Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
9200/15.8T8LSB.L1-4
Relator: CELINA NÓBREGA
Descritores: ACÇÃO ESPECIAL DE IMPUGNAÇÃO JUDICIAL DA REGULARIDADE
LICITUDE DO DESPEDIMENTO
ERRO NA FORMA DO PROCESSO
ABANDONO DE TRABALHO
EXCEPÇÃO PEREMPTÓRIA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 04/26/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: ALTERADA A SENTENÇA
Sumário: 1 Faltando o trabalhador ao serviço, pelo menos, por dez dias úteis seguidos, sem que informe o empregador do motivo da sua ausência e desde que este não tenha ou não deva ter conhecimento do motivo da não comparência do trabalhador, funciona a presunção prevista no nº 2 do artigo 403º do CT.

2 Contudo, esta presunção pode ser ilidida nos termos do nº 4 do artigo 403º do CT, isto é, “mediante prova da ocorrência de motivo de força maior impeditivo da comunicação da ausência”, ou seja, o trabalhador tem de provar que ocorreu motivo de força maior que o impediu de comunicar ao empregador a sua ausência.

3 A acção especial de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento apenas se aplica aos casos de despedimento individual comunicados por escrito ao trabalhador, seja por facto que lhe seja imputável, seja por extinção do posto de trabalho, seja por inadaptação.

4 Não configura erro na forma do processo a circunstância de, no âmbito da acção de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento provar-se, na sequência de excepção invocada no articulado motivador, que o contrato de trabalho cessou por abandono do trabalho comunicado antes de proferida a decisão de despedimento.

(Sumário elaborado pela relatora)

Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa.


Relatório:


AAA, Director, morador na Rua (…), intentou a presente acção para impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento, apresentando o formulário a que aludem os artigos 98º- C e 98º-D do CPT, opondo-se ao despedimento que lhe foi movido por (…), S.A, com sede no (…) Lisboa, (actualmente BBB S.A.) e (…), S.A.(…), S.A., com sede na Avenida Dr. (…), pedindo que seja declarada a sua ilicitude ou irregularidade com as consequências legais.

Teve lugar a audiência de partes não se obtendo a sua conciliação.
Notificado o empregador nos termos da al.a) do nº 4 do artigo 98º-I do CPT para apresentar articulado para motivar o despedimento, veio fazê-lo invocando, em síntese, que:
Em 12 de Fevereiro de 2007 foi celebrado um contrato individual de trabalho entre o Réu e o Autor nos termos do qual este foi admitido para desempenhar a funções de Sub-Director no (…) Investimento;
Em 31 de Julho de 2008 por Acordo de Cedência Ocasional de Trabalhador, foi o Autor cedido ao Banco (…), com sede em (…), para aí desempenhar as funções de Director, sendo que esse contrato se iniciou em 1 de Outubro de 2008;
Por carta datada de 28 de Agosto de 2014, entregue em mão ao Autor, o Banco(…), S.A., ao abrigo da Cláusula Terceira do dito Acordo denunciou o contrato de cedência;
Findo o contrato de cedência o Autor não se apresentou no (…) em Lisboa, o que deveria ter feito em 29 de Setembro de 2014;
Apesar das tentativas para contactar o Autor, o que não conseguiu, o (…) em 21 de Outubro de 2014, enviou ao Autor carta solicitando que se apresentasse no local de trabalho em Lisboa com a maior urgência possível;
O Autor nunca se apresentou ao trabalho e nunca justificou a sua ausência, pelo que o (…), por carta de 13 de Novembro de 2014 que dirigiu ao Autor, invocou o abandono do trabalho nos termos do nº 3 do artigo 403º do CT, sendo que o Autor não ilidiu a presunção a que alude o nº 4 do referido artigo;
Ainda que considerasse cessado o contrato de trabalho, face à gravidade dos factos que constatou, não podia o empregador deixar de tomar uma posição sobre os mesmos, tendo, em 27 de Outubro de 2015 instaurado procedimento disciplinar ao Autor;
O Autor nunca pôs em causa que o contrato de trabalho cessou por abandono do trabalho e, por isso, o processo próprio para pôr em causa essa extinção do vínculo laboral é o processo comum e não o presente processo, verificando-se, assim, erro na forma de processo, devendo o (…) ser absolvido da instância; e
Ainda que assim não se entenda caducou o direito de acção do Autor posto que a decisão de despedimento chegou à sua residência no dia 22.1.2015, e não, como faz crer, em 17.03.2015.
Reafirmando os factos constantes da nota de culpa, concluiu o Réu (…) que o comportamento do trabalhador traduz uma clara violação dos deveres de respeito, urbanidade, de probidade, de lealdade e de boa fé, previstos nas al.a) e f) do nº 1 do artigo 128º e 126º do CT, como dos usos laborais, além de consubstanciarem crime de injúrias e de violação do segredo profissional, constituindo fundamento para despedimento com justa causa nos termos dos nºs 1 e 2 als. e), j) e g), do artigo 351º do CT.
Por fim, invocando que o Autor ocupa um cargo de direcção, o que face aos factos praticados impossibilita o seu regresso, requereu que o tribunal exclua a sua reintegração no Réu.
O Autor contestou invocando, em resumo, que:
Não recebeu a carta datada de 28/08/2014 e que o próprio Presidente do (…), Sr. Dr. (…), informou o Autor, no decurso do mês de Setembro, que tinha sido decidido manter em vigor o referido acordo de cedência, pelo que este acordo não foi “denunciado” pela referida carta;
Uma vez que se encontrava ao serviço do (…)  com o acordo de cedência em vigor, o Autor permaneceu em (…), como era seu dever contratual, logo, o facto de não ter comparecido nas instalações do (…) em Lisboa “em 29 de Setembro de 2014”, além de ser fisicamente impossível atenta a distância entre Lisboa e Macau, não constitui abandono do trabalho;
O Autor não estava incontactável e não recebeu a carta que o (…) alega ter-lhe enviado em 21 de Outubro de 2014, a qual foi enviada para a Rua (…), em (…), Portugal, apesar do (…) bem saber que, na altura, o Autor se encontrava em Macau, onde vivia com o seu agregado familiar, constituído pela mulher e duas filhas menores, que ali frequentavam a escola, sendo em Macau que o Autor tinha centradas todas as actividades inerentes à sua vida profissional, familiar e pessoal;
O Autor nunca abandonou o seu posto de trabalho, pelo que não tinha de justificar quaisquer faltas e só deixou de se apresentar ao trabalho quando foi impedido de entrar e permanecer nas instalações da sua entidade patronal;
A questão da extinção do vínculo laboral por “abandono do posto de trabalho/denúncia” carece de qualquer relevância jurídica, dado que, já depois de terem ocorrido os factos que o (…) qualifica como abandono do posto de trabalho com notificação ao trabalhador nos termos do disposto no nº. 3 do art. 403º do CT, este Banco instaurou ao A. um procedimento disciplinar, em cuja nota de culpa conclui ser sua intenção proceder ao despedimento do Autor, pelo que este processo especial é o aplicável e não o processo comum;
A carta do (…) datada de 9 de Janeiro de 2015 foi devolvida ao remetente, não tendo o Autor recebido tal carta nem a decisão final, tendo aquela sido enviada sob registo simples, sem aviso de recepção, além de ter sido endereçada para uma morada que não coincide exactamente com a morada do Autor, em (…);
O Autor só teve conhecimento da decisão final proferida no procedimento disciplinar em 17 de Março de 2015, data em que a advogada signatária lha enviou por e-mail, depois de, a seu pedido, a ter recebido, na mesma data e pela mesma via, do Senhor Instrutor do processo, pelo que não se verifica a alegada caducidade do direito de acção;

O procedimento disciplinar é inválido porque:
a)- o BBB, proferiu a decisão final de despedimento do Autor sem aguardar a defesa deste constante da sua resposta e tendo, na prática, impedido o A. de examinar e impugnar os documentos invocados na nota de culpa, que desconhece se estariam integrados no procedimento disciplinar;
b)- a decisão de despedimento foi proferida sem que fossem realizadas quaisquer diligências probatórias e nem sequer analisadas criticamente e valoradas quaisquer provas; e
c)- a instauração e a conclusão do procedimento disciplinar não foi notificada à Comissão de Trabalhadores, o que impediu esta entidade de proceder ao controle da legalidade do mesmo.

Por manifesta invalidade do procedimento disciplinar, deverá o despedimento do Autor ser declarado ilícito, com as inerentes consequências legais.
Quanto aos factos imputados ao Autor, o BBB limita-se a fazer afirmações vagas, não procedendo à descrição das circunstâncias essenciais relativas ao tempo, ao local e ao modo da ocorrência dos factos, fazendo referência a uma mensagem de correio electrónico que não é reproduzida, no todo ou em parte, na nota de culpa, nem dela faz parte integrante, nem nela é sequer dada como reproduzida, omissão factual que constitui nulidade insuprível que inquina o procedimento disciplinar e tem como consequência a nulidade do despedimento;
Nega os factos constantes da nota de culpa e enquanto “advisor to the board” no … o Autor cumpriu sempre a sua obrigação de alertar a hierarquia da sua entidade patronal relativamente a medidas que, no seu entender, afectariam negativamente o futuro do …, tal como recomendou a adopção das medidas para uma gestão sã e prudente, como obriga a lei bancária.
A remuneração base anual líquida do Autor foi fixada em 1.080.000,00 MOP (Patacas de Macau) a que corresponde o valor mensal de 90.000,00 MOP, desde 01.06.2008 (início da vigência do acordo de cedência ao …), a que corresponde o contravalor de 118.960,00 Euros, sendo o valor mensal de 9.913,33 Euros, acrescendo ao vencimento base os benefícios que identifica;
Ficou acordado entre o BBB e o …, no acordo de cedência do trabalhador, que o … suportaria metade da remuneração e demais benefícios e custos inerentes ao trabalhador;
Em 25 Maio de 2015 encontram-se em dívida créditos laborais, já vencidos, num total de 250.197,00 Euros que identifica, a que acresce a indemnização por antiguidade, contando-se esta desde 11.05.2005 conforme ficou estabelecido entre as partes no contrato de trabalho e devendo considerar-se o valor de 45 dias de retribuição por cada ano completo ou fracção de antiguidade; e
A instauração do processo disciplinar e as dificuldades criadas à sua defesa, deixaram o A. profundamente angustiado, desgostoso e com reflexos directos no seu estado de saúde, não se conforma com o facto de ter sido despedido e mais ainda, com o facto de o terem despedido sem lhe enviar uma cópia integral do procedimento disciplinar, como ele solicitara e sem oportunidade de se defender, constituindo uma mancha indelével no seu curriculum profissional, além de uma profunda humilhação, deixou de dormir, perdeu o apetite e saúde e passou a viver tremendamente angustiado com a injustiça de que foi vítima e em profundo stress quanto à incerteza do seu futuro, acentuando-se a angústia e perda de saúde quando a partir de 01/10/2014 deixou de receber o vencimento, pelo que deve ser indemnizado pelos danos não patrimoniais que lhe provocou o Réu.

Pediu, a final, que:
Sejam julgadas totalmente improcedentes as excepções deduzidas pelo BBB;
b)- Seja o procedimento disciplinar considerado inválido por não ter sido respeitado o direito do Autor a consultar o processo e a responder à nota de culpa; quando não,
c)- Seja o procedimento disciplinar considerado nulo por não constar da nota de culpa a descrição circunstanciada dos factos que são imputados ao A.; ou, quando não
d)- Seja considerado que os “factos” constantes da nota de culpa não consubstanciam fundamento para o despedimento; e
e)- Em qualquer dos casos, seja declarada a ilicitude do despedimento;

f)- Seja o Réu, BBB, condenado a pagar ao A. as seguintes quantias:
125.098,50€ (cento e vinte e cinco mil noventa e oito euros e cinquenta cêntimos) correspondente a metade dos 250.197,00€ de créditos laborais vencidos na presente data (25/05/2015);
127.000,00€ (cento e vinte sete mil euros) correspondente a metade de 254.000,00€ a título de indemnização por antiguidade - 60 dias de remuneração base por cada ano de antiguidade, em função do elevado grau de ilicitude e da exclusão da reintegração já requerida pela R. nos termos das disposições dos art. 391º nº 1 e 392º nº 3 do Código do Trabalho;
6.350,00€ (seis mil trezentos e cinquenta euros) correspondente a metade da compensação de 12.700,00€ de vencimento base + 1.377,00€ (mil trezentos e setenta e sete euros) correspondente a metade das despesas de alojamento de 2.754,00€ por cada mês que passe desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão que declare a ilicitude do despedimento;
juros vencidos e os vincendos até integral pagamento
150.000,00€ (cento e cinquenta mil euros) de danos não patrimoniais;

g)- metade das quantias, a liquidar em execução de sentença, correspondentes aos complementos salariais fixados na cláusula Quinta do doc. 2 que instrui o a.e.:
custos da viagem anual a Lisboa em classe executiva, por avião para o Autor e agregado familiar, relativa ao anos de 2014 e 2015;
transporte dos bens pessoais aquando do regresso definitivo a Portugal;
custos da viagem de regresso definitivo a Portugal do trabalhador e agregado familiar;
os encargos fiscais inerentes a remuneração e benefícios adicionais;

h)- custas e condigna procuradoria.
O Réu ainda respondeu invocando, em síntese, que a pretensão do Autor não pode proceder porque o contrato de trabalho cessou nos termos da al.h) do art.340º do CT, o direito de acção do Autor caducou, o procedimento disciplinar não enferma de qualquer vicio, sendo o despedimento regular e licito e que, caso assim não se entenda, desconhece a generalidade do que vem alegado nos artigos 86.º e seguintes da Contestação do Autor, não sendo responsável pelo pagamento de qualquer crédito perante o Autor, com excepção dos encargos decorrentes do Fundo de Pensões do … que os créditos laborais reclamados, a existirem, são devidos pelo (…), nos termos da Cláusula Quinta, que posteriormente, e se assim o entender, os facturará em 50% ao ora Réu, nos termos da Cláusula Sétima e que, atendendo ao elevado valor da sua retribuição e ao baixo grau de ilicitude, o tribunal deverá fixar a indemnização em 30 dias.
Conclui pedindo que seja declarado lícito o processo disciplinar e negado provimento à reconvenção
O Autor respondeu invocando que não deduziu excepção a nenhuma das matérias alegadas no articulado motivador do despedimento, limitando-se a deduzir a sua defesa por impugnação, pelo que deverá ser considerada inadmissível e consequentemente como não escrita a Réplica em tudo o que extravasar a resposta ao pedido reconvencional, ou seja, todo o alegado nos artigos 1º a 25º da Réplica, bem com deve considerar-se extemporânea e inadmissível a apresentação de documentos pelo Réu.
O Autor apresentou requerimento de desistência da instância relativamente ao (…), S.A. que foi indeferido.
Foi proferido despacho que absolveu a sociedade “(…), S.A.” da instância do qual foi interposto recurso, vindo tal despacho a ser confirmado por Decisão Sumária proferida pelo Exm.º Sr. Desembargador Leopoldo Soares, em 28.09.2015.
Dispensada a audiência preliminar, foi proferido despacho saneador que relegou para a decisão final o conhecimento da invocada nulidade do erro na forma do processo e a excepção da caducidade do direito de acção, abstendo-se o Tribunal a quo de enunciar os factos assentes e de fixar a base instrutória.

