Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
6960/15.0T8FNC.L1-6
Relator: EDUARDO PETERSEN SILVA
Descritores: CONTRATO-PROMESSA
ALTERAÇÃO
SINAL
RESOLUÇÃO
INTERPELAÇÃO ADMONITÓRIA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 07/04/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTEP
Sumário: I.– A dedução de articulado próprio por interveniente chamado a associar-se ao autor, ainda que revista a natureza de petição inicial e os respectivos factos devam ser apreciados para a decisão, quando não contestada pelo réu, não tem o efeito cominatório de se considerarem confessados os factos articulados se a dedução é feita depois do oferecimento da primitiva contestação e desta já resulta, ao menos no seu conjunto, defesa quanto aos mesmos factos.

II.– Se no contrato promessa se condiciona a sua produção de efeitos à transferência do sinal no prazo de quinze dias, e se o promitente-comprador transfere valor inferior ao convencionado, se o promitente-vendedor prossegue, apesar disso, na execução das suas próprias obrigações, designadamente obtendo os documentos que lhe incumbem e autorizando sucessivos adiamentos da escritura definitiva, esta conduta constitui alteração tácita do valor do sinal, não carecendo a mesma de forma escrita.

III.– No contrato promessa de compra e venda de bens imóveis, sem fixação de prazo essencial ou peremptório para o cumprimento, a celebração de um aditamento para convencionar tal natureza ao prazo está sujeita a forma escrita, não podendo vincular a parte promitente-compradora que não assina tal aditamento.

IV.– Porém, em face de sucessivos adiamentos da escritura definitiva, se a vontade da parte promitente-vendedora que se expressa no aditamento integra uma interpelação admonitória, não carecendo esta de forma escrita, tendo tal vontade sido levada ao conhecimento do devedor, deve considerar-se realizada a interpelação admonitória.

V.– Afirmando o réu, na contestação, que continua a querer realizar a escritura, mas que, por ter sido lançada enorme quantidade de terras sobre o prédio, já fez propostas de aquisição apenas da parte não afectada e de redução de preço, e afirmando que a responsabilidade da remoção das terras é dos promitentes vendedores, e que tal remoção custará milhões de euros e demorará vários anos, torna-se evidente que o réu, apesar do que declara, não pretende cumprir o contrato promessa nos precisos
termos dele constantes, tornando-se assim dispensável a interpelação admonitória.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os juízes que compõem este colectivo do Tribunal da Relação de Lisboa:


I.–Relatório


A…, nos autos m.id., veio propor a presente acção declarativa com processo comum contra B…, também nos autos m.id., pedindo a condenação deste a reconhecer o direito de propriedade pleno da autora e restantes titulares inscritos, sobre determinado prédio misto, localizado no concelho do M…, Madeira, e que seja o réu declarado incumpridor no contrato promessa outorgado em 2007 e condenado à entrega imediata do mesmo prédio, completamente livre e desocupado de pessoas e bens. Mais peticionou que a quantia paga a título de sinal, no montante de € 200.000,00, seja considerada perdida a favor da autora e restantes proprietários e promitentes-vendedores e ainda que seja o réu condenado no ressarcimento de todos os prejuízos, danos e gastos que da sua ocupação ilegítima vem causando, a apurar em sede de liquidação de sentença.

Alega, em síntese, que a autora, na qualidade de comproprietária e conjuntamente com os restantes comproprietários, prometeu vender ao réu o prédio mencionado, pelo preço de 1.500.000 euros, tendo ficado convencionado que o promitente-comprador, aqui réu, deveria pagar a título de sinal o montante de €300.000,00, no prazo máximo de 30 dias, sendo que o réu acabou por entregar apenas a quantia de €200.000,00, prometendo pagar o remanescente mas nunca o tendo feito. No contrato promessa ficou a constar o domicílio do promitente-comprador no Funchal e ficou encarregue de tratar dos assuntos do referido contrato um procurador. Ficou ainda acordado, como condição essencial para a validade do contrato, que os promitentes vendedores ficavam obrigados a entregar, ao promitente comprador, prova documental de que o prédio já era de propriedade privada desde antes de 31/12/1864 e que assim era excluído do domínio público marítimo. Tal prova foi remetida ao procurador do promitente comprador por um dos comproprietários. Igualmente se estabeleceu que o réu ficava autorizado a habitar a parte urbana do prédio, podendo proceder a reparações e melhoramentos – o que fez, ali instalando a sua habitação de férias – com a ressalva de que em caso de incumprimento não seria devida nenhuma indemnização. Os promitentes vendedores conservavam a posse exclusiva do prédio até integral pagamento, mas o réu mudou fechaduras e não os deixou mais ter acesso.

Convencionou-se que a escritura definitiva seria outorgada no prazo de seis meses – até 12 de Dezembro de 2007 – mas o réu, sempre alegando iliquidez, foi sempre pedindo o adiamento da escritura, ao que os promitentes-vendedores foram acedendo.

Em 6 de Março de 2012 as partes acordaram, em aditamento ao contrato-promessa, num novo prazo para a outorga da escritura, ficando a escritura definitiva marcada para 6 de maio de 2012, sem mais prorrogações, tendo ficado expressamente convencionado que, em caso de incumprimento por parte do promitente-comprador, o réu ficaria obrigado à restituição automática e imediata da posse do imóvel aos promitentes vendedores, com perda total do sinal prestado e sem direito a indemnizações por obras; o réu não compareceu no dia aprazado para a escritura, razão pela qual a mesma não se realizou.

Nessa sequência, em 15 de Outubro de 2012, uma das promitentes-vendedoras, em seu nome e em representação dos demais, notificou o réu de que, devido ao seu incumprimento, e de acordo com as cláusulas contratuais e aditadas, considerava resolvido o contrato-promessa, por não cumprido por culpa do réu, o que causou a perda do interesse na realização do contrato, mais o notificando para, no prazo máximo de 30 dias, retirar todos os móveis e utensílios que lhe pertencessem do imóvel. Embora recebida tal notificação na morada convencionada, o réu não tomou qualquer atitude.

A 31 de Julho de 2013, outra das proprietárias do imóvel notificou novamente o réu, reiterando a rescisão definitiva do contrato-promessa, reafirmando-a, e solicitando a entrega do prédio no prazo máximo de 5 meses e, embora recebida a notificação na morada convencionada, o réu persistiu na inércia.

Finalmente, a A. requereu a notificação judicial avulsa do réu, notificando-o para que, no prazo máximo de 30 dias, contados a partir da data da notificação, entregasse o prédio livre de pessoas e bens, sob pena de contra si ser intentada acção judicial, notificação que foi realizada por agente de execução, o qual se fez acompanhar de intérprete, e ainda assim o réu persiste na ocupação do imóvel.

Depois de variadas tentativas de citar o réu, veio este a ser citado por agente de execução acompanhado por intérprete, e a apresentar contestação, na qual excepcionou a ilegitimidade da autora, por desacompanhada dos restantes sete promitentes vendedores, com preterição de litisconsórcio necessário activo, e por impugnação, nesta sede alegando, muito em síntese, que não domina a língua portuguesa, que ficou convencido que tinha ficado assente que os promitentes compradores se obrigavam a obter licença de construção, o que era para si condição essencial, que a morada convencionada no contrato promessa só valia para a primeira data e que não constitui um domicílio convencionado, que não é verdade que houvesse um procurador seu, que não recebeu quaisquer cartas, que entretanto foram depositadas enormes quantidades de entulho que tornam impossível retomar a orografia inicial, que notificou judicial e avulsamente os promitentes vendedores para cumprir, o que não fizeram, e negando que os promitentes vendedores tenham direito à resolução do contrato, e concluindo pela sua absolvição.

Replicou a autora, pugnando pela improcedência da excepção invocada, ou assim não se entendendo, pela intervenção dos demais comproprietários, requerendo então a intervenção provocada destes, a qual veio a ser admitida.

O chamado C…, ofereceu articulado próprio, apresentando a respectiva versão dos factos, no essencial afirmando a tempestividade do cumprimento da obtenção de declaração de exclusão do domínio público marítimo, afirmando ter sido convencionada morada para o réu e ter sido a imobiliária contratada por este, e atribuindo a responsabilidade pelo depósito de entulhos ao réu, visto que embora formalmente os promitentes vendedores ficassem na posse exclusiva, a verdade é que apenas o promitente-comprador podia ter impedido tais depósitos. Alegou ainda que o réu já não quer comprar a totalidade do prédio, oferecendo propostas para parte, o que os promitentes vendedores não aceitam. Concluiu a final como na petição inicial.

Convidada, a autora veio pronunciar-se sobre a validade do aditamento ao contrato promessa referido no artigo 2º da petição inicial, afirmando que apesar de não assinado pelo réu, que se ausentou para a Alemanha, foi efectivamente celebrado entre as partes, e era favorável ao réu, o referido aditamento.

Designou-se data para audiência prévia, convocada com as finalidades previstas nas alíneas a) e b) do artigo 591º do Código de Processo Civil, e seguidamente foi proferido despacho saneador, julgando prejudicada a excepção de ilegitimidade e afirmando a possibilidade de conhecimento imediato do mérito, passando a proferir sentença, de cuja parte dispositiva final consta:
Face ao exposto, o tribunal decide julgar parcialmente procedente a presente ação e, consequentemente:
a)- Reconhecer o direito de propriedade dos autores sobre o prédio misto, localizado no (…), freguesia (…), inscrito na matriz, a parte rústica, sob o artigo (…) da secção “(…)” e a parte urbana sob o artigo (…) e descrito na Conservatória do Registo Predial de (…) encontra-se descrito sob o n.º (…) da freguesia (…).
b)- Absolver o réu dos demais pedidos.
Custas da ação a cargo dos autores e do réu, na proporção de 90% para os autores e 10% para o réu.
Fixa-se à ação o valor de 1.500.000 (um milhão e quinhentos mil) euros (artigos 296º, n.º 1, 297º, n.ºs 1 e 2, 299º, n.º 1, 301º, n.º 1 e 306º, n.ºs 1 e 2, todos do Código de Processo Civil)”.

Inconformada, a Autora e os intervenientes interpuseram o presente recurso, formulando, a final, as seguintes conclusões:
1.- O contrato de promessa de compra e venda celebrado entre a A. e intervenientes, como promitentes vendedores, e o R., como promitente-comprador, em 12-06-2007, previa na cláusula 3ª, alínea a) o pagamento imediato de um sinal de €300.000,00.
2.- No acto da assinatura do contrato, porque o R., promitente-comprador, não disponha daquele valor, ficou de transferir o montante do sinal, no prazo de quinze dias, para os promitentes vendedores (alínea c), da clª 3ª).
3.- Todavia, naquele prazo, transferiu apenas a quantia de €200.000,00, mantendo-se por satisfazer, pelo R., promitente-comprador, até hoje, o restante do sinal (€100.000,00).
4.- A cláusula 10º do contrato previa que, se o sinal convencionado não fosse transferido para os promitentes vendedores, nos quinze dias subsequentes à sua celebração, o contrato não produziria quaisquer efeitos e ter-se-ia por resolvido.
5.- Tal cláusula manteve-se integralmente subsistente, sem quaisquer reservas ou limitações, pelo que o contrato deve, a tal título, ter-se por resolvido.
6.- A escritura e pagamento do restante do preço em dívida, que deveria ser de €1.200.000,00 (mas é de €1.300.000,00, em virtude do não pagamento integral do sinal convencionado por parte do R.,) deveria ter lugar no prazo de seis meses.
7.- Todavia, como a celebração da escritura ficou, também, dependente da prévia exclusão do domínio público marítimo, relativamente ao prédio prometido vender, a assegurar pelos promitentes vendedores, no prazo máximo de dois anos, caso em quer a escritura deveria ser outorgada, no prazo de 30 dias, a partir da data em que fosse feita a prova, pelos promitentes vendedores, de estar concretizada tal exclusão (cláusula 5ª).
8.- Uma vez que a prova da exclusão do domínio público marítimo foi efectuada, pelos promitentes vendedores, por carta de 29 de Maio de 2009, carta em que também notificaram o R. para outorgar a escritura e pagar o restante do preço, no prazo de 30 dias (doc. de fls. 17).
9.- Daqui decorre que o R. está, comodamente, na posse do prédio prometido vender, desde 12 de Junho de 2007, usufruindo do imóvel, enquanto os promitentes vendedores estão privados da quase totalidade do preço, desde sempre (de €1.500.000,00 só receberam €200.000,00), aguardando o seu pagamento e a celebração da escritura, desde Junho de 2009, ou seja, há quase dez anos.
10.- Significa isto que, há dez anos, que as prestações devidas pela A. e intervenientes, promitentes vendedores, para com o R., estão integralmente satisfeitas e que as prestações devidas pelo R., promitente-comprador, – pagamento do restante do sinal, pagamento do restante do preço e outorga da escritura – vencidas há dez anos, estão por satisfazer e relativamente às quais o R., promitente-comprador, já assumiu, definitivamente, não pretender cumprir, sem justificação para tal.
11.- Claro que o R. tenta, sem sucesso, “voltar o bico ao prego” invocando uma excepção de incumprimento, na base da imputação de um falso incumprimento, dos promitentes vendedores, quando, como os autos demonstram, estão integralmente satisfeitas as prestações devidas pela A. e intervenientes.
12.- Efectivamente, a exclusão do domínio público marítimo foi obtida e provada ao R., pelos promitentes vendedores (A. e intervenientes), dentro do prazo convencionado (cláusula 5ª), como foram assinados, por eles, todos os documentos necessários à aprovação e licenciamento do projecto, pelo Município de (…) (cláusula 5ª), processo que só não prosseguiu porque o R. não apresentou os respectivos projectos da especialidade e de engenharia.
13.- A questão do despejo de terras, pelo Governo Regional, numa parcela da área rústica do prédio prometido vender – deve-se a acto de terceiro – e ocorreu com o consentimento do R., que, estando na posse do imóvel a tal não se opôs, nem alertou a A. e intervenientes, promitentes vendedores, para isso.
14.- Aliás, tal nunca constituiria incumprimento, mas quando muito, vício do bem objecto da promessa de compra e venda, devido a acto de terceiro, facilmente removível (facto provado por não impugnado pelo R., constante do articulado próprio do chamado C...).
15.- Não tem, assim, qualquer fundamento a alegada pretensão do R, da devolução do sinal em dobro e benfeitorias introduzidas no imóvel, pela razão simples de que não há o menor incumprimento, por parte dos promitentes vendedores, o que, aliás, levou o R. a não deduzir qualquer reconvenção nesse sentido, o mesmo acontecendo quanto à eventual anulação do contrato por alegado erro.
16.- Em qualquer caso, encontrando-se o R. em falta relativamente a prestação por ele devida à A. e intervenientes, como promitentes vendedores, - parte do sinal em dívida (€ 100.000,00), não lhe era lícito lançar mão, da excepção de incumprimento, aliás, inexistente, que imputa aos outros contraentes, na contestação.
17.- A A. e intervenientes, promitentes vendedores, deram todas as oportunidades, e mais algumas, ao R., promitente-comprador, para a celebração da escritura e pagamento da parte do preço em dívida, ao que este se foi sucessivamente subtraindo, sem a menor justificação.
18.- Só como reacção à notificação judicial avulsa que lhe foi dirigida pelos promitentes vendedores e efectuada em 13-03-2015 (fls. 9vº), veio, em notificação judicial avulsa que requereu, de fls. 10 e segs., imputar à A. e intervenientes falso incumprimento, como se demonstrou.
19.- Tal notificação judicial avulsa afigura-se, em qualquer caso, de todo irrelevante, porquanto ela não é oponível à A.. que dela não foi notificada (V. certidão negativa de fls. 81vº), sendo certo que é o próprio R. quem, na contestação levanta a questão do litisconsórcio necessário.
20.- As sucessivas cartas de notificação do R. para a celebração da escritura, incluindo a notificação judicial avulsa que lhe foi efectuada, constituem, diríamos mesmo que por excesso, interpelação admonitória bastante para a outorga da escritura em causa, ao contrário do decidido pela sentença recorrida.
21.- Relativamente ao acordo de prorrogação (doc. 3 de fls. 18), embora o R., por razão de se ter ausentado da Madeira, não ter chegado a assiná-lo, a verdade é que concordou com o mesmo e este foi-lhe notificado, em correspondência subsequente e na notificação judicial avulsa que lhe foi feita (e traduzida), requerida pela A. e intervenientes, promitentes vendedores.
22.- A Meritíssima Juíza “a quo”, depois de proclamar que, nos termos do artº 342º, nº 2., do CCivil, fez recair sobre o R. a prova de que detêm a posse lícita do imóvel, cuja restituição é requerida, substituiu-se ao demandado nessa obrigação de prova.
23.- Para tanto, embrenhou-se nas questões relativas à mora ou incumprimento, por parte do R., do contrato de promessa, concluindo, com manifesto erro, inexistir a interpelação admonitória do promitente comprador, decidindo, por isso, pela licitude da posse do imóvel por sua parte.
24.- Ora, o incumprimento, desde logo, relativamente ao sinal convencionado, tornou, desde sempre, a posse em causa, de má-fé, situação agravada pela confissão do culposo e deliberado incumprimento definitivo, assumido pelo próprio R..
25.- Incumprimento este resultante, além de tudo o mais já referido, por ser, demonstradamente falso o incumprimento que imputou à A. e intervenientes, promitentes vendedores, o que ficou reforçado com os factos que, por acordo, deveriam ter sido dados como provados pela sentença recorrida, face à não impugnação do articulado próprio (petição) apresentado pelo chamado, C….
26.- Aliás, a douta sentença recorrida a este respeito enferma de nulidade por omissão de pronúncia (alínea d) do nº 1, do artº 615º do CPCivil), uma vez que tinha de conhecer daquele articulado, da sua não impugnação e da admissão dos factos, por acordo, vertendo-os no elenco dos factos dados como provados, o que bastaria para declarar como procedentes todos os demais pedidos formulados pela A..
27.- Não ocorre qualquer erro relevante relativamente à cláusula 9ª do contrato de promessa, à qual, ao contrário do que aconteceu com as cláusulas 5ª e 6ª do mesmo contrato, as partes não atribuíram qualquer carácter essencial no tocante ao negócio celebrado.
28.- Toda a correspondência – notificações e interpelações ao R. – foram dirigidas para as moradas convencionadas, incluindo a da nova sede da mediadora (…) e do domicílio profissional do representante do R., na Madeira, Snr. D… e entregues e recebidas pelo R..
29.- Confessado pelo R. o incumprimento definitivo do contrato e a sua disposição injustificada de não outorgar a escritura e pagar o restante do preço em dívida, declaração séria que subsiste e é mantida na contestação, dispensada ficaria sempre, por inútil e desnecessária, qualquer interpelação admonitória.
30.- Por outro lado, se o Tribunal considerou dever entrar por essa questão, teria de fixar os temas da prova e designar julgamento e ainda, se entendia ocorrer insuficiência de alegação por parte da A., como parece referir, tinha obrigação de a tentar suprir, ordenando a notificação da A. para aperfeiçoar a petição (artº 590º, nº 4., do CPCivil) e como o impõe o princípio da cooperação (artº 7º do CPCivil).
31.- Em qualquer caso, ficou demonstrada, à saciedade, a posse ilícita do imóvel, por parte do R., desde o seu incumprimento relativamente ao sinal convencionado (entregou apenas € 200.000,00), com a consequência do contrato ficar sem efeito e ter-se por rescindido (cláusula 10ª), o que reforça e torna ainda mais evidente a ilicitude da mesma posse e podia ter permitido ao Tribunal “a quo” ter operado, por convolação, a qualificação jurídica dos factos em conformidade com o citado Acórdão do STJ de 25-01-2007.
32.- Por outro lado, ao vir imputar à A. e intervenientes, como promitentes vendedores, de má-fé, falso incumprimento, incluindo a questão do depósito de terras pelo Governo Regional, facto que aconteceu, com o seu conhecimento e sem qualquer oposição da sua parte, apesar de ser ele o único que estava na plena posse do imóvel, e sem que disso informasse os promitentes vendedores.
33.- Tal traduz-se num abuso de direito (artº 334º do CCivil), sob a forma de “venire contra factum proprium”, que torna ainda mais ilícita a posse em causa, questão esta que é de conhecimento oficioso, enfermando também a sentença recorrida, a este título, de nulidade por omissão de pronúncia (alínea d) do nº 1., do artº 615º do CPCivil).
34.- Estão, pois, reunidos todos os requisitos de facto e de direito para a procedência de todos os pedidos formulados pela A., incluindo os da restituição do prédio, incumprimento do contrato, perda do sinal e reparação de prejuízos e danos a liquidar em execução de sentença, bem como nas custas do processo, ao contrário do decidido pela sentença recorrida.
35.- A douta sentença recorrida violou, entre outras disposições legais e além das já citadas nas alegações e nestas conclusões, os artºs 1305º e segs. do CCivil, artºs 1311º e segs. do mesmo Código, artºs 224º, 230º, 289º, 342º, 350º, 410º, 334º, 442º, 483º e 801º, do CCivil, entre outros, e ainda os artºs 5º, 7º, 315º, 319º, 574º, 590º, 591º, 595º, 597º, 615º, do CPCivil.
Termos em que se deve considerar procedente o presente recurso, revogando-se a douta sentença recorrida na parte em que considerou improcedentes os pedidos formulados pela A., (…)”

Não foram produzidas contra-alegações.

O tribunal admitiu o recurso, sustentando a decisão quanto a nulidades.

Corridos os vistos legais, cumpre decidir:

II.–Direito
Delimitado o objecto do recurso pelas conclusões da alegação, as questões a decidir são a nulidade da sentença, a reapreciação da decisão sobre a matéria de facto e a procedência integral dos pedidos formulados pela autora e intervenientes.

III.–Matéria de facto
A decisão sobre a matéria de facto proferida pelo tribunal recorrido é a seguinte:
“Dos documentos juntos e da posição das partes nos respectivos requerimentos, resultam provados os seguintes factos:
1.- Mediante escrito datado de 12 de junho de 2007 e denominado de “Contrato Promessa de Compra e Venda”, a autora e os chamados, como primeiros contratantes e promitentes vendedores, e o réu, como segundo outorgante e promitente comprador e identificado como “residente habitualmente em (…) Alemanha, declaram na celebração de contrato-promessa de compra e venda, nos termos constantes nos artigos seguintes:

“ 1º
Os primeiros contratantes, pelo preço de 1.500.000,00 (um milhão e quinhentos mil euros), prometem vender ao segundo contratante, ou a quem este indicar, completamente livre de encargos e quaisquer outras responsabilidades, um prédio misto, localizado ao sítio (…), freguesia (…), concelho de (…), com área aproximada de cinco mil novecentos setenta e sete metros, que confronta pelo norte com a Rua (…), inscrito na matriz predial rústica sob parte do artigo (…) Secção “(…)”, e a parte urbana sob o artigo (…), e descrito na Conservatória do Registo Predial de (…) sob parte do n.º (…) de (…), onde se acha registada aquisição a favor dos vendedores;
(…)


O preço será pago do seguinte modo:
a)- A importância de 30.000,00 (trezentos mil euros), no momento da assinatura deste contrato, como princípio de pagamento e a título de sinal;
b)- A importância restante, no montante de 1.200.000,00 (um milhão e duzentos mil euros), contra a outorga da escritura definitiva de compra e venda;
c)- Dado que o segundo contratante não está munido da importância de 300.000,00 (trezentos mil euros), no momento da assinatura deste contrato esta importância só será tida por paga se, no prazo máximo de 15 dias a contar de hoje, for
transferida ou depositada n a conta n.º (…) do Banco (…) – com o NIB (…), de que é titular o promitente-vendedor – C….


A escritura definitiva será outorgada no prazo de seis meses a contar de hoje, podendo qualquer das partes notificar a outra para esse efeito pelo envio de carta registada e aviso de recepção com a antecedência mínima de trinta dias para as seguintes moradas localizadas na Região Autónoma da Madeira:
Vendedores – Rua (…) Funchal;
Comprador – Rua (…) Funchal.


Os primeiros contratantes para a validade deste contrato obrigam-se a entregar ao segundo contratante promitente-comprador, prova documental de que o prédio objecto deste contrato já antes de 31/12/1864 era objecto de propriedade privada, para que o segundo contratante e promitente-comprador viabilize o seu empreendimento, pelo que os primeiros contratantes ficam com o direito a um prazo de dois anos, se para tal necessitarem, para fazer entrega dessa prova ao segundo contratante, pelo que, neste caso especial, o prazo contratual de seis meses para a outorga da escritura definitiva de compra e venda, pode ser alargado até dois anos, por vontade unilateral dos promitentes-vendedores.


Se essa prova documental não for entregue ao segundo contratante, no prazo máximo de dois anos a contar de hoje, o presente contrato não produz quaisquer efeitos, tendo o segundo contratante apenas direito a exigir dos primeiros contratantes a devolução do sinal em singelo e sem acréscimos, pelo que a importância de 300.000,00€ (trezentos mil euros), perde o carácter de sinal neste caso especial de falta de prova documental não imputável aos promitentes-vendedores.


Com a entrega material da mencionada prova documental ao segundo contratante ou ao seu representante nesta Região Autónoma da Madeira, fica cumprida a obrigação dos primeiros contratantes, pelo que a escritura definitiva deverá ser outorgada nos trinta dias seguintes.


O segundo contratante fica autorizado a habitar a parte urbana do prédio objecto deste contrato, podendo proceder a reparações e melhoramentos sem direito a indemnização, as quais ficarão a fazer parte integrante do prédio dos primeiros contratantes, que conservam a sua posse exclusiva até pagamento integral do preço e outorga da escritura definitiva.


Os primeiros outorgantes obrigam-se a assinar e a requerer em nome próprio todas as licenças para o loteamento, parcelamento ou para a edificação ou construção exigidas pelo promitente-comprador, que assume toda a responsabilidade, designadamente, relativamente aos pagamentos que essas assinaturas e esses requerimentos derem lugar.

10º
Se o promitente-comprador, no prazo máximo de quinze dias a contar de hoje, não transferir para a conta bancária acima indicada os 300.000,00 € (trezentos mil euros), a título de princípio de pagamento e de sinal, o presente contrato de modo automático não produzirá quaisquer efeitos e ter-se-á por resolvido e os promitentes-vendedores ficam automaticamente desvinculados do segundo contratante e livres para venderem o prédio a terceiros que eventualmente manifestem interesse nessa compra.

11º
Nesta transacção interveio a firma “(…) Mediação Imobiliária, Ldª.” (…) – cfr. Documento de fls. 13 a 15).
2.- Na Conservatória do Registo Predial de (…) encontra-se descrito sob o n.º (…), da freguesia (…), um prédio misto, localizado no (…), com área total de 6210m2, sendo 111m2 de área coberta, composto de cultura arvense e uma casa, a confrontar a norte com Rua (…), a sul com herdeiros de (…), a leste com calhau do mar e a oeste com (…), inscrito na matriz, a parte rústica, sob o artigo (…) da secção “(…)” e a parte urbana sob o artigo (…), e aí inscrita, com a Ap. (…), aquisição, em comum e sem determinação de parte ou direito, a favor da autora e dos chamados, por sucessão legítima (cfr. documento de fls. 110).
3.- O réu acabou por apenas transferir a quantia de 200.000,00 euros.
4.- O réu nunca fez outra transferência que não a indicada em 1[1].
5.- A 29 de maio de 2009, o chamado C… enviou a D…, que identificou como representante e procurador do réu, carta em que comunicou que foi excluído do domínio público marítimo o prédio referido em 1., identificado por sentença datada de (…) 2009 do Tribunal Judicial de (…) e que fazia nesse momento entrega dessa prova documental. Mais comunicou que com esta entrega, os promitentes-vendedores cumprem a sua obrigação para que o promitente-comprador viabilize o seu empreendimento ficando, desde já o destinatário, na qualidade de representante e procurador do promitente-comprador, notificado para outorgar a escritura de compra e venda no prazo contratual de 30 dias, a contar de hoje, no mesmo Cartório Notarial onde foi assinado o Contrato-Promessa de Compra e Venda.
5.- Em (…) 2009, no âmbito do processo n.º (…), em que figurou como autor C… e outros e como ré a Região Autónoma da Madeira, foi proferida sentença, transitada em julgado em (…).2009, que homologou a transacção a que as partes chegaram, nos termos da qual, além do mais, a ali ré Região Autónoma da Madeira reconheceu o prédio misto, no (…), freguesia do (…), concelho (…), com área de 6210m2, inscrito na matriz predial rústica sob o artigo (…) da Secção “(…)” e na matriz predial urbana sob o artigo (…), descrito na Conservatória do Registo Predial (…) sob o n.º (…), como propriedade privada e particular dos autores, em comum e sem determinação de parte ou direito, bem como que desse prédio o domínio público marítimo está excluído, pelo facto de existir prova bastante nos autos de que esses prédios estão exclusivamente na posse e em nome próprio de particulares e na fruição conjunta dos mesmos já antes de 31 de dezembro de 1864 (cfr. documento de fls. 117 a 119).
6.- O réu instalou na parte urbana do prédio referido em 1. a sua habitação de férias, aí pernoitando e dele usufruindo em todas as suas deslocações à Madeira.
7.- Tendo feito obras no prédio.
8.- O réu mudou as fechaduras do prédio, não deixando a autora e os chamados ter acesso ao mesmo.
9.- O réu foi sucessivamente pedindo o adiamento da escritura, a que os promitentes-vendedores foram acedendo.

10.- Consta de escrito datado de 6 de março de 2012, denominado de “Prorrogação do Contrato Promessa de Compra e Venda datado de 12 de junho de 2007”, celebrado entre a autora e os chamados, duma parte, como primeiros contratantes e promitentes-vendedores, e o réu, como segundo contratante e promitente-comprador, e subscrito apenas pela autora e os chamados, o seguinte:

Considerando que o segundo contratante e promitente-comprador solicitou aos promitentes-vendedores mais prazo de sessenta dias para cumprimento integral do contrato, os primeiros contratantes aceitam esse segundo pedido de prorrogação, nos termos do qual fica desde já adiado para o dia seis de maio de 2012.

O pagamento da totalidade do preço e dos respectivos juros moratórios será pago contra a outorga da escritura definitiva de compra e venda, findo o qual não haverá mais prorrogações contratuais, desencadeando-se, em caso de incumprimento por parte do promitente-comprador, as consequências contratualmente acordadas de restituição automática e imediata da posse do imóvel aos promitentes vendedores, com perda total do sinal prestado e sem direito a indemnização por obras realizadas no imóvel objecto do contrato, dando, assim, as partes mutuamente por pagos do que eventualmente haviam de receber (cfr. documento de fls. 18).

11.- O réu não compareceu no dia marcado para a escritura, a qual, por isso, não se realizou.

12.- Com data de 15 de outubro de 2015[2], a chamada E… dirigiu ao réu, e para a morada “(…)Mediação Imobiliária, Ldª.”, Rua (…) Funchal, carta da qual consta o seguinte:
“E… (…), na qualidade de cabeça-de-casal da herança deixada por óbito de (…), em 12 de junho do ano de 2007, em conjunto com os demais herdeiros, prometeu vender a V. Exª, pelo preço de 1.500.000,00 euros, um prédio misto, localizado na freguesia (…), concelho (…), inscrito na matriz predial rústica sob parte do artigo (…) Secção “(…)”, e a parte urbana sob o artigo (…).
A escritura definitiva deveria ter sido outorgada no prazo de seis meses a contar da assinatura do contrato promessa (12/07/2007), o que só não aconteceu por culpa do promitente-comprador, B…, que não conseguiu o dinheiro suficiente para pagar aos promitentes-vendedores o preço acordado.
A pedido de V. Exª. (promitente-comprador), ficou acordado entre as partes que a escritura definitiva seria outorgada até ao dia 31/12/2011, sob pena de fazer entrega, nesse dia, da totalidade do prédio, livre e desembaraçado de ónus e encargos, com perda de sinal e das obras feitas, sem direito a quaisquer indemnizações, e passou-se esse dia designado pelas partes, sem que a escritura tenha sido outorgada.
Novamente a pedido de V.Exª. a 28/12/2011, ficou acordado entre as partes que a escritura definitiva seria outorgada até ao dia 01/03/2012, nas mesmas condições acordadas anteriormente.
E sobre este último prazo já passaram mais de sete meses, pelo que os promitentes-vendedores perderam o interesse na realização do contrato.
Assim, comunica-se a V. Exª. a resolução do contrato-promessa de compra e venda, com efeitos para o futuro, com fundamento no incumprimento e na falta de pagamento do preço e falta de outorga da escritura definitiva de compra e venda.
E solicita-se a V.ª Exª. sejam retirados, no prazo máximo de 30 dias, todos os móveis e utensílios que lhe pertencem, instalados no prédio em causa (…) – cfr. documento de fls. 19).

13.- O réu não tomou qualquer atitude, apesar das muitas insistências entretanto havidas, pessoalmente, para que entregasse o prédio.

14.- Com data de 31 de julho de 2013, a chamada E… dirigiu ao réu, A/C “… Mediação Imobiliária, Ldª.”, carta da qual consta o seguinte:
“E (…), na qualidade de cabeça-de-casal da herança deixada por óbito de (…), falecida em (…), vem comunicar a Vª. Exª., mais uma vez, a rescisão definitiva, com efeitos para o futuro, do contrato-promessa de compra e venda, datado de 12 de junho de 2007, do qual Vª. Exª. foi promitente-comprador, relativo a um prédio misto, localizado na freguesia (…), concelho de (…), inscrito na matriz predial rústica sob parte do artigo (…) Secção “(…)”, e a parte urbana sob o artigo (…).
O prazo contratual foi de seis meses, no entanto, os promitentes vendedores beneficiaram de um alargamento do prazo de dois anos, para fazerem entrega ao promitente comprador de prova documental de que o objecto do contrato, já antes de 31 de Dezembro de 1861, era cultivado por particulares.
E os promitentes-vendedores fizeram entrega ao promitente-comprador da prova a que se obrigaram obter, dentro do prazo de dois anos acordados, cujo termo já ocorreu em finais de 2009.
Mas o promitente-comprador não conseguiu obter dinheiro suficiente para pagar aos promitentes-vendedores o preço a que se obrigou, pelo que, a seu pedido, o prazo contratual foi prorrogado em 1 de Setembro de 2010, em 28 de Dezembro de 2011 e em 6 de Março de 2012, sempre com o fundamento de que o promitente-comprador não conseguia, ainda, obter o dinheiro suficiente para pagar o preço contratual acordado.
A signatária, na qualidade de cabeça-de-casal, em 12 de Outubro de 2012, comunicou a Vª. Exª. a definitiva rescisão do contrato-promessa de compra e venda, com efeitos para o futuro, com fundamento na falta de pagamento do preço que se revelou impossível de efectuar por culpa do promitente comprador e falta de outorga da respectiva escritura definitiva de compra e venda e solicitou que fossem retirados, no prazo máximo de trinta dias, todos os móveis e utensílios que lhe pertencem, instalados no prédio em causa (…).
E a última prorrogação, de 06 de Março de 2012, só foi feita ao promitente-comprador após os promitentes vendedores, durante a mora, terem concedido variadas vezes um prazo razoável ao promitente-comprador para cumprir, e, mesmo assim, este culposamente não cumpriu.
Não obstante a última prorrogação, que é uma verdadeira e real interpelação admonitória, com fixação de prazo de intimação para o promitente-comprador cumprir, a verdade é que o promitente-comprador não cumpriu o contrato, porque não pagou o preço, nem marcou a escritura, nem entregou o imóvel aos promitentes vendedores, gerando-se incumprimento culposo, que lhe é imputável de modo exclusivo.
Termos em que,
Os promitentes-vendedores reafirmam a rescisão do contrato, constante da comunicação de 15 de Outubro de 2012, e solicitam a V. Exª. a entrega do prédio, objecto do contrato promessa de compra e venda, completamente desembaraçado de pessoas e bens, no prazo máximo de cinco meses, com perda de sinal prestado e de obras incorporadas no imóvel, nos termos contratuais, sob pena dos promitentes-vendedores desocuparem, eles próprios, o imóvel, no dia 1 de Janeiro do ano de 2014, aliás, com anuência de V. Exª. já prestada na prorrogação anterior (cfr. documento de fls. 20 e 21).

15.- O réu persistiu na sua inércia, ocupando o prédio e recusando-se a entrega-lo à autora e chamados.

16.- A autora requereu notificação avulsa do réu, nos seguintes termos:

“1º
Aos 12 de Junho de 2007, a requerente, conjuntamente com os restantes comproprietários, prometeu vender, ao requerido, um prédio misto, localizado ao (…), freguesia (…), concelho de (…), inscrito na matriz predial, a parte rústica, sob parte do artº (…) da secção “(…)”, e a parte urbana sob o artº (…), sendo o descrito na Conservatória do Registo Predial de Machico, sob parte do nº (…), de (…).


Tendo em tal contrato-promessa ficado convencionado o domicílio do promitente adquirente, aqui requerido, a Rua (…) Funchal, precisamente um daqueles para o qual se requer a realização da presente notificação.


Mais tendo ficado encarregue de tratar dos assuntos relacionados com o dito contrato, o procurador do requerido, Sr. D…, na pessoa de quem, alternativamente, se requer também a realização da notificação.


Na clausula 5ª do contrato, e como condição essencial para a validade do mesmo, ficaram os promitentes vendedores obrigados a entregar, ao promitente comprador, prova documental de que o prédio prometido vender era já propriedade privada antes de 31/12/1864 e, assim, que era excluído do Domínio Público Marítimo.


Aos 29 de Maio de 2009, um dos comproprietários e promitente vendedor, o C…, enviou, ao procurador do requerido, essa prova de que o prédio, por reunir condições para tal, havia sido excluído do Domínio Público Marítimo.


Contudo, e alegando sempre falta de liquidez para cumprir com a sua obrigação de pagamento, o requerido foi sucessivamente pedindo o adiamento da escritura, a que os promitentes vendedores foram, pacientemente, acedendo.


Até que, e para obstar ao adiamento eterno da escritura, e aos 6 de Março de 2012, as partes promitentes acordaram, em aditamento ao contrato promessa, um novo adiamento do prazo para a outorga da escritura, ficando a escritura, que deveria definitivamente titular a prometida compra e venda, desde logo e definitivamente, marcada para o dia 6 de Maio de 2012, sem admissão de mais prorrogações contratuais.


E tendo ficado expressamente convencionado que, em caso de incumprimento por parte do promitente-comprador, o aqui requerido, ficaria este obrigado à restituição automática e imediata da posse do imóvel aos promitentes vendedores, com perda total do sinal prestado, e sem direito a quaisquer indemnizações por eventuais obras levadas a cabo, entretanto, no prédio.


Contudo, o promitente-comprador, aqui requerido, não compareceu no dia aprazado para a escritura e, por essa causa, por sua culpa exclusiva, não se realizou a mesma na data que, improrrogavelmente, havia sido fixada para a sua outorga.

10º
Nessa sequencia, e aos 15 de Outubro de 2012 uma das promitentes vendedoras, E…, em seu nome e em representação dos restantes, notificou o ora requerido de que, devido ao seu incumprimento, e de acordo com as clausulas contratuais e aditadas, considerava resolvido o contrato promessa supra identificado, não cumprido por culpa exclusiva do promitente comprador, que causou a perda de interesse na realização do contrato.

11º
E mais notificando o aqui requerido para que, no prazo máximo de 30 dias, retirasse todos os móveis e utensílios que lhe pertencessem, para que os proprietários retomassem a posse do imóvel.

12º
Embora recebida, tal notificação, na morada convencionada, a verdade é que o réu não tomou qualquer atitude, e persistiu na posse do prédio em questão, apesar das muitas insistências entretanto havidas, pessoalmente, para que o entregasse.

13º
Assim, e aos 31 de Julho de 2013, outra das proprietárias do imóvel, a ora requerente, notificou novamente o aqui requerido, reiterando a rescisão definitiva do contrato promessa, reafirmando-a, e solicitando a entrega do prédio completamente desembaraçado de pessoas e bens, no prazo generoso mas máximo de cinco meses.

14º
Embora novamente recebida, tal segunda notificação, na morada convencionada, a verdade é que o requerido persistiu na sua inércia, na sua posse ilegítima do prédio em questão, ocupando-o, assim, sem qualquer título que a tal o legitime, e recusando-se a entrega-lo à requerente e restantes comproprietários.

15º
O proprietário goza de modo pleno e exclusivo dos direitos de uso, fruição e disposição das coisas que lhe pertencem, sendo a propriedade, portanto, um direito inviolável nos termos do Artigo 1305.º do Código Civil;

16º
Considerando o disposto no Artigo 1311.º do código Civil, e tendo em conta que o requerido não colabora, nem nunca demonstrou qualquer vontade em colaborar com os proprietários do prédio supra referido, estes ver-se-ão obrigados, caso não surta efeito esta última oportunidade que lhe é dada, a recorrer aos meios judiciais, para que lhes seja restituída a sua propriedade.

17º
E onde, para além disso, serão peticionados todos os prejuízos que da ilegítima ocupação para eles tem resultado, bem como o ressarcimento por todos os custos que tal situação lhes tem causado.
Desta forma e pelo exposto, solicitando a V. Exa. Se digne proceder à notificação avulsa de B…, supra identificado, na sua pessoa, ao Sítio (…), (…), na sua pessoa, ou, caso aí não seja encontrado, o seja, no seu endereço convencionado, o da sociedade “… Mediação Imobiliária, Ldª., à Rua (…) Funchal, ou ainda, caso tal não se demonstre possível, na pessoa do seu procurador D…, com domicílio profissional à rua (…) Funchal, para que, no prazo máximo de 30 dias, contados da data da sua notificação, entregue o prédio misto, localizado ao (…), freguesia (…), concelho de (…), inscrito na matriz predial, a parte rústica, sob parte do artº (…)º da secção “(…)”, e a parte urbana sob o artº (…), sendo o descrito na Conservatória do Registo Predial de (…), sob parte do nº (…), de (…), aos seus legítimos proprietários, entre os quais, à aqui requerente, completamente livre e desocupado de pessoas e bens, sob pena de, não o fazendo, ser contra si intentada uma acção judicial para obter tal desocupação e devolução de posse, bem como a sua condenação no ressarcimento de todos os prejuízos, danos e gastos que da sua ocupação ilegítima e ilegal tem causado.
A notificação foi concretizada pela agente de execução M…, portadora da cédula profissional (…), na própria pessoa do réu, em 13.3.2015, na Rua (…) (Sítio (…), tendo na mesma intervindo intérprete, uma vez que o réu não dominava a língua portuguesa, o qual, sob compromisso de honra, transmitiu ao agente de execução que o notificando foi devidamente esclarecido ao conteúdo da notificação, tendo o réu assinado a respectiva certidão (cfr. documento de fls. 8 a 12.).
17.– O réu persiste na ocupação do prédio.
18.– O que tem impedido a autora e os chamados de por novamente o prédio à venda ou colocá-lo no mercado do arrendamento.
19.– De informação prestada pelo chefe da divisão e planeamento, urbanismo e ambiente, consta que, no âmbito do processo n.º (…), da Câmara Municipal de (…), foram praticados os seguintes atos:
“14/10/2010 – C… e outros apresentaram documentos em falta para o licenciamento do projecto de alteração da arquitectura de 3 edifícios;
24/11/2010 – A CM… pede parecer SRES e esclarecimentos sobre a competência do tribunal judicial em causa para decidir para decidir a questão do reconhecimento da propriedade dos autores nos termos em que foi feita;
24/11/2010 – A CM… informa o requerente deste procedimento;
14/04/2011 – A CM… insiste SRES para que responda ao pedido de esclarecimentos que ainda não foi recebido;
06/06/2011 – A SRES envia parecer dizendo que “(…)o reconhecimento da propriedade privada sobre parcelas de leitos ou margens dominiais são efectuadas através de processos judiciais. Uma vez reconhecida a propriedade privada (…) será necessária a abertura do procedimento administrativo de delimitação dos referidos prédios com domínio público”.
13/06/2011 – C… expõe em contestação que a CM… recusou a licença sem fundamento legal, o que na sua perspectiva gera responsabilidade para a CM…, seu Presidente e Vereadores;
29/06/2011 – A CM… responde informando que, face ao parecer do SRES (GRIGOT/DSOT), o requerente deve proceder ao procedimento administrativo de delimitação dos prédios com domínio público. Além disso, a Câmara não recusou a concessão licença pois a aprovação do projeto de arquitectura está dependente da referida delimitação, devendo o processo suspender-se, neste caso.
07/11/2011 – A SRARN envia novo parecer à CM… onde refere, no seu ponto 6 que "(...) contudo, após a junção de elementos adicionais ao processo que transitou da SRES, nomeadamente a planta de localização e a cópia do pedido de averbamento à matriz das atuais confrontações do prédio, efectuado junto do serviço de finanças (…), as dúvidas (…) foram esclarecidas”, tornando desnecessário o procedimento de delimitação administrativa do “prédio 2” com o domínio público marítimo. Sendo aquele processo arquivado.
23/11/2011 – A CM… respondeu ao Sr. C… dizendo que, em face do parecer da SRARN, o projecto de arquitetura estava aprovado devendo o requerente apresentar os projectos de especialidade no prazo de seis meses (cfr. documento de fls. 92)”.
20.- O réu requereu uma notificação judicial avulsa e todos os promitentes-vendedores (cfr. documento de fls. 68 a 87).

IV.–Apreciação
Como acima referimos, está em causa a nulidade da sentença, a reapreciação da decisão sobre a matéria de facto, e a procedência integral da acção.
Expliquemos melhor: os recorrentes invocam a nulidade da sentença a dois títulos: - primeiro, a sentença não conheceu dos factos alegados pelo chamado e da sua não contestação pelo réu, e segundo, a sentença não conheceu oficiosamente do abuso de direito na modalidade de venire contra factum proprium cometido pelo réu.    Acresce que, precisamente porque não se conheceu da primeira questão, haverá que aditar aos factos provados os que resultam autonomamente da petição própria do chamado C…, que o réu não contestou e por isso se devem dar por confessados.

Finalmente, em matéria da procedência integral, o recurso apresenta vários argumentos:
- da suficiência de factos para o conhecimento imediato no sentido da procedência da acção, da eventual insuficiência desses factos para a improcedência da acção e consequentemente do dever de convite ao aperfeiçoamento da alegação, questão que se prende também com o desvio de fundamentação que se traduz, segundo o recurso, numa substituição do tribunal à defesa que o próprio réu não fez e que aliás nem é coerente com a defesa que fez (porque desta se retira a não intenção de cumprimento);
- do não pagamento da integralidade do sinal e a aplicação da cláusula do contrato promessa que determina a não produção de quaisquer efeitos deste;
- da interpretação da conduta da autora e intervenientes como interpelação admonitória;
- da intenção de não cumprir que dispensa a interpelação admonitória;
- do abuso de direito por parte do réu.

1ª questão:

Da nulidade da sentença:
Nos termos do artigo 615º nº 1 al. d) do CPC, a sentença é nula quando o tribunal conhece de questão de que não podia conhecer e quando não conhece de questão da qual deve conhecer.
Comecemos pelo não conhecimento do abuso de direito: revisitadas as peças da autora e do interveniente com articulado próprio, nelas não se encontra a alegação de abuso de direito e por isso no recurso se imputa a nulidade ao não conhecimento de questão de conhecimento oficioso.
Os recorrentes invocam que o réu, ao vir imputar aos autores, digamos assim por comodidade de expressão, o incumprimento destes, por não terem obtido o licenciamento ou não terem requerido os pedidos necessários a tanto, terem deixado depositar terras no prédio, estaria a agir contra a conduta que anteriormente havia assumido, designadamente porque apesar de não dominar a língua portuguesa, o contrato promessa fora celebrado com intervenção de tradutor e por isso o réu não podia pretender que resultava do contrato a obrigação dos promitentes vendedores obterem o licenciamento da construção que ele, réu, pretendia fazer no prédio, e menos ainda que essa condição fosse essencial, e que tendo ele, réu, mudado as fechaduras do prédio, só ele podia ter evitado o depósito de terras.
Ora, não tendo o tribunal recorrido relevado a não contestação do réu à petição oferecida pelo interveniente, estas questões, da banda dos autores e por via da posição assumida quer no processo quer nas comunicações que dirigiram anteriormente ao réu, e da banda do réu, por via da notificação judicial avulsa que fez aos autores, situam-se no “limbo”, digamos, da controvérsia, e não constituem aparentemente, manifestamente, de modo chocante e clamoroso, uma situação de abuso de direito – independentemente de o poderem ser – sendo que o conhecimento oficioso do abuso de direito só tem lugar quando precisamente a situação de abuso é manifesta, tão manifesta que o tribunal, mesmo que ninguém tenha alertado para tanto, não pode mesmo deixar de a sancionar, por repúdio aos valores fundamentais da boa-fé ou do fim para que os direitos são concedidos.
Não nos parece, vista a situação de controvérsia, que fosse tão evidente a situação de abuso de direito, e por isso entendemos que o tribunal recorrido não cometeu a invocada nulidade.
Diverso é o ponto de partida na questão da não aplicação da cominação por não contestação dos factos alegados, próprios, pelo interveniente.
Sendo também verdade que o Réu foi citado e juntou procuração a mandatário forense – fls. 67 dos autos – com a sua contestação, a notificação do articulado próprio deduzido pelo interveniente em momento posterior foi assegurada pelo sistema informático “Citius”[3], e em todo o caso, mesmo que assim não fosse, nenhuma nulidade foi invocada pelo ilustre mandatário do réu na audiência prévia cuja primeira sessão teve lugar em 29.6.2018. E, tendo sido alegado, específica e autonomamente, que “A mesma Câmara Municipal que, em 24/11/2010, suscitou dúvidas, quanto ao documento de exclusão do Domínio Público Marítimo (sentença), para efeitos de aprovar o projecto de arquitectura, apresentado pelo R., em conjunto, com a Secretaria Regional do Equipamento Social, removeu unilateralmente essas dúvidas, e reconheceu que, após análise do processo, “o prédio encontra-se perfeitamente identificado e delimitado na planta cadastral, não subsistindo, assim, qualquer dúvida na aplicação dos critérios, legais à definição, no terreno, dos limites do Domínio Público Hídrico”, tudo conforme documento que se junta e aqui se dá por reproduzido para os efeitos legais (Doc. nº 1)”, que “O R., na qualidade de promitente-comprador empossado, ficou com a única chave do imóvel, que lhe foi entregue pelos promitentes vendedores, no momento da assinatura do contrato, em 12/06/2007”, que “(…) enormes quantidades de terras foram lançadas no prédio, de modo unilateral e imperativo, pelo Governo Regional da Madeira, com o fundamento de perigo eminente, e, a ser possível o impedimento, este só podia ter sido desencadeado por iniciativa do próprio promitente-comprador, porque só este tinha a posse exclusiva do imóvel e só a ele competia o inerente dever de zelo e de vigilância do mesmo”, que “(…) a pretensão actual do R., não é já a de comprar todo o prédio objecto do contrato, como, aliás, já consta da contestação, mas, apenas, e tão só, a de comprar parte do imóvel e, para isso, tem já apresentado propostas, nesse sentido, que não foram aceites pelos promitentes vendedores, que mantêm o propósito inicial de venda do prédio, no seu todo, nos termos acordados”, que “(…) porque o R./promitente-comprador residia na Alemanha, foi negociado, com este, escolher uma morada em Portugal, para receber quaisquer notificações. 20º E a morada, em Portugal, escolhida pelo R., foi a morada da sede da “… Mediação Imobiliária, Ldª”, à Rua (…) Funchal, tal como, expressamente, ficou a constar do contrato promessa compra e venda em causa, com reconhecimento de assinaturas presenciais, feitas perante notário, pelo que, trata-se de documento particular autenticado, com força probatória notarial bastante, que não foi impugnado, pelo R., nem arguido de falso. (…) 22º E a “… Mediação Imobiliária, Ldª”, foi empresa contratada pelo R., e não pelos AA., no sentido de procurar um prédio à beira mar, com os requisitos que o R. indicou. 23º E foi a empresa “… Mediação Imobiliária, Ldª”, contratada pelo R., que tomou a iniciativa de procurar os AA., para, em nome do R., apresentar proposta de compra do imóvel. 24º E para essa morada escolhida pelo R. (sede de “…, Mediação Imobiliária, Ldª”), os promitentes vendedores têm dirigido toda a sua correspondência e todas as necessárias notificações, as quais, têm chegado ao seu legítimo destinatário/promitente-comprador e ora R., sem que, alguma vez, o R. tivesse reclamado ou posto em causa a morada usada pelos AA.. (…) Os promitentes vendedores obrigaram-se, formalmente, a assinar, e assinaram, e a requerer, formalmente, em nome próprio, e requereram, todas as licenças para o loteamento, parcelamento, edificação ou construção, desde que, “exigidas pelo promitente-comprador, que, contratualmente, assume toda a responsabilidade, designadamente, pelos pagamentos que essas assinaturas e esses requerimentos derem lugar.”, e não tendo o réu contestado, impunha-se que o tribunal recorrido, ao concluir pela suficiência dos factos para o conhecimento do mérito e ainda mais adiante, ao decidir quais os factos que lhe resultavam provados por acordo nos articulados e prova documental, visto que prova testemunhal não houve, que tivesse ponderado quais dentre os factos alegados pelo interveniente eram realmente factos, quais eram factos relevantes e qual era o efeito que lhes resultava da não contestação do réu. 
Isto dito, convém porém relembrar que a omissão de pronúncia se refere às questões suscitadas pelas partes, e não propriamente à omissão de observância de procedimentos processuais, de regras processuais, que determinariam resultado diverso em termos de decisão dos factos alegados, e ainda assim, que o vício que afecta a decisão de facto não é, em si mesmo, uma nulidade, constituindo quanto muito um erro de julgamento. Ademais, tanto é assim quanto o interveniente, de facto, concluiu como na petição e portanto as questões que o tribunal tinha a conhecer eram essencialmente as mesmas.
Improcedem pois as nulidades de sentença invocadas.

2ª questão:
Chamado alguém a intervir no processo, neste caso, para intervir do lado da autora, evitando assim a preterição do invocado litisconsórcio necessário, esse alguém pode fazer seus os articulados da parte a que fica associado, ou pode apresentar articulado próprio, nos termos do artigo 319º nº 2 do CPC. Ora, quando aconteça a apresentação de articulado próprio, ainda que o pedido final ou a conclusão da defesa seja a mesma que a da parte ao lado de quem figurará, esse articulado tem a mesma natureza que a da peça principal desta parte, ou seja, duma petição ou duma contestação, aplicando-se-lhe as mesmas regras, ou, no mínimo dos mínimos, a alegação factual própria e nova tem de ser levada a contraditório e, se pertinente, relevar para os termos em que a causa será decidida, naturalmente após a sua validação em termos probatórios. Assim sendo, pela aplicação das regras próprias da contestação, o réu haveria de tomar posição definida sobre a nova e própria argumentação factual do interveniente, sob pena de se considerarem confessados os factos, nos termos do artigo 567º nº 1 do CPC.

Ora, pretendem os recorrentes que, por via desta não contestação, se dê como provado e adite, conforme consta do corpo do recurso:
- Que foi atempadamente feita a prova pelos promitentes vendedores, de harmonia com o contrato, da legal exclusão do domínio público marítimo relativamente ao prédio prometido vender;
- Que as dúvidas levantadas pelo Município de (…) a esse respeito, não tinham razão de ser e estavam ultrapassadas (V. doc. de fls. 135);
- Que a aprovação do projecto e obtenção da respectiva licença, no Município de (…), cabia ao R. providenciar e obter, de harmonia com o convencionado no contrato-promessa;
- Que o R., vem ele próprio procedendo a operações de movimentação de terras na parte rústica do prédio prometido vender (artº 14º do articulado fls. 131vº);
- Que estando o R. na plena posse de todo o imóvel, incluindo a parte rústica, só ele poderia ter impedido o despejo de terras no prédio em causa, pelo Governo Regional, e o R. consentiu-o, sem o conhecimento ou autorização dos promitentes vendedores (artºs 15º, 16º e 17º do articulado);
- Que a morada do R. para efeito de notificações foi escolhida por ele com referência à … Mediação Imobiliária, Lda. (artº 21º);
- Que a Predial (…) foi procurada pelo R., e não pelos AA., para localizar prédio com as características e requisitos que lhe foram indicados pelo R. (artº 22º);
- Que foi a Predial (…) que procurou os promitentes vendedores em nome do R. (artº 23º);
- Que toda a correspondência e notificações dirigidas pelos promitentes vendedores ao R. têm-lhe sido entregues (artº 24º);
- Que os promitentes vendedores assumiram, como exigência formal, pelo facto do prédio até à escritura, ter de continuar em seu nome, assinar, e assinaram, todos os requerimentos que lhes foram trazidos pelo R., destinados ao processo de construção, a aprovar e licenciar pelo Município de (…), por exclusiva incumbência e encargo do R. (artºs 25º, 26º e 27º do articulado)”.

Não deve proceder-se à reapreciação da decisão sobre a matéria de facto quando a pretensão se revele inútil, qualquer que seja a solução de direito, e isto por via da proibição da prática de actos inúteis no processo constante do artigo 130º do CPC, e não há que proceder à mesma reapreciação senão para factos, mas não para conclusões e muito menos conclusões de direito, cujo lugar não é na decisão da matéria de facto, como resulta do artigo 607º do CPC.

Assim, aditar que “foi atempadamente feita a prova pelos promitentes vendedores, de harmonia com o contrato, da legal exclusão do domínio público marítimo relativamente ao prédio prometido vender” é uma conclusão e mais é patentemente desnecessário em vista do teor do contrato e do facto provado nº 5, donde esta conclusão se pode retirar.

Quanto a que “as dúvidas levantadas pelo Município de (…) a esse respeito, não tinham razão de ser e estavam ultrapassadas (V. doc. de fls. 135)”, estamos no mesmo domínio, da prova do cumprimento tempestivo da obrigação dos promitentes vendedores, já feita, e estamos em todo o caso a ver uma versão que contraria quanto o réu disse na sua contestação, nos artigos 80 a 85, pelo que também nunca se poderia dar esta matéria por provada por acordo nos articulados, o qual não se produz autonomamente a partir da necessidade de contestação ao articulado do interveniente, em desconsideração de tudo o que já consta da primitiva contestação.

Quanto a que “a aprovação do projecto e obtenção da respectiva licença, no Município de (…), cabia ao R. providenciar e obter, de harmonia com o convencionado no contrato-promessa”, pois isto em rigor não é um facto, mas uma conclusão que se extrai da análise do contrato, dado como provado no facto nº 1 e em face da cláusula 9ª do mesmo, e portanto não deve ser aditado.

Relativamente a que “o R., vem ele próprio procedendo a operações de movimentação de terras na parte rústica do prédio prometido vender (artº 14º do articulado fls. 131vº)” repare-se que, em rigor, o que o interveniente fez, já de posse do conhecimento dos termos da contestação, foi nega-los e contraditá-los com nova versão. Ora, o réu afirmou que o depósito de terra e entulho tinha alterado completamente a orografia, que, e aqui por palavras nossas, seria preciso gastar milhões para remover os detritos e seriam precisos anos para o fazer, e que isto era obrigação dos vendedores, e que ele vinha insistindo com eles para o fazerem ou em alternativa queria a redução do preço ou queria comprar apenas as partes não afectadas pelo depósito dos detritos. O interveniente veio pois dizer que não tinham de ser os promitentes vendedores a fazê-lo, porque o depósito fora feito imperativamente pelo governo regional, e que se alguém se podia ter oposto, e não o fez, a esse depósito, era o réu que tinha a posse, não formal, mas de facto, do prédio. Portanto, o interveniente diz que, para a defesa que o réu fez de que foram os promitentes vendedores que não cumpriram e por isso não podem pedir a resolução do contrato, que essa defesa não tem fundamento. E, no mesmo sentido funcional, digamos, vai o facto seguinte, de que “estando o R. na plena posse de todo o imóvel, incluindo a parte rústica, só ele poderia ter impedido o despejo de terras no prédio em causa, pelo Governo Regional, e o R. consentiu-o, sem o conhecimento ou autorização dos promitentes vendedores (artºs 15º, 16º e 17º do articulado)”.

Quanto a estes dois factos pretendidos aditar, não só temos provado que o réu, após o contrato promessa, mudou as fechaduras e vedou o acesso dos promitentes vendedores ao prédio, o que torna desnecessário o aditamento, porque o tribunal pode retirar a mesma conclusão (de que a única possibilidade de oposição ao depósito era do réu), como se revela absolutamente desinteressante saber se a movimentação feita pelo réu também alterou a orografia, porque os recorrentes não pretendem retirar nenhum efeito jurídico, não formulam nenhum pedido onde esta movimentação pudesse actuar como facto a subsumir a direito para obter a consequência do pedido. 

Em suma, não deve reapreciar-se a decisão quanto a estes dois pontos.

Relativamente a que “a morada do R. para efeito de notificações foi escolhida por ele com referência à … Mediação Imobiliária, Lda. (artº 21º); (…) a Predial (…) foi procurada pelo R., e não pelos AA., para localizar prédio com as características e requisitos que lhe foram indicados pelo R. (artº 22º); (…) foi a Predial (…) que procurou os promitentes vendedores em nome do R. (artº 23º); (…) toda a correspondência e notificações dirigidas pelos promitentes vendedores ao R. têm-lhe sido entregues (artº 24º)”, não temos aqui efeito cominatório, confessório, porque o réu, na contestação primitiva declara exactamente o contrário – a morada da Rua (…) foi apenas para marcação de escritura, não corresponde a um domicílio convencionado, não sabe quem é a Predial, nem o Sr. D… que nunca foi seu procurador, e nunca recebeu nenhuma das cartas que a autora e os intervenientes afirmam ter-lhe mandado ao cuidado do dito senhor e da dita Predial. Ou seja, não podemos afirmar que estes factos estão confessados por falta de contestação.

Finalmente, quanto a que “os promitentes vendedores assumiram, como exigência formal, pelo facto do prédio até à escritura, ter de continuar em seu nome, assinar, e assinaram, todos os requerimentos que lhes foram trazidos pelo R., destinados ao processo de construção, a aprovar e licenciar pelo Município de (…), por exclusiva incumbência e encargo do R. (artºs 25º, 26º e 27º do articulado)”, também não vemos que este facto tenha qualquer interesse, na medida em que rebate a tese do Réu, que a sentença não tomou de modo algum em consideração.

Para nos centrarmos: - o recurso serve a impugnar a decisão recorrida e os seus fundamentos, justamente demonstrando que esses fundamentos não estão correctos. No caso concreto, tirando a fundamentação de direito e as considerações doutrinais nela vertidas, e com o maior respeito pelo tribunal recorrido, o discurso que a sentença fez foi, linearmente, só isto: - nem pelo provado nem simplesmente pelo alegado não provado, os autores conseguem demonstrar que ocorreu incumprimento definitivo, antes apenas ocorreu mora, e os autores não conseguem demonstrar, pelos termos das cartas e da notificação judicial avulsa que mandaram ao réu, que lhe fixaram prazo final com admonição para ele, durante esse prazo e sem mais hipóteses, por termo à mora, celebrando o contrato prometido, sob pena de não o fazendo incorrer em incumprimento definitivo. E isto porque, para o tribunal recorrido, o aditamento ao contrato promessa (onde os termos desta interpelação admonitória constavam) não vincula o réu, que não o assinou. Então, lidas as cartas, e em cada carta se relatando o que já anteriormente fora dito, os autores “apenas” insistem na entrega do prédio, mas não fixam prazo para cumprimento (não se podendo pressupor que já o haviam feito, porque “não vale” o aditamento). É este, linearmente e com o devido respeito, o essencial da fundamentação. Note-se que, para este raciocínio fundamentador não releva saber, em concreto, se o réu recebeu ou não as cartas, se tinha procurador ou representante, a questão é que o teor das cartas em si não traduz uma interpelação admonitória.

A isto podem os recorrentes opor, como opõem, que não é preciso interpelação admonitória porque já se revela com clareza e sem dúvida, da contestação, da notificação judicial que o réu lhes fez, que ele não tem intenção de cumprir.

A isto opõem ainda os recorrentes que o contrato promessa, em todo o caso, não produzia efeitos na medida em que logo nos primeiros quinze dias o réu não pagou, afinal, a totalidade do sinal que se havia comprometido.

O réu, recorrido, não contra-alegou e perdeu por isso a oportunidade de levar o tribunal de recurso, em ampliação do objecto do recurso, a conhecer das questões que o tribunal recorrido não conheceu, como seja precisamente a questão de saber se os vendedores se obrigaram a conseguir o licenciamento da obra dele, se não cumpriram tempestivamente a obtenção da prova de exclusão do domínio público marítimo, se, sendo possuidores, não impediram que o governo regional depositasse entulho no prédio, e se a retirada deste entulho é por isso obrigação deles, e se eles não cumpriram estas obrigações mas o réu até os notificou para o fazerem porque ainda assim continua a ter interesse na conclusão do negócio.

Portanto, para este tribunal de recurso, o que temos de saber é se, como a sentença recorrida afirma, não se demonstra, nem pelo provado nem pelo alegado, a interpelação admonitória, se no entendimento da falta de alegação devia ter havido convite ao aperfeiçoamento, ou se essa interpelação admonitória é dispensável no caso concreto.

Com o exposto, pretendemos reforçar os argumentos já acima usados para dizer que não há que reapreciar parte da decisão sobre a matéria de facto e que parte do que é pedido reapreciar não pode ser reapreciado, além de que não se verifica efeito cominatório, ou seja, em suma, que improcede totalmente a pretensão de aditar os mencionados pontos.

Todavia, entendemos que se deve aditar oficiosamente aos factos provados, porque assim resulta do acordo nos articulados, designadamente da conjugação dos artigos 30 a 33 da contestação do réu e dos artigos 16 e 17 do articulado do interveniente, que “Posteriormente à celebração do contrato promessa, em data não concretamente apurada, o Governo Regional da Madeira lançou enormes quantidades de terras no prédio objecto do mesmo contrato”.

3ª questão:
Como se sabe, o tribunal não está sujeito às alegações das partes em matéria de direito – artigo 5º nº 3 do CPC – e por isso, embora o réu não tenha invocado a inexistência de interpelação admonitória[4] – mas mais propriamente que ele mesmo não tinha perdido o interesse no negócio e que este era ainda possível, e que tinham sido os promitentes vendedores a não cumprir e que por isso não tinham direito a resolver o contrato – não se encontra aqui a apontada substituição feita pelo tribunal recorrido ao réu, fornecendo outra solução jurídica de defesa, até porque o tribunal teve de apreciar o segundo pedido formulado pelos autores – declare o réu incumpridor do contrato promessa e condene-o à entrega do prédio, com perda do sinal – e no âmbito da apreciação desse pedido impunha-se ao tribunal que ponderasse se esse incumprimento – aliás manifesto – era porém definitivo, e para tanto apurar impunha-se-lhe que ponderasse também os termos do contrato e da sua execução – saber se tinha sido fixado, desde logo, ou posteriormente, ainda que por mera advertência, um prazo peremptório para o cumprimento.   

Outra nota relevante é a questão do ónus de prova. Não está em causa toda a fundamentação jurídica da sentença recorrida que levou à procedência do primeiro pedido dos autores, isto é, do reconhecimento do seu direito de propriedade e consequentemente da perspectivação da acção como uma acção de reivindicação, perspectiva segundo a qual de facto aos autores bastava provar a propriedade e que terceiro a ocupava, e ao réu se impunha demonstrar que tinha título suficiente para essa ocupação, título que lhe permitia não entregar a coisa ao dono.

E, se a tanto se tivesse resumido o pedido dos autores, pois era mesmo ao réu que competia provar, no caso concreto, que ocupava ao abrigo de contrato promessa que se mantinha válido e eficaz, ou melhor dizendo, “pendente” de cumprimento. Assim, competiria ao réu demonstrar quanto alegou na contestação, ou seja, basicamente, que o contrato promessa ainda não tinha sido cumprido por causa imputável aos promitentes vendedores, que não haviam obtido licença de construção e que tinham permitido o depósito de terras ou entulhos, e que nunca tinha sido notificado pelos promitentes vendedores, devendo sê-lo para a Alemanha porque a imobiliária e o mencionado Sr. D… não o representavam nem tinha sido convencionado o domicílio na Madeira, donde não se poderia dizer que não tivesse ele comparecido repetidamente quando convocado para a compra e venda: - no fundo, que continuava à espera que os promitentes vendedores cumprissem as suas obrigações que eram condicionais à celebração da escritura definitiva de compra e venda.

Acontece porém que o segundo pedido deduzido pelos Autores – declare incumprido o contrato promessa e condene na perda do sinal – implica, nos termos do artigo 342º nº 1 do Código Civil, a prova dos factos constitutivos do direito, a saber das vicissitudes da execução do contrato promessa que integram o incumprimento e geram a consequência da perda do sinal, ou seja, basicamente, contratámos que a escritura se faria até tal data, cumprimos a nossa parte, convocámos o comprador e ele não compareceu para cumprir a dele (outorgar a escritura definitiva e pagar).

Portanto, sendo verdade que na acção de reivindicação, a prova da legitimidade da ocupação pelo demandado pertence a este, regra que vale em termos gerais, já porém, quando o título de ocupação é o contrato-promessa de compra e venda e os promitentes vendedores se querem prevalecer de todos os seus efeitos, designadamente sancionatórios (finalidade do sinal) o ónus de prova reverte-lhes.

Prosseguindo:
Defendem os recorrentes que era razão suficiente para a procedência da acção a aplicação da cláusula 10ª do contrato promessa, em vista do facto provado de que o promitente-comprador apenas transferiu €200.000,00 em vez dos acordados €300.000,00.

Não parece que assim seja. Sem dúvida a cláusula 9ª estabelece que a não transferência dos trezentos mil euros no prazo de quinze dias produz de modo automático a não produção de quaisquer efeitos do contrato, que se terá por resolvido, ficando os promitentes-vendedores desvinculados do promitente-comprador e livres para venderem o prédio a outro interessado.

Mas, tendo sido transferidos €200.000,00, os promitentes-vendedores não se fizeram valer desta cláusula, pelo contrário, prosseguiram no cumprimento da sua própria obrigação que era condição do negócio, a de obterem a prova de exclusão do domínio público marítimo, e prosseguiram nas comunicações que visavam a marcação e outorga do contrato definitivo.
Ou seja, renunciaram à invocação da cláusula.

Mesmo que assim não se entenda, então tacitamente, nessas comunicações posteriores que fizeram, acabaram por aceitar que o valor do sinal se reduzisse para €200.000,00.

Se pensarmos que, na conjugação dos termos dos artigos 875º e 410º nº 3, ambos do Código Civil, o contrato promessa está sujeito a forma escrita, com assinaturas reconhecidas, o que aliás foi cumprido, teremos de aplicar o disposto no artigo 221º nº 2 do Código Civil, segundo o qual “As estipulações posteriores ao documento só estão sujeitas à forma legal prescrita para a declaração se as razões da exigência especial da lei lhes forem aplicáveis”, o que não é o caso pois na verdade a solenidade legalmente exigida tem implicação com a importância do negócio por referência à importância do direito, digamos, para completa consciencialização das partes dos efeitos do seu compromisso, e está sobretudo ligada à segurança do comércio jurídico sobre bens tradicionalmente considerados os mais relevantes, mas não propriamente aos termos em que concretamente se processa o pagamento. Sendo o preço um elemento fundamental no contrato de compra e venda, já a forma de pagamento interessa apenas às partes e muitas vezes apenas como estratégia de negócio, e nem o contrato promessa é um contrato necessário em face do contrato de compra e venda, nem o sinal é um elemento essencial do contrato promessa, como resulta da primeira parte do artigo 440º do Código Civil, e por maioria de razão, o valor concreto do sinal também não é um elemento essencial, e por essencial, neste contexto, designamos a qualidade que justifica que as mesmas exigências de forma (escrita) lhe sejam aplicáveis. 

Admitimos portanto que não sendo aplicáveis as mesmas exigências de forma, se pode tacitamente – isto é, deduzindo de comportamentos que toda a probabilidade o revelem – alterar o valor de sinal fixado para, como no caso, menos do que o constante do contrato promessa.

Improcede pois esta linha de argumentação do recurso.

Resulta da conduta dos autores a interpelação admonitória?

Desde logo, nada a apontar à sentença recorrida quando considera que o aditamento ao contrato promessa, datado de 6 de Março de 2012, não vincula o réu, precisamente em função do citado artigo 221º nº 2 do Código Civil. É que realmente o documento em causa não está assinado pelo réu e a autora esclareceu nos autos que não o estava mas que correspondia ao que tinha sido acordado entre as partes e era em benefício do réu (porque lhe concedia prazo adicional, depois dos incumprimentos já verificados), só que isso (acordo) não ficou provado nem veio impugnada essa não prova, e em todo o caso o referido artigo tem mesmo aplicação, porque estamos a falar dum elemento essencial do contrato – até quando (e quais as consequências) nos vinculamos e que tipo de atitude temos de tomar quando chegarmos a essa data.

Se no caso anterior falamos do valor (mais ou menos) do sinal/antecipação de cumprimento/parte do preço, sendo que o que é verdadeiramente relevante é o preço total pelo pagamento do qual transferimos a propriedade dum bem imóvel, neste caso do prazo as exigências de segurança sobre a situação dos imóveis, até para com terceiros que possam vir a entrar em negociações com os promitentes vendedores, já o remetem para a cobertura da aplicação das mesmas exigências legais que determinam a forma escrita no que toca às estipulações posteriores, sendo de notar que é bem diversa a vinculação de alguém a vender sem lhe ser particularmente interessante o prazo em que o faz, ou seja, admitindo, em termos práticos, que haja necessidade de flexibilizar datas de celebração para acomodar vicissitudes diversas mas que não impedem o negócio ou não revelam, essencialmente, o desinteresse ou a não vontade de o celebrar, da vinculação de alguém para quem, pelas mais diversas razões, quer subjectivas quer objectivas, o prazo marca mesmo o tempo pelo qual aceita vincular-se, obrigar-se, findo o qual pretende mesmo retomar a sua liberdade negocial, e que no desiderato desta retoma se não compadece nem com desculpas, nem com azares, nem com a necessidade de fazer mais qualquer comunicação, nem com prolongadas demandas. 

Só para exemplificar, no estado corrente do negócio imobiliário, não fixar um prazo peremptório e curto para a venda dum imóvel, imaginemos em Lisboa, significa perder uma enorme quantidade de outros interessados mais prontos e aptos a comprar e em termos práticos, arrastar por anos uma discussão em tribunal sobre a natureza do prazo significa arcar com o risco da “onda alta do negócio imobiliário” passar. E para um comprador, no mesmo exemplo, a fixação dum prazo peremptório significa uma maior responsabilidade na vinculação, ter a certeza que tem ou vai conseguir os meios para comprar, e significa muito possivelmente que qualquer contratempo que tiver se resolve na perda da oportunidade de comprar o imóvel por aquele preço (ou seja, sujeitar-se à procurar de novo no mercado e a ter de pagar mais).
Com este exemplo espera-se demonstrar porque razão, de facto, a fixação do prazo e os termos dessa fixação (prazo peremptório ou não) são altamente relevantes para os termos da vinculação mútua e por isso, tal como para o contrato inicial, alterações da natureza do prazo neste sentido (de fixação de prazo peremptório) cabem sobre a aplicação das mesmas exigências.

Em suma, concorda-se com a sentença recorrida quando afirma que o aditamento ao contrato promessa não vincula o réu.

E, comparando-se os termos do contrato (cláusula 4ª: “A escritura definitiva será outorgada no prazo de seis meses a contar de hoje, podendo qualquer das partes notificar a outra para esse efeito, pelo envio de carta registada e aviso de recepção com a antecedência mínima de trinta dias para as seguintes moradas…”) e os termos do aditamento ao contrato (desde logo intitulado Prorrogação, que depois de mencionar o adiamento de 60 dias pedido pelo réu para cumprir integralmente, refere no seu artigo 2º “O pagamento da totalidade do preço e dos respectivos juros moratórios, será pago contra a outorga da escritura definitiva de compra e venda, findo o qual não haverá mais prorrogações contratuais desencadeando-se, em caso de incumprimento por parte do promitente comprador as consequências contratualmente acordadas de restituição automática e imediata da posse do imóvel aos promitentes vendedores, com perda total do sinal prestado e sem direito a indemnização por obras realizadas no imóvel objecto do contrato, dando, assim, as partes mutuamente por pagos do que eventualmente haveriam de receber”, já se percebe que o prazo fixado inicialmente não o foi peremptoriamente, nem mesmo há a simples menção a prazo máximo, ou seja, que é meramente indicativo e que admite prorrogações – aliás, em total coerência, desde logo, com a sua extensão a beneficio dos promitentes vendedores pela fixação do prazo de dois anos para poderem obter a prova da exclusão do domínio público marítimo – e que no aditamento sim, já se podia afirmar que se fixava um prazo findo o qual, sem cumprimento e sem necessidade de mais diligências, as partes considerariam definitivamente incumprido o contrato e operariam automaticamente as consequências de restituição, perda do sinal e perda do valor das obras realizadas pelo promitente comprador no imóvel.

Ora, dos factos provados, mais concretamente, 12 e 14 e mesmo 16, em todos encontramos um relato de não comparência e incumprimento em datas sucessivamente marcadas e, no documento nº 5 com a petição inicial, transcrito no facto 14, assume-se precisamente que o prazo inicialmente fixado podia ser prorrogado (“E a última prorrogação só foi feita ao promitente-comprador após os promitentes vendedores, durante a mora, terem concedido variadas vezes um prazo razoável ao promitente comprador para cumprir e, mesmo assim, este culposamente não cumpriu”), e que o aditamento ao contrato promessa era justamente a fixação do prazo como peremptório: - “Não obstante a última prorrogação, que é uma verdadeira e real interpelação admonitória, com fixação de prazo de intimação para o promitente-comprador cumprir o contrato, a verdade é que o promitente comprador não cumpriu o contrato, porque não pagou o preço, nem marcou a escritura, nem entregou o imóvel aos promitentes vendedores, gerando-se incumprimento culposo que lhe é imputável de modo exclusivo”.

Se, literalmente, em nenhuma das cartas mandadas ao réu posteriormente ao aditamento/prorrogação consta expressamente a concessão de novo prazo com fixação da sua essencialidade, podemos concluir como na sentença ou podemos concluir como os recorrentes que a conduta mantida pode ser interpretada como interpelação admonitória?

Ora, ainda que o aditamento ao contrato promessa não vincule o réu, a interpelação admonitória não é um contrato, não implica uma declaração bilateral, é-lhe irrelevante a reacção do destinatário, e não está sujeita a forma legal, ou seja, pode ser verbal (veja-se neste sentido o Ac. desta Relação de 27.3.2012, em cujo sumário se escreveu, no ponto II “Podendo a mora converter-se em incumprimento definitivo na sequência de uma interpelação/notificação admonitória ( cfr. artº 808º,nº1, do CC), ou intimação para o cumprimento, e dentro de um prazo/dilação razoável, nada obsta a que seja tal interpelação efectuada - pelo credor ao devedor - verbalmente, pois que a respectiva eficácia não está sujeita a qualquer forma legal”.

Como justamente se referiu na sentença recorrida, a interpelação admonitória serve ao credor – quando não se verifica a impossibilidade objectiva de cumprimento, a perda objectiva do interesse do credor ou a recusa de cumprimento por parte do devedor – cujo devedor se constituiu em mora a não ficar eternamente nela.

Discorreu a sentença e bem: “A mora subsiste enquanto a prestação não for efetuada ou se mantiver o interesse do credor na prestação. Perdido objetivamente o interesse na prestação ou não sendo esta realizada dentro do prazo razoavelmente fixado pelo credor, a obrigação considera-se como não cumprida, com todas as consequências daí emergentes (artigo 808°, n.° 1 do Código Civil). Na verdade, a perda do interesse do credor há-de resultar de uma apreciação meramente objetiva da situação, emergente da “natureza das coisas”. Verificando-se a perda de interesse do credor, a mora equivale, desde logo, ao não cumprimento definitivo da obrigação (ANTUNES VARELA, Das Obrigações em Geral, 4.” edição, 1990, pág. 119).

Noutras situações, pretendendo o credor converter, legitimamente, a mora no cumprimento[5] definitivo, a lei, como se viu, atribui-lhe o poder de fixar, ao devedor em mora, um prazo razoável para além do qual deixa de lhe interessar mais a prestação.

Na realidade, o credor não é obrigado a permanecer vinculado ad aeternum e apenas o não cumprimento definitivo legitima a resolução do contrato. Para esse efeito, o credor pode então interpelar o devedor, intimando-o a cumprir a prestação, dentro de um prazo razoável, fixado de acordo com as circunstâncias concretas do contrato a celebrar, com a advertência, muito clara, de que a falta da prestação, no prazo fixado, o fará incorrer no incumprimento definitivo da obrigação.

Trata-se, pois, da chamada interpelação admonitória ou interpelação cominatória, que visa conceder ao devedor uma derradeira possibilidade de manter o contrato, nas palavras expressivas de ANTUNES VARELA (Ibidem, pág. 119).
(…)”.

Ora, segundo a sentença “de nenhum dos referidos pontos da fundamentação de facto resulta que os autores tenham procedido: 1º à intimação do réu para o cumprimento; 2º fixação de um termo para o cumprimento; 3º à admonição ou cominação de que a obrigação se terá por definitivamente não cumprida se não for realizada no prazo concedido, ou seja, à fixação ao réu um prazo razoável para o cumprimento da prestação em falta, mediante a respectiva interpelação admonitória”.

Expressamente notificada para esclarecer a questão da assinatura do aditamento, como se relatou, a autora disse que o mesmo “foi, realmente, convencionado entre as partes e é favorável ao Réu, que, posteriormente, se ausentou para a Alemanha, sem que assinasse o referido documento”. Mais disse que “Tal documento foi elaborado no âmbito do princípio da cooperação das partes, e a pedido do réu (…)”.

E o que disse o réu a este respeito? Nos artigos 88º e 89º da contestação limitou-se a anotar que “Também como se verifica pelo documento que a parte entende como real interpelação admonitória, a verdade é que tal prorrogação não foi assinada pelo ora réu (…) e “Aliás como se verifica pelo documento junto pela A. como documento nº 3, o mesmo apenas está assinado pelos promitentes vendedores, não se mostrando assinado pelo promitente comprador”.

Ou seja, o réu não negou que tivesse havido uma marcação de escritura para a data referida em tal documento, não negou que os promitentes vendedores tivessem, relativamente a tal marcação, como levaram a escrito para ser assinado – e nem isto o réu nega – entendido e comunicado, mais que não seja verbalmente, que se tratava da última oportunidade, e que se ela se frustrasse, importaria, para eles, na resolução do contrato e na devolução do imóvel.
De resto, só em face desta não negação se compreende o facto provado nº 11: “11. O réu não compareceu no dia marcado para a escritura, a qual, por isso, não se realizou”.

Portanto, apesar do réu não o ter assinado, ele, necessariamente, tomou conhecimento da vontade dos promitentes vendedores que em tal documento se expressava, no sentido de que aquela prorrogação seria a última, que o prazo prorrogado era de 60 dias, que já ficava marcada a data da escritura para 6 de Maio de 2012, e que se o réu não comparecesse a outorgar, seriam automática e imediatamente restituídos à posse do imóvel, com perda total do sinal e sem que o réu tivesse direito a indemnização pelas obras que tivesse feito.

Assim, ainda que de modo verbal, o réu tomou conhecimento da vontade dos recorrentes em, naquela data, aceder a mais um pedido de prorrogação, mas ser a última vez que o faziam, constituindo esses 60 dias e a data de 6.5.2012 a derradeira oportunidade para o promitente comprador outorgar a escritura definitiva de compra e venda.

Considerando a data de celebração do contrato promessa, a data da sentença (2009) que homologou a transacção relativa à exclusão do prédio do domínio público marítimo, que era a condição que os promitentes compradores deviam obter, que desde 2009 a 2012 já haviam passado cerca de três anos, considerando outrossim que não é verdade, segundo o contrato, que aos promitentes vendedores incumbisse obterem a licença de construção e que o réu nisto não se podia ter enganado, precisamente porque o contrato foi celebrado com a intervenção de um tradutor, entende-se que é possível concluir que o prazo de sessenta dias fixados se afigura como perfeitamente razoável e que portanto nos encontramos face a uma interpelação admonitória válida que o réu, ainda assim, incumpriu.

De resto, com o devido respeito, resulta claro da contestação que o réu, nas exactas condições constantes do contrato promessa, não tem intenção de cumprir. Já para não falar da imputação da violação do dever acessório dos promitentes vendedores de obterem o licenciamento, que não se encontra nem deduz de nenhuma cláusula contratual e cuja justificação (desconhecimento da língua) é completamente descabida em face do intérprete mencionado no contrato, da alegação de perda de financiamento para os projectos que tinha, a questão do lançamento de terras que segundo o réu custam milhões a remover e demoram anos a remover, e que ele insiste serem da responsabilidade dos autores – porque segundo ele só eles, possuidores, podiam ter impedido o lançamento, o que, se pode ser verdade em termos jurídicos, em termos duma oposição jurídica e judicial, já não é verdade em termos de simples oposição material, em vista de ser ter provado que o réu mudou as fechaduras e impediu o acesso dos promitentes vendedores ao prédio – acompanhada do lamento de não aceitação das propostas de compra de apenas parte do prédio ou de redução do preço, revela claramente que o réu não tem intenção de cumprir o contrato nos seus precisos termos, designadamente, nem que os promitentes vendedores lhe fixem novo prazo razoável, ele irá comparecer para simplesmente outorgar e pagar o remanescente do preço.

Torna-se assim evidente, parece-nos, que a interpelação admonitória, mesmo que se entendesse que não tinha sido feita, é totalmente dispensável.

Por último, quanto ao direito de exigir a contraprestação, isto é, o direito do réu de exigir dos autores que outorguem no contrato definitivo, direito que ele formalmente continua a declarar pretender exercer, quanto a esse direito e na situação concreta dos autos, perante um contrato promessa celebrado em 2007, pronto a celebrar, da parte dos promitentes vendedores, em 2009, não celebrado até ao dia de hoje, 12 anos passados, e que se antevê que não será celebrado durante os muitos mais anos que sejam precisos para remover as terras, com uma patente desactualização do preço acordado e de facto subsistindo esse direito por via do pagamento de um sinal de apenas duzentos mil euros, excede manifestamente o fim social e económico do direito, na medida em que redunda numa privação desproporcionada dos réditos que os proprietários do prédio haveriam de auferir por ele, constituindo pois um abuso de direito, nos termos do artigo 334º do Código Civil.

Deste modo, entendemos que, quer por via da interpelação admonitória levada verbalmente ao conhecimento do réu por ocasião do aditamento/prorrogação ao contrato promessa, quer via de ser claro que o promitente-comprador não tem intenção de cumprir, quer ainda por abuso de direito, o contrato promessa se tem de considerar definitiva e culposamente incumprido por parte do réu.

Resulta assim, pelo incumprimento definitivo e culposo do réu, que cessa o título que legitimava a sua detenção da propriedade dos autores.

E resulta ainda, na conjugação do disposto no artigo 808º nº 1 com o artigo 442º nº 2, ambos do Código Civil, têm os promitentes vendedores, ora autores, o direito a fazer seu o valor do sinal prestado – duzentos mil euros.

Porém, ainda que nos termos gerais o devedor que falte culposamente ao cumprimento da obrigação se torne responsável pelo prejuízo que causa ao credor, nos termos do artigo 798º do Código Civil, e ainda que tenha ficado provado que os autores, por via da conduta do réu, se viram impedidos de vender o prédio a outrem que se viesse a mostrar interessado ou de o colocar no mercado de arrendamento, por aplicação do disposto no artigo 442º nº 4 do Código Civil, segundo o qual “Na ausência de estipulação em contrário, não há lugar, pelo não cumprimento do contrato, a qualquer outra indemnização, nos casos de perda do sinal ou de pagamento do dobro deste, ou do aumento do valor da coisa ou do direito à data do não cumprimento”, visto o teor do contrato promessa nada prever a este respeito, já não pode proceder o pedido formulado pelos autores de condenação do réu no ressarcimento de todos os prejuízos, danos e gastos que da sua ocupação ilegítima vem causando, a apurar em sede de liquidação de sentença.

Em suma, procede parcialmente o recurso, devendo revogar-se a sentença recorrida na parte em que absolveu o réu dos pedidos de declaração do réu como incumpridor no contrato promessa outorgado em 2007, da sua condenação à entrega imediata do mesmo prédio, completamente livre e desocupado de pessoas e bens, e de perda da quantia paga a título de sinal, no montante de € 200.000,00, a favor da autora e restantes proprietários e promitentes-vendedores, e ainda na parte em que condenou a autora e intervenientes e o réu em custas na proporção de 90% para os primeiros e 10% para o segundo, que, nessas partes, se substitui pelo presente acórdão que julga a acção parcialmente procedente por provada, e em consequência declara que o réu incorreu em incumprimento culposo e definitivo do contrato promessa celebrado com a autora e intervenientes a que se referem os autos, condena o réu a entregar o imóvel objecto do mesmo contrato e identificado no nº 2 dos factos provados, à autora e intervenientes, completamente livre e desocupado de pessoas e bens, e declara a perda do sinal de duzentos mil euros prestado pelo réu, a favor da autora e intervenientes, condenando, nos termos do artigo 527º nº 1 e 2 do CPC, ambas as partes nas custas, em primeira e segunda instâncias, que se fixam na proporção de 90% para o réu e 10% para a autora e intervenientes. No mais, mantém-se a sentença recorrida.

V.–Decisão

Nos termos supra expostos, acordam conceder provimento parcial ao recurso e em consequência:
I- Revogam a sentença recorrida na parte em que absolveu o réu dos pedidos de declaração do réu como incumpridor no contrato promessa outorgado em 2007, da sua condenação à entrega imediata do mesmo prédio, completamente livre e desocupado de pessoas e bens, e de perda da quantia paga a título de sinal, no montante de € 200.000,00, a favor da autora e restantes proprietários e promitentes-vendedores, e ainda na parte em que condenou a autora e intervenientes e o réu em custas na proporção de 90% para os primeiros e 10% para o segundo;
II- Substituem as partes ora revogadas pelo presente acórdão que julga a acção parcialmente procedente por provada, e em consequência:
A- declara que o réu incorreu em incumprimento culposo e definitivo do contrato promessa celebrado com a autora e intervenientes a que se referem os autos;
B- condena o réu a entregar o imóvel objecto do mesmo contrato e identificado no nº 2 dos factos provados, à autora e intervenientes, completamente livre e desocupado de pessoas e bens;
C- declara a perda do sinal de duzentos mil euros prestado pelo réu, a favor da autora e intervenientes;
D- condena ambas as partes nas custas, em primeira e segunda instâncias, fixando-as na proporção de 90% para o réu e 10% para a autora e intervenientes;
E- no mais, mantém-se a sentença recorrida.
Registe e notifique.



Lisboa, 04 de Julho de 2019



Eduardo Petersen Silva
Cristina Neves
Manuel Rodrigues



[1]A referência ao nº 1 constitui mero lapso, visto o teor do nº 1, devendo entender-se feita ao nº 3.
[2]A menção 2015 corresponde a mero lapso, pois como resulta do documento nº 4 com a petição inicial, que é transcrito, a data é 15 de Outubro de 2012.
[3]Conjugação dos artigos 144º nº 1, 132º nº 1, 221º nº 1 e 255º todos do CPC, e artigo 26º nº 1 da Portaria nº 280/2013, de 26 de Agosto, rectificada pela declaração de rectificação nº 44/2013, publicada no Diário da República, Iª série, nº 207, de 25 de Outubro de 2013 e alterada pela Portaria nº 170/2017, de 25 de Maio, rectificada pela declaração de rectificação nº 16/2017, publicada na primeira série do Diário da República nº 109, de 06 de Junho de 2017 e pela Portaria nº 267/2018, de 20 de Setembro.
[4]Apenas, ao discorrer em matéria de direito sobre o incumprimento definitivo e sobre o direito à resolução lhe faz uma referência, conforme artigos 95º e 96º da contestação.
[5]Deve ler-se “incumprimento”.