Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
2636/07.0TBAMD-B.L1-2
Relator: VAZ GOMES
Descritores: ACTIVIDADES PERIGOSAS
AUDIÇÃO DO MENOR
AUTORIZAÇÃO JUDICIAL
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 11/19/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: N
Texto Parcial: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: 1. Se a organização e a promoção da actividade de corridas de automóveis ou a realização de provas desportivas de karting devem ser consideradas como actividades perigosas também assim deve ser considerada a participação de um jovem corredor de 13 anos, sendo essa participação uma questão de particular importância nos termos e para os efeitos do art.º 1901/2 do CCiv;
2. Se o Tribunal realizou a audição do jovem menor, nos termos e para os efeitos do art.º 1901/3 do CCiv e a vontade do menor foi manifestada, nenhuma razão objectiva para dela duvidar existindo, nenhuma razão ocorre para nova audição.
(Sumário elaborado pelo Relator)
Decisão Texto Parcial: Acordam os juízes do Tribunal da Relação de Lisboa:



I – RELATÓRIO:



APELANTE /PAI e REQUERENTE da AUTORIZAÇÃO do TRIBUNAL: HERMÍNIO … .
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APELADA/MÃE e REQUERIDA: FÁTIMA … .
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MENOR (Filho dos anteriores nascido aos 18/09/2002): JOÃO PEDRO …
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Com os sinais dos autos.
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I.1. Inconformada com a decisão de 29/01/2015, (ref:º 86825367), que, julgando improcedente o pedido de autorização de participação do menor nas provas do Campeonato Nacional e Taça de Portugal de Karting que se desenrolam todos os anos por a mãe se opor a tal, dela apelou o requerente, em cujas alegações conclui em suma:
  • A vontade actual do menor e anterior à decisão reportada a Janeiro de 2015 é diferente daquela que consta da fundamentação da decisão sendo incompreensível que se decerte uma decisão contrária à vontade do menor (Conclusões 1 e 2).
  • O Tribunal recorrido foi iludido por não ter procedido a uma audição do menor nos termos por si requeridos em momento anterior à sentença proferida ora em crise, pelo que a sentença deve ser revogada, decidindo-se autorizar o menor a participar nas provas de karting de 2015 e anos seguintes, ou se determine uma nova audição do menor a efectuar pelo tribunal a quo e que a decisão então a proferir vá de encontro à manifestação de vontade do menor que resultar dessa audição (Conclusões 3 a 6).

    I.2. O Ministério Público veio responder nesse recurso em suma dizendo:
  • É extemporâneo o recurso apresentado, na media em que a decisão recorrida de 29/1/2015 foi notificada apo Requerente por carta registada e enviada em 30/01/2015 (fls. 120) devendo considerar-se notificado dessa decisão em 2/2/2015 terminado o prazo normal de 30 dias (art.ºs 138, 279 e 638/1 do NCPC) em 4/3/2015, sendo que o recurso foi apresentado em 12/4/2015, não tendo aplicação ao caso o disposto no art.º 24/5 da lei 34/04 de 29/7, na medida em que tendo o Autor advogado constituído na pessoa do DR José do Carmo …no processo principal, o qual foi notificado já em Março de 2015 de outos actos processuais, ou seja depois de proferida a decisão deste incidente e da nomeação do patrono neste incidente, sendo que havendo mandato presumidamente oneroso o Requerente dispõe de meios económicos para assegurar o pagamento dos honorários, o que contraria o apoio judiciário que ao Requerente foi concedido; admitir a interrupção do prazo em taios circunstâncias seria pugnar pela violação ostensiva do princípio da igualdade, consagrado constitucionalmente bem como na lei processual civil, pois de contrário estar-se-ia a admitir que qualquer cidadão que node curos de uma acção com mandatário constituído obtivesse um prazo acrescido por efeito de solicitação a posteriori de apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono, constitui um bónus de exercício do seu direito em relação aos demais cidadãos que desde o início se mantiveram representados com mandatário constituído (Conclusões 1 a 6).
  • A sentença recorrida não merce qualquer reparo quanto aso factos apurados e dados como provados sendo que a declaração ora mencionada nas alegações é posterior à data da sentença recorrida (Conclusão 7).

