Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
5598/18.4T8LSB.L1-7
Relator: ISABEL SALGADO
Descritores: AUDIÊNCIA PRÉVIA
PRESCRIÇÃO
CONHECIMENTO DO MÉRITO
CONHECIMENTO NO SANEADOR
FACTOS CONTROVERTIDOS
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 05/19/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Sumário:   1.  O ónus de alegação do Réu, assente no princípio geral da boa-fé processual, visa acautelar o Autor de um articulado amalgama, entre impugnação e excepção, deixando passar alguma excepção “oculta”, à qual não responda, e lhe acarrete o efeito cominatório da admissão por confissão/falta de impugnação.
 2. Ressalvadas as situações excluídas por lei, à partida toda a causa poderá ser julgada na fase intermédia do processo, posto que o julgador antecipe que, o proveito da fase instrutória dos factos controvertidos, ante a solução plausível de direito, seja indiferente para o destino do litígio.
 3. Em ordem a alicerçar a conclusão de que está habilitado a conhecer de imediato do pedido, o juiz não pode, todavia, cingir-se à sua percepção da realidade do facto controvertido, firmada através dos elementos documentais (e outros) já disponíveis nos autos; tal prognose, não se equivale, no momento do saneador, à suficiência da convicção antecipada do julgador sobre a realidade do(s)facto(s).
 4. À luz da solução plausível de direito eleita - prevalência da invocada prescrição do direito peticionado sobre a intemporalidade de invocação da nulidade do negócio jurídico - mostra-se relevante apurar da factualidade susceptível de interromper o prazo de prescrição de 20 anos.
 5. Daí que, estando essa matéria de facto controvertida entre as partes, e a sua demonstração aferível, vg. por depoimento testemunhal, assiste ao Autor o direito de perseverar na respectiva prova (com ou sem êxito), de que o seu conhecimento do direito peticionado ocorreu em data ulterior à celebração do negócio jurídico/mútuo bancário.
 6. Subsistindo controvertida essa factualidade, que intercepta o rumo de procedência ou de improcedência da excepção da prescrição, o estado da causa não permite antecipar o julgamento no saneador, sem a produção da prova testemunhal indicada pelo Autor.
 7. Os objectivos de economia e gestão processual e parcimónia nos custos, tão caros à administração da justiça, cederão, na medida necessária, em prol do exercício do direito à acção e do direito à prova, vertentes do princípio constitucional do acesso ao direito e à tutela jurisdicional efectiva.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os Juízes na 7ªSecção do Tribunal da Relação de Lisboa

I.RELATÓRIO
A. Itinerário dos autos
1. A [ João …]  instaurou a presente acção de condenação, sob a forma de processo comum, contra  B [ …. Inv.Pessoal, Lda ] , C [ M…., S.A. ]  e D [ Banque Espírito ….]. Pede a nulidade do contrato de mútuo bancário celebrado com a 3.ª Ré, no valor de €241.526,45, e a nulidade dos negócios jurídicos subsequentes, nomeadamente a venda simulada dos dois imóveis, de que o Autor era proprietário, a duas sociedades offshore, bem como a nulidade das transferências das acções das sociedades “Beach Heath” e da “Goggles Marine”, para terceiros, sem conhecimento do Autor. Pediu ainda que as Rés sejam condenadas a restituir os imóveis referidos, bem como que se ordene o cancelamento dos registos dos mesmos, ou, não sendo a restituição possível, que sejam condenadas a compensar o Autor com valor equivalente ao valor de mercado actual dos imóveis. Por último, peticionou que seja ordenada a restituição das acções da “Beach Heath” e da “Goggles Marine”, ou, não sendo esta possível, que o Autor seja compensado com o valor equivalente ao valor de mercado actual das mesmas.
As Rés contestaram, por excepção e impugnação, invocando além do mais, a incompetência internacional do tribunal português, e a prescrição do direito invocado pelo Autor, concluindo pela improcedência da pretensão do Autor.
O Autor apresentou articulado resposta.
Realizou - se audiência prévia, tendo as partes debatido a matéria das excepções invocadas.
O Tribunal assumiu a competência do tribunal português, e após apreciação de outras prévias, proferiu decisão de mérito, julgando procedente a excepção peremptória da prescrição do direito, e absolveu as Rés dos pedidos.
Conforme ao que se transcreve, na parte que importa ao conhecimento do recurso.       
