Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
2413/12.6TTLSB.L1-4
Relator: CELINA NOBREGA
Descritores: INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 07/02/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: N
Texto Parcial: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA A DECISÃO
Sumário: -Tendo o instituto da prescrição por fim sancionar a inacção negligente do titular do direito, não é de excluir a aplicação do disposto no nº 2 do artigo 323º do CC, nos casos em que esse titular tenha errado na identificação da pessoa do Réu por entender que este ainda mantinha a sua personalidade jurídica e o tribunal não tenha apreciado, em tempo útil e quando tal lhe era possível, a falta de citação do Réu.
(Elaborado pela Relatora)
Decisão Texto Parcial:Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa:
            RELATÓRIO
-AA, residente (…), 2710-487 Sintra,
-BB, residente (…), 2765-011 Estoril,
 CC, residente (…), 1250-083 Lisboa,
 DD, residente (…), 1800-070, Lisboa e
 EE, residente na (…), 2635-325 Rio de Mouro, intentaram contra o Instituto dos Museus e da Conservação, sito no Palácio Nacional da Ajuda, Ala Sul, Piso 4, 1349-021 Lisboa a presente acção com processo declarativo comum, pedindo que seja declarado que a extinção dos contratos de trabalho celebrados entre Autores e Réu é ilícita e, em consequência, seja o Réu condenado:
- A reintegrar os Autores no seu posto de trabalho, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade ou, em alternativa, a indemnizá-los no montante de 45 dias por cada ano completo ou fracção de antiguidade, consoante opção que façam até ao termo da discussão em audiência de julgamento; e
- A pagar-lhes as retribuições que deixaram de auferir desde a data do despedimento até à data do trânsito em julgado da decisão judicial que declare a ilicitude do despedimento com as legais deduções.
Subsidiariamente e para o caso de se entender serem os contratos de trabalho celebrados com os Autores e Réu nulos, deve o Réu ser condenado a pagar aos Autores indemnização correspondente a sessenta dias de retribuição de base e diuturnidades por cada ano de antiguidade ou fracção.
Para tanto e, em síntese, invocaram:
(…)
No dia 05.07.2012 teve lugar a audiência de partes constando da respectiva acta, para além do mais, o seguinte:
“Declarada reaberta a audiência, pelo ilustre mandatário da ré foi comunicado que o Instituto dos Museus e da Conservação foi extinto pelo Dec.Lei 115/2012, tendo as suas competências sido integradas na Secretaria Geral da Cultura, razão pela qual apresenta procuração outorgada pelo Sr. Secretário de Estado.
De seguida, foi tentado o acordo o qual não se mostrou possível, uma vez que pelos autores foi declarado manter os fundamentos de facto e de direito exarados em sede de petição inicial e pelo ilustre mandatário da ré foi declarado não conceber os fundamentos de facto e de direito articulados pelos autores, relegando uma tomada de posição para sede de contestação.
De imediato, pela Mmª Juiz foi proferido o seguinte:
DESPACHO
Frustrada que se mostra a conciliação, notifique a ré para contestar, no prazo de 10 dias, com a cominação de que não contestando, no prazo legal, se consideram confessados os factos articulados pelos autores, sendo logo proferida a sentença a julgar a causa conforme for de direito (art.56º, a) e art.57º, nº 1, ambos do C.P.T.).
Notifique.
(…)
Do decidido ficaram notificados todos os presentes, sendo a ré também para contestar no prazo de 10 dias, com a advertência de que não contestando se consideram confessados os factos articulados na petição inicial, sendo logo proferida sentença a julgar a causa conforme for de direito.”  
 A Secretaria de Estado da Cultura apresentou contestação invocando, em síntese:
- A sua falta de personalidade/capacidade judiciária dado que:
- A presente acção foi intentada contra o Instituto Português de Museus, Instituto que foi extinto por força do disposto no artigo 16º do Decreto-Lei nº 115/2012 de 25 de Maio, diploma que criou a Direcção Geral do Património Cultural que sucedeu nas atribuições do IMC;
- As Direcções Gerais são estruturas orgânicas integradas num determinado Ministério, não dispondo de personalidade/capacidade judiciária pelo que a entidade competente para a presente contestação é a Secretaria de Estado da Cultura, competindo ao Ministério Público a sua representação;
- Todos os factos invocados pelos Autores são verdadeiros;
- Contudo, dada a declaração de extinção dos contratos celebrados ser válida, nenhum direito assiste aos Autores;
- E mesmo que assim não se entenda, a Lei 23/2004 de 22 de Junho, bem como o Decreto-Lei nº 59/2008 de 11 de Setembro, vêm fulminar com o regime de nulidade o contrato de trabalho firmado com um Instituto Público sem a demonstração de que foi observado um procedimento de recrutamento e selecção equiparáveis ao concurso, pelo que sempre se terá de entender que a declaração de rescisão operou como declaração de nulidade, não sendo, por esta via, possível a reintegração nem a indemnização.
Pediu, a final, que a acção seja julgada improcedente dado ser válida a declaração de extinção dos contratos e, caso assim, não se entenda, então, os contratos são nulos pelo que a declaração de rescisão operou como declaração de nulidade.
