Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
81/17.8YRLSB-8
Relator: ANTÓNIO VALENTE
Descritores: TRIBUNAL ARBITRAL
COMPETÊNCIA MATERIAL
CONTRATOS DE SWAP
CLÁUSULAS COMPROMISSÓRIAS
COLIGAÇÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 06/14/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I.– Celebrados diversos contratos de swap entre diversos particulares e o mesmo Banco, regidos por um contrato quadro idêntico em todos os casos, verifica-se que a procedência dos pedidos depende essencialmente da interpretação e aplicação das mesmas regras de direito ou de cláusulas de contratos perfeitamente análogas, o que legitima a coligação, nos termos do art. 36º nº 2 do CPC.

II.– Tendo cada um dos Autores acordado com o Banco, nos contratos que com este celebrou, a competência do tribunal arbitral para julgar litígios emergentes de tais contratos, tais cláusulas compromissórias mantêm-se em caso de coligação.

III.– Isto porque a coligação não afectada a pluralidade de relações materiais controvertidas e respectivos pedidos.

IV.– No caso dos autos, a ligação entre essa pluralidade de relações resulta da aplicação das mesmas regras de direito e das mesmas regras contratuais do Contrato Quadro.

(Sumário elaborado pelo relator)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa. 


Relatório:


Nos autos em que são AA Clínica Médica da Linha Lda, Pórtico-Gabinete de Engenharia Lda, Hospitex-Material Hospitalar Lda e outros e Réu o Banco Santander Totta SA, foi proferida decisão, em sede de Tribunal Arbitral, com o seguinte teor:
– A análise dos factos que constituem causa de pedir e daqueles que a Demandada invoca para demonstrar a improcedência dos pedidos, revela uma tendencial identidade, homogeneidade, ou paralelismo dos factos controvertidos, que se repetem a respeito dos vários casos, o que permite caracterizar o litígio nos termos exigidos pelo nº 2 do art. 30º do CPC “a procedência dos pedidos principais depende essencialmente dos mesmos factos ou da interpretação e aplicação das mesmas regras de direito ou de cláusulas de contratos perfeitamente análogas"

– Nestes termos e por estas razões, o Tribunal considera improcedentes as excepções processuais de incompetência e de inadmissibilidade da coligação, invocadas pela Demandada, considerando-se competente para conhecer num único processo os pedidos formulados em coligação activa pelas 15 Demandantes contra a Demandada, ao abrigo de 15 convenções de arbitragem totalmente iguais.
“ Uma vez que a decisão não está dependente de prova ulterior, a mesma é tomada desde já no processo, ficando assim a Demandada em condições de, querendo, impugná-la autonomamente junto aos Tribunais Estaduais.”

O Banco requerido vem impugnar tal decisão, concluindo que:
– Ao contrário do que entendeu o Tribunal Arbitral, o litígio multipartes afigura-se inadmissível quer à luz das convenções de arbitragem quer à luz da lei.
–  Tal como consta do ponto 3.3.2 da presente Impugnação - para onde se remete -, o que cuida saber no caso concreto é da admissibilidade da cumulação no âmbito de um único processo arbitral multipartes dos litígios abrangidos pelas 15 convenções de arbitragem celebradas entre as 15 Demandantes e o Demandado  (cf. Docs. 1 a 15 juntos).
– Visto está que o que importa em primeira linha é saber se as 15 convenções de arbitragem permitem ou não a dita arbitragem colectiva ou multipartes. Só no caso desta primeira pergunta merecer resposta afirmativa é que cumpre indagar em que termos e condições é que essa arbitragem colectiva é admitida em face da
natureza e especificidades do próprio processo arbitral.                                                                                               
– Apesar de posteriormente poder vir até a considerar-se que a "coligação" é admissível (seja à luz das regras do CPC ou outras) o facto é que, se as convenções de arbitragem não previrem a possibilidade de litígio multipartido, a respectiva admissibilidade há-de resultar da interpretação da vontade das partes e estará naturalmente condicionada pela natureza e princípios do processo arbitral.
– Importa referir que se trata no caso concreto de 15 de convenções de arbitragem que não prevêem a possibilidade de arbitragem multipartes e que, por isso, se dizem silentes relativamente a tal questão.
– O Tribunal Arbitral considerou, e bem, que nem a LAV nem o Regulamento do Centro de Arbitragem previam a possibilidade de cumulação inicial de litígios ou de acções, tratando-se de uma lacuna (cf. ponto 13 da Decisão Impugnada).
– Salvo devido respeito, andou mal o Tribunal Arbitral ao considerar ser de admitir essa dita cumulação de acções sob a forma de coligação nos autos de processo arbitral com base no facto de cada convenção de arbitragem [mandar] expressamente aplicar o CPC subsidiariamente, estando a coligação activa ou passiva expressamente pelo art.36º do CPC.
A resposta à pergunta sobre se as convenções de arbitragem admitem a arbitragem multipartes não se alcança pela aplicação a título supletivo das nonnas previstas para um instituto específico no âmbito do processo civil (a coligação), mas por recurso à interpretação da fonte do poder jurisdicional dos árbitros, ou seja, à vontade das partes à data da contratação da convenção.
– A aplicação supletiva do CPC apenas pode servir para completar naquilo que o texto das convenções de arbitragem, o Regulamento do Centro de Arbitragem e a NLAV forem omissos. Não é seguramente os casos de pluralidade de partes no âmbito de um único processo arbitral.
– A admissibilidade do litígio multipartido há-de resultar da vontade das partes (à data da contratação) e, posteriormente e em termos de roupagem, do regime supletivo escolhido.
– Tal como consta do ponto 3.3.1 da presente Impugnação - para onde se remete-, a esmagadora parte da doutrina não admite a aplicação mecânica do regime do CPC ao processo arbitral, designadamente e em particular no que respeita à coligação, essencialmente por motivos que se prendem com a natureza contratual da convenção de arbitragem e com as especificidades próprias do processo arbitral.
– A isto acresce que, a jurisprudência ainda e apenas teve oportunidade de se debruçar sobre casos em que a convenção de arbitragem previa a pluralidade de partes e, portanto, daí apenas se pode extrair que a coligação seria admissível neste particular caso na medida em que as convenções permitissem a pluralidade de partes (o que não sucede) e na ausência de convenção em contrário (o que já parece suceder).
                                                                                                            