“Regressando aos elementos constitutivos da causa de pedir descrita pelo Autor, temos que o negócio cuja nulidade pretende ver declarada na presente acção terá sido celebrado durante a década de oitenta do século XX – portanto, há, pelo menos 29 anos, se tivesse tido lugar em 1989; por sua vez, os direitos translativos da propriedade constituídos sobre os imóveis cuja restituição o Autor ora pretende (sem prejuízo do pedido alternativo da entrega de equivalente em dinheiro) ter-se-ão constituído com a celebração – simulada, segundo a alegação do Autor – dos negócios de compra e venda de tais imóveis, as quais teriam ocorrido, respectivamente, em Maio de 1992 e 31 de Julho de 1992 (cf. artigo 34º da p.i.), às sociedades relativamente às quais o Autor ficou constituído como ultimate beneficial owner (UBO), no mesmo período (cf. artigos 40º42º da p.i.). O Autor alegou, em fase mais adiantada dos autos, que só mais recentemente (relativamente àquelas mencionadas datas) ficou ciente de elementos factuais relevantes para peticionar a nulidade do mútuo e dos negócios subsequentemente celebrados sobre os imóveis; mas não é isso que, claramente, transparece da alegação efectuada em sede de petição inicial – veja-se os documentos juntos pelo próprio Autor, relacionados com a constituição das sociedades offshore de cujas acções o mesmo foi constituído “UBO” (cf. docs. fls. 34-39) e, designadamente, a alegação contida no artigo 54º da p.i.: pese embora sempre ter tido conhecimento da atribuição de tal estatuto, por forma a preservar o seu direito sobre os imóveis transferidos para as sociedades, o Autor só muitos anos mais tarde, segundo alegou, é que veio a saber que aquelas acções foram transferidas, logo, em 1992, para a “Societé Bancaire de Paris”, a ora 3ª Ré, na sequência do que deixou de ser “UBO”. Ou seja, ao contrário do que, entretanto, defendeu, o Autor sempre teve conhecimento do negócio cuja nulidade vem agora peticionar, bem como dos fundamentos que, em sua perspectiva, sustentariam tal nulidade; só mais tarde é que ficou ciente da operação, entretanto efectuada que o veio a privar dos direitos patrimoniais sobre os imóveis em questão nos autos (doc. fls. 40 e seguintes) – o que é coisa bem diferente. Com efeito, uma coisa é o Autor estar na posse de todos os elementos constitutivos do negócio, que poderiam ser causa da sua nulidade, mas não suscitar a questão em tempo por não ver interesse nisso; outra coisa é só mais tarde tomar conhecimento de algum facto novo que, sendo-lhe desfavorável, determine a conveniência de levantar essa mesma questão, conhecida muito antes – é o que parece ter acontecido in casu. Finalmente, no que respeita à circunstância de a nulidade poder ser invocada a todo o tempo, dir-se-á que, sendo esse, efectivamente, o regime, o mesmo não pode colidir, naturalmente, com o da prescrição, especialmente, aquela na modalidade ordinária. De outra forma, e usando um argumento ad absurdum, todo e qualquer negócio nulo, ainda que celebrado há cem anos, poderia vir a ser posto em causa. Assim sendo, forçoso é concluir que, entre aqueles factos jurídicos e a data de entrada da acção, decorreram mais de vinte anos, o que, à luz da lei portuguesa, determina a prescrição do direito do Autor, por ter já decorrido o prazo ordinário consagrado no artigo 309º do Código Civil. Sendo que, como acima já se salientou, o Autor não alegou – e, por isso, não poderia provar – que tenha ocorrido algum facto suspensivo ou interruptivo dessa prescrição. Nos termos do artigo 298º do Código Civil, a prescrição consiste na perda ou extinção de um direito disponível ou que a lei não declare isento de prescrição, por virtude do seu não exercício durante certo tempo. Costuma justificar-se este instituto da prescrição, em geral, com a inércia do titular do direito em exercitá-lo, o que faz presumir uma renúncia ou, pelo menos, torna o respectivo titular indigno da tutela do direito, conjugado com a necessidade social de segurança jurídica e certeza dos direitos (cfr. MOTA PINTO, “Teoria Geral do Direito Civil”, 3ª ed., pág. 376). A prescrição constitui um facto extintivo do direito invocado pelo demandante e determina, como excepção peremptória que é, a absolvição dos demandados do pedido. Vieram as Rés e também, posteriormente, o Autor, peticionar a condenação da contra- parte, respectivamente, como litigantes de má-fé.  Considerando a decisão supra, não vislumbramos elementos suficientemente consistentes para poder qualificar a conduta processual de qualquer das partes à luz do instituto da litigância de má-fé, designadamente, no âmbito de alguma das situações consagradas no artigo 542º, n.º 2 do C.P.C.  Assim sendo, sem necessidade de outras considerações, julga-se tal pedido improcedente.”.
Culminando no seguinte dispositivo: “… pelo exposto, julgo procedente a excepção de excepção peremptória de prescrição, em consequência, absolvo as Rés de todos os pedidos formulados pelo Autor. Julgo também improcedentes os pedidos de condenação em sede de litigância de má-fé. Custas pelo Autor”[1]
2. Inconformado o Autor apelou da sentença.
Tendo desenvolvido nas alegações os motivos da sua discordância com o julgado, extraiu a final as conclusões que seguem:
“1. O presente recurso vem interposto da decisão que julgou procedente “…a excepção de excepção peremptória…”, tendo absolvido as Rés/Recorridas de todos os pedidos formulados pelo Autor/Recorrente. 
2. O Tribunal a quo considerou que Rés/Recorridas invocaram correctamente a excepção peremptória de prescrição. 
3. Sucede que, ao ter decidido como decidiu, o Tribunal a quo colocou em causa lei substantiva ou processual.
4. Em primeiro lugar, na sua Decisão o Tribunal a quo não identificou qual a excepção peremptória que julgou procedente. 
5. A referida ambiguidade da Decisão constitui uma nulidade da sentença, prevista no art. 615º nº 1, al. c) do CPC, na medida em que esta ambiguidade ou obscuridade torna a decisão ininteligível. 
6. Em segundo lugar, o Tribunal decidiu julgar que as Rés/Recorridas invocaram a excepção peremptória de prescrição e que esta ocorreu quando, na verdade, as Rés/Recorridas não a invocaram expressa e separadamente, à luz do direito português.
7. Importa referir que, a excepção peremptória de prescrição não é do conhecimento oficioso, em conformidade com os termos conjugados dos arts. 572º al. c), 576º e 579º do CPC, e, por conseguinte, para que o Tribunal pudesse dela conhecer, a mesma tinha de ser invocada expressa e separadamente, por quem aproveita, ou seja, pelas Rés/Recorridas. 