Os Autores responderam invocando que:
(…)
Requereu que a contestação da Secretaria de Estado da Cultura seja desentranhada e devolvida ao apresentante, declarando-se o Réu Instituto dos Museus e Conservação em situação de revelia absoluta e decidindo-se a causa, declarando os Autores, desde já, que optam pela indemnização por antiguidade.
A Secretaria de Estado da Cultura pronunciou-se sobre o desentranhamento da contestação dizendo:
- A Secretaria de Estado da Cultura estará sempre em juízo e com capacidade/personalidade para o efeito, sempre que para tal tenha legitimidade, sendo este o caso;
- O Instituto dos Museus e Conservação foi retirado da ordem jurídica não pela sua extinção directa, mas por revogação do diploma legal (cfr.art.16º do DL nº 115/2012 de 22 de Maio), com a evidente extinção dos seus órgãos, jamais poderia passar procuração a quem quer que fosse; e
- Na audiência conciliatória a procuração passada a advogado foi-o pela Secretaria de Estado da Cultura, tendo o tribunal aceite a mesma e, consequentemente, ser hoje uma decisão transitada em julgado no processo.
Requereu que seja proferida sentença, porquanto os factos invocados pelos Autores são todos verdadeiros e se o Tribunal entender que é devida qualquer indemnização, deverá oficiar ao Instituto de Segurança Social e obtida resposta, proferir decisão.
Em 02.04.2013 foi proferido o seguinte despacho:
“ Nos presentes autos foi ordenada a citação do Réu por despacho de 18/06/2012,sendo que a mesma se efectivou em 22/06/2012 (cfr.fls.97 a 105).
Sucede que, desde 01.06.2012, por força do disposto nos arts. 1º, 13º e 17 do Dec.Lei nº 115/2012, de 25/01, a Direcção-Geral do Património Cultural (DGPC), que é um serviço central da administração directa do Estado, dotado de autonomia administrativa, sucedeu nas atribuições do aqui Réu – Instituto dos Museus e da Conservação IP- cuja extinção já havia sido declarada pelo art.42º/3/f) do Dec.-Lei nº 126-A/2011, de 29.12.
Daqui resulta que quer à data do despacho que ordenou a citação quer à data em que a mesma se efectivou, nestes autos, quem ocupava a posição da Réu era o Estado Português e não aquele IP.
Por conseguinte, a citação do Réu devia ter sido cumprida com o estrito cumprimento do disposto no art. 20º do C.P.Civil, aplicável ex vi do art.1º/2ª) do C.P.Trabalho.
Tal omissão da citação do Ministério Público integra a situação de falta de citação prevista na alínea b) do art.194º do C.P. Civil (Cfr. Lebre de Freitas, in Código de Processo Civil Anotado, I Volume, 1999, p.330), a qual implica a anulação de todo o processado posterior à petição inicial.
Porém e uma vez que nenhuma das partes se pronunciou expressamente sobre esta nulidade, antes de tudo mais, determina-se a notificação dos Autores e do Réu (entidade que até agora actuou em seu nome) para, no prazo de 10 dias, querendo, dizerem ou requererem o que tiver por conveniente (cfr. art.3º/3 do C.P.Civil, aplicável ex vi do art.1º/2ª) do C.P.T).
Deste despacho foram notificados o ilustre mandatário dos Réus, o ilustre mandatário que assinou a contestação apresentada pela Secretaria de Estado da Cultura e o Instituto dos Museus e da Conservação, IP (fls.136 a 138).
           Os Autores responderam invocando não haver que proceder à citação do Ministério Público, dado que à data em que foi proferido o despacho que ordenou a citação era o Instituto dos Museus e da Conservação, IP e não o Estado Português, quem ocupava a posição de Réu, conforme já explanado na resposta à contestação apresentada pela Secretaria de Estado da Cultura, sendo certo que o Estado Português não tinha a ver com este assunto já que a sua personalidade jurídica é distinta da personalidade jurídica do Réu.
    Contesta, assim, a intenção de ordenar a citação do Ministério Publico para assumir a representação do Estado Português.
Em 02.07.2013 foi proferido o seguinte despacho:
“I-Incidente de nulidade da Citação
   Nos presentes autos, AA e Outros intentaram contra o Instituto dos Museus e da Conservação, IP, acção declarativa de condenação, com processo comum, pedindo que se declare que a extinção dos contratos de trabalho celebrados entre Autores e Réu é ilícita e que se condene o Réu a reintegrar os Autores no seu posto de trabalho, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade, consoante opção que façam até ao termo da discussão em audiência de julgamento, a pagar-lhes as retribuições que deixaram de auferir desde a data do despedimento até à data do trânsito em julgado da decisão judicial que declare a ilicitude do despedimento, com as legais deduções, ou subsidiariamente e para o caso se entender serem os contratos de trabalho celebrados entre Autores e Réu nulos, deve o Réu ser condenado a pagar aos Autores indemnização correspondente a sessenta dias de retribuição de base e diuturnidades por cada ano de antiguidade ou fracção.
           Por despacho de 18/06/2012, foi ordenada a citação do Réu, sendo que a mesma se efectivou em 22/06/2012 (cfr. fls.97 a 105).
    Sucede que, desde 01/06/2012, por força do disposto nos arts.1º, 13º e 17º do Dec.-Lei nº 115/2012, de 25/01, a Direcção-Geral do Património Cultural (DGPC), que é um serviço central da administração directa do Estado, dotado de autonomia administrativa, sucedeu nas atribuições do aqui Réu – Instituto dos Museus e da Conservação, IP, - cuja extinção já havia sido declarada pelo art.42º/3f) do Dec.-Lei nº 126-A/2011, de 29/12.