Procedeu-se ao julgamento com observância do legal formalismo.

Foi proferida a sentença que finalizou com o seguinte dispositivo:
“ Por tudo o que se deixou dito, nos termos das disposições legais citadas, declaro ilícito o despedimento do trabalhador e, em consequência, condeno a empregadora, “BBB, S.A.”:
a)- A pagar ao trabalhador uma indemnização correspondente a 20 dias de remuneração base e diuturnidades por cada ano completo ou fracção de antiguidade, esta reportada a 12/02/2007, acrescida de juros legais a partir do trânsito em julgado da presente sentença e até integral pagamento, a liquidar, se necessário, em execução de sentença;
b)- A pagar ao trabalhador as retribuições que deixou de auferir desde o trigésimo dia anterior ao da propositura da acção e até ao trânsito em julgado da presente sentença, aí se incluindo a retribuição das férias, subsídio de férias e subsídio de Natal, deduzidas das importâncias previstas nas alíneas a) e c) do nº 2 do art. 390º do CT, acrescidas de juros legais a partir da data do referido trânsito em julgado e até integral pagamento, a liquidar, se necessário, em execução de sentença;

c)- A pagar ao trabalhador 50% das seguintes retribuições:
€ 101.509,12 de remuneração base (12.688,64 x 8 meses - Outubro 2014 a Abril 2015);
€ 12.688,64 de férias vencidas em 01/01/2014;
€ 12.688,64 de subsídio de férias vencido em 01/01/2014;
€ 12.688,64 de subsídio de Natal de 2014;
€ 12.688,64 de férias vencidas em 01/01/2015;
€ 12.688,64 de subsídio de férias vencido em 01/01/2015;
€ 3.172,16 de 3/12 de férias do ano da cessação;
€ 3.172,16 de 3/12 do subsídio de férias do ano da cessação;
€ 3.172,16 de 3/12 do subsídio de Natal de 2015;
Juros de mora, à taxa legal, sobre as referidas quantias, a partir dos respectivos vencimentos e até integral pagamento;
d)- A pagar ao trabalhador a quantia de € 10.000,00, a título de indemnização por danos não patrimoniais, acrescida de juros legais a partir do trânsito em julgado da presente sentença e até integral pagamento.
*
Custas pela empregadora – art. 527º, nºs 1 e 2, do CPC.
*
Fixo à causa o valor de € 30.000,01 - art. 98º-P, nº 2, do CPT.
*
Registe e notifique.”
Inconformado, o Banco Réu interpôs recurso sintetizando as suas alegações nas conclusões seguintes:
(…)    

Finaliza pedindo que seja dado provimento ao recurso, assim se fazendo Justiça.   
 
O Autor contra-alegou e formulou as seguintes conclusões:
(…)
O recurso foi admitido na espécie, modo de subida e efeito adequados.
Subidos os autos a este Tribunal, a Exm.ª Srª Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer no sentido de ser dado provimento ao recurso e ser revogada a sentença recorrida.
Notificadas as partes do teor do mencionado parecer, respondeu o Autor por remissão para as suas contra-alegações e concluindo que não assiste razão ao Ministério Público, pelo que deverá ser proferido acórdão que, julgando improcedente o recurso, mantenha integralmente a sentença recorrida.

Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.

Objecto do recurso.
Sendo o âmbito do recurso limitado pelas questões suscitadas pelo recorrente nas conclusões das suas alegações (arts. 635º nº 4 e 639º do CPC, ex vi do nº 1 do artigo 87º do CPT), sem prejuízo da apreciação das questões que são de conhecimento oficioso (art.608º nº 2 do CPC), no presente recurso há que apreciar:
-Se deve ser alterada a decisão que recaiu sobre a matéria de facto.
- Se o contrato de trabalho cessou por abandono do trabalho e, em caso afirmativo, se o Tribunal a quo deveria ter julgado procedente a alegada excepção do erro na forma do processo.
- Se o tribunal a quo deveria ter julgado procedente a alegada excepção da caducidade do direito de acção do trabalhador.
- Se o Tribunal a quo errou ao considerar o despedimento do Autor ilícito por invalidade do procedimento disciplinar (se o Réu respeitou o prazo de defesa do Autor).
- Se existiam fundamentos para o despedimento com justa causa.
- Se a sentença deveria ter considerado nos cálculos que efectuou, para efeitos da indemnização, a remuneração mensal de €2.428,57.
- Se a sentença não deveria ter condenado o Réu no pagamento ao Autor de indemnização por danos não patrimoniais por estes não se terem provado e, a existirem, não serem imputáveis ao Réu.

Fundamentação de facto.

A sentença recorrida considerou provados os seguintes factos:
A) Em 12 de Fevereiro de 2007, foi celebrado entre o “…, S.A.” e o trabalhador o “Contrato Individual de Trabalho” cuja cópia consta de fls. 54 a 58 dos autos e que aqui se dá por integralmente reproduzida.
B) Nos termos do contrato, referido em A), o trabalhador foi admitido para desempenhar as funções de Sub Director no “…”.
C) Em 31 de Julho de 2008, foi celebrado entre o “…, S.A.”, o “…, S.A.” e o trabalhador, o “Acordo de Cedência Ocasional de Trabalhador”, cuja cópia consta de fls. 60 a 64 dos autos e que aqui se dá por integralmente reproduzida, através do qual o trabalhador foi cedido ao “…, S.A.”, com sede em Macau, para aí desempenhar as funções de Director.
D) Por carta datada de 28 de Agosto de 2014, cuja cópia consta de fls. 66 dos autos e que aqui se dá por integralmente reproduzida, o “…, S.A.”, denunciou o contrato de cedência, referido em C).

E)– Na carta, referida em D), era dito, além do mais:
“… O …, S. A. …, vem rescindir unilateralmente o contrato de cedência ocasional de trabalhador, celebrado no passado dia 31 de Julho de 2008…, nos termos e ao abrigo da sua cláusula nona.
A presente rescisão produzirá efeitos 30 dias após a data desta missiva, sendo eficaz a partir do dia 28 de Setembro de 2014”.
F)– A carta, referida em D), foi entregue em mão ao trabalhador em 28 de Agosto de 2014.
G)– Em 17/11/2014, o “…, S.A.” enviou ao trabalhador, registada e com aviso de recepção, para a morada …, Macau, a carta cuja cópia consta de fls. 3 e 4 do processo disciplinar apenso e que aqui se dá por integralmente reproduzida, datada de 13/11/2014, assinada pelo Director Central de Recursos Humanos, Sr. Dr. (…), e pelo Responsável do Departamento de Recursos Humanos, Sr. Dr. (…).

H)– A carta, referida em G), tinha o seguinte teor:
“(…)
Lisboa, 13 de Novembro de 2014
Exmo. Senhor,
1- A ausência de V. Exa. ao serviço, ininterruptamente, desde 24 de Setembro de 2014 até à presente data, sem qualquer comunicação que a justifique, subsume-se no disposto no art.° 403.° do Código do Trabalho.
2- Efectivamente, V. Exa. deixou de se apresentar ao serviço no …, SA. (entidade onde exercia funções ao abrigo de contrato de cedência ocasional), no dia 24 de Setembro de 2014, sem justificar as suas faltas.
3- Identicamente, cessado o acordo de cedência com efeitos a partir de 28 de Setembro, também sem qualquer justificação, não se apresentou ao serviço no …, nem justificou a correspondente ininterrupta falta. Verdadeiramente, não realizou qualquer contacto com esta instituição, entidade patronal de V. Exa., que foi totalmente ignorada.
4- Acresce, ainda, um quadro factual/circunstancial rico em indícios complementares de que V. Exa. abandonou o trabalho.
5- Face ao exposto, serve a presente, nos termos e para os efeitos do n.º 3 do art.º 403.° do Código do Trabalho, para comunicar a V. Exa. que consideramos ter-se verificado o abandono do trabalho.
6- Consequentemente, cessou o contrato de trabalho celebrado entre V. Exa e esta sociedade no passado dia 25 de Setembro de 2014.
7- Dirigimos a presente carta para a morada supra indicada, porque, ao que parece, é aquela onde actualmente residirá. Identicamente, enviámos segunda via desta carta para a morada de V. Exa. que consta dos nossos registos e que se manteve, sempre, inalterada. Ou seja, V. Exa. não procedeu, como lhe incumbia, à actualização da morada junto desta instituição. Desconhecemos qualquer outro paradeiro eventual de V. Exa ..
Com os nossos respeitosos cumprimentos,
(…)”.
I) O trabalhador recebeu a carta, referida em G), em 26/12/2014, conforme aviso de recepção de fls. 1 do processo disciplinar apenso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
J) Em 17/11/2014, o “…, S.A.” enviou ao trabalhador, registada e com aviso de recepção, para a morada …, a carta cuja cópia consta de fls. 10 e 11 do processo disciplinar apenso e que aqui se dá por integralmente reproduzida, datada de 13/11/2014, com o mesmo teor da carta referida em G).
K)– A carta, referida em J), foi devolvida ao remetente com a menção “Não Atendeu”.
L) Em 14/11/2014, o “…, S.A.” enviou ao trabalhador, registada e com aviso de recepção, para a morada …, Macau, a carta cuja cópia consta de fls. 18 do processo disciplinar apenso e que aqui se dá por integralmente reproduzida, datada de 13/11/2014, assinada pelo Director Central de Recursos Humanos, Sr. Dr. …, e pelo Responsável do Departamento de Recursos Humanos, Sr. Dr. ….
M) A carta, referida em L), tinha o seguinte teor:
“(…)
Lisboa, 13 de Novembro de 2014
ASSUNTO:Notificação da abertura de procedimento disciplinar/Nota de culpa
Exmo. Senhor,
1- Face aos actos recentemente praticados por V. Exa., foi decidido instaurar-lhe um procedimento disciplinar, cuja nota de culpa se junta.
2- A partir da presente notificação, V. Exa. dispõe de um prazo de 10 dias úteis para, querendo, apresentar a sua defesa por escrito e solicitar qualquer diligência probatória.
3- O processo encontra-se ao dispor de V. Exa, para consulta, no Departamento de Recursos Humanos do …, S.A., sito na Rua …, Lisboa.
Com os nossos respeitosos cumprimentos,
(…)”.

N)– Em 13/11/2014, foi elaborada a nota de culpa de fls. 19 a 25 do processo disciplinar apenso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, assinada pelo Director Central de Recursos Humanos, Sr. Dr. …, e pelo Responsável do Departamento de Recursos Humanos, Sr. Dr. ….
O)– A nota de culpa, referida em N), tem o seguinte teor:
 “(…)
Nota de Culpa
1- O trabalhador celebrou, em 12 de Fevereiro de 2007, um contrato individual de trabalho sem termo com o “…, SA.”.
2- Em 31 de Julho de 2008 foi celebrado “Acordo de Cedência Ocasional de Trabalhador” entre o “…, SA.”, o “…, S.A.” e ….
3- À data da celebração do referido acordo, o trabalhador integrava a categoria de Sub-Director, por contrato de trabalho sem termo celebrado com o “…, SA.”".
4- Nos termos do identificado acordo, o trabalhador deslocou-se para Macau, onde passou a desempenhar as suas funções junto do “…, S.A.”.
5- Tanto do contrato de trabalho, como do acordo de cedência, resulta a existência de deveres para o trabalhador, decorrentes quer dos artigos 126.º e 128.º do Código do Trabalho, quer da Cláusula 34.° do Acordo Colectivo de Trabalho do Sector Bancário.
6- O trabalhador, na perspectiva da entidade patronal, ignorou essas obrigações, violando-as grosseiramente: faltou culposamente ao cumprimento dos mais elementares deveres emergentes dos contratos supra identificados. O quadro factual que adiante se descreve, manifesta uma violação de deveres essenciais (elementares), pois que se prendem com a confiança e respeito que, inevitavelmente, alicerçam a relação laboral.

7- Os factos que motivaram o exercício do presente procedimento disciplinar são os que se passam a descrever:
a)- Facto ocorrido em 15 de Setembro de 2014
8- Em 15 de Setembro de 2014, o Trabalhador enviou uma mensagem de correio electrónica dirigida ao Sr. Dr. …, à data Presidente Executivo do “…, S.A.”.
9- Nessa mensagem, o Trabalhador/Arguido realizou - em moldes claramente desrespeitosos, maxime, olhando à posição hierárquica relativa de cada uma interlocutores - ao Dr. …, uma série de afirmações de carácter injurioso e depreciativo as suas qualidades de gestor. Imputa-lhe omissões e comissões falsas, na sua existência e nas suas, alegadamente, gravíssimas consequências. Ou seja, verdadeiramente, acusa o Sr. Dr. … de realizar uma gestão contrária aos interesses do … e das entidades por si dominadas (in casu, …). A competência profissional e honradez do Sr. Dr. … é colocada injuriosamente em causa pelas afirmações do Trabalhador/Arguido.
10- O Trabalhador/Arguido, identicamente, injuria em moldes análogos, a equipa de gestão do Sr. Dr. …: seriam todos inaptos, ineptos e incompetentes. Todos eles, estariam a destruir o … como que movidos por pérfidos desígnios.
11- A conduta do Trabalhador/Arguido consiste numa clara falta de respeito e urbanidade pela autoridade e pela disciplina. Consiste, ainda, numa gravíssima deslealdade para com os colegas e hierarquia.
12- O trabalhador ocorreu na violação do dever de respeito, urbanidade e probidade a que está obrigado, tanto por força do artigo 128.º, n.º 1, al. a) do Código do Trabalho, como dos usos laborais, conforme artigo 1.º do mesmo diploma.
13- A imputação de factos a uma pessoa, mesmo sob a forma de suspeita, e o uso de palavras ofensivas da honra e consideração, consubstanciam o crime de injúria, previsto e punido pelos artigos 181.º e 182.º do Código Penal.
14- O trabalhador agiu livremente e com culpa, sabendo que o seu comportamento era proibido por lei, criando um ambiente inóspito no seu local de trabalho, e deixando de ser pessoa merecedora da confiança dos seus colegas e dos seus superiores hierárquicos.
15- Os factos ora imputados ao trabalhador são graves, por si só e nas suas consequências que dele advieram e podem ainda advir, não sendo apenas inexigível como também impossível a manutenção do seu contrato de trabalho, consubstanciando justa causa de despedimento, nos termos do n.º l do artigo 351.º do Código do Trabalho.
16- A prática, no âmbito da empresa, de injúrias punidas por lei, sobre um elemento dos seus corpos sociais, constitui justa causa de despedimento, como vem previsto na alínea i) do n.º 2 do artigo 351.º do mesmo diploma.
b)Facto ocorrido em 17 de Setembro de 2014
17- No dia 17 de Setembro de 2014, o Trabalhador/Arguido reenviou a mesma mensagem electrónica, referida na alínea supra, para o Exmo. Sr. Presidente da República, para o Exmo. Sr. Primeiro-Ministro, para a Exma. Sra. Ministra de Estado e das Finanças e para o Exmo. Sr. Governador do Banco de Portugal.
18- Nessa mensagem, o trabalhador descreveu, com o detalhe que conhecia ou conjecturava, factos e imputações que apenas chegaram ao seu conhecimento devido à função que este desempenhava, nessa época, junto do “…, S.A.”.
19- Para além do facto de enunciar o que julgou serem erros de gestão, em substância e forma já supra analisados, dirigiu-os a pessoas que pelo seu relevo institucional e pela sua relação, identicamente institucional, com a entidade patronal, não deveria, desde logo, por ele serem endereçadas nos moldes em que o fez. Difamando a hierarquia, deprimindo-a perante os destinatários (Presidente da República, Primeiro Ministro, Ministra de Estado e das Finanças e Governador do Banco de Portugal).
20- O Arguido/Trabalhador, serviu-se, ainda, de informações sujeitas a sigilo profissional, divulgando a identidade de cliente do “…, S.A.”, do montante dos depósitos por estes detidos no banco, bem como de algumas das movimentações a débitos realizadas pelo cliente.
21- O comportamento descrito viola o dever de segredo profissional, a que o trabalhador está sujeito, previsto e punido pelo artigo 195.º do Código Penal, pelo artigo 78.º do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras e pela Cláusula 34.º, n.º 1, alínea c) do Acordo Colectivo de Trabalho do Sector Bancário.
22- O facto de os comportamentos descritos preencherem um ilícito penal, infla de uma maneira excepcional a sua gravidade, sendo completamente inconcebível e inexigível a qualquer empregador manter a relação laboral.
23- Mais uma vez, o trabalhador agiu de forma consciente e culposa, sabendo que o seu comportamento era proibido por lei e pelos usos da prática bancária, os quais eram do seu pleno conhecimento, atentando ao seu cargo e aos seus anos de trabalho na área da banca.
24- O trabalhador quebrou, de forma irremediável, ao divulgar informação privilegiada sobre a gestão do banco e dos seus clientes, a confiança que em si tinha sido depositada, não só pela administração do banco, como também pelos seus clientes: a base fundamental de toda a actividade bancária.
25- Nestes termos, o trabalhador violou culposamente e de forma grosseira o dever de lealdade e de boa-fé, aos quais está obrigado, constituindo fundamento para despedimento com justa causa, nos termos dos artigos 126.º, n.º 1 e 128.º, n.º 1, alínea f) conjugados com o artigo 351.º n.ºs 1 e 2 alínea e).
c) Facto ocorrido em 28 de Setembro de 2014
26- Em 28 de Agosto de 2014, o “…, SA.” procedeu à denúncia do acordo de cedência ocasional de trabalhador, enviando, para tanto, um pré-aviso, aos restantes outorgantes, entre os quais o trabalhador, como previa a Cláusula Nona do acordo.
27- O trabalhador deveria, no dia 28 de Setembro, ter-se apresentado nas instalações do “…, S.A.”, o que não fez.
28- Na realidade, o trabalhador nunca se chegou a apresentar ao serviço, nunca entrou em contacto com a sua entidade patronal e não respondeu a nenhuma das suas tentativas de contacto.
29- Situação, essa, que se verifica ainda presentemente. Ou seja, o Trabalhador encontra-se a faltar injustificadamente ao Trabalho desde 28 de Setembro de 2014; nunca prestou qualquer justificação, nunca contactou a sua hierarquia, nunca se dignou contactar ou mandar contactar o Departamento de Recursos Humanos.
30- Resulta da alínea g) do n.º 2 do artigo 351.º do Código do Trabalho, que as faltas não justificadas, cujo número atinja, em cada ano civil, cinco seguidas ou dez interpoladas, constituem justa causa de despedimento.

d) Síntese Final
31- O trabalhador praticou actos que, pela sua gravidade, pela sua irreversibilidade e pelos danos produzidos e os que podem ainda a vir ser causados, tanto à imagem das instituições envolvidas como dos seus órgãos de administração, tomam uma relação laboral insustentável e inexigível.
32- O próprio trabalhador assim parece reconhecê-lo, tanto que não voltou a comunicar com a sua entidade patronal, não regressou ao seu posto de trabalho, pura e simplesmente deixou de cumprir com o seu contrato de trabalho. Tudo indica que tenha ocorrido um abandono do posto de trabalho o que, a consolidar-se juridicamente, tomará, aparentemente, inútil o presente processo disciplinar.
33- Os factos descritos e imputados ao trabalhador têm como único resultado aceitável o seu despedimento com justa causa, intenção que desde já se manifesta, nos termos e para os efeitos do artigo 353.º do Código do Trabalho.
Termos em que dispõe V/ Exa. de um prazo de 10 (dez) dias úteis para, querendo, consultar o processo e responder à presente Nota de Culpa, deduzindo por escrito os elementos que considerar relevantes para esclarecer os factos e a sua participação nos mesmos, podendo juntar documentos e solicitar diligências probatórias que se mostrem pertinentes para o esclarecimento da verdade.
Lisboa, 13 de Novembro de 2014
(…)”.

P) O trabalhador recebeu a carta e a nota de culpa, referidas em L) e N), em 26/12/2014, conforme aviso de recepção de fls. 16 do processo disciplinar apenso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
Q) Em 14/11/2014, o “…, S.A.” enviou ao trabalhador, registada e com aviso de recepção, para a morada …, a carta cuja cópia consta de fls. 31 do processo disciplinar apenso e que aqui se dá por integralmente reproduzida, datada de 13/11/2014, com o mesmo teor da carta referida em L).
R)– A carta, referida em Q), foi devolvida ao remetente com a menção “Não Atendeu”.
S) O “…, S.A.” enviou ao trabalhador, registada e com aviso de recepção, para a morada Rua…, a carta cuja cópia consta de fls. 43 do processo disciplinar apenso e que aqui se dá por integralmente reproduzida, datada de 21/10/2014, com o seguinte teor:
“(…)
Lisboa, 21 de Outubro de 2014
ASSUNTO: Acordo de Cedência Ocasional de Trabalhador/ …, S.A./ Denúncia (rescisão)
Exmo. Senhor,
1- O … procedeu à rescisão do “Acordo de Cedência Ocasional de Trabalhador”, celebrado com V. Exa. e com esta instituição em 31 de Julho de
 2008 (vide carta em anexo).
2- A rescisão foi efectuada ao abrigo da cláusula 9.ª do indicado acordo e produziu efeitos no dia 28 de Setembro de 2014.
3- V. Exa. deveria ter-se apresentado ao trabalho no dia 29 de Setembro, nas nossas instalações o que, incompreensivelmente, não ocorreu. Ou seja, injustificadamente falta ao trabalho desde então.
4- Para que não existam dúvidas ou equívocos: V. Exa. deverá apresentar-se ao trabalho, nas instalações do …, em Lisboa, na Rua …, “…”,  com a maior urgência possível e manter-se-á em situação faltosa enquanto isso não ocorrer.
5- Informamos ainda que V. Exa. exercerá funções no Departamento de Project Finance e o seu superior hierárquico será o Exmo. Senhor Dr. ….
6- A remuneração de V. Exa. é a correspondente à média das remunerações do Banco para os colaboradores da sua categoria à data da saída que era e será a de Subdirector.
Com os nossos respeitosos cumprimentos,
(…)”.
T) A carta, referida em S), foi devolvida ao remetente com a menção “Não Atendeu”.
U) O trabalhador respondeu à nota de culpa, referida em N), nos termos expressos no articulado de fls. 47 a 49 do processo disciplinar apenso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, datado de 12/01/2015.
V)– A resposta à nota de culpa, referida em U), foi recebida pela empregadora em 26/01/2015, conforme carimbo aposto no rosto da mesma.
W) Em 09/01/2015, foi proferida a decisão final, que consta de fls. 55 a 59 do processo disciplinar apenso e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, assinada pelo Director Central de Recursos Humanos, Sr. Dr. …, e pelo Responsável do Departamento de Recursos Humanos, Sr. Dr. …, que aplicou ao trabalhador a sanção disciplinar de despedimento, alegando justa causa.

X)– A decisão final, referida em W), tem o seguinte teor:
“(…)
DECISÃO:
1- Foi V. Exa. informado, através de carta registada com aviso de recepção datada de 13 de Novembro de 2014, da abertura de processo disciplinar, enviada juntamente com a correspondente Nota de Culpa.
2- Nos termos e para os efeitos do artigo 355.° do Código do Trabalho, concedeu-se um prazo de dez dias úteis para que pudesse, querendo, “consultar o processo e responder à presente nota de culpa, deduzindo por escrito os elementos que considerar relevantes para esclarecer os factos e a sua participação nos mesmos, podendo juntar documentos e solicitar as diligências probatórias que se mostrem pertinentes para o esclarecimento da verdade”.
3- Findo o prazo legalmente estabelecido, concluiu-se que V. Exa. optou por não responder à Nota de Culpa, nem requerer quaisquer diligências probatórias.
4- Não foram igualmente juntos quaisquer documentos.