8. No entanto, no caso vertente, as 1ª e 2ª Rés/Recorridas, apenas fizeram uma referência à prescrição num artigo dentro de um capítulo denominado “III. Da litigância de má-fé, não individualizando, separadamente, a pretensa excepção de peremptória de prescrição cuja procedência veio a ser julgada pelo Tribunal, nem, tão pouco, peticionam a final a procedência de tal excepção com as legais consequências que daí pudessem advir.
9. Por sua vez, a 3ª Ré/Recorrida individualizou a prescrição, porém, fê-lo ao abrigo do direito civil francês e não do direito civil português aplicável in casu, pelo que, não se pode considerar correctamente invocação nos termos do direito nacional, uma vez que, são legislações e ordens jurídicas distintas.
10. Acresce que, nenhuma das Recorridas peticionou nos seus Pedidos a final, nas respectivas Contestações, que a excepção peremptória de prescrição, ao abrigo da lei portuguesa, fosse julgada procedente por provada, requerendo, em consequência, a sua absolvição dos pedidos e/ou da instância.
11. Ficou, assim, precludido o ónus que recaia sobre as Recorridas para invocarem expressa e separadamente a prescrição à luz da lei portuguesa.
12. Mais sucede que, a norma do artigo 301º do Código Civil não consagra a comunicabilidade da prescrição, pelo que, ainda que a 3ª R. a tivesse invocado cumprindo os formalismos previstos no art. 572º do CPC, à luz da lei civil portuguesa – o que não aconteceu - não poderiam de ela beneficiar a 1ª e 2ª Rés/Recorridas.
13. Assim tem entendido a jurisprudência, designadamente, os Acórdãos do Tribunal da Relação de Évora, de 3/11/2016, Processo nº 33/12.4TBGLG.E1; do Supremo Tribunal de Justiça, de 21/09/1993, Proc. nº 9549/84 e do Tribunal da Relação de Coimbra, de 14/11/2000, na Colectânea de Jurisprudência 2000, 5ª – 19.
14. Procedimentalmente existe uma impossibilidade prática do Tribunal a quo na apreciação da referida excepção, porquanto, a mesma foi feita de forma encapotada e indevidamente pelas Rés/Recorridas nas respectivas Contestações, facto que o próprio Tribunal reconhece expressamente no aresto de que ora se recorre, quando refere que “Embora não de forma destacada, também as restantes Rés invocaram a prescrição…” [sublinhado nosso].
15. Contudo, ao invés de o Tribunal se declarar impossibilitado de apreciar tal excepção, considerando que o art. 572º conjugado com o art. 579º do CPC impede o seu conhecimento, julgou-a procedente, entendimento este que a lei expressamente proíbe, em obediência aos princípios da cooperação e da boa-fé processual. 
16. No mesmo sentido, veja-se o que análoga e expressamente se dispõe quanto à dedução da Reconvenção no artigo 583.º do CPC.
17. A decisão de apreciar uma excepção que as Recorridas encapotam na sua defesa por impugnação viola claramente o disposto na alínea c) do artigo 572.º do CPC, que prevê que a falta de especificação separada das excepções deduzidas tenha como sanção não poderem ser considerados admitidos por acordo os factos que lhe deram origem.
18. E ofende o princípio da boa fé processual subjacente à introdução da disposição do art. 572º al. c) no nosso ordenamento jurídico, conforme refere o preâmbulo do Decreto-Lei 329 A/95 de 29/12: “Em matéria de contestação, por razões de clareza e em concretização do princípio de boa fé processual, estabeleceu-se que o réu deverá deduzir especificada e discriminadamente a matéria relativa às excepções deduzidas e formular, a final, e em correspectividade com a exigência formal de dedução do pedido que é feito ao autor, as conclusões da sua defesa”.
19. Neste sentido veja-se os doutos Acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa, de 13/07/2016, proferido no âmbito do processo nº 2073/14.0TTLSB.L1-4 (disponível em www.dgsi.pt) e da Relação de Coimbra, de 4/05/2004, Processo nº 642/04. (cfr. em bdjur.almedina.net). 
20. Em virtude do exposto, resulta demonstrado que o Tribunal de 1ª instância, ao ter decidido como decidiu, violou lei substantiva e concretamente o disposto nos arts. 572.º, alínea c) conjugada com o 579º do CPC.
21. O aresto ora em crise atenta contra lei expressa, padecendo de manifesta nulidade, por excesso de pronúncia, nos termos sobreditos, por ter conhecido de questões de que não lhe era lícito conhecer, nos termos do artigo 608º e 615, nº 1, alínea d), do CPC
22. Adicionalmente, o Recorrente não pode concordar nem se conformar com a douta Sentença na parte em que condiciona a arguição de nulidade a um prazo de prescrição, quando a lei não o prevê.
23. Dispõe o art. 286º do Código Civil que “A nulidade é invocável a todo o tempo…”
24. Conforme doutrina do Prof. Dr. Carlos Alberto da Mota Pinto: as nulidades são insanáveis pelo decurso do tempo.
25. E segundo a jurisprudência do Tribunal da Relação de Lisboa: “Não está sujeita a limite temporal a declaração judicial de ineficácia por lhe ser aplicável este art.”, isto é, o art. 286º do Código Civil (Cfr. Ac. TRL de 23/07/1975: BMJ, 251.º - 200).