  • I.3. Recebida a apelação, foram os autos aos vistos dos Meritíssimos Juízes-adjuntos, que nada sugeriram; nada obsta ao conhecimento do mesmo.

    I.4.Questões a resolver:

    a) Questão prévia da extemporaneidade do recurso.
    b) Saber se ocorre erro de julgamento na decisão de facto do ponto 7 da decisão recorrida, devendo subsequentemente ser alterada a decisão recorrida ou que pelo menos se determine uma nova audição do menor.

    II- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO.

    O Tribunal recorrido deu como provados os seguintes factos:

    1. O menor João Pedro … nasceu a 18.09.2002 e é filho de Fátima … e de Hermínio ….
    2. Os pais não são casados entre si e estão separados.
    3. Em 27.05.2013, por acordo dos progenitores, alterou-se o regime de exercício das responsabilidades parentais, tendo-se estipulado que o menor fica a residir com a mãe e o exercício conjunto das responsabilidades parentais, no que respeita às questões de particular importância (fls. 34 do apenso A).
    4. O menor João Pedro participou nos anos de 2012 e 2013 nas provas do campeonato nacional e taça de Portugal de Karting.
    5. A progenitora não consente que o menor participe nas provas de Karting.
    6. O progenitor quer que o menor participe nas provas de Karting.
    7. O menor João Pedro gostaria de participar nas provas de Karting de 2014, não pretendendo competir no futuro, devido aos custos e afazeres escolares

    III- FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO.

    III.1. Conforme resulta do disposto nos art.ºs 608/2, 5, 635/4 e 639 (anteriores 660, n.º 2, 664, 684, n.º 3, 685-A, n.º 3), do CPC[1] são as conclusões do recurso que delimitam o seu objecto, salvas as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras e as que sejam de conhecimento oficioso. É esse também o entendimento uniforme do nosso mais alto Tribunal (cfr. por todos o Acórdão do S.T.J. de 07/01/1993 in BMJ n.º 423, pág. 539.

    III.2. Não havendo questões de conhecimento oficioso são as conclusões de recurso que delimitam o seu objecto tal como enunciadas em I.

    III.3. Questão prévia da extemporaneidade do recurso.

    III.3.1. Como bem se diz no despacho de 23/06/2015, despacho esse que admitiu o recurso ora em apreciação, por despacho de 2/3/2015 considerou-se interrompido o prazo para a prática do recurso por parte do Requerente nos termos do art.º 24, n.ºs 4 e 5 da Lei 47/07 de 29/7, face ao requerimento apresentado pelo Requerente datado de 17/2/2015 junto da Segurança Social para nomeação de patrono e respectiva compensação bem assim como dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo e constante de fls. 153/156. Este despacho que julgou interrompida a instância. O Ministério Público tem intervenção acessória nos termos dos art.º 325 e 5/4/a do Estatuto do Ministério Público (em defesa do incapaz menor) bem assim como compete-lhe recorrer de decisão proferida contra lei expressa e bem assim como velar para que a função jurisdicional se exerça de acordo com a Constituição, recorrendo dela, naturalmente se não for conforme (art.ºs 3/o e 3/f e n,º 2 do Estatuto). Dir-se-á em primeiro lugar que o despacho que julgou interrompido prazo para a interposição de recurso não é um despacho de mero expedientes nem foi proferido no uso legal de um poder discricionário, razão pela qual é recorrível (art.º 630/1) e sendo recorrível, não havendo interposição atempada de recurso forma caso julgado formal nos termos do art.º 620, que impede que se volte a discutir a questão. Se aquela decisão foi proferida contra lei expressa ou não sendo proferida contra lei expressa atenta contra um princípio de igualdade com manifesta relevância constitucional, cumpria ao Ministério Público recorrer ou para a instância superior dos tribunais comuns ou para o Tribunal Constitucional, sendo caso, nos termos da lei respectiva. Não tendo sido notificada daquela decisão havia que suscitar a nulidade respectiva que não surge expressa ou implicitamente suscitada nas contra-alegações de recurso.