5- Deste modo, tendo unicamente por base a Nota de Culpa, dão-se como provados os seguintes factos:
I) O Arguido celebrou, em 12 de Fevereiro de 2007, um contrato individual de trabalho sem termo com o “…, SA.”;
II) Em 31 de Julho de 2008 foi celebrado “Acordo de Cedência Ocasional de Trabalhador” entre o “…, SA.”, o “…, SA.” e o Arguido;
III) À data da celebração do referido acordo, o Arguido integrava a categoria de Sub Director;
IV) Nos termos do identificado acordo, o Arguido deslocou-se para Macau, onde passou a desempenhar as suas funções junto do “…, SA.”;
V) Em 15 de Setembro de 2014, o Arguido enviou uma mensagem de correio electrónica dirigida ao Sr. Dr. …, à data Presidente Executivo do “…, SA.”;
VI) Nessa mensagem, o Arguido realizou afirmações de carácter injurioso e depreciativo às qualidades de gestor do Dr. … (dá-se como integralmente provado o conteúdo dessa mensagem);
VII) O Arguido imputou omissões e comissões falsas, na sua existência e nas suas, alegadamente, gravíssimas consequências, acusando o Sr. Dr. … de realizar uma gestão contrária aos interesses do … e das entidades por si dominadas (in casu, …);
VIII) A competência profissional e honradez do Sr. Dr. … foram colocadas injuriosamente em causa pelas afirmações do Arguido;
IX) O Arguido, identicamente, injuriou em moldes análogos a equipa de gestão do Sr. Dr. …;
X) No dia 17 de Setembro de 2014, o Arguido reenviou a mesma mensagem electrónica, para o Exmo. Sr. Presidente da República, para o Exmo. Sr. Primeiro-Ministro, para a Exma. Sra. Ministra de Estado e das Finanças e para o Exmo. Sr. Governador do Banco de Portugal (dá-se identicamente como integralmente provado o conteúdo dessa mensagem);
XI) O Arguido descreveu - com o detalhe que conhecia ou conjecturava – factos e imputações que apenas chegaram ao seu conhecimento devido à função que desempenhava, nessa época, junto do “…., SA.”;
XII) O Arguido enunciou o que julgou serem erros de gestão, dirigindo-os a pessoas que pelo seu relevo institucional e pela sua relação, identicamente institucional, com a entidade patronal, não deveria, desde logo, por ele serem endereçadas nos moldes em que o fez. O Arguido difamou a hierarquia, deprimindo-a perante os destinatários da mensagem (Presidente da República, Primeiro Ministro, Ministra de Estado e das Finanças e Governador do Banco de Portugal);
XIII) O Arguido serviu-se, ainda, de informações sujeitas a sigilo profissional, divulgando a identidade de cliente do “…, SA.”, do montante dos depósitos por estes detidos no banco, bem como de movimentações a débito realizadas pelo cliente;
XIV) Em 28 de Agosto de 2014, o “…, SA.” procedeu à denúncia do acordo de cedência ocasional de trabalhador, enviando, para tanto, um pré-aviso, aos restantes outorgantes, entre os quais o trabalhador, ora Arguido, como previa a Cláusula Nona do acordo;
XV) O Arguido deveria, no dia 28 de Setembro, ter-se apresentado nas instalações do “…, SA.”, o que não fez;
XVI) O Arguido nunca se chegou a apresentar ao serviço, nunca entrou em contacto com a sua entidade patronal e não respondeu a nenhuma das suas tentativas de contacto;
XVII) A 13 de Novembro de 2014, o Arguido encontrava-se a faltar injustificadamente ao trabalho desde 28 de Setembro de 2014, não prestando qualquer justificação, não contactando nem mandando contactar a sua hierarquia ou o Departamento de Recursos Humanos.
6- O Arguido agiu de forma livre e consciente, com culpa, sabendo que o seu comportamento, os seus actos e omissões eram proibidos por lei, e criando, com os seus colegas e superiores hierárquicos, um ambiente relacional humanamente insustentável, deixando de ser pessoa merecedora de confiança e credibilidade. Ao fazê-lo, o Arguido violou o dever de respeito, urbanidade e probidade a que estava obrigado por força dos artigos 1.º e 128.º, n.º 1, al a) do Código do Trabalho.
7- O Arguido imputou factos falsos a uma pessoa, ainda que sob a forma de suspeita, fazendo, igualmente, uso de palavras ofensivas da sua honra e consideração, o que consubstancia o crime de injúria, previsto e punido pelos artigos 181.º e 182.º do Código Penal. Ora a prática, no âmbito de uma empresa, de factos que constituam o crime de injúria sobre elementos dos seus corpos sociais, é motivadora de justa causa de despedimento, nos termos do artigo 351.º do Código do Trabalho.
8- Resulta ainda dos factos provados que o Arguido violou culposamente e de forma grosseira o dever de lealdade e de boa-fé, aos quais está obrigado, constituindo fundamento para despedimento com justa causa, nos termos dos artigos 126.º, n.º 1 e 128.º, n.º 1, alínea f) conjugados com o artigo 351.º n.ºs 1 e 2 alínea e).
9- Acresce provado, da mesma forma, o facto de o Arguido ter violado o dever de segredo profissional a que estava sujeito, previsto e punido pelo artigo 195.º do Código Penal, pelo artigo 78.º do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras e pela Cláusula 34.º, n.º 1, alínea c) do Acordo Colectivo de Trabalho do Sector Bancário.
10- Extrai-se ainda dos factos provados que o Arguido quebrou, de forma irremediável, ao divulgar informação privilegiada sobre a gestão do banco e dos seus clientes, a confiança que em si tinha sido depositada, não só pela administração do banco, como também pelos seus clientes: a base fundamental de toda a actividade bancária.
11- O facto de os comportamentos descritos preencherem ilícitos penais, infla de uma maneira excepcional a sua gravidade, sendo inexigível ao empregador manter a relação laboral.
12- Decide-se assim, nos termos dos artigos 328.° n.º 1 f) e 351.º do Código do  Trabalho, proceder ao despedimento sem indemnização ou compensação por se verificarem os requisitos do despedimento com justa causa.
Lisboa, 9 de Janeiro de 2015
(…)”.
Y) Em 12/01/2015, o “…, S.A.” enviou ao trabalhador, registada e com aviso de recepção, para a morada …, Macau, a carta cuja cópia consta de fls. 54 do processo disciplinar apenso e que aqui se dá por integralmente reproduzida, datada de 09/01/2015, assinada pelo Director Central de Recursos Humanos, Sr. Dr. …, e pelo Responsável do Departamento de Recursos Humanos, Sr. Dr. ….

Z) A carta, referida em Y), tinha o seguinte teor:
“(…)
Lisboa, 9 de janeiro de 2015
ASSUNTO: Decisão do procedimento disciplinar
Exmo. Senhor,
1- No seguimento do procedimento disciplinar instaurado contra V. Exa. e com base no artigo 357.º do Código do Trabalho, vimos pela presente comunicar-lhe que o … decidiu proceder ao seu despedimento com justa causa, nos termos e com os fundamentos da decisão que se junta.
2- Como é do conhecimento de V. Exa., o contrato de trabalho celebrado com o … Investimento cessou no passado dia 25 de Setembro de 2014, por abandono do trabalho.
3- Os efeitos úteis deste despedimento só se verificarão se V. Exa se apresentar ao serviço, justificando - de forma plausível - a sua prolongada ausência.
Com os nossos respeitosos cumprimentos,
(…)”.

AA) A carta, referida em Y), foi devolvida ao remetente com a menção “Não Reclamado”.
AB) O “… S.A.” enviou ao trabalhador, para a morada Rua …, a carta cuja cópia consta de fls. 67 dos autos e que aqui se dá por integralmente reproduzida, datada de 21/10/2014, a qual veio devolvida.
AC)– O trabalhador nunca se apresentou ao trabalho nas instalações da empregadora e nunca justificou a sua ausência.
AD) Em 15 de Setembro de 2014, o trabalhador enviou ao Sr. Dr. …, à data Presidente Executivo do “…, S.A.”, a mensagem de correio electrónico cuja cópia consta de fls. 634 e 635 dos autos e que aqui se dá por integralmente reproduzida.
AE)– No dia 17 de Setembro de 2014, o trabalhador reenviou a mensagem de correio electrónico, referida em AD), para o Sr. Presidente da República, para o Sr. Primeiro-Ministro, para a Sra. Ministra de Estado e das Finanças e para o Sr. Governador do Banco de Portugal.
AF) O acordo de cedência, referido em C), teve início em Junho de 2008.

AG)– A cláusula “Terceira” do acordo de cedência, referido em C), tem a seguinte redacção:
“O presente contrato tem início a partir da data de obtenção da autorização de residência e de trabalho e por um período de trinta e seis meses, não sendo denunciado com a antecedência de trinta dias, renova-se sucessivamente por períodos de três anos.”.
AH)– No início de Setembro de 2014, o “…, S.A.”, tinha em aberto a hipótese da manutenção do trabalhador em funções em Macau até Dezembro do mesmo ano.
AI)– Em reunião havida em 23 ou 24 de Setembro de 2014, foi comunicado, pelo “…, S.A.”, ao trabalhador que tinha deixado de ser ponderada a prorrogação da sua estadia em Macau.
AJ)– Na data do envio ao trabalhador da carta referida em AB), a empregadora sabia que o trabalhador se encontrava em Macau, onde vivia com o seu agregado familiar, constituído pela mulher e duas filhas menores, que ali frequentavam a escola, sendo em Macau que o trabalhador tinha centradas todas as actividades inerentes à sua vida profissional, familiar e pessoal.
AK)– O trabalhador só deixou de se apresentar ao trabalho em Macau quando foi impedido de entrar nas instalações do “…., S.A.”, em finais de Setembro de 2014.
AL)– O trabalhador, enquanto “advisor to the board” no …, cumpriu sempre a sua obrigação de alertar a hierarquia da sua entidade patronal relativamente a medidas que, no seu entender, afectariam negativamente o futuro do …, tal como recomendou a adopção das medidas para uma gestão sã e prudente.
AM) O trabalhador sempre se dirigiu a todas entidades com as quais se relacionou com respeito e urbanidade e nunca foi desleal para com os colegas, nem para com os superiores hierárquicos.
AN)– No ponto “Um” da cláusula “Quinta” do “ Acordo de Cedência Ocasional de Trabalhador”, referido em C), a remuneração anual líquida do trabalhador foi fixada em 1.080.000,00 MOP (Patacas de Macau).

AO) No ponto “Dois” da mesma cláusula “Quinta”, ficou estabelecido que o (…) suportaria os custos dos seguintes benefícios atribuídos ao trabalhador:
a)- Renda de casa e respectivas despesas de telefone, electricidade, água e gás até ao limite de 22.500,00 MOP;
b)- Um automóvel para uso em serviço e respectiva manutenção;
c)- Assistência médica e despesas de saúde;
d)- Custos de uma viagem anual de ida e volta a Portugal, em classe executiva, por avião, para o trabalhador e agregado familiar;
e)- Transporte dos bens pessoais aquando do regresso definitivo a Portugal;
f)- Custos da viagem de regresso definitivo a Portugal do trabalhador e agregado familiar;
g)- Os encargos fiscais inerentes a remuneração e benefícios adicionais.

AP) Desde Janeiro de 2014, a remuneração base mensal do trabalhador passou a ser de 110.900,00 MOP.
AQ)– Na cláusula “Sétima” do “Acordo de Cedência Ocasional de Trabalhador”, referido em C), ficou acordado entre o (…) e o (…) que o primeiro suportaria metade da remuneração e demais benefícios e custos inerentes ao trabalhador.
AR) O agregado familiar do trabalhador é composto por si, pela mulher e por duas filhas menores.
AS) O trabalhador tem a sua vida pessoal, familiar e profissional centrada em Macau desde o ano de 2008, data em que, em virtude do acordo de cedência referido em C), deixou de viver em Lisboa.
AT) O trabalhador estabeleceu em Macau o centro da sua vida pessoal e familiar unicamente em virtude de ter sido cedido ao (…).
AU) A instauração do processo disciplinar deixou o trabalhador angustiado.
AV) O trabalhador viu-se involuntariamente envolvido num processo interno de alterações profundas associadas ao …, ao …, ao … e ao ….
AW) O trabalhador deixou de dormir e perdeu o apetite.
AX) O trabalhador, a mulher e as duas filhas deixaram de viajar e deixaram de passar fins-de-semana de lazer na companhia de amigos.
AY) As menores têm sofrido com o ambiente de insegurança e tristeza em que vivem o trabalhador e a mulher.
AZ)– A sociedade “…, S.A.”, alterou a sua firma para “BBB, S.A.”, alteração essa levada ao registo comercial em 07/09/2015, como decorre do teor da certidão permanente junta aos autos a fls. 1173 a 1213, que aqui se dá por integralmente reproduzida.
*
Da alteração da decisão que recaiu sobre a matéria de facto.
Apreciemos, então, se, como pretende o Recorrente deve ser alterada a decisão que recaiu sobre a matéria de facto.
6- O facto provado em AL) deve ser considerado como não provado.
Para tanto invoca que as testemunhas que fundamentaram a decisão do Tribunal a quo (…), (…) e (…), não tinham conhecimento desta matéria.
Contrapõe o Recorrido que deve manter-se nos factos provados a matéria da al.AL), indicando como meios de prova o depoimento das mesmas testemunhas.

A alínea AL) dos factos provados tem a seguinte redacção:
AL)– O trabalhador, enquanto “advisor to the board” no (…), cumpriu sempre a sua obrigação de alertar a hierarquia da sua entidade patronal relativamente a medidas que, no seu entender, afectariam negativamente o futuro do (…), tal como recomendou a adopção das medidas para uma gestão sã e prudente.”

O Tribunal a quo assentou a sua convicção quanto a esta matéria dizendo:
“Os factos constantes da alínea AL) assentaram na análise crítica do depoimento da testemunha …, ouvida por carta rogatória, que trabalha no …, desempenhando desde há 7 anos as funções de Secretária do CEO e dos membros da Direcção e que foi colega de trabalho do trabalhador, de quem também é amiga, desde Novembro de 2008, do depoimento da já referida testemunha … e do depoimento da testemunha …, também ouvida por carta rogatória, que trabalha desde 1997 no …, desempenhando as funções de Coordenadora dos Serviços de Tecnologia Informática e que foi colega de trabalho do trabalhador.”

Ora, da leitura da alínea AL) dos factos provados logo ressalta que estamos perante matéria conclusiva, razão pela qual não deve constar dos factos provados.
Consequentemente elimina-se dos factos provados a alínea AL).
7- O facto provado em AM) seja considerado não provado.
Invoca, para o efeito, que as testemunhas que serviram para fundamentar a convicção do Tribunal a quo não foram confrontadas com os e-mails constantes do procedimento disciplinar, pelo que se desconheciam o conteúdo dessas mensagens não podiam apreciar criticamente o seu conteúdo, nem dos seus depoimentos resulta a matéria em causa, indicando o depoimento das mesmas testemunhas e o depoimento das testemunhas …, … e ….
Entende o Recorrido que se deve manter o facto provado em questão.
A alínea AM) dos factos provados tem a seguinte redacção.
AM)- O trabalhador sempre se dirigiu a todas entidades com as quais se relacionou com respeito e urbanidade e nunca foi desleal para com os colegas, nem para com os superiores hierárquicos.
O Tribunal a quo fundamentou a sua convicção referindo: ”Os factos constantes das alíneas AM) e AR), assentaram na análise crítica dos depoimentos das já referidas testemunhas …,… e….
Ora, a matéria em causa, tal como a matéria da al.AL) dos factos provados, é conclusiva, pelo que não deve constar dos factos provados.
Consequentemente elimina-se dos factos provados a matéria da al.AM).
8- Conclusivamente deveria ter sido dado como provado que o Recorrente transmitiu a terceiros montantes de depósitos e de levantamentos e a identidade de clientes.
Tal como afirma o próprio Recorrente, a matéria em causa é conclusiva pelo que não pode constar dos factos provados.
9- O facto provado AP) não pode ser considerado provado devendo dar-se por provado que “ De Janeiro a Setembro de 2014 (data em que produziu efeitos a denúncia da cedência ocasional), a remuneração mensal do trabalhador foi de 110.900,00MOP” ou “ A remuneração mensal base do trabalhador, junto do … (BBB), era de € 2.428,57 (a partir de 2014, data em que cessou a cedência ocasional e em que voltou a vigorar na sua plenitude o contrato de trabalho).
Para o efeito invoca que os documentos de fls. 170 a 178 dos autos nos quais o Tribunal a quo fundamentou a sua posição, constituem recibos de vencimento do trabalhador, entre Janeiro de 2014 e Setembro de 2014, pagos no âmbito do contrato de cedência pelo (…), actual (…).
Indicou como meios de prova o depoimento das testemunhas … e … e o ACT aplicável ao sector.
Por sua banda, invoca o Recorrido que se trata de matéria que foi alegada pelo trabalhador no artigo 88º da contestação, consta dos documentos de fls.170 a 178 dos autos, que não foi impugnado pelo Recorrente quer o alegado no artigo 88º da contestação, quer os referidos documentos, que o Recorrente nunca alegou que o Autor auferia a quantia de € 2.428,57 à data do despedimento, tratando-se de factos novos e que os depoimentos das testemunhas … e … são totalmente irrelevantes para infirmar o facto constante da alínea AP) na medida em que incidem sobre facto diferente, a saber: qual seria o vencimento do trabalhador se à data do despedimento estivesse ao serviço do Apelante em Portugal.

O Facto AP) tem a seguinte redacção:
“AP)- Desde Janeiro de 2014, a remuneração base mensal do trabalhador passou a ser de 110.900,00 MOP.”
O Tribunal a quo assentou a sua motivação quanto a este facto nos seguintes termos:
“Os factos constantes da alínea AP) assentaram no teor dos documentos (cópias de recibos de vencimento) de fls. 170 a 178 dos autos, não impugnados.”
No artigo 88º da contestação ao articulado motivador o Autor alegou: “ Desde Janeiro de 2014, a remuneração base mensal do A. passou a ser de 110.000,00MOP, a que corresponde o contra-valor de Euros 12.720,00, conforme atestam os recibos de vencimento dos meses de Janeiro a Setembro de 2014 que ora se juntam. (docs.6 a 14, adiante juntos).”

O facto não foi impugnado pelo Réu (cfr. artigo 42º da Réplica).

A fls. 170 a 178 dos autos constam os recibos de vencimento do Autor de Janeiro a Setembro de 2014.

Consequentemente, tendo o Tribunal a quo fundado a sua convicção nos ditos documentos, então, impõe-se que a alínea AP) passe a ter a seguinte redacção:
AP- De Janeiro a Setembro de 2014, a remuneração base mensal do trabalhador foi de 110.900,00 MOP.”
(…)
10- Os factos AU) e AW) não deviam ter sido dados como provados.
Indicou o depoimento das testemunhas …, … e ….
Contrapõe o Recorrido que os factos em questão devem manter-se, pois foram confirmados pelas testemunhas … e ….

Os factos provados AU) e AW) têm a seguinte redacção:
“AU)- A instauração do processo disciplinar deixou o trabalhador angustiado.
AW)- O trabalhador deixou de dormir e perdeu o apetite.”

O Tribunal a quo fundamentou a sua convicção nos seguintes termos.

“Os factos constantes das alíneas AU) e AW), assentaram na análise crítica do depoimento da já referida testemunha ….”

A testemunha …, secretária dos membros da Direcção do … e do CEO e que também trabalhou para o Autor afirmou, em síntese, que o Autor vivia em Macau com a mulher e duas filhas, mas que não tinha a certeza se, em Outubro de 2014, o Autor estava em Macau. Tendo-lhe sido perguntado se sabia que tinha havido um processo disciplinar contra o Autor por ter proferido injúrias contra o Dr. …, disse não ter conhecimento do processo disciplinar.

É certo que a testemunha declarou que chegou a ver o Autor angustiado, que não podia dormir, que estava muito preocupado por causa da questão dos seus rendimentos, que emagreceu e que ficou humilhado por ter sido afastado do Banco e que a esposa também estava muito preocupada porque o marido não dormia. Contudo, do contexto das suas declarações ressalta que se reportam à data posterior à carta de denúncia do Acordo de Cedência Ocasional e não ao procedimento disciplinar movido ao Autor (A expressão despedimento foi utilizada pela ilustre mandatária que a questionou, embora se referisse à carta do …). Aliás tendo a testemunha declarado não saber da existência do processo disciplinar, se o Autor foi notificado para apesentar defesa em Lisboa ou se não se pôde defender, bem como desconhecer se foi acusado de ter abandonado o trabalho, não podemos afirmar que o estado emocional que descreveu foi consequência do procedimento disciplinar.

Consequentemente, o seu depoimento não suporta os factos das alíneas AU) e AW).

A testemunha … referiu que a última vez que viu o Autor foi em Outubro ou Novembro de 2014, em Macau, no …, que o Autor manifestou estar incomodado com a situação e revelou alguma instabilidade emocional a qual resultava de um acumular de eventos que resumiu a um conjunto de três factores: a morte do pai do Autor, o que estava a acontecer com o … em Portugal e a sua situação em Macau, ou seja, o facto de ter terminado a sua cedência em Macau.

Por seu turno, a testemunha … refere-se à carta de “despedimento” de Agosto de 2014 entregue ao Autor pelo …, quando resulta provado que a carta em questão tratava da denúncia do Acordo de Cedência Ocasional, referindo, ainda, que depois não teve conhecimento de muita coisa.

Ainda declarou que era preciso enquadrar a situação e não esquecer que em Agosto de 2014 houve a Resolução do Banco e os cinco ramos da família perderam muito e que o Autor fez-lhe o seguinte desabafo: “ a minha família num mês perdeu 200 milhões de euros”, pelo que presume que quem perde este montante não fique contente. Ainda disse que há a Resolução depois logo de seguida o Autor recebe a carta (de denúncia do acordo), que acompanhou a situação durante os primeiros tempos, ia muitas vezes jantar com ele e pode afirmar que ele não estava bem, via-se que estava com o ar cansado, descuidado e na altura do Natal de 2014 esteve com ele e viu-o com uma mancha no braço que ele atribuiu ao stress, nos primeiros meses viu-se que ele não estava bem, muito repetitivo e, uma pessoa que sempre fora precisa e concisa como ele, passou a adoptar um discurso triste e que nas últimas vezes que o viu já estava bastante melhor.

Ora, apesar de no Natal de 2014 o Autor já ter conhecimento que lhe havia sido instaurado um processo disciplinar, face aos mencionados depoimentos não podemos afirmar que foi o processo disciplinar que deixou o Autor angustiado e que foi por causa do processo disciplinar que deixou de dormir e perdeu o apetite. Na verdade, da conjugação dos mencionados depoimentos resulta claro que outros factores existiram, para além do despedimento, que o deixaram angustiado e preocupado: o que se estava a passar com o …, a comunicação da denúncia do Acordo de Cedência Ocasional e a morte do pai.

Consequentemente, elimina-se dos factos provados os das alíneas AU) e AW). 
(…)
Em conclusão, apenas parcialmente procede a impugnação da matéria de facto.
*

Fundamentação de direito.
Apreciemos, agora, a 2ª questão suscitada no recurso e que consiste em saber se o contrato de trabalho cessou por abandono do trabalho e, em caso afirmativo, se o Tribunal a quo deveria ter julgado procedente a alegada excepção do erro na forma de processo.

Sobre o invocado abandono do trabalho e erro na forma do processo escreve-se na sentença recorrida o seguinte:
“No articulado motivador do despedimento, começa a empregadora por arguir a nulidade do erro na forma do processo, decorrente de o contrato de trabalho ter cessado não por despedimento, mas por abandono do trabalho pelo trabalhador, nos termos do art. 403º do CT.
O art. 403º do CT, sob a epígrafe Abandono do trabalho, dispõe:
“1.- Considera-se abandono do trabalho a ausência do trabalhador do serviço acompanhada de factos que, com toda a probabilidade, revelam a intenção de não o retomar.
2.- Presume-se o abandono do trabalho em caso de ausência de trabalhador do serviço durante, pelo menos, 10 dias úteis seguidos, sem que o empregador seja informado do motivo da ausência.
3.- (…)”.
Vejamos.
Pese embora tenham resultado provados os factos constantes das alíneas C), D), E), F), G), H) e I), não pode considerar-se, salvo melhor opinião, cessado o contrato por abandono do trabalhador.
É que, valendo a invocação do abandono como denúncia do contrato pela empregadora (vd. art. 403º, nº 3, do CT), tal denúncia não é compatível com a elaboração, na mesma data, da nota de culpa, referida em N), no âmbito do processo disciplinar instaurado contra o trabalhador, com vista ao seu despedimento.
Assim, foi a própria empregadora que, apesar de invocar o abandono do trabalho pelo trabalhador, ilidiu a presunção estabelecida no nº 2 do citado art. 403º do CT.
Nestes termos, não considero cessado o contrato de trabalho celebrado entre as partes por abandono do trabalhador, nem verificada a nulidade do erro na forma do processo.”

Discorda o Recorrente do entendimento do Tribunal a quo invocando, em síntese, que resultou demonstrado nos autos que foi celebrado um acordo de cedência ocasional com o trabalhador e o (…), validamente denunciado pelo cessionário em 28 de Agosto de 2014, que vigorou durante 6 anos e do qual decorreu que o trabalhador passasse a prestar a sua actividade em Macau, que findo o contrato de cedência ocasional, ao abrigo do qual o trabalhador se encontrava a exercer actividade em Macau, este não se apresentou ao trabalho em Portugal, junto do seu empregador BBB, como estava obrigado, que em 21 de Outubro de 2014 o empregador enviou uma carta ao trabalhador, para a sua morada em Leiria, correspondente àquela que constava do seu processo individual, solicitando a sua comparência no trabalho e que justificasse o motivo da ausência, não tendo o trabalhador comparecido nem justificado a sua ausência, que o Recorrido não logrou ilidir a presunção de abandono, como lhe era exigível nos termos do n.º 4 do art.403.º do Código do Trabalho, que o contrato de trabalho cessou por abandono, devidamente declarado pelo empregador em cumprimento do disposto no art.403.º do Código do Trabalho, que, contrariamente ao que se diz na sentença, o empregador não afastou a presunção do abandono do trabalho, tendo antes declarado esse abandono, explicitamente, em todas as cartas enviadas ao trabalhador e que se encontram juntas aos autos, nem tal conclusão se poderia extrair da instauração pelo empregador, por mera cautela, de um processo disciplinar, que a sentença deveria ter julgado procedente a excepção de erro na forma de processo e que uma vez que o contrato de trabalho cessou por abandono do trabalho, ficou prejudicada a apreciação da validade do processo disciplinar, pelo que não o tendo feito o tribunal aplicou, deste modo, de forma errada os art.º 106.º, n.º 2, art.º 109.º, 403.º n.º 3 do Código do Trabalho, bem como os artigos 98.º-C e 98.º-I do Código de Processo do Trabalho.

Contrapõe o Recorrido, em resumo, que o Acordo de Cedência do Trabalhador teve início em 1 de Junho de 2008, vigorou por um período inicial de 36 meses, que terminou no dia 1 de Junho de 2011, tendo-se renovado por três anos nesta última data, até 1 de Junho de 2014, tendo-se renovado, de novo, em 1 de Junho de 2014, por mais 3 anos, só terminando o período de vigência, então em curso em 1 de Junho de 2017, pelo que o trabalhador tinha a justa expectativa de manter a sua vida profissional em Macau, onde tinha o centro da sua vida pessoal e familiar, pelo menos, até Junho de 2017, que é revelador de que a carta de 28 de Agosto de 2014 não operou a denúncia válida do Acordo de Cedência o facto de “No início de Setembro de 2014, o … ter em aberto a hipótese da manutenção do trabalhador em funções em Macau até Dezembro do mesmo ano”, o Acordo de Cedência não findou, pelo que o Trabalhador não estava obrigado a apresentar-se ao trabalho em Portugal, nas instalações do Apelante, o que, de resto seria impossível ocorrer em 24 horas, atenta a distância e os meios de transporte disponíveis, a carta dirigida ao Trabalhador para Leiria “foi devolvida ao remetente com a menção “Não atendeu” logo, não é possível considerar o Trabalhador notificado por via de tal carta para “comparecer ao trabalho ou justificar o motivo da sua ausência”, resulta dos autos que o Trabalhador praticou vários actos reveladores de que pretendia retomar o trabalho, designadamente os constantes das alíneas AH) e AK) dos FACTOS PROVADOS., a denúncia do contrato de trabalho não é compatível com a elaboração, na mesma data, da nota de culpa com vista ao despedimento do Trabalhador, o Trabalhador, na defesa que produziu no Processo disciplinar, respondeu expressa e atempadamente à questão do abandono, tendo em vista ilidir a presunção que, atenta a sua natureza, era passível de prova em contrário, no entanto, foi impedido pelo Apelante de produzir prova sobre os factos que ali alegou, acresce que o Trabalhador não estava obrigado a comparecer nas instalações do Apelante em Lisboa, mas sim nas do …, em Macau, onde compareceu até ser impedido, que não resultando provado que o contrato tenha cessado por abandono do Trabalhador, a forma legal de impugnar o despedimento não era a do processo comum, mas sim a do processo especial previsto nos artigos 98º-B a 98º-P do CT, como foi adoptada e que na Audiência de Partes, o Apelante foi notificado do despacho que ordenou o prosseguimento dos autos, dele não tendo interposto recurso, pelo que, também por esta razão não pode agora vir suscitar a questão do erro na forma do processo.

Vejamos:
Dispõe o artigo 403º do Código do Trabalho de 2009, aprovado pela Lei nº 7/2009, de 12 de Fevereiro, aplicável ao caso atenta a data dos factos, que:
“1- Considera-se abandono do trabalho a ausência do trabalhador ao serviço acompanhada de factos que, com toda a probabilidade, revelam a intenção de não o retomar.
2- Presume-se o abandono do trabalho em caso de ausência de trabalhador do serviço durante, pelo menos,10 dias úteis seguidos, sem que o empregador seja informado do motivo da ausência.
3- O abandono do trabalho vale como denúncia do contrato, só podendo ser invocado pelo empregador após comunicação ao trabalhador dos factos constitutivos do abandono ou da presunção do mesmo, por carta registada com aviso de recepção para a última morada conhecida deste.
4- A presunção estabelecida no nº 2 pode ser ilidida pelo trabalhador mediante prova da ocorrência de motivo de força maior impeditivo da comunicação ao empregador da causa da ausência.
5- Em caso de abandono do trabalho, o trabalhador deve indemnizar o empregador nos termos do artigo 401º.”
Como se refere no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 27.5.2015, pesquisa em www.dgsi.pt, em que a ora relatora interveio como 2ª adjunta:
“Consagra-se nesta disposição uma causa de extinção da relação laboral, reconduzida a um caso especial de denúncia irregular ou ilícita pelo trabalhador, dependente de invocação pelo empregador. A irregularidade ou ilicitude da denúncia decorre da falta de comunicação do trabalhador ao empregador, feita por escrito, da vontade de por sua iniciativa fazer cessar o vínculo laboral, nos termos previstos no art.º 400.º, do CT/2009”.
E como se afirma no sumário do mesmo aresto “I. São pressupostos da cessação do contrato por parte da entidade empregadora, com base em abandono do trabalho os seguintes: i) ausência injustificada do trabalhador ao serviço; ii) que essa ausência seja, acompanhada de factos concludentes no sentido de que o trabalhador não tem intenção de retomar o trabalho ou que o período de ausência seja de, pelo menos, 10 dias úteis seguidos sem que seja comunicado o motivo da ausência, caso em que funciona a presunção de abandono estabelecida no nº 2;iii) que a entidade patronal comunique a cessação do contrato por carta registada com aviso de recepção para a última morada conhecida do trabalhador.
II. O facto indiciário sobre o qual assenta a presunção de abandono do trabalho (art.º 403.º/2 CT/09) consiste da ausência desacompanhada da falta de comunicação do motivo da mesma.
III. E, uma vez verificados esses factos, cabe ao trabalhador ilidir a presunção, isto é, a intenção de não retomar o trabalho, “mediante prova da ocorrência de motivo de força maior impeditivo da comunicação ao empregador da causa da ausência” (art.º 404.º/4).
(…).”
Também sobre o abandono do trabalho elucida o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 21.3.2012, in www.dgsi.pt relatado pela Exma 2ª Adjunta:
“O conceito de abandono do trabalho pressupõe assim a existência de dois requisitos, a saber: um objectivo constituído pela ausência do trabalhador ao serviço, ou seja, a sua não comparência no local e tempo de trabalho; e um segundo de natureza subjectiva constituído pela intenção definitiva, por parte do trabalhador, em não retomar o trabalho.
Todavia, no n.º2 do mesmo dispositivo, estabelece-se uma presunção do abandono do trabalho em caso de ausência do trabalhador ao serviço durante, pelo menos, 10 dias úteis seguidos, sem que o empregador seja informado do motivo da ausência, ou seja, sem que conheça os motivos pelos quais o trabalhador não comparece ao serviço.
Deste modo, a entidade empregadora tem o ónus da prova da ausência ao serviço, mas beneficia da presunção – iuris tantum – do abandono do trabalho se lhe não for comunicado o motivo da ausência. Esta presunção pode, no entanto, ser ilidida pelo trabalhador mediante prova da ocorrência de motivo de força maior impeditivo da comunicação ao empregador da causa da sua ausência, tal como decorre do n.°4 do mesmo art.º403 do CT, não lhe bastando a prova dos factos que determinaram a ausência.”

Por outro lado, como também se refere no sumário do Acórdão do STJ de 5.7.2007, igual pesquisa, que embora analise caso à luz da LCCT, mantém entendimento actual: (…)
“IV Para beneficiar da presunção legal de abandono do trabalho a entidade patronal tem apenas de alegar e provar que o trabalhador faltou ao serviço durante 15 dias úteis seguidos sem apresentar justificação, competindo ao trabalhador provar que comunicou à entidade patronal o motivo da ausência.
V Para ilidir a presunção de abandono do trabalho, ao trabalhador não basta provar os factos que determinaram a sua ausência: é ainda necessário que alegue e prove que, no caso concreto, agiu com a necessária diligência, própria de uma pessoa normal, medianamente prudente, avisado e cuidadoso e que só por razões que lhe não são imputáveis, foi impedido de cumprir aquele seu dever de comunicar o motivo da ausência.”
Por outro lado, como escreve Pedro Furtado Martins, in “Cessação do Contrato de Trabalho”, 3.ª Edição, pags. 553 e 554, “Assim, o empregador não pode invocar o abandono do trabalho, quando conhece ou tem obrigação de conhecer que a ausência, mesmo que prolongada, se deve a outros motivos que não a vontade do trabalhador terminar o contrato. (…) Em suma, desde que o empregador tenha ou deva ter conhecimento do motivo subjacente à não-comparência ao serviço, não pode dizer-se que a ausência revela a intenção do trabalhador de não retomar o trabalho.”

Assim, ausentando-se o trabalhador ao serviço, pelo menos, por dez dias úteis seguidos, sem que informe o empregador do motivo da sua ausência e desde que este não tenha ou não deva ter conhecimento do motivo da não comparência do trabalhador, funciona a presunção prevista no nº 2 do artigo 403º do CT.
Contudo, esta presunção pode ser ilidida nos termos do nº 4 do artigo 403º do CT, isto é, “mediante prova da ocorrência de motivo de força maior impeditivo da comunicação da ausência”, ou seja, o trabalhador tem de provar que ocorreu motivo de força maior que o impediu de comunicar ao empregador a sua ausência.

Regressando ao caso em análise constata-se que ficou provado que:
Por carta datada de 28 de Agosto de 2014, cuja cópia consta de fls. 66 dos autos e que aqui se dá por integralmente reproduzida, o “…, S.A.”, denunciou o contrato de cedência, referido em C). (alínea D) dos factos provados);
Na carta, referida em D), era dito, além do mais:
“… O …, S. A. …, vem rescindir unilateralmente o contrato de cedência ocasional de trabalhador, celebrado no passado dia 31 de Julho de 2008…, nos termos e ao abrigo da sua cláusula nona.
A presente rescisão produzirá efeitos 30 dias após a data desta missiva, sendo eficaz a partir do dia 28 de Setembro de 2014”.
(alínea E) dos factos provados);
A carta, referida em D), foi entregue em mão ao trabalhador em 28 de Agosto de 2014. (al.F) dos factos provados);
Em 17/11/2014, o “…, S.A.” enviou ao trabalhador, registada e com aviso de recepção, para a morada …, Macau, a carta cuja cópia consta de fls. 3 e 4 do processo disciplinar apenso e que aqui se dá por integralmente reproduzida, datada de 13/11/2014, assinada pelo Director Central de Recursos Humanos, Sr. Dr. …, e pelo Responsável do Departamento de Recursos Humanos, Sr. Dr. … (al.G) dos factos provados);
A carta, referida em G), tinha o seguinte teor:
“(…)
Lisboa, 13 de Novembro de 2014
Exmo. Senhor,
1- A ausência de V. Exa. ao serviço, ininterruptamente, desde 24 de Setembro de 2014 até à presente data, sem qualquer comunicação que a justifique, subsume-se no disposto no art.° 403.° do Código do Trabalho.
2- Efectivamente, V. Exa. deixou de se apresentar ao serviço no …, SA. (entidade onde exercia funções ao abrigo de contrato de cedência ocasional), no dia 24 de Setembro de 2014, sem justificar as suas faltas.
3- Identicamente, cessado o acordo de cedência com efeitos a partir de 28 de Setembro, também sem qualquer justificação, não se apresentou ao serviço no …, nem justificou a correspondente ininterrupta falta. Verdadeiramente, não realizou qualquer contacto com esta instituição, entidade patronal de V. Exa., que foi totalmente ignorada.
4- Acresce, ainda, um quadro factual/circunstancial rico em indícios complementares de que V. Exa. abandonou o trabalho.
5- Face ao exposto, serve a presente, nos termos e para os efeitos do n.º 3 do art.º 403.° do Código do Trabalho, para comunicar a V. Exa. que consideramos ter-se verificado o abandono do trabalho.
6- Consequentemente, cessou o contrato de trabalho celebrado entre V. Exa e esta sociedade no passado dia 25 de Setembro de 2014.
7- Dirigimos a presente carta para a morada supra indicada, porque, ao que parece, é aquela onde actualmente residirá. Identicamente, enviámos segunda via desta carta para a morada de V. Exa. que consta dos nossos registos e que se manteve, sempre, inalterada. Ou seja, V. Exa. não procedeu, como lhe incumbia, à actualização da morada junto desta instituição. Desconhecemos qualquer outro paradeiro eventual de V. Exa ..
Com os nossos respeitosos cumprimentos, (…)”.(alínea H) dos factos provados);
O trabalhador recebeu a carta, referida em G), em 26/12/2014, conforme aviso de recepção de fls. 1 do processo disciplinar apenso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido (alínea I dos factos provados);
Em 17/11/2014, o “…, S.A.” enviou ao trabalhador, registada e com aviso de recepção, para a morada Rua…, a carta cuja cópia consta de fls. 10 e 11 do processo disciplinar apenso e que aqui se dá por integralmente reproduzida, datada de 13/11/2014, com o mesmo teor da carta referida em G) (alínea J) dos factos provados);
A carta, referida em J), foi devolvida ao remetente com a menção “Não Atendeu” (alínea K dos factos provados); Em 14/11/2014, o “…, S.A.” enviou ao trabalhador, registada e com aviso de recepção, para a morada …, , a carta cuja cópia consta de fls. 18 do processo disciplinar apenso e que aqui se dá por integralmente reproduzida, datada de 13/11/2014, assinada pelo Director Central de Recursos Humanos, Sr. Dr. …, e pelo Responsável do Departamento de Recursos Humanos, Sr. Dr. … (alínea L) dos factos provados);
A carta, referida em L), tinha o seguinte teor:
“(…)
Lisboa, 13 de Novembro de 2014
ASSUNTO: Notificação da abertura de procedimento disciplinar/Nota de culpa
Exmo. Senhor,
1- Face aos actos recentemente praticados por V. Exa., foi decidido instaurar-lhe um procedimento disciplinar, cuja nota de culpa se junta.
2- A partir da presente notificação, V. Exa. dispõe de um prazo de 10 dias úteis para, querendo, apresentar a sua defesa por escrito e solicitar qualquer diligência probatória.
3- O processo encontra-se ao dispor de V. Exa, para consulta, no Departamento de Recursos Humanos do …, S.A., sito na Rua …, Lisboa.
Com os nossos respeitosos cumprimentos,
(…)”. (alínea M) dos factos provados); e
em 13/11/2014, foi elaborada a nota de culpa de fls. 19 a 25 do processo disciplinar apenso, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, assinada pelo Director Central de Recursos Humanos, Sr. Dr. …, e pelo Responsável do Departamento de Recursos Humanos, Sr. Dr. … (alínea N) dos factos provados).

Na nota de culpa invoca a empregadora, além do mais, a existência de faltas injustificadas como causa de despedimento por justa causa e refere no seu ponto 32 o seguinte: “32-O próprio trabalhador assim parece reconhecê-lo, tanto que não voltou a comunicar com a sua entidade patronal, não regressou ao seu posto de trabalho, pura e simplesmente deixou de cumprir com o seu contrato de trabalho. Tudo indica que tenha ocorrido um abandono do posto de trabalho o que, a consolidar-se juridicamente, tomará, aparentemente, inútil o presente processo disciplinar.”

Ainda resultou provado que: Em 12/01/2015, o “…, S.A.” enviou ao trabalhador, registada e com aviso de recepção, para a morada …, a carta cuja cópia consta de fls. 54 do processo disciplinar apenso e que aqui se dá por integralmente reproduzida, datada de 09/01/2015, assinada pelo Director Central de Recursos Humanos, Sr. Dr. …, e pelo Responsável do Departamento de Recursos Humanos, Sr. Dr. … (alínea Y dos factos provados); A carta, referida em Y), tinha o seguinte teor:
“(…)
Lisboa, 9 de janeiro de 2015
ASSUNTO: Decisão do procedimento disciplinar
Exmo. Senhor,
1- No seguimento do procedimento disciplinar instaurado contra V. Exa. e com base no artigo 357.º do Código do Trabalho, vimos pela presente comunicar-lhe que o … decidiu proceder ao seu despedimento com justa causa, nos termos e com os fundamentos da decisão que se junta.
2- Como é do conhecimento de V. Exa., o contrato de trabalho celebrado com o … Investimento cessou no passado dia 25 de Setembro de 2014, por abandono do trabalho.
3- Os efeitos úteis deste despedimento só se verificarão se V. Exa se apresentar ao serviço, justificando - de forma plausível - a sua prolongada ausência.
Com os nossos respeitosos cumprimentos,
(…)”. Alínea Z) dos factos provados); e a carta, referida em Y), foi devolvida ao remetente com a menção “Não Reclamado (alínea AA) dos factos assentes).
Ora, da citada factualidade decorre que a empregadora sempre considerou que o contrato de trabalho cessou por abandono do trabalho, entendimento que reafirmou na carta que enviou ao trabalhador a comunicar-lhe a decisão de despedimento e na qual ainda refere que “os efeitos úteis do despedimento só se verificarão se o trabalhador se apresentar ao serviço justificando - de forma plausível- a sua prolongada ausência”

Ou seja, do teor da mencionada carta extrai-se que, caso o Autor se apresentasse ao trabalho, estaria ilidida a presunção a que alude o nº 2 do artigo 403º do CT, que é o mesmo que dizer que o empregador deu uma oportunidade ao Autor de se apresentar ao serviço e justificar a ausência, circunstâncias em que o despedimento produziria os seus efeitos.

