Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
989/21.6T8CSC-A.L1-2
Relator: NELSON BORGES CARNEIRO
Descritores: PROCEDIMENTO CAUTELAR NÃO ESPECIFICADO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 03/02/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I – A decretação de providência cautelar não especificada pressupõe que se verifique a “probabilidade séria da existência do direito invocado” e “fundado receio de que outrem cause lesão grave e dificilmente reparável a tal direito” (periculum in mora).

II – Para a valoração do dano grave e irreparável ou de difícil reparação, não é necessário que se trate de um dano irreparável em termos absolutos, bastando que implique uma reconstituição difícil do status quo ante.

III – A providência cautelar não deve ser decretada quando o dano que se pretende evitar respeitar a um facto imputável ao próprio requerente ou quando este tiver contribuído para a produção desse mesmo dano.

IV – A aplicação das sanções previstas no art.º 442.º/2, do CCivil, pressupõe o incumprimento definitivo do contrato-promessa, não bastando a simples mora.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: ACÓRDÃO[1]

Acordam os juízes da 2ª secção (cível) do Tribunal da Relação de Lisboa:

1. RELATÓRIO

WHITEKEY PROPERTIES, S.A., intentou procedimento cautelar não especificado contra PL, entretanto falecido e com herdeiros habilitados, CL, AL, BG, PML, BL, FB, MB e, MTB pedindo que:
1. Se abstenham de onerar, alienar ou prometer alienar a terceiros, total ou parcialmente, o quinhão hereditário de que são titulares e que haviam prometido vender à Requerente através do contrato-promessa celebrado em 19.4.2019;
2. Se abstenham de votar favoravelmente, na qualidade de sócios e/ou de gerentes, qualquer deliberação social da sociedade Lobimar - Realizações Turísticas Lda, que tenha por efeito, direto ou indireto a alienação, a título oneroso ou gratuito, divisão, oneração, arrendamento ou qualquer outro negócio jurídico que tenha por efeito a diminuição da disponibilidade dos imóveis identificados no artigo 8.º do presente requerimento inicial;
3. As ordens judiciais referidas nos anteriores números 1 e 2 deverão ser decretadas até trânsito em julgado da decisão que ponha termo ao Processo que, sob o n.º …/…, corre termos pelo Juízo Central Cível de Cascais, J2, deste Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste.

Foi proferida sentença que julgando improcedente o procedimento cautelar, indeferiu as providências requeridas.

Inconformado, veio o requerente apelar da sentença, tendo extraído das alegações[2],[3] que apresentou as seguintes

CONCLUSÕES[4]:

A. O presente recurso vem interposto da douta sentença de fls._, proferida pelo Juiz 2 do Juízo Central Cível de Cascais, no âmbito do processo n.º …/…, que corre por apenso à Acção Principal de Execução Especifica, que tem por objeto a aquisição do quinhão hereditário da herança aberta por óbito de MVL (o referido CPCV).

B. O Recorrente não se conforma com a referida sentença e visa com o presente recurso impugnar a decisão proferida.

C. De acordo com a alínea e) dos Factos Não Provados que constam da sentença recorrida, a “Recorrente não foi notificada por qualquer das formas previstas na Cláusula 6.ª do CPCV para estar presente no dia 29.12.2020, pelas 14:30, ou em qualquer outra data ou hora, no cartório notarial ou em outro local, com vista à outorga da escritura pública de compra e venda do quinhão hereditário”.

D. A declaração de resolução do contrato dirigida pelos Recorridos à Recorrente a 30 de Dezembro de 2020 não deve ter-se por lícita, uma vez que existem elementos nos autos para permitir indiciariamente chegar-se a essa conclusão.

E. Consequentemente essa declaração resolutiva sem fundamento tem uma inegável virtualidade: torna patente a constituição dos Recorridos numa situação de incumprimento definitivo, tornando dispensável ao recorrente o percurso da via crucis da fixação do prazo admonitório, para que estes se constituam naquela situação: quem resolve infundadamente um contrato revela uma vontade séria, definitiva e consciente de não o querer cumprir e de se sujeitar às consequências desse incumprimento.

F. Para efeitos do preenchimento do requisito fumus bonus iuris - aparência do bom Direito - a presente providência cautelar não especificada foi intentada com base no n.º 2 do artigo 362.º do CPC.

G. Como se refere nessa norma, “o interesse do requerente pode fundar-se num direito já existente ou em direito emergente de decisão a proferir em ação constitutiva, já proposta ou a propor.”, tendo a Recorrente intentado a respetiva Acção Principal, cujo desfecho se aguarda.

H. Tendo o contrato-promessa dos autos eficácia meramente obrigacional, a não se impedir a venda a terceiros, poderá o promitente comprador (aqui Recorrente) ver frustrada, de forma definitiva e irremediável, a sua expectativa e o seu direito à outorga do contrato prometido, ainda que por efeito à execução específica.

I. A presente providência tem como fim acautelar o fim útil da ação de que depende, visando impedir que, durante a pendência desta, a situação de facto se altere de modo a que a sentença, sendo favorável, perca a eficácia ou pelo menos, parte dela.

J. Com a presente Providência, pretende-se acautelar e garantir o cumprimento futuro do contrato.

K. O fim útil da providência é “impedir que os promitentes vendedores fiquem impossibilitados de vir a cumprir o contrato", por forma a que "não possam perder a legitimidade
para o contrato prometido".

L. O fim da providência é totalmente distinto do fim da ação de execução específica do contrato-promessa, pelo que, "no caso presente, não se procura alcançar, através da primeira o fim que se tem em vista com a segunda".

Os requeridos, FL, CL e AL contra-alegaram, pugnando pela improcedência da apelação do requerente.

Colhidos os vistos[5], cumpre decidir.

OBJETO DO RECURSO[6],[7]

Emerge das conclusões de recurso apresentadas por WHITEKEY PROPERTIES, S.A., ora apelante, que o seu objeto está circunscrito à seguinte questão:

1.) Saber se estão verificados os pressupostos de que depende o decretamento do procedimento cautelar comum.
       
2. FUNDAMENTAÇÃO

2.1. FACTOS PROVADOS NA 1ª INSTÂNCIA
           
1. Por contrato-promessa celebrado em 11 de abril de 2019, os Requeridos (ou seus
antecessores) prometeram vender à Requerente, pelo preço de 1.085.000,00€ (um milhão e oitenta e cinco mil euros), que lhes prometeu comprar, o quinhão hereditário da herança aberta por óbito de MVL (doravante apenas “CPCV”), junto à ação principal como Doc. 4, que aqui se dá por integralmente reproduzido para os devidos e legais efeitos.

2. Integra o referido quinhão hereditário a quota indivisa de 39.900,00€ no capital social da sociedade Lobimar, que representava 99,75% do capital da referida sociedade comercial.

3. Por seu turno, a Lobimar tinha como ativo o já referido imóvel, entretanto objeto de divisão fundiária levada a cabo pela Requerente, após a celebração do CPCV e a suas expensas, mediante procuração emitida pelos Requeridos, como ato preparatório da venda do quinhão hereditário.

4. Por força da referida operação de parcelamento, a Lobimar é atualmente proprietária de dois imóveis contíguos sitos na Rua … n.º …, Estoril, ambos
descritos na 2.ª Conservatória do Registo Predial de Cascais, União de Freguesias de Cascais e Estoril: o primeiro corresponde a um lote de terreno para construção sob o n.º …, inscrito na matriz sob o art.º …-P, com a área de 652 m², o segundo descrito sob o n.º …, inscrito na matriz sob o art.º …, com a área de 665 m², no qual se encontra edificada uma moradia com a área de 208 m², de acordo com o que resulta das respetivas certidões prediais juntas aos autos e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para os devidos e legais efeitos.

