Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
28114/17.0T8LSB.L1-6
Relator: MARIA DE DEUS CORREIA
Descritores: HOMOLOGAÇÃO DO ACORDO DAS RESPONSABILIDADES PARENTAIS
CONSERVATÓRIA DO REGISTO CIVIL
COMPETÊNCIA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 06/21/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE / REVOGADA
Sumário: I. O objectivo da Lei n.º 5/2017 de 2 de março foi estender a faculdade de requerer a homologação do acordo de regulação das responsabilidades parentais na Conservatória do Registo Civil, que já existia para os pais casados, em processo de divórcio por mútuo consentimento, àqueles pais que pretendem a separação de facto, e ainda àqueles que vivam em união de facto e pretendam dissolver tal união e ainda aos pais não casados nem unidos de facto.

II. De acordo com o disposto no art.º 1909 n.º2 do Código Civil, os pais podem requerer a homologação judicial de acordo de regulação das responsabilidades parentais, nos termos previstos no Regime Geral do Processo Tutelar Cível, aprovado pela Lei n.º 141/2015, de 8 de setembro, pelo que os Tribunais de Família têm competência em razão da matéria para a homologação desses acordos.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na 6.ª secção do Tribunal da Relação de Lisboa:

I-RELATÓRIO

HF, divorciado, residente na Rua M, em Lisboa requereu ao Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Juízo de Família e Menores a homologação do acordo de regulação das responsabilidades parentais que estabeleceu com RS, com referência ao menor, filho de ambos, LF, nascido a 01/07/2013.
Aberta vista ao Magistrado do Ministério Público foi por este dado o seguinte parecer:
Por se mostrarem salvaguardados os superiores interesses do menor Lourenço Soares Vilas Boas o MP nada tem a opor à homologação do acordo apresentado.”
Porém, seguidamente a M.ª Juíza a quo entendeu que “ a competência para apreciar o presente acordo cabe às Conservatórias do Registo Civil e não a este Tribunal” e assim declarou o Tribunal incompetente para apreciar o acordo e competentes as Conservatórias.
Inconformado com esta decisão da mesma interpôs recurso de apelação o Ministério Público, concluindo:
Ao declarar incompetente o Tribunal e competente a Conservatória do Registo Civil para apreciar o acordo de regulação das responsabilidades parentais apresentado por progenitores que viveram em união de facto e estão separados, verifica-se na decisão recorrida a violação do disposto no art.º 1909.º n.º2 do Código Civil, pelo que deverá ser revogada e, em sua substituição, ordenado que tal acordo seja efectivamente apreciado pelo Tribunal e, eventualmente, homologado, pois as alterações legislativas introduzidas no Código do Registo Civil e no Código Civil pela Lei n.º5/2017, de 2 de março, não retiraram competência ao Tribunal para tal questão, antes estenderam a faculdade de recurso às Conservatórias do Registo Civil aos pais casados em caso de separação de facto, aos pais unidos de facto em caso de separação e aos pais não casados nem unidos de facto, como já acontecia aos pais casados em processo de divórcio por mútuo consentimento.
Não foram apresentadas contra alegações.
Cumpre apreciar e decidir:
II-OS FACTOS
A questão a apreciar é exclusivamente jurídica, sendo que os elementos com relevo para a decisão são os que constam do relatório.