            Daqui resulta que quer à data do despacho que ordenou a citação quer à data em que a mesma se efectivou, nestes autos, quem ocupava a posição de Réu era o Estado Português e não aquele IP.
            Por conseguinte, a citação do Réu devia ter sido cumprida com o estrito cumprimento do disposto no artigo 20º do C.P.Civil, aplicável ex vi do art. 1º/2a) do C.P.Trabalho.
   Tal omissão da citação do Ministério Público integra a situação de falta de citação prevista na al.b) do art.194º do C.P.Civil, a qual implica a anulação de todo o processado posterior à petição inicial.
         É certo que os Autores vêm defender que não se verifica esta nulidade, alegando, em síntese, que «com a publicação do Decreto Lei nº 126-A/2011 (art.42º nº 3 al.f)) o Réu entrou em fase de dissolução, o nº 6 do supra citado art.º 4º que” concluído o processo, o membro do Governo fixa, por despacho publicado no Diário da República, a data em que tal ocorreu…concluída a fase de liquidação, em que se ultimam os assuntos em que a pessoa colectiva está envolvida e se procede ao apuramento final dos seus bens, é que a pessoa colectiva se extingue…tal despacho não estava publicado aquando da citação do Réu e crê-se que tal ainda não sucedeu». Não lhes assiste razão: uma coisa é o processo de dissolução decorrente da extinção do IP em causa decretado pelo referido art.42º/3f) do Dec.-lei 126-A/2011, outra coisa é efectiva e concreta sucessão da Direcção-Geral do Património Cultural (DGPC) nas atribuições desse IP decretada pelos referidos arts. 1º, 13º e 17º do Dec.-Lei nº 115/2012, sendo certo que, independentemente do termo daquele processo de dissolução (e do aludido despacho), a partir da referida data de 01/06/2012 as atribuições desse IP onde se incluem os respectivos direitos obrigações, passaram a pertencer àquela DGPC que é um serviço central da administração directa do Estado, não tendo, por isso, personalidade jurídica e judiciária próprias.
      Decorrendo do referido artigo 20º/1 do C.P.Civil, que, quando o Estado nela figura como Réu, a acção há-de ser interposta com o Estado, mas requerendo-se que seja citado como seu representante o Magistrado do Ministério Público junto do Tribunal em que a acção for intentada, in casu, dúvidas não restam que, apesar dos Autores ter identificado como Réu o «Instituto dos Museus e da Conservação IP», a pessoa efectivamente demandada na presente acção é o próprio Estado, pessoa colectiva em que se integra aquela DGPC, que sucedeu àquele IP e é um órgão da administração pública mas destituído de qualquer personalidade jurídica e judiciária.
            Nestas circunstâncias, para efectivação da citação do Réu devia ter-se procedido à citação do Magistrado do Ministério Público junto deste 2º Juízo, 2ª Secção, do Tribunal do Trabalho de Lisboa para contestar a presente acção, o que manifestamente não sucedeu, pelo que se verifica a nulidade de citação arguida, e que seria sempre do conhecimento oficioso do Tribunal.
            Face ao exposto e nos termos dos arts. 20º/1, 194º/b), 202, 203, 206 e 207º do C.P.Civil, aplicáveis ex vi do art.1º/2/a) do C.P.Trabalho, decide-se:
            1) julgar procedente o presente incidente de nulidade por falta de citação do Réu;
    2) declarar a anulação de todo o processado posterior à petição inicial e, nomeadamente do processado relativo ao despacho que designou a audiência de partes e determinou a citação do Réu (fls.97), da efectivação citação (fls.105 e 105), e à realização da audiência de partes (fls.108/109);
            3- e, nos termos do art.54º/2 do C.P.Trabalho e para os fins previstos nos arts. 55º e 56º do mesmo diploma legal, designar a realização da audiência de partes para o próximo dia 9 de Setembro de 2013, pelas 14horas.
  Notifiquem-se os Autores e cite-se o Réu, na pessoa do Magistrado do Ministério Público junto deste Juízo, 2ª Secção, do Tribunal do Trabalho de Lisboa, com a expressa advertência do disposto nos nºs 3 e 5 do art.54º do C.P.Trabalho, e, no que concerne ao (à) Réu (Ré), dê-se cumprimento ao disposto no nº 4 daquele art.54º. Com a citação, advirta-se também o Réu de que: -caso se frustre a conciliação a que se destina a audiência de parte, dispõe de 10 (dez) dias para, querendo, contestar a presente acção (art.56º/a) do C.P.Trabalho), com a expressa advertência de que, não o fazendo, se considerarem confessados os factos articulados pelo autor, sendo logo proferida sentença a julgar a causa conforme for de direito (art.57º/1 do C.P.Trabalho); - ainda que falte (m) à audiência de partes a contagem do prazo de dez (10) dias para contestar se conta da data designada para tal diligência – e quem o (a) represente deve fazer-se acompanhar de documento comprovativo dos respectivos poderes de representação.
D.N.”