– Donde, de uma perspectiva normativa, não poderia ser extraída a admissibilidade de uma arbitragem colectiva ou multipartes, diversamente do que consta da Decisão Impugnada, facto pelo qual deve a mesma ser anulada e substituída por outra que conheça da incompetência do Tribunal Arbitral e, em consequência declare extinta a instância.
– Ainda de uma perspectiva normativa, o Tribunal Arbitral considerou que a arbitragem colectiva seria sempre admissível à luz da garantia constitucional da tutela jurisdicional efectiva, na medida em que a mesma fosse reconhecida como necessária para permitir às Demandantes com menos recursos para obter tutela jurisdicional efectiva (cf. ponto 13 da Decisão Impugnada)
– Porém, tal como resulta do ponto 3.2.2 da presente Impugnação – para onde se remete -, este argumento normativo não justifica a admissibilidade de um litigio multipartido / arbitragem colectiva.
– Em termos sucintos refira-se que, qualquer insuficiência económica ou desproporção dos meios económicos de que qualquer das Demandantes padecesse não lhe permitiria furtar-se aos efeitos da convenção de arbitragem, donde, jamais seria por essa via que se justificaria a admissibilidade da arbitragem colectiva.
– É entendimento pacífico que as pessoas colectivas que tenham sido instituídas por particulares para a realização de uma actividade económica destinada à obtenção de lucros, devem encontrar-se dotadas de uma estrutura organizativa e financeira capaz de fazer face aos custos previsíveis da sua actividade, incluindo os que resultem da litigiosidade normal que a gestão comercial frequentemente implica, sendo que as dificuldades ou insuficiências económicas de uma pessoa colectiva com fins lucrativos não constitui causa justificativa de afastamento da convenção de arbitragem.
– Mais, se as pessoas colectivas com escopo lucrativo não têm direito a apoio judiciário - sendo certo que tal opção legislativa se revela conforme a Constituição da República Portuguesa - então é evidente que o facto de uma arbitragem implicar custos alegadamente incomportáveis para as Demandantes (o que não se concede) jamais poderia, em qualquer caso, constituir uma violação do disposto no artigo 20º da Constituição da República Portuguesa.
– Donde, uma vez mais, de uma perspectiva normativa, não poderia ser extraída a admissibilidade de uma arbitragem colectiva ou multipartes, diversamente do que consta da Decisão Impugnada.
– Termos em que sempre deveria ter-se por verificada a incompetência do Tribunal Arbitral, extinguindo-se a instância arbitral, também por esta via.
– Chegados a este ponto, visto está que o Tribunal Arbitral jamais poderia recorrer a uma perspectiva puramente normativa para admitir a possibilidade de uma arbitragem colectiva e, assim, considerar-se competente para conhecer dos 15 litígios aqui cumulados com fundamento nas 15 convenções de arbitragem.

– Tal como consta do ponto 3.2.3 da presente Impugnação - para onde se remete -, a resposta sobre a admissibilidade de uma arbitragem multipartida que envolva litígios distintos depende sempre da interpretação da vontade das partes e da natureza do processo arbitral.
- A convenção de arbitragem desempenha o papel central no âmbito das chamadas arbitragens multi partes, nas quais o problema se desloca para o plano subjectivo da convenção: a convenção de arbitragem é um negócio jurídico inter partes sendo que o que releva  é a vontade das partes à data da respectiva celebração.
– É, assim, a vontade das partes ao momento da celebração da convenção de arbitragem que releva para efeitos de admissibilidade de pluralidade de partes no âmbito de um único processo arbitral.
– O facto de se tratar de 15 convenções de arbitragem com redacção igual e idênticas não significa que as mesmas percam a sua autonomia ou que crie entre elas elo de ligação, dependência ou conexão entre as mesmas, as quais permanecem abrangendo relações contratuais totalmente diferentes e independentes.
– Também não se encontra em qualquer das convenções de arbitragem uma remissão para as outras. Ou sequer se encontra uma tal remissão relativamente ao complexo unitário contratual em que cada uma das 15 convenções de arbitragem se insere.
– Deve acrescentar-se que, olhando-se a cada uma das cláusulas compromissórias é com simplicidade cristalina que se extrai que cada uma delas apenas prevê o recurso à arbitragem voluntária para dirimir os litígios emergentes da relação contratual entre as partes integrada pelo Contrato-Quadro em que o pacto arbitral se insere.
Mais, inexiste qualquer cláusula expressa que determine a extensão do objecto da convenção de arbitragem - e, assim, da extensão da competência do Tribunal Arbitral - para abranger outros litígios do mesmo tipo que se encontrassem abrangidos por outras convenções de arbitragem análogas ou semelhantes.
– Neste conspecto, na ausência de indicação expressa das partes, entrar-se no tema da interpretação da vontade das partes no momento da contratação enquanto fonte do poder jurisdicional dos árbitros.
– Assim, vista que está a natureza de negócio jurídico privado da convenção de arbitragem, é evidente que a mesma está sujeita às regras gerais de interpretação do negócio jurídico, designadamente em conformidade com o disposto no artigo 236.° e no artigo 238.°, ambos do Código Civil.

Sendo atendíveis todos os coeficientes ou elementos que um declaratário medianamente instruído, diligente e sagaz, na posição do declaratário efectivo, teria tomado em conta, não pode olvidar-se que o presente caso se reporta a convenções de arbitragem e relações contratuais celebradas entre partes distintas, em momentos separados no tempo, no âmbito de relações contratuais sem qualquer conexão ou relação de dependência.
– É evidente que, na data da contratação das 15 convenções de arbitragem nenhuma das Demandantes pôde sequer prever que iria associar-se às outras no âmbito de um litígio multipartido.
– Assim, atenta a redacção da convenção de arbitragem - cf. o nº 1 da Cláusula 41ª dos Contratos Quadro -, no contexto supra descrito, sempre há a concluir que a vontade exteriorizada pelas partes contida na formulação "os diferendos que possam surgir entre as partes no âmbito do presente contrato são dirimidos por um tribunal arbitral” é no sentido de abranger todo e qualquer litígio que possa surgir apenas entre aquelas concretas partes, a respeito da relação jurídica unitária entre elas estabelecida e não quaisquer outros.
– Donde, seja pela via da previsão expressa seja pela via interpretativa, as convenções de arbitragem em causa nestes autos não prevêem a arbitragem multipartes, sendo inclusivamente de considerar que a interpretação das convenções de arbitragens juntas à presente Impugnação, de acordo com o respectivo elemento literal, contêm implicitamente uma convenção em sentido contrário - ou seja, no sentido da inadmissibilidade do litígio multipartes -, na medida em que circunscrevem os respectivos efeitos aos litígios emergentes entre as partes signatárias e no específico âmbito de determinadas operações contratadas.
– Termos em que, por esta via, seria sempre de rejeitar a competência do Tribunal Arbitral para conhecer no âmbito de um único processo os 15 litígios cumulados com base nas 15 convenções de arbitragem.
– Ainda assim, resta, então, indagar sobre se da vontade das partes em arbitrar "em grupo" (no momento da contratação) no âmbito de um processo arbitral único multipartido pode ser presumida ou pode presumir-se da natureza dos contratos ou dos diferendos, tal como defendeu o Tribunal Arbitral (cf. ponto 14 da Decisão Impugnada).
– Em abono da sua tese, o Tribunal Arbitral socorre-se de um paralelismo com o que o domínio das arbitragens de investimento, aludindo para o efeito ao caso "Abaclat" , em que milhares de investidores demandaram conjuntamente a República Argentina numa arbitragem ICSID.