III-O DIREITO
Tendo em conta as conclusões de recurso formuladas que delimitam o respectivo âmbito de cognição deste Tribunal a única questão a apreciar consiste em saber se apenas a Conservatória do Registo Civil tem competência para apreciar os acordos sobre a regulação das responsabilidades parentais relativos a filhos de pais não casados que viveram em união de facto, ou se esta competência é também conferida legalmente aos Tribunais.
A decisão recorrida fundamenta-se na Lei n.º5/2017, de 2 de março, que entrou em vigor em 1 de abril de 2017 e que estabelece o regime de regulação das responsabilidades parentais por mútuo acordo junto das Conservatórias do Registo Civil, em caso de separação de facto e de dissolução de união de facto, bem como entre pais não casados nem unidos de facto, alterando o Código Civil a o Código do Registo Civil.
O art.º 274-A do Código de Registo Civil (aditado pela Lei n.º 5/2017, de 2 de março), sob a epígrafe “Regulação das responsabilidades parentais junto da Conservatória”, estipula o seguinte:
«1-Os progenitores que pretendam regular por mútuo acordo o exercício das responsabilidades parentais de filhos menores de ambos, ou proceder à alteração de acordo já homologado, devem requerê-lo a todo o tempo junto de qualquer Conservatória do Registo Civil.
2 - O requerimento previsto no número anterior é assinado pelos próprios ou pelos seus procuradores, acompanhado do acordo sobre o exercício das responsabilidades parentais e sobre alimentos.
3 - Recebido o requerimento, o conservador aprecia o acordo convidando os progenitores a alterá-lo se este não acautelar os interesses dos filhos, podendo determinar para esse efeito a prática de atos e a produção da prova eventualmente necessária.
4 - Após apreciação do acordo sobre o exercício das responsabilidades parentais prevista no número anterior, o processo é enviado ao Ministério Público junto do tribunal judicial de 1.ª instância competente em razão da matéria no âmbito da circunscrição da residência do menor, para que este se pronuncie sobre o mesmo no prazo de 30 dias.
5 - Não havendo oposição do Ministério Público, o processo é remetido ao conservador do registo civil para homologação.
6 - As decisões de homologação proferidas pelo conservador do registo civil produzem os mesmos efeitos das sentenças judiciais sobre idêntica matéria»

Por sua vez, o art.º 1909.º n.º2 do Código Civil, também na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º5/2017 de 2 de março, reza assim:
«2 - Quando os progenitores pretendam regular por mútuo acordo o exercício das responsabilidades parentais de filhos menores ou proceder à alteração de acordo já homologado, podem requerê-lo a todo o tempo junto de qualquer Conservatória do Registo Civil, nos termos previstos nos artigos 274.º-A a 274.º-C do Código do Registo Civil, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 131/95, de 6 de junho, ou requerer a homologação judicial[1] de acordo de regulação das responsabilidades parentais, nos termos previstos no Regime Geral do Processo Tutelar Cível, aprovado pela Lei n.º 141/2015, de 8 de setembro.»
Ora, da conjugação de ambos os preceitos e especialmente da leitura do art.º 1909.º n.º2 do Código Civil do qual ressalta a disjuntiva “ou”, resulta claramente consagrada, em alternativa, a possibilidade de os pais requererem a homologação judicial do acordo da regulação das responsabilidades parentais, ou requerê-la junto da Conservatória do Registo Civil.
Tal como bem refere o Magistrado do Ministério Público, o objectivo da Lei n.º 5/2017 de 2 de março foi estender a faculdade de requerer a homologação do acordo de regulação das responsabilidades parentais na Conservatória do Registo Civil que já existia para os pais casados, em processo de divórcio por mútuo consentimento, àqueles pais que pretendem a separação de facto, e ainda àqueles que vivam em união de facto e pretendam dissolver tal união e ainda aos pais não casados nem unidos de facto. Ou seja, as alterações legais foram determinadas por razões de igualdade de tratamento.
Procedem, pois, as conclusões do Apelante.
IV-DECISÃO
Em conformidade com o exposto, acordamos neste Tribunal da Relação de Lisboa em julgar procedente o recurso e, consequentemente, revogando a decisão recorrida, e declara-se o Tribunal a quo competente para apreciar o acordo sobre a regulação das responsabilidades parentais apresentado.
Sem custas.

Lisboa, 21 de junho de 2018

Maria de Deus Correia

Nuno Sampaio

Maria Teresa Pardal

[1] Negrito nosso.