Consequentemente, salvo o devido respeito, não podemos afirmar que foi a própria empregadora que, ao instaurar o procedimento disciplinar e não obstante ter invocado o abandono do trabalho, ilidiu a presunção estabelecida no nº 2 do artigo 403º do CT, tanto mais que nos termos do nº 4 do mesmo artigo é o trabalhador que terá de ilidir tal presunção.

Por outro lado, também não podemos afirmar, como faz a sentença recorrida que “valendo a invocação do abandono como denúncia do contrato pela empregadora (vd. art. 403º, nº 3, do CT), tal denúncia não é compatível com a elaboração, na mesma data, da nota de culpa, referida em N), no âmbito do processo disciplinar instaurado contra o trabalhador, com vista ao seu despedimento.”

Na verdade, como se escreve no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 16.7.1984, in www.dgsi.pt, citado pelo Recorrente:
 “I- A rescisão pelo trabalhador é uma das formas da extinção do contrato de trabalho.
II- Essa rescisão pode operar-se por quatro formas: a) rescisão com justa causa; b) rescisão sem justa causa, mas com pré-aviso; c) rescisão sem justa causa nem pré-aviso; d) abandono do trabalho.
III- O abandono implica uma desaparição súbita e intempestiva do lugar do trabalho, com aviso ou sem ele, sendo preciso que se prove o propósito deliberado do trabalhador de dar por terminado o contrato.
IV- Verificado o abandono, o empresário não tem necessidade de despedir o trabalhador, porque o contrato se extinguiu com o próprio abandono.
V - No entanto, e para sua segurança, poderá mover-lhe o respectivo processo disciplinar, dada a dificuldade de prova do propósito de abandono, e uma vez que este é uma conduta antijurídica de incumprimento.”

Assim, no caso, havendo a possibilidade do Autor ilidir a presunção do abandono do trabalho e sendo certo que a empregadora tinha o prazo de 60 dias para iniciar o procedimento disciplinar conforme dispõe o nº 2 do artigo 329º do CT, impõe-se concluir que a invocação do abandono do trabalho não obstava a que a empregadora tivesse instaurado o procedimento disciplinar ao Autor conforme veio a suceder. O que podia suceder é que, verificando-se a cessação do contrato de trabalho por abandono do trabalho, o despedimento deixaria de produzir qualquer efeito, o que sempre foi reconhecido pelo Recorrente nas cartas que enviou ao Autor, na medida em que cessando o contrato de trabalho, necessariamente, cessa o poder disciplinar da empregadora.

Consequentemente, não acompanhamos o fundamento invocado pelo Tribunal a quo para considerar que o contrato de trabalho celebrado entre as partes não cessou por abandono do trabalho e para considerar que não se verifica a nulidade do erro na forma do processo.

E assim sendo, importa, então, apreciar se, como defende o Recorrente, o contrato de trabalho cessou por abandono do trabalho do Autor e se estamos perante o alegado erro na forma de processo o que passa, necessariamente, por saber se operou a denúncia do Acordo de Cedência Ocasional levada a cabo pelo Banco Espírito Santo do Oriente.

Nos termos do artigo 288º do Código do Trabalho “ A cedência ocasional consiste na disponibilização temporária do trabalhador, pelo empregador, para prestar trabalho a outra entidade, a cujo poder de direcção aquele fica sujeito, mantendo-se o vínculo contratual inicial.”
E de acordo com o nº 2 do artigo 290º do CT “ Em caso de cessação do acordo de cedência ocasional, de extinção da entidade cessionária ou de cessação da actividade para que foi cedido, o trabalhador regressa ao serviço do cedente, mantendo os direitos que tinha antes da cedência, cuja duração conta para efeitos de antiguidade.”

Ora, ficou provado que em 12 de Fevereiro de 2007, foi celebrado entre o “…, S.A.” e o trabalhador o “Contrato Individual de Trabalho” cuja cópia consta de fls. 54 a 58 dos autos e que aqui se dá por integralmente reproduzida (alínea A) dos factos provados) e que nos termos do contrato, referido em A), o trabalhador foi admitido para desempenhar as funções de Sub Director no “…” (alínea B dos factos provados).

Mais se provou que em 31 de Julho de 2008, foi celebrado entre o “…, S.A.”, o “…, S.A.” e o Trabalhador, o “Acordo de Cedência Ocasional de Trabalhador”, cuja cópia consta de fls. 60 a 64 dos autos e que aqui se dá por integralmente reproduzida, através do qual o trabalhador foi cedido ao “…, S.A.”, com sede em Macau, para aí desempenhar as funções de Director (alínea C) dos factos provados).

O Acordo de Cedência Ocasional teve início em Junho de 2008. (alínea AF) dos factos provados).

De acordo com a Cláusula Terceira do Acordo de Cedência Ocasional “ O presente contrato tem início a partir da data da obtenção da autorização de residência e de trabalho e por um período de trinta e seis meses, não sendo denunciado com a antecedência de trinta dias, renova-se sucessivamente por períodos de três anos.”

Não obstante, dispõe a Cláusula Nona do Acordo de Cedência Ocasional:
“ Um - O presente contrato poderá cessar por:
A)Acordo entre as partes;
B)Rescisão por iniciativa de qualquer dos OUTORGANTES, mediante pré-aviso que, salvo acordo em contrário, será de trinta dias;
C)Cessação do contrato de trabalho entre o … e o TRABALHADOR;
D)Justa causa.
Dois - O pré-aviso referido na alínea B do número anterior será enviado a ambos os outorgantes.
Três- Nas situações previstas nas alíneas A, B e D do número anterior desta cláusula, o … obriga-se a aceitar, de imediato, o regresso do TRABALHADOR, promovendo a sua colocação no exercício de funções decorrentes do seu Contrato Individual de Trabalho.”

Assim, para além da denúncia prevista na Cláusula Terceira, as partes, no âmbito da sua liberdade contratual, ainda acordaram a possibilidade de rescisão unilateral do Acordo de Cedência Ocasional, condicionando-a a um pré-aviso de 30 dias.

Ora, conforme resulta dos factos provados, por carta datada de 28 de Agosto de 2014, cuja cópia consta de fls. 66 dos autos e que aqui se dá por integralmente reproduzida, o “…, S.A.”, denunciou o contrato de cedência, referido em C) (alínea D) dos factos provados).

A referida carta foi endereçada à Administração do … e ao Autor e tem o seguinte teor:
“(…)Denúncia do contrato de cedência ocasional de trabalhador
Ex.mos Senhores,
Por via da presente, o …, S.A., sociedade comercial anónima, com sede em Macau, na Avenida … “A” e “E-F” (“…”), vem rescindir unilateralmente o contrato de cedência ocasional de trabalhador, celebrado no passado dia 31 de Julho de 2008 com V.Exas. (“o Contrato”), nos termos e ao abrigo da sua cláusula nona.
A presente rescisão produzirá efeitos 30 dias após a data desta missiva, sendo eficaz a partir do dia 28 de Setembro de 2014.”

A referida carta foi entregue em mão ao trabalhador em 28 de Agosto de 2014 (alínea E) dos factos provados.

Assim, em 28 de Agosto o Autor tomou conhecimento que o … rescindia unilateralmente o acordo de cedência ocasional ao abrigo da sua cláusula nona e que a rescisão produziria efeitos 30 dias após a data da carta, ou seja, em 28 de Setembro de 2014.

É certo que se provou que, no início de Setembro de 2014, o “…, S.A.”, tinha em aberto a hipótese da manutenção do trabalhador em funções em Macau até Dezembro do mesmo ano (alínea AH) dos factos provados), o que significa que, a dado momento, o … ponderou prorrogar os efeitos da rescisão para momento posterior a 28 de Setembro.

Contudo, também se provou que, em reunião havida em 23 ou 24 de Setembro de 2014, foi comunicado, pelo “…, S.A.”, ao trabalhador que tinha deixado de ser ponderada a prorrogação da sua estadia em Macau (alínea AI dos factos provados), do que resulta que a rescisão unilateral do acordo efectuada pelo … sempre produziria efeitos em 28 de Setembro de 2014.

Consequentemente, impõe-se concluir que, em 28 de Setembro de 2014, cessou o Acordo de Cedência Ocasional, facto que foi do conhecimento do Autor.

E como o Acordo de Cedência Ocasional cessou, então, face ao disposto no nº 2 do artigo 290º do CT, o trabalhador deveria ter regressado ao serviço do cedente, ou seja, ao serviço do … que nos termos do ponto três da cláusula nona “obriga-se a aceitar, de imediato, o regresso do TRABALHADOR”.

Ora, uma vez que apenas na reunião havida em 23 ou 24 de Setembro de 2014 (a rescisão produzia efeitos no dia 28 desse mês) foi comunicado, pelo “…, S.A.”, ao trabalhador que tinha deixado de ser ponderada a prorrogação da sua estadia em Macau até Dezembro de 2014 e sabendo-se que o Autor tinha a sua vida familiar e pessoal centrada em Macau, obviamente que, atenta a distância que separa Macau de Portugal não lhe era exigível que se apresentasse no dia 28 de Setembro em Lisboa, tanto mais que foi o … que criou a expectativa do Autor se manter em Macau até Dezembro desse ano.

Mas já lhe era exigível que comunicasse essas circunstâncias ao empregador, o que não se provou ter acontecido.

Por outro lado, a obrigação do Autor se apresentar no …, em Lisboa mantinha-se, sendo certo que nunca foi cumprida.

E sendo certo que era sobre o Autor que impendia a obrigação de se apresentar ao serviço do … em Lisboa (é sobre o trabalhador que recai o dever de assiduidade, conforme resulta da al.b) do nº 1 do artigo 128º do CT), não vislumbramos que este tivesse a obrigação de enviar ao Autor a carta de 21.10.2014 (fls.67 dos autos) e que veio devolvida, na qual refere que:” Para que não existam dúvidas ou equívocos: V.Exa. deverá apresentar-se no trabalho, nas instalações do …, em Lisboa, na Rua…, com a maior urgência possível, e manter-se-á em situação faltosa enquanto isso não ocorrer.”

Por outro lado, é sobre o trabalhador que recai o dever de comunicar a sua ausência, o que resulta do regime da imperatividade do regime de faltas previsto no artigo 250º do CT.
Ora, conforme resultou provado, o trabalhador nunca se apresentou ao trabalho nas instalações da empregadora e nunca justificou a sua ausência (alínea AC) dos factos provados). Ou seja, o Autor nunca se apresentou nas instalações do …, em Lisboa, não comunicou a sua ausência, nem provou que ocorreu motivo de força maior que o impedisse de comunicar a ausência.

É certo que ficou provado que o trabalhador só deixou de se apresentar ao trabalho em Macau quando foi impedido de entrar nas instalações do “…, S.A.”, em finais de Setembro de 2014 (alínea AK dos factos provados). Mas é óbvio que o trabalhador foi impedido de entrar no …, exactamente porque este Banco rescindiu o Acordo de Cedência Ocasional, sendo certo que foi em finais de Setembro de 2014 que colocou de lado a possibilidade do Autor ainda se manter em Macau até Dezembro de 2014.

E se deixou de vigorar o Acordo de Cedência, necessariamente, o … deixou de ser o local de trabalho do Autor, daí que impedisse a entrada deste nas suas instalações.

Assim, do exposto resulta o seguinte quadro:
A partir de 23 ou 24 de Setembro de 2014 o Autor teve conhecimento que a rescisão do Acordo de Cedência Ocasional operava em 28 do mesmo mês, nessa sequência foi impedido de entrar no … e, apesar disso, não se apresentou no … em Lisboa, nem justificou a sua ausência, nem a impossibilidade de apresentar justificação para essa ausência.

Ora, como resultou provado (alíneas G e H), em 17/11/2014, o “…, S.A.” enviou ao trabalhador, registada e com aviso de recepção, para a morada …, a carta cuja cópia consta de fls. 3 e 4 do processo disciplinar datada de 13/11/2014, assinada pelo Director Central de Recursos Humanos, Sr. Dr. …, e pelo Responsável do Departamento de Recursos Humanos, Sr. Dr. … com o seguinte teor:
“Lisboa, 13 de Novembro de 2014
Exmo. Senhor,
1- A ausência de V. Exa. ao serviço, ininterruptamente, desde 24 de Setembro de 2014 até à presente data, sem qualquer comunicação que a justifique, subsume-se no disposto no art.° 403.° do Código do Trabalho.
2- Efectivamente, V. Exa. deixou de se apresentar ao serviço no …, SA. (entidade onde exercia funções ao abrigo de contrato de cedência ocasional), no dia 24 de Setembro de 2014, sem justificar as suas faltas.
3- Identicamente, cessado o acordo de cedência com efeitos a partir de 28 de Setembro, também sem qualquer justificação, não se apresentou ao serviço no …, nem justificou a correspondente ininterrupta falta. Verdadeiramente, não realizou qualquer contacto com esta instituição, entidade patronal de V. Exa., que foi totalmente ignorada.
4- Acresce, ainda, um quadro factual/circunstancial rico em indícios complementares de que V. Exa. abandonou o trabalho.
5- Face ao exposto, serve a presente, nos termos e para os efeitos do n.º 3 do art.º 403.° do Código do Trabalho, para comunicar a V. Exa. que consideramos ter-se verificado o abandono do trabalho.
6- Consequentemente, cessou o contrato de trabalho celebrado entre V. Exa e esta sociedade no passado dia 25 de Setembro de 2014.
7- Dirigimos a presente carta para a morada supra indicada, porque, ao que parece, é aquela onde actualmente residirá. Identicamente, enviámos segunda via desta carta para a morada de V. Exa. que consta dos nossos registos e que se manteve, sempre, inalterada. Ou seja, V. Exa. não procedeu, como lhe incumbia, à actualização da morada junto desta instituição. Desconhecemos qualquer outro paradeiro eventual de V. Exa ..
Com os nossos respeitosos cumprimentos,
(…)”.
Conforme provado, o trabalhador recebeu esta carta em 26/12/2014, o que é atestado pelo aviso de recepção de fls. 1 do processo disciplinar apenso.
O motivo pelo qual o Autor deixou de se apresentar ao serviço no … SA. no dia 24 de Setembro de 2014, é conhecido: cessado o Acordo de Cedência Ocasional, o trabalhador foi impedido de entrar nas instalações do … em Macau.
Mas o motivo pelo qual o Autor não se apresentou ao serviço no empregador, ou seja, no …, em Lisboa, é desconhecido; o Autor não compareceu nem deu notícias sobre a sua ausência. Ou seja, nas palavras de João Leal Amado, na obra “Contrato de Trabalho, 3ª Edição Reimpressão, pag.457, nota de rodapé, trata-se de um caso em que o trabalhador “desaparece em combate”(ausência prolongada do serviço sem notícias).
Com efeito, desde a data da cessação do Acordo de Cedência Ocasional até que ao Autor foi comunicada a cessação do contrato de trabalho por abandono do trabalho (26.12.2014), nunca o Autor informou o Réu do motivo da sua não comparência ao serviço, nem provou que ocorreu motivo de força maior que o impedisse de comunicar a ausência, prova que lhe competia fazer (nº 4 do artigo 403º do CT); nem se provou que o empregador sabia o motivo dessa ausência ou que devia conhecê-lo.
Não tendo o Autor feito tal prova, impõe-se concluir que o Réu beneficia da presunção legal estabelecida no n º 2, do artº 403º. E provado que está que o Réu observou o disposto no nº 3 do artigo 403º do CT, então, resta concluir que o Réu fez cessar validamente o contrato de trabalho, por abandono do trabalho, cessação que ocorreu no dia 29 de Setembro de 2014.
 Com efeito, perfilhamos o entendimento plasmado por Pedro Furtado Martins na obra “Cessação do Contrato de Trabalho”, 4ª edição revista e actualizada, pag.619 que remete para o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 11 de Julho de 1994 referindo que: “o contrato tem-se por extinto na data em que a ausência teve início, « não no termo do prazo de 15 dias úteis referido no nº 2 do artigo 40º da [LCCT] como base da presunção de abandono, nem após a comunicação do empregador, referida no nº 5 daquele artigo». Esta é a consequência que se retira da circunstância  de o abandono do trabalho valer como resolução do contrato, por iniciativa do trabalhador como igualmente faz notar esta importante decisão judicial, esclarecendo ainda que o prazo fixado na lei para a duração da ausência se refere apenas à «data a partir da qual (o empregador) pode invocar a cessação do contrato, mas não impede o empregador de referir a cessação do contrato ao início da ausência reveladora do abandono.”

Na verdade, não faz sentido considerar a data da cessação do contrato como sendo a data da comunicação pois como refere o citado autor na pag. 681 da mesma obra, a comunicação corresponde “ à constatação da cessação do contrato” e como escreve Maria do Rosário Palma Ramalho in “Direito do Trabalho Parte II-Situações Laborais Individuais” pag. 1026, a comunicação tem um “carácter meramente procedimental não alterando, por isso, a configuração desta modalidade de cessação do contrato de trabalho que continua a ser da iniciativa do trabalhador”.

Assim, assente que está que o contrato de trabalho cessou por abandono do trabalho, importa, agora, apreciar o alegado erro na forma de processo e consequente absolvição do Réu da instância.

De acordo com o nº 1 do artigo 98-C do CPT, “ Nos termos do artigo 387.º do Código do Trabalho, no caso em que seja comunicada por escrito ao trabalhador a decisão de despedimento individual, seja por facto imputável ao trabalhador, seja por extinção do posto de trabalho, seja inadaptação, a acção de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento inicia-se com a entrega, pelo trabalhador, junto do tribunal competente, de requerimento em formulário electrónico ou em suporte de papel, do qual consta declaração do trabalhador de oposição ao despedimento, sem prejuízo do disposto no número seguinte.”

Do referido preceito decorre que esta acção especial apenas se aplica aos casos de despedimento individual comunicados por escrito ao trabalhador, seja por facto que lhe seja imputável, seja por extinção do posto de trabalho, seja por inadaptação.

E como elucida Albino Mendes Baptista na obra “ A nova acção de impugnação do despedimento e a revisão do Código de Processo do Trabalho”, Reimpressão, pag.74”Fica de fora, desde logo, o despedimento verbal e até o procedimento disciplinar (mesmo com realização de instrução) que termine em despedimento verbal.
Fica ainda de fora um cenário de invocação de abandono do trabalho (art.403.º do CT) quando não estão verificados os respectivos pressupostos.
(…).”

Por outro lado, como se escreve no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 7.6.2016, in www.dgsi.ptUma comunicação de cessação contratual por abandono de trabalho não equivale a uma decisão escrita de despedimento para os efeitos do preceituado no nº 1º do artigo 98º - C do CPT /2010, nomeadamente em termos de aplicabilidade do processo especial ali contemplado”.

No caso, o Autor recebeu a carta em que lhe é comunicada a cessação do contrato de trabalho por abandono do trabalho em 26.12.2014, o que nos levaria a considerar, embora precipitadamente, que deveria ter instaurado uma acção declarativa sob a forma de processo comum prevista e regulada nos artigos 51º e seguintes do CPT, em vez da acção especial de impugnação da regularidade e licitude do despedimento como fez.
Com efeito, como se afirma no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 15.12.2016, in www.dgs.pt, “I.O despedimento individual, tanto quando fundado em causas subjectivas como objectivas, é sempre uma decisão unilateral e receptícia emitida pelo empregador tendo como destinatário o trabalhador (art.os 224.º, n.º 1 do CC e 353.º, n.º 1 e 357.º, 367.º, n.º 1 e 373.º do CT); já o abandono do trabalho o é deste relativamente àquele, valendo como denúncia do contrato ainda que apenas invocável pelo empregador após lhe comunicar por carta registada com aviso de recepção os factos constitutivos, reais ou presumidos (art.º 403.º, n.os 1, 2 e 3 do CT).

II.- Assim, por definição, a forma processual adequada para o trabalhador impugnar o abandono do trabalho que lhe seja comunicado por escrito (carta registada com a/r) do empregador é a acção declarativa comum e não a especial de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento (art.os 546.º, n.º 2 do CPC e 21.º, 51.º e 98.º-C, n.º 1 do CPT).

II.-Intentando o trabalhador a acção especial ao invés da comum, ocorre a nulidade processual do erro na forma de processo; e se o fizer apresentando requerimento em formulário próprio e não petição inicial em que exponha os factos que constituem a causa de pedir e conclua pelo pedido adequado, nenhum acto pode ser aproveitado, daí decorrendo a excepção dilatória da nulidade de todo o processo, de conhecimento oficioso e com a consequente absolvição do réu da instância (art.os 98.º,-C, n.º 1 do CPT e 552.º, n.º 2, als. d) e e), 193.º, n.º 1, 196.º, 576.º, n.º 2 e 577.º, alínea b) do CPC).”

Contudo, também é verdade que o Autor, na mesma, data (26.12.2014) recebeu a comunicação de que lhe fora instaurado um procedimento disciplinar e, posteriormente, acabou por receber a decisão de despedimento, pelo que, em face deste novo facto, entendemos que nada obstava a que intentasse a presente acção especial.

Ora, de acordo com o artigo 98.º I do CPT:
“ 1- Declarada aberta a audiência pelo juiz, o empregador expõe sucintamente os fundamentos de facto que motivam o despedimento.
2- Após a resposta do trabalhador, o juiz procurará conciliar as partes, nos termos e para efeitos dos artigos 52.º e 53.º.
3- Caso verifique que à pretensão do trabalhador é aplicável outra forma de processo, o juiz abstém-se de conhecer do pedido, absolve da instância o empregador e informa o trabalhador do prazo de que dispõe para intentar acção com processo comum.
(…).”

Analisada a acta da audiência de partes (fls.33 dos autos), logo ressalta que a empregadora nada disse sobre a cessação do contrato por abandono do trabalho nem sobre a existência de erro na forma de processo. O que consta da acta é que “ …deu-se a palavra ao mandatário da Entidade Empregadora e à mandatária do Trabalhador nos termos do disposto no artigo 198º-I nºs 1 e 2 do Código de Processo do Trabalho que, no seu uso, disseram que remetem a sua posição para os articulados respectivos.”

Assim, é claro que na audiência de partes o Tribunal a quo não podia verificar que à pretensão do trabalhador era aplicável outra forma de processo isto, por um lado, porque o formulário foi instruído com a decisão de despedimento (fls. 4 a 8) e, por outro, porque a empregadora também não invocou que, anteriormente à decisão de despedimento, comunicara ao trabalhador a cessação do contrato por abandono do trabalho.

Mas mais, face à pretensão do Autor constante do formulário que se encontrava devidamente instruído com a decisão de despedimento, não havia fundamento legal para que se considerasse verificado o erro na forma do processo e se absolvesse o Réu da instância; era esta a forma de processo correcta para impugnar o despedimento.

E a verdade é que, salvo o devido respeito e não obstante ter ficado provado que o contrato de trabalho cessou por abandono do trabalho, entendemos que não se verifica o alegado erro na forma do processo.

Com efeito, o que se verifica é que em consequência da “defesa” apresentada pelo empregador no articulado motivador resultou provada uma excepção peremptória consistente na invocação de factos que integram o abandono do trabalho que impedem o efeito jurídico dos factos articulados pelo Autor, excepção que, de acordo com o nº 2 do artigo 576º do CPC, importa a absolvição total ou parcial do pedido.

E assim, tendo o Réu provado que o contrato de trabalho já tinha cessado por abandono do trabalho devidamente comunicado, então, a consequência a retirar é que a presente acção improcede em tudo aquilo que respeita ao despedimento, tanto mais que cessado o contrato extinguiu-se, em simultâneo, o poder disciplinar.

Consequentemente, porque relacionadas com o alegado despedimento, fica prejudicado o conhecimento das restantes questões suscitadas no recurso.

Por outro lado, tendo o Autor peticionado, em reconvenção, outros créditos laborais que não decorrem do despedimento, mas que são devidos na sequência da cessação do contrato de trabalho e cuja existência não é posta em causa pelo Recorrente nas suas conclusões (nas alegações e nas conclusões o Recorrente apenas questiona o valor da remuneração do trabalhador para efeitos do cálculo da indemnização, por entender que aquela não podia ser a prevista no Acordo de Cedência Ocasional já denunciado, mas a prevista no contrato de trabalho em vigor, nada referindo quanto às férias, subsídios de férias e de Natal e proporcionais do ano da cessação do contrato), então, face ao disposto nos artigos 127º, nº 1, al. b), 237º, 245º, nº 1, al. b), 264º, nºs 1 e 2, 263º, nº 1 e nº 2, al. b), e 278º, nºs 1, 2 e 5, todos do CT, deverá manter-se a sentença recorrida na parte em que condena o Réu a pagar ao Autor 50% das seguintes retribuições:
- € 12.688,64 de férias vencidas em 01/01/2014;
- € 12.688,64 de subsídio de férias vencido em 01/01/2014;
bem como deve o Réu ser condenado a pagar ao Autor 50% das seguintes quantias:
- € 9.516,48 relativos a 9/12 de férias do ano da cessação;
- € 9.516,48 relativos a 9/12 do subsídio de férias do ano da cessação.
- € 9.516,48 relativos a 9/12 do subsídio de Natal do ano da cessação.
A estas quantias acrescem juros de mora, à taxa legal, a partir dos respectivos vencimentos e até integral pagamento.
Considerando o disposto nos nºs 1 e 2 do artigo 527º do CPC, as custas da acção e do recurso são da responsabilidade de ambas as partes na proporção do respectivo decaimento.

Decisão.

Em face do exposto, acordam os Juízes deste Tribunal e Secção em:
-Julgar parcialmente procedente a impugnação da matéria de facto nos termos supra citados;
- Julgar o recurso parcialmente procedente e, em consequência, julgando a acção improcedente revogam a sentença recorrida na parte em que declarou a ilicitude do despedimento e condenou o Réu a pagar ao Autor as quantias a que aludem as alíneas a), b) e d) do dispositivo;
- Julgam parcialmente procedente a reconvenção e condenam o Réu, BBB, S.A. a pagar ao Autor 50% das seguintes quantias:
- € 12.688,64 de férias vencidas em 01/01/2014;
- € 12.688,64 de subsídio de férias vencido em 01/01/2014;
- € 9.516,48 relativos a 9/12 de férias do ano da cessação;
- € 9.516,48 relativos a 9/12 do subsídio de férias do ano da cessação;
-€ 9.516,48 relativos a 9/12 do subsídio de Natal do ano da cessação
- Juros de mora, à taxa legal, sobre as referidas quantias, a partir dos respectivos vencimentos e até integral pagamento.
- Absolvem o Réu do pagamento das demais quantias a que alude a alínea c) do dispositivo (€ 101.509,12 de remuneração base (12.688,64 x 8 meses - Outubro 2014 a Abril 2015); € 12.688,64 de férias vencidas em 01/01/2015; € 12.688,64 de subsídio de férias vencido em 01/01/2015; € 3.172,16 de 3/12 de férias do ano da cessação;- € 3.172,16 de 3/12 do subsídio de férias do ano da cessação;- € 3.172,16 de 3/12 do subsídio de Natal de 2015)
Custas da acção e do recurso pelas partes na proporção do decaimento.



Lisboa, 26 de Abril de 2018



Maria Celina de Jesus de Nóbrega
Paula de Jesus Jorge dos Santos
Maria Paula Sá Fernandes