    III.3.2. Poderia essa decisão ser impugnada com o recurso da decisão final nos termos do n.º 3 do art.º 644? Parece-nos que a razão que subjaz à alínea c) do n.º 2 do art.º 644 (apelação autónoma da decisão que decrete a suspensão da instância) também subjaz à necessidade de subida imediata do recurso que decreta a interrupção a instância nos termos do art.º 24/4 mencionado e por conseguinte, nessa medida deveria esse despacho ter sido impugnado autonomamente. Mas ainda que assim se não entenda que a impugnação daquele despacho pode ser feita no recurso que venha a ser interposto da decisão final do incidente (art.º 644/1/a e 3), é necessário que essa impugnação seja expressa ou seja é necessário desde logo que se impugne essa decisão juntamente com a impugnação da decisão final, que se identifique o despacho em questão como sendo despacho impugnado, juntamente com o outro, quer no corpo das alegações quer nas conclusões de recurso. E, não havendo recurso da decisão final (por não haver interesse do Ministério Público em impugná-la, designadamente por a considerar conforme ao superior interesse do menor) mantendo interesse em impugnar aquela decisão interlocutória teria ela que ser interposta num recurso único, após o trânsito em julgado da decisão, o que não vem referenciado. A questão prévia da inadmissibilidade do recurso suscitada em resposta às alegações de recurso pressupõe que se possa considerar irrelevante o despacho que julgou interrompida a instância, o que de modo nenhum acontece, nos autos pelo que, face ao trânsito em julgado do mesmo, tem de considerar-se tempestivo o recurso que contou pois com a interrupção válida do prazo de interposição do recurso que aquando da prolação desse despacho decorria. Improcede a questão prévia da admissibilidade do recurso o qual foi correctamente recebido com o efeito adequado.

    III.4. Saber se ocorre erro de julgamento na decisão de facto do ponto 7 da decisão recorrida, devendo subsequentemente ser alterada a decisão recorrida ou que pelo menos se determine uma nova audição do menor.

    III.4.1. Está assente a legitimidade processual e substantiva do pai do menor ao solicitar a intervenção do Tribunal para dirimir questão que, indiscutivelmente (não é objecto do recurso) é de particular importância, nos termos e para os efeitos do previsto nos art.ºs 1902/2, 1906/1, 1911/1 do CCiv, redacção DL 61/08 de 31/10, e para cuja resolução os pais não estão de acordo, sendo certo que por força da lei em relação a essas matérias as responsabilidades parentais são exercidas em comum por ambos os progenitores. A decisão recorrida dá como provado que “7. O menor João Pedro gostaria de participar nas provas de Karting de 2014, não pretendendo competir no futuro, devido aos custos e afazeres escolares.”

    III.4.2. Quando o requerente pai foi ouvido em 13/3/2014 entre o mais disse que a mãe receia que o menor se possa magoar e tem receio que inscrevendo o menor na modalidade a progenitora o venha a acusar de ser irresponsável e negligente, o menor gosta de praticar o “karting”, modalidade essa que é paga pelos patrocinadores possui um seguro diário e um outro de provas desportivas sendo a modalidade desportiva composta por 5 provas durante o ano, uma delas na Páscoa e as outras ao longo do ano; a progenitora mãe ouvida nesse mesmo dia disse que o filho gosta de praticar karting por desporto e não por competição e nesta modalidade está a prejudicar o seu percurso escolar; o jovem, ouvido ais 5/5/2014 entre o mais disse:

    “Frequenta o 5.º ano…teve no 2.º período nota 5 a 4 disciplinas e nota 4 às restantes; no ano passado a sua mãe disse-lhe que se praticasse Kart no ano de 2013/2014, não praticaria no ano seguinte. Quando praticava Kart, fazia-o durante um fim-de-semana por mês...teve um acidente em Leiria, há dois anos…capotou mas não se magoou. Gostava de estar no kart durante este ano, mas no próximo já não quer continuar, porque vai transitar para o 6.º ano e é mais difícil, para além dois custos do Kart também vão aumentar…os treinos são realizados nos fins-de-semana em que está com o seu pai e ocupa-lhe um dia ou uma tarde.”