26. O que, por sua vez, está sujeito a prazo de prescrição são as obrigações decorrentes de negócios nulos.
27. Neste âmbito veja-se o douto Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, datado de 25/05/2017, Processo nº 1123/09.6TBOLH-G.E.1, segundo o qual: “Embora a nulidade do negócio seja invocável a todo o tempo (…)(cfr. artigo 286.º do Código Civil), tal não significa, que à restituição da importância mutuada não seja aplicável prazo prescricional e possa ser reconhecida a prescrição do direito a tal quantia pelo decurso do tempo, não obstante a nulidade do negócio que importa a restituição, sendo de concluir que as obrigações decorrentes de negócios nulos não são imunes à eficácia da prescrição.”. 
28. Acresce que, o art. 306º, nº 1 do CC dispõe que: “O prazo da prescrição começa a correr quando o direito puder ser exercido…”
29. Sucede que, in casu, o Recorrente esclareceu na sua Petição inicial, o mesmo não sabia quem tinha sido a entidade mutuante, nem no ano 1992, nem nos anos que se seguiram e só teve pleno conhecimento de todos os negócios realizados e dos seus intervenientes a partir do Ano 2012, mais precisamente, em 2016, no decurso de um processo que a 1ª Ré/Recorrida propôs contra a mãe do Autor/Recorrente.
30. Antes disso, o ora recorrente não estava em condições de exercer os seus direitos. 
31. Antes das datas supramencionadas o Autor/Recorrente desconhecia a entidade mutuante; que as acções da 1ª Ré  B e da sociedade Goggles Marine, Limited, tinham sido transmitidas para a Societé Bancaire de Paris, ou seja, actualmente, a 3ª R. e, posteriormente para a C , 2ª Ré, e desconhecia, que havia pedido o direito de propriedade sobre os dois imóveis em causa nos presentes autos.
32. Ou seja, até às datas supra referidas, e mais precisamente, até 2016, o Autor/Recorrente desconhecia os danos que se consubstanciaram na perda dos dois imóveis identificados nos autos.
33. Pelo que, o Recorrente só pôde exercer o seu direito a partir de junho de 2016, o que fez, atempadamente, por meio do presente acção, pelo que, não ocorreu qualquer prazo de prescrição, pelo que, a presente acção, que é atempada, requerendo-se por isso a sua procedência.
34. Por todo o exposto, requer-se a esse Venerando Tribunal a revogação da decisão proferida, devendo os autos prosseguir os seus termos até final para apreciação da nulidade arguida pelo Autor/Recorrente na sua Petição Inicial.
Pugnando a final pela procedência do recurso e, consequentemente, declarada a nulidade da sentença, por ambígua ou obscura, que a torna ininteligível; caso assim não se entenda, procedente por verificada a nulidade da sentença por excesso de pronúncia, ou caso assim não se entenda, procedente e revogada a sentença e substituída por decisão que reconheça que as arguidas  nulidades do negócio jurídico são  invocáveis a todo o tempo, não estando sujeitas a prazo de prescrição; ou caso assim não se entenda, procedente e, revogada a sentença, seja substituída por decisão que reconheça que o Recorrente só podia exercer o seu direito a partir de junho de 2016, ou, na pior das hipóteses, a partir dos anos 2008 ou 2012, pelo que, o seu direito não se encontra prescrito, devendo os autos prosseguir os seus termos até final para apreciação dos Pedidos na presente acção.”
As RR contra-alegaram, refutando por inteiro a argumentação do recorrente.
*
Colheram-se os vistos e nada obsta ao conhecimento do mérito do recurso.

3. Objecto do Recurso –Thema decidendum  
São as conclusões que delimitam a esfera de actuação do tribunal ad quem- artigos 635º, nº4 e 639º, nº1, do Código de Processo Civil - salvo em sede da qualificação jurídica dos factos, ou relativamente a questões de conhecimento oficioso, não podendo ainda conhecer de questões novas; o tribunal de recurso também não está adstrito à apreciação de todos os argumentos recursivos, debatendo  apenas aqueles que se mostrem relevantes para o conhecimento do recurso, e não resultem  prejudicados pela solução preconizada – artigos 608.º, n.º 2, do CPC, ex vi do artigo 663.º, n.º 2, do mesmo diploma.
Posto o que, do cotejo das conclusões do apelante resulta que o empreendimento analítico abrange as seguintes questões:   
- Nulidade da sentença por excesso de pronúncia; Nulidade da sentença por ambiguidade da decisão;
- Pressupostos do julgamento de mérito da causa no despacho saneador; soluções plausíveis do direito; os factos controvertidos e o conhecimento de mérito da excepção da prescrição do direito peticionado.
II. FUNDAMENTAÇÃO
A. Dos Factos
A matéria de facto a levar em conta para efeitos decisórios é a constante do Relatório.
B. Enquadramento Jurídico
1.1 O objecto e mérito do recurso reconduz-se, em síntese, à seguinte vexata quaestio:
- O Juiz de primeira instância estava ou não habilitado a antecipar o julgamento da causa, pronunciando-se de imediato sobre o mérito do pedido do Autor?
Em suporte argumentativo do sentido contrário ao adoptado na sentença sob recurso, o apelante invoca obstáculos de índole processual e de natureza substantiva.
A apreciação das diversas conclusões recursivas pela sua intrínseca conexão normativa, aconselha a ordenação lógica da abordagem do modo que segue.
1.2 Primo, apontando à sentença a nulidade tipificada na alínea d), 2ª parte, do nº 1 do artigo 615 do Código de Processo Civil - excesso de pronúncia.
