Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
3943/13.8T2SNT.1.L1-4
Relator: JOSÉ FETEIRA
Descritores: ACIDENTE DE TRABALHO
REVISÃO DE PENSÃO
COEFICIENTE DE ACTUALIZAÇÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 09/27/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: ALTERADA A SENTENÇA
Sumário: ITendo a Lei n.º 98/2009 de 04-09 revogado a Lei n.º 100/97 e o respetivo regulamento, ou seja, o D.L. 143/99 de 30-04, não adotou o legislador o mesmo procedimento em relação ao Decreto-Lei n.º 142/99 de 30-04 o qual foi mantido em vigor, devendo as normas constantes deste diploma, designadamente a prevista no n.º 1 do seu art. 6º atinente à atualização anual de pensões, ser aplicáveis aos acidentes de trabalho regulados por aquela primeira Lei;
IIPara efeitos do cálculo da pensão decorrente do incidente de revisão, quando do mesmo decorra alteração da capacidade de ganho do sinistrado, são ponderados exatamente os mesmos critérios que o foram aquando do cálculo inicial, fixando-se a nova pensão (revista) tal qual o fosse à data da alta, pelo que, por respeito ao princípio da unidade do sistema jurídico, constante do art. 9º, do Código civil, se a pensão revista deve ser calculada do mesmo modo que o foi a pensão inicial então os coeficientes de atualização devem sobre a mesma incidir como se estivesse a ser fixada desde o início, não obstante apenas ser devida desde a data da sua alteração.

(Sumário elaborado pelo Relator)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa.


Relatório:


Nos presentes autos de ação emergente de acidente de trabalho em que é sinistrado e Autor AAA, residente na (…) e entidade responsável a BBB., gora denominada por CCC, S.A. por força de fusão por incorporação conforme certidão permanente do Registo Comercial com o código de acesso (…), com sede na (…) Lisboa, veio esta, em 11-11-2016 requerer a instauração de incidente de revisão de incapacidade, com fundamento em, com elevada probabilidade, ter ocorrido uma alteração do estado clínico do Autor consubstanciada numa melhoria da lesão decorrente do acidente de trabalho de que o mesmo foi vítima.

Pediu, por isso, que o Autor AAA fosse submetido a uma nova avaliação médica para verificação da sua atual capacidade de ganho, formulando, para esse efeito os correspondentes quesitos.
Designada data para a realização de perícia médica, com a fixação dos quesitos a serem respondidos, reclamou a responsável seguradora quanto à formulação de quesitos efetuada pelo Mmo. Juiz, reclamação que obteve deferimento.

Realizada a referida perícia médica, o senhor perito emitiu o laudo de fls. 285 a 287 no qual concluiu haver agravamento do estado sequelar das lesões sofridas pelo sinistrado no acidente de que foi vítima e que constitui objeto dos autos, entendendo que deve ser considerada a atribuição de IPATH, em face da gravidade do quadro sequelar e a sua interferência – impedindo – a atividade profissional do Autor de jogador de futebol.

Concluiu que o sinistrado e aqui Autor AAA é portador de uma IPP de 3%, com IPATH a partir da data do pedido de revisão.

Notificadas as partes do teor deste laudo, nada disseram pelo que, seguidamente, o Mmo. Juiz proferiu sentença em 16-03-2017 que concluiu com a seguinte decisão:
«Nos termos e fundamentos expostos, altera-se o coeficiente de incapacidade de que padece o Sinistrado AAA em consequência do acidente de trabalho dos autos, de IPP de 1,5% com IPATH para IPP de 4,5% com IPTAH e, em consequência decide-se:
a)-Condenar a BBB, SA a pagar ao Sinistrado AAA uma pensão anual e vitalícia de € 86.532,04 (oitenta e seis mil quinhentos e trinta e dois Euros e quatro cêntimos), devida desde 11.11.2016, adiantada e mensalmente, até ao 3º dia de cada mês, correspondendo cada prestação 1/14 da pensão anual, sendo que nos meses de maio e novembro deverão acrescer mais 1/14, a título respetivamente, subsídio de férias e de Natal, acrescida de juros de mora à taxa legal desde data vencimento até integral pagamento, e até à data em que o Sinistrado complete 35 anos de idade (ou seja, 18.01.2023).
Custas do incidente a cargo da BBB, SA.».

Inconformado com esta sentença, dela veio o sinistrado e aqui Autor AAA interpor recurso de apelação para este Tribunal da Relação, apresentando alegações que termina mediante a formulação das seguintes conclusões:
1.ª)-A sentença em crise viola, entre outras, a norma contida no artigo 6.º, do Decreto-Lei n.º 142/99, de 30 de Abril.
2.ª)-No âmbito do presente incidente, o Tribunal a quo considerou existir agravamento da situação clínica do sinistrado e, em consequência, alterou o coeficiente de incapacidade de IPP de 1,5% com IPATH para IPP de 4,5% com IPATH.
3.ª)-Todavia, o cálculo da pensão não está correcto, porquanto o Tribunal a quo não teve em consideração os coeficientes de actualização fixados após a data da alta.
4.ª)-Conforme decidiu o STJ em Acórdão proferido em 03/03/2010, no processo 14/05.4TTVIS.C2.S1. “Sobre a pensão revista incidem os coeficientes de actualização vigentes desde a data em que a pensão foi, inicialmente, fixada não obstante a nova pensão só seja devida desde a data da entrada do requerimento que deu início ao incidente de revisão da pensão”.
5.ª)-Assim, no caso vertente, o valor da pensão revista e devida ao sinistrado a partir de 11.11.2016, data da apresentação do requerimento de revisão, é de € 89.755,23, ao invés de € 86.532,04 como determinado na decisão recorrida.
Termos em que deve ser revogada a decisão proferida no presente incidente de revisão de incapacidade, e ser a mesma substituída por Acórdão que condene a Companhia de Seguros Tranquilidade a pagar ao sinistrado/recorrente uma pensão anual e vitalícia de € 89.755,23, devida desde 11.11.2016.
Julgando assim, estarão, Venerandos Juízes Desembargadores, A fazer uma vez mais JUSTIÇA!

Contra-alegou a responsável seguradora deduzindo as seguintes conclusões:
A.–Interpõe o Recorrente o presente recurso, por não concordar com a parte da decisão da sentença que determina o valor da pensão anual e vitalícia, que não aplicou os coeficientes de actualização desde a data da alta.
B.–Com o devido respeito, outra não poderia ser a decisão do Tribunal “a quo”.
C.–A IPP de 4,5% apenas reporta-se à data do impulso do presente acidente, sendo que até essa data o sinistrado era portador de IPP de 1,5%.
D.–O cálculo do valor da pensão anual tem por base a IPP de que em determinado momento o sinistrado é portador. Significa isto que a aplicação dos coeficientes de actualização dos anos anteriores sobre o valor da pensão anual agora calculada consubstanciaria uma consideração retroactiva da IPP só agora fixada.
E.–Face ao exposto, sobre o valor da pensão anual e vitalícia determinada pelo cálculo da actual IPP de 4%, não caberá a aplicação dos coeficientes de actualização, devendo ser mantida a decisão da douta sentença do Tribunal “a quo”.
Nestes termos e nos mais de Direito, sempre com o douto suprimento de V. Exas., deverá o presente recurso ser julgado improcedente, mantendo-se na íntegra a sentença proferida pelo Tribunal “a quo”.

Admitido o recurso na espécie própria e com adequado regime de subida e efeito, foram os autos remetidos a esta 2ª instância para apreciação do mérito do mesmo.

Devolvidos os autos à 1ª instância para fixação do valor da causa na sequência da sentença recorrida, foi o mesmo fixado em € 955.817,51.

Remetidos, de novo, os autos a esta 2ª instância, determinou-se que fossem apresentados ao M.ºP.º (art. 87º n.º 3 do CPT), tendo a Exmo. Procurador-Geral Adjunto aposto apenas o seu visto.

Pelas razões que figuram de fls. 334 foram dispensados os vistos dos Exmos. Adjuntos.

Cabe, pois, apreciar do mérito do recurso em causa.

Apreciação
Dado que, como se sabe, são as conclusões de recurso que delimitam o seu objeto, em face das que são formuladas no recurso interposto pelo Autor/apelante sobre a sentença recorrida, suscita-se perante este Tribunal ad quem a questão de saber se no cálculo da pensão revista, o Tribunal a quo deveria, ou não, ter levado em consideração os coeficientes de atualização fixados após a data da alta e quais as consequências daí decorrentes face à sentença recorrida.

Fundamentos de facto:
Com interesse na apreciação da suscitada questão de recurso, resulta dos autos – designadamente da sentença proferida em 25/01/2016 e transitada em julgado – que:
1.–O sinistrado foi vítima de um acidente ocorrido em 3 de novembro de 2011, cerca das 19:00 horas no campo de futebol (…), sito no Estoril, quando exercia a sua profissão de atleta profissional ao serviço do (…) e do (…);
2.–Tal acidente consistiu em, no decurso de um jogo de futebol, ter ficado com o pé esquerdo preso na relva quando, em corrida, mudava de direção;
3.–Tendo sofrido entorse do joelho esquerdo;
4.–Em consequência da referida entorse, foi-lhe diagnosticada uma lesão osteocondral do côndilo interno e uma lesão do menisco interno;
5.–Para tratamento de tais lesões foi submetido a uma intervenção cirúrgica: Artroscopia cirúrgica;
6.–À data do acidente o sinistrado auferia uma remuneração anual de € 42.000,00 da responsabilidade do (…) e de € 128.004,00 da responsabilidade do (…);
7.–A responsabilidade emergente de acidentes de trabalho estava transferida para a BBB, S.A.;
8.–Na época desportiva de 2012/2013 o sinistrado foi cedido ao (…) e, embora tentasse retomar a prática desportiva, deixou de poder jogar futebol;
9.–Por sentença proferida nos autos em 25/01/2016 e transitada em julgado foi fixada ao sinistrado uma IPP de 1,5%, resultante da aplicação do fator 1,5 à IPP de 1%, com IPATH, com efeitos desde a data da alta fixada em 31/05/2012;
10.–Com base nessa mesma sentença, foi atribuída ao sinistrado uma pensão anual de € 85.512,01, devida desde 01/06/2012 até à data em que o mesmo completasse 35 anos de idade, bem como um subsídio por situação de elevada incapacidade no montante de € 3.898,48;
11.–Em 11 de novembro de 2016 a Ré BBB, S.A. requereu que o sinistrado AAA fosse submetido a exame de revisão da sua incapacidade;
12.–Submetido a exame médico de revisão, o senhor perito médico do tribunal considerou que o sinistrado estava afetado de uma IPP de 3% com IPATH a partir da data referida na alínea anterior;
13.–A sentença recorrida proferida em 16 de março de 2017 fixou, com trânsito em julgado, que o sinistrado AAA está afetado de uma IPP de 4,5% com IPATH desde aquela data de 11 de novembro de 2016.

FUNDAMENTOS DE DIREITO.

Antes de passarmos à apreciação da suscitada questão de recurso, importa considerar que, tendo o acidente de trabalho sofrido pelo Autor/apelante ocorrido em 3 de novembro de 2011 nas circunstâncias mencionadas nos precedentes pontos 1 a 4 e que aqui se dão por reproduzidas, tal apreciação deve ser levada a efeito tendo por base o estabelecido na Lei n.º 98/2009 de 04-09 que regulamenta o regime de reparação de acidentes de trabalho, Lei que entrou em vigor em 1 de janeiro de 2010 e é aplicável aos acidentes de trabalho ocorridos após esta data (cfr. arts. 187º n.º 1 e 188º), bem como o estabelecido pelo Decreto-Lei n.º 142/99 de 30-04, diploma que prevendo, para além do mais que aqui não releva, a atualização das pensões, não foi revogado nem alterado por aquela Lei, ao contrário do que sucedeu com a anterior LAT (Lei de Acidentes de Trabalho), ou seja, a Lei n.º 100/97 de 13-09 e o respetivo regulamento aprovado pelo Decreto-Lei n.º 143/99 de 30-04, diplomas que foram efetivamente revogados pela referida Lei n.º 98/2009 de 04-09 como resulta do disposto no art. 186º deste diploma.