Inconformados com esta decisão, os Autores interpuseram recurso para este Tribunal que foi admitido como apelação e subiu em separado, vindo, por acórdão proferido em 4 de Junho de 2014, no Processo nº 2413/12.6TTLSB-A.L1 deste Tribunal e Secção a ser julgado improcedente e confirmada a decisão recorrida que entendeu julgar procedente o incidente de nulidade por falta de citação do Réu, declarar a anulação de todo o processado posterior à petição inicial e designar nova audiência de partes, decisão que teve por fundamento a consideração de que o IMC, IP se extinguiu em 01.06.2012, data em que a DGPC sucedeu nas suas atribuições e por não ser este organismo do Estado dotado de personalidade jurídica, mas um serviço da administração directa do Estado, este é que deveria ter sido citado através do seu representante, o Ministério Público, conforme dispõe o nº 1 do artigo 20º do CPC.
Tendo os autos prosseguido, teve lugar nova audiência de partes, resultando da respectiva acta que a audiência foi aberta após 40 minutos de espera para que o Ministério Público aguardasse no sentido de se saber se viria a tribunal algum representante da Secretaria de Estado da Cultura, o que não sucedeu.
Notificado o Réu, na pessoa do Ministério Público, para contestar, por este foi requerida a prorrogação do prazo para apresentar a contestação, o que lhe foi deferido.
Contestou o Réu por excepção e por impugnação.
   Por excepção, invocou a prescrição dos créditos dos Autores, por já ter decorrido o prazo previsto no nº 1 do artigo 337º do CT, dado que foi citado em 15 de Julho de 2013 e o vínculo laboral que uniu os Autores e o Estado cessou em 3 de Fevereiro de 2012, acrescentando que os Autores contribuíram para que a citação do Estado Português se efectuasse decorrido aquele lapso de tempo, porquanto não demandaram inicialmente quem de direito.
     Por impugnação invocou, em resumo, que os contratos a prazo que foram celebrados pelos Autores, foram celebrados nos termos do Decreto-Lei nº 64-A/89 de 27/2 com a estrutura de projecto denominada Rede Portuguesa de Museus e não, como referem, com o IMC, IP cuja lei orgânica só foi aprovada em 1 de Abril de 2007, pelo que, após a extinção da estrutura da Rede de Museus continuaram a trabalhar sem qualquer suporte formal para tal vínculo.
   Acrescentou, ainda, que a prestação dos Autores, após a criação do IMC, IP é irregular e anómala, implicando que em qualquer momento podia cessar o contrato, não tendo cobertura legal a reintegração dos Autores, por não ser possível a conversão do contrato em contrato por tempo indeterminado, como também não existe fundamento legal para a peticionada indemnização, não sendo aplicáveis ao caso as normas do contrato de trabalho, dado que, após a extinção da estrutura Rede Portuguesa de Museus, inexiste um vínculo dessa natureza.
 Pediu, a final, que seja julgada procedente a excepção peremptória e o Réu absolvido do pedido e, caso assim não se entenda, que seja julgada improcedente a acção, com a consequente absolvição do Réu do pedido.
 Os Autores responderam mantendo que, à data em que foi interposta a acção, o IMC, IP mantinha a sua personalidade jurídica e mesmo que assim não fosse, a incorrecta designação do sujeito passivo sempre se deveria ter como desculpável e, ao abrigo do princípio pro actione, considerar-se a acção interposta contra o Estado.
            (…)
  Subsequentemente foi proferido despacho saneador/sentença que decidiu:
          “ Face ao exposto e nos termos dos artigos 576º, 579º, e 595º do C.P.Civil de 2013,aplicáveis ex vi do art.1º/2ª) do C.P.T., decide julgar-se verificada a excepção da prescrição e consequentemente, mais se decide julgar improcedente a presente acção interposta pelos Autores AA, BB, CC, DD e EE contra o Réu Estado Português e absolver o Réu do pedido contra si formulado pelos Autores”.
           Inconformados com a decisão os Autores interpõem recurso, formulando as seguintes conclusões:
(…)
            O Ministério Público contra-alegou e formulou as seguintes conclusões:
            (…)
*
            OBJECTO DO RECURSO
Como é sabido, o âmbito do recurso é limitado pelas questões suscitadas pelo recorrente nas conclusões das suas alegações (arts. 635º nº 4 e 639º do CPC, ex vi do nº 1 do artigo 87º do CPT), sem prejuízo da apreciação das questões que são de conhecimento oficioso (art.608º nº 2 do CPC).
No presente recurso, há que apreciar as seguintes questões:
1ª- Se é de conhecer se o IMC, IP, se mantém em fase de liquidação e logo, se ainda tem personalidade jurídica, por ainda não ter sido publicado o aviso a que se refere o artigo 4º nº 6, do Decreto-Lei nº 200/2006 de 25/10.
2ª-Se o tribunal a quo, ao considerar estarem prescritos os créditos dos Autores violou o disposto no nº 2 do artigo 323º do CC e fez uma interpretação deste preceito em violação do princípio da pro actione consagrado no artigo 20º da CRP.
*
FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
            Os factos com interesse para a decisão da causa são os que constam do relatório supra para o qual se remete e os seguintes:
            - A presente acção foi intentada em 09 06.2012 (fls.44).
            - A carta para citação do Instituto Português dos Museus, IP foi recepcionada e assinada a 22 de Junho de 2012 (fls.105).