Uma nota breve sobre o enquadramento normativo preliminar da questão.  
A violação das normas processuais que regulam - artigos 607º a 609º do Código de Processo Civil- a elaboração da sentença enquanto acto processual- traduz vício formal ou error in procedendo, e pode implicar, ademais, a cominação de alguma das nulidades tipificadas nas alíneas do nº 1 do artigo 615 do Código de Processo Civil.[2]
Conforme dispõe o artigo 608, nº 1, do Código de Processo Civil, cumpre ao juiz conhecer na sentença - em primeiro lugar, de todas as questões processuais (suscitadas pelas partes ou que sejam de conhecimento oficioso, e não se encontrem prejudicadas) que determinem a absolvição do réu da instância, e após, conhecer das questões de mérito - do pedido (s) do autor, pedido(s) reconvencional, pretensão do terceiro oponente e das excepções peremptórias.
Somente conhecerá das questões suscitadas pelas partes, ou, daquelas outras, cujo conhecimento oficioso a lei autoriza ou impõe, (como no caso das denominadas excepções impróprias) excepto se a respectiva apreciação se mostrar precludida pela solução dada a outras questões, de harmonia com o preceituado no citado artigo 608, nº2 do CPC.
Significando que o legislador não permite validar decisão que extravase o domínio da questão indicada e com o conteúdo definido pelos sujeitos processuais, vedando ao julgador determinar efeitos jurídicos não abordados no desenvolvimento da lide, nem apreciar questões omitidas nos articulados. É adentro do perímetro desenhado pelo pedido do Autor, assente no descritivo factual e fundamentos que delimitam a causa de pedir, e dos avançados pela defesa, que o tribunal se moverá para alcançar a resolução do litígio.
Trata-se de matéria sedimentada na doutrina e jurisprudência que não justifica no contexto maior indagação dogmática.  
Verifica-se, por conseguinte, excesso de pronúncia[3] caso o julgador conheça de questões não suscitadas pelas partes ou que não sejam de conhecimento oficioso, por força do disposto na 1ª parte da alínea d) do nº 1 do artigo 615º do Código de Processo Civil.
1.3. Revertendo ao caso dos autos.
O recorrente manifesta dissentimento sobre a sentença que julgou a acção improcedente, por ter conhecido oficiosamente da prescrição do direito peticionado, cuja invocação dependente da vontade do interessado. 
Dispõe o artigo 303 do Código Civil que o tribunal não pode suprir, de ofício, a prescrição; esta, para ser eficaz, deve ser invocada, judicial ou extrajudicialmente, por aquele a quem aproveita.
O Recorrente pugna pela nulidade da decisão que concluiu pela procedência da excepção da prescrição do direito que peticionou, uma vez que as Rés (em particular as 2ª e 3ª RR) não invocaram a excepção pela forma processual exigida - artigo 571, nº2 e 572 al) c) do CPC - passando o tribunal a apreciar matéria vedada ao conhecimento oficioso, e assim incorrendo em excesso de pronúncia.
A este propósito estatui o artigo 572 al) c) que, na contestação deve o Réu: “Expor os factos essenciais em que se baseiam as excepções deduzidas, especificando-as separadamente, sob pena de os respetivos factos não se considerarem admitidos por acordo por falta de impugnação;(.)”
Com efeito, este ónus de alegação do Réu, assente no princípio geral da boa-fé processual, visa acautelar o Autor de um articulado amalgama entre a defesa por impugnação e excepção, deixando passar alguma excepção “oculta”,[4] e lhe acarrete o efeito cominatório da admissão por confissão/falta de impugnação, em  aplicação do disposto no artigo 574 ex vi do artigo 587, n1 do CPC.
Na situação ajuizada.
Ao longo da contestação a 1ª R rebatem cada um dos fundamentos do pedido principal e subsidiário do Autor, aduzindo em sua defesa factualidade contrária, e bem assim a aplicação de lei estrangeira, culminando com a defesa expressa (no que se prende com a nulidade por simulação do mútuo) pela verificação do efeito da prescrição, decorridos mais de 20 anos, configurando ademais abuso de direito. Assim consta do artigo 156º da sua Contestação.
De igual modo, as 2ª e 3ªRR na sua contestação – artigos 54ª a 66º - invocam de forma expressa a excepção da prescrição do direito peticionado pelo Autor, seja à luz da lei francesa, (alegam a sua conexão para a apreciação do litígio dos autos), ou da lei portuguesa, destacando no final do articulado, sob a alínea b), o pedido de procedência da excepção da prescrição.    
Seguidamente, o Autor juntou articulado resposta e debateu profusamente as excepções invocadas pelas RR. (concretizando nos artigos 24, 25,26 o respeitante à prescrição do direito de arguir a nulidade da simulação do negócio- mútuo).
Para concluir, à semelhança da tese reiterada em recurso, que deverá prevalecer a possibilidade de o interessado arguir a todo o tempo a nulidade do negócio jurídico, atento o disposto no artigo 286 do Código Civil.
No decurso da audiência prévia, o tribunal suscitou a discussão sobre a matéria da excepção peremptória da prescrição,[5] e o Autor convidado a pronunciar-se por escrito ; por esta via, erradicando a incompreensão do Autor, sanando-se eventual irregularidade. [6]
O Autor produziu então articulado/pronúncia adrede, seguido do contraditório das RR.
Do que se extrai com nitidez que as RR. cumpriram o ónus processual na arguição da excepção da prescrição, em adverso ao afirmado pelo apelante.