    III.4.3. Nada nos autos permite concluir que nesta audição do jovem, que é certo veio acompanhado da mãe que tem a guarda do mesmo, estando ausente o pai tenha sido coagido a dizer aquilo que disse. É dos livros que o progenitor guardião exerce uma especial influência sobre o filho com quem de resto mais tempo convive, daqui não se segue que essa influência tenha de ser funesta para a educação e desenvolvimento do filho, é de esperar que o progenitor guardião se preocupe com o desenvolvimento social e educacional do filho e particularmente com a sua segurança. O progenitor pai dá conta nos autos que o filho em 2014 tinha os melhores tempos dos treinos, que tinha boas hipóteses de vencer e começar o campeonato nas primeiras posições, para poder lutar pelo título de campeão nacional, um dos objectivos para esse ano assim como o de conquistar o título de campeão da taça de Portugal. Por decisão provisória de 19/5/2014, determinou-se, face à posição do menor e à posição da mãe para esse ano que o menor fosse autorizado a participar nas provas do Campeonato Nacional de Karting de 2014. O progenitor, depois disso, veio, na sequência de despacho que lhe foi notificada para se pronunciar sobre a eventual extinção da instância por inutilidade superveniente da lide (2014 estava então a terminar), dizer (Outubro de 2014) que se deveria ouvir de novo o menor para que esta transmitisse, livremente, a sua opinião, sem a pressão da mãe, requerimento ao qual a mãe se opôs por perturbar o filho, novo requerimento do progenitor de 16/12/2014 para que lhe fosse entregue o filho no dia seguinte a fim de gozar as férias de Natal e levar o filho a participar na Taça da Ilha da Madeira dia 21/12/2014 ao que a mãe veio responder que cabendo-lhe o dia 24 deveria estar com elas os dias antecedentes.

    III.4.4. Na decisão de 18/12/2014, sobre a participação na Taça da Madeira foi tal indeferido por não, se enquadrar no Campeonato Nacional assim como se indeferiu a audição do jovem menor por já ter sido ouvido, tal despacho foi notificado ao progenitor nesse mesmo dia conforme colhe fls. 99, novo requerimento, extenso, do progenitor pai em que dá conta da necessidade da recusa da mediação familiar; a fls. 109, data de 29/12/2014, surge então uma declaração com assinatura imputada ao menor João Pedro, manuscrita onde este vem “por este meio comunicar que a minha vontade é ade praticar karting e que eu quero continuar a fazer as provas de karting como sempre quis”. O estilo coloquial da declaração é, diga-se, pouco consentâneo com a idade do jovem menor (13 anos já feitos), o que de resto a progenitora mãe refere a fls. 11.

    III.4.5. A audição do menor, nos termos e para os efeitos do art.º 1901/3 do CCiv foi já efectuada e a vontade do menor foi manifestada, nenhuma razão objectiva, eventualmente suportada em exames psicológicos do mesmo permitindo duvidar do carácter livre e esclarecido daquela declaração prestada em audiência.

    III.4.6. Para além das afirmações prestadas em audiência pelo progenitor pai nenhum outro elemento de prova existe relativamente à evolução do jovem menor na modalidade desportiva do karting designadamente no que toca à afirmação que “em 2014 tinha os melhores tempos dos treinos, que tinha boas hipóteses de vencer e começar o campeonato nas primeiras posições, para poder lutar pelo título de campeão nacional, um dos objectivo para esse ano assim como o de conquistar o título de campeão da taça de Portugal.”

    III.4.17. A promoção e organização da modalidade desportiva do karting é, conforme vem sendo referido pela nossa jurisprudência, uma actividade perigosa nos termos e para os efeitos do art.º 493/2 do CCiv. A título de exemplo transcrevem-se parcialmente os sumários e fundamentação e dois arestos disponíveis no sítio www.dgsi.pt.

    2321/05.7TBVCT.G1   

    Relator: CONCEIÇÃO BUCHO
    Descritores: ACTIVIDADES PERIGOSAS
    ÓNUS DA PROVA
               
    Nº do Documento:RG
    Data do Acordão:03-12-2009
    Votação:UNANIMIDADE
    Texto Integral:S
    Privacidade:1
               
    Meio Processual:APELAÇÃO
    Decisão:JULGADA PROCEDENTE A DA RÉ E NEGADO PROVIMENTO À DO AUTOR
               
    Sumário: I – O art. 493º, nº 2 do CC estabelece uma inversão do ónus da prova presumindo a culpa do demandado, ao qual cabe provar que empregou todas as cautelas exigidas pelas circunstâncias com o fim de prevenir os danos ocorridos;
    II – Em relação às actividades perigosas, o lesante só poderá exonerar-se da responsabilidade provando que empregou todas as providências exigidas para evitar o efeito danoso;
    III – Explorando a ré um kartódromo, que cede para corridas e competições organizadas por outros e aluga individualmente karts, tal actividade pode considerar-se perigosa, o que deve ser aferido em face do circunstancialismo concreto;
    IV – De harmonia com o Regulamento Nacional de Circuitos de Karting, Competição e lazer, em vigor desde 01.01.1998, todas as provas desportivas dessa natureza só podem efectuar-se mediante a existência de seguro que garanta a responsabilidade civil dos concorrentes em relação a terceiros;
    V – Os organizadores de provas desportivas são responsáveis pelos danos causados por essa actividade, a menos que haja culpa do próprio lesado na produção desses danos;
    VI – Tendo o autor saído do kart, infringindo as regras de segurança que lhe impunham a permanência nesse veículo, há culpa da sua parte na produção do acidente, pelo que não pode ser imputada à recorrente a responsabilidade pelos danos que aquele sofreu.
    (…)

    Com efeito, uma prova (corrida) de karting, onde pode atingir-se velocidades consideráveis e de onde pode resultar acidentes integra-se no conceito do n.º 2 do artigo 493º do Código Civil.

    Tal como vem sendo defendido pela jurisprudência, nomeadamente a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, as corridas de automóveis ou a realização de provas desportivas de karting devem ser consideradas como actividades perigosas ( a este propósito veja-se o Ac. do STJ de 6/6/02. CJ, Acs do STJ , Ano X, t. 2, pág. 98).

    E, por isso todas as provas desportivas – de acordo, nomeadamente, com o Regulamento Nacional de Circuitos de Karting, Competição e Lazer, em vigor desde 1 de Janeiro de 1998- só podem efectuar-se mediante a existência de seguro que garanta a responsabilidade civil dos concorrentes em relação a terceiros.

    Também em actividades desportivas, é necessária ( e já era à data dos factos)a existência de seguros que cubram os riscos de acidentes, pessoais e de terceiros inerentes à actividade desportiva.
    *

    Processo:         
    02B1620         
    Nº Convencional:JSTJ00000333
    Relator:ABEL FREIRE
    Descritores:CORRIDA DE AUTOMÓVEIS
    ACTIVIDADES PERIGOSAS
    PRESUNÇÃO DE CULPA
    INVERSÃO DO ÓNUS DA PROVA
               
    Nº do Documento: SJ200206060016202
    Data do Acordão:06-06-2002
    Votação:UNANIMIDADE
    Tribunal Recurso:T REL ÉVORA
    Processo no Tribunal Recurso:1088/01
    Data:29-11-2001
    Texto Integral:S
    Privacidade:1
               
    Meio Processual:REVISTA.
    Decisão:NEGADA A REVISTA.
    Área Temática: DIR CIV - DIR RESP CIV.
    Legislação Nacional:     CE94 ARTIGO 134.
    DL 522/85 DE 1985/12/31 ARTIGO 9.
    CCIV66 ARTIGO 493 N2.
    Jurisprudência Nacional:ACÓRDÃO STJ DE 1989/02/10 IN BMJ N384 PAG515.
    ACÓRDÃO RP DE 1991/11/05 IN BMJ N411 PAG647.
    ACÓRDÃO RP DE 1986/02/20 IN BMJ N361 PAG597.
               
    Sumário: I- É de considerar como "actividade perigosa" nos termos e para os efeitos do n. 2 do art. 493 do C.Civil a realização, na via pública, de uma prova desportiva de "karting".
    II- A organização de um tal tipo de provas desportivas com veículos terrestres motorizados só pode ser efectuada mediante a realização de um seguro específico, extensivo aos proprietários desses veículos e aos respectivos participantes.
    III- A entidade organizadora responderá pelos danos causados pelo atropelamento de um intruso peão entrado na pista para assistir a um concorrente seu filho acidentado se não provar ter usado de todas as providências exigidas pelas circunstâncias para prevenir o sinistro.
    (…)

    Em nosso entendimento a actividade de corridas de karting é uma actividade perigosa. Se bem que a perigosidade não seja da dimensão duma corrida de automóveis, que são veículos de maior envergadura e peso, não deixa de envolver perigo uma tal competição em que os concorrentes procuram desenvolver a maior velocidade que lhes for possível para obterem a melhor classificação. Daí que os regulamentos que lhe dizem respeito procurem disciplinar a entrada em pista de pessoas estranhas, pois o interesse de cada concorrente em disputar o melhor lugar e a natureza da prova torna-a alheia as regras usuais da condução rodoviária e nem está sujeito a elas. Daí que, embora mais voltada para o desporto com veículos automóveis a jurisprudência classifica esta actividade como perigosa (ver Ac. STJ de 10-2-1989, BMJ 384-515, Ac.s RP de 5-11-1991, BMJ 411-647 e de 20-2-1986, BMJ 361-597). Essa mesma conclusão se extrai da lei. A realização de provas desportivas de veículos terrestres a motor realizadas em vias públicas só podem ser efectuadas mediante um seguro bem como a dos proprietários ou detentores dos veículos e dos participantes (art. 134 do C. E. segundo a redacção do DL 114/94). E o mesmo refere o DL 522/85, art. 9.º, onde se diz que o seguro é feito caso a caso, e "garanta a responsabilidade a responsabilidade civil dos organizadores, dos proprietários dos veículos e dos seus detentores e condutores em virtude de acidente causado por esse veículo".

    Por estas razões se reconhece o perigo de tal actividade desportiva (com veículos terrestres a motor) e a incidência sobre os organizadores do dever de fazer o seguro. E assim acontece porque a actividade de organização de tais eventos é, em si mesma, propiciadora duma actividade perigosa(…)

    III.4.18. Se a organização e a promoção dessa actividade é considerada perigosa, a participação por parte dos corredores também assim deve ser considerada, tendo em mente, até, o acidente que o jovem menor sofreu conforme declarações suas prestadas; isto não quer dizer que com adequada vigilância o jovem menor, por mero lazer e gozo pessoal, uma vez por outra, não possa “correr” num kart, situação completamente diferente da competição dessa modalidade desportiva que obriga não só aos treinos como a um apertado calendário de provas. A participação na modalidade desportiva e competitiva pode, eventualmente, ser o “futuro” do jovem desde que não prejudique o seu percurso escolar (ao que tudo indica bom), mas nada nos autos permite ao tribunal tirar uma tal ilação e com os elementos dos autos nenhuma vantagem ocorreria em nova audição do jovem, pois daí não se seguiria, ainda que nova vontade favorável à continuação da modalidade demonstrasse, como pretende o apelante, a autorização do Tribunal para inscrição nas competições nacionais de karting.


    IV- DECISÃO:

    Tudo visto acordam os juízes em julgar improcedente a apelação e confirmar a decisão recorrida.
    Regime da Responsabilidade por Custas: As custas são da responsabilidade do apelante que decai e porque decai (art.º 527)


    Lxa., 19/11/2015.


    João Miguel Mourão Vaz Gomes
    Jorge Manuel Leitão Leal
    Ondina Carmo Alves


    [1] Na redacção que foi dada ao Código do Processo Civil pela Lei 41/2013, de 26/6, atentas as circunstâncias de a acção de regulação ser de 2007, o presente incidente sobre questão de particular importância ter sido instaurado por apenso aquela acção em 05/02/2014 autuada aos 13/2/2014 no Juízo de Família e Menores 2.ª secção da Comarca de Grande Lisboa Noroeste- Amadora (actualmente Comarca de Lisboa Oeste, Amadora, Instância Central, 2.ª secção e Família e Menores, Juízo 2), e a sentença recorrida ter sido proferida em 29/01/2015 e o disposto nos art.ºs 5/1 da Lei 41/2013 de 26/7 que estatui que o novel Código de Processo Civil entrou em vigor no passado dia 1/09/2013 e que se aplica imediatamente a todas as acções pendentes; ao Código referido, na redacção dada pela Lei 41/2013, de 26/6, pertencerão as disposições legais que vierem a ser mencionadas sem indicação de origem.

  • Decisão Texto Integral: