Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
7283/19.0T8LSB.L1-9
Relator: CALHEIROS DA GAMA
Descritores: CÚMULO JURÍDICO
PENA DE PRISÃO SUSPENSA NA SUA EXECUÇÃO
PENA EFECTIVA DE PRISÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 12/11/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: PROVIDO
Sumário: I- Na determinação da pena única, em caso de concurso de infracções, as penas cuja execução foi suspensa na sua execução devem ser cumuladas quando o conhecimento do concurso é superveniente, inclusivamente com penas de prisão não suspensas;
II-Procedendo-se ao cumulo das penas e dai fixando-se a pena única, ou tal pena única é superior a 5 anos de prisão, inviabilizando legalmente a suspensão da sua execução (vd. primeira parte do n.° 1 do art. 50.° do Código Penal) ou é inferior, permitindo-o. Momento em que, então, o tribunal a quo terá de efetuar o seu próprio juízo de prognose (favorável ou não quanto ao futuro), como igualmente exige a segunda parte do mencionado art. 50°, do Código Penal, daí retirando as consequentes ilações.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, na 9a Secção (Criminal) do Tribunal da Relação de Lisboa:

I — Relatório
1. No âmbito do NUIPC 7283/19.0T8LSB, após se ter procedido à realização de audiência, nos termos e para efeitos do disposto no artigo 472.°, do Código de Processo Penal, com observância do estrito formalismo legal conforme se alcança da respetiva acta, por acórdão, proferido a 30 de Maio de 2019 pelo Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa - Juízo Central Criminal de Lisboa - Juiz 11, foi decidido não cumular juridicamente as penas aplicadas nos processos n°s. 60/16.2SVLSB, 108/17.3PAAMD, 670/ 17.0GLSNT, 173/17.3GDSNT, 218/16.4GDSNT e 664/16.3PULSB, ao arguido AA, solteiro, jardineiro, nascido a …………, filho de BB e de CC, natural da freguesia da Reboleira, concelho da Amadora, residente na Rua …………………….., Belas.
2. O Ministério Público, inconformado com a mencionada decisão, interpôs recurso extraindo da sua motivação as seguintes conclusões:
"1 - O Tribunal Colectivo entendeu não integrar no cúmulo jurídico das penas que estavam em concurso, porque considera não haver lugar a cúmulo entre penas efectivas e penas com execução suspensa, atenta a sua diferente natureza.
2 — Estavam em causa as penas aplicadas nos Processos n°s. 60/16.2SVLSB, 108/17.3PAAMD, 670/17.0GLSNT, 173/17.3GDSNT, 218/16.4GDSNT e 664/16.3PULSB.
3- As penas em concurso são: 2 anos e 5 meses de prisão, suspensos na sua execução por idêntico período — Processo n°. 60/16.2SVLSB; pena de 220 dias de multa, à taxa diária de €6,00, no total de €1.320,00 — Processo n°. 108/17.3PAAMD; 2 anos e 4 meses de prisão, suspensos da sua execução por 3 anos - Processo n°. 670/17.0GLSNT; 7 meses de prisão efectiva, já cumprida — Processo n°. 173/17.3GDSNT; 2 anos e 6 meses, suspensos por idêntico período — Processo ri°. 218/16.4GDSNT; 2 anos de prisão suspensos por idêntico período — Processo n°. 664/16.3PULSB.
4 - No Ac. do STJ de 12.3.2015 do Senhor Conselheiro Souto de Moura em que o mesmo explica porque mudou de posição e aderiu à posição agora defendida na presente Motivação de Recurso, refere-se que: "Ao peso do argumento centrado na diferente natureza das penas, tem que ser contraposta a concreta realidade da pena de substituição. (....)
Ora, é aceitável que, assim como existem razões que podem levar à revogação da pena suspensa com o renascimento da pena substituída, também pode haver outro motivo, de diferente cariz, para que se abandone a pena de substituição e se passe a considerar a pena substituída."
A necessidade de realizar um cúmulo pode ser esse motivo, porque vai haver um momento de apreciação da ilicitude global dos factos e da personalidade do arguido, em que se justifica ver se a aplicação da pena de substituição, a uma parcelar que em princípio deveria fazer parte do cúmulo, já não tem razão de ser. Designadamente, se lal viabilizar a execução de uma única pena conjunta com todas as vantagens daí resultantes, e, por maioria de razão, se não redundar em prejuízo do arguido.
São por demais conhecidas os inconvenientes da aplicação, por exemplo, de penas mistas de prisão e multa, mas também não deixam de criar situações absurdas, as execuções simultâneas de penas de prisão e de 'Penas suspensas".
5- No mesmo sentido se pronunciou o Exm° Juiz Conselheiro Rodrigues
Costa in cúmulo Jurídico na Doutrina e na Jurisprudência do STJ", acessível no site do STJ (www.stj.pt):"Se, porém, uma pena parcelar tiver sido suspensa na sua execução, o que frequentemente sucede nos cúmulos jurídicos em que o conhecimento do concurso de crimes é de conhecimento superveniente, (Tara efeito de formação da pena conjunta relevará a medida da prisão concretamente determinada», e, uma vez determinada aquela, (w tribunal decidirá se ela pode legalmente e deve político-criminalmente ser substituída por pena não detentiva."