5. Consta do teor da Cláusula 3.ª, do acordo aludido em 1. e entre o mais que:
a) De forma a evitar que qualquer imprevisto pudesse inviabilizar a celebração da escritura definitiva, os ditos Requeridos comprometiam-se a realizar individualmente e de imediato, procurações a favor de pessoa da sua escolha para esse efeito - v. Cláusula 3.ª, n.º 1, i);                
b) Extinção do inventário de partilhas com o n.º …/…, no Cartório Notarial de
MP, em Odivelas - v. Cláusula 3.ª, n.º 1, i);
c) Constituição de conta bancária para caucionar o pagamento de indemnização em
que a LOBIMAR – Realizações Turísticas Lda pudesse vir a ser condenada no âmbito da ação declarativa de condenação que lhe foi movida pela WORLDWIDEX, LDA, e corre termos sob o n.º …/… pelo Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, Juízo Central Cível de Lisboa – Juiz 20, em que o pedido de condenação é de 60.270,00€ acrescido de juros legalmente devidos (v. Cláusula 3.ª, n.º 5);
d) Outorga de procuração conferindo poderes à Autora para permitir o registo prévio da hipoteca exclusivamente para efeitos de garantia do financiamento a obter pela Autora para aquisição celebração do contrato prometido (v. Cláusula 3.ª, n.º 8, alínea c);
e) Assegurar a renúncia à gerência dos então gerentes até à celebração do contrato definitivo de compra e venda, declarando os Requeridos reconhecer que este era um ponto essencial para que a Requerente celebrasse o mesmo contrato (v. Cláusula 3.ª, n.º 10);

6. Do cotejo do disposto nas alíneas b) e e) do n.º 1 da cláusula segunda e da cláusula quarta do CPCV decorre que a escritura pública de compra e venda dos quinhões hereditários deveria ter lugar no prazo de 90 (noventa) dias a contar da data da assinatura do CPCV, incumbindo à Requerente notificar os Requeridos com a antecedência mínima de 10 (dez) dias úteis da data, hora e local agendados para a outorga da escritura, por e-mail ou carta registada, prazo que poderia ser prorrogado por mais 90 (noventa) dias contra o pagamento do reforço de sinal de €210.000,00 (duzentos e dez mil euros).

7. Dispõe a cláusula 6.ª do aludido CPCV, sob a epígrafe "Notificações, contactos e IBAN", para o que releva que, "[a]s partes contratantes notificar-se-ão entre si para os endereços
constantes do preâmbulo do presente contrato e para os endereços de e-mail abaixo indicados,
comprometendo-se a informar prontamente qualquer alteração, sem a qual as notificações enviadas para os endereços conhecidos serão consideradas válidas.".

8. O prazo convencionado para a celebração do contrato prometido terminaria, pois, a
10.07.2019, incumbindo à Requerente notificar os requeridos, até 26.06.2019, da data, hora e local agendados para a outorga da escritura, o que não fez.

9. O prazo aludido em 6 foi ultrapassado sem que tivesse havido, por banda da requerente, reforço de sinal, tal qual previsto na cláusula 2.ª al. f) e g) do referido CPCV.

10. A escritura pública para outorga do contrato prometido esteve marcada e foi sendo
sucessivamente adiada, pelo menos, nos dias 17.11.2020, 26.11.2020 e 22.12.2020.

11. Consta dos autos, como doc. 2 junto com a oposição, mensagem de correio eletrónico enviada para os Promitentes Vendedores em 17.06.2020, pelo representante legal da
Requerente com o seguinte teor: “estão finalmente compilados os documentos previstos no
CPCV e necessários à apresentação do processo no banco, pelo que vou entregar de imediato.”

12. No dia 17.11.2020, uma das datas gizadas para a realização da escritura, foi enviada outra mensagem de correio eletrónico mediante a qual a requerente, através do seu legal representante, se propõe substituir a venda do quinhão hereditário, por uma escritura pública de dissolução e partilha da sociedade Lobimar – Realizações Turísticas Lda., por forma a que o imóvel que compõe o seu património fosse diretamente vendido à Requerente.

13. Tal proposta foi rejeitada pelos Requeridos, tal como resulta do teor do Doc. 6, junto com a oposição, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para os devidos e legais efeitos.

14. A Requerente não foi notificada nem por carta, nem por e-mail para estar presente no dia 29.12.2020, pelas 14:30, no mencionado cartório notarial para outorga da aludida escritura.

15. Os requeridos remeteram à requerente a seguinte mensagem de correio eletrónico, 30 de dezembro de 2020, pelas 19:10:
 “ASSUNTO: RESOLUÇÃO DE CPCV POR INCUMPRIMENTO DEFINITIVO PL, BL (Em nome próprio e em representação de MTL e de BL), PML (em nome próprio e em representação de ML) e FB, na qualidade de únicos titulares dos quinhões hereditários da herança por óbito de MVL E PROMITENTES VENDEDORES DOS SEUS QUINHÕES HEREDITÁRIOS QUE INTEGRA A QUOTA INDIVISA DA SOCIEDADE LOBIMAR – Realizações Turísticas, Lda.
Exmº. Senhor RS
Mui Digno Administrador Único da WHITE KEY PROPERTIES, S.A. Av. Clotilde, Ed.Centro de Congressos do Estoril, 3º.B 2765-211 ESTORIL
No dia 11 de abril de 2019, celebrámos com a White Key Properties S.A., no acto representada por V. Exª., um contrato-promessa de compra e venda do nosso quinhão hereditário na herança aberta por óbito de nossa mãe MVL, falecida a 15.01.2009, pelo preço de um milhão e oitenta e cinco mil euros.
Na cláusula 5ª. (Incumprimento) do dito contrato-promessa, nos seus nºs. 1 e 3, reza o seguinte:
1. Em caso de incumprimento por motivo imputável por parte da Promitente Compradora, os Promitentes Vendedores têm o direito de resolver imediatamente o presente contrato-promessa de compra e venda e de fazer suas todas as quantias que tenham recebido da Promitente Compradora.”
“3. Entende-se que houve incumprimento definitivo por parte da Promitente Compradora, se esta, devidamente notificada, não comparecer na data e hora previamente marcada para a escritura pública.”
Sucede que, V.Exª., devidamente notificado, não compareceu e nem se fez representar, no dia 29 de dezembro de 2020 pelas 14H30, com uma tolerância de espera de 60 minutos, no Cartório da Notária Dra. FC em Cascais, para a outorga da escritura, onde se encontravam presentes os promitentes vendedores e a procuradora de um dos promitentes vendedores, FL, Sra. D. AS e RS. Do Certificado proferido pela Sra. Notária, Dra. FC, consta entre outros, o seguinte: Mais certifico que a indicada escritura não foi outorgada, em virtude de: 1º. não ter comparecido o representante da sociedade compradora.
Deste modo, consideramos que o Contrato-Promessa de Compra e Venda não foi cumprido por V. Exª. E mais, de acordo com o artigo 5º., nºs. 1 e 3 do CPCV, acima transcrito, considera-se que há um incumprimento definitivo por parte de V. Exª. Nestes termos e pelos motivos acima exposto, vimos declarar a resolução do contrato promessa outorgado com V. Exª. em 11 de abril de 2019, com efeitos imediatos, fazendo nossos os valores recebidos a título de sinal, da sociedade que V. Exª. representa. Sem mais, atentamente,”, consoante resulta do teor do Doc. 7, junto com a petição inicial da Ação Principal, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para os devidos e legais efeitos.

16. A requerente enjeitou a posição expendida pelos requeridos, mediante resposta(s) por mensagem de correio eletrónico remetidas nos dias 31.12.2020 e 15.02.2021, juntas como doc. 9 e 10 à petição da ação principal e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para os devidos e legais efeitos.

2.2. FACTOS NÃO PROVADOS NA 1ª INSTÂNCIA

a) Desde 16 de abril de 2019, data da celebração por CPCV, os Requeridos nunca cumpriram as referidas condições – como aconteceu com as referidas nas alíneas d) e), ou seja, com a outorga de procuração com os poderes e renúncia dos gerentes – ou demoraram anos para demonstrar o cumprimento.

b) Após a celebração do CPCV, faleceu em França, onde residia, a Promitente Vendedora JFL, o que deu origem à abertura de um processo sucessório que se prolongou no tempo e que apenas se resolveu, com a designação das suas sucessoras, a aqui 2.ª Requerida, BG e 7.ª Requerida, MTL, cuja sucessão na titularidade da quota indivisa da Lobimar apenas foi inscrita no registo comercial em 22 de novembro de 2019.

c) À data da missiva expendida em 15, a Requerente já havia pago os seguintes valores, a título de sinal e princípio de pagamento: 84.000,00€ pagos com a celebração do CPCV (12.000€ a cada um dos 7 Réus); 5.000,00€ pagos em 17.05.2020 ao Réu PML; 45.000,00€ pagos em 20.05.2020 mesmo Réu PML, Mais 5.000,00€ pagos no mesmo dias 20.05.2020 ao mesmo Réu PML, 5.000,00€ pagos em 16.10.2020 ao Réu PML; Perfazendo um total de 144.000,00€.

d) Assim, a escritura pública não foi outorgada, nem na data convencionada para o efeito, nem nos 90 (noventa) dias subsequentes, porquanto a requerente não empreendeu o reforço de sinal aludido nas cláusulas referidas em 9.

e) Conforme havia sido solicitado pelo próprio legal representante da Requerente, a Dra. CC, em representação do Cartório Notarial, recebeu o original da renúncia à gerência e, em 29.12.2020, telefonou a todos os intervenientes, tendo, por razões de celeridade, solicitado a comparência dos mesmos no Cartório Notarial para conclusão da escritura em apreço, para o próprio dia, pelas 14h30.

2.3. O DIREITO

Delimitada a matéria de facto, que não vem impugnada[8], importa conhecer o objeto do recurso, circunscrito pelas respetivas conclusões, salvas as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, e as que sejam de conhecimento oficioso[9] (não havendo questões de conhecimento oficioso são as conclusões de recurso que delimitam o seu objeto).

1.) SABER SE ESTÃO VERIFICADOS OS PRESSUPOSTOS DE QUE DEPENDE O DECRETAMENTO DO PROCEDIMENTO CAUTELAR COMUM.
 
A apelante alegou que “os Promitentes Vendedores, aqui Recorridos, ao terem procedido, em 30 de Dezembro de 2020, ao envio de um e-mail declarando, por essa via, que resolviam o CPCV que havia sido celebrado em 2019, declararam de forma clara, inequívoca e definitiva não pretenderem cumprir com as suas obrigações”.

Mais alegou que “Revela bem a intenção de os Requeridos não cumprirem o CPCV, escapando-se à outorga da escritura pública de compra e venda do quinhão hereditário”.

Assim, concluiu que “a resolução infundamentada e precipitada do CPCV pelos Recorridos revela uma intenção subjacente de vender os imóveis a terceiros, aproveitando para, de caminho, se apropriar das quantias já pagas a título de sinal e princípio de pagamento”.

Vejamos a questão.

Sempre que alguém mostre fundado receio de que outrem cause lesão grave e dificilmente reparável ao seu direito, pode requerer a providência conservatória ou antecipatória concretamente adequada a assegurar a efetividade do direito ameaçado – art.º 362º/1, do CPCivil.

A providência é decretada desde que haja probabilidade séria da existência do direito e se mostre suficientemente fundado o receio da sua lesão – art.º 368º/1, do CPCivil.

A providência cautelar será decretada se o tribunal, uma vez efetuada uma apreciação sumária e liminar do direito invocado pelo requerente e da prova por ele produzida, considerar, de forma fundamentada, que se verifica a séria probabilidade de existência desse direito e de um perigo que ameace, de forma grave e irreparável ou de difícil reparação, a sua satisfação[10].

A decretação de providência cautelar não especificada pressupõe que se verifique a “probabilidade séria da existência do direito invocado” e “fundado receio de que outrem cause lesão grave e dificilmente reparável a tal direito” (periculum in mora)[11].
     
O requerente da providência há de, por um lado, afirmar a existência do direito tutelado – ou do interesse juridicamente protegido – e, por outro, o fundado receio de que lhe seja causada lesão grave e dificilmente reparável[12].

O recurso à tutela cautelar implica, desde logo, que o requerente se arrogue titular de um direito, o qual se encontre em risco de sofrer uma lesão grave e irreparável ou de difícil reparação[13],[14],[15].

Não é necessário que se trate de um dano irreparável em termos absolutos, bastando que implique uma reconstituição difícil do status quo ante[16].

Quanto ao direito cujo receio de lesão grave constitui a justificação fundamental para a concessão da tutela cautelar não se exige um juízo de certeza, bastando-se a lei com um juízo de verosimilhança ("probabilidade séria", segundo o art.º 387°, n° 1) formulado pelo juiz, com base nos meios de prova apresentados ou naqueles que o tribunal oficiosamente aprecie, embora tal juízo não deva ser colocado num patamar tão baixo na escala gradativa da convicção do juiz que se tutelem situações destituídas de fundamento razoável[17].

O periculum in mora é constituído por dois elementos essenciais: a demora e o dano decorrente dessa demora. No que concerne ao dano, a providência cautelar só pode ser decretada desde que esta seja grave e irreparável ou de difícil reparação, isto é, quando não seja viável a reintegração do direito de forma especifica ou por equivalente no decurso de um juízo de mérito[18].
    
Os requisitos da gravidade e da dificuldade da reparação são cumulativos, ficando afastadas da tutela cautelar as lesões que sejam facilmente reparáveis[19],[20],[21],[22].

Para o preenchimento do pressuposto periculum in mora não basta que a delonga na efetivação do direito acarrete prejuízo. É necessário que este seja grave e dificilmente reparável[23].

Apenas merecem a tutela provisória consentida pelo procedimento cautelar comum as lesões graves que sejam simultaneamente irreparáveis ou de difícil reparação[24].

O procedimento cautelar pressupõe necessariamente um outro processo (a ação principal) já pendente ou que vai ser instaurado e surge para servir o fim desse processo. Quer isto dizer que qualquer procedimento cautelar tem que visar o reconhecimento provisório de um direito que na causa principal possa vir a ser declarado, constituído ou exigido, não se podendo atingir com ele um objetivo que nela não se possa obter[25].

****

Vejamos, no caso dos autos, se estão verificados os pressupostos de que depende o decretamento da providência cautelar comum, isto é, a probabilidade séria da existência do direito invocado e, o fundado receio de lesão grave e dificilmente reparável.