Posto isto e como referimos, a questão suscitada no recurso em causa para apreciação por este Tribunal da Relação, consiste em saber se no cálculo da pensão revista – ou seja, a pensão atribuída na sentença recorrida ao sinistrado e Autor AAA após submissão deste a exame de revisão requerido pela responsável seguradora – deveria, ou não, o Mmo. Juiz do Tribunal a quo ter levado em consideração os coeficientes de atualização fixados após a data da alta (31/05/2012) e quais as consequências daí decorrentes face à sentença recorrida.

O regime da atualização das pensões devidas por acidente de trabalho – ou por doença profissional – foi introduzido na ordem jurídica portuguesa através do Decreto-Lei n.º 668/75 de 24-11 – com as redações que, sucessivamente, lhe foram dadas pelo Decreto-Lei n.º 456/77 de 02-11, pelo Decreto-Lei n.º 286/79 de 13-08, pelo Decreto-Lei n.º 195/80 de 20-06 e pelo Decreto-Lei n.º 39/81 de 07-03 – sendo que tal regime foi estabelecido face à desvalorização da moeda que então se verificava e ao consequente aumento do custo de vida como decorre do que se refere no preâmbulo daquele primeiro Decreto-Lei.

Como se refere no douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 03-03-2010 proferido no processo n.º 14/05.4TTVIS.C2.S1 e acessível em www.dgsi.pt, «[a] actualização das pensões, proclamada por tal diploma, estava, no entanto, condicionada a determinados critérios legais, quais fossem o valor anual da retribuição que, sendo indexado ao valor da remuneração mínima mensal legalmente fixada para o sector em que o trabalhador exercesse a sua actividade e para o território onde a exercesse, não poderia àquela remuneração mínima mensal ser superior, atento o art. 1.º, do citado diploma, e o grau de incapacidade permanente, necessariamente igual ou superior a 30%.

Por força da entrada em vigor da Lei n.º 100/97, de 13 de Setembro, … , as pensões emergentes de acidente de trabalho continuaram a ser susceptíveis de actualização quer nas situações em que o sinistrado se mostrasse afectado de uma incapacidade permanente – fosse ela parcial com coeficiente de desvalorização igual ou superior a 30%, fosse ela absoluta ou fosse absoluta para o trabalho habitual – quer nas situações em que do acidente viesse a resultar a morte do sinistrado e a pensão fosse fixada ao seu ou seus beneficiários, a menos que o valor da pensão nas enunciadas situações fosse inferior a seis vezes o valor da retribuição mínima mensal garantida mais elevada à data da fixação da pensão, caso em que, e à semelhança do que sucede com as pensões por incapacidade permanente parcial inferior a 30%, seria obrigatoriamente remível (art. 56.º da Lei n.º 143/99, de 30 de Abril, que veio regulamentar a Lei 100/97, de 13 de Setembro).

Tais pensões passaram, no entanto, a ser actualizadas nos mesmos termos em que o fossem as pensões do regime geral da segurança social, atento o disposto no art. 6.º, do D.L. n.º 142/99, de 30 de Abril – Dispôs o n.º 1 do referido art. 6.º: “As pensões de acidentes de trabalho serão anualmente actualizadas nos termos em que o forem as pensões do regime geral da segurança social”..».