6 — A Doutrina e Jurisprudência estão, no essencial, de acordo e citando por facilidade o Tribunal da Relação de Lisboa, no Acórdão de 2.11.2011 que: "No concurso superveniente de infracções, citando, com a devida vénia, o acórdão do STJ de 2.06.2004 In, C.J. STJ, Tomo II, pág.221., "tudo se passa como se, por pura ficção, o tribunal apreciasse, contemporaneamente com a sentença, todos os crimes praticados pelo arguido, formando um juízo censório único, projectando-o retroactivamente". Isto porque o nosso sistema rejeita uma visão atomística da pluralidade dos crimes, instituindo a pena conjunta, ou única, como a sanção ajustada à unidade relacional de ilícito e de culpa, numa ponderação do conjunto dos crimes e da relação da personalidade com o conjunto dos factos."
7 - Ora, se assim é, não se entende, quanto mais não seja em nome do principio da igualdade de tratamento, que, no caso do concurso de crimes apreciado em conjunto e no mesmo momento, o Tribunal não aprecie a possibilidade da suspensão de execução das penas parcelares e só a final e relativamente à pena única tenha se ponderar tal possibilidade se a medida da pena concreta o consentir e que no caso do conhecimento superveniente, em que "tudo se passa como se, por pura ficção, o tribunal apreciasse, contemporaneamente com a sentença, todos os crimes praticados pelo arguido, formando um juízo censório único, projectando-o retroactivamente", o Tribunal não possa apreciar os crimes que objectivamente estão numa relação de concurso apenas porque, por contingências do sistema, não conheceu deles na mesma altura.
8 - Nos presentes autos, o Tribunal deu como provados todos os factos necessários à realização do cúmulo jurídico e à determinação da pena concreta aplicável.
9 - Foi realizada a audiência de cúmulo e constam dos autos todas as certidões dos processos cujas penas se encontram numa relação de concurso.
10- No caso dos autos, das seis penas a cumular, quatro tratam-se de penas de prisão suspensas na sua execução.
11- Apenas uma é de pena de prisão efectiva — sete meses, já declarada extinta pelo cumprimento, o que, nos termos do disposto no artigo 78°., n°. 1, do Código Penal, não impede a realização do cúmulo jurídico, sendo o tempo já cumprido descontado na pena única que vier a ser aplicada.
12- Existe ainda uma pena de multa, a aplicada no Processo n°. 108/17.3PAAMD, única desta natureza das que se encontram em concurso, e que, como tal, ao abrigo do preceituado no artigo 77°., n°. 3, do Código Penal, apesar de dever ser considerada/englobada no cúmulo jurídico a realizar, deverá manter a sua diferente natureza.
13- De todo o modo, ainda que assim não se considere, entendendo-se não cumular a pena de multa, por ser a única, das que integram o cúmulo, desta natureza, e pena de prisão, por já ter sido cumprida e declarada extinta, sempre haverá que cumular as penas de prisão suspensas na sua execução, todas claramente numa relação de concurso entre si, conforme já supra referido.
14 - Acresce que, in casu, em nosso entender, atentas as penas em concurso-a maioria suspensa na sua execução e ainda no início do seu prazo de cumprimento, será claramente mais favorável a aplicação de uma pena única.
15 - A decisão recorrida violou o disposto nos art°s 77°. e 78°. do Código Penal.
Revogando a decisão recorrida e substituindo-a por outra que considere as penas parcelares aplicadas a cada um dos crimes que se encontram numa relação de concurso, incluindo aquelas cuja execução foi suspensa, e determine a realização do cúmulo, V. Excas farão a esperada JUSTIÇA! " (fim de transcrição).
3. Foi proferido despacho judicial admitindo o recurso, como se alcança de fls. 88.
4. Notificada a defesa do arguido, para, querendo, responder, nada disse.
5. Subidos os autos, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta nesta Relação teve neles "Vista" e emitiu parecer, pronunciando-se no sentido de aderir, nada mais se lhe oferecer acrescentar, à posição assumida pelo Ministério Público na primeira instância (cfr. fls. 99).
6. Foi cumprido, oficiosamente, o preceituado no art. 417.°, n.° 2, do Código de Processo Penal (doravante CPP), não tendo havido resposta.
7. Efetuado o exame preliminar foi considerado não haver razões para a rejeição do recurso.
8. Colhidos os vistos legais, cumpre agora apreciar e decidir. II — Fundamentação
1. Conforme entendimento pacífico dos Tribunais Superiores, são as conclusões extraídas pelo recorrente, a partir da respetiva motivação, que operam a fixação e delimitação do objeto dos recursos que àqueles são submetidos, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas e quaisquer questões que, face à lei, sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer (cfr., entre outros, os Acs. do STJ de 16.11.95, de 31.01.96 e de 24.03.99, respetivamente, nos BMJ 451.° - pág. 279 e 453.° - pág. 338, e na Col (Acs. do STJ), Ano VII, Tomo 1, pág. 247, e cfr. ainda, arts. 403.° e 412.°, n.° 1, do CPP).
As questões suscitadas pelo recorrente, que deverão ser apreciadas por este Tribunal Superior, sem prejuízo do conhecimento da segunda ficar prejudicado pela solução dada àquela que a antecede, são, em síntese, as seguintes:
- das seis penas a cumular, quatro tratam-se de penas de prisão suspensas na sua execução, uma é de pena de prisão efectiva — sete meses, já declarada extinta pelo cumprimento, o que, nos termos do disposto no artigo 78.°, n.° 1, do Código Penal, não impede a realização do cúmulo jurídico, sendo o tempo já cumprido descontado na pena única que vier a ser aplicada, e uma outra é de pena de multa e, como tal, ao abrigo do preceituado no artigo 77.°, n.° 3, do Código Penal, apesar de dever ser considerada/englobada no cúmulo jurídico a realizar, deverá manter a sua diferente natureza.
- ainda que assim não se considere, entendendo-se não cumular a pena de multa, por ser a única, das que integram o cúmulo, desta natureza, e pena de prisão, por já ter sido cumprida e declarada extinta, sempre haverá que cumular as penas de prisão suspensas na sua execução, todas claramente numa relação de concurso entre si, conforme já supra referido. Acrescendo que, in casu atentas as penas em concurso-a maioria suspensa na sua execução e ainda no início do seu prazo de cumprimento, será claramente mais favorável ao arguido a aplicação de uma pena única.
2. Passemos, pois, ao conhecimento das questões alegadas. Para tanto, vejamos, antes de mais, o conteúdo da decisão recorrida, que é do seguinte teor:
"Resultaram provados e, com interesse para a realização do cúmulo jurídico, os seguintes factos:
1 — Nos autos de processo comum singular n° 60/16.2SVLSB, dos Juízos Locais Criminais de Lisboa, foi o arguido condenado, por sentença datada de 17/03/2017, pela prática, por factos datados de 16/05/2016, de um crime de furto qualificado na forma tentada, previsto e punido pelos artigos 22°, 23°, 72°, 73°, 203°, n° 1, 204°, n° 2, alínea e), do Código Penal, na pena de 2 anos e 5 meses de prisão, suspensos na sua execução por 2 anos e 5 meses, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 50°, do Código Penal, sujeitando tal suspensão a regime de prova, nos termos do disposto
nos artigos 53° e 54°, ambos do Código Penal.
A sentença transitou em julgado em 30/01/2018.
2 - Nos autos de processo comum singular n° 108/17.3PAAMD, dos Juízos Locais Criminais da Amadora, foi o arguido condenado, por sentença datada de 29/05/2017, pela prática, por factos datados de 25/05/2017, de um crime de condução de veículo sem habilitação legal, previsto e punido pelo artigo 3°, do Dec.-Lei n° 2/98, de 03/01, em pena de multa.
A sentença transitou em julgado em 22/09/2017.
3 - Nos autos de processo comum singular n° 670/17.0GLSNT, dos Juízos Locais Criminais de Sintra, foi o arguido condenado, por sentença datada de 13/12/2017, pela prática, por factos datados de 20/06/2017, de um crime de furto simples na forma tentada, previsto e punido pelos artigos 22°, 23°, 72°, 73° e 203°, n° 1, do Código Penal e um crime de furto simples, previsto e punido pelo artigo 203°, n° 1, do Código Penal, na pena de 2 anos e 4 meses de prisão, suspensos na sua execução por 3 anos, sujeitando tal suspensão a condições.
A sentença transitou em julgado em 30/01/2018.
4 - Nos autos de processo comum colectivo n° 173/17.3GDSNT, dos Juízos Centrais Criminais de Sintra, foi o arguido condenado, por acórdão datado de 01/02/2018, pela prática, por factos datados de 26/06/2017, de um crime de furto simples na forma tentada, previsto e punido pelos artigos 22°, 23°, 72°, 73°, 203°, n° 1 e 204°, n° 2, alínea e) e n° 4, todos do Código Penal, na pena de 7 meses de prisão, efectiva.
O acórdão transitou em julgado em 05/03/2018 e a pena de prisão foi julgada extinta em 01/02/2018 (cumprida em prisão preventiva).
5 - Nos autos de processo comum singular n° 218/16.4GDSNT, dos Juízos Locais Criminais de Sintra, foi o arguido condenado, por sentença datada de 01/02/2018, pela prática, por factos datados de 13/06/2016, de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelos artigos 203°, n° 1 e 204°, n° 2, alínea e), do Código Penal, na pena de 2 anos e 6 meses de prisão, suspensos na sua execução por 2 anos e 6 meses, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 50°, do Código Penal, sujeitando tal suspensão a regime de prova, nos termos do disposto nos artigos 53° e 54°, ambos do Código Penal e a condições.
A sentença transitou em julgado em 05/03/2018.
6 - Nos autos de processo comum singular n° 664/16.3PULSB, dos Juízos Locais Criminais de Lisboa, foi o arguido condenado, por sentença datada de 08/06/2018, pela prática, por factos datados de 14/05/2016, de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelos artigos 202°, alínea d), 203°, n° 1 e 204°, n° 2, alínea e), do Código Penal, na pena de 2 anos de prisão, suspensos na sua execução por 2 anos, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 50°, do Código Penal, sujeitando tal suspensão a condições.
A sentença transitou em julgado em 09/07/2018.
7 - Fora as referidas em 1) a 6), o arguido tem as seguintes outras condenações averbadas no respectivo certificado de registo criminal:
a) Pelos Juízos Criminais de Loulé, foi o arguido condenado, por sentença datada de 20/11/2006, pela prática, por factos datados de 20/04/2005, de um crime de condução de veículo sem habilitação legal, previsto e punido pelo artigo 3°, n° 2, do Dec.-Lei n° 2/98, de 03/01, em pena de multa. A sentença transitou em julgado em 11/12/2006 e a pena foi julgada extinta em 15/09/2010.
b) Pelos Juízos Criminais da Amadora, foi o arguido condenado, por sentença datada de 28/09/2010, pela prática, por factos datados de 20/02/2008, de um crime de condução de veículo sem habilitação legal, previsto e punido pelo artigo 3°, n° 2, do Dec.-Lei n° 2/98, de 03/01, na pena de 1 ano de prisão suspensos na sua execução por 1 ano, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 50°, do Código Penal. A sentença transitou em julgado em 28/10/2010 e a pena foi julgada extinta em 28/10/2011.
c) Pelos Juízos Criminais de Loulé, foi o arguido condenado, por sentença datada de 23/11/2009, pela prática, por factos datados de 07/07/2006, 09/09/2006 e 22/01/2007, em concurso real, de três crimes de condução de veículo sem habilitação legal, previsto e punido pelo artigo 3°, n° 2, do Dec.-Lei n° 2/98, de 03/01 e um crime de furto simples, previsto e punido pelo artigo 203°, n° 1, do Código Penal, na pena única de 250 dias de multa e 3 meses de prisão suspensos na sua execução por 1 ano, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 50°, do Código Penal. A sentença transitou em julgado em 15/12/2009 e as penas foram julgadas extintas em 16/12/2010 e 13/02/2012.
d) Pelos Juízos de Pequena Instância Criminal de Lisboa, foi o arguido condenado, por sentença datada de 14/05/2010, pela prática, por factos datados de 24/02/2008, de um crime de condução de veículo sem habilitação legal, previsto e punido pelo artigo 3°, n° 2, do Dec.-Lei n° 2/98, de 03/01, em pena de multa. A sentença transitou em julgado em 04/06/2010 e a pena foi julgada extinta em 21/07/2011.
d) Pelos Juízos de Pequena Criminalidade de Lisboa, foi o arguido condenado, por sentença datada de 26/02/2016, pela prática, por factos datados de 08/02/2016, de um crime de detenção ilegal de arma, previsto e punido pelos artigos 1°, 3°, n° 7, alínea b) e 86°, n° 1, alínea d), da Lei n° 5/2006, de 23/01 e um crime de consumo de estupefacientes, previsto e punido pelos artigos 21°, n° 1 e 40°, n° 2, ambos do Dec.-Lei n° 15/93, de 22/01 e tabela anexa I-C, em pena única de multa. A sentença transitou em julgado em 27/04/2016.
e) Pelos Juízos Locais Criminais de Faro, foi o arguido condenado, por sentença datada de 26/01/2017, pela prática, por factos datados de 12/04/2015, de um crime de furto simples, previsto e punido pelo artigo 203°, n° 1, do Código Penal, na pena de 2 meses de prisão, suspensos na sua execução por 1 ano, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 50°, do Código Penal. A sentença transitou em julgado em 16/03/2017.
f) Pelos Juízos Locais Criminais da Amadora, foi o arguido condenado, por sentença datada de 07/02/2017, pela prática, por factos datados de 17/06/2016, de um crime de condução de veículo sem habilitação legal, previsto e punido pelo artigo 3°, n° 2, do Dec.-Lei n° 2/98, de 03/01, na pena de 6 meses de prisão, por dias livres (36 períodos). A sentença transitou em julgado em 23/03/2017.
Do relatório social:
8 — Conforme consta do oficio de fls. 66, dos autos, convocado para entrevista, o arguido não compareceu, entendendo a D.G.R.S.P. encontrar-se "(...) impossibilitados, por ora, de dar seguimento à elaboração do relatório social (...)".
3.2. Prova
A matéria dada como assente alicerçou-se:
- No que respeita às condenações sofridas pelo arguido, nas certidões de fls. 1 a 32, dos autos, dos autos, no C.R.C. junto aos autos a fls. 54 a 65, dos autos, no ofício relativo ao relatório social de fls. 66, dos autos. O arguido não esteve presente na audiência de cúmulo jurídico.
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3.3. Do direito
Dispõe o artigo 78°, n° 1, do Código Penal revisto que haverá lugar a cúmulo:
"1- Se, depois de uma condenação transitada em julgado, se mostrar que o agente praticou, anteriormente àquela condenação, outro ou outros crimes, são aplicáveis as regras do artigo anterior, sendo a pena que já tiver sido cumprida descontada no cumprimento da pena única aplicada ao concurso de crimes.
Assim, cumpre efectuar cúmulo jurídico das penas parcelares supra elencadas, atenta a sua relação de concurso (superveniente).
Importa mencionar que as condenações proferidas e referidas em 7), da matéria de facto provada não serão abrangidas pelo cúmulo dos autos uma vez que estão todas fora da relação de cúmulo, tendo essas condenações transitado em julgado, antes da prática dos factos abrangidos pelos processos referidos em 1) a 6) - obstando, consequentemente, à realização de qualquer operação de cúmulo jurídico que as abrangesse.
No caso da condenação referida em 2), a mesma traduziu-se em condenação em pena multa, sendo que, nenhuma outra pena da mesma natureza, de multa se encontra abrangida pela relação de cúmulo. Assim mostra-se impossível, em relação à mesma, realizar operação de cúmulo jurídico — pois tal decisão condenou o arguido em pena de multa, pena de natureza diversa das demais em cúmulo nos presentes autos e, com elas, incumulável (ou seja, insusceptível de gerar uma pena única).
No caso concreto, os crimes, referidos em 1) a 6), praticados pelo arguido Rui Miguel Pais Grosa, encontram-se, como se viu, em relação de concurso, de acordo com o disposto no mencionado artigo 78°, do Código Penal.
Importa, nesta sede, decidir se se deve efectuar o cúmulo jurídico entre as penas supra elencadas em 1) e 3) a 6), da matéria de facto provada (atento o supra expendido quanto às referidas em 2) e 7), da matéria de facto provada atenta a proibição dos chamados cúmulos por arrastamento).
Quanto às penas referidas em 1) e 3) a 6) da matéria de facto provada, importa referir, no entanto, que tais penas, não podem ser cumuladas entre si.
De facto, o Tribunal adere, totalmente, ao vertido no douto Ac. da R.L. de 11/09/2013, a consulta in www.dgsi.pt, sob o n° de processo108/08.4SFLSB-A.L1-3, que refere:
"(• • .)
1- Em caso de conhecimento superveniente do concurso de crimes, a pena única não deve englobar as penas parcelares cuja execução ficou suspensa na sua execução, porquanto estas são penas de substituição e, portanto, têm diferente natureza das penas de prisão. Cumular reclusão com liberdade, é operação que se mostra, em si mesma, impossível.
II- A inclusão no cúmulo de uma pena de prisão declarada suspensa só pode ocorrer se tiver havido decisão de revogação nos termos do art. ° 56° do CPP, em que a pena substituída é afastada, retornando à pena base.
(• • •)".
Efectivamente, enquanto pena de substituição, a pena de prisão suspensa na sua execução merece tratamento idêntico às demais.
Assim, deparado com as questões que infra se passarão a explanar, o Tribunal não vê alternativa senão o entendimento que preconiza, isto salvo melhor opinião e com o mais elevado respeito por opinião em contrário.
Assim:
Em primeiro lugar, importa referir que a discordamos da posição que defende que o trânsito em julgado numa condenação em pena de prisão suspensa na sua execução é "condicional" ou "não completo" ou mesmo "(...) que a "substituição" deve entender-se, sempre, resolutivamente condicionada ao conhecimento superveniente do concurso e que o caso julgado forma-se quanto à medida da pena e não quanto à sua execução. (...)".
De facto, tal posição não nos parece estar de acordo com à noção legal de trânsito em julgado, ínsita no artigo 628°, do C.P.C., onde se lê: "A decisão considera-se transitada em julgado logo que não seja susceptível de recurso ordinário ou de reclamação.".
A defesa desta posição, tanto quanto nos apercebemos, é exclusivamente defendida para estes casos e, apenas, nesta específica situação, nunca nos tendo apercebido que o fosse em qualquer outra situação.
Em todas as demais situações, o caso julgado sempre abrangeu a medida da pena mas, igualmente o decidido quanto à sua execução.
Quanto à condição resolutiva defendida, não nos parece que esteja consagrada legalmente, parecendo-nos que, a sê-lo, se mostraria salvaguardada necessariamente no artigo 56°, do Código Penal, o que se analisará infra.
Efectivamente, é nosso entendimento, que a decisão condenatória que condene o arguido em pena de prisão suspensa na sua execução, transita em julgado como as demais, com a seguinte especialidade — comum a parte das penas de substituição previstas no nosso ordenamento jurídico: nas condições expressamente previstas na lei, tal substituição pode ser revogada, levando a que perca a sua eficácia, subsistindo — nessas circunstâncias — a pena substituída, a saber, a pena de prisão aplicada na decisão condenatória que foi, subsequentemente, alvo de substituição.
Se assim não fosse, o artigo 78°, n° 2, do Código Penal, impediria a sua inclusão em operação de cúmulo jurídico, por não haver transitado em julgado.
É extremamente importante passar esta noção que defendemos, que esta condenação transita em julgado como as demais, nos seus precisos termos.
É também essencial passar o nosso entendimento que esta pena não tem — isto é, não deve ter — qualquer "relatividade". A pena é a aplicada. A lei prevê todas as situações em que tal substituição pode cessar, subsistindo — nessa circunstância — a pena substituída.
Assim entendida, a pena de prisão suspensa na sua execução não é diferente de qualquer outra pena de substituição.
Seguindo o entendimento que acabamos de expressar, somos levados a constatar que, na situação das penas de prisão suspensas na sua execução não se colocam questões diferentes ou que se não devam colocar nas demais penas de substituição (na prisão substituída por multa, prestação de trabalho a favor da comunidade, etc.).
A posição de que a pena de prisão suspensa na sua execução é uma verdadeira pena de substituição, parece-nos pacífica, desde logo na jurisprudência, tendencialmcntc unânime nos Venerandos Tribunais da Relação, com inúmeros acórdãos, especialmente debatendo a questão da prescrição da pena de prisão suspensa na sua execução, reforçando a sua natureza de verdadeira pena de substituição.