PROBABILIDADE SÉRIA DA EXISTÊNCIA DO DIREITO

Contrato-promessa de compra e venda do quinhão hereditário

Contrato-promessa é a convenção pela qual ambas as partes, ou, apenas uma delas, se obrigam a celebrar determinado contrato – art.º 410º/1, do CCivil.

Está provado que “Por contrato-promessa celebrado em 11 de abril de 2019, os Requeridos (ou seus antecessores) prometeram vender à Requerente, pelo preço de 1.085.000,00€ (um milhão e oitenta e cinco mil euros), que lhes prometeu comprar, o quinhão hereditário da herança aberta por óbito de MVL (doravante apenas “CPCV”) – facto provado 1.

A sua função consiste em vincular as partes a uma prestação futura, isto é, em obrigar à conclusão de um contrato futuro, que por agora se não quer ou se não pode
realizar, sendo certo ainda que o seu objeto próprio não é
o objeto do contrato a concluir, mas a conclusão dele[26].

Diz-se contrato prometido ou definitivo aquele cuja realização se pretende (compra e venda, sociedade, locação, mandato, etc.)[27].

O contrato-promessa pode assim qualificar-se como um contrato preliminar que tem por objeto a celebração de um outro contrato, o contrato prometido[28].

Assim, face à matéria fáctica, entre as partes foi celebrado um “Contrato Promessa de Compra e Venda do quinhão hereditário da herança aberta por óbito de MVL”.

Incumprimento do contrato-promessa de compra e venda do quinhão hereditário

O legislador configurou diversas situações em que consagrou expressamente o direito à resolução (v.g. artigos 270.º, 437.º, 891.º, 966.º, 1140.º, 1150.º e 2248.º, todos do CCivil).

Entre elas se contam as de impossibilidade definitiva da prestação imputável ao devedor, no âmbito de contratos bilaterais. É o que resulta dos artigos 798.º e 801.º, n.º 2: o devedor que falta culposamente ao cumprimento da obrigação toma-se responsável pelo prejuízo que causa ao credor, sendo certo que, tendo a obrigação por fonte um contrato bilateral, o credor, face à impossibilidade do cumprimento pode, independentemente do direito à indemnização, resolver o contrato.

 Situação diversa do não cumprimento definitivo é a mora do devedor que ocorre quando a prestação, ainda possível, não foi cumprida no tempo devido, por causa imputável àquele (art.º 804.º, n.º 2). A mora, nos termos do n.º 1 do mesmo normativo, apenas constitui o devedor na obrigação de reparar os danos causados ao credor. Não lhe confere o direito à resolução do contrato.

 Além das situações de não observância de prazo fixo absoluto, contratualmente estipulado, o carácter definitivo do incumprimento do contrato-promessa verifica-se nas três hipóteses seguintes:
a) se, em consequência de mora do devedor, o credor perder o interesse na prestação;
b) se, estando o devedor em mora, o credor lhe fixar um prazo razoável para cumprir e, apesar disso, aquele não realizar a prestação em falta;
c) se o devedor declarar inequívoca e perentoriamente ao credor que não cumprirá o contrato.

Ou seja, a mora poderá converter-se em não cumprimento definitivo, se o credor, em consequência da mora, perder o interesse que tinha na prestação (perda de interesse apreciada objetivamente) ou esta não for realizada dentro do prazo que razoavelmente for fixado pelo credor (art.º 808.º/1/2, do CCivil). Nestes dois casos, a demora culposa no cumprimento da obrigação determinará, para o contraente faltoso, a obrigação de indemnizar os danos causados ao credor e confere a este o direito à resolução do negócio.

Este regime é inteiramente aplicável ao contrato-promessa de compra e venda, tendo este, no entanto, um regime específico ao nível das sanções aplicáveis ao não cumprimento, quando tenha havido lugar à constituição de sinal.

Efetivamente, neste caso, quando se verifique uma situação de incumprimento imputável a quem prestou o sinal, permite a lei que aquele que o recebeu o faça seu e, verificando-se o incumprimento definitivo da parte que recebeu o sinal, confere a quem o prestou a faculdade de exigir o dobro do que prestou (artigos 441.º e 442.º/2, do CCivil).

A retenção do sinal pelo contraente que o recebe ou a sua restituição em dobro ao contraente que o constitui sempre foram entendidas, não como uma indemnização moratória, mas antes como uma indemnização pelo não cumprimento definitivo do contrato. Só quando uma das partes desiste do contrato que origina culposamente uma situação de não cumprimento definitivo, é que o outro contraente deve poder exercer, em relação ao sinal, o direito de fazer seu ou de exigir a respetiva restituição em dobro, conforme se trate do accipiens ou do tradens[29].

A aplicação das sanções previstas no art.º 442.º/2, do CCivil, pressupõe o incumprimento definitivo do contrato-promessa, não
bastando a simples mora[30],[31],[32],[33].

A mora poderá também converter-se em incumprimento definitivo quando a prestação não for realizada dentro do prazo que razoavelmente for fixado pelo credor. Confere-se ao credor a possibilidade de impor à outra parte um prazo para cumprir, como meio de obter a realização efetiva da prestação a que tem direito ou de obter uma definição clara da situação de incumprimento que lhe permita exercitar os direitos que a lei confere ao contraente cumpridor perante o não cumprimento definitivo da obrigação que impende sobre a outra parte (designadamente o direito a resolver o contrato).

Por outro lado, impondo-se ao credor a necessidade de proceder à interpelação admonitória do devedor para converter a mora em não cumprimento definitivo, tem o devedor a garantia de que o credor não pode desencadear contra ele nenhuma das sanções ou providências correspondentes ao incumprimento, enquanto lhe não der uma nova e derradeira possibilidade de cumprir a obrigação, pondo termo à sua negligência.

A interpelação admonitória consagrada no art.º 808.º constitui uma ponte essencial de passagem do atravessadouro (lamacento e escorregadio) da mora para o terreno (seco e limpo) do não cumprimento definitivo da obrigação[34].

A interpelação admonitória envolve os elementos da intimação para o cumprimento; da fixação de um termo perentório para o cumprimento e da declaração de que a obrigação se terá por definitivamente não cumprida, se não se verificar o cumprimento dentro do prazo fixado[35].

Mas, independentemente de haver interpelação admonitória, poderá o incumprimento definitivo do contrato-promessa ser resultado de uma antecipada perceção de que o contrato prometido não será concretizado, mediante a apreciação do comportamento ativo ou omissivo da contraparte.

Tal será, v.g., a situação da declaração de um dos promitentes de que não irá cumprir ou não o poderá fazer, traduzindo uma posição de objetiva recusa de cumprimento, sem necessidade de qualquer interpelação admonitória, fixação de algum prazo adicional ou invocação de qualquer outro fator revelador da falta de interesse objetivo no prosseguimento do relacionamento contratual.

Assinala-se uma outra hipótese de incumprimento definitivo do contrato: a que advém de uma declaração inequívoca de não cumprimento por parte do devedor[36].

A esta situação é equiparada uma outra: a que emerge da resolução infundada. A inexistência ou a mera aparência de motivo válido para resolver o contrato, invocado por um dos contraentes, determina a ilegitimidade da própria resolução efetuada. O comportamento mencionado corresponde a uma recusa de execução do contrato, devendo entender-se que se trata de “declaração séria e firme de não cumprir”[37].

Como exemplos de recusa categórica de cumprimento, temos a declaração de resolução ilegítima, a apresentação de uma proposta com condições inaceitáveis de cumprimento, a apresentação de uma reivindicação arbitrária, o começo de negociação com terceiro ou até a inércia em preparar o cumprimento (não eliminando os encargos existentes ou não obtendo a documentação essencial)[38].