A matéria da excepção da prescrição invocada pelas RR. foi claramente identificada pelo Autor, motivando a sua resposta, e mais adiante pronúncia autonomizada, estando satisfeito na íntegra o imperativo legal consagrado no artigo 3, nº3 do CPC.  [7]
Em suma, a sentença apreciou matéria alegada pelas RR, de forma válida e regular e, sobre a qual o apelante/autor exerceu resposta e contraditório.              
Não se verifica a nulidade por excesso de pronúncia, que improcede.
1.4 Secundo, sustenta o apelante que a sentença enferma da nulidade contemplada no artigo 615, nº1, al) c do CPC, pois que do dispositivo consta a procedência “da excepção” que não se identifica, causando ambiguidade no julgado.
A questão não merece detença, e surpreende que haja provocado na apelante dificuldade na apreensão- percepção do sentido decisório.
O desenvolvimento da fundamentação da decisão, leva a concluir, sem margem para equívocos, que é da excepção peremptória da prescrição que se trata, e não de nenhuma outra; a subsistir, sempre acudiria a rectificação do mero lapso de escrita, talqualmente a Senhora Juiz veio a reconhecer no despacho ulterior.[8]      
2. Adicionalmente o apelante mostra-se inconformado por ter a sentença antecipado o julgamento da causa, por duas ordens de razões, a saber – o pedido de declaração de nulidade por simulação do negócio celebrado com as RR( e consequente efeito translativo sobre os imóveis envolvidos), segundo o seu entendimento, não está sujeito a prazo legal; e, na hipótese de prevalência do prazo de prescrição do direito , alegou factos que pretende provar, demonstrativos de que o conhecimento  do seu direito ocorreu em momento ulterior à celebração do negócio simulado, devendo os autos prosseguir para instrução e julgamento.        
Aportamos agora ao núcleo substantivo do objecto do recurso.  
2.1. Do conhecimento de mérito na fase do saneador.
Como é sabido o julgador pode nessa fase conhecer do pedido (ou de algum deles), desde que, caucionado pela condição imposta pelo artigo 595, nº1 al) b do CPC − o estado do processo o permitir.
A seu propósito estatui o artigo 595 do CPC:
1 - O despacho saneador destina-se a:
a) Conhecer das exceções dilatórias e nulidades processuais que hajam sido suscitadas pelas partes, ou que, face aos elementos constantes dos autos, deva apreciar oficiosamente;
b) conhecer imediatamente do mérito da causa, sempre que o estado do processo permitir, sem necessidade de mais provas, a apreciação, total ou parcial, do ou dos pedidos deduzidos ou de alguma exceção perentória.
Damos por adquirido que as alterações normativas acomodaram evolução na concepção teórica-dogmática do conhecimento de mérito no saneador. [9]
Com a reforma de 1996,[10] mantida no novo CPC, abandonou-se a tradicional dicotomia entre questão de direito e de facto, cingindo-se a possibilidade - “conhecer imediatamente do mérito da causa, sempre que o estado do processo permitir, sem necessidade de mais provas.” 
A partir deste quadro normativo, sinaliza-se dissonância na doutrina[11] e na jurisprudência ,[12] quanto a admitir-se,  ou não, o conhecimento de mérito no saneador nas situações, em que estando o juiz seguro da solução jurídica para o litígio,  alicerçada em factos assentes aptos, permanecem ainda factos relevantes controvertidos para a decisão da causa, de acordo com as várias soluções plausíveis de direito.
À parte da hesitação do julgador na casuística de certas situações, supomos, contudo, fiável afirmar que, ante a estrutura do processo civil, ressalvadas as situações excluídas por lei, toda a causa poderá ser julgada na fase intermédia do processo, posto que o julgador conclua que o proveito da fase instrutória seja indiferente para o destino do litígio.
O actual Código Processo Civil assim o determina, designadamente pelo disposto nos seus artigos 6º, 130 º e 152º.
Salvaguardada fica, por seu turno, a hipótese de o tribunal de recurso preconizar distinta solução jurídica da assumida pela sentença, e não dispondo os autos de elementos para decidir, determine a ampliação factual da causa, conforme o estatuído no artigo 662, nº 2, al. c) do CPC.       
2.2. Retomando o caso dos autos.
Razões de segurança e certeza jurídicas do ordenamento, leva-nos a admitir como solução plausível de direito, segura e consistente na composição do litígio, a opção da sentença em recurso, ao considerar prevalecente a prescrição sobre a possibilidade de invocação da nulidade do negócio jurídico a todo tempo.[13]  
Aderindo embora à orientação que perfila em modo amplo o conhecimento de mérito no despacho saneador, não é, mesmo assim, viável o imediato conhecimento do pedido, quando permaneçam controvertidos factos relevantes sob um juízo de prognose antecipado.
Doravante, na situação com que nos defrontamos no caso sub judice, verifica-se uma notória subsistência de factos controvertidos, cuja prova de apreciação livre, interfere frontalmente com o desfecho da causa, sob a solução jurídica da prescrição.  [14]
Explicitando.
Nos termos do artigo 298 do Código Civil, a prescrição consiste na perda ou extinção de um direito disponível ou que a lei não declare isento de prescrição, por virtude do seu não exercício durante certo tempo.
Por seu turno, à luz de uma das soluções plausíveis de direito, o termo inicial do prazo de prescrição coincidirá com o conhecimento  pelo lesado “do direito que lhe compete”, i.e, dos elementos/pressupostos que condicionam o seu exercício.[15]
O Tribunal a quo antecipou a decisão de mérito, fundamentando-se nos elementos documentais das relações contratuais juntos pelo próprio Autor (cf. docs. fls. 34-39 e 40).