– Porém, tal como consta do ponto 3.2.4 da presente Impugnação - para onde se remete -, não existe no concreto caso qualquer paralelismo com as arbitragens de investimento, o que resulta do simples facto de as arbitragens ICSID, diversamente do que sucede no presente caso, não têm a sua fonte em contratos de direito privado / convenções de direito privado, mas antes em convenções internacionais multilaterais ou bilaterais por meio das quais os Estados outorgantes sujeitam voluntariamente à arbitragem os litígios que surjam entre si e os nacionais de um Estado membro signatário da mesma convenção que tenha subscrito um produto de investimento.
– Por um lado, conforme se deixou evidenciado, não há qualquer razão que permita concluir que a tutela jurisdicional das 15 Demandantes apenas seja efectiva com uma arbitragem colectiva, antes pelo contrário, pode causar um enorme entorpecimento do processo arbitral, atendendo a que os factos que subjazem a cada um dos 15 casos são completamente distintos
– É inadmissível a presunção do consentimento do Demandado na arbitragem colectiva.
Ainda assim, cumpre deixar aqui umas notas a propósito das circunstâncias que o Tribunal Arbitral refere como sendo aptas a presumir o dito consentimento do Demandado numa arbitragem colectiva.
– O primeiro dos elementos identificados pelo Tribunal Arbitral prende-se com a interpretação mais favorável ao abrigo do disposto no nº 2 do artigo 11.° do RJCCG e, portanto, no sentido da admissibilidade do litígio multipartes das Demandantes contra o Demandado (segundo o entendimento do Tribunal Arbitral).
– Sucede que, não obstante as Demandantes terem alegado uma série de factos tendentes à qualificação da convenção de arbitragem como uma cláusula contratual geral, a verdade é que o Demandado impugnou-os. Persiste, nesta fase, controvertido o facto de a convenção de arbitragem ser ou não uma cláusula contratual geral.
– Para beneficiarem do aludido regime, as Demandantes teriam, em concreto, de alegar e provar que se está perante aquela tipologia de cláusulas, em conformidade com o disposto no nº 1 do artigo 342.° do CC, o que não sucedeu.
– A que acresce que, tendo existido negociações prévias à contratação o RJCCG não merece aplicação ao concreto caso que nos ocupa, tal como vem sendo entendimento na jurisprudência dos Tribunais superiores.
– As Demandantes contrataram os swaps e as convenções de arbitragem no e para o exercício da respectiva actividade comercial e, portanto, é altamente controverso que possam merecer a mesma tutela que qualquer incauto consumidor pessoa singular, sem qualquer fim lucrativo, que adquire a uma empresa especializada um produto ou serviço para consumo pessoal.
– Decidiu já o Supremo Tribunal de Justiça que tendo uma sociedade comercial adquirido um produto para uso no âmbito da sua actividade, não beneficia do regime próprio dos direitos do consumidor.
             
– Por último, sempre seria dúbio que, a interpretação no sentido da admissibilidade da arbitragem "colectiva" fosse mais favorável às Demandadas, na medida em que o facto de ficar mais barato, desde logo, não é capaz de depor favoravelmente à admissibilidade do litígio multipartes, posto que não se suscitam aqui no concreto caso temas relacionados com a tutela efectiva carecer da intervenção de todas 15 Demandantes e não merece aqui acolhimento a doutrina da insuficiência económica.
– Assim, a interpretação das convenções de arbitragem no sentido da admissibilidade da arbitragem multipartes apenas seria mais favorável às Demandantes caso houvesse algum risco de decisões contraditórias e incompatíveis e elas pudessem aproveitar eficiências do processo e obter uma decisão mais célere, definitiva e sem contradições - o que, no concreto caso, não sucede.
– Por outo lado, refere o Tribunal Arbitral que a arbitragem colectiva se afigura como a forma mais consistente com o tratamento uniforme e sem contradições que se presume que as partes tenham querido ao inserir as convenções de arbitragem nos Contratos-Quadros (condições gerais) sempre e quando as mesmas forem sendo suscitadas a respeito dos vários contratos celebrados com as diversas Demandantes.
– Ora, apesar de impressiva a argumentação, o facto é que do facto de as convenções arbitrais constarem dos Contratos-Quadro não pode presumir-se que as partes e, em especial o Banco Demandado, tenha querido mais do que uniformizar o procedimento de resolução de litígios sempre e quando estejam em causa quaisquer operações financeiras (e não só swaps) previstas nas aludidas condições gerais.
– Olhando-se à realidade do Banco Demandado, bem se entende a vontade e a necessidade de adoptar procedimentos de resolução de litígios que permita uma resolução célere, eficaz e definitiva dos diferendos que o opuserem a clientes.
– Ademais, tudo se passou de forma diferente, em momentos diferentes, realidades diferentes e circunstâncias diferentes e contou com intervenientes diversos. Assim, é natural que as questões não sejam as mesmas, mas as específicas de cada caso, donde não pode presumir-se uma vontade de tratamento uniforme e sem contradições.
– Além do que, a vontade presumida não pode, também, exceder os limites daquilo que é o razoável dentro da realidade de facto de cada contratante e o entendimento a que se chega por via da interpretação da vontade presumida terá de ser, em abstracto, genericamente aplicável a todos os casos semelhantes.
– Tendo em consideração que o Banco Demandado tem milhares de clientes com operações de derivados financeiros contratadas e que todas essas operações podem, em abstracto, levantar o mesmo tipo de questões, não pode presumir-se pela vontade do Demandado no sentido da admissibilidade da arbitragem "colectiva" .
           