Há também uma corrente jurisprudencial que atende a esses comportamentos concludentes equivalentes a uma situação de recusa de cumprimento que justifica a invocação do incumprimento definitivo (relevo autónomo que deve ser atribuído às ações ou omissões de cada um dos promitentes, por forma a justificar, em determinadas circunstâncias, um efeito idêntico ao que decorreria da transformação formal de uma situação de mora em incumprimento definitivo)[39],[40],[41], [42],[43],[44],[45],[46],[47].

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Está provado que:

– Do cotejo do disposto nas alíneas b) e e) do n.º 1 da cláusula segunda e da cláusula quarta do CPCV decorre que a escritura pública de compra e venda dos quinhões hereditários deveria ter lugar no prazo de 90 (noventa) dias a contar da data da assinatura do CPCV, incumbindo à Requerente notificar os Requeridos com a antecedência mínima de 10 (dez) dias úteis da data, hora e local agendados para a outorga da escritura, por e-mail ou carta registada, prazo que poderia ser prorrogado por mais 90 (noventa) dias contra o pagamento do reforço de sinal de €210.000,00 (duzentos e dez mil euros) – facto provado 6.

– O prazo convencionado para a celebração do contrato prometido terminaria, pois, a 10.07.2019, incumbindo à Requerente notificar os requeridos, até 26.06.2019, da data, hora e local agendados para a outorga da escritura, o que não fez – facto provado 8.

– O prazo aludido em 6 foi ultrapassado sem que tivesse havido, por banda da requerente, reforço de sinal, tal qual previsto na cláusula 2.ª al. f) e g) do referido CPCV – facto provado 9.
 
– A Requerente não foi notificada nem por carta, nem por e-mail para estar presente no dia 29.12.2020, pelas 14:30, no mencionado cartório notarial para outorga da aludida escritura – facto provado 14.

– Os promitentes vendedores, aqui requeridos, enviaram à promitente compradora, aqui requerente, em 30 de dezembro de 2020, um e-mail declarando, por essa via, que resolviam o CPCV que havia sido celebrado em 2019 – facto provado 15.

Face aos factos, como acordado entre as partes, a escritura de compra e venda dos quinhões hereditários seria celebrada no prazo de 90 dias, a contar da data da assinatura do contrato, em dia, hora e local a indicar pela promitente compradora, no caso, a apelante/autora.

Assim sendo, o contrato definitivo de compra e venda dos quinhões hereditários deveria ser celebrado até 10-07-2019, competindo à apelante/autora a marcação da respetiva escritura, o que não fez.

Pese embora esteja acordado que a escritura de compra e venda seria celebrada no prazo de 90 dias, nada foi adiantado ou acrescentado no sentido de que a ultrapassagem desse prazo implicaria a resolução do contrato-promessa, com dispensa de interpelação admonitória.

Também não ficou aí consignado que o aludido prazo era perentório, improrrogável e determinante da celebração do negócio, para a outorga do contrato prometido, sendo certo que a cláusula a fixar o prazo essencial deve ser clara, inequívoca e explícita, sob pena do incumprimento do prazo se traduzir apenas em mora[48].

Assim, não tendo a apelante/autora como promitente-compradora procedido à marcação da escritura no prazo de 90 dias a contar da data da assinatura do contrato, não praticou os atos necessários ao cumprimento da obrigação, pelo que, entrou em mora na realização do negócio, pois não se vislumbra que a ultrapassagem do prazo contratualizado, implicou, por si só, o incumprimento definitivo do contrato-promessa.

No contrato-promessa, a situação de mora cessa ou com o cumprimento do contrato-promessa, seja, pela celebração do contrato prometido (o que poderá até decorrer de ação de execução específica – art. 830º/1/3 do CCivil), ou com a sua conversão em incumprimento definitivo, nos termos estatuídos no art.º 808.º do CCivil.

Se o credor, em consequência da mora, perder o interesse que tinha na prestação, ou esta não for realizada dentro do prazo que razoavelmente for fixado pelo credor, considera-se para todos os efeitos não cumprida a obrigação – art.º 808º/1, do CCivil.

A perda do interesse na prestação é apreciada objetivamente – art.º 808º/2, do CCivil.

A perda do interesse do credor, como motivo que gera o incumprimento definitivo, encontra-se prevista no art.º 808º/1,1ª parte, do CCivil.

A perda de interesse na prestação deve ser apreciada objetivamente, isto é, não à luz da interpretação pessoal da situação feita pelo credor, mas tendo em consideração a perspetiva das coisas própria de uma entidade comum, aferindo-se a perda de interesse pela superveniente falta de utilidade da prestação adveniente da mora do devedor, na medida em que as circunstâncias que justificavam a realização do negócio prometido entretanto deixaram de existir, por razões que não se prendem exclusivamente com opções unilaterais do credor[49].

 A perda objetiva há de concretizar-se através de circunstâncias que provem, de modo indiscutível, o não cumprimento definitivo. Afere-se, assim, "em função da utilidade concreta que a prestação teria para o credor, não se determina [ndo] de acordo com o seu juízo arbitrário, mas considerando elemntos susceptiveis de valoração pelo comum das pessoas”[50].

Ora, os apelados, como promitentes vendedores, comunicaram à apelante, como promitente compradora, “em 30 de dezembro de 2020”, que “resolviam o CPCV que havia sido celebrado em 2019”.

Os apelados, como promitentes vendedores, por via desta comunicação de 20-12-2020, declararam inequívoca e claramente que não iriam cumprir o contrato, invocando incumprimento definitivo do CPCV, imputável à apelante, como promitente compradora, por esta não ter comparecido à escritura, apesar de não ter sido notificada para aí comparecer.

Porém, apesar de não ter ficado provado que existia fundamento para os apelados anularem o contrato promessa, por falta de comparência da apelante à escritura, como o fizeram, ao comunicarem “vimos declarar a resolução do contrato promessa outorgado em 11 de abril de 2019, com efeitos imediatos, fazendo nossos os valores recebidos a título de sinal”, revelaram intenção de não cumprirem o contrato[51],[52],[53],[54],[55].

Temos, pois, que face à declaração inequívoca de não cumprimento do contrato por parte dos apelados, como promitentes vendedores, bem como da resolução infundada do mesmo, estamos perante uma situação de incumprimento definitivo[56].

Concluindo, perante tais factos, mostra-se provável a existência de uma situação de incumprimento definitivo do contrato promessa, isto é, a probabilidade séria da existência de um direito, de modo a apelante, como promitente compradora, poder requerer a execução especifica do contrato (art.º 442.º/3, do CCivil).

FUNDADO RECEIO DE LESÃO GRAVE E DIFICILMENTE REPARÁVEL

A apelante alegou que “a resolução infundamentada e precipitada do CPCV pelos Recorridos revela uma intenção subjacente de vender os imóveis a terceiros, aproveitando para, de caminho, se apropriar das quantias já pagas pela Requerente a título de sinal e princípio de pagamento”.

Mais alegou que “caso acontecesse até à prolação da sentença da ação
principal causaria um dano irreparável ao seu direito de crédito”.

A doutrina e a jurisprudência têm vindo a entender que não bastam simples dúvidas, conjeturas ou receios meramente subjetivos ou precipitados, assentes numa apreciação ligeira e descuidada da realidade[57].