Entretanto e como já referimos, tendo a Lei n.º 98/2009 de 04-09 revogado a Lei n.º 100/97 e o respetivo regulamento, ou seja, o D.L. 143/99 de 30-04, não adotou o legislador o mesmo procedimento em relação ao aludido Decreto-Lei n.º 142/99 de 30-04 o qual, desse modo, foi mantido em vigor, devendo as normas constantes desse diploma, designadamente a prevista no n.º 1 do seu art. 6º atinente à atualização anual de pensões, ser aplicáveis aos acidentes de trabalho regulados por aquela primeira Lei, como é o caso do acidente de trabalho dos autos, e isto, porquanto, sendo um dado assente que, por sentença proferida nos autos em 25/01/2016 e transitada em julgado, como consequência do acidente de trabalho sofrido pelo sinistrado AAA em 3 de novembro de 2011, foi-lhe fixada uma Incapacidade Permanente Parcial (IPP) de 1,5%, assim como uma Incapacidade Permanente e Absoluta para o Trabalho Habitual (IPATH) de jogador profissional de futebol, tudo com efeitos desde a data da alta fixada em 31/05/2012 (v. ponto 9 dos factos assentes), enquanto, por outro lado, também se sabe que a sentença agora recorrida, proferida em 16 de março de 2017, fixou – igualmente com trânsito em julgado na medida em que nessa parte não vem impugnada – que o sinistrado AAA está afetado de uma IPP de 4,5% com Incapacidade Permanente e Absoluta para o Trabalho Habitual (IPATH) desde a data de 11 de novembro de 2016, ou seja, desde a data em que foi requerido que o mesmo fosse submetido a exame médico de revisão (v. pontos 11 e 13 dos factos assentes), tendo havido, portanto, um agravamento da anterior IPP ao mesmo tempo que foi mantida a inicial IPATH, razão pela qual a pensão revista resultante deste agravamento de incapacidade está efetivamente sujeita a atualização anual nos termos dos mencionados diplomas legais.

Importa agora determinar se, como defende o Autor/apelante, a atualização da pensão revista se deve reportar a 1 de junho de 2012, ou seja, a partir da data da fixação inicial da pensão atribuída ao sinistrado em consequência do acidente de trabalho por ele sofrido e que constitui o objeto dos presentes autos, ou se apenas a partir de 11 de novembro de 2016, ou seja a partir da data em que ao sinistrado foi atribuída a pensão revista e que corresponde à data em que foi requerido o exame médico de revisão a que o mesmo foi submetido.

Ora, a este propósito e como também se referiu a dado passo do já mencionado Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, «… distinta da alteração do montante da pensão por força do incidente de revisão da incapacidade do sinistrado – que tanto pode ocorrer em razão da melhoria da sua capacidade de ganho, decorrente da melhoria das sequelas causadas pelo acidente de trabalho, como em razão do agravamento de tais sequelas, com inevitável repercussão na capacidade de ganho – é a sua actualização que, como vimos, tem subjacente razão distinta e que se prende com a inflação ou com a desvalorização da moeda.

Acresce que a lei dos acidentes de trabalho, ao não estatuir acerca do modo como há-de ser calculada a pensão decorrente de incidente de revisão, remete-nos, inelutavelmente, para os critérios – ou fórmulas – que presidiram ao respectivo cálculo inicial, com excepção, naturalmente, do que emerja desse incidente quanto à capacidade de ganho do sinistrado. Vale o exposto por dizer que para efeitos do cálculo da pensão decorrente do incidente de revisão – quando do mesmo decorra, naturalmente, alteração da capacidade de ganho do sinistrado – são ponderados, exactamente, os mesmos critérios que o foram aquando do cálculo inicial, fixando-se a nova pensão (revista) tal-qual o fosse à data da alta – cfr., Acórdãos do STJ de 25.03.1983 e de 17.06.1983, publicados, respectivamente, no BMJ n.º 325.º, pág. 499, e BMJ n.º 328º, pág.458. E, por respeito ao princípio da unidade do sistema jurídico, constante do art. 9º, do Código civil, se a pensão revista deve ser calculada do mesmo modo que o foi a pensão inicial então os coeficientes de actualização devem sobre a mesma incidir como se estivesse a ser fixada desde o início, não obstante apenas ser devida desde a data da sua alteração.

Do entendimento diverso – isto é, do entendimento de acordo com o qual a actualização só deveria incidir sobre a pensão revista a partir do momento em que esta fosse devida – resultaria a incongruência de, após vários anos desde a data da fixação inicial da pensão, vir a ser fixada uma pensão revista que, na medida em que resultante do cálculo a que obedeceu a sua fixação inicial, não reflectiria a desvalorização da moeda entretanto ocorrida. Aliás, de tal entendimento poderia mesmo resultar que, em casos de agravamento do estado do sinistrado com consequente atribuição de um coeficiente de desvalorização superior àquele que já era portador, lhe pudesse vir a ser fixada uma pensão inferior àquela que, até então, vinha percebendo (porque, entretanto, sujeita a actualizações), justamente em razão do cálculo da pensão revista não reflectir qualquer actualização dos factores que para o efeito relevam».

Ora, acompanhando-se, como se acompanha inteiramente este douto entendimento jurisprudencial e revertendo ao caso em apreço, diremos que, tendo em consideração a matéria de facto anteriormente mencionada em conjugação com o direito que lhe é aplicável e verificados que se mostram os pressupostos legais de atualização da pensão, não poderemos deixar de concluir que sobre a pensão revista atribuída ao sinistrado AAA incidem os coeficientes de atualização vigentes desde a data em que a pensão que lhe foi atribuída em consequência do acidente dos autos foi inicialmente fixada, ou seja desde 1 de junho de 2012, não obstante aquela pensão revista só ser devida ao sinistrado desde 11 de novembro de 2016, ou seja, a partir da data de entrada em juízo do requerimento que deu início ao incidente de revisão da pensão.

Deste modo, verifica-se que, assistindo ao sinistrado e Autor AAA o direito a uma pensão anual e vitalícia de € 86.532,04 {[(€170.004,00 x 70%) - (€170.004,00 x 50%)] x 4,5% + (€170.004,00 x 50%)} por força da IPP de 4,5% com IPATH de que é portador e tendo em consideração as disposições conjugadas dos art.ºs 23º, al. b), 47º e 48º, n.º 3, al. b), 71º e 72º da Lei n.º 98/2009 de 04-09, sobre essa pensão incidem as atualizações decorrentes da publicação das Portarias n.ºs 338/2013 de 21-11 (2,9%); 378-C/2013 de 31-12 (0,4%); 162/2016 de 09-06 (0,4%), razão pela qual é-lhe devida uma pensão anual e vitalícia no montante global de € 89.755,22 com efeitos desde 11 de novembro de 2016, pensão que tem de ser atualizada para o montante de € 90.204,00 por força da Portaria n.º 97/2017 de 07-03.

Procede, pois, o recurso interposto pelo Autor/apelante, razão pela qual a sentença recorrida, mais concretamente a alínea a) da sua parte dispositiva, não pode deixar de ser alterada em conformidade.

Decisão.
Nestes termos, acordam os juízes que integram a Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa em julgar a apelação procedente e, em consequência, decidem alterar a alínea a) do dispositivo da sentença recorrida nos seguintes termos:
a)-Condenar a BBB, SA – agora denominada por CCC, S.A. – a pagar ao Sinistrado AAA uma pensão anual e vitalícia de € 89.755,22 (oitenta e nove mil setecentos e cinquenta e cinco euros e vinte e dois cêntimos), devida desde 11 de novembro de 2016, pensão que é atualizada para o montante de € 90.204,00 (noventa mil duzentos e quatro euros) por força da Portaria n.º 97/2017 de 07-03 e que será paga adiantada e mensalmente até ao 3º dia de cada mês, correspondendo cada prestação 1/14 da pensão anual, sendo que nos meses de maio e novembro deverão acrescer mais 1/14, a título respetivamente, de subsídio de férias e de subsídio de Natal, acrescida de juros de mora à taxa legal desde data vencimento até integral pagamento e até à data em que o sinistrado complete 35 anos de idade, ou seja, até 18-01-2023.
b)-No mais mantém-se a sentença recorrida.
c)-Custas a cargo da Ré/apelada.



Lisboa, 2017/09/27  

        
José António Santos Feteira (relator)
Filomena Maria Moreira Manso
José Manuel Duro Mateus Cardoso