            - O Ministério Público foi citado para a acção a 15 de Julho de 2013 (fls.164)
       - A cessação dos contratos celebrados com os Autores foi-lhes comunicada em 03.02.2012.
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FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
Comecemos, então, por apreciar se é de conhecer se o IMC, IP se mantém em fase de liquidação e logo, se ainda tem personalidade jurídica, por ainda não ter sido publicado o aviso a que se refere o artigo 4º nº 6, do Decreto-Lei nº 200/2006 de 25/10.
A este propósito os recorrentes reafirmaram o já defendido na petição inicial e na resposta à contestação que foi apresentada pela Secretaria de Estado da Cultura no sentido de que aquele Instituto ainda está em fase de liquidação e goza de personalidade jurídica e, para prova do alegado, juntaram com as alegações de recurso 8 documentos.
Ora, conforme decorre do relatório que antecede, por acórdão proferido, em 4 de Junho de 2014, no Processo nº 2413/12.6TTLSB-A.L1 deste Tribunal e Secção foi confirmada a decisão do tribunal a quo que julgou procedente o incidente de nulidade por falta de citação do Réu, declarou a anulação de todo o processado posterior à petição inicial e designou a realização de nova audiência de partes, decisão que teve por fundamento a consideração de que o IMC, IP extinguiu-se em 01.06.2012, data em que a DGPC sucedeu nas suas atribuições e por não ser este organismo do Estado dotado de personalidade jurídica, mas um serviço da administração directa do Estado, este é que deveria ter sido citado através do seu representante, o Ministério Público, conforme dispõe o nº 1 do artigo 20º do CPC.
Sendo assim, relativamente a esta questão mostra-se esgotado o poder jurisdicional, conforme dispõe o nº 1 do artigo 613º do CPC, não podendo este Tribunal proceder, de novo, no âmbito deste recurso, à sua apreciação e sendo certo que, a existirem vícios no referido acórdão, os mesmos sempre terão de ser suscitados e conhecidos no âmbito daquele processo.
Com efeito, como escrevem José Lebre de Freitas, A. Montalvão Machado e Rui Pinto, in Código de Processo Civil Anotado, Volume 2º, pag. 697, cujo ensinamento embora se reporte ao CPC na versão anterior é, ainda assim, aplicável ao caso, “ Um dos efeitos da sentença consiste no esgotamento do poder jurisdicional do juiz que a profere: quer conclua com a absolvição da instância, quer condene no pedido ou dele absolva, o juiz da causa não pode em regra reverer a decisão proferida.”
Acrescente-se, por fim, que, uma vez que os documentos juntos com as alegações tinham em vista fazer prova da não extinção do IMC, IP, não sendo de conhecer tal questão pelos motivos apontados, entendemos não se vislumbrar necessária qualquer pronúncia sobre a sua admissibilidade ou não, o que apenas se justificaria no caso de ser apreciada essa questão.
*
Vejamos, agora, se o tribunal a quo ao considerar estarem prescritos os créditos dos Autores, violou o disposto no nº 2 do artigo 323º do CC e fez uma interpretação deste preceito em violação do princípio da pro actione consagrado no artigo 20º da CRP.
Nesta sede, defendem os Recorrentes, em resumo, que quem leia o parágrafo em que o tribunal a quo diz que os Autores “erraram” ao identificar o Réu é levado a pensar que era óbvio e manifesto, visível a olho nu, sem qualquer margem para dúvidas que o Estado Português era o Réu e que os Autores deveriam, desde logo, ter requerido a citação do Ministério Público, mas não é assim, tanto mais que, na audiência de partes, nenhum dos presentes levantou a questão do suposto erro, sendo certo, também que a evidência do erro dos Autores se compadece mal com o comportamento processual do Ministério Público, como já sublinharam na resposta à excepção.
Acrescenta que estamos no âmbito de uma matéria complexa pelo que exigir uma precisão como se exigiria se estivéssemos no âmbito de uma relação laboral que tivesse como sujeito passivo o Sr. Silva, talhante, merceeiro, carpinteiro ou mecânico, afigura-se de excessivo rigor.
Na interpretação do artigo 323º nº 2 do CC não pode ser olvidada a Constituição e o princípio do “pro actione”, que impede que a rígida aplicação das regras processuais possa por em causa o exercício do direito fundamental do acesso ao direito e que postula a interpretação das normas adjectivas de forma a promover a obtenção de pronúncias sobre o mérito.
Por fim, entendem os Autores que a norma do artigo 323º nº 2 do CC não pode, in casu, ser interpretada no sentido segundo o qual é imputável aos Autores a citação do Ministério Público, para além dos cinco dias ali previstos.
Contrapõe o Ministério Público invocando, essencialmente, que a identificação errónea do Réu por parte dos Autores contribuiu para que a citação se não fizesse no prazo de cinco dias após a propositura da acção, consumando-se, por conseguinte, a invocada prescrição dos direitos dos Autores.
Sobre a questão e após aludir ao instituto da prescrição, à pretensão formulada pelos Autores na acção e transcrever o nº 1 do artigo 337º do CT de 2009, escreve-se na sentença recorrida o seguinte:
“ No caso em apreço, apesar de estarem em desacordo quanto a outros vários aspectos, as partes não colocam em causa a data da extinção dos contratos de trabalhos invocados a título de causa de pedir: tal extinção foi comunicada aos Autores em 03/02/2012.
Daqui decorre que o prazo de 1 ano de que os Autores dispunham para exercer o seu direito exigir judicialmente os créditos invocados na presente acção, não ocorrendo nenhum facto interruptivo ou suspensão do mesmo, terminava às 24horas do dia 03/03/2013 (cfr.art.279/c) do C.Civil).
A presente acção apenas foi instaurada na data de 14/06/2012 (cfr. fls.96 dos autos e cfr.art.267º do C.P.Civil na versão em vigor à data, aplicável ex vi do art.1º/2/a) do C.P.Trabalho.
Como resulta dos despachos proferidos a fls.135 e 154/156 dos autos, o Réu só foi válida e eficazmente citado na data de 15/07/2013 (cfr.fls.164 dos autos) e uma vez que não foram alegados quaisquer factos reveladores da verificação de uma qualquer causa suspensiva ou interruptiva da prescrição (nomeadamente, não se mostra que tenha ocorrido qualquer acto revelador da intenção do exercício do direito por parte do respectivo titular ou que consubstancie um reconhecimento do direito – cfr.arts.323/1 e 325º do C. Civil), conclui-se que tal acto interruptivo da prescrição, (citação) ocorreu muito depois de decorrido na íntegra aquele prazo de 1 ano.
É certo que, por força do disposto no art.323º/2 do C.Civil, a interrupção do prazo de prescrição pode verificar depois de decorridos cinco dias sobre a data da interposição da acção, mas tão só e apenas quando a citação não se faça dentro desse prazo de cinco dias por causa não imputável ao autor.
Ora, como bem salienta o Réu em sede de contestação, e os Autores não conseguem minimamente contrariar na sua resposta, a citação jamais podia ter ocorrido válida e eficazmente nesse prazo de 5 dias já que os Autores erraram ao identificarem como Réu, na petição inicial, o IMC, IP, em vez do Estado Português, dando assim caso à efectivação de uma citação nula e a que só posteriormente se pudesse corrigir tal erro dos Autores, e ordenar a efectivação de uma citação válida e eficaz.
Dando-se aqui por integralmente reproduzido o nosso despacho de fls.154 a 155 dos autos, frisa-se ainda o seguinte:
- desde 01/06/2012, por força do disposto nos arts.1º, 13º, 17º do Dec.-Lei nº 115/2012,de 25/10, a Direcção –Geral do Património Cultural (DGPC), que é um serviço da administração directa do Estado, dotado de autonomia administrativa, sucedeu nas atribuições do aqui Réu – Instituto dos Museus e da Conservação, IP – cuja extinção já havia sido declarada pelo art.42º/3f) do Dec.-Lei nº 126-A/2011, de 29/12;
- daqui resulta que, desde a data da publicação daquele Dec.-Lei nº 115/2012, em 25/01/2012, ou seja, desde data anterior à própria declaração da extinção dos contratos, já os Autores tinham (e deviam ter) conhecimento que, independentemente do termo daquele processo de dissolução (e do respectivo despacho) a partir da referida data de 01/06/2012, as atribuições desse IP onde se incluem os respectivos direitos e obrigações, passariam a pertencer àquela DGCP, que é um serviço central da administração directa do Estado, não tendo, por isso, personalidades jurídica e judiciária próprias;
- Apesar disso os Autores identificaram erradamente na petição inicial como Réu o «Instituto dos Museus e da Conservação, IP», quando a pessoa efectivamente demandada na presente acção é o próprio Estado, pessoa colectiva em que se integra aquela DGPC, que sucedeu àquele IP e é um órgão da administração pública mas destituído de personalidade jurídica e judiciária, assinalando-se que uma coisa é o processo dissolução decorrente da extinção do IP em causa decretada pelo referido Dec.-lei nº 126-A/2011, outra coisa é efectiva e concreta sucessão da Direcção-Geral do Património Cultural (DGPC) nas atribuições desse IP decretada pelos referidos arts.1º,13º e 17º do Dec.-Lei nº 115/2012;
- Por força de tal erro, que não se mostra sequer desculpável atenta a antecedência temporal com que os Autores tiveram conhecimento da situação (saliente-se que os Autores podiam ter instaurado a acção antes daquela data de 01/06/2012, sendo que a sucessão de direitos e obrigações já teria ocorrido no âmbito da acção, e tal já não lhes seria imputável…, por despacho de 18/06/2012, foi ordenada a citação do Réu, a qual se realizou de forma ilegal e inválida – quer à data do despacho que ordenou a citação quer à data em que a mesma se efectivou, nestes autos, quem ocupava a posição de Réu era o Estado Português e não aquele IP;
- por conseguinte, a citação do Réu devia ter sido cumprida com o estrito cumprimento do disposto no art.20º do C.P.Civil na versão em vigor à data, aplicável ex vi do art.1º/2ª) do C.P.Trabalho, sendo que tal omissão da citação do Ministério Público integrou a situação de falta de citação prevista na altura na alínea b) do art.194º do C.P.Civil e implicou a anulação de todo o processado posterior à petição inicial;
- e sendo certo que, só após tal anulação do processado, se pode efectivar a citação válida e eficaz do Réu, tudo sempre em consequência do erro dos Autores (assinale-se que mesmo após a questão da nulidade da citação ter sido citada, os Autores vieram sustentar e manter a sua posição de demandar entidade já não detentora de quaisquer direitos e obrigações – cfr.fls.123 a 129 – Como pretendia exercer os direitos que pretendiam ver declarados contra tal ente?!).
Nestas circunstâncias, conclui-se que, por força do erro dos Autores, jamais podia ser efectivada a citação válida e eficaz do Réu no prazo de 5 dias após a propositura da acção (assinale-se que já mesmo quando o tribunal suscitou a questão da nulidade da citação – despacho de fls.135, proferido em 02/04/2013 – já estava integralmente decorrido o prazo de prescrição), pelo que não ocorre o facto interruptivo da prescrição previsto no citado por força do disposto no art.323º/2 do C.Civil.
Por conseguinte, impõe concluir-se que o prazo de prescrição decorreu na íntegra antes da data de verificação do único facto que in casu teria virtualidade para o interromper.
E, assim, mostrando-se integralmente completado o respectivo prazo, encontra-se consumada a prescrição de todo e qualquer direito emergente do contrato de trabalho de que os Autores fossem titulares sobre o Réu.
(…)
Consequentemente, está verificada a excepção peremptória deduzida pelo Réu, e por via disso, não se pode reconhecer aos Autores os direitos reclamados sobre o Réu, devendo o mesmo ser absolvido do pedido, devendo a acção ser julgada improcedente.
(…)”.
Vejamos:
Estabelece o artigo 323º do Código Civil:
            1- A prescrição interrompe-se pela citação ou notificação judicial de qualquer acto que exprima, directa ou indirectamente, a intenção de exercer o direito, seja qual for o processo a que o acto pertence e ainda que o tribunal seja incompetente.
            2- Se a citação ou notificação se não fizer dentro de cinco dias depois de ter sido requerida, por causa não imputável ao requerente, tem-se a prescrição por interrompida logo que decorram os cinco dias.
       3- A anulação da citação ou notificação não impede o efeito interruptivo previsto nos números anteriores.
           4- É equiparado à citação ou notificação, para efeitos deste artigo, qualquer outro meio judicial pelo qual se dê conhecimento do acto àquele contra quem o direito pode ser exercido.
      Sobre este artigo escrevem Pires de Lima e Antunes Varela, in Código Civil Anotado, Vol I, pags.288 e 289:
   “ Decorre deste preceito que não basta o exercício extrajudicial do direito para interromper a prescrição: é necessária a prática de actos judiciais que, directa ou indirectamente, dêem a conhecer ao devedor a intenção de o credor exercer a sua pretensão.
            (…)
          O facto interruptivo da prescrição consiste no conhecimento que teve o obrigado, através duma citação ou notificação judicial, de que o titular pretende exercer o direito daí as disposições dos nºs 3 e 4.
            (…)
  Importa distinguir entre falta e nulidade da citação ou notificação. Como se exige que seja levada ao conhecimento do obrigado a intenção de exercer o direito, se falta a citação ou notificação, a prescrição não se interrompe, a não ser nos termos excepcionais acima referidos. Se porém, há nulidade, não deixa de haver interrupção, se, não obstante a nulidade, se exprimiu aquela intenção.”
E a propósito do nº 2 do artigo 323º do CC, afirma-se no Acórdão do STJ de 14 de Janeiro de 2009, in www.dgsi.pt: “ O efeito interruptivo estabelecido no nº 2 do artigo 323º do Código Civil, pressupõe a concorrência de três requisitos: que o prazo prescricional ainda esteja a decorrer e assim se mantenha nos cinco dias posteriores à propositura da acção; que a citação não tenha sido realizada nesse prazo de cinco dias; que o retardamento na efectivação desse acto não seja imputável ao autor”.
Volvendo ao caso dos autos, constata-se que os Autores propuseram a acção contra o IMC, IP e logo na petição inicial referiram que o dito Instituto tinha sido extinto, mas que ainda mantinha a sua personalidade jurídica pelos motivos que aí apontaram e que foram sustentando ao longo de todo o processo.
Sucede que, na audiência de partes que se realizou no dia 5 de Julho de 2012 (data em que ainda não tinha decorrido o prazo de um ano sobre a cessação dos contratos dos Autores), estiveram presentes, para além do ilustre mandatário dos Autores, ilustre mandatário que apresentou procuração que lhe foi outorgada pelo Sr. Secretário de Estado, isto porque, segundo afirmou, o Instituto dos Museus e da Conservação, IP foi extinto pelo Decreto-Lei nº 115/2012, tendo as suas competências sido integradas na Secretaria Geral da Cultura, extinção que, conforme já dissemos, também já tinha sido sustentada pelos Autores na petição inicial, mas com a particularidade de que aquele Instituto ainda mantinha a sua personalidade jurídica, pelo que, para efeitos de interrupção do prazo de prescrição, entendemos não relevar a afirmação feita pelo tribunal a quo no sentido de que os Autores tinham ou deviam ter conhecimento que o IMC, IP já estava extinto quando propuseram a acção.