Por conseguinte, uma providência cautelar será injustificada se o periculum in mora nela invocado se fundar num juízo hipotético, genérico, abstrato, futuro ou incerto, ou num receio subjetivo, sustentado em meras conjeturas[58].
 
O requerente tem, pois, o ónus de alegar e de comprovar os factos reveladores do direito de que se arroga titular, a par de outros de onde se possa inferir a existência de um periculum in mora na tutela desse direito[59].

Ora, por um lado, a apelante não fez a prova, como lhe competia, do fundado receio de lesão grave e dificilmente reparável do seu direito, pois nada se provou quanto à tal requisito.

Por outro lado, o contrato promessa não respeita à compra e venda de qualquer imóvel, mas sim, à compra e venda do quinhão hereditário da herança aberta por óbito de MVL, o que são realidades diferentes.

Concluindo, a apelante não fez a prova, como lhe competia, do fundado receio de lesão grave e dificilmente reparável do seu direito, pois nada se provou quanto à intenção dos apelados pretenderem vender o quinhão hereditárioou, o imóvela terceiros.

Acresce dizer que a providência cautelar não deve ser decretada quando o dano que se pretende evitar respeitar a um facto imputável ao próprio requerente ou quando este tiver contribuído para a produção desse mesmo dano[60].

Como referirmos, o contrato definitivo de compra e venda dos quinhões hereditários deveria ser celebrado até 10-07-2019, competindo à apelante/autora a marcação da respetiva escritura, o que não fez.

Não procedendo à marcação da escritura no prazo de 90 dias a contar da data da assinatura do contrato, não praticou os atos necessários ao cumprimento da obrigação, pelo que, entrou em mora na realização do negócio, pois não se vislumbra que a ultrapassagem do prazo contratualizado, implicou, por si só, o incumprimento definitivo do contrato-promessa.

Isto é, caso a apelante tivesse marcado a escritura no prazo de 90 dias a contar da data da assinatura do contrato, portanto até 10-07-2019, como lhe competia, evitava que os apelados, em 30-12-2020, cerca de 1 ½ ano após, viessem invocar o incumprimento definitivo do contrato promessa.

Temos, pois, que como o dano que a apelante pretendia evitar respeitava a factos à mesma imputáveis, porquanto ao não ter agendado a escritura definitiva, como lhe competia fazer, os apelados resolveram o contrato, também por este motivo, a providência não deveria ser decretada, caso se tivessem por verificados os restantes pressupostos.

Concluindo, não estando verificado o fundado receio de lesão grave e dificilmente reparável, como estatuído no art.º 368º1, do CPCivil, não há não há fundamento para concessão da tutela cautelar.

Destarte, improcedendo as conclusões do recurso de apelação, pese embora por fundamentos diferentes, há que confirmar a decisão proferida pelo tribunal a quo.

3. DISPOSITIVO
          
3.1. DECISÃO

Pelo exposto, acordam os juízes desta secção cível (2ª) do Tribunal da Relação de Lisboa em julgar improcedente o recurso e, consequentemente, em confirmar-se a decisão recorrida.       
   
3.2. REGIME DE CUSTAS

Custas pela apelante (na vertente de custas de parte, por outras não haver[61]), porquanto a elas deu causa por ter ficado vencida[62].                  
 
Lisboa, 2023-03-02[63]
Nelson Borges Carneiro
Paulo Fernandes da Silva
Pedro Martins