– Presumir-se a vontade do Demandado no sentido da admissibilidade da arbitragem colectiva equivaleria a dizer-se que o Demandado previu e quis que todos os clientes com quem contratou operações de derivados financeiros e que suscitassem questões de uma forma mais ou menos homogénea pudessem iniciar conjuntamente um processo arbitral contra si. O resultado seria absurdo... aqui são 15, mas poderiam ser 500 ou 1000, bastando utilizarem todas o mesmo método de articulação que as aqui 15 ... Não é plausível que tal suceda quando se trata de um Banco internacional com milhares de clientes.
– Donde sempre se concluiria pela ausência de circunstâncias relevantes para concluir pela vontade presumida no que se refere à admissibilidade da arbitragem colectiva, sempre se concluiria pela inadmissibilidade do litígio multipartes à luz das convenções de arbitragem.
– Ademais, tal como consta do ponto 3.2.6 da presente Impugnação - para onde se remete -, a admissibilidade da arbitragem "colectiva" no presente caso que nos ocupa importa uma clara violação do princípio da igualdade de partes, sendo também um motivo para anulação da Decisão Impugnada e substituição por outra que declare o Tribunal Arbitral incompetente e ordene a extinção da instância.
– Na fase da constituição do Tribunal Arbitral aplica-se o princípio da autonomia da vontade, sendo as partes livres de determinar o número de árbitros e escolher os árbitros que irão decidir o litígio que as opõe. A este princípio acresce o da igualdade das partes.
– Com efeito, à luz de cada uma das 15 convenções de arbitragem as partes ali contratantes previram e acordaram que os litígios emergentes da concreta relação contratual por ela abrangida seriam dirimidos por um tribunal arbitral, constituído por três árbitros, nomeando cada uma das partes um árbitro e sendo o terceiro designado pelos dois primeiros.
– Cada convenção de arbitragem prevê a constituição de um tribunal arbitral para dirimir o litígio por si abrangido e a escolha de um árbitro por cada uma das partes para dirimir aquele concreto litígio.
– O problema coloca-se na violação do direito de escolha de árbitro por parte do Demandado na medida em que, mercê da cumulação de litígios fundada na cumulação de convenções arbitrais, se vê obrigado a escolher apenas um árbitro para dirimir os 15 litígios totalmente distintos, quando na realidade lhe assiste o direito, ao abrigo dessas 15 convencões de arbitragem, de participar na constituicão de 15 tribunais arbitrais (1 por convenção arbitral) e designar, consoante cada caso concreto, o árbitro que entende ser mais adequado à resolução de cada litígio em concreto.
– Isto porque, o facto de as Demandantes invocarem variadíssimas questões de direito como sendo potencialmente aplicáveis a todos e cada um dos 15 casos não cria, por si, uma qualquer homogeneidade nas normas de direito a aplicar em todos os casos para a sua resolução. Assim, o Demandado vê-se coarctado no seu direito de designar um árbitro para cada caso, consoante as respectivas especificidades e a específica questão que se suscite.
            
– Mais, diversamente do que foi entendido na Decisão Impugnada, a cumulação de 15 litígios no âmbito de um processo arbitral único ao abrigo das 15 convenções de arbitragem, pelas circunstâncias do caso, equivale à nomeação 15 vezes do mesmo árbitro contra a mesma parte em litígios envolvendo operações de derivados financeiros, podendo questionar-se a respectiva independência.
– Tal como consta do ponto 3.2.7 da presente Impugnação - para onde se remete-, importa considerar que se trata aqui de 15 processos arbitrais cumulados sem que exista qualquer conexão entre si e que poderiam e deveriam ter sido iniciados em separado, caso em que estariam em causa 30 árbitros de parte.  
– Sendo evidente que pudessem existir repetições na nomeação de árbitros, não seria já normal que nas 15 acções arbitrais iniciadas à luz das 15 convenções de arbitragem fosse sempre nomeado o mesmo árbitro por parte da Demandante em cada uma delas contra o Demandado.
– É evidente que o mesmo árbitro de parte ser nomeado sucessivamente em arbitragens sobre operações financeiras de permuta de taxa de juro contra o mesmo Demandado suscita óbvios problemas de independência e até de imparcialidade.
– Apesar de o árbitro de parte não dever advogar a favor da parte que o nomeia, a verdade é que ao participar em arbitragens contra uma mesma parte fica, de certo modo, formatado e influenciado contra essa mesma parte.
– A que acresce que objecto de cada uma destas 15 arbitragens é semelhante (apenas e só) na medida em que diz respeito à relação contratual estabelecida entre um banco e os seus clientes no âmbito da contratação de operações financeiras de permuta de taxa de juro. Logo, o mesmo árbitro de parte iria ser colocado na posição de decidir 15 vezes contra o Demandado no âmbito de litígios na mesma zona de interesses.
–  Não se olvida que, apesar do disposto nas IBA Guidelines, a independência e imparcialidade devem ser apreciadas em função das circunstâncias do caso concreto, sendo que as circunstâncias do caso depõem no sentido presentes circunstâncias levam a concluir que objetivamente existe um risco provável de ausência de independência e consequente imparcialidade do árbitro assim nomeado, em conformidade com o que foi já decidido por este Tribunal superior.
– É também por este motivo que a conexão não é admitida em processos arbitrais, excepto se as partes expressamente nela acordarem.
Subsidiariamente, a Decisão Impugnada deve ser anulada e substituída por outra que declare incompetente o Tribunal Arbitral em virtude da inadmissibilidade legal da coligação e, em consequência, declare extinta a instância.
  
– Desde logo, andou mal o Tribunal Arbitral ao considerar que são de aplicar mecanicamente ao processo arbitral as regras previstas para o processo civil declarativo incluindo no que respeita à coligação, com base no que concluiu pela admissibilidade implícita da arbitragem "colectiva" e, consequentemente, se considerou competente. Ao fazê-lo, o Tribunal Arbitral desconsiderou por completo a própria natureza do processo arbitral.
– Tal como consta do ponto 3.3.2 da presente Impugnação - para onde se remete-, ainda que, em abstrato, fosse admissível a aplicação do instituto jurídico da coligação, tal como tratado pela jurisprudência e doutrina processualista portuguesa (o que jamais se concede e apenas por cautela de patrocínio se equaciona), seria sempre necessário "aplicar normas que combinem os princípios gerais subjacentes às regras relativas às pluralidades de partes com as especificidades da arbitragem."
– Recorde-se que o que está em causa é a formação de um processo arbitral alicerçado em 15 convencões de arbitragem distintas (embora com idêntica redação), insertas em 15 Contratos-Quadro que abrangem 15 relações contratuais distintas e sem qualquer conexão entre si.
São diversas as limitacões à aplicação do instituto jurídico processual da coligação previsto no Código de Processo Civil.
Em primeiro lugar, a admissibilidade de uma arbitragem multipartida depende sempre de uma compatibilização entre as necessidades da harmonia de decisões e a legitimidade contratual do tribunal.
Em segundo lugar, terá de existir uma conexão entre os vários Contratos-Quadro / relações contratuais / convenções de arbitragem, conexão que não poderá limitar-se ao facto do Demandado ser parte em todas as convenções de arbitragem. Apenas uma conexão relevante poderá justificar o julgamento das causas de pedir de todas as partes, o que in casu não sucede.
– Apesar de a jurisprudência já ser ter pronunciado pela admissibilidade da coligação na arbitragem num caso em que a convenção de arbitragem previa a pluralidade de partes - e, portanto, diverso daquele que nos ocupa -, a verdade é que a fonte de legitimação do tribunal arbitral era, nesse caso em particular, uma só convenção de arbitragem.
– No concreto caso, além de a convenção de arbitragem não prever a pluralidade de partes, parece existir uma clara convenção em contrário na medida em que as partes contratantes circunscreveram a arbitragem ao abrigo de cada uma das 15 convenções de arbitragem aos concretos litígios emergentes da relação contratual das ali partes contratantes e, portanto, signatárias da convenção de arbitragem.
– Não se vislumbra, portanto, como poderia a coligação ser admitida na arbitragem, ainda que implicitamente e por via da escolha do CPC como regime supletivo.
– Ademais, os vários contratos em causa nos autos não são contemporâneos nem conexos, pelo que não se está perante um problema de arbitragem complexa, no âmbito da qual se poderia eventualmente suscitar a admissibilidade de uma figura paralela à coligação prevista no CPC.

– Por conseguinte, considerando que [j) o caso que nos ocupa não é um caso de arbitragem complexa, na medida em que os vários contratos - nos quais se se encontram insertas as 15 convenções de arbitragem - não são contemporâneos nem conexos e (ii) cada uma das 15 convenções de arbitragem excluí, expressamente, a possibilidade de coligação no âmbito do processo arbitral, o regime da coligação do Código de Processo Civil jamais será de aplicar ao caso vertente.
Sem conceder, ainda que as convenções de arbitragem permitissem litígios multipartes e fosse aplicável à arbitragem a coligação do CPC, bom é de ver que a coligação seria inadmissível e, portanto, ilegal.

– Em primeiro lugar, tal como consta do ponto 3.3.3 da presente Impugnação - para onde se remete -, a coligação seria ilegal pela ausência de pedidos distintos.
– Isto porque, a coligação mais não é do que uma situação de combinação entre cumulação de pedidos e pluralidade de partes, apenas tendo lugar quando os pedidos cumulados não são deduzidos por ou contra a mesma parte (singular ou plural), mas sim discriminadamente deduzidos por ou contra partes distintas.

– Ora, a falta de formulação de pretensão distinta e diferenciada por parte de cada um dos Autores implica, por si só, coligação activa ilegal, excepção dilatória que tem como consequência a absolvição do Demandado da instância arbitral.
– Em segundo lugar, tal como consta do ponto 3.3.4 da presente Impugnação - para onde se remete - a coligação seria ilegal pela inexistência de conexão relevante para efeitos da respectiva admissibilidade.
– Desde logo cumpre referir que pouco importa ao presente caso o argumento segundo o qual seria admissível a coligação por na base dos factos expostos se encontrarem uma série de Contratos padronizados e comercializados pela mesma instituição de crédito.
– Visto está que não estamos nestes autos no domínio da interpretação e integração contratual, não dependendo a procedência dos pedidos principais essencialmente da interpretação e aplicação do clausulado dos Contratos cuja validade é impugnada.
   
 - Ademais, diversamente ao que as Demandantes invocaram e foi acolhido pelo Tribunal Arbitral (cf. ponto 17 da Decisão Impugnada), a procedência dos pedidos principais por elas formulado não depende essencialmente da interpretação e aplicação das mesmas regras de direito.
– Tal como ensina o Prof. JOSÉ ALBERTO DOS REIS, "[a] palavra «essencialmente» está ali posta para significar o seguinte: quando a questão a resolver seja substancialmente de facto, é necessário que os factos sejam os mesmos; quando seja de direito é indispensável que a solução dependa da interpretação e aplicação da mesma regra de direito"
– Desde logo, no caso concreto, bom é de ver que as questões a resolver são substancialmente de facto, após o que será, naturalmente, aplicado o direito.
– Os presentes litígios são fundamentalmente de facto, razão pela qual a coligação só seria lícita se a procedência dos pedidos dependesse essencialmente da apreciação dos mesmos factos E, neste ponto, não existe qualquer elemento de conexão relevante na medida em que, tal como reconhece o próprio Tribunal Arbitral, os factos concretos não são os mesmos (cf. ponto 17 da Decisão Impugnada).

– Ademais, considerou já o Supremo Tribunal de Justiça que "discutir num só processo contratos diferentes, celebrados em épocas diversas, com condições variáveis, equivalia a permitir a perturbação processual que o legislador teve em vista evitar. A coligação será ilegal sempre que os factos alegados sejam diversos por provirem de contratos diferentes e com elementos diversos para cada um deles". Tal é precisamente o caso dos autos, tal como reconhece o próprio Tribunal Arbitral (cf. ponto 17 da Decisão Impugnada).
– Dito isto, recuperando os ensinamentos do Prof. Joss ALBERTO DOS REIS, "[a]    palavra «essencialmente» está ali posta para significar o seguinte: quando a questão a resolver seja substancialmente de fàcto. é necessário que os fàctos sejam os mesmos; quando seja de direito é indispensável que a solução dependa da interpretação e aplicação da mesma regra de direito", além de factos diferentes e circunstâncias diferentes indiciarem por si só a necessidade de interpretação e aplicação de regras de direito diferente, basta olhar à vasta panóplia de causas de pedir / normas fundamento invocadas pelas Demandantes para a nulidade e, subsidiariam ente, para a anulabilidade para se entender que não está em todos os casos em causa a aplicação da mesma regra de direito, mas potencialmente de todas ou nenhuma das regras de direito invocadas.
– Donde, por ausência da conexão exigida nos termos do disposto no artigo 36.°, nº 2 do CPC, a coligação activa de Demandantes sempre seria ilegal e, portanto, determinaria a extinção desta instância, não podendo os autos de processo arbitral prosseguir, devendo ser extinta a instância.
 
– Por fim, tal como consta do ponto 3.3.5 da presente Impugnação - para onde se remete -, sempre cumpre referir que, diversamente do que entendeu o Tribunal Arbitral (cf. alínea e) do ponto 16 da Decisão Impugnada), no concreto caso do processo arbitral a coligação sempre encontra os entraves decorrentes do princípio da confidencialidade, da celeridade e eficiência do concreto processo arbitral e da imparcialidade e independência dos árbitros.
– Assim, ainda que se considerassem verificados todos os requisitos de que depende a admissibilidade da coligação, sempre haveria a alegar o que é evidente mesmo à luz das regras da LAV e do próprio CPC: o inconveniente grave de as causas serem instruídas, discutidas e julgadas conjuntamente, no que respeita à coligação das Demandantes.
– Com efeito, o artigo 36.°, nº 3 da LAV estabelece que "A admissão da intervenção depende sempre de decisão do tribunal arbitral, após ouvir as partes iniciais na arbitragem e o terceiro em causa. O tribunal arbitral só deve admitir a intervenção se esta não perturbar indevidamente o normal andamento do processo arbitral e se houver razões de relevo que a justifiquem ( ... )".
– Com efeito, nem o Demandado, nem nenhuma das Demandantes em concreto beneficia com o facto de o seu litígio ser apreciado no âmbito da mesma acção arbitral que uma outra Demandante (com excepção de eventuais poupanças de custos - que no caso de sociedades comerciais deve ser desconsiderado) e, só por isso, esta coligação, sempre seria inadmissível, nos termos do artigo 36.°, nº 3 da LAV.
–  Por seu turno, dispõe o nº 4 do artigo 37.° do CPC que  "se o tribunal, oficiosamente ou a requerimento de algum dos réus, entender que, não obstante a verificação dos requisitos da coligação, há inconveniente grave em que as causas sejam instruídas, discutidas e julgadas conjuntamente, determina, em despacho fundamentado, a notificação do autor para indicar, no prazo fixado, qual o pedido ou os pedidos que continuam a ser apreciados no processo, sob cominação de, não o fazendo, ser o réu absolvido da instância quanto a todos eles".
– Efectivamente, está em causa a instrução, discussão e julgamento de 15 relações materiais principais, por si só, complexas, com matéria em termos de facto absolutamente diferenciada, sem qualquer interligação atendível, densa, e reclamando uma instrução e discussão individualizadas que permita compreender a respectiva realidade subjacente em termos aptos a realizar a justiça do caso concreto
– A separação das acções é, por isso, em qualquer caso, preferível no presente caso à coligação, atendendo a que esta prejudica a boa decisão das causas, quer do ponto de vista da LAV, quer da perspectiva do CPC.
– Isso mesmo entendeu o Supremo Tribunal de Justiça numa acção declarativa em que um único autor pedia a condenação de 8 bancos a pagar-lhe uma indemnização, em resultado da revogação dos contratos de mandato celebrados com aquelas instituições. O Tribunal considerou "ser de toda a conveniência, para facilidade, clareza e prontidão da instrução e julgamento que estas [acções] se façam em separado"
            
– Assim, ainda que se entenda pela admissibilidade da coligação, o facto é que deverá este Tribunal ordenar a separação de processos, por se afigurar preferível à realização da justiça em cada caso concreto.
Termos em que deve a presente Impugnação proceder e, consequentemente:
a)- Ser anulada a Decisão Impugnada e substituída por outra que declare o Tribunal Arbitral incompetente para conhecer dos 15 litígios cumulados nos autos com base nas 15 convenções de arbitragem e, em consequência, ordene a extinção da instância arbitral.
b)- Caso assim não se entenda, deve a presente Impugnação proceder, ter-se por verificada a excepção dilatória de coligação activa ilegal e, em consequência, ser extinta a instância e o Demandado absolvido da instância.
c)- Por fim, caso se entenda pela admissibilidade formal da cumulação dos 15 litígios distintos ao abrigo das 15 convenções de arbitragem (sem conceder), atentos os graves inconvenientes na instrução, discussão e julgamento conjunto do processo e, assim, na realização da justiça de caso concreto, requer-se a V. Exas. se dignem ordenar a separação de processos, em conformidade com o disposto no artigo 37º da LAV.

Os requerentes contra-alegaram sustentando o despacho impugnado.

Cumpre apreciar.

Assente que está a competência do tribunal arbitral relativamente a cada uma das acções intentadas. A questão que aqui se coloca é a de saber se o mesmo tribunal arbitral é competente para conhecer de acção em que os AA se acham coligados contra o Banco Santander.

Todavia, antes de entrarmos na abordagem da questão da competência, será necessário apurar da viabilidade legal da focada coligação.

Nos termos do art. 36º nº 1 do CPC “é permitida a coligação de autores contra um ou vários Réus e é permitido a um autor demandar conjuntamente vários Réus, por pedidos diferentes, quando a causa de pedir seja a mesma e única ou quando os pedidos estejam entre si numa relação de prejudicialidade ou de dependência.”

E no nº 2 vem estabelecido que:
– É igualmente lícita a coligação quando, sendo embora diferente a causa de pedir, a procedência dos pedidos principais dependa essencialmente da apreciação dos mesmos factos ou da interpretação e aplicação das mesmas regras de direito ou de cláusulas de contratos perfeitamente análogas”.
              
Antes do mais, caberá analisar os contratos que os AA celebraram com o Banco Santander.
Desde logo, foi celebrado um contrato, dito “Contrato Quadro para Operações Financeiras”, idêntico para todos e destinado a regular as condições gerais a que estão sujeitas todas as operações financeiras a estabelecer entre as partes, sejam do mesmo tipo ou natureza ou tipo e natureza diferente.
Deste modo, cada uma das operações financeiras a realizar entre as partes reger-se-á pelos respectivos termos e condições particulares e em tudo o que não resulte de tais termos e condições particulares, essas operações financeiras ficarão sujeitas ao estabelecido no contrato quadro.
Assim, os contratos relativos a uma determinada operação estarão sujeitos à respectiva regulamentação particular, no âmbito e regras gerais do contrato quadro.
Daí que, na cláusula 2ª se estabeleça que:
“As partes expressamente declaram e aceitam que todas as operações financeiras a realizar entre elas sejam consideradas integrantes de um relacionamento jurídico-contratual unitário, sem prejuízo dos termos e condições particulares de cada operação, de modo que, nos termos adiante definidos, o incumprimento por alguma das Partes, de obrigações relativas a qualquer das referidas operações financeiras poderá determinar a extinção do relacionamento entre as Partes”.
É neste contexto que a cláusula 41º do Contrato Quadro, enqunto padrão normativo para os contratos de swap que constituem as aludidas operações financeiras, ao estabelecer que os diferendos que possam surgir entre as partes no âmbito do presente contrato serão dirimidas por um tribunal arbitral, assume a natureza de cláusula compromissória relativamente a todos os contratos de swap celebrados entre as partes à sombra do Contrato Quadro.

Os contratos de SWAP estabelecem condições diversas em cada caso, delimitadas pela referência   normativa do Contrato-Quadro, sendo que os AA peticionam a declaração de nulidade desses contratos de permuta de taxas de juro ou swap, com a invocação de que os mesmos correspondem a um instrumento de cobertura do risco, nomeadamente cobertura dos riscos de variação adversa das taxas de juros de dívidas ou outras responsabilidades dos AA perante terceiros.
É igualmente peticionada a nulidade dos contratos nos termos dos artigos 280º nº 2 (contratos especulativos que violam a ordem pública e ofensivos dos bons costumes).
Invocando os AA que em tais contrato o Santander violou os seus deveres legais e éticos de comunicação e informação aos aderentes nos termos dos artigos 5º, 6º, 8º e 9º da Lei das CCG bem como os deveres de informação previstos nos artigos 304º nº 2 e 3, 312º, 312º-A a 312º-C do Código de Valores Mobiliários. 
           
Por outro lado, peticionam os AA a anulabilidade dos contratos de swap por exploração pelo Banco da inexperiência e iliteracia financeira dos requerentes, por erro destes sobre o objecto e ainda por dolo do Banco ao actuar de modo a, propositadamente, causar erro às AA ou de as manter em erro. Além de ser invocado o erro das contratantes AA sobre as circunstâncias em que as partes fundaram a decisão de contratar.

Sendo peticionado o pagamento de indemnização resultante dos prejuízos sofridos por cada uma das AA e causado pela celebração e execução dos focados contratos de swap.

Independentemente das circunstâncias específicas de cada contrato ou grupo de contratos swap ou permuta das taxas de juros, da conduta de cada contraente na execução do contrato, na existência ou não de contratos de financiamento com garantias visando assegurar o seu cumprimento, os pedidos e as causas de pedir, no essencial, são muito semelhantes e apelando à análise e aplicação das mesmas regras de direito. Pode mesmo dizer-se que, constitui matéria nuclear de todos os casos a invocação de aproveitamento par parte do Banco da inexperiência financeira de cada um dos AA, convencendo-os que esses contratos de swap eram instrumentos adequados à cobertura do risco inerente às variações adversas das taxas de juro em dívidas ou outras responsabilidades dos AA, quando se tratava de operação de especulação e risco. Sendo comum a invocação de violação do dever de comunicação e informação por parte do Banco, conduzindo os AA ao erro sobre o objecto do negócio e sobre as circunstâncias em que fundaram a decisão de contratar.

Assim, entendemos que, sendo formulados pedidos distintos por cada Autor, cada um atinente aos contratos por ele celebrados com o Réu, e mesmo não existindo uma única causa de pedir, apesar de coincidirem nos aspectos nucleares já apontados, o certo é que a procedência das pretensões formuladas depende no essencial da apreciação e interpretação das mesmas regras de direito, sem esquecer a existência de um contrato-quadro padronizado e presente em todas as relações contratuais discutidas.

Por outro lado, não ocorre qualquer dos obstáculos à coligação previstos no art. 37º do CPC, nomeadamente não se vislumbra que exista qualquer inconveniente grave em que as causas sejam instruídas, discutidas e julgadas conjuntamente.
Basta ver os temas de prova enumerados pelo Tribunal Arbitral para se constatar a similitude das matérias a discutir. Não podemos concordar com o impugnante quando alude a matérias “complexas, com matéria em termos de facto absolutamente diferenciadas, sem qualquer interligação atendível, densa, e reclamando uma instrução e discussão individualizada que permita compreender a respectiva realidade subjacente (...) - art. 103º do requerimento de impugnação.
           
Para além da complexidade inerente aos próprios contratos de swap, mas que não diferem grandemente, em substância, uns dos outros, a apreciação do cumprimento dos deveres de comunicação e informação por parte do Banco e dos vícios inerentes à formação da vontade negocial, são questões que se repetem relativamente a cada um dos AA, numa interligação normativa manifesta.
Não só não existem motivos que desaconselhem a apreciação conjunta das causas, pelo contrário, atenta a similitude dos vários contratos, dos vícios assacados pelos diversos AA à formação da sua própria vontade devido a conduta dolosa do Banco, tudo se conjuga para as vantagens da coligação.

A outra questão que se coloca é a da competência do tribunal arbitral para julgar a aludida coligação.
Nos contratos que celebraram com o Banco Réu, cada um dos AA assentiu em que os litígios decorrentes do respectivo contrato seriam da competência de um tribunal arbitral.
Por outro lado, tem sido entendido que é admissível a coligação na lei de arbitragem voluntária – ver acórdão deste TRL de 18/05/2004.

Não se discute aqui que o tribunal arbitral é o competente para julgar cada uma das acções, face à existência de cláusula compromissória.
A objecção suscitada pelo Banco Réu reside no facto de cada um dos AA ter acordado com o Banco tal cláusula compromissória mas só no tocante a litígios decorrentes do contrato ou contratos entre ambos celebrados, não envolvendo qualquer pluralidade de partes.
Ou seja existem 15 cláusulas compromissórias relativas a cada relação contratual entre cada Autor e o Banco Réu.
Não se prevendo em cada cláusula compromissória a competência do Tribunal Arbitral para julgar uma única acção com pluralidade de AA e de pedidos contra o mesmo Réu.

Esta situação é compreensível na medida em que cada Autor celebrou um ou diversos contratos com o Santander, sendo tais contratos independentes uns dos outros.
Daqui não se extrai, contudo, que tais cláusulas compromissórias expressa ou implicitamente proíbam a pluralidade de partes.

Como se sublinha na decisão do Tribunal Arbitral – fls. 135 - “a circunstância de a convenção de arbitragem ser uma cláusula de um anexo ao contrato intitulado Contrato Quadro para Operações Financeiras, o qual representa um conjunto de condições gerais uniformes aplicáveis aos vários contratos concretos, leva-nos a presumir um propósito de assegurar um tratamento uniforme e sem contradições, das mesmas questões quando as mesmas forem sendo suscitadas a respeito dos vários contratos celebrados com as diversas Demandantes”.
Trata-se de um argumento relevante, derivado da própria fonte obrigacional de que derivam os litígios. É o próprio Banco que estabelece uma referência contratual geral num Contrato Quadro à sombra do qual foram negociados e executados os contratos com cada um dos AA. Esse Contrato Quadro que cada Autor terá de aceitar como tal para celebrar o ou os contratos de swap concretos já traduz uma vontade manifesta de uniformização num padrão normativo negocial.
Esta característica, a que já fizemos referência, e que fundamenta a coligação, implica igualmente, mesmo que de modo implícito, a vontade de uniformizar o julgamento dos litígios pelo tribunal escolhido nas cláusulas compromissórias.
Repare-se que, sendo admissível a coligação de todos os AA contra o Réu e caso se decidisse que o tribunal competente teria de ser o tribunal judicial, à apreciação por este, no âmbito da coligação, dos pedidos formulados por cada um dos Autores, poderia o Banco Santander excepcionar que entre esse Autor e o Banco existiu uma cláusula compromissória que implica a competência exclusiva do tribunal arbitral. 
O que significa que aquilo que é pretendido pelo Réu é forçar cada um dos Autores a propôr acção isolada contra o Banco, no Tribunal Arbitral, não podendo ignorar os elevados custos daí decorrentes.
A alegação do Banco de que os AA são pessoas colectivas com fins lucrativos e que como tal devem estar munidos de estruturas e mecanismos que lhes permitam fazer face às despesas de litígios relacionados com essas suas actividades, não pode fazer concluir que todas as sociedades tenham a mesma capacidade económica e sobretudo não pode iludir o facto de o Réu estar numa posição financeira de grande superioridade sobre cada uma das sociedades contraentes. Está aqui em causa a garantia constitucional da tutela jurisdicional efectiva. Note-se que o facto de as pessoas colectivas com fins lucrativos não terem direito a protecção jurídica (consulta jurídica e apoio judiciário) não significa que lhes não seja aplicável a garantia da tutela jurisdicional efectiva, nomeadamente quando por força da aposição contratual pelo Banco de cláusula compromissória irá causar manifesta desigualdade de armas no acesso ao tribunal arbitral.

O sacrifício patrimonial de cada uma das AA, embora possa variar de caso para caso, tem um peso relativo incomparavelmente superior ao do Banco Réu. Tal não é suficiente para afastar a competência do tribunal arbitral mas constitui um argumento em favor do julgamento pelo tribunal arbitral da acção em coligação, verificados que estejam os respectivos pressupostos processuais.
Aliás, parece evidente ser propósito do Banco Santander desencorajar a propositura de acções no âmbito dos contratos em apreço, já que, tendo inicialmente cada Autor instaurado acção no tribunal judicial, veio o Banco invocar a excepção da preterição do tribunal arbitral, obtendo decisão favorável pelo menos em três casos, cujas decisões estão juntas aos autos. Ou seja, o Banco quer que as acções sejam julgadas no Tribunal Arbitral, o que é sua prerrogativa e que, de resto, é coerente com a aposição de cláusulas compromissórias nos diversos contratos.
Mas apesar dessa opção pelo Tribunal Arbitral, o Banco altera imediatamente a sua posição quando, coligados, os AA propõem acção nesse mesmo Tribunal Arbitral. A única justificação possível é que o Banco pretende que cada Autor tenha de propôr a acção, isoladamente nesse Tribunal Arbitral, fazendo recair sobre cada Autor uma sobrecarga económica muitíssimo mais penosa de suportar para cada Autor que para o Banco e que assim poderá desencorajar muitos contraentes de litigar contra o Banco..
A invocação do Réu de uma situação de desvantagem relativamente à escolha dos árbitros não faz sentido, já que não estamos perante a escolha sucessiva por parte de cada um dos Autores de um mesmo árbitro. Nos termos do art. 11º nº 1 da LAV, “em caso de pluralidade de demandantes ou demandados, e devendo o tribunal arbitral ser composto por três árbitros, os primeiros designam conjuntamente um árbitro e os segundos designam conjuntamente outro”, ou seja, para efeitos da escolha do árbitro os vários AA coligados representam conjuntamente uma única parte.
Acresce que, independentemente da parte que os nomeia, os árbitros estão vinculados aos deveres de independência e imparcialidade.
Por outro lado, não se compreende que o Banco Réu alegue que fica coartado o seu direito de escolher em cada caso o árbitro com mais garantias de conhecimentos específicos relativamente à matéria de cada contrato, quando os contratos, regidos por um Contrato Quadro igual em todos os casos, têm características muito semelhantes uns com os outros.

Sendo manifesto que em contrato ou grupo de contratos celebrado entre cada Autor e o Réu é expressamente declarada a vontade de que qualquer diferendo inerente a tais contratos seja decidido em tribunal arbitral e verificando-se os requisitos previstos no art. 36º nº 2 do CPC para a coligação, subsiste tal vontade dos contraentes na parte activa e passiva. Nenhum prejuízo, note-se, recai sobre o Réu, já que os pedidos que antes foram formulados caso a caso terão de ser apreciados na especificidade da relação contratual entre as partes contraentes.
Como salienta Rui Pinto, “Notas ao Código de Processo Civil”, pág. 95/96, “a coligação é a modalidade de litisconsórcio em sentido amplo na qual os pedidos são subjectivamente diferenciados relativamente aos sujeitos que integram a parte litisconsorcial: a cada sujeito corresponde um objecto processual. Em termos simples: na coligação, à cumulação de sujeitos (cumulação subjectiva) corresponde uma cumulação de pedidos (cumulação objectiva).”
Deste modo, a vontade de conferir competência ao tribunal arbitral para apreciar e decidir os litígios emergentes de cada relação contratual em nada é afectada pela coligação, na qual se mantém a pluralidade das relações materiais controvertidas mas ligadas processualmente entre si pelas circunstâncias atrás enunciadas.

Conclui-se pois que:
– Celebrados diversos contratos de swap entre diversos particulares e o mesmo Banco, regidos por um contrato quadro idêntico em todos os casos, verifica-se que a procedência dos pedidos depende essencialmente da interpretação e aplicação das mesmas regras de direito ou de cláusulas de contratos perfeitamente análogas, o que legitima a coligação, nos termos do art. 36º nº 2 do CPC.
– Tendo cada um dos Autores acordado com o Banco, nos contratos que com este celebrou, a competência do tribunal arbitral para julgar litígios emergentes de tais contratos, tais cláusulas compromissórias mantêm-se em caso de coligação.
– Isto porque a coligação não afectada a pluralidade de relações materiais controvertidas e respectivos pedidos.
– No caso dos autos, a ligação entre essa pluralidade de relações resulta da aplicação das mesmas regras de direito e das mesmas regras contratuais do Contrato Quadro.

Termos em que se indefere a impugnação, confirmando-se a competência material do Tribunal Arbitral.
Custas pelo recorrente.



LISBOA, 14/6/2018


António Valente
Ilídio Sacarrão Martins
Teresa Prazeres Pais