Como refere, de forma sintética mas totalmente esclarecedora, o Douto Ac. do T.R.C. de 24/01/2018, a consulta in www.dgsi.pt, sob o n° de processo 50/17.8GBTSC.C1:
I — A suspensão da execução da pena de prisão é uma pena de substituição em sentido próprio, uma vez que que o seu cumprimento é feito em liberdade e pressupõe a prévia determinação da pena de prisão, em lugar da qual é aplicada e executada.
(• • •)"
Sendo pacífico tal entendimento, não nos alongaremos nessa matéria.
Concluímos, pois, que a pena de prisão suspensa na sua execução é uma pena de substituição, com o transito em julgado nos seus precisos termos, como as demais, o que nos encaminhará no sentido que o seu trânsito em julgado determina que apenas se possa proceder à sua modificação nos estritos casos previstos quer na Lei quer na condenação específica — se esta estabelecer condições específicas — estas vertidas na decisão condenatória.
Chegados a este momento, importa então verificar quais os casos cm que a pena de prisão suspensa na sua execução pode e deve ser revogada, importando analisar o artigo 56°, do Código Penal, que refere:
Artigo 56.°
Revogação da suspensão
1 - A suspensão da execução da pena de prisão é revogada sempre que, no seu decurso, o condenado:
a) Infringir grosseira ou repetidamente os deveres ou regras de conduta impostos ou o plano de reinserção social; ou
b) Cometer crime pelo qual venha a ser condenado, e revelar que as finalidades que estavam na base da suspensão não puderam, por meio dela, ser alcançadas.
2 - A revogação determina o cumprimento da pena de prisão fixada na sentença, sem que o condenado possa exigir a restituição de prestações que haja efectuado.
Da verificação das condições de revogação da suspensão da pena de prisão, constatamos que não se encontra prevista a situação de cúmulo sucessivo de penas, a saber, uma situação que, a par das restantes, preveja a possibilidade de revogação da suspensão da pena de prisão caso se venha a verificar que o arguido, nessa data, praticou factos ilícitos, por cuja prática venha a ser condenado, antes do trânsito de qualquer dessas condenações e, assim, se mostre em situação de cúmulo sucessivo de penas.
Necessário seria, assim, no nosso modesto entender, prever que, em caso de cúmulo jurídico superveniente, quando se verifique que o Estado, não sendo capaz de exercer a acção penal simultânea em todos os processos penais em situação de cúmulo próprio ou nas muito menos frequentes situações em que o arguido pratique os factos entre a decisão condenatória anterior e o seu trânsito em julgado, tal ocorrência deve servir de fundamento para revogar — em desfavor do arguido — a suspensão da execução da pena de prisão, com a subsequente condição prevista no n° 2, do artigo 56°, do Código Penal.
Isto sem prejuízo de, assim o permitindo o disposto nos artigos 50° e seguintes do Código Penal (desde logo a moldura penal ou a pena concreta aplicada em concurso), se efectue novo juízo de prognose, incidindo sobre a pena única resultante dessa operação de cúmulo jurídico.
Este novo juízo, assim o permitindo as condições concretas para a aplicação das penas de substituição, pode levar a que a pena única possa ver a sua execução suspensa na sua execução — o que será:
- Impossível nas situações em que se exceda o quantum máximo previsto na Lei para a sua aplicação;
- Muito difícil, quando se trate de condenação em penas de prisão suspensas na sua execução e penas de prisão efectivas, dado o juízo de prognose desfavorável, efectuado nos processos em que a condenação foi em prisão efectiva — todos transitados em julgado; ou
- Difícil de compreender, quando se trate de penas suspensas na sua execução que acabem numa pena única, também ela suspensa na sua execução, (uma operação que, desde logo, sacrifica quem, caso de qualquer arguido nesta situação, já iniciou o cumprimento de tais penas para o reiniciar, após o trânsito em julgado desta nova decisão, cumulatória, com um período de suspensão de execução de extensão superior — excepto se se tiver aplicado, em cúmulo, o mínimo da moldura dessa pena — àquelas que já se encontrava a cumprir e sem que o período já cumprido seja descontado no período a cumprir).
Tudo isto se defende em nome da paz jurídica e do "direito do arguido a ver a sua situação jurídico-penal unificada e decidida" — o que não parece levar em conta o quanto a aplicação concreta deste entendimento prejudica o arguido (e, desde logo, o seu direito a cumprir a pena em que foi condenado pela forma como o foi se nenhuma das situações previstas na lei para a sua modificação ou revogação se verificou).
Concluímos, pois, no seguimento do que vimos defendendo que, enquanto subsistir a pena de prisão suspensa na sua execução, esta não pode ser cumulada com pena de prisão efectiva.
E, nesse sentido, verifica-se que o Tribunal segue o entendimento vertido supra no douto Acórdão citado.
Concluindo, encontramos algumas dificuldades que nos surgem quando analisamos a posição que defende a possibilidade de cúmulo jurídico entre penas de natureza diferente e que não conseguimos ultrapassar, são elas:
- A posição unânime — e, quanto a nós, no nosso humilde entendimento, perfeitamente justificada — na jurisprudência que a pena de prisão suspensa na sua execução, extinta pelo seu cumprimento, não seja descontada, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 78°, n° 1, in fine, do Código Penal. Como defender tal posição se se tratam do mesmo tipo de penas que se pretende cumular?
Ou seja, se se cumulam penas de prisão suspensas na sua execução, defender a não inclusão de tais penas, cumpridas mas em cúmulo, com o subsequente desconto dessas penas na pena única a fixar?
O menor sentido que se percebe fazer descontar penas suspensas à pena única aplicada em cúmulo jurídico nestas situações, deveria avisar os defensores dessa posição para as, eventuais, incongruências que o mesmo possa revelar.
- Como admitir a revogação da suspensão da execução da pena de prisão, fora dos casos do artigo 56°, do Código Penal, dependendo tal situação da seguinte alea: se o arguido não tiver ainda cumprido a totalidade da pena de prisão suspensa na sua execução, cumula-se, se já a tiver cumprido, não, mas também não se desconta.
- Como restringir às penas de prisão suspensas na sua execução esta inclusão em operação de cúmulo jurídico? Como não incluir penas de prisão substituídas por qualquer outra pena de substituição? Trabalho a favor da comunidade, multa (de substituição, não pena principal), o regime de permanência na habitação, etc.
- No caso de suspensão da execução da pena de prisão sujeita a condições, tendo o arguido prestado tais condições, não lhe sendo aplicada pena similar, é-lhe restituído o que prestou? É quantificado? De que modo?
- Se se considerar que a pena de prisão suspensa na sua execução, por simples inclusão em operação de cúmulo jurídico, não fica revogada (sem prejuízo do novo juízo de prognose a efectuar em sede de pena única aplicada — como em todas as situações de aplicação desta pena de substituição), como é possível cumular prisão com liberdade? Cumula-se que pena? A pena de prisão substituída, como é defendido — e então, tal significa inelutavelmente que a suspensão é, de facto, revogada — ou a pena de substituição, mantida suspensa na sua execução e, consequentemente, de natureza diferente?
A verdade é que o Tribunal não vislumbra respostas satisfatórias a estas questões, o que nos empurra, salvo melhor opinião, para o entendimento por nós defendido nos presentes autos.
Uma questão final: Como se deve entender o artigo 77°, n° 3, do Código Penal?
Este dispositivo legal descreve uma operação de cúmulo jurídico de penas próprio e não sucessivo. Na altura em que o cúmulo jurídico próprio é realizado, o juízo de substituição não foi, ainda, efectuado. Nessa ocasião, apenas duas penas — principais — são possíveis: prisão e/ou multa. O juízo de substituição, nessas situações, só incidirá sobre a pena única a aplicar. Diferente é a situação do cúmulo jurídico impróprio ou sucessivo, em que tal juízo foi já efectuado em relação às várias penas em concurso.
Não há, pois, no nosso entendimento e salvo melhor opinião em contrário, que proceder a qualquer operação de cúmulo jurídico por as penas em concurso superveniente, serem insusceptíveis de ser englobadas em pena única, nos termos supracitados." (fim de transcrição).
3. Aquilatemos, então, se assiste razão ao recorrente.
Perante a prática de vários crimes, quer apreciados e punidos num mesmo processo e como tal necessariamente antes de transitar em julgado a respetiva condenação, quer resultantes de condenação em processos diferentes e já transitadas em julgado de cujo concurso haja conhecimento superveniente, o regime legal que regulamenta o instituto do cúmulo jurídico de penas (artigos 77.° e 78.° do Código Penal) tem suscitado diversas interpretações por parte dos aplicadores do direito, bastas vezes inconciliáveis e nem todas defensáveis, apesar de haver sempre doutrina e jurisprudência que permita dar razão e consistência à posição que se defende, pretende fazer valer e prevalecer neste domínio.
Compreendemos mas não acompanhamos a posição, perplexidades e interrogações elencadas pelo coletivo de primeira instância.
Pela nossa parte, tal como decidido no Acórdão da RC de 15/06/2011, relatado por Maria Pilar de Oliveira, no proc. 6/08.1GGCBR.C3, in www.dgsi.pt, entendemos que "... As penas de prisão cuja execução foi suspensa devem ser incluídas em cúmulo jurídico, no caso de conhecimento superveniente do concurso.".
Neste mesmo sentido pode ver-se, entre outra, ainda, a seguinte jurisprudência:
- acórdão: da RL de 23/09/2010, relatado por João Carrola, in www.pgdlisboa.pt, processo n.° 663/07.6PKLSB-B.L1, de cujo sumário citamos: "Na determinação da pena única, em caso de concurso de infracções, deve igualmente integrar o cúmulo jurídico uma pena de prisão, mesmo que tenha ficado suspensa na sua execução.". - Com a seguinte nota: "Já no mesmo sentido, entre muitos outros: Ac. Rel. Lisboa, de 2003-07-01 (Rec. n° 10225/03, in Col. Jur. XXVIII, TV, 122). Ac. Rel. Coimbra, de 2005-01-19 (Rec. n° 3672/04, rel:- Oliveira Mendes, in www.dgsi.pt). Ac. Rel. Lisboa, de 2005-06-23 (Rec. n° 6354/04-9° secção, rel.-- Maria da Luz Batista, in www.pgdlisboa.pt). Ac. STJ, de 2004-04-22 (Proc. n° 1390/04, rel:- Costa Mortágua, in Col. Jur. XII, II, 172). Ac. Rel. Coimbra, de 2006-05-31 (Rec. n° 457/06, rel:- João Trindade, in www.dgsipt). Ac. Rel. Guimarães, de 2009-06-22 (Rec. n° 737/05.8GVCCT.G1, rel. Nazaré Saraiva, in 1,11,11,12 .desi.pt).";
- acórdão da RC de 23/11/2010, relatado por Pilar de Oliveira, in www.gde.mj.pt, processo n.° 246/07.GEACB.C1, de cujo sumário citamos: "1. As penas cuja execução foi suspensa devem ser cumuladas quando o conhecimento do concurso é superveniente, inclusivamente com penas de prisão não suspensas. 2. Não podem ser objecto de cúmulo jurídico penas de prisão suspensas cujo prazo já se encontre decorrido.".
- acórdão da RE de 20/01/2011, relatado por Correia Pinto, in www.gde.mj.pt, processo n.° 734/06.6PBFAR.E1, de cujo sumário citamos: "A pena única a aplicar em sede de concurso de infracções pode eliminar a suspensão que tenha sido concedida a uma ou à generalidade das penas parcelares, pois, como já decidiu o STI por acórdão de 6-10-2005, "não há violação de lei se na nova sentença e no novo cúmulo jurídico se não aplicar a medida de suspensão da pena decretada em sentença anterior, nem violação de caso julgado, por a suspensão o não formar de forma perfeita, já que a suspensão pode vir a ser alterada, quer no respectivo condicionalismo, quer na sua própria existência se ocorrerem os motivos legais referidos nos artigos 50.° e 51.° ou 78.° e 79.° do Código Penal".";
- acórdão: da RL de 12/06/2018, relatado por Ricardo Cardoso, in www.dgsi.pt, processo n.° 16.659/17.7PT8SB.L1, de cujo sumário citamos: "... Sempre que o arguido é julgado no mesmo processo por todos os crimes em concurso a questão da aplicação de pena de substituição apenas se coloca ao tribunal depois de encontrada a pena única resultante do cúmulo jurídico das penas parcelares e não perante cada pena parcelar. Este é o argumento sistemático essencial para se concluir que devem ser incluídas em cúmulo jurídico de penas de prisão também as penas de prisão cuja execução haja sido suspensa (com excepção das situações em que o prazo de suspensão já haja decorrido e a pena deva ser declarada extinta pelo cumprimento da pena de substituição."
Ainda no mesmo sentido, na doutrina, pronunciaram-se Figueiredo Dias, in "Direito Penal Português — As Consequências Jurídicas do Crime", Aequitas/Editorial Notícias, 1993, pág. 285, 290 e 295, Paulo Dá Mesquita, in "O Concurso da Penas", Coimbra Editora, 1997, págs. 96/100, e M. Miguez Garcia/J.M. Castela Rio, in ""CP com notas e comentários, Almedina, 2a ed., 2015, pág. 412.
Assim, haverá in casu que fixar-se uma pena unitária, cumulando juridicamente as quatro penas de prisão (de, segundo a sua ordem decrescente: 2 anos e 6 meses; 2 anos e 5 meses; 2 anos e 4 meses; e 2 anos) aplicadas ao arguido e suspensas na sua execução (nos processos 60/16.2SVLSB, 670/17.0GLSNT, 218/16.4GDSNT e 664/16.3PULSB), juntamente com a pena de prisão efectiva (do processo 173/17.3GDSNT) — sete (7) meses, já declarada extinta pelo cumprimento, o que, nos termos  do disposto no artigo 78.°, n.° 1, do Código Penal, não impede a realização do cúmulo jurídico, sendo o tempo já cumprido descontado na pena única que vier a ser aplicada — [cinco penas em que foi condenado pela prática de crimes de furto (simples, um consumado e dois tentados, e três qualificados, sendo um na forma tentada e dois na consumada)] cumulando-se ainda a pena de multa (do processo 108/17.3PAAMD, pela prática de um crime de condução de veículo sem habilitação legal), pese embora esta, ao abrigo do preceituado no artigo 77.°, n.° 3, do Código Penal, apesar de dever ser considerada/englobada no cúmulo jurídico a realizar, deva manter a sua diferente natureza.
Aí chegados ou tal pena única é superior a 5 anos de prisão, inviabilizando legalmente a suspensão da sua execução (vd. primeira parte do n.° 1 do art. 50.° do Código Penal) ou é inferior, permitindo-o. Momento em que, então, o tribunal a quo terá de efetuar o seu próprio juízo de prognose (favorável ou não quanto ao futuro), como igualmente exige a segunda parte do mencionado art. 50°, do Código Penal, daí retirando as consequentes ilações.
III — Decisão
Pelo exposto, acordam os Juízes na 9a Secção Criminal da Relação de Lisboa, em conceder provimento ao recurso interposto pelo Ministério Público, em conformidade com o que decidem revogar a decisão recorrida, que deverá ser substituída por outra em que a primeira instância proceda ao cúmulo jurídico das penas aplicadas ao arguido Rui Miguel Pais Grosa nos processos 60/16.2SVLSB, 670/17.0GLSNT, 218/16.4GDSNT e 664/16.3PULSB, 173/17.3GDSNT e 108/17.3PAAMD.
Sem tributação.
Notifique nos termos legais.

Lisboa, 11 de dezembro de 2019
Calheiros da Gama
João Abrunhosa