_______________________________________________________
[1] O acórdão principia pelo relatório, em que se enunciam sucintamente as questões a decidir no recurso, expõe de seguida os fundamentos e conclui pela decisão, observando-se, na parte aplicável, o preceituado nos artigos 607.º a 612.º – art.º 663º/2, do CPCivil.
[2] Para além do dever de apresentar a sua alegação, impende sobre o recorrente o ónus de nela concluir, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão – ónus de formular conclusões (art.º 639º/1) – FERREIRA DE ALMEIDA, Direito Processual Civil, volume II, 2ª edição, p. 503.
[3] As conclusões exercem ainda a importante função de delimitação do objeto do recurso, como clara e inequivocamente resulta do art.º 639º/3. Conforme ocorre com o pedido formulado na petição inicial, as conclusões devem corresponder à identificação clara e rigorosa daquilo que o recorrente pretende obter do tribunal superior, em contraposição com aquilo que foi decidido pelo tribunal a quo – ABRANTES GERALDES – PAULO PIMENTA – PIRES DE SOUSA, Código de Processo Civil Anotado, volume 1º, 2ª ed., p. 795.
[4] O recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão. Versando o recurso sobre matéria de direito, as conclusões devem indicar, as normas jurídicas violadas; o sentido com que, no entender do recorrente, as normas que constituem fundamento jurídico da decisão deviam ter sido interpretadas e aplicadas, e invocando-se erro na determinação da norma aplicável, a norma jurídica que, no entendimento do recorrente, devia ter sido aplicada – art.º 639º/1/2, do CPCivil.
[5] Na sessão anterior ao julgamento do recurso, o processo, acompanhado com o projeto de acórdão, vai com vista simultânea, por meios eletrónicos, aos dois juízes-adjuntos, pelo prazo de cinco dias, ou, quando tal não for tecnicamente possível, o relator ordena a extração de cópias do projeto de acórdão e das peças processuais relevantes para a apreciação do objeto da apelação – art.º 657º/2, do CPCivil.
[6] Todas as questões de mérito que tenham sido objeto de julgamento na sentença recorrida e que não sejam abordadas nas conclusões do recorrente, mostrando-se objetiva e materialmente excluídas dessas conclusões, têm de se considerar decididas, não podendo de elas conhecer o tribunal de recurso.
[7] Vem sendo entendido que o vocábulo “questões” não abrange os argumentos, motivos ou razões jurídicas invocadas pelas partes, antes se reportando às pretensões deduzidas ou aos elementos integradores do pedido e da causa de pedir, ou seja, entendendo-se por “questões” as concretas controvérsias centrais a dirimir.
[8] Quando não tenha sido impugnada, nem haja lugar a qualquer alteração da matéria de facto, o acórdão limita-se a remeter para os termos da decisão da 1.ª instância que decidiu aquela matéria – art.º 663º/6, do CPCivil.
[9] Relativamente a questões de conhecimento oficioso e que, por isso mesmo, não foram suscitadas anteriormente, a Relação deve assegurar o contraditório, nos termos gerais do art.º 3º/3. A Relação não pode surpreender as partes com uma decisão que venha contra a corrente do processo, impondo-se que as ouça previamente – ABRANTES GERALDES – PAULO PIMENTA – PIRES DE SOUSA, Código de Processo Civil Anotado, volume 1º, 2ª ed., p. 829.
[10] MARCO CARVALHO GONÇALVES, Providências Cautelares, 4ª ed., pp. 179/80.
[11] Ac. Tribunal da Relação de Lisboa de 2018-09-20, Relator: JORGE LEAL, http://www.dgsi.pt/jtrl.
[12] LEBRE DE FREITAS – ISABEL ALEXANDRE, Código de Processo Civil Anotado, volume 2º, 4ª ed., p. 7.
[13] MARCO CARVALHO GONÇALVES, Providências Cautelares, 4ª ed., p. 183.
[14] O fundado receio de lesão grave e dificilmente reparável constitui nas medidas cautelares atípicas a manifestação do requisito comum a todas as providências – ABRANTES GERALDES, Temas da Reforma do Processo Civil, III volume, 2.ª ed., p. 82.
[15] O requisito “lesão grave e de difícil reparação” do direito ameaçado consiste num conceito jurídico indeterminado gradativo “carecido de preenchimento valorativo”, a fazer no confronto do caso concreto, à luz dos padrões socioculturais do tipo de comportamento ou situação social relevante e da teleologia subjacente à norma em que se inscreve – Ac. Tribunal da Relação de Lisboa de 2008-03-04, Relator: TOMÉ GOMES, http://www.dgsi.pt/jtrl.
[16] MARCO CARVALHO GONÇALVES, Providências Cautelares, 4ª ed., p. 207.
[17] ABRANTES GERALDES, Temas da Reforma do Processo Civil, III volume, 2.ª ed., pp. 74/75.
[18] MARCO CARVALHO GONÇALVES, Providências Cautelares, 4ª ed., pp. 203/04.
[19] MARCO CARVALHO GONÇALVES, Providências Cautelares, 4ª ed., p. 205.
[20] Ficam afastadas do círculo de interesses acautelados pelo procedimento cautelar comum, ainda que se mostrem irreparáveis ou de difícil reparação, as lesões sem gravidade ou de gravidade reduzida, assim como as lesões que, apesar de se revelarem graves, não sejam dificilmente reparáveis ou irreparáveis – Ac. Tribunal da Relação do Porto de 2009-06-24, Relator: FERREIRA MARQUES, http://www.dgsi.pt/jtrp.
[21] Apenas merecem a tutela provisória consentida pelo procedimento cautelar comum as lesões graves que sejam simultaneamente irreparáveis ou de difícil reparação – Ac. Tribunal da Relação do Porto de 2009-06-24, Relator: FERREIRA MARQUES, http://www. dgsi.pt/jtrp.
[22] Para o preenchimento do pressuposto periculum in mora não basta que a delonga na efetivação do direito acarrete prejuízo. É necessário que este seja grave e dificilmente reparável – Ac. Tribunal da Relação de Lisboa de 2018-09-20, Relator: JORGE LEAL, http://www.dgsi.pt/jtrl.
[23] Ac. Tribunal da Relação de Lisboa de 2018-09-20, Relator: JORGE LEAL, http://www.dgsi.pt/jtrl.
[24] Apenas merecem a tutela provisória consentida pelo procedimento cautelar comum as lesões graves que sejam simultaneamente irreparáveis ou de difícil reparação – Ac. Tribunal da Relação do Porto de 2009-06-24, Relator: FERREIRA MARQUES, http://www.dgsi.pt/jtrp.
[25] Ac. Tribunal da Relação do Porto de 2009-06-24, Relator: FERREIRA MARQUES, http://www.dgsi.pt/jtrp.
[26] ABEL DELGADO, Do Contrato-Promessa, 3ª ed., p. 15.
[27] ALMEIDA COSTA, Separata da Revista da Ordem dos Advogados, ano 50º, p. 22.
[28] MENEZES LEITÃO, Direito das Obrigações, Volume 1.º, 4.ª ed., p. 203.
[29] PIRES DE LIMA – ANTUNES VARELA, Código Civil Anotado, volume 1º, 4ª ed., p. 423.
[30] Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 1998-05-26, CJ (STJ), Tomo 2.º, pág. 100.
[31] Só o incumprimento definitivo do promitente-vendedor, e não a simples mora, desencadeia a sanção de restituição entregue pelo promitente-comprador – Ac. Relação do Porto de 1998-02-17, BMJ 474/548.
[32] A possibilidade legal de exigir o sinal em dobro tem como pressuposto o incumprimento definitivo do contrato-promessa e não a simples mora – Ac. Relação do Porto de 2000-04-02, BMJ 496/309
[33] A perda do sinal pelo promitente-comprador faltoso só se justifica no caso de incumprimento definitivo, que não perante a simples mora – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2001-07-12, Coletânea de Jurisprudência (STJ), Tomo 3.º, pág. 30.
[34] ANTUNES VARELA, RLJ, ano 128.º, pp. 112 e seguintes.
[35] ANTUNES VARELA, RLJ, ano 128.º, p. 138.
[36] GRAVATO MORAIS, Contrato-Promessa em Geral, Contratos-Promessa em Especial, p. 163.
[37] GRAVATO MORAIS, Contrato-Promessa em Geral, Contratos-Promessa em Especial, pp. 163 a 165.
[38] BRANDÃO PROENÇA, Do Incumprimento do Contrato-promessa Bilateral, p. 89 apud Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2020-11-11, Relator: ABRANTES GERALDES, http://www.dgsi.pt/jstj.
[39] A interposição de uma ação de reivindicação, em que se pede aos promitentes-compradores a restituição do imóvel prometido vender e que estes ocupam desde a data da celebração do contrato-promessa, e em que se declara, simultaneamente, que não será celebrada a escritura de compra e venda, consiste numa declaração inequívoca de que os autores não têm intenção de cumprir o contrato definitivo, o que legitima os promitentes-compradores a recorrer à execução específica. Ocorrendo inequívoco incumprimento definitivo – mediante recusa de cumprimento –, fica prejudicada a interpelação admonitória, para esse efeito, com a fixação de um prazo essencial e perentório – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2014-02-25, Relatora: MARIA CLARA SOTTOMAYOR, http://www.dgsi.pt/jstj.
[40] Independentemente da estipulação, ou não, de um prazo pelas partes e da sua natureza, em face de um comportamento do devedor que exprima inequivocamente a vontade de não cumprir a obrigação principal, verifica-se, desde logo, um quadro de incumprimento definitivo. A recusa tanto pode ser expressa e categórica como pode ser valorada a partir de outras atitudes inequívocas e concludentes daquele comportamento, como seja a dedução em juízo de um pedido de restituição do imóvel objeto do contrato-promessa pelos herdeiros do promitente-vendedor, o que legitima o promitente-comprador a recorrer às sanções previstas para o incumprimento do contrato-promessa, designadamente, a restituição do sinal em dobro nos termos do art.º 442.º do CC – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2017-11-23, Relatora: MARIA DO ROSÁRIO MORGADO, http://www.dgsi.pt/jstj.
[41] A vontade de não cumprir pode resultar de comportamentos concludentes apreensíveis pela atuação da parte inadimplente, em função dos deveres convividos na sua prestação, sendo de atender ao grau e intensidade dos atos por si perpetrados na inexecução do contrato. Esses atos relevam, desde que, objetivamente apreciados, mereçam inquestionável censura, não sendo justo que o credor, por mais tolerante que tenha sido na expectativa do cumprimento, esteja atido à vontade lassa do devedor – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2014-01-29, Relator: MÁRIO MENDES, http://www.dgsi.pt/jstj.
[42] Esta clara vontade de não cumprir pode não ser expressa, admite-se que possa resultar de um declaração negocial tácita, de comportamentos concludentes apreensíveis pela atuação da parte inadimplente, em função dos deveres coenvolvidos na sua prestação, sendo de atender ao grau e intensidade dos atos por si perpetrados na inexecução do contrato, desde que objetivamente revelem inquestionável censura, não sendo justo que o credor – por mais tolerante que tenha sido na expectativa do cumprimento – esteja atido à vontade lassa do devedor. No caso dos autos tem-se por inquestionável que a atuação dos RR., promitentes-vendedores, revela definitiva vontade de não cumprir; desde logo, pelo facto de terem recebido desde há mais de sete anos o preço total do prometido contrato de compra e venda; a incumbência de marcarem a escritura pública o que não fizerem desde 1998; o facto de terem assumido o compromisso de prometerem vender o imóvel livre de ónus e encargos e, entretanto, terem deixado que o prédio fosse alvo de hipoteca judicial a favor de terceiro, acentuando o risco do direito do promitente-comprador – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2010-06-22, Relator: FONSECA RAMOS, http://www.dgsi.pt/jstj.
[43] A efetivação da interpelação admonitória para verificação de uma situação de incumprimento definitivo é dispensável quando se verifique a recusa antecipada de cumprimento por parte do outro promitente, ou perante a verificação de circunstâncias que, analisadas objetivamente, revelem um comportamento concludente no sentido do incumprimento definitivo do contrato – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2020-11-11, Relator: ABRANTES GERALDES, http://www.dgsi.pt/jstj.
[44] A vontade inequívoca de não cumprir, para efeitos de dispensa de interpelação admonitória, pode não ser expressa, admitindo-se que possa resultar de uma declaração negocial tácita estribada “em comportamentos concludentes apreensíveis pela atuação da parte inadimplente, em função dos deveres coenvolvidos na sua prestação, sendo de atender ao grau e intensidade dos atos por si perpetrados na inexecução do contrato, desde que objetivamente revelem inquestionável censura, não sendo justo que o credor esteja adstrito à vontade lassa do devedor.” No quadro circunstancial apurado e atentos os ditames da boa fé na integração da declaração negocial como se preceitua no artigo 239.º do CC, é forçoso reconhecer, à luz do disposto no artigo 217.º, n.º 1, do mesmo Código, que o comportamento da promitente-vendedora evidencia uma inequívoca vontade de não cumprir a obrigação assumida para com a promitente-compradora, que é inteiramente imputável àquela, dispensando assim qualquer interpelação prévia admonitória – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2015-04-30, Relator: TOMÉ GOMES, http://www.dgsi.pt/jstj.
[45] Se o devedor declara antecipadamente não estar disposto a cumprir a obrigação que assumiu, ou se adota um qualquer comportamento que revela inequívoca ou categoricamente a intenção de não cumprir a prestação, incorre desde logo em incumprimento, a qualificar como definitivo. Neste caso, o credor fica automaticamente legitimado a resolver o contrato, não tem de esperar pelo vencimento da obrigação (ou, no limite, havendo já mora do devedor, fica liberto da compulsão de transformar a mora em incumprimento definitivo habilitante da resolução). Trata-se de ponto frequentemente afirmado na literatura jurídica – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2018-05-22, Relator: JOSÉ RAÍNHO, http://www.dgsi.pt/jstj.
[46] A falta da interpelação admonitória ou da prova de factos que revelem a intenção de não cumprir impede que se dê como verificada a conversão da mora em incumprimento definitivo – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2021-01-21, Relatora: MARIA DOS PRAZERES BELEZA, http://www.dgsi.pt/jstj.
[47] Evidenciando-se do contexto factual uma clara recusa da sociedade em cumprir o contrato promessa, o incumprimento é definitivo  – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2010-01-21, Relator: OLINDO GERALDES, http://www.dgsi.pt/jstj.
[48] Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2015-04-14, Relator: SEBASTIÃO PÓVOAS, http://www.dgsi.pt/jstj.
[49] Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2015-01-15, Relator: TAVARES DE PAIVA, http://www.dgsi.pt/jstj.
[50] GRAVATO MORAIS, Contrato-Promessa em Geral, Contratos-Promessa em Especial, pp. 160/61.
[51] Mesmo que se entenda que a resolução infundada não é eficaz sempre se poderia considerar que uma declaração de resolução equivale a uma declaração antecipada de incumprimento do contrato – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2016-07-29, Relator: JÚLIO GOMES, http://www.dgsi.pt/jstj.
[52] Não existindo uma situação de mora contratual da responsabilidade da ré e não existindo incumprimento definitivo nos termos invocados pela autora, esta não tem direito e consequente fundamento legal para resolver o contrato promessa de compra e venda com base na perda de interesse, que não logrou demonstrar. E sendo assim, a autora na qualidade de promitente compradora tem de assumir a responsabilidade pelo rompimento do contrato promessa em apreço, quando infundadamente resolveu o contrato, o que, no caso configura uma situação de incumprimento definitivo por banda da autora, circunstancialismo que, no caso dos autos, implica que a ré, como promitente vendedora, tenha direito a fazer seu o sinal entregue nos termos do art.º 442.º n.º 2, do CC – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2015-01-15, Relator: TAVARES DE PAIVA, http://www.dgsi.pt/jstj.
[53] A declaração resolutiva, sendo uma declaração receptícia, produz os seus efeitos logo que recebida pela contraparte, ficando resolvido definitivamente o contrato, independentemente de tal resolução ser legal ou ilegal – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2011-03-22, Relator: MOREIRA ALVES, http://www.dgsi.pt/jstj.
[54] Mesmo que assim se não entenda, sempre seria de considerar, como tem sido entendido, que a declaração de resolução, mesmo que infundada e ilegítima, corresponde a uma recusa de execução do contrato, equivalendo a uma declaração séria e firme de não cumprir. Tal declaração deve ser equiparada a uma declaração antecipada e irreversível de incumprimento, uma vez que, ao fazê-la, o declarante afirma em termos categóricos e definitivos que não outorgará o contrato definitivo; ou, pelo menos, tem implícita uma declaração inequívoca de não cumprimento do contrato, colocando o declarante em situação de incumprimento definitivo – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2017-04-27, Relator: PINTO DE ALMEIDA, http://www.dgsi.pt/jstj.
[55]  A comunicação dos promitentes-compradores de que perderam o interesse na subsistência do contrato, decidindo assim resolvê-lo, sem que exista fundamento legal para isso, configura um incumprimento definitivo dos mesmos promitentes-compradores, o qual, nos termos do art.º 442º nº 2 do Código Civil, confere ao promitente vendedor o direito de fazer sua a quantia adiantada a título de sinal – Ac. Tribunal Relação de Lisboa de 2009-12-03, Relator: ANTÓNIO VALENTE, http://www.dgsi.pt/jtrlj.
[56] Evidenciando-se do contexto factual uma clara recusa da sociedade em cumprir o contrato promessa, o incumprimento é definitivo  – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2010-01-21, Relator: OLINDO GERALDES, http://www.dgsi.pt/jstj.
[57] MARCO CARVALHO GONÇALVES, Providências Cautelares, 4ª ed., pp. 211/12.
[58] MARCO CARVALHO GONÇALVES, Providências Cautelares, 4ª ed., p. 213.
[59] MARCO CARVALHO GONÇALVES, Providências Cautelares, 4ª ed., p. 216.
[60] MARCO CARVALHO GONÇALVES, Providências Cautelares, 4ª ed., p. 211.
[61] Como o conceito de custas stricto sensu é polissémico, porque é suscetível de envolver, nos termos do artigo 529º/1, além da taxa de justiça, que, em regra, não é objeto de condenação – os encargos e as custas de parte, importa que o juiz, ou o coletivo de juízes, nos segmentos condenatórios das partes no pagamento de custas, expressem as vertentes a que a condenação se reporta – SALVADOR DA COSTA, As Custas Processuais, Análise e Comentário, 7ª ed., p. 8.
[62] A decisão que julgue a ação ou algum dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da ação, quem do processo tirou proveito – art.º 527º/1, do CPCivil.
[63] A assinatura eletrónica substitui e dispensa para todos os efeitos a assinatura autógrafa em suporte de papel dos atos processuais – art.º 19º/2, da Portaria n.º 280/2013, de 26/08, com as alterações introduzidas pela Portaria n.º 267/2018, de 20/09.