Documentos que sob a sua apreciação crítica, contrariam o conhecimento ulterior da operação pelo Autor, que alegadamente o privou dos imóveis, parecendo outrossim, que só muito mais tarde é que teria tomado conhecimento de eventual facto novo desfavorável que despoletou a conveniência na arguição da nulidade por simulação do negócio celebrado na década de 80.
Incontornável é que o Autor alegou factualidade susceptível do efeito interruptivo no decurso do prazo de prescrição de 20 anos, em que assentou a sentença (artigo 309 do Código Civil).
Daí que, estando essa matéria de facto controversa entre as partes, e a sua demonstração aferível, v.g. por depoimento testemunhal, assiste ao Autor o direito de perseverar no direito à respectiva prova (com ou sem êxito); com a finalidade de demonstrar que o seu conhecimento do direito peticionado ocorreu em data ulterior à celebração do negócio jurídico/mútuo bancário - cf. artigos 76º, 77º,78º da PI., e,28º, 30º a 38º do articulado aperfeiçoado e pronúncia sobre a excepção da prescrição.[16]
É de sublinhar que, a desnecessidade ou inutilidade da produção de prova sobre factos necessários controvertidos face à solução jurídica eleita, não se equivale no momento do saneador, à suficiência da convicção antecipada do julgador sobre a realidade dos mesmos factos.
Neste momento processual, em ordem a alicerçar a conclusão de que está habilitado a conhecer de imediato do pedido, o juiz não pode cingir-se à sua percepção da realidade do facto relevante e controverso, motivada apenas  pelos elementos documentais [17](ou outros) já disponíveis nos autos.
Nos autos, está controvertido que o autor tivesse conhecimento dos factos tendentes à invocação da nulidade por simulação em data contemporânea à celebração do negócio, ou só ulteriormente, conforme alegou.
Deixando dúvidas sobre tal contemporaneidade, factualidade que intercepta objectivamente o rumo de procedência ou improcedência da excepção da prescrição, segundo as soluções plausíveis de direito, o estado da causa não permite antecipar o julgamento no saneador, sem a produção da prova testemunhal indicada, em audiência final.
Os objectivos de economia e gestão processual e parcimónia de custos, tão caros à administração da justiça, cederão, na medida necessária, para o exercício do direito à acção e do direito à prova, vertentes do princípio constitucional do acesso ao direito e à tutela jurisdicional efectiva -artigo 20, nº1 da Constituição da República Portuguesa.        

Em conclusão, não se verifica, pois, o pressuposto legal estabelecido no artigo 579, nº2 al) b do CPC que habilita o conhecimento de mérito do pedido.
Colhem em parte as conclusões do apelante, devendo os autos prosseguir, a fim de se completar a instrução e julgamento da causa.
Na procedência do decidido, mostra-se prejudicada a apreciação das demais questões a montante.
III.DECISÃO
Posto o que precede, acordam os juízes deste Tribunal da Relação em julgar procedente o recurso, e em consequência decidem:
a) anular a sentença recorrida;
b) O prosseguimento dos termos da instância com vista à produção da prova em audiência de discussão e julgamento, conhecendo-se a final da matéria da excepção, e do mais que ocorra então decidir.
*
As custas do recurso são a cargo das RR., em igual proporção.  
  
Lisboa, 19 de Maio de 2020 
ISABEL SALGADO
CONCEIÇÃO SAAVEDRA
CRISTINA COELHO
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[1] Na versão final, após a rectificação do lapso de escrita, ao abrigo do disposto no artigo 614 do CPC, conforme despacho de fls.275, de 21.11.2019.  
[2] Note-se que embora em certas situações não isentas de dúvidas na separação, o regime do preceito é de estrita aplicação às denominadas nulidades de julgamento, distinguindo-se das nulidades do processo (artigo 195 do CPC) -cfr. CPC anotado, I, A. Geraldes, P. Pimenta e P. Sousa, volume I, pág. 762.     
[3] Atenta a génese do processo civil como “processo de partes” e ao princípio do dispositivo segundo o vector consagrado no artigo 3, nº2 do CPC –cabe às partes a disponibilidade do objecto do processo /disponibilidade do pedido, das questões e dos factos necessários à decisão desse pedido.
[4]   De resto, como bem salientam os insignes processualistas na obra acima citada, pág.666/7: “Tratar-se-ia de um verdadeiro caso de benefício do infrator que o sistema repudia, tanto mais que nem sempre é fácil identificar, de entre os factos que são invocados, aqueles que apresentam com natureza impeditiva, modificativa ou extintiva do direito do autor, em função da diversidade ou da complexidade das normas de direito material aplicáveis (cf. Nota 5 ao art.579).                
[5] Cf. acta do acto realizado no dia 21.02.2019, a fls.178/9.
[6] Também na obra citada, pág. 667, “O sistema ainda não foi ao ponto de cominar com a ineficácia pura e simples a alegação feita na excepção que traduza exceções ocultas (…). Independentemente disso, a invocação de exceções sem a adequada especificação implicará irregularidade da contestação, devendo ser proferido despacho pré-saneador de convite ao aperfeiçoamento da peça, nos termos do art.590º, nº3.”     
[7] Acerca da ratio do artigo 3, nº3 do CPC, v.g. o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 259/2000; DR, II série, de 7 de novembro de 2000: “A norma contida no artigo 3.º, n.º 3 do CPC resulta (…) de uma imposição constitucional, conferindo às partes num processo o direito de se pronunciarem previamente sobre as questões - suscitadas pela parte contrária ou de conhecimento oficioso - que o tribunal vier a decidir.”
[8] Datado de 21.11.2019.
[9] Cf. Resenha histórica por Paulo Ramos de Faria, “Relevância das (outras) soluções plausíveis da questão de direito”, in Revista Julgar, versão online, outubro 2019, 7.             
[10] Cf.  artigo 510, nº1 al) b do CPC (na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 180/96, de 25.09) - “conhecer imediatamente do mérito da causa, sempre que o estado do processo permitir, sem necessidade de mais provas, a apreciação, total ou parcial, do ou dos pedidos deduzidos.”
[11] Na doutrina, advogando a oportunidade do imediato conhecimento do pedido, no caso de a prova dos factos residuais controvertidos não possa de modo algum afectar o sentido da decisão final-cf. A. Geraldes, in Temas da Reforma de Processo Civil, Vol. II, pág. 132, e também A. Geraldes P. Pimenta, Luís P. Sousa in CPC anotado, I, pág.721/2; em sentido contrário, Miguel Teixeira de Sousa em comentário ao Acórdão do TRG de 14.03.2019, disponível em blogippc. blogspot e também neste blog no post “Conhecimento de excepções peremptórias no despacho saneador? Depende!”.    
[12] Cf. entre outros os Acórdãos do TRL desta 7ªsecção, de 22.01.2019 (Relator-Diogo Ravara); de 23.10.2018(Relator José Capacete) e, de 18.12.2012 (Relator-Cristina Coelho), todos disponíveis in www.dgsi.pt.  
[13]  E, assim considerar-se precludida na situação em que o direito emergente do mesmo negócio, sem a validade imputada, se mostre já extinto por prescrição; observe-se ainda em amparo, que a nulidade de negócio jurídico não constitui motivo de suspensão ou interrupção da prescrição, conforme resulta da interpretação a contrario do disposto nos artigos 318 a 327º, do C. Civil, sendo certo que, o regime da prescrição é inderrogável -artigo 300, do C. Civil- e, a renúncia da prescrição só é admitida depois de haver decorrido o prazo prescricional -artigo 302, n.º 1, do C. Civil.
[14]  Privilegiando razões de segurança e certeza jurídicas, o instituto da “prescrição”, na vertente extintiva, sobrepõe-se à possibilidade de invocação da nulidade do negócio jurídico a todo tempo, devendo assim considera-se precludida, nas situações em direito emergente do mesmo negócio, se revele já extinto por prescrição.
[15] Cf. Manuel de Andrade, in Teoria Geral, vol. II, pg. 448 “(…) não pode dizer-se que haja negligência da parte do titular direito em exercitá-lo enquanto ele o não pode fazer valer por causas objectivas, isto é, inerentes à condição do mesmo direito.”
[16]  Transcreve-se parte dessa alegação de factos: “30 º em 1992 o A. era o ultimate benefitial owner da Ré Beach Heath e da Goggles Marine, Limited, pelo que, na prática, em 1992 o A. era ainda o real proprietário das acções, e consequentemente, das fracções em causa.” º31. Acresce que, não lhe foram comunicadas as condições para o reembolso do mútuo, nem a data em que o mesmo lhe foi concedido, sendo certo que, o A. também não configurou por esta ausência de informação, que pudesse haver algum problema com o mútuo que pudesse conduzir à transmissão das acções à sua revelia, uma vez que, era visita da casa de família dos Espírito Santo”;  32. Só em 2008, quando foi outorgado o contrato de compra das acções1, é que foram estabelecidas, em bom rigor, as condições de reembolso do mútuo celebrado. 33. De facto, até aquela data o A. não sabia ter sido desapossado das acções das sociedades Beach Heath e Googles Marine e que tinha de as recomprar, uma vez que, a sua mãe sempre teve a posse das duas fracções do imóvel sito na Rua das Praças, nº 30, em Lisboa, e em momento algum foi exigido ao A. ou à sua mãe a entrega das mesmas por quem quer que fosse e muito menos por alguém em representação da Ré Beach Heath. 34. Nesta medida, o A. só teve pleno conhecimento de todos os negócios realizados e dos seus intervenientes através da acção proposta em 10/09/2012, pela Ré Beach Heath, contra a mãe do A., citada em 17/09/2012, para reivindicar o imóvel melhor identificado nestes autos, sito na Rua das Praças, nº 30, em Lisboa, no qual o A. foi testemunha e que correu termos no Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, Juízo Central Cível, Juiz 20, Processo nº 1755/12.5TVLSB. 35. Pelo que, só a partir da data da citação da mãe do A. para a acção supra identificada – 17 de Setembro de 2012 – é que o A. foi tomando conhecimento, através das informações e documentos que foram sendo juntos ao processo, de que o mútuo em crise foi efectuado e concedido pelo BESV e que as acções da Beach Heath foram, sucessivamente, transmitidas para a Societé Bancaire de Paris (actual BESV) e depois para a Multiger, e o mesmo aconteceu com as acções da sociedade Googles Marine, sem que tivesse sido dado conhecimento disso ao A., que havia sido o ultimate benefitial owner de ambas as sociedades cujas acções foram transmitidas (cfr. doc. nº 1 – citação no Processo nº 1755/12.5TVLSB – que ora e junta e se dá por integralmente reproduzido
[17] Não estando em causa, como se disse, factos sujeitos a prova vinculada.