondo-lhes regras, disciplina e horários e acompanhando as suas actividades escolares e extra escolares.
25. As menores frequentam escola pública. Também frequentam aulas de música, que são gratuitas, e de ballet, que são pagas.
26. As menores estão bem integradas na escola e têm aproveitamento.
27. A progenitora é .. e, desde data não apurada, está a trabalhar por conta própria. Declarou ter auferido, no ano de 2006, um rendimento anual bruto, proveniente de trabalho dependente, no valor de 7.392,97 euros.
28. A progenitora recorre, com frequência, ao auxílio financeiro dos pais.
29. O progenitor é … (…).
Na sua declaração de IRS referente ao ano de 2006, o progenitor declarou ter auferido rendimentos de trabalho dependente no valor anual bruto de 85.438,13 euros.
30. O progenitor vive com uma companheira da qual tem dois filhos, mais novos do que a “A” e a “B”.
31. A progenitora apresentou queixa crime contra o progenitor, por suspeita de abuso sexual praticado contra as duas filhas menores, queixa essa que deu origem ao inquérito n.º (…). Foi proferido despacho de arquivamento do inquérito, foi requerida a abertura de instrução e foi proferido despacho de não pronúncia.
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B) De direito:
1. O direito de visita e a questão do abuso sexual:
O processo de alteração da regulação do poder paternal (art.ºs 182º da OTM[8]) é um processo tutelar cível [art.º 146º al. d) da OTM)] e é considerado um processo de jurisdição voluntária (art.º 150º da OTM). O que significa que o material de facto sobre o qual há-de assentar a decisão a proferir é não só o que os interessados ofereçam, mas também o que o juiz conseguir trazer ao processo pela sua própria iniciativa. E o mesmo sucede quanto aos meios de prova. O juiz tem livre iniciativa para investigar os factos indispensáveis à decisão, sem ter de cingir aos factos alegados pelas partes interessadas, podendo, pois, investigar livremente os factos, proceder a certas diligências que considere necessárias e rejeitar as que considere desnecessárias para uma resolução conscienciosa da questão (art.º 1409º, n.º 2 do Cód. Proc. Civil)[9]. Domina aqui, portanto, o princípio do inquisitório. O que mostra que a vontade decisiva e relevante é aqui a do juiz, e não a do requerente ou dos requeridos, no que respeita à matéria de facto relevante a utilizar pelo juiz para a solução do caso concreto, bem como às provas que demonstrem a verdade desses factos.  
À luz do exposto, vejamos.
Alega o recorrente que a alteração do regime de visitas foi feita com base na audição das menores.
Mas não tem inteiramente razão. A alteração do regime de visitas baseou-se em três razões: 1.º no facto de que a fixação de um regime de visitas apenas para uma das meninas seria constrangedor e causaria alguma estranheza ser apenas estabelecido o regime de visitas apenas quanto a uma delas; 2.º no facto de a menor “B” ter afirmado que não quer conviver com o pai por ter medo dele; 3.º e que deve ser respeitada a vontade da menor, porque sem essa adesão, o estabelecimento de um regime de reaproximação, mesmo coadjuvado por terceiros, acarretaria para a menor sentimentos de constrangimento e intranquilidade.
Donde e pelo exposto, a alteração do regime de visitas não se baseou inteiramente na audição das menores.
Ouvida já com oito anos (fls. 1449), a menor “B” disse que não vê o pai há cinco ou seis anos, que não tem saudades do pai, que não gostaria de o voltar a ver, e que não quer ver o pai, porque tem medo dele, e porque da última vez que o viu fez “chichi” pelas pernas abaixo, porque tem medo dele».
Estas declarações da menor “B” têm de ser avaliadas e integradas nos demais elementos existentes nos autos.
E é o que se fará infra.
Alega o recorrente que a menor “B” não conhece o pai __ uma vez que desde Janeiro de 2004, tinha ela três anos, nunca mais o viu e vive só com a mãe e a família materna __ e, por isso, não pode ter medo dele; e porque os peritos não detectaram a existência de qualquer medo.
O recorrente confunde conhecimento com convivência.
As menores, desde Janeiro de 2004, que não voltaram a ver o pai. Isto é, desde Janeiro de 2004, deixaram de conviver com o pai. Mas as menores, designadamente a “B”, conhecem o pai. À data de Janeiro de 2004, a menor “A” tinha 6 anos e 2 meses e a menor “B” tinha 3 anos e 8 meses [cfr. matéria de facto provada supra descrita em II. A pontos 2., 3. e 16.]. O recorrente sai da casa de morada de família em 19-06-2002, tinha então a “A” 3 anos e 7 meses, e a “B”, 2 anos e 1 mês. Desde então, as menores têm vivido, de forma ininterrupta, na companhia da mãe. Após ter saído da casa de morada de família e até Dezembro de 2002, o recorrente ia buscar as menores e saía com as mesmas, indo com frequência frequentar os avós paternos ou a tia paterna. Por vezes, o recorrente, ia buscar as menores a casa da mãe, acompanhado dos pais ou da irmã. Em 27-01-2003, realizou-se uma conferência de pais, na qual foi fixado um regime provisório, que atribuiu a guarda e o exercício do poder paternal à mãe, não tendo sido atribuído ao pai o direito de visita. A partir de Janeiro de 2003, as menores deixaram de ter contacto com o pai. Em 16-07-2003, em aditamento ao regime provisório, fixado na conferência, foi estabelecido um regime de visitas ao pai. As menores não passaram com o pai 15 dias do mês de Agosto de 2003, porque a mãe não permitiu. De fins de Julho a Dezembro de 2003, as menores retomaram o contacto com o pai, tendo efectuado visitas ao pai aos fins de semana e às quartas-feiras e, posteriormente, às quintas-feiras, nos horários estabelecidos. Habitualmente as menores iam com o pai para casa dos avós paternos. No mês de Dezembro de 2003, a “A”, então com 5 anos e 1 mês começou a recusar-se a ir com o pai. As memores não passaram o Natal de 2003, com o pai, conforme foi estipulado no regime de visitas. Desde janeiro de 2004, até ao presente, as menores não voltaram a contactar com o pai. Em 25-02-2004, foi suspenso o regime de visitas ao progenitor [cfr. matéria de facto provada supra descrita em II. A pontos 2., 3., 6. a 16. e 18.].
No Relatório de Observação Psicológica do Departamento de Pedopsiquiatria do Hospital de 15-12-2005 (fls. 925 a 927), no desenho de uma família imaginária a menor “B” pergunta à perita se pode não desenhar o pai. Representa três personagens, mãe e duas filhas de 7 e 2 anos, identificando-se com a mais pequena, «porque é ainda pequenina e ainda não sei ler!». Nessa família falta o pai, «porque eu não quero fazer! Eu não tenho!» (fls. 926). No Relatório Pedopsiquiátrico – Exame Médico Legal (Hospital  feito em 07-06-2006 à menor “B” pelos peritos Dr. “E” e Dr.ª “F” (fls. 921 a 924) refere-se que a criança disse a seguinte frase aos peritos, claramente reveladora das dificuldades da criança em relação à figura paterna: «posso não desenhar o pai?… porque eu não quero fazer e eu não tenho …» (fls. 923).  À data tinha a menor 6 anos e dias.    
Destes factos, vê-se que o recorrente conviveu com as filhas desde o nascimento destas até Janeiro de 2003, data em que a A” tinha já 5 anos e 2 meses, e a “B” 2 anos e 7 meses. Durante o ano de 2003, embora com algumas interrupções, as menores tiveram também contacto com pai. Só a partir de Janeiro de 2004 até ao presente, é que as menores deixaram de ter contactos com pai, portanto, tinha a menor “A” 6 anos e 2 meses e a menor “B” tinha 3 anos e 8 meses. Aos 6 anos e dias a “B” não quer desenhar o pai.
Na literatura sobre a psicologia infantil, fala-se constantemente da figura da mãe, mas não da relação do pai com a criança. Mas a relação deste com a criança é também fundamental. Lê-se, frequentemente, nesta literatura, que a criança começa a distinguir a figura da mãe desde os seis meses de idade, e que o vínculo da criança com a mãe e com as pessoas que de mais perto lidam com ela se processam paralelamente ao desenvolvimento intelectual da criança[10]. O pai tem um papel tão importante quanto o da mãe, uma vez que contribui para no necessário equilíbrio psíquico da mãe e, consequentemente, para a harmonia psíquica da família. Do ponto de vista do funcionamento mental, o pai representa para a criança «o princípio da realidade de Freud», é através dele que se estabelece a relação diádica mãe-bebé, e que esta se organiza e evolui de modo positivo[11]. O pai é, desde o início, o duplo materno, na representação imagoica. O pai é reconhecido e diferenciado num segundo tempo, que está implícito no primeiro. A função separadora do pai, requisitando a mãe como seu complemento sexual, dá-lhe o estatuto de terceiro ou de objecto interno para a mãe. O pai é progressivamente reconhecido e diferenciado pelas funções específicas de «pai objecto de protecção» e, tal como a mãe, o pai é objecto de amor e de idealização e objecto desconhecido[12]. Segundo algumas teorias psicanalíticas, o complexo de Édipo[13], ou o complexo de Electra, no caso das raparigas, se se preferir[14], que desempenha um papel fundamental na estruturação da personalidade[15], leva as meninas, quando se dão conta da diferença de sexos, a uma ligação emocional mais intensa com o pai, desejando possuí-lo em exclusivo, ao mesmo tempo que lhe provoca sentimentos hostis (ou mesmo inconscientemente desejos de morte) em relação à mãe. Este complexo eclode na segunda infância (período sexual fálico)[16] e, após o declínio deste, segue-se o período de latência, que dura até à adolescência[17].
Atento o exposto, e os factos supra referidos, vê-se que as menores conviveram com o pai desde que nasceram até Janeiro de 2003, data em que já tinham 5 anos e 2 meses e 2 anos e 7 meses, e depois, durante o ano de 2003, com algumas interrupções, continuaram a conviver com o pai e só a partir de Janeiro de 2004 até ao presente, é que deixaram de conviver com o pai, ou seja, quando já tinham 6 anos e 2 meses e 3 anos e 8 meses. Na fase de desenvolvimento em que se encontravam quando deixaram de conviver com o pai, que era o normal para a sua idade, segundo os relatórios periciais a que foram sujeitas, conforme melhor se verá infra, já as menores tinham entrado na fase edipiana, e a menor “B” estaria mesmo na fase de declínio do conflito edipiano[18].
Donde, e por todo o exposto, as menores conhecem o pai.
É insustentável a afirmação do recorrente de que a menor “B” não conhece o pai. Ambas as menores conhecem o pai, por tudo o que se deixou exposto.
No entanto, sempre se diga, que a afirmação implícita do recorrente de que uma «pessoa não pode ter medo de uma coisa ou de uma pessoa que desconhece» __ e destaca que o Tribunal a quo não teve em conta este pequeno pormenor __ não é uma proposição universalmente válida. Pode-se ter medo do que não se conhece, se o estado afectivo violento e passageiro que é o medo, for o resultado de uma criação no espírito de conteúdos psíquicos que não tenham qualquer correspondência com conteúdos reais previamente percebidos. Não se pode ter medo do que não se conhece se o medo resultar de uma reprodução no espírito, com maior ou menor fidelidade, de objectos com conteúdos reais percebidos anteriormente. E tudo isto pode ser muito problemático, já que entra aqui em cena a origem, valor e natureza do conhecimento[19]. Diga-se, ainda, muito sucintamente, que o conhecimento dá lugar a um esforço motor determinado que é acompanhado de um estado afectivo (lei do movimento específico), mas os fenómenos afectivos não se confundem com os intelectuais, visto que aqueles são subjectivos e estes são mais ou menos objectivos, aqueles enfraquecem com a repetição, e estes tornam-se mais nítidos e precisos, aqueles persistem, mesmo que se verifique que não têm fundamento, estes têm mais mobilidade. Tudo isto, porque o conhecimento é uma representação na consciência do sujeito que conhece do objecto conhecido, muito embora seja altamente discutível qual a natureza dessa representação (idealismo versus realismo) e o medo é uma emoção básica e saudável, um sentimento humano, que coloca o nosso organismo de sobre-alerta e o prepara para fugir e/ou defender-se perante uma percepção de perigo. Portanto, como fenómeno da vida afectiva, distingue-se dos da vida cognitiva, pois que sentir é uma coisa e outra é conhecer, como dizia Thomas Reide[20].
Alega o recorrente que não foi detectado qualquer medo em relação à menor “B”, que os peritos não o disseram.
Ouvida em 15-07-2008 (fls. 1449), a menor “B” disse que não quer ver o pai porque tem medo dele. Segundo o Relatório Pedopsiquiátrico de 01-03-2004 feito pela perita Dr.ª “G” (fls. 575 e segs.) refere que a menor “B” evidencia alguma ansiedade centrada na figura paterna, e que parece, contudo, ter sido menos alvo do abuso de que a irmã “A”. Mais diz que parecem existir actualmente indícios da ocorrência de abuso sexual (fls. 578-579).
A ansiedade da “B” enquadra-se neste contexto.
A ansiedade é um sentimento misto de receio e de apreensão ou inquietação sobre o futuro, é um estado de alerta, um estado afectivo desagradável, exprime a expectativa perante um perigo que se apresenta impreciso e indefinido e perante o qual o sujeito se sente indefeso. É uma forma atenuada da angústia; distingue-se desta pela ausência de modificações fisiológicas. Tal como a angústia, a tensão por ela criada pode ser geradora de medo. A ansiedade encontra-se em todos os graus, desde um receio leve, vivenciado como estranho e incompreensível, sem objecto, até a um pânico sem conteúdo definido que pode chegar a induzir uma perturbação de consciência[21].
Donde e por todo o exposto, a ansiedade centrada na figura paterna, e medo que a “B” diz sentir pelo pai, tem justificado fundamento.
Os medos infantis[22] podem ter causas variadas[23], podem ser racionais ou irracionais, podem até ser normais e fruto do próprio desenvolvimento da criança, de etapas específicas do seu desenvolvimento, e podem depender de factores familiares, culturais e sociais.
Por tudo isto, tanto as causas do medo da menor “B”, como do medo da menor “A” (cr. Exame Pericial Pedopsiquiátrico de 08-01-2004 feito pela perita Dr.ª “H” fls. 455 a 460, e esclarecimentos prestados por esta perita em 29-05-2007 fls. 1181) têm de ser averiguados no contexto mais vasto do alegado abuso sexual por parte pai.
O que se fará infra.
Alega o recorrente que o Tribunal a quo só se lembrou da vontade da menor e não se lembrou de que a menor “B” não apresenta qualquer perturbação emocional em conviver com o pai e demonstra disponibilidade psíquica para conviver com o pai, e que o Tribunal a quo não soube interpretar a diferença entre o que disse a menor de não querer estar com o pai e a disponibilidade psíquica para estar com ele.
O direito de visita consiste no direito das pessoas unidas entre si por relações familiares ou afectivos estabelecerem relações pessoais. No contexto do divórcio ou da separação judicial de pessoas e bens, o direito de visita significa o direito que o progenitor sem guarda dos filhos se relacionar e conviver com estes, de forma a substituir o convívio diário anteriormente existente antes da separação judicial de pessoas e bens ou do divórcio[24]. O exercício do direito de visita por parte do progenitor não guardião funciona como um meio de este manifestar a sua afectividade pela criança, de ambos se reconhecerem reciprocamente e partilharem os seus sentimentos de amizade, as suas emoções, ideias, medos e valores mais íntimos[25]. O direito de visita assume a natureza jurídica de um direito-dever, de um direito-função, ou seja, de um direito a ser exercido não no interesse exclusivo do seu titular mas, sobretudo, no interesse da criança[26]. Não é, pois, um direito subjectivo propriamente dito, não tem carácter absoluto, e está subordinado ao interesse do menor[27]. Pode, por isso, ser limitado ou excluído quando o seu exercício for incompatível com a saúde psíquica do menor[28]. Não é um direito do progenitor sem a guarda dos filhos que possa ser imposto ao menor sem ter em conta a vontade deste, sobretudo se é já é adolescente. «A decisão judicial que obriga um menor, que tem sentimentos de repulsa por um dos pais, a conviver com o mesmo considera o menor como um objecto que se transfere coercivamente das mãos de um dos pais para as de outro. O menor, como qualquer ser humano, merece respeito e a sua vontade e os seus sentimentos devem ser tidos em conta na regulação do poder paternal. Tem sido esta a tendência da evolução do direito dos menores consagrada na Convenção dos Direitos da Criança de 1989[29] e na Convenção do Conselho da Europa[30], que prevêem o direito de o menor ser ouvido em todas as decisões que lhe digam respeito»[31]. «A consideração da vontade do menor depende da sua idade, do seu discernimento, e do grau da sua maturidade. Tratando-se de um adolescente, a lei (art.º 10º, n.º 1 da LPCJP[32]) aponta a idade de 12 anos, como idade a partir da qual a opinião do jovem é relevante. É este também o critério seguido no Cód. Civil em matéria de adopção [art.º 1981º, n.º 1 al. a) e 1984º al. a)[33]]. Abaixo desta idade é importante analisar o grau de maturidade do menor e a liberdade da sua opção, ou seja, em que medida é que a sua vontade foi livremente determinada ou resultou de influências ou manipulações externas. No período intermédio entre os 6 e 11 anos, há crianças que têm maturidade suficiente para formar uma opinião autónoma e outras que não têm essa maturidade. Tratando-se de crianças muito pequenas, com menos de 6 anos, e que precisam da mediação da mãe para entrar em contacto com o pai, é relevante analisar, para decidir executar ou não o regime de visitas, o comportamento passado do progenitor sem guarda, ou seja, se trata de um progenitor que sempre se interessou pelo filho, ou de um progenitor que só exige o direito de visita por vingança ou de controlo em relação ao outro. E ainda se os motivos da mãe que coloca obstáculos ao exercício do direito de visita são caprichosos ou egoístas, ou se o seu comportamento se explica pelo facto de se tratar de uma família com uma história de violência doméstica contra a mulher e/ou contra os filhos»[34]. Não se pode ignorar que, por vezes, as denúncias de abusos sexuais podem ser o fruto de uma escalada no conflito em torno da guarda do filho, e que algumas acusações são forjadas para ganhar o conflito judicial, mas também não se pode ignorar, que as acusações falsas são largamente minoritárias, e que o alegado síndrome de alienação parental (SPA)[35], pode também ser uma manobra defesa usada do pai abusador para obter a guarda para si e ou o direito de visita.
Não pode, pois, aqui, o Tribunal ter ideias pré-concebidas, aplicar estereótipos ou regras da experiência[36].
A menor “A” tem actualmente 10 anos e 5 meses e a “B” 8 anos e 11 meses. 
Desde Janeiro de 2004, que as menores não voltaram a contactar com o pai.
A “A” não quer ver o pai e a “B” não tem saudades do pai e não gostaria de o voltar a ver (cfr. audições das menores em 15-07-2008 fls. 1449).
No Relatório Pedopsiquiátrico – Exame Médico Legal (Hospital ) feito em 07-06-2006 à menor “B” pelos peritos “E” e Dr.ª “F” (fls. 921 a 924) refere-se que os peritos não encontram sinais ou indícios de que a “B” esteja indisponível para se reencontrar com o pai, mas que esse reencontro terá de ter em conta também o desejo da própria criança (fls. 923).
Ouvida em 15-07-2008 (fls. 1449), a menor “B” disse que não quer ver o pai porque tem medo dele. Segundo o Relatório Pedopsiquiátrico de 01-03-2004 feito pela perita Dr.ª “G” (fls. 575 e segs.) refere que a menor “B” evidencia alguma ansiedade centrada na figura paterna, e que parece, contudo, ter sido menos alvo do abuso de que a irmã “A”. Mais diz que parecem existir actualmente indícios da ocorrência de abuso sexual (fls. 578-579).
Tendo em conta as perícias mais recentes, verifica-se o seguinte:
A perita Dr.ª “H”, pedopsiquiátra do Hospital , ouvida em 29-05-2007 (fls. 1181) disse que a “A” estava em muito sofrimento e que a “A” lhe disse que tem medo do pai. Segundo o Relatório Pedopsiquiátrico de 21-06-2006 do Departamento de Pedopsiquiatria do Hospital feito pelos peritos Dr.ª “I” (chefe de serviço de pedopsiquiatria) e Dr.ª “J” (assistente hospitalar graduada de pedopsiquiatria) (fls. 932 a 945), a “A” apresenta um desenvolvimento psicoafectivo normal para a sua idade e evidencia aspectos traumáticos resultantes da situação vivenciada na relação com o pai. Manifesta sinais evidentes de sofrimento psíquico e é uma menina extremamente assustada. Conforme Relatório Pedopsiquiátrico – Exame Médico Legal de 07-06-2006 do Departamento de Pedopsiquiatria do Hospital  feito pelos peritos Dr. “E” e Dr.ª “F” (fls. 921 a 924), a “B” apresenta uma idade aparente compatível com a real, apresenta bom nível de linguagem falada, humor eutímico, não se detectaram quaisquer alterações de pensamento e do discurso, e o seu nível de desenvolvimento psicoafectivo está de acordo com a sua idade.
Do que vem exposto, vê-se que as menores apresentam um grau de desenvolvimento psicoafectivo normal para a sua idade, encontrando-se especialmente a “A”, já no final da infância (2.ª infância[37], período de latência[38] ou quarto estádio[39]) e, às portas da pré-puberdade, muitas próximas da idade em que a lei atribui relevância à sua vontade. Trata-se de um período em que se processa um grande desenvolvimento das diversas funções psicológicas. É o período do ensino-cultura ou período cognitivo (ou idade escolar), em que o conhecimento sincrético cede o lugar ao conhecimento objectivo, devido ao crescimento e amadurecimento do cérebro e enriquecimento da percepção. A criança deixa a fase narcísica e entra no mundo do conhecimento. A sua curiosidade vira-a para o mundo exterior, onde prossegue a aprendizagem de pequeno prático, em que os processos de aquisição são muito activos, nomeadamente pela consideração do mundo exterior, o das regras e das diferenças, e em que a criança experimenta uma grande expansão sociocultural, desenvolve e amadurece as principais estruturas psíquicas. Durante este período de grande desenvolvimento, a criança adquire autonomia para estar só e com os outros, multiplica experiências e faz escolhas[40].
Por tudo isto, na ponderação das vontades das menores “A” e “B”, não pode deixar de se ter em conta todo este estado de desenvolvimento e amadurecimento já às portas da pré-puberdade. Para além disto, há que ter em conta a sua própria personalidade, uma vez que não há a criança, mas crianças concretas, tem de se averiguar se a recusa das visitas ao pai por parte das menores se são geradas por influência da mãe, ou se tratam de meros caprichos das menores, ou se existem barreiras de natureza psíquica por parte das menores a essas visitas.
Segundo o Relatório Clínico de 27-05-2003 da Dr.ª “G” (fls. 147 a 150) a mãe das menores é uma mulher frágil e insegura e com sinais indicadores de uma perturbação emocional e que a situação de ruptura familiar e a alegada suspeita de abuso sexual conduziu-a um estado de grande ansiedade e algum descontrole. E conclui o Relatório, dizendo que a mãe das menores apresenta sinais indicadores de grande instabilidade emocional, necessitando de acompanhamento psiquiátrico ou psicológico. No Relatório Social – Ministério da Justiça de 22-12-2003 (fls. 327), coordenado por “K”, diz-se que a mãe das menores é uma mãe muito atenta aos cuidados e necessidades das filhas havendo, eventualmente, alguma protecção excessiva, notados nos primeiros anos de vida sobretudo em relação à mais velha, a “A”. De acordo com o Relatório Pericial Pedopsiquiátrico de 01-03-2004 feito pela perita Dr.ª “G” fls. 575 e segs.), a mãe das menores sofreu uma desilusão face à ruptura da sua relação conjugal com o pai das menores, mas, em 01-03-2004, já apresentava um maior estabilidade emocional que lhe permitia separar a dita desilusão das dificuldades apresentadas pelas filhas, permitindo-lhe uma maior objectividade das situações vivenciadas e oferecendo-se como figura parental mais securizante. O Relatório de Avaliação Psicológica de 25-03-2004 feito à mãe das menores pela perita Dr.ª “L” (fls. 701 e segs.) refere que os dados obtidos não evidenciam sinais de psicopatologia, desadequação afectiva face aos conteúdos do discurso e à realidade actual vivenciada pela examinada. «Algumas das suas descrições relativas à vivência conjugal dão conta de atitudes pouco adequadas do marido em relação a si e em relação às filhas sem que a examinada adoptasse atitudes maduras que lhe permitissem a clarificação das situações e a sua resolução. Adoptou uma atitude pouco madura no papel maternal, tendo sido pouco perspicaz e pouco empática nas relações com as filhas sem conseguir protegê-las convenientemente dos riscos a que alude» (fls. 705). Em esclarecimentos a este Relatório, a Dr.ª “L” acrescenta em 30-08-2004 (fls. 725 e segs.) quanto à imaturidade afectiva. É preciso situar a questão no seu contexto. «Nenhuma das escalas apresenta valores elevados a níveis psicopatológicos assumindo um perfil de funcionamento relativamente adaptado com algumas características de imaturidade afectiva», mas sem que tal imaturidade afectiva seja um obstáculo ao exercício da função materna (fls. 726). De acordo com o Exame Psiquiátrico – Forense de 06-05-2004 feito pelo perito Dr. “M” (fls. 641 e segs.) não existem sinais de psicopatologia na mãe das menores. Refere este Exame, que a mãe apresenta uma «atitude “pouco madura” no seu papel maternal, o que coloca quando muito a hipótese de poder ser benéfico para a própria e para as filhas ter algum tipo de ajuda no plano psicológico».
Do exposto, vê-se a mãe das menores sofreu uma desilusão face à ruptura da sua relação conjugal com o pai das menores e isto e a suspeita de abuso sexual por parte do pai das suas filhas conduziu-a a um estado de grande ansiedade e algum descontrole, apresentando-se em 27-05-2003 como uma mulher insegura e com sinais indicadores de uma perturbação emocional. Em 01-03-2004 já apresentava uma maior estabilidade emocional, que lhe permitia separar a dita desilusão das dificuldades apresentadas pelas filhas, e lhe permitia uma maior objectividade das situações vivenciadas e lhe permitia oferecer-se como uma figura parental mais securizante. Tanto em 01-03-2004, como em 06-05-2004 não evidenciava sinais de psicopatologia ou desadequação afectiva. É uma mulher que em 2004, revelava algumas características de imaturidade afectiva, mas sem que isso constituísse qualquer obstáculo ao exercício da função materna. É uma mãe muito atenta aos cuidados e necessidades das filhas.
No Exame Pedopsiquiátrico feito à menor “A” nos Hospitais – Hospital , em 21-06-2006, pelas peritas Dr.ª “I” (Chefe de Serviço de Pedopsiquiatria) e Dr.ª “J” (Assistente Hospitalar Graduada de Psiquiatria) (fls. 932 a 945), o pai das menores formulou, entre outros, os seguintes quesitos:
Quesito 2º: «As menores estão a relatar acontecimentos que efectivamente viveram ou trata-se de uma situação de coacção moral e indução psicológica das menores?»
Quesito 5º: «As menores estão a ser vítimas de coacção moral e maus tratos psíquicos, apresentando sinais de serem vítimas de um processo de alienação parental por parte da família materna, nomeadamente da mãe e da avó?»
Quesito 8º: «Há ou não intenção da mãe e da avó materna de obstruir o vínculo entre o pai e as filhas, manipulando as crianças, provocando nestas a recusa do pai?»
Estes quesitos tiveram as seguintes respostas:
Quesito 2º: «Das entrevistas realizadas, não nos parece existir uma situação de coacção moral e indução psicológica da “A”» (fls. 943).
Quesito 5º: «Os factos descritos em relação à eventual situação de abuso sexual são concordantes nos relatos da mãe, avó materna e da “A”, sem no entanto apresentarem indícios de sugestionabilidade de terceiros face à criança» (fls. 943).
Quesito 8º: «Foi-nos transmitido pela mãe e pela avó o desejo de que a “A” não tenha contacto presencial com o pai com a intenção de a proteger de eventuais futuras situações de abuso. Não nos foi evidente existir nesta postura uma intencionalidade de obstruir o vínculo da criança com o pai» (fls. 943).
No Exame Pedopsiquiátrico feito à menor “B” nos Hospitais  – Hospital , em 07-06-2006, pelos peritos Dr. “E” e Dr.ª “F” (fls. 920 a 924), estes mesmos quesitos do pai tiveram as seguintes respostas:
Quesito 2º: «A “B” não relatou acontecimentos que possam estar ligados à prática de abusos sexuais» (fls. 922).
Quesito 8º: «Toda a situação decorrente do conflito instalado entre os pais e o consequente afastamento da “B” deste, prejudicou claramente a instalação dum vínculo normal entre a criança e o pai.
Atente-se na seguinte frase durante a realização do exame psicológico “posso não desenhar o pai?… porque eu não o quero fazer eu não tenho…”
Esta frase é claramente reveladora das dificuldades da criança relativamente à figura paterna.
Não podemos contudo afirmar que essas dificuldades resultam da intenção manifesta de impedir ou manipular a criança por parte da mãe» (fls. 923).
De tudo o que vem exposto, pode concluir-se que, apesar do que sofreu com a ruptura da sua relação conjugal com o pai das menores e com a suspeita de abuso sexual das menores por parte deste, e de alguma imaturidade afectiva que ainda revelava em 2004, a mãe das menores é uma mãe muito atenta aos cuidados e necessidades das filhas, esses sinais de alguma imaturidade afectiva não prejudicavam a sua função de maternal, e oferece às filhas uma imagem de segurança. Não há quaisquer indícios de coacção moral e indução psicológica da mãe sobre a “A”, não há indícios de que a mãe manipule as menores para obstruir o vínculo das menores com o pai, e, muito menos, se pode afirmar aqui de síndroma de alienação parental (SPA), se é que este tem base científica[41]. O que não é contrariado pelo facto de a mãe das menores ter exercido pressões sobre estas relativos aos alegados abusos sexuais praticados pelo pai sobre elas, com a constante e excessiva focalização na temática genital e sexual, como se houvesse uma procura incessante por parte da mãe de conformação dos alegado abusos [cfr. Relatório Clínico de 30-04-2003 da Pedopsiquiatra Dr.ª “G” – Hospital  (fls. 147 a 150) e Exame Pericial Pedopsiquiátrico de 08-01-2004 da Dr.ª “H” (fls. 455 a 460)], já que, atentas as datas das observações, se verifica que estas pressões da mãe foram anteriores e surgiram na sequência da perturbação emocional que sofreu com a ruptura da relação conjugal com o pai das menores e com a suspeita de abusos sexuais destes sobre as menores, e que posteriormente, segundo o Relatório de 01-03-2004 da Dr.ª “G” (fls. 575 a 579), apresentava uma maior estabilidade emocional (fls. 578).
Não se pode, pois, afirmar, como faz o recorrente, que as menores são manipuladas pela mãe com vista a obstruir o vínculo delas com o pai. Pelo que se tem de concluir que a vontade das menores em não quererem ver o pai foi livremente determinada.
Posto isto, é altura de abordar a questão central posta nestes autos do abuso sexual.
É sabido que, em casos de divórcios e separações problemáticas, muitas vezes os pais programam os filhos contra o outro progenitor forjando acusações ou insinuações de abusos sexuais, só para denegrir e humilhar o outro progenitor, mas também para conquistarem os filhos para si (pai manipulador), sabe-se que geralmente são as mulheres que fazem esse tipo de acusações, por verem os filhos como prolongamentos delas próprias, e por serem incapazes de os colocar acima da dor, da perda, e da raiva, e sabe-se também que há advogados que não tem pejo em jogar a arma do abuso sexual para instalar a dúvida num juiz, e levá-lo a  negar ou mesmo a restringir as visitas. E sabe-se também que, muitas vezes, a invocação de abuso sexual é um meio de defesa do progenitor abusador para obter a entrega da criança. E também não se desconhece que os pais, padrastos, avós e até outras pessoas que gozam da intimidade das famílias são os principais responsáveis pelos casos de agressões sexuais a menores ocorridas no seio das famílias[42]. Sabe-se também que muitas vezes o abusador se defende usando o argumento da imaginação fértil das crianças. Mas sabe-se igualmente que, muito embora as crianças tenham uma imaginação fértil, que as leva a fantasiar, raro é que o façam relativamente ao abuso sexual, porque uma criança não inventa o que desconhece[43], e as crianças não têm um conhecimento explícito do comportamento sexual dos adultos e, quando o descrevem, é um bom indício da veracidade dos factos.
A questão é delicada e não se pode ter ideias pré-concebidas.
Antes de mais é fundamental apurar a credibilidade dos depoimentos das menores e dos relatos da mãe e da avó materna, em confronto com as demais provas produzidas.
Vejamos o que nos diz a psicologia judiciária quanto ao testemunho das crianças.
Quanto à prova e à fiabilidade do testemunho da criança, há que ter em conta que a criança, ao separar-se do ventre materno, é um ser incompleto, cuja vida psíquica se reduz à expressão mais simples: a sensação que se traduz em reflexos. Em virtude da pobreza dos dados precedentemente percepcionados, podem dar-se os erros mais extraordinários. A criança facilmente se detém na superfície das coisas e dificilmente penetra no fundo delas. A percepção da criança é sincrética, isto é, uma visão de conjunto, em virtude da qual lhe escapam os detalhes, a percepção do adulto é analítica, isto é, examina cada uma parte de um todo. A criança, do ponto de vista sensorial e mecânico, percepciona as coisas, mas não sabe interpretá-las. As sensações, por ela apreendidas de uma forma extraordinariamente exactas, sofrem transformações resultantes de interpretações aumentadas por interpretações ilógicas. A imaginação de uma criança é tão grande, que transforma os objectos em seres conscientes e sensíveis, dando o sopro da vida às coisas inanimadas e inertes. A insuficiente capacidade de discernimento da criança entre as recordações e imagens dá à evocação um carácter de fantasia, na qual desaparecem ou se modificam percepções reais, tornando possível a narração de factos deformados e inexistentes. A criança é propensa a ficções. A atenção da criança caracteriza-se por uma extrema mobilidade. Qualquer sensação interna provoca uma adaptação nos órgãos que a recebem e o esquecimento absoluto, por um tempo relativo da tarefa começada. O que facilita a confusão entre percepção e imaginação. A memória da criança é frágil e falaz. «Nos primeiros anos as imagens fixam-se tão debilmente que podem desaparecer de um momento para o outro, o que explica porque as crianças repetem um, jogo ou escutam uma história vezes sem conto, deleitando-se sempre como se tratasse de um facto novo». O processo de fixação mnemónica só começa por altura dos três anos, ao passo que a aptidão para a memoração, entendida como capacidade de reevocação de uma experiência do próprio passado, se desenvolve cerca dos seis anos. A isto acrescente-se que as recordações são deformadas por elementos fantásticos que nelas se introduzem. A tudo isto acresce que as crianças são extremamente emotivas e egocêntricas. A sua experiência limitada, faz com que tudo se refira à sua própria pessoa, e fique sujeito a grandes amplificações, e aquilo que por ela não percepcionado é imaginado de um modo limitado e pueril. «A casa onde vive é enorme, mas a grande cidade, que não conhece, é imaginada pouco maior do que uma aldeia onde decorre a sua infância; o ribeiro que passa pelos campos parece-lhe um grande rio, mas o mar é considerado por ela um grande charco, pouco maior que o lago onde cria os seus peixinhos coloridos». A criança é altamente sugestionável, a sua vontade e convicções são fragilíssimas. Tem, no entanto, uma grande intuição. A criança descobre com facilidade a opinião de quem a interroga, e isso perturba tudo o que ela sabe[44].
De tudo o que vem exposto, se pode concluir que a criança seja uma testemunha perigosa. O seu depoimento é complexo e está sujeito a muitas condicionantes. Aquilo que ela afirma com sinceridade, espontaneidade e simplicidade e que parece credível, pode-o não ser.
Por tudo isto, assume especial relevância que os seus inquiridores sejam técnicos especializados, psicólogos ou pedopsiquiátras.
Não tem, pois, razão de ser a implícita censura feita pelo recorrente ao Tribunal a quo na seguinte passagem «(…) Dos peritos (que tanto cita e gosta) (…)». Na verdade, a prova pericial impõe-se sempre que estejam em causa a verificação de factos para reconhecimento dos quais se exigem conhecimentos especiais que os julgadores não possuam[45], em virtude da sua formação académica. O que não significa que o julgador seja obrigado a adoptá-los ou a adoptar uma posição intermédia perante várias perícias, visto que a perícia é sempre livremente apreciada com as restantes provas que forem produzidas  sobre os factos que dela são objecto (art.º 389º do Cód. Civil), podendo o julgador controlar as perícias e afastar-se mesmo delas se as reputar incorrectas, desde que o faça fundamente. Neste caso, exerce a insubstituível função de peritus peritorum
Portanto e pelo exposto a prova pericial tem a sua razão de ser e, no caso do presentes autos, muito se justifica porque os factos a averiguar exigem especiais conhecimentos no domínio da pedopsiquiatria e psicologia que os julgadores, em virtude da sua formação académica não possuem.
Portanto, a censura implícita do recorrente feita ao Tribunal a quo por apoiar a sua decisão nos peritos e de os seguir de perto, justifica-se perfeitamente.
As crianças vítimas de abuso sexuais podem apresentar sintomas variados, a nível físico, psicológico e comportamental. A nível físico pode haver corrimento vaginal, hemorragia vaginal, ardor ao urinar, corrimento através da uretra, encoprose, alterações dos hábitos intestinais, hematomas, feridas, sífilis, sida, gravidez, etc.. A nível psicológico, pode haver manifestações de ansiedade, depressão, vergonha, por vezes sentimentos de culpa, alterações do sono, pesadelos, insónias, medo de estar sozinho, falta de confiança num familiar ou de não querer estar sozinho com determinado adulto, medo de alguns lugares, sentimentos de insegurança etc.. A nível comportamental, pode verificar-se agressividade, destrutividade, dificuldades de aprendizagem, mudança súbita de comportamento na escola, incapacidade de concentração, isolamento dos amigos, familiares, ou das actividades usuais,  masturbação excessiva ou de modo exibicionista, atitudes ou conversas sobre temas sexuais desadequados ao seu nível etário.
Tendo em conta todo o contexto supra referido, importa agora descer aos factos.
No ponto 20. da matéria de facto provada supra descrito em II: A), o Tribunal a quo deu o abuso sexual por parte do pai quanto à menor “A”.
Face à matéria de facto provada supra descrita em II. A) pontos 5. a 19. verifica-se que a mãe das menores teve as primeiras suspeitas de abuso sexual da menor “A” pelo pai em Outubro de 2001. Em datas posteriores, mas anteriores a 19-06-2002, ouviu novos relatos da “A” de abuso sexual que o pai lhe infligia. Em 19-06-2002, o pai das menores sai de casa e as menores passam a viver com a mãe, de forma ininterrupta. Após ter saído de casa e até Dezembro de 2002, o pai ia buscar as menores a casa da mãe e saía com as mesmas, indo com frequência visitar os avós paternos ou a tia paterna. Por vezes ia buscar as menores acompanhado dos pais ou da irmã. Neste período, as mesmas nunca pernoitaram em casa do pai (dos avós paternos), dado que a mãe não o permitiu. A partir de Janeiro de 2003, as menores deixaram de ter contacto com o pai. Em 16-07-2003, foi fixado um regime de visitas do pai. O qual a mãe das menores não cumpriu. De fins de Julho a Dezembro de 2003, as menores retomaram o contacto com o pai, tendo este efectuado visitas aos fins-de-semana e às quartas-feiras e, posteriormente, às quintas-feiras, nos horários referidos no regime de visitas. Por vezes, o pai ia buscar as menores acompanhado dos pais ou da companheira. No mês de Dezembro de 2003, a “A” começou a recusar-se a ir com o pai. As menores não passaram o dia de Natal com o pai, conforme estipulado no regime de visitas. Desde Janeiro de 2004 e até ao presente as menores não voltaram a ter contactos com o pai.
Perante estes factos, vejamos as provas periciais.
Foram feitos exames de sexologia forense no Instituto Nacional de Medicina Legal  em 30-12-2002, tendo então a A” 4 anos e a “B” 2 anos e 7 meses de idade, e concluiu que as menores se encontravam em estado de virgindade anatómica e não foram encontrados vestígios de lesões traumáticas recentes, nem sinais de lesões infecciosas, quer a nível genital, quer a nível extra-genital, que possam ser sugestivas de qualquer tipo de abuso sexual.
O perito médico que as examinou em 30-12-2003 era do sexo masculino.
As menores mostraram-se colaborantes quer durante a entrevista, quer durante o exame objectivo (vd. fotocópia do despacho de arquivamento do inquérito – Proc. º contra o pai das menores – fls. 1011 a 1013 e 1034).
Foram feitos exames de biologia forense, tendo, para o efeito, sido entregues entre 28-01-2004 e 17-02-2006, na Polícia Judiciária, 9 cuecas da menor “A” para realização de exames periciais a efectuar no Departamento de Biologia do Laboratório de Polícia Científica. Neste exame não foram detectados vestígios de sangue ou de sémen nas peças assinaladas e apenas se detectaram vestígios biológicos de indivíduo do sexo feminino em algumas delas (fls. 1013-1014).
Foram feitos exames de pedopsiquiatria e de psicologia às menores.
O Relatório Clínico de 30-04-2003, da Pedopsiquiatra Dr.ª “G” – Hospital (fls. 147 a 150) – refere que, entre Julho de 2002 e Janeiro de 2003, foi observada a “A” e a família, e que a menor foi observada com maior profundidade pela Dr.ª “N” __ cujo relatório desta anexa (fls. 146 e 148).
Neste Relatório, lê-se: «Parece-nos nesta altura haver uma excessiva focalização na temática genital e sexual, como se houvesse uma procura incessante por parte da mãe de confirmação do alegado abuso sexual, o que reflecte um estado de grande ansiedade e instabilidade emocional. (…) A mãe “C” transmitiu-nos a impressão de uma mulher frágil, insegura e com sinais indiciadores da existência de uma perturbação emocional. A situação de ruptura familiar e da alegada suspeita de abuso sexual das menores terá conduzido a um estado de grande ansiedade e algum descontrole. (…) O pai, “D”, pareceu-nos um homem mais calmo, mantendo uma atitude colaborante e adequada nas consultas e disponibilizando-se para comparecer sempre que necessário. Confrontado com as acusações de que era alvo por parte da mulher, negou sempre ter abusado sexualmente das crianças ou de “lhes ter tocado de forma abusiva”. (…) Atravessando um período de crise evidencia igualmente alguma desilusão face à ruptura familiar, sendo contudo mais contido nas acusações que faz (fls. 149).
Relativamente à observação da criança diz: «Da discussão em equipa deste caso há a salientar o facto das crianças não apresentarem na altura sinais da existência de psicopatologia ou indiciadores de abuso sexual, estando no entanto em risco, no seu processo de desenvolvimento. A constante focalização no tema do abuso sexual pode criar condições para o aparecimento de dificuldades na expressão dos afectos e no contacto corporal saudável entre pais e filhos, conduzindo a atitudes de retraimento e inibição, quer a uma erotização das relações afectivas (fls. 150).
E conclui que «embora não possamos afirmar com certeza a existência de abuso sexual na menor (ou a sua ausência) não parece haver indícios conclusivos da sua ocorrência».
E o relatório em anexo da Dr.ª “N”, informa, entre outras coisas, que a menor “A” foi por ela observada em quatro espaços de consulta (25/7/02; 8/8/02; 22/10/02; 19/11/02) e que «não revela quaisquer sinais de conflito ou impulsos agressivos na sua forma de estar. Não se observam no seu comportamento, discurso ou forma de brincar quaisquer sinais ou sintomas que vão ao encontro da suspeita materna por parte do pai» (fls. 151).
O Relatório de Exame Pericial Pedopsiquiátrico – Hospital  __ foi feito em 01-03-2004 à menor “B” pela perita Dr.ª “G”, tendo a menor na altura 3 anos e 9 meses (fls. 575 a 579). O exame foi feito com base nas consultas de 09-09-2003 (1.ª observação), 06-01-2004 (2.ª observação), e 19-02-2004 (3.ª observação), e numa entrevista com a mãe.
Neste Relatório, lê-se: «A “B” é uma criança com idade aparente semelhante à real, expressiva e alegre, mantendo ao longo da observação um comportamento calmo. Estabelece contacto um fácil, revelando interesse e curiosidade pela adulto e estabelecendo relação com o observador. Comunica e fazendo-se compreender, apresenta um discurso espontâneo, com verbalização adequada face ao esperado para a idade. (…) Interessa-se pelos brinquedos, explorando e esboçando alguma simbolização. Quando introduzida a figura paterna e as coisas que fazem quando se encontram, a “B” evidencia sinais de ansiedade diz que “não quer falar disso”, desinteressa-se pelos brinquedos e manifesta o desejo de se reunir à mãe. Em suma, trata-se uma criança harmoniosa, com um desenvolvimento adequado face ao esperado para a idade e sem sinais de psicopatologia. Evidencia, contudo, alguma ansiedade centrada na figura paterna. (…) A criança mais velha, “A”, que me foi dado rever aquando da observação da irmã “B”, parece ser agora uma criança menos inibida e mais afirmativa, exteriorizando mais os seus sentimentos. Ambas as crianças têm agora um pouco mais idade e maior domínio da linguagem, têm maior capacidade de relatar vivências e acontecimentos, havendo referência a que terão mencionado a ocorrência do abuso a pessoas fora do círculo familiar.
Parecem assim existir actualmente maiores indícios da ocorrência de abuso sexual.
E conclui:
Em suma, a menor “B” apresenta-se como uma criança harmoniosa, com desenvolvimento psicomotor e emocional adequado ao esperado para a idade, sem sinais de psicopatologia, evidenciando, contudo, alguma ansiedade centrada na figura paterna
Com base na informação disponível, parecem existir actualmente maiores indícios da ocorrência de abuso sexual das menores “A” e “B”. A menor “B” parece, contudo, ter sido menos alvo do que a irmã “A”, sendo assim aparentemente mais preservada das repercussões psicológicas e emocionais daí decorrentes».
No Exame Pericial Pedopsiquiátrico de 08-01-2004 feito pela perita Dr.ª “H” fls. 455 a 460 feito à menor “A”, então com 4 anos à data da observação, em consultas de 22/08/2003, 18-09-2003, 02-10-2003, 30-10-2003 e 21-11-2003, diz o seguinte:
«Na 1.ª consulta (22-08-2003), a menor separa-se da mãe e permanece tranquila na consulta. Explora o material lúdico e nomeia os brinquedos. Dispõe-os em cima da mesa, que fica toda preenchida. Responde às questões colocadas que se relacionam com o infantário. Ao abordar a situação familiar, pergunto-lhe com quem vive e a menor responde que é com a mãe e com a irmã, “então o pai não vive com a mãe da “A””, digo, ao que a menor responde: “não porque mexe no meu pipi”, sem evidenciar ansiedade. Nesta altura, olha-me intensamente, como se me observasse para perceber qual seria a minha reacção, permanecendo eu silenciosa, a menor nota que não tem espaço para brincar com o comboio de madeira que tem um fio na parte dianteira e, numa bola de plasticina, enterra o fio do comboio, fazendo a sua impressão na plasticina. Não reage à reunião com a mãe e permanece silenciosa, negando-se a despedir-se de mim e parecendo zangada pela conclusão da consulta». E conclui: «A menor é uma menina harmoniosa, que se encontra vígil, orientada no tempo, no espaço e em relação a si própria. Desenvolvimento estatoponderal adequado à sua idade. (…). Inteligência e desenvolvimento psicomotor adequado à faixa etária. Mímica expressiva e olhar directo só na primeira consulta, que se altera nas seguintes, surgindo uma pobreza de mímica facial e um olhar com evitamento ou com expressão receosa. O sorriso, inicialmente presente e vivo, altera-se para um sorriso tímido. (…) A relação com o perito modifica-se de uma relação confiante para uma desconfiança, que também muda durante o período da consulta, desejando, por vezes, prolongar o tempo da consulta. Na sala de espera, é uma criança que brinca adequadamente à sua idade, expansiva, o que se altera quando a vou buscar para a consulta, onde reage com ansiedade e resistindo à separação da mãe. Na última consulta efectuada (21-11-2003) apresenta uma postura física tensa, uma mímica facial sem mobilidade, mantendo um sorriso tímido, e uma expressão de olhar receosa. Procuro tranquilizá-la, mas perante a sua atitude pergunto-lhe se tem medo de mim, o que nega com um movimento de cabeça; o mesmo que faz quando lhe pergunto se tem medo da mãe; quando lhe pergunto se tem medo do pai, inicia o mesmo movimento de cabeça mas logo o altera para um movimento afirmativo. Pergunto-lhe porque é que tem medo do pai, diz: “O pai mexeu no meu pipi”. Tento diminuir a angústia associada a esta afirmação e menciono os laços afectivos positivos que a “A” pode ter com a mãe e com o pai ao que a menor diz: “Não gosto do pai”.
E o Relatório diz ainda:
A menor é uma menina harmoniosa, que se encontra vígil, orientada no tempo, no espaço e em relação a si própria. Desenvolvimento estatoponderal adequado à idade. (…) Inteligência e desenvolvimento psicomotor adequados à faixa etária.  Mímica expressiva e olhar directo na 1.ª consulta que se altera nas seguintes, surgindo uma pobreza mímica facial e um olhar ou com evitamento ou com expressão receosa. O sorriso inicialmente presente e vivo, altera-se para um sorriso tímido. (…).
E o Relatório conclui: «A menor e a situação observada contêm elementos que conduziram a que a menor apresente uma atitude muito defensiva na consulta, onde está pressionada pela mãe e pela avó materna a falar do que seriam os relatos feitos por ela à mãe e à avó materna relativos às acções do pai, mas por outro lado, nega-se ou parece ter medo de falar, sobre qualquer assunto, mesmo lúdico, a partir da 2.ª consulta. A imagem que apresenta do pai é da existência de um pai bom (que cuida e brinca, com quem os filhos têm prazer de estar) e de um pai mau (que lhe mexe no pipi, de quem tem medo e diz não gostar). Com a mãe existe também uma boa mãe (que cuida e com quem se sente protegida quando vem à consulta) e a mãe insuficientemente boa (nem sempre suficientemente interessante para desejar reunir-se a ela no fim da consulta e que, no contexto lúdico, dorme enquanto o pai brinca com os filhos). A menor apresenta uma sintomatologia que pode corresponder uma perturbação de adaptação com predomínio de ansiedade mas que terá o risco de se agravar se a situação se mantiver».
Dada a situação observada, o Serviço irá propor a continuação das consultas com a menor».
Segundo o Relatório Pedopsiquiátrico de 01-03-2004 feito pela perita Dr.ª “G” – Hospital  (fls. 575 a 579) à menor “B”, então com 3 anos e 9 meses, sendo o exame feito com base nas consultas de 09-09-2003 (1.ª observação), 06-01-2004 (2.ª observação), e 19-02-2004 (3.ª observação), e numa entrevista com a mãe, concluiu que a “B” apresenta-se como uma criança harmoniosa, com um desenvolvimento psicomotor e emocional adequado face ao esperado para a idade, sem sinais de psicopatologia, evidenciando, contudo, alguma ansiedade centrada na figura paterna.
No Relatório Pedopsiquiátrico – Exame Médico Legal - Hospital  - feito em 07-06-2006 à menor “B” pelos peritos Dr. “E” e Dr.ª “F”, com base em quatro consultas de pedopsiquiatria e entrevistas com a mãe e com o pai em dias diferentes, e com base na observação da “B” por uma psicóloga que, em duas sessões, lhe realizou provas psicológicas standartizadas  (fls. 921 a 924) refere-se que os peritos não encontram sinais ou indícios de que a “B” esteja indisponível para se reencontrar com o pai, mas que esse reencontro terá de ter em conta também o desejo da própria criança (fls. 923).
Neste exame, respondeu-se a quesitos, tendo o 1.º e o 2.º tido as seguintes respostas:
No quesito 1º perguntava-se: «Há sinais indiciadores de uma situação de abuso sexual da “B” pelo requerido?»
Respondeu-se: Quesito 1º: «Não há sinais indiciadores de abuso sexual da “B”» (fls. 922).
No quesito 2º, onde se questionava: «A “B” relata acontecimentos que efectivamente viveu ou trata-se de uma situação de coacção moral e indução psicológica da menor?»
Respondeu-se: Quesito 2º: «A “B” não relatou acontecimentos que possam estar ligados à prática de abusos sexuais» (fls. 922).
O Relatório Pedopsiquiátrico de 21-06-2006 do Departamento de Pedopsiquiatria do Hospital feito a menor “A” pelos peritos Dr.ª “I” (chefe de serviço de pedopsiquiatria) e Dr.ª “J” (assistente hospitalar graduada de pedopsiquiatria) (fls. 932 a 945), refere que a menor foi observada por dois peritos em Pedopsiquiatria, em consulta de observação livre, nos seguintes moldes:
1.ª Observação em Pedopsiquiatria:
31/03/05
__ Entrevista individual com a mãe (11h00-12:30h)
__ Entrevista da criança na presença da mãe (12:30h-12:40h)
2.ª Observação em Pedopsiquiatria:
15/04/05
__ Entrevista individual da criança (11:15h-12:15h)
3.ª Observação em Pedopsiquiatria:
23/05/05
__ Entrevista individual com o pai (11:15h-12:15h)
4.ª Observação em Pedopsiquiatria:
30/05/05
__ Entrevista individual com a avó materna (12:15h-12:45h)
5.ª Observação em Pedopsiquiatria:
07/10/05
__Entrevista individual da criança (9:20h-10:20h)
6.ª Observação em Pedopsiquiatria:
12/04/06
__ Entrevista individual da criança (11:15h-11:50h)
__ Entrevista individual com a mãe (11:50h-12:30h)
Entrevistas de Avaliação psicológica da criança (resposta ao item v):
05/07/05
11/07/05
14/07/05
Da Avaliação Psicológica fizeram parte (resposta ao item vi):
1. Entrevista da criança (individual) e observação da relação da criança com os observadores.
2. Provas projectivas (desenho livre, desenho da família, desenho da família imaginária, C.A.T.-A e ROCHARCH.
3. Observação do jogo simbólico.
O Relatório deste Pedopsiquiátrico descreve assim a entrevista com a criança:
«d) Entrevista com a criança (resposta aos itens iv, vii, viii, ix, x, xi, xii e xiii):
A “A” é uma menina com um desenvolvimento estato-ponderal dentro dos para metros esperados para a idade; apresenta-se bem cuidada, com vestuário apropriado ao sexo e idade.
Estabelece com as observadoras um bom contacto, de início ligeiramente retraído (como seria de esperar para o seu grupo etário), tornando-se posteriormente mais próximo.
Aceita facilmente as nossas sugestões de jogo, apresentando uma boa compreensão do conteúdo dos mesmos e mostrando prazer nesta actividade lúdica. Sendo postos a sua disposição diversos brinquedos, escolhe o material do médico e 2 bonecos, um menino e uma menina. O jogo decorre da seguinte forma:
A “A” explora o material do médico de forma adequada, tendo-se colocado no papel do médico, que de forma atenta vai tratando o menino e a menina, referindo o  sofrimento do tratamento (“dor da pica”), mas sempre com um intuito reparador (as “picas” são para as meninas ficarem boas...). É de salientar, no entanto, uma certa inquietação quando verifica que os bonecos por ela escolhidos "... não têm cuecas...", o que a “A” tenta imediatamente reparar, dizendo “... temos que comprar ... onde está a loja?”.
Desinteressando-se deste material passa a manipular 2 puzzles que se encontravam sobre mesa (estes puzzles são muito simples, para crianças de 3-­4 anos e são constituídos por animais encaixados uns dentro dos outros). A sua atitude e de reflexão, começando por desencaixar as peças, constatando, primeiro, o vazio deixado por elas e depois preocupando-se com o seu preenchimento: “... agora vão ver um elefante, quase todo vazio, agora esta cheio...”.
Em conclusão, o jogo simbólico é adequado à idade, logo, a problemática do seu desenvolvimento, não manifestando sintomas de confabulação (observação de 15/04/05).
Também acedeu rapidamente, embora com algum embaraço, a desenhar a situação de abuso do pai para com ela, após ter descrito, a nosso pedido, esta situação (vide em anexo fotocópias do desenho). Descrição do desenho:
Diz que e ela e o pai vão dentro do carro, não vai mais ninguém; “... chegamos a um sítio onde não havia nada e ele fazia-me as maldades ... na rua, perto do mar...”; diz que não sabia lá ir.
Desenha o pai e diz que o pai não se despia totalmente “...despia as calças e as cuecas só ...”, “... (...)”; desenhou a camisola dela (azul), diz que estava de cabeça para baixo; “ (…) ...”.
Depois iam para casa e ele dava-lhe beijos na boca (observação de 15/04/05).
A “A” relata ter sido sujeita a práticas sexuais infligidas pelo pai nos seguintes termos:
A propósito das idas as consultas de Pedopsiquiatria/Psicologia no HSFX, a “A” diz que vai lá “... para contar as maldades que o meu pai me fez ...” (observação de 15/04/05). Descreve-as depois em pormenor:
“... (…)...”.
Na observação de 12/04/06, a “A” descreve novamente, a pedido dos peritos, a situação de abuso sexual, tendo a sua descrição sido coerente e em tudo semelhante a acima descrita.
Sob o ponto de vista da socialização, a “A” apresenta-se de forma adequada. No que diz respeito aos pares parece haver uma boa integração, sobretudo na escola. Esta é vivida por ela como um espaço agradável, verbalizando prazer na aprendizagem. Mostrou também capacidade de se projectar no futuro com uma identidade coesa.
Durante as entrevistas tornou-se claro tratar-se de uma criança com um desenvolvimento psicoafectivo normal para a idade, sendo no entanto evidentes os aspectos traumáticos resultantes da situação vivenciada (e anteriormente descrita) na relação com o pai.
e) Avaliação Psicológica:
A avaliação psicológica foi pedida com o intuito de melhor compreender se poderia existir da parte da “A” algum grau de confabulação ou desorganização do funcionamento mental, afim de reforçar a credibilidade do relato da “A” face não só à situação de suposto abuso como às suas vivências nos diversos contextos relacionais.
Assim, temos a salientar como conclusão desta avaliação que (e transcrevemos ):
Na análise do desenho livre, verifica-se um nível gráfico de acordo com o seu nível etário. A estruturação e a organização do desenho não apresentam alterações. Apenas são de assinalar fragilidades na representação do esquema corporal, em particular no desenho das mãos.
Do ponto de vista projectivo sobressai, quer ao nível do desenho, quer ao nível da narrativa, o sentimento de distância em relação a figura materna e de procura simultânea de protecção. As crianças São representadas como imaturas e vivenciando sentimentos de desamparo. Destaca-se aqui uma representação do sol com características muito exuberantes, dominando o desenho, mas sendo paradoxalmente, excluído da narrativa, quer de uma forma espontânea quer quando questionada (sendo este elemento habitualmente usado pela criança como representação simbólica da figura paterna, admite-se como bastante plausível a alusão a uma intensa extensa excitação).
No desenho da Família Imaginária, o seu traço torna-se mais hesitante e inseguro. Representa-se como a figura mais frágil, insegura e com mais necessidade de protecção. Na representação da família é excluída a figura do pai e ao ser questionada relativamente à ausência de um pai, confirma, recusando qualquer explicação.
Assim, verifica-se não só a exclusão explícita da figura paterna como uma dificuldade acentuada por parte da criança na exteriorização dos seus sentimentos, nomeadamente os sentidos como menos favoráveis.
A “A” evidencia de uma forma muito relevante, em todas as sessões de observação, uma atitude receosa e muito perscrutadora, em particular em relação ao observador do sexo masculino, também presente.
Essa atitude de reserva relativamente ao masculino é patente na quase totalidade de toda a observação. Os aspectos masculinos são vividos com uma conotação marcadamente violenta e agressiva, tendendo a ser ora denegados, ora completamente excluídos.
Parece tratar-se de uma criança que manifesta sinais evidentes de sofrimento psíquico, que se não puder beneficiar de tratamento psicoterapêutico, acarretar-lhe-á problemas significativos no seu desenvolvimento futuro».
Neste exame, o pai das menores formulou, entre outros, os seguintes quesitos:
Quesito 1º: «Há sinais indiciadores de uma situação de abuso sexual da “A” e da “B” pelo requerido?»
Quesito 2º: «As menores estão a relatar acontecimentos que efectivamente viveram ou trata-se de uma situação de coacção moral e indução psicológica das menores?»
Quesito 8º: «Há ou não intenção da mãe e da avó materna de obstruir o vínculo entre o pai e as filhas, manipulando as crianças, provocando nestas a recusa do pai?»
Estes quesitos tiveram as seguintes respostas:
Quesito 1º: «Pelo descrito existem sinais indiciadores de abuso sexual por arte do pai» (fls. 943).
Quesito 2º: «Das entrevistas realizadas, não nos parece existir uma situação de coacção moral e indução psicológica da “A”» (fls. 943).
Quesito 8º: «Foi-nos transmitido pela mãe e pela avó o desejo de que a “A” não tenha contacto presencial com o pai com a intenção de a proteger de eventuais futuras situações de abuso. Não nos foi evidente existir nesta postura uma intencionalidade de obstruir o vínculo da criança com o pai» (fls. 943).
E a mãe, das menores formulou, entre outros, os seguintes quesitos:
Quesito 1º: «Nos seus comportamentos, reacções e atitudes as menores dão sinais de rejeição ou de menor aceitação da figura do pai?»
Quesito 2º: «Como reagem elas à introdução da figura do pai no diálogo ou discurso?»
Quesito 3º: «As menores demonstram disponibilidade para conviverem com o pai ou simplesmente se encontrarem e saírem com ele?»
Quesito 4º: «As menores dão notícia de terem sido abusadas sexualmente pelo pai?»
Quesito 5º: «Se sim, porque forma dão elas notícia (verbal, gestual, emocional), e com que conteúdos (em que actos concretos) se traduziu e desenvolveu o abuso?»
Estes quesitos tiveram as seguintes respostas:
Quesito 1º: «Sim» (fls. 944).
Quesitos 2º e 3º: «A “A” rejeita claramente o pai, alegando “…porque ele faz maldades…”» (fls. 944).
Quesitos 4º e 5º: «A “A” descreve com pormenor, de forma coerente e nas suas próprias palavras a situação de abuso sexual infligida pelo pai [vd. item 3d) Entrevista individual com a criança]» (fls. 944).
Neste Relatório, as peritas formularam as seguintes conclusões:
Os peritos estiveram particularmente atentos às técnicas da entrevista, nomeadamente:
__ Observaram a criança sozinha e em situação de privacidade. Iniciaram a entrevista com questões abertas e só progressivamente foram introduzindo questões fechadas. Procuraram não induzir respostas e não repetir as mesmas perguntas.
__ Realizaram um máximo de 3 entrevistas com a criança (atendendo ao risco de coercitividade).
__ Utilizaram brinquedos apropriados à idade da criança, sem recorrer ao uso de bonecos anatómicos (os quais não são considerados um “teste” para abuso). 
E o Relatório conclui:
Os peritos consideram que os relatos da “A” são credíveis, com base nos seguintes aspectos da observação pedopsiquiátrica:
1. Uma criança com idade compreendida entre os 3 e os 6 anos tem capacidade de codificação da informação, de retenção de acontecimentos e de recuperar memórias;
2. Existiu espontaneidade na forma como a criança revelou a informação;
3. Demonstrou um afecto adequado a revelação;
4. Fez descrições detalhadas, coerentes, de conteúdo consistente (embora com pequenas variações entre as repetições, como e esperado) e utilizou um vocabulário adequado a idade;
5. Admite que há pormenores que não consegue recordar, fazendo um relato progressivo ao longo das entrevistas (e não imediato), não sendo evidentes sinais de confabulação (como ir acrescentando novos dados/informações ao longo das entrevistas);
6. Surgem no relato detalhes de memórias especificas periféricas à situação de abuso (por exemplo, recorda sempre e espontaneamente que o sítio era perto do mar).
E em explicações prestadas em 10-07-2007, a Dr.ª “J” (assistente hospitalar graduada de pedopsiquiatria co-autora do exame) (fls. 1190) refere, entre outras coisas, «não foram encontrados indícios de confabulação, os relatos são feitos com espontaneidade, há descrições detalhadas, não foram descrições feitas de uma forma pré-formatada, há uma espontaneidade, revelou uma forma genuína, a forma como relatou era coerente com as várias entrevistas, sem parecer uma coisa decorada, ela falava espontaneamente, ela usava palavras diferentes entre as várias descrições, fazia pequenas variações, como é normal, o que no fundo é um reforço de credibilidade. Havia depois pormenores que ela não conseguia recordar, mas fez um relato progressivo ao longo das sessões, não foi inventando coisas novas, não foi acrescentando pormenores em cada uma das observações, e havia também o que nós chamamos de memórias específicas periféricas, como p. ex., relatos de pormenores do loca onde a situação acontecia, e tudo isto de acordo com o que vem em (?) e literatura internacional reforça a credibilidade do relato de uma criança desta idade. (…) Não nos parece que os relatos efectuados pela “A” durante as entrevistas efectuadas pelos pedopsiquiatras tenham sido induzidos pela gravação da videográfica __ a mãe fez uma gravação videográfica com os relatos da “A” relativo à eventual situação de abuso sexual. Sr.ªs peritas que fizeram este exame consideraram esta gravação um meio agressivo para a criança, por exigir dela a repetição da situação traumática de forma demasiado ostensiva e “pública” e que a gravação de uma cassete com o relato de uma eventual situação de abuso poderá ser considerado um método sugestivo e indutor. No entanto referem, nas respostas aos quesitos 6 e 7º do pai que, no presente caso, não nos parece que os relatos efectuados pela “A” durante as entrevistas pedopsiquiátricas, atendendo às suas características, tenham sido induzidos pela gravação videográfica (fls. 943) __, porque havia espontaneidade da criança. Nestas conclusões, não está só a opinião pessoal da perita, mas da colega que fez o Relatório comigo. Nós consultámos fontes. Uma das fontes que consultámos é a da Academia Americana de Psiquiatria da Infância e da Adolescência, que é uma associação reconhecida internacionalmente, que tem vários livros. Se se verificar os (?) de psiquiatria verificamos que nas conclusões do nosso Relatório muitas coisas que aqui estão tiveram a ver com estudos que nós fizemos mais alargados na literatura, obviamente, e que nós fazemos ao longo de toda a nossa vida. Portanto, isto não é uma opinião minha ou da Dr.ª M. Portanto, uma criança entre os 3 ou 6 anos de idade tem capacidade de retenção mnésica e de codificar a informação e de recordar posteriormente. Isto não sou eu que digo C. São autores internacionais. Uma criança faz uma descrição espontânea dos factos, com vocabulário adequado à sua idade, repito, uma descrição detalhada, que não é uma descrição pré-formatada, que há pequenas variações entre os relatos, que com insistente coerente e que se mantém ao longo do tempo são características de veracidade de um relato, dito não por mim, “J”, apenas pedopsiquiatra do Hospital , mas por outras pessoas que passam a vida a estudar isto, não é?. Portanto, quando nós escrevemos no Relatório este tipo de coisas, claro que nos estamos a basear a nossa opinião pessoal e nas empresas que foram já escritas por outros autores. As crianças são sugestionáveis. Os relatos desta menina não nos parecem, a nós peritas que fizemos este Relatório. Não há sugestão, porque há credibilidade nesta menina. Esta menina não se esquece, que tem um sofrimento, sabe (discurso dirigido à mandatária do pai das menores que lhe solicitava esclarecimentos sobre o Relatório), eu também sou pedopsiquiátra há alguns anos, tem um sofrimento evidentíssimo e conta as coisas de uma forma muito coerente, como nós aqui descrevemos, percebe?, que se mantém ao longo do relato dela e das várias observações. É fácil ludibriar nós os peritos uma criança desta idade, fazendo perguntas ao contrário, enganá-la, não estamos a falar de uma adolescente, estamos a falar de uma menina pequena, as perguntas são feitas de formas diferentes, percebe?, e portanto quando nós observamos com todo o cuidado durante várias entrevistas, temos o cuidado de não repetir as perguntas da mesma maneira, tentando nós perceber se há ou não veracidade nos relatos. Nós fizemos perguntas de várias formas, a criança responde com coerência, não encontramos sinais de ela estar a acrescentar informações diferentes, de se confundir, não é muito difícil baralhar uma criança de 6 anos quando ela está a mentir. Uma adolescente será diferente, mas de facto nós fizemos as perguntas ao longo das entrevistas com todo o cuidado do ponto de vista técnico e pareceu-nos que os relatos da menina eram verídicos como nós descrevemos aqui».
Posto isto, vejamos.
O facto de o exame de sexologia forense ter concluído que as menores se encontravam em estado de virgindade anatómica e não foram encontrados vestígios de lesões traumáticas recentes, nem sinais de lesões infecciosas, quer a nível genital, quer a nível extra-genital, que possam ser sugestivas de qualquer tipo de abuso sexual não exclui, nem confirma que não tenha havido abuso sexual por parte do pai das menores, porque os actos denunciados de que as menores terão sido vítimas __ p. ex., a introdução do pénis na boca da “A” e aí se ejacular, o meter-lhe o pénis na mão, e a masturbação, o mexer-lhe na vulva e no ânus __ não são actos de natureza invasiva do ponto de vista físico e, por outro lado, não foram encontrados vestígios de lesões traumáticas recentes ou não recentes, nem sinais de lesões infecciosas, quer a nível genital, quer extra-genital, que pudessem ser sugestivos de qualquer tipo de contacto sexual.
Conforme se disse supra, as crianças vítimas de abusos sexuais podem apresentar sintomas variados, quer a nível físico, quer a nível psicológico e comportamental. A nível psicológico e comportamental manifestar diversas perturbações, ansiedade, medo, agressividade, etc.
Este exame nada detectou a nível físico que pudesse indiciar qualquer contacto de natureza sexual. A nível psicológico e comportamental, também nada se verificou, uma vez que as menores foram observadas por um perito médico do sexo masculino, um estranho que conversou com elas, que lhes fez um exame ginecológico, exame que tem implicações sobejamente conhecidas, em termos de contactos directos com o corpo e com a intimidade privada, as menores não revelaram estranheza, desconforto, incómodo, e foram colaborantes com o perito. A serem molestadas sexualmente, e sendo este exame de sexologia forense feito muito próximo da ocorrência dos alegados abusos perpetrados pelo pai, era natural que tivessem um comportamento diferente com o perito médico[46]. A fazer fé nas descrições da mãe e da avó relativas ao mal-estar e agitação das menores decorrentes do abuso sexual, esta atitude das menores é insólita. Vejamos. A “A” dizia à mãe “que o pai lhe esfregava o pipi com muita força e que lhe fazia doer”, e que “lhe metia o dedo (indicador) no rabinho e que lhe fazia doer”, e que, depois de ter passado o dia 25-12-2002, com o pai e a tia paterna, em casa dos avós paternos, ao chegar a casa da mãe, a “B” não queria que a mãe lhe tocasse ao mudar-lhe a fralda. Tudo isto é incrível com o comportamento das menores perante um estranho, perante um perito médico do sexo masculino. Mas mais, o inverosímil não acaba aqui. Por um lado, a menor não poderia ver que dedo é que o pai lhe introduzia[47] e, por outro, tendo que a menor tinha 4 anos, não deixa de ser surpreendente que a menor soubesse também a denominação de cada um dos dedos da mão, de cada um dos quirodáctilos: polegar, indicador, médio, anelar e mínimo, dedinho ou mindinho. Mas ainda, depois de ter saído de casa, no dia 19-06-2002, por causa dos alegados abusos, o pai passou a ir buscar as menores e saía com as mesmas, indo, com frequência, visitar os avós paternos, e indo buscar as menores a casa da mãe destas, acompanhado dos pais ou da irmã. Tudo isto só prova as cautelas que o pai punha nas visitas das menores ao pai. Não obstante isto, o pai molesta a “B” no dia de Natal em casa dos pais, onde estavam os pais e a irmã ou, dia em que toda a família está junta e convive, ou então, ou então abusou das menores no caminho para casa da mãe das menores. Nesta hipótese, já sem aquelas cautelas. 
Os exames de biologia forense também não confirmam ou infirmam o alegado abuso sexual, uma vez que, segundo o alegado «as cuecas eram vestidas à “A”, depois desta ter sido lavada pelo pai, já em casa da avó paterna, e ao invés, as calças ou outra peça de roupa que lhe eram vestidas directamente sobre o corpo da menor, e como tal, com maior probabilidade de conterem vestígios biológicos não foram preservada»[48].
Vejamos agora os exames pedopsiquiátricos.
Aqui importa salientar que os exames que foram realizados mais próximos das datas da ocorrência dos alegados abusos são mais relevantes do que os realizados em datas mais distantes. Os exames “feitos a quente”, ou seja, quando as menores estariam ser molestadas, são mais fidedignos do que os “feitos a frio”, porque as menores, ainda não estavam a ser esmagadas com perguntas, actos de censura ou de incentivo[49], e assim sendo, mais facilmente contavam o que as molestava. As múltiplas entrevistas e exames a que foram sujeitas prejudicou a observação das menores, para além de lhes causar traumatismo e, por isso, até, acabou por ser para elas um factor desprotector[50]. Donde, portanto, o resultado da observação nos exames “feitos a frio”, por muitas cautelas que os peritos possam ter tido na sua realização, sai necessariamente afectado, e tem de ser lido com alguma reserva e no confronto com as demais provas produzidas.
Assim, e para o primeiro momento dos alegados abusos sexuais __ de Outubro de 2001 a Dezembro de 2002 __, há que privilegiar O Relatório Clínico de 30-04-2003, da Pedopsiquiatra Dr.ª “G” – Hospital  __ (fls. 147 a 150), tendo por objecto a menor “A”, e a Informação Clínica anexa a este Relatório da Dr.ª “N” também a respeito da menor “A” atentas as datas em que foram feitas as observações à menor.
Naquele Relatório, para além de se referir a excessiva focalização na temática genital e sexual, como se houvesse uma procura incessante por parte da mãe de confirmação do alegado abuso sexual __ o que, diz-se neste Relatório, reflecte um estado de grande ansiedade e instabilidade emocional, pode criar condições para o aparecimento de dificuldades na expressão dos afectos e no contacto corporal saudável entre pais e filhos, e conduzir a atitudes de retraimento e inibição, quer a uma erotização das relações afectivas __, refere também que as crianças não apresentavam, na altura, sinais da existência de psicopatologia ou indiciadores de abuso sexual. E conclui que «embora não possamos afirmar com certeza a existência de abuso sexual na menor (ou a sua ausência), não parece haver indícios conclusivos da sua ocorrência».
Na Informação Clínica anexa a este Relatório da Dr.ª “N” escreve-se: «não revela quaisquer sinais de conflito ou impulsos agressivos na sua forma de estar. Não se observam no seu comportamento, discurso ou forma de brincar quaisquer sinais ou sintomas que vão ao encontro da suspeita materna por parte do pai» (fls. 151).
Relativamente ao segundo momento dos alegados abusos sexuais __ de fins de Julho a Dezembro de 2003 __ há que privilegiar o Relatório Pedopsiquiátrico de 01-03-2004 feito pela perita Dr.ª “H” – Hospital (fls. 575 a 579) à menor “B” e o Exame Pericial Pedopsiquiátrico – Hospital de 08-01-2004, feito pela perita Dr.ª “H” à menor “A” (fls. 455 a 460), atentas as datas em que foram feitas as consultas às menores.
No primeiro Relatório diz-se que a “B” é uma criança com idade aparente semelhante à real, expressiva e alegre, de fácil contacto, com interesse e curiosidade pelo adulto, com discurso espontâneo, que é uma criança harmoniosa, com desenvolvimento psicomotor e emocional adequado para a idade, sem sinais de psicopatologia, evidenciando contudo alguma ansiedade centrada na figura paterna. Mais diz-se que parecem existir, actualmente, maiores indícios da ocorrência de abuso sexual.
No segundo Relatório, diz-se que a “A” referiu que o pai “lhe mexe no pipi” sem evidenciar ansiedade, e que na altura em que disse isto, olhou intensamente para a perita para tentar perceber qual seria a reacção do perito. Diz ainda que a “A” tem um desenvolvimento estatoponderal adequado à sua idade, bem como uma inteligência e desenvolvimento psicomotor adequado à sua faixa etária, e que apresenta uma sintomatologia que pode corresponder a uma perturbação de adaptação com predomínio de ansiedade.
Voltando ao primeiro momento dos alegados abusos sexuais sobre a “A”.
Muito embora as crianças vítimas de abusos sexuais possam apresentar sintomas variados a nível psicológico e comportamental, tais como agressividade, destrutividade, e a “A” não revela quaisquer sinais de conflito ou impulsos agressivos. Na “A” não há sinais ou sintomas da ocorrência de abuso sexual, a nível do seu comportamento, do seu discurso ou forma de brincar. E isto apesar da mãe ter exercido sobre a “A” uma excessiva e constante focalização na temática genital e sexual, como se a mãe, incessantemente, procurasse a confirmação do abuso sexual do pai sobre a menor. Mau grado tudo isto, a perita não quis ou não pode afirmar a certeza da existência ou ausência de abusos sexuais do pai sobre a menor. Mas não deixou de apontar a pressão e ansiedade provocadas na menor pela mãe e pela avó materna.
Passemos agora ao segundo momento.
A “A”, que teria sido a mais molestada sexualmente pelo pai, referiu-se a esses abusos (o pai “mexe no meu pipi”) sem manifestar qualquer ansiedade, ao mesmo tempo que procura perceber a reacção que provocou na perita com a revelação que fez e, como esta permaneceu em silêncio, voltou de novo a sua atenção para o brinquedo, não reage à reunião com a mãe e nega-se a despedir-se da perita. Isto é, a revelação feita pela “A” à perita não lhe provocou qualquer ansiedade e continuou a brincar, ao constar que a sua revelação não provocou qualquer reacção na perita. Muito embora as crianças vítimas de abusos sexuais possam apresentar manifestações de ansiedade, a “A” referiu-se aos alegados abusos sexuais (o pai “mexe no meu pipi”), sem revelar qualquer ansiedade. A perita, a Dr.ª “H”, diz que após a primeira consulta (22-08-2003) a “A” passa a ter uma atitude muito defensiva, onde está pressionada pela mãe e pela avó materna a falar do que seriam os relatos feitos por ela à mãe e à avó materna relativos às acções do pai, mas por outro lado, nega-se ou parece ter medo de falar, sobre qualquer assunto, mesmo lúdico, a partir da segunda consulta (18-09-2003). Esta perita, confirma assim as pressões por parte da mãe sobre a menor em relação aos alegados abusos sexuais do pai, com excessiva e constante focalização na temática genital e sexual. Segundo os relatos da mãe, tendo como fonte o que lhe contou a “A”, o pai tirava-lhe as calças e as cuecas, punha-a de cabeça para baixo e punha-lhe a (...) na boca, e que, numa das vezes em que o pai lhe colocou a (...) boca, ela vomitou dentro do carro e que o pai lhe disse: “tu és má, tu és má”, e que a “A” lhe referia também que o pai lhe esfregava o pipi com a (...) da direita para a esquerda e da esquerda para a direita, exemplificando com o dedo indicador de uma mão, esfregando a palma da outra mão. No fim, ficava “espuma de sabão no chão”. E que a “A” lhe disse que estes factos acontecem no banco de trás do carro, depois de o pai tirar as cadeirinhas de transporte de crianças e as colocar na bagageira do mesmo. No fim vestia-lhe as calças, ficando as cuecas no banco da frente, sentava-a ao colo dele, dizendo-lhe: “És muito linda e vais ser minha para sempre”. Depois levava-a para a casa da avó, onde lhe lavava o pipi na casa de banho, vestia-lhe as cuecas e calças[51].
É estranho. A “A” é avaliada por pedopsiquiátras e não refere nada disto. E estranho é também este relato. É impressionante o colorido e a precisão dos pormenores no relato da “A”:  “espuma de sabão”, os factos acontecem no banco detrás, o pai tira as cadeirinhas e coloca-as na bagageira, as cuecas ficam no banco da frente…
Não são invulgares relatos deste género em crianças. São frequentes nelas fenómenos paramnésicos, em virtude dos quais a criança, com uma lucidez impressionante e com uma grande precisão de pormenores e colorido recorda e narra acontecimentos que nunca se deram e que, na maior parte das vezes, são o resultado de um complexo de percepções, muitas vezes tidas em momentos diferentes, que se coordenam em unidade, criando a recordação complexa de um facto não verdadeiro. «A criança narra um facto que sabe não ser verdadeiro; na sua recordação fixa-se com precisão aquilo que contou, ao mesmo tempo que se vai diluindo a consciência da mentira, de maneira que só recorda de ter contado que esteve presente a um determinado acontecimento; assim se compreende que, com facilidade, o evoque como um facto realmente sucedido»[52].
Não perdendo isto de vista, vejamos mais.
De Julho a Dezembro de 2003, o pai ia buscar as menores aos fins-de-semana e às quartas-feiras e posteriormente, às quintas-feiras, nos horários referidos no regime provisório fixado na Conferência de 16-07-2003, indo, habitualmente, com as menores para casa dos avós paternos [Cfr. pontos 12. e 13. da matéria de facto provada supra descrita em II. A)]. A serem verídicos tais factos, isto implicava que o pai tinha de deixar a “B” em algum lado, habitualmente, em casa dos avós paternos, enquanto a “A” ficaria no carro, visto que a “A” dizia que ficava no carro. O pai voltava ao carro e saía com a “A” pela levar a cabo aos seus intentos, demorando-se, como é obvio, algum tempo. Então o pai entrava só com a “B” em casa dos avós paternos e ninguém dava pela falta da “A”?... Ou quem é que ficava com a “B” enquanto ele se ausentava com a “A”?...[53].
Relativamente à “B”, diz-se que a menor é uma criança expressiva e alegre, que estabelece um contacto fácil, revelando interesse e curiosidade pelo adulto e estabelece uma relação fácil com o observador, comunica e faz-se compreender, apresenta m discurso espontâneo, com verbalização adequada à sua idade e que evidencia sinais de ansiedade em relação à figura paterna, e __ diz à perita __ “não quer falar disso”. Diz-se ainda no Relatório de 01-03-2004 da Dr.ª “G” que ambas as crianças têm agora um pouco de mais idade e maior domínio da linguagem, têm maior capacidade de relatar vivências e acontecimentos, havendo referência a que terão mencionado a ocorrência do abuso a pessoas fora do círculo familiar e que parecem assim existir actualmente maiores indícios da ocorrência de abuso sexual. E conclui, com base na informação disponível, parecem existir actualmente maiores indícios de abuso sexual das Menores A” e “B”, parecendo, contudo, que a “B” terá sido menos alvo do que a “A”.
Os abusos agora já estendem para fora do círculo familiar?…
Mas há que dizer o seguinte:
Primeiro, a “B” se recusou a falar sobre o assunto. Segundo, o Relatório é desprovido de qualquer fundamentação fáctica que apoie tal conclusão. Terceiro esta fundamentação não foi removida com os esclarecimentos prestados pela perita nos esclarecimentos prestados em 29-05-2007 (fls. 1181), já que deles resulta que estes indícios resultam de dados que foram colhidos entre o primeiro exame e este, com base em informações dadas pela mãe das menores sobre a existência de situações de abuso e que os indícios eram maiores sobre a “A” do que sobre a “B”, porque existiam mais queixas de situações de abuso em relação à “A” do que à “B”.
Por todo o exposto, não se lhe pode atribuir qualquer valor.
No segundo relatório deste segundo momento, o da Dr.ª “H” tendo por objecto a menor “A”, a perita aponta uma sintomatologia que pode corresponder a uma perturbação de adaptação da menor com predomínio de ansiedade. A menor refere o pai “lhe mexe no pipi” mas não evidencia qualquer ansiedade. E a ansiedade pode ser uma das manifestações psicológicas de crianças abusadas sexualmente, como se referiu supra. No entanto e  apesar de tudo, a perita não pode ou não se quis comprometer com um juízo pericial acerca da veracidade dos relatos da “A”[54].   
O Relatório Pedopsiquiátrico – Exame Médico Legal (Hospital)  feito em 07-06-2006 à menor “B” pelos peritos Dr. “E” e Dr.ª “F” (fls. 921 a 924) refere que não há sinais indiciadores de abuso sexual da menor “B” (resposta ao quesito 1º) (fls. 922).
O Relatório Pedopsiquiátrico de 21-06-2006 do Departamento de Pedopsiquiatria do Hospital feito a menor “A” pelos peritos Dr.ª “I” (chefe de serviço de pedopsiquiatria) e Dr.ª “J” (assistente hospitalar graduada de pedopsiquiatria) (fls. 932 a 945) é de todos o mais feito a “frio” em relação aos alegados abusos sexuais, porque o mais distante em relação aos alegados abusos. Na verdade, desde Janeiro de 2004, que as menores deixaram de ter contactos com o pai [ponto 17. da matéria de facto provada em II. A)] e a 1.ª consulta em 31-03-2005, data em que a “A” tinha já 5 anos e 4 meses. Por esta razão, este Relatório «encontra-se ferido pelo decurso do tempo e pelas sucessivas e múltiplas entrevistas, observações, exames e relatos efectuados pela menor “A” a terceiros», como acertadamente diz o Ministério Público no despacho de arquivamento do inquérito, no âmbito do processo do processo penal dirigido contra o pai das menores[55], pois que elas afectam a observação pericial.
Confrontadas as palavras e expressões utilizadas pela “A” no seu relato às peritas com os relatos da mãe, consta-se que os relatos são idênticos. A menor usa as mesmas palavras e expressões que a mãe[56]. O que é sinal evidente de que foi sugestionada. A criança é extremamente sugestionável, a sua vontade e convicções são fragilíssimas. Basta dizer-lhes mais do que uma vez que chore ou que ria, para a vermos soluçar ou rir convulsivamente; basta repetir-lhes, com convicção, que esteve presente em certo acontecimento, para que ela se convença disso. A criança diz habitualmente sim a tudo, pelo desejo de estar de acordo com quem a interroga[57]. Os inúmeros relatos da mãe, a pressão exercida pela mãe e pela avó materna, com uma temática excessivamente focalizada na temática genital e sexual, como se houvesse, por parte da mãe uma procura incessante da confirmação dos alegados abusos sexuais perpetrados pelo pai contra a menor [cfr. Relatório Clínico Pedopsiquiátrico de 30-04-2003 da Dr.ª “G” (fls. 147 a 150) e Relatório Pedopsiquiátrico de 08-01-2004 da Dr.ª “H” (fls. 455 a 460)] repetidos inúmeras vezes ficaram impressos na memória da menor “A”, sem que a mesma tivesse consciência disso. É muito difícil à criança fixar a linha divisória entre a verdade e a mentira, pois a criança até certa idade não dá importância à mentira em si mesma, não distingue entre ficção e realidade, entre os seus pensamentos e a verdade objectiva. A criança mente com frequência inconsciente ou conscientemente. A criança que narra um facto que sabe não ser verdadeiro, na sua recordação fixa com precisão aquilo que contou, ao mesmo tempo que se vai diluindo a consciência da mentira, de maneira que só se recorda de ter contado que esteve presente em certo acontecimento; e assim se compreende que, com facilidade, o evoque como um facto realmente sucedido. Pondo parte este factor mnemónico, a criança narra, frequentemente, a sua mentira com tão grande colorido que, especialmente se compreende que a acreditaram, fica perturbada pela história que contou, a ponto de poder vir a acreditar nela como um facto verdadeiro, como já supra se referiu[58].
Dizer como faz a Sr.ª perita, Dr.ª “J”, nos esclarecimentos prestados em 10-07-2007 (fls. 1190), que não lhe parece __ a ela e aos peritos que fizeram o exame, esclarece __  que os relatos da “A” tenham sido objecto de sugestão, porque há credibilidade da “A”, e que há credibilidade, porque a “A” faz descrições detalhadas e coerentes, de conteúdo consistente, com vocabulário adequado à sua idade, e porque não são evidentes nela sinais de confabulação e surgem detalhes de memórias periféricas, não arreda que a “A” não tenha sido objecto de sugestão, não só pelo que já foi dito supra sobre a identidade do relato da mãe e da “A”, cujas palavras e expressões são idênticas __ a pressão e a repetição dos relatos da mãe e da avó materna explicam a fixação de tais relatos na sua memória e a menor repete o que ouviu __ como também as descrições detalhadas pelo que já se referiu supra a propósito da memória e da mentira nas crianças[59] __ a memória da criança é frágil e falaz, e a deficiência dos poderes de crítica e a existência de elementos estranhos à percepção fixada podem modificar a recordação de uma determinada imagem __, e dita a coerência e a consistência das suas descrições da menor “A” referidas pelas peritas, têm de ser pesadas no conjunto das demais provas produzidas, mais do que a menor diz, vale o podem ou querem dizer. E tendo em conta a situação no tempo dos alegados abusos sexuais e as perícias realizadas a “quente” sobre eles, as cientificamente objectivas (sexologia e biologia forenses) e as subjectivas de pedopsiquiatria e de psicologia, e a análise que supra se fez sobre elas e o confronto sobre elas, retiram fundamento às ditas descrições da menor “A” e não dão credibilidade ao seu depoimento.
Os relatos da “A” não são, pois, verosímeis.
Donde não se pode dar como provado o ponto 20. da matéria de facto provada supra descrita em II. A), já que o mesmo foi dado como provado com base nos relatos da “A”, e nos Relatórios de fls. 455 a 460 e 932 a 945 e nos esclarecimentos dos peritos que os elaboraram, Dr.ªs “H” e “J”, e no depoimento da testemunha “O”, e esta testemunha baseia o seu depoimento naquilo que a “A” lhe disse __ e os relatos da “A” não se afiguram verosímeis, conforme se disse __ e do primeiro daqueles Relatórios não se pode extrair a existência de abuso sexual do pai sobre as menores, como do exposto supra sobre eles evidencia, e o segundo Relatório está ferido pelo decurso do tempo e pelas demais razões expostas, pelo que não pode ter o peso probatório que lhe foi dado, nem os esclarecimentos prestados pelos ditos peritos podem sustentar a plausibilidade da existência de abuso sexual por parte do pai, pelas razões expostas[60].
Por todo o exposto se dá como não provado o provado o ponto 20. da matéria de facto provada supra descrita em II. A), uma vez que não se provam os abusos sexuais por parte do pai sobre as menores.
Aqui chegados, há que abordar o direito de visita por parte do pai.
*
2. A suspensão provisória do direito de visita:
Conforme se disse supra em II. B) ponto 1. (O direito de visita e a questão do abuso sexual)[61], o direito de visita é um direito-dever, um direito-função, um direito a ser exercido não no interesse exclusivo do seu titular mas, sobretudo, no interesse da criança. Não é, pois, um direito subjectivo propriamente dito, não tem carácter absoluto, e está subordinado ao interesse do menor. Pode, por isso, ser limitado ou excluído quando o seu exercício for incompatível com a saúde psíquica do menor. Não é um direito do progenitor sem a guarda dos filhos que possa ser imposto ao menor sem ter em conta a vontade deste, sobretudo se é já é adolescente e, não o sendo ainda, há que ter em conta o grau de maturidade do menor, para se averiguar se a sua vontade foi ou não livremente determinada ou se resultou de influências ou manipulações externas. E viu-se também que, in casu, a recusa das menores em não quererem ver o pai foi livremente determinada, já que não foram manipuladas pela mãe com vista a obstruir o vínculo delas com o pai[62]. Assim a sua vontade tem de ser respeitada.
Donde, impõe-se a suspensão provisória do direito de visita do pai até que se atenue ou desapareça a recusa das menores. O que terá de ser obviamente averiguado pelos peritos.
*
β) Agravo da mãe das menores:
A) De facto:
A matéria de facto a ter em conta é o despacho recorrido supra referido em I. 1..
*
B) De direito:
1. A nulidade do despacho:
Nos termos do art.º 668º, n.º 1 al. b) do Cód. Proc. Civil[63] ex vi art.º 666º, n.º 2 do mesmo código, o despacho é nulo quando faltem em absoluto os fundamentos de facto e de direito em que assenta a decisão do despacho. É a sanção para o desrespeito ao disposto no art.º 158º do Cód. Proc. Civil, quanto ao dever de fundamentação das decisões judiciais em geral, e decorre além do mais do imperativo constitucional (art.º 205º, n.º 1 da C.R.P.)[64]. E isto é assim, porque o despacho deve representar a adaptação da vontade abstracta da lei ao caso particular submetido à decisão contida no despacho, e porque a parte vencida tem direito a saber porque razão o despacho lhe foi desfavorável, para efeitos de recurso, quando a ele haja lugar. Por outro lado, em caso de recurso, a fundamentação é absolutamente necessária para que o tribunal superior possa apreciar as razões determinantes da decisão do despacho[65]. Mas uma coisa é falta absoluta de fundamentação e outra é a fundamentação deficiente, medíocre ou errada. Só aquela é que a lei considera nulidade. Esta não constitui nulidade, e apenas afecta o valor doutrinal da despacho, e apenas corre o risco, a padecer de tais vícios, de ser revogado ou alterado em recurso[66].
Traçado o esquisso desta nulidade, salta à vista a falta de fundamentação do despacho e, por conseguinte, a sua nulidade. O que não impede que não se conheça do objecto do recurso, atento o disposto no art.º 715º, n.º 1 ex vi art.º 749º.
É o que se fará de seguida.
*
2. A legalidade do despacho:
Uma coisa é o exercício do mandato judicial __ que é sempre admissível e não pode ser impedido (art.º 61º, n.º 3 do EOA[67]) __ e o advogado ser indispensável à administração da justiça __ art.º 83º, n.º 1 do EOA __ e outra é se o advogado da mãe das menores podia ou não assistir à audiência das menores. Esta questão não tem a ver necessariamente com aquelas, visto que, muito embora o advogado constituído pela parte tenha poderes para a representar em todos os actos e termos do processo (art.º 36º, n.º 1 do Cód. Proc. Civil) __ o que, com os poderes de estabelecer, constitui os poderes forenses gerais (art.º 37º, n.º 1 do Cód. Proc. Civil) __, nem sempre a pode representar em actos do processo, como sucede, por exemplo, no caso dos procedimentos cautelares em que possa estar em causa a eficácia da decisão a proferir, em que há limites de acesso impostos às próprias partes neles visadas, e, por conseguinte, limites de acesso aos seus próprios mandatários judiciais [Cfr. art.º 168º, n.º 1 e 2 al. b) e art.ºs 385º, n.º 6 e 388º, n.º 1 do Cód. Proc. Civil e art.º 408º, n.º 1 do Cód. Proc. Civil]. Ora nestes casos não se está a impedir o exercício do mandato judicial nem a contrariar a indispensabilidade do mandato judicial. O que se está a impedir é a parte visada ou seu advogado de assistir como representante da parte aos actos referidos ou a que lhe seja facultado o acesso a tais procedimentos cautelares. Mas esta limitação ao acesso não se fica pelos procedimentos cautelares. Esta limitação de acesso pode estender-se a certos actos no âmbito dos processos tutelares cíveis se para tal houver justificadas razões.
E no caso dos presentes autos há.
Vejamos.
O processo de alteração da regulação do poder paternal (art.ºs 182º da OTM[68]) é um processo tutelar cível [art.º 146º al. d) da OTM)] e é considerado um processo de jurisdição voluntária (art.º 150º da OTM). O que significa que, para além do mais, que o tribunal não está sujeito a critérios de legalidade estrita, devendo em cada caso, adoptar a solução que julgue mais conveniente e oportuna (art.º 1410º do Cód. Proc. Civil). O que se explica porque nestes processos não há um conflito de interesses a compor mas um só interesse a regular, muito embora possa haver conflito de representações ou opiniões acerca do mesmo interesse[69]. Assim sendo, o juiz não está obrigado à observância rigorosa do direito aplicável à espécie vertente, mas pode subtrair-se a esse enquadramento rígido e proferir a decisão que lhe pareça mais equitativa, isto é, que lhe pareça mais justa, atendendo apenas às características da situação e sem recurso à lei eventualmente aplicável. Assim sendo, e estando em causa a audição das menores sobre se queriam ou não reatar a convivência com o pai, justificava-se, plenamente que nem os pais nem os seus mandatários judiciais estivessem presentes à sua audição __ e estes ainda mais do que os seus pais por serem pessoas estranhas __ para que a sua vontade fosse livremente manifestada sem qualquer pressão ou constrangimento, que a presença dos pais ou dos seus mandatários judiciais poderia constituir, já que esta Relação tinha determinado a sua audição, e, porque, havia indícios nos autos de anteriores pressões maternas sobre as menores no sentido de as mesmas falarem em relação aos alegados abusos sexuais perpetrados pelo pai e de que elas teriam sido vítimas [cfr. Relatório Clínico de 30-04-2003 da Pedopsiquiatra Dr.ª G – Hospital (fls. 147 a 150) e Exame Pericial Pedopsiquiátrico de 08-01-2004 da Dr.ª “H” (fls. 455 a 460)], e porque as menores têm medo do pai.
Justificava-se, pois, o despacho recorrido. E foi, além do mais, sensato e avisado.
Não há, pois, violação das normas legais indicadas, muito embora o despacho recorrido fosse nulo por falta de fundamentação.
Improcede, pois o recurso.
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III. Conclusão:
1. A alteração do regime de visitas não se baseou inteiramente na audição das menores.
2. As menores conhecem o pai.
3. A ansiedade é um sentimento misto de receio e de apreensão ou inquietação sobre o futuro, é um estado de alerta, um estado afectivo desagradável, exprime a expectativa perante um perigo, e pode apresentar graus, desde um leve receio até a um pânico sem conteúdo definido. Assim a ansiedade de uma menor centrada na figura paterna justifica o medo que a menor sente pelo pai.
Os medos infantis podem ter causas variadas, podem ser racionais ou irracionais, e uma criança, tal como um adulto, pode ter medo do que desconhece, se o estado afectivo violento e passageiro que é o medo, for o resultado de uma criação no espírito de conteúdos psíquicos que não tenham qualquer correspondência com conteúdos reais previamente percebidos. E isto, claro está, com a ressalva de toda a problemática em torno da origem, valor e natureza do conhecimento.
4. O direito de visita é um direito-dever, um direito-função, um direito a ser exercido não no exclusivo interesse do seu titular, mas, sobretudo, no interesse da criança. Não é, pois, um direito de carácter absoluto, visto que está subordinado ao interesse da criança. Por isso, pode ser limitado ou excluído, ou suspendido provisoriamente.  
5. A consideração da vontade do menor depende da sua idade, do seu discernimento, e do grau da sua maturidade. Tratando-se de um adolescente, a lei (art.º 10º, n.º 1 da LPCJP) aponta a idade de 12 anos, como idade a partir da qual a opinião do jovem é relevante. É este também o critério seguido no Cód. Civil em matéria de adopção [art.º 1981º, n.º 1 al. a) e 1984º al. a) do Cód. Civil, alterados pelo Dec. Lei n.º 120/98, de 08-05]. Abaixo desta idade é importante analisar o grau de maturidade do menor e da questão de saber se a sua vontade foi livremente determinada ou resultou de influências ou manipulações externas.
6. A vontade das menores tem de ser ponderada, atento o estado do seu desenvolvimento e amadurecimento já às portas da puberdade (2.ª infância, período de latência ou quarto estádio), já que não há indícios de que tenham sido objecto de coacção moral e indução psicológica da mãe, nem se pode afirmar a existência de síndrome de alienação parental (SPA), se é que o mesmo tem base científica. Donde se tem de concluir que a vontade das menores em se recusarem a ver o pai foi livremente determinada e, por isso, tem de ser respeitada.
7. Os depoimentos das crianças é muito complexo e está sujeito a muitas condicionantes. Aquilo que elas afirmam com sinceridade, espontaneidade e simplicidade e que parece credível, pode não o ser. É muito difícil à criança fixar a linha divisória entre a verdade e a mentira, entre a ficção e a realidade, entre os seus pensamentos e a verdade objectiva. A criança mente frequentemente, consciente ou inconscientemente, podendo mesmo os seus relatos apresentar muitos pormenores e coloridos. Por tudo isto, assume especial relevância que os seus inquiridores sejam técnicos especializados, psicólogos e pedopsiquiatras, uma vez que se está perante factos a averiguar (a existência ou não de abuso sexual de menores) que exigem especiais conhecimentos no domínio da psicologia e pedopsiquiatria que os julgadores, em virtude da sua formação académica, não possuem.
8. As perícias destes técnicos é livremente apreciada com as restantes provas que forem produzidas sobre os factos que dela são objecto (art.º 389º do Cód. Civil), podendo o juiz controlar as perícias e afastar-se mesmo delas se as reputar incorrectas, desde que o faça fundamente. Neste caso, o juiz exerce a sua insubstituível função de peritus peritorum.
9. Havendo perícias de peritos diferentes que se contradizem, tem o julgador, à luz do supra referido em 8., de dar prevalência às perícias realizadas “a quente” sobre a ocorrência dos alegados abusos sexuais e não sobre as realizadas a “frio” e que se encontram feridas pelo decurso do tempo e pelas sucessivas e múltiplas entrevistas, observações e exames efectuados às menores, que prejudicam a observação dos peritos, se aquelas estiverem devidamente fundamentadas e se lhe afigurarem correctas.
10. Verificando-se que uma destas perícias que concluiu “parecerem existir actualmente maiores indícios da ocorrência de abuso sexual sobre as menores” e de que uma teria sido mais abusada do que a outra pelo pai, não está devidamente fundamentado, nem os esclarecimentos posteriores da perita removeram a essa falta de fundamentação, não pode ser atribuído a essa perícia qualquer valor. Verificando-se igualmente que a última perícia realizada a “frio” conclui que a menor mais velha foi abusada sexualmente pelo pai e que os relatos desta menor são credíveis, por razões que aponta, mas verificando-se que os relatos desta menor são idênticos aos da mãe, que a menor utiliza as mesmas palavras e expressões que a mãe, e que a mãe e a avó materna exerceram pressões sobre as menores relativas às acções do pai de forma constante e excessivamente focalizada na temática genital e sexual, como se houvesse da sua parte uma procura incessante da confirmação dos alegados abusos sexuais, numa primeira fase em que se encontrava perturbada emocionalmente devido à ruptura da sua relação conjugal com o pai das menores e da suspeita dos ditos abusos sexuais, estamos perante um sinal evidente de que a menor mais velha e alegadamente mais abusada foi sugestionada.
11. Verificando-se que os exames de sexologia forense e biologia forense realizados a “quente” sobre a alegada ocorrência dos factos abusivos não confirmaram os abusos sexuais, e verificando-se que de três perícias a “quente” duas delas não verificam a existência de sinais ou sintomas de abusos sexuais e, uma terceira, aponta à menor, alegadamente mais abusada, uma sintomatologia que pode corresponder a uma perturbação de adaptação com predomínio de ansiedade, não querendo ou não podendo afirmar a existência de abusos sexuais sobre a menor, e referindo que a menor está pressionada pela mãe e pela avó materna a falar do que seriam os relatos feitos por ela à mãe e à avó materna relativos às acções do pai; e verificando-se ainda uma outra perícia que diz que não há sinais indiciadores de abuso sexual sobre a menor alegadamente menos abusada, há que, atento o supra referido em 10., de concluir que não se provam os alegados abusos sexuais do pai sobre as menores.
12. Uma vez que não se provam os alegados abusos sexuais do pai sobre as menores, e uma vez que estas se recusam a ver o pai e a sua vontade tem de ser respeitada, pelas razões supra referidas em 6., impõe-se a suspensão provisória do direito de visita do pai até que se atenue ou desapareça a recusa das menores. O que terá de ser obviamente averiguado pelos peritos.
13. Nos termos do art.º 668º, n.º 1 al. b) do Cód. Proc. Civil ex vi art.º 666º, n.º 2 do mesmo código, é nulo por falta de fundamentação, o despacho que decidiu que as menores seriam ouvidas sem a presença dos progenitores nem dos seus advogados sobre se queriam ou não reatar a convivência com o pai.
14. Não obstante ser nulo, tal despacho é legal, e não viola o disposto nos art.ºs 61º, n.º 3 e 83º, n.º 1 do EOA (Lei n.º 15/2005, de 26-01), art.º 36º, n.º 1 do Cód. Proc. Civil e 208º da C.R.P., não só porque não se está, in casu, a impedir o exercício do mandato judicial nem a contrariar a indispensabilidade do mandato judicial __ o que se está é a impedir os pais e os seus advogados de assistirem à dita audição __, mas também porque o processo de regulação do poder paternal é um processo tutelar cível [art.º 146º al. d) da OTM)] e é considerado um processo de jurisdição voluntária (art.º 150º da OTM), e, por isso, o tribunal não está sujeito a critérios de legalidade estrita, podendo o juiz proferir a decisão que lhe pareça mais justa, atendendo apenas às características da situação e sem recurso à lei eventualmente aplicável, e porque aquele despacho se justifica com o fim de permitir às menores manifestarem livremente a sua vontade sem qualquer pressão ou constrangimento, já que a Relação tinha determinado a sua audição, e, porque, havia indícios nos autos de anteriores pressões maternas sobre as menores no sentido de as mesmas falarem em relação aos alegados abusos sexuais perpetrados pelo pai e de que elas teriam sido vítimas, e porque as menores têm medo do pai.
***
IV. Decisão:
Assim e pelo exposto, acordam em julgar parcialmente procedente a apelação interposta pelo pai da menor e, consequentemente, revogam a sentença recorrida, e decidem agora suspender provisoriamente o direito de visita do pai até que se atenue ou desapareça a recusa das menores.
Acordam em julgar improcedente o agravo interposto pela mãe das menores apelada e, consequentemente, negam-lhe provimento.
Custas da apelação pelo pai da menor apelante e pela mãe das menores apelada, na proporção de 1/3 e 2/3, respectivamente. Custas do agravo pela mãe das menores agravante.
Registe e Notifique (art.º 157º, n.º 4 do Cód. Proc. Civil).
***
Lisboa, 19/05/2009

Arnaldo Silva
Graça Amaral
Ana Resende

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[1] Excluindo os desabafos e as proclamações de indignação, que, obviamente, estão fora do âmbito do presente recurso, e que, por conseguinte, aqui se eliminaram.
[2] O âmbito do recurso é triplamente delimitado. Primeiro é delimitado pelo objecto da acção e pelos eventuais casos julgados formados na 1.ª instância recorrida. Segundo é delimitado objectivamente pela parte dispositiva da sentença que for desfavorável ao recorrente (art.º 684º, n.º 2 2ª parte do Cód. Proc. Civil) ou pelo fundamento ou facto em que a parte vencedora decaiu (art.º 684º-A, n.ºs 1 e 2 do Cód. Proc. Civil). Terceiro o âmbito do recurso pode ser limitado pelo recorrente. Vd. Sobre esta matéria Miguel Teixeira de Sousa, Estudos Sobre o Novo Processo Civil, Lex, Lisboa –1997, págs. 460-461. Sobre isto, cfr. ainda, v. g., Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos, Liv. Almedina, Coimbra – 2000, págs. 103 e segs.  
[3] Vd. J. A. Reis, Cód. Proc. Civil Anot., Vol. V, pág. 56. 
[4] Neste sentido, vd. Ac. do STJ de 12-09-2006: Revista - Proc. n.º 06A1986 – Sebastião Povoas –unanimidade, in http://www.dgsi.pt.
[5] Conclusões que terão de ser, logicamente, um resumo dos fundamentos porque se pede o provimento do recurso, tendo como finalidade que elas se tornem fácil e rapidamente apreensíveis pelo tribunal. As conclusões não devem ser afirmações desgarradas de qualquer premissa, e sem qualquer referência à fundamentação por que se pede o provimento do recurso. Não podem ser consideradas conclusões as indicadas como tal, mas que sejam afirmações desgarradas sem qualquer referência à fundamentação do recurso, nem se deve tomar conhecimento de outras questões que eventualmente tenham sido suscitadas nas alegações propriamente ditas, mas não levadas às conclusões. Por isso, só devem ser conhecidas, e só e apenas só, as questões suscitadas nas alegações e levadas às conclusões. Neste sentido, vd. Acs. do STJ de 21-10-1993 e de 12-01-1995: CJ (STJ), respectivamente, Ano I, tomo 3, pág. 84 e Ano III, tomo 1, pág. 19.
[6] Cfr. supra nota 5.
[7] Este ponto da matéria de facto foi dado como «não provado». Vd. infra pág.  58.
[8] Dec. Lei n.º 314/78, de 14-09, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 133/99, de 28-09.  
[9] Vd., v.g., J. A. Reis, Processos Especiais, Vol. II (Reimpressão), Coimbra Editora, Ld.ª, Coimbra – 1982, pág. 399; A. Varela e outros, Manual de Processo Civil, Coimbra Editora, Ld.ª - 1984, págs. 65 e segs.
[10] Vd. A. Fernandes da Fonseca, A Psicologia e a Psicopatologia da Infância e da Adolescência, 2.ª Ed., Edições Universidade Fernando Pessoa – 2004, págs. 70 e segs.  
[11] Vd. “B” Ferreira, Em Defesa da Criança – Teoria e Prática Psicanalítica da Infância, Assírio Alvim – Abril de 2002, pág. 48.
[12] Vd. “B” Ferreira, opus cit., pág. 449.
[13] Expressão oriunda da mitologia grega. Édipo filho de Laio e de Jocasta, reis de Tebas, mata o pai e casa com a mãe, por estes terem desobedecido a um oráculo que lhes impedia de ter descendência. Sigmund Freud baseou-se na tragédia de Sófacles (496 – 406 a. C.) Rei Édipo, para formular o complexo de Édipo. Nele Freud descreve o auge do desenvolvimento da sexualidade infantil, quando a criança experimenta impulsos diferentes para cada um dos progenitores. Metaforicamente o conceito é visto como o amor à mãe e ódio ao pai pelo rapazinho, por o mundo infantil se resumir a estas figuras parentais ou aos representantes delas. À consciência feminina atribui-se uma origem simétrica, por vezes designada de complexo de Electra. Vd. infra nota 14.
[14] C. G. Jung utilizou a expressão complexo de Electra para designar, no sexo feminino, o equivalente ao complexo de Édipo. A analogia não foi aceite por Sigmund Freud, que manteve a designação de complexo de Édipo feminino, acentuando as diferenças na relação do sexo feminino com os dois progenitores. C. G. Jung baseou-se aqui no mito de Electra. Segundo a mitologia grega, Electra, filha de Agamémnon (irmão de Manelaus e ambos filhos de Atreu, e, por isso são também designados de Atridas) e de Clitemenestra, vinga a morte do pai perpetrada pelo amante da mãe, Egisto, e por esta, depois do pai ter regressado da guerra de Tróia. O complexo de Electra refere-se à atitude emocional das raparigas que as levam a afastar-se da mãe e, consequentemente, a mudar de objecto libidinal, desejando inconscientemente eliminá-la, e a possuir o pai, para obter dele aquilo que a mãe lhe recusou (o pénis). Depois, ao mesmo tempo que renuncia ao pénis, a menina procura uma indemnização junto do pai uma indemnização sob a forma de um filho. Vd., p. ex., Eduardo L. Cortesão, Enciclopédia Luso-Brasileira de Cultura, Vol. 7.º «Édipo, complexo de»; Simon Blackburn, Dicionário de Filosofia, Gradiva «complexo de Édipo»; Daniel Marcelli, Infância e Psicopatologia – Manuais Universitários 40 – Climepsi Editores, Lisboa – 2005, págs. 48 e 377 e segs.   
[15] Vd. Élisabeth Clément e outros, Dicionário Prático de Filosofia, Terramar – 1997. 
[16] Para uns ocorre entre os entre 3 e os 5 anos, após a fase pré-edipiana. M. Klein e a sua escola situam-na muito mais cedo. Para outros, o seu ponto culminante ocorre entre os 4 e os 5 anos, e depois declina (normalmente …), no final de uma crise decisiva para o desenvolvimento ulterior da personalidade. Para outros ainda, eclode entre os 4 e os 7 anos. Vd. Eduardo L. Cortesão, Enciclopédia Luso-Brasileira de Cultura, Vol. 7.º «Electra, complexo de»; Élisabeth Clément e outros, Dicionário Prático de Filosofia, Terramar – 1997, «complexo de Édipo»; Daniel Marcelli, Infância e Psicopatologia cit., pág. 48; Grégory Michel e Diana Purper–Ouakil, Personalidade e Desenvolvimento – Do normal ao patológico, Colecção Epigénese.  Desenvolvimento e Psicologia, Instituo Piaget, pág. 61; Enciclopédia, e http://pt.wikipedia.
[17] Vd. Dicionário Enciclopédico de Psicologia, Edições Texto & Grafia, Ld.ª, 1.ª Ed. (2008) – obra publicada com o apoio do Centro Nacional do Livro – Ministério Francês da Cultura, pág. 171.  
[18] Cfr. supra nota 16.
[19] Empirismo, com as suas variantes (o espírito tábua rasa, o sensualismo, o associacionismo, evolucionismo e positivismo), racionalismo, com as suas variantes (plantonismo, platonismo de Santo Agostinho, Cartesianismo, inatismo virtual de Leibnitz, critiscismo) e empírico-racionalismo, quanto à origem do conhecimento, e realismo e idealismo, com as suas variantes consoantes os filósofos representativos, quanto à natureza do conhecimento, e relativismo com suas variantes (relativismo kantiano, positivista, pragmático, intuicionismo de Bergson (que não é propriamente relativista, mas que pode ser considerado como tal se tiver em consideração alguns «porquês») e emírico-racionalismo quanto ao seu valor. Como se vê, tudo isto poderia dar muito pano para mangas. Mas ficamos aqui. Tudo isto mostra quão se deve ser sóbrio em afirmações categóricas de validade universal não devidamente fundamentadas.
[20] Filósofo escocês (Strachan 26-04-1710 – Glasgow 07-10-1796) contemporâneo de David Hume, de quem foi crítico. As principais obras de Thomas Reide são: An Inquirity into the Human Mind on the Principles of Common Sense (1764) e Essays on the Intelctuals Powers of Man (1788).  
[21] Vd. Dicionário de Psicologia, J. P. Chaplin, Publicações Dom Quixote, Lisboa – 1981, palavra «ansiedade»; Dicionário de Psicologia, Michel e Françoise Gauquelin, Verbo, págs. 74-75 e 29; Verbo Enciclopédia Luso-Brasileira de Cultura, Vol. 2 palavra «ansiedade».
[22] Medo de estar sozinho, medo do escuro, dos monstros e papões, etc.
O receio do escuro é uma fase normal no processo de crescimento. Faz parte do desenvolvimento infantil e surge normalmente a partir dos dois/três anos, desaparecendo sensivelmente aos cinco. O medo do escuro evoca o desconhecido, o que está escondido, o que não se vê, e que é mais aterrador do aquilo que se vê. Monstros e papões, e medo de dormir, podem surgir por volta dos 2 ou 3 anos de idade. Estão muitas vezes, ligados às angústias de separação/abandono. A criança tem pesadelos, terrores nocturnos, fica muito agitada sempre que é hora de ir dormir. Recusa-se a ficar sozinha no quarto a brincar, a ir sozinha à casa de banho e insiste, na maior parte das vezes, em dormir na cama dos pais. Esta criança pode estar sentir que, ao dormir, perde a mãe. No entanto, o medo do escuro pode servir para a criança aprender a lidar com a ausência e o desconhecido, e para, no fundo, progressivamente se autonomizar das figuras parentais. Estes e outros medos, como o medo de fantasmas, bruxas, extra-terrestres, que povoam o imaginário infantil, ou o medo de pequenos animais, e, mais tarde, o medo da morte ou medo existencial são normais e são mesmo uma emoção saudável e básica, e põe a criança de sobre-alerta, e prepara-a para fugir face à percepção de perigo, permite-lhe uma adaptação a essas situações, e é, muitas vezes, uma reacção instintiva de defesa essencial de sobrevivência, física ou psíquica. Através dos medos, a criança confronta-se todos os dias com novos desafios e faz a sua aprendizagem diária.
[23] A maioria dos medos infantis está relacionada com sentimentos de solidão e de desamparo.
[24] Vd. Maria Clara Sottomayor, Exercício do Poder Paternal, Publicações Universidade Católica, Porto – 2003, págs. 274-275.
[25] Vd. Maria Clara Sottomayor, Exercício do Poder Paternal, págs. 277-278.
[26] Por isso, o direito de visita também se designa «de direito de conteúdo altruístico ou poder funcional, pois não serve exclusivamente o interesse do titular do poder, mas sim o interesse de outro e não poder ser exercido a não ser tendo em vista a realização do fim que está na base da sua concessão». Vd. Maria Clara Sottomayor, Exercício do Poder Paternal, pág. 296. 
[27] Vd. Maria Clara Sottomayor, Exercício do Poder Paternal, pág. 289 e Maria Clara Sottomayor, Regulação do Exercício do Poder Paternal nos Casos de Divórcio, 4.ª Ed., Liv. Almedina – págs. 78-79.
[28] Vd. Maria Clara Sottomayor, Regulação do Exercício do Poder Paternal nos Casos de Divórcio, pág. 80.
[29] Art.º 12º, n.º 1 – Os Estados Partes garantem à criança com capacidade de discernimento o direito de exprimir livremente a sua opinião sobre as questões que lhe respeitem, sendo devidamente tomadas em consideração as opiniões da criança, de acordo com a sua idade e maturidade.
[30] Art.º 3º - Direito a ser informado e de exprimir a sua opinião nos processos.
[31] Vd. Maria Clara Sottomayor, Regulação do Exercício do Poder Paternal nos Casos de Divórcio, págs. 79-80.
[32] Lei de Protecção de Crianças e Jovens em Perigo – Lei n.º 147/99, de 01-09.
[33] Alterados pelo Dec. Lei n.º 120/98, de 08-05.
[34] Vd. Maria Clara Sottomayor, Regulação do Exercício do Poder Paternal nos Casos de Divórcio, págs. 81-82.
[35] Por síndroma de alienação parental (SPA) entende-se «uma desordem na infância que surge quase exclusivamente no contexto de disputas sobre o exercício do poder paternal da criança. A sua manifestação principal está na campanha de difamação feita junto da criança contra a um dos pais, campanha que não tem justificação. O síndroma resulta da combinação de uma programação (lavagem ao cérebro) e doutrinação e das contribuições próprias da criança para o alvitamento do progenitor alvo» (vd. fls. 610 dos autos). O conceito de SPA foi criado por Gardner e tem sido criticado pela doutrina mais recente, que tem afirmado que não tem base científica. Vd. Maria Clara Sottomayor, Regulação do Exercício do Poder Paternal nos Casos de Divórcio, págs. 319-320 e nota 426. 
[36] Vd. Maria Clara Sottomayor, Regulação do Exercício do Poder Paternal nos Casos de Divórcio, págs. 319-320.
[37] Vd. Fernandes da Fonseca, opus cit., págs. 95 e segs.
[38] Que vai desde o declínio do conflito edipiano até à adolescência. Vd. Dicionário Enciclopédico de Psicologia, Edições Texto & Grafia, Ld.ª, 1.ª Ed. (2008) – publicação com o apoio do Centro Nacional do Livro – Ministério Francês da Cultura, pág. 171. 
[39] Segundo Erikson. Vd. Grégory Michel e Diane Purper-Ouakil, Personalidade e Desenvolvimento – Do normal ao patológico, Colecção Epigénese, Desenvolvimento e Psicologia, Instituto Piaget, pág. 71. 
[40] Vd. Dicionário Enciclopédico de Psicologia, Edições Texto & Grafia, Ld.ª, 1.ª Ed. (2008) – publicação com o apoio do Centro Nacional do Livro – Ministério Francês da Cultura, pág. 171; Fernandes da Fonseca, opus cit., págs. 95-99 e 131; Henri Wallon, A Evolução Psicológica da Criança, Edições 70, 4.ª Ed., págs. 207-215; Grégory Michel e Diane Purper-Ouakil, opus cit., págs. 61-77.
[41] Cfr. supra nota 35 
[42] Neste sentido, vd. o estudo de Francisco Taveira, investigador da Faculdade de Medicina do Porto (FMUP), coordenado por “B” Magalhães, directora do Instituo de Medicina Legal da FMUP, disponível in, http://www.cienciahoje.pt/index.php?oid=264258op=all, segundo o qual os pais e os padrastos são os principais responsáveis pelos abusos sexuais ocorridos no seio das famílias. De acordo com os dados recolhidos pelos autores, na Delegação do Norte do Instituto de Medicina Legal, entre 1997 e 2004, 45 % das crianças abusadas no sei familiar foram-no pelo próprio pai e 6% pelo padrasto.  
[43] Como refere Elisabeth Loftus, figura polémica que, nos Estados Unidos, se tem dedicado a desmascarar as mentiras das vítimas de pedofilia. Vd. Abuso Sexual de Menores – FEUC – Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, in http://www4.fe.uc.pt/fontes/trabalhos/2005026.pdf.
[44] Vd. Enrico Altavillla, Psicologia Judiciária, Vol. I, Arménio Amado – Editor, Sucessor, Coimbra – 1981, págs. 58 e segs.; Enrico Altavillla, O Processo Psicológico e a Verdade Judicial, Vol. I, págs. 57 e segs.    
[45] Porque, caso contrário, se o estado de coisas que se pretende conhecer pode ser apreendido e devidamente interpretado à luz dos conhecimentos gerais e comuns, o meio a empregar é a inspecção judicial (art.º 612º do Cód. Proc. Civil), que aliás pode ser acumulado com este. Vd. Jacinto Rodrigues Bastos, Notas ao Cód. Proc. Civil, Vol. III, Lisboa – 2001, pág. 119 nota 1. ao art.º 568º.
[46] Vd. fls. 1005 e 1034 do despacho do Ministério Público do arquivamento do inquérito contra o pai.
[47] Vd. fls. 1040 do despacho do Ministério Público do arquivamento do inquérito contra o pai.
[48] Vd. fls. 1027 do despacho do Ministério Público do arquivamento do inquérito contra o pai, onde o Ministério Público questiona __ e bem __ a utilidade da recolha da cuecas que foram escolhidas para exame.
[49] Vd. fls. 1032-1033 o despacho do Ministério Público do arquivamento do inquérito contra o pai.
[50] Vd. Relatório Pedopsiquiátrico – Exame Médico Legal – Hospital feito à menor “B” em 07-06-2006, pelos peritos Dr. A e Dr.ª J fls. 922 dos autos.
[51] Vd. fls. 1006 o despacho do Ministério Público do arquivamento do inquérito contra o pai.
[52] Vd. Enrico Altavilla, opus cit., págs. 66 e 78.
[53] Vd. fls. 1041 o despacho do Ministério Público do arquivamento do inquérito contra o pai.
[54] Vd. fls. 1038 o despacho do Ministério Público do arquivamento do inquérito contra o pai. E tem efectivamente razão o Ministério Público.
[55] Vd. fls. 1047 o despacho do Ministério Público do arquivamento do inquérito contra o pai
[56] No mesmo sentido, vd. fls. 1047-1048 o despacho do Ministério Público do arquivamento do inquérito contra o pai.
[57] Vd. Enrico Altavilla, opus cit., págs. 68 e segs.
[58] Vd. Enrico Altavilla, opus cit., págs. 76 e segs. Cfr. supra nota 52 pág. 54.
[59] Cfr. supra pág. 54
[60] Cfr. supra nota 7 e pág. 10.
[61] Cfr. supra págs. 21 e segs..
[62] Cr. supra pág.
[63] São deste código os preceitos legais indicados na falta de indicação em contrário.
[64] Nos termos do art.º 205º, n.º 1 da C.R.P. «as decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei». O dever de fundamentação é uma garantia integrante do próprio conceito de Estado de direito democrático (cfr. Art.º 2º), ao menos quanto às decisões judiciais que tenham por objecto a solução da causa, como instrumento de ponderação e legitimação da própria decisão judicial e de garantia do direito ao recurso. Em todo o caso, não deixa de ser pouco congruente com o princípio de Estado de Direito a falta de consagração de um dever geral de fundamentação das decisões judiciais». Vd. J. J Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, 3.ª Ed., Coimbra Editora – 1993, págs. 798-799 anotação I ao artigo 208º, correspondente ao actual art.º 205º. A modificação introduzida pela IV Revisão Constitucional __ onde antes se lia «nos casos e termos previstos na lei» passou a ler-se «na forma prevista na lei» __ visou reforçar a obrigatoriedade de fundamentar as decisões judiciais. Com esta alteração, salvo a excepção constitucionalmente fixada das decisões de mero expediente, a lei não pode, em caso algum, afastar ou afrouxar o dever de fundamentação. Vd. Alexandre Sousa Pinheiro e Mário João de Brito Fernandes, Comentário à IV Revisão Constitucional, AAFDL , Lisboa – 1999, pág. 464 anotação 1. ao artigo 205º.
[65] Neste sentido vd. J. A. Reis, Cód. Proc. Civil Anot., Vol. V, reimpressão (1981), pág. 139. Esta ideia fundamental num estado de direito, está mesmo presente no âmbito do procedimento administrativo gracioso. Aqui o dever de fundamentação do acto administrativo é um importante sustentáculo da legalidade administrativa e é um instrumento fundamental da respectiva garantia contenciosa.
[66] Neste sentido vd. mutatis mutandis J. A. Reis, Cód. Proc. Civil Anot., Vol. V, reimpressão (1981), pág. 140.
[67] Considera-se aqui o EOA na versão da Lei n.º 15/2005, de 26-01.  [68] Dec. Lei n.º 314/78, de 14-09, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 133/99, de 28-09.  
[69] Vd. Ary de Almeida Costa e Carlos Alberto de Frias Oliveira Matias, Notas e Comentários à Lei tutelar de Menores, 2.ª Ed., Liv. Petrony, Lisboa – 1982 pág. 203 citando Manuel de Andrade (cfr. nota 169).