Ora, perante a versão apresentada pelos Autores na petição inicial e as declarações que foram prestadas na audiência de partes pelo ilustre mandatário da Secretaria Geral da Cultura, impunha-se, desde logo, que perante a evidente controvérsia que se suscitava sobre a pessoa do Réu, o tribunal, após cumprido o contraditório, tivesse proferido decisão sobre o lado passivo da acção (o que, de acordo com o artigo 202º do CPC na redacção aplicável, sempre seria do conhecimento oficioso do tribunal), questão que apenas foi suscitada pelo tribunal em 02.04.2013 e que veio a ser decidida em 02.07.2013, ou seja, quase um ano depois de realizada a audiência de partes e sendo certo que, em ambas as datas, já havia decorrido mais de um ano sobre a data em que foi comunicada aos Autores a cessação dos contrato.
Na verdade, perante tal questão controvertida, não fazia sentido o tribunal ter tentado a conciliação das partes como tentou, assumindo, assim, que o Réu seria a Secretaria de Estado e que esta se encontrava devidamente representada, como também o assumiu a dita Secretaria na pessoa do seu mandatário e, muito menos, ter determinado a sua notificação para contestar, como se, efectivamente, estivesse na presença do Réu e este estivesse devidamente representado.
E mesmo pressupondo que na audiência de partes, ou em momento posterior próximo à sua realização, não teria sido possível apreciar da falta de citação do Réu, tendo o último articulado sido apresentado a 2 de Outubro de 2012 (fls.134), ou seja, 4 meses antes do prazo de prescrição, não se justifica que, em tal período de tempo não tivesse sido decidida a questão.
Assim, decorrendo do artigo 20º da CRP que “todos têm direito a que uma causa em que intervenham seja objecto de decisão em prazo razoável e mediante processo equitativo” (nº 4) e que “para defesa dos direitos, liberdades e garantias pessoais, a lei assegura aos cidadãos procedimentos judiciais caracterizados pela celeridade e prioridade de modo a obter tutela efectiva e em tempo útil contra ameaças ou violações desses direitos” (nº 5), afirmamos que o direito ao acesso ao direito e à tutela jurisdicional efectiva do direito dos Autores só se teria concretizado com a apreciação da questão sobre a pessoa do Réu, na audiência de partes ou em momento próximo posterior, ou então, no momento acima referido, o que não sucedeu.
E como escrevem J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira in Constituição da República Portuguesa Anotada, Vol.I, pag. 416:
“ Não é suficiente garantia o direito de acesso aos tribunais ou o direito de acção. A tutela através dos tribunais deve ser efectiva. O princípio da efectividade articula-se, assim com uma compreensão unitária da relação entre direitos materiais e direitos processuais, entre direitos fundamentais e organização e processo de protecção e garantia. (…) O princípio da efectividade da acção postula, desde logo, a existência de tipos de acções ou recurso adequados (cfr. Cód.Proc.Civil, art.20-2), tipos de sentenças apropriados às pretensões de tutela deduzida em juízo e clareza quanto ao remédio ou acção à disposição do cidadão (cfr.as formas de processo hoje consagradas no Cód.Proc.Trib.Adm., arts.35 e sss).”
E se é certo que os Autores erraram ao identificar a pessoa do Réu como sendo o IMC, IP, também é certo que ao não decidir sobre a falta de citação do Réu (Estado Português), no momento próprio e em tempo útil, como era exigível, tal circunstância também contribuiu para que tal erro se protelasse no tempo e decorresse, entretanto, mais de um ano sobre a cessação dos contratos até que fosse citado o Réu.  
Assim, perante este quadro e sendo certo que o instituto da prescrição tem por fim sancionar a inacção negligente do titular do direito, o que não é, manifestamente, o caso dos autos, impõe-se concluir que o tribunal a quo errou ao concluir que a falta de citação do Réu, Estado Português, na pessoa do Ministério Público, antes de decorrido o prazo de um ano sobre a cessação dos contratos dos Autores se deveu, em exclusivo, a erro dos Autores que não identificaram correctamente a pessoa do Réu e ao não considerar interrompido o prazo de prescrição nos termos do nº 2 do artigo 323º do CPC.
E porque o prazo prescricional ainda estava a decorrer quando foi proposta a acção, ainda se mantinha nos cinco dias posteriores à sua propositura e o retardamento da citação do Ministério Público não pode ser, em exclusivo, imputável aos Autores, teremos de concluir que o prazo de prescrição do direito dos Autores se interrompeu decorridos os cinco dias a que alude o nº 2 do artigo 323º nº 2 do CC.
Assim, estabelecendo o nº 1 do artigo 337º do CT/2009 que corresponde ao artigo 381º do CT/2003 que, por sua vez, teve por fonte o artigo 38º da LCT que “ o crédito de empregador ou trabalhador emergente de contrato de trabalho, da sua violação ou cessação prescreve decorrido um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho”, impondo-se considerar que a citação do Réu verificou-se decorridos cinco dias depois de ter sido requerida, logo resulta que não decorreu o prazo de prescrição dos créditos reclamados pelos Autores nesta acção.
Por conseguinte, terá de ser julgada procedente a apelação com a consequente revogação da decisão recorrida e prosseguimento dos autos.
As custas do recurso serão devidas a final pela parte vencida.
*
            DECISÃO
Pelo exposto, acorda-se em julgar procedente a apelação e, revogando-se a decisão recorrida, declara-se improcedente a excepção peremptória da prescrição de créditos arguida pelo Réu e determina-se que os autos prossigam os seus ulteriores termos.
Custas a final pela parte vencida.
Lisboa, 2 de Julho de 2014

Celina Nóbrega
Alda Martins
Paula Santos
Decisão Texto Integral: