Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
1090/11.6GLSNT.L1-5
Relator: LUÍS GOMINHO
Descritores: COACÇÃO
COACÇÃO GRAVE
CONSUMPÇÃO
MEDIDA DA PENA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 10/21/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: PROVIMENTO
Sumário: I - O crime de coacção consome os de ameaça, ofensa à integridade física simples ou dano, pese embora a diversidade dos bens jurídicos tutelados por cada um deles.

II - A coacção é um crime de resultado, que consiste em constranger outra pessoa, e o bem jurídico protegido é a liberdade de acção.

III - O crime de coacção exige dolo, bastando-se com o dolo eventual. Assim não é o coagido (dolo específico), bastando que o agente, sejam quais forem as suas motivações, tenha consciência de que a violência que exerce ou a ameaça que faz é susceptível de constranger e com tal se conforme.

IV - O crime de coacção em apreço não contempla a possibilidade de aplicação de pena não detentiva como pena principal.

Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, na Secção Criminal (5.ª) da Relação de Lisboa:

I - 1.) Nos Juízos de Média Instância Criminal do Tribunal da Grande Lisboa-Noroeste, foi o arguido AG..., com os demais sinais dos autos, submetido a julgamento em processo comum com a intervenção do tribunal singular, acusado pelo Ministério Público da prática de três crimes de ameaça qualificada, p. e p. pelos art.°s 153.°, n.° 1 e 155.°, n.° 1, alínea a), ambos do Código Penal, de dois crimes de coacção agravada, p. e p. pelos art.°s 154.°, n.° 1 e 155.°, n.° 1, al. a), do mesmo Diploma, e de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo art. 86.°, n.° 1, al. c), com referência aos art.°s 3.°, n.°s 1 e 4, al. a), 5.° e 6.° da Lei n.° 5/2006, de 26 de Fevereiro, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.° 17/2009, de 6 de Maio.

Efectuado o julgamento e proferida a respectiva sentença veio a decidir-se, entre o mais, o seguinte:

- Absolver o arguido da prática de dois crimes de ameaça agravada, p. e p. pelos art.°s 153.°, n.° 1 e 155.°, n.° 1, alínea a), ambos do Código Penal, pelos quais vinha acusado.

- Condená-lo como autor material de um crime de ameaça agravada, p. e p. pelo art. 153.°, n.° 1 e 155.°, n.° 1, alínea a) do Código Penal, na pena de 70(setenta) dias de multa.

- Condená-lo como autor material de dois crimes de coacção agravada, p. e p. pelos artigos 154.°, n.° 1 e 155.°, n.° 1, alínea a), ambos do Código Penal, na pena de 80 (oitenta) dias de multa, por cada crime.

- Condená-lo como autor material de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo artigo 86.°, n.° 1, alínea c), com referência aos artigos 3.°, n.°s 1 e 4, alínea a), 5.° e 6.° da Lei n.° 5/2006, de 26 de Fevereiro, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.° 17/2009, de 6 de Maio, na pena de 120 (cento e vinte) dias de  multa.

Em cúmulo jurídico das penas parcelares acima indicadas, na pena única de 200 (duzentos)  dias multa à taxa diária de € 5,00 (cinco euros), o que perfaz o montante de € 1.000,00 (mil euros).

I — 2.) Inconformado com o assim decidido, recorreu o Ministério Público para esta Relação, condensando as razões da sua discordância com a apresentação das seguintes conclusões:

1.ª - O presente recurso vem interposto da douta sentença proferida a fls. 405 e ss. dos autos supra referenciados, nos termos da qual foi o arguido condenado pela prática, em autoria material, de dois crimes de coacção agravada, previstos e punidos pelos artigos 154°, n.° 1, e 155°, alínea a), ambos do Código Penal, na pena de 80 (oitenta) dias de multa por cada um dos referidos crimes;

2.ª - Em nosso entender, e salvo o devido respeito por opinião contrária, a pena de multa não podia ser aplicada ao arguido pela prática do crime de coacção nos termos constantes da sentença recorrida, ou seja a título de pena principal;

3.ª - Sobre a questão em análise — moldura penal abstracta do crime de coacção agravada — versa o artigo 155°, n.° 1, alínea a), do Código Penal, o qual dispõe que: Quando os factos previstos nos artigos 153° e 154° forem realizados: a) por meio de ameaça com a prática de crime punível com pena de prisão superior a três anos; (...) o agente é punido

(...) com pena de prisão de um a cinco anos, no caso do n.° 1 do artigo 154°.";

 4.ª - Ora, na situação em apreço, ao optar pela aplicação ao arguido de uma pena de multa pela prática de cada um dos crimes de coacção agravada pelo qual foi condenado quando o mesmo apenas é punido com pena de prisão, a Mm.° Juiz não teve, a nosso ver, em conta o tipo de pena ao ilícito em causa.

5.ª - Por todo o exposto, entendemos que a douta sentença recorrida violou o disposto no artigo 154°, n.° 1, e 155°, n.° 1, alínea a), ambos do Código Penal, devendo ser revogada e substituída por outra que, mantendo a condenação do arguido pela prática, como autor material, de dois crimes de coacção agravada, determine que tal condenação seja, sopesando todos os factores referidos na sentença recorrida quanto à determinação concreta da pena a aplicar ao arguido e elencados no artigo 71° do Código Penal, na pena de 1 (um) ano e 6 (meses) de prisão por cada um dos referidos crimes e, em cúmulo jurídico, na pena única de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão.

6.ª - Tal pena única de prisão de prisão deverá, a nosso ver, ser suspensa na sua execução pelo mesmo período (2 anos e 6 meses de prisão) nos termos do disposto no artigo 50°, n.° 1, do Código Penal, atendendo a que, face à personalidade do arguido, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior aos crimes em apreço e às circunstâncias deste, é de concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizaram de forma adequada e suficiente as finalidade da punição.

7.ª - Caso assim se decida, deverá necessariamente proceder-se à reformulação do cúmulo jurídico das penas de multa em que o arguido foi condenado pela prática do crime de ameaça agravada (70 dias de multa) e do crime de detenção de arma proibida (120 dias de multa), fixando-se a pena única em 160 (sessenta) dias de multa, à taxa diária de 5 @ (cinco euros), perfazendo a multa global de 800 € (oitocentos euros).

I - 3.) Respondendo ao recurso interposto, o arguido AG... terminou solicitando a confirmação da sentença proferida, não devendo ser aplicada pena de prisão suspensa na sua execução, mas sim pena de multa, "sendo que esta deverá ser reduzida de acordo com o peticionando pelo Digníssimo Magistrado do Ministério Público".

II — Subidos os autos a esta Relação, a Exm? Sr? Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer.

No cumprimento do preceituado no art. 417.°, n.°2, do Cód. Proc. Penal, nada mais foi acrescentado.

Procedeu-se a exame preliminar e seguiram-se os vistos legais.

Teve lugar a conferência.

Cumpre apreciar e decidir:

III - 1.) Conforme resulta das conclusões apresentadas, consabidamente limitadoras do respectivo objecto, o recurso apresentado pelo Ministério Público mostra-se confinado à matéria de Direito, convergindo a respectiva questão central, na condenação em multa operada nos crimes de coação agravada que se tiveram por verificados em relação ao arguido.

III — 2.) Como temos por habitual, vejamos conferir primeiro a factualidade que se mostra definida:

Factos provados:

I. No dia 13 de Junho de 2011, no interior no interior da residência do arguido, onde também habitava a sua neta a AJ..., sita na Rua xxx - Várzea de Sintra, o arguido, dirigindo-se à sua neta AJ…, disse-lhe, em alto som e de forma grave, que futuramente matá-la-ia.

3. (assim no original) As mencionadas palavras, pela forma veemente e séria como foram proferidas, causaram na pessoa de AJ... receio, inquietando-a com a perspectiva de o arguido poder praticar contra si algum acto lesivo da sua integridade fisica ou da sua vida.

4. Sabia e queria o arguido provocar na pessoa de AJ... tal sensação, bem sabendo que as palavras que àquela dirigiu eram para tanto idóneas.
5. No dia 8 de Julho de 2011, cerca das 12h30, no interior da residência mencionada em 1°, o arguido, na sequência de um desentendimento com a sua neta relacionado com o facto desta

não apoiar a atitude que tinha tido no dia anterior com um seu vizinho, foi buscar uma pistola semi-automática, de calibre 6,35mm Browning, de marca "Pietro Beretta", de modelo 950 B, com o número de série M05048, de origem italiana, de sua propriedade, a qual se encontrava devidamente municiada, e exibiu-a à sua neta, tendo de seguida premido o gatilho da mesma para efectuar um disparo, o qual não se concretizou por motivos que se desconhecem.
6. Ao exibir uma arma de fogo e tentado efectuar de seguida um disparo com a mesma na presença de AJ... e na direcção desta, sabia o arguido que tais actos eram adequados a provocar naquele momento medo e receio na pessoa de AJ..., fazendo-a temer pela sua integridade fisica e vida.
7. A pistola exibida pelo arguido encontra-se em bom estado de conservação e em boas condições de funcionamento, sendo que funciona com munições de calibre 6,35 mm.

8. O arguido detinha tal arma desde data não concretamente apurada, não sendo o mesmo titular de qualquer licença que para tanto o autorizasse ao uso e porte de arma com aquelas características.
9. Conhecia bem as características do mencionado objecto e sabia que era proibida a sua detenção naquelas condições.

10. No dia 5 de Julho de 2011, cerca das 14h30m, o arguido, descontente com o facto de
o AB…, seu vizinho, se encontrar a abrir uns buracos num muro que divide as propriedades de ambos, sitas na Rua xxx Várzea de Sintra, com a finalidade de colocar no mesmo ferros/tubos para delimitar a sua propriedade, dirigiu-se ao mesmo, e empunhando uma anua de fogo, tipo caçadeira, na sua direcção, disse-lhe para terminar com a obra que senão o matava.

11. Perante tal atitude do arguido, pela forma séria e determinada como proferiu as mencionadas palavras e empunhou uma arma de fogo na sua direcção, sentiu-se AB... intimidado e, temendo pela concretização de algum acto lesivo da sua integridade fisica ou da sua vida, parou os trabalhos que estava a levar a cabo e afastou-se do local, assim se vendo impedido de prosseguir o desenvolvimento da actividade que até então alí desenrolava.

12. Bem sabia o arguido que a sua atitude era adequada a constranger AB... e, assim, a conseguir que o mesmo não continuasse com os trabalhos que estava a levar a cabo no referido muro.

13. No dia 7 de Julho de 2011, cerca das 16h30, o arguido, descontente com o facto de AB... haver retomado os trabalhos referidos em 9.°, efectuou disparos com uma arma de fogo, tipo caçadeira, na direcção do muro que divide as propriedades de ambos.

14. Perante tal atitude do arguido, pela efectivação de disparos na direcção do muro onde estavam a ser levados a cabo trabalhos de construção, sentiu-se AB... intimidado e, temendo pela concretização de algum acto lesivo da sua integridade tisica ou da sua vida, parou novamente os trabalhos que estava a levar a cabo e afastou-se do local, assim se vendo impedido de prosseguir o desenvolvimento da actividade que até então ali desenrolava.

15. Bem sabia o arguido que a sua atitude era adequada a constranger AB... e assim, a conseguir que o mesmo não continuasse com os trabalhos que estava a levar a cabo no referido muro.

16. O arguido agiu de forma livre e voluntária, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas pela lei penal.

17. O Certificado de Registo Criminal do arguido não averba qualquer condenação.
18. O arguido vive só e aufere mensalmente uma pensão de reforma no valor de E 300,00 e uma pensão de viuvez no valor de € 400,00.

19. O arguido tem como habilitações o quarto ano de escolaridade
20. O arguido, actualmente com 89 anos de idade, ficou psicologicamente descompensado desde que enviuvou.
21. Factos não provados:
22. Em data não concretamente apurada do mês de Maio de 2011, no interior da residência onde ambos habitavam, sita na xxx - Várzea de Sintra, o arguido, dirigindo-se a AJ..., sua neta, disse-lhe, em alto som e de forma grave, "quando cá voltares vai ser o teu último dia no mundo".
23. No dia 13 de Junho de 2011 a expressão concreta que o arguido dirigiu à sua neta foi: não me vires as costas quando estou a falar contigo, da próxima vez que me virares as costas eu mato-te!
24. Ao exibir uma arma de fogo e tentado efectuar de seguida um disparo com a mesma na presença de AJ..., bem como na sua direcção, o arguido quis assusta-la.
25. 4. O arguido efectuou um disparo com a arma na presença da neta, no dia 08 de Julho de 2011.

Factos não provados:

1.       Em data não concretamente apurada do mês de Maio de 2011, no interior da residência onde ambos habitavam, sita na xxx - Várzea de Sintra, o arguido, dirigindo-se a AJ..., sua neta, disse-lhe, em alto som e de forma grave, "quando cá voltares vai ser o teu último dia no mundo".

2.       No dia 13 de Junho de 2011 a expressão concreta que o arguido dirigiu à sua neta foi: não me vires as costas quando estou a falar contigo, da próxima vez que me virares as costas eu mato-te!

3.       Ao exibir uma arma de fogo e tentado efectuar de seguida um disparo com a mesma na presença de AJ..., bem como na sua direcção, o arguido quis assusta-la.

4.       4. O arguido efectuou um disparo com a arma na presença da neta, no dia 08 de Julho de 2011.

III — 3.1.) Como decorre do antecedente enunciado, insurge-se o Ministério Público contra a aplicação da multa enquanto pena principal, relativamente aos crimes de coacção agravada, tidos por verificados, porquanto, na subsunçãc jurídica normativa que opera, tal forma de sanção não se mostrar prevista no respectivo tipo penal.

Vejamos o que nos diz a sentença recorrida a este propósito:

"Do crime de coacção agravada

Dispõe o art. 154.° do Código Penal:

"Quem, por meio de violência ou de ameaça com mal importante, constranger outra pessoa a uma acção ou omissão, ou a suportar uma actividade, é punido com pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa.

2. A tentativa é punível.

3. O facto não é punível:

a) Se a utilização do meio para atingir o fim visado não for censurável; ou

b) Se visar evitar suicídio ou a prática de facto ilícito típico."

O tipo objectivo de ilícito da coacção consiste em constranger outra pessoa a adoptar um determinado comportamento: praticar uma acção, omitir determinada acção, ou suportar uma acção,
Visando o art. 154.° garantir a liberdade de acção em geral, a conduta (acção, omissão ou tolerância) coagida pode ser toda e qualquer uma, isto é, não precisa de ser uma conduta que tenha relevância jurídica ou sequer social

Os meios de coacção são a violência ou a ameaça com mal importante (crime de execução vinculada ou de processo típico). A violência, pressuposta pelo crime de coacção, também pode consistir numa intervenção física sobre coisas, como, p. ex., o furar os pneus do automóvel. As coisas, sobre as quais o agente faz recair o seu acto violento (destruição, danificação, ou mesmo usurpação da utilização), tanto podem ser do coagido como de terceiro. Necessário é que o mal causado nas coisas seja adequado a afectar sensivelmente a liberdade de acção do coagido, de forma a constranger este a adoptar o comportamento visado pelo agente.

O crime de coacção consome os de ameaça, ofensa à integridade física simples ou dano, pese embora a diversidade dos bens jurídicos tutelados por cada um deles.

Compreende-se que assim seja, uma vez que, existindo entre dois tipos criminais uma relação de meio -fim (um facto previsto como crime é concretamente meio para cometer outro crime), deve considerar-se que a norma atinente ao crime-fim consome a protecção visada pela outra.

A coacção é um crime de resultado, que consiste em constranger outra pessoa, e o bem jurídico protegido é a liberdade de acção.

A consumação deste crime exige, consequentemente, que a pessoa objecto da acção de coacção tenha, efectivamente, sido constrangida a praticar a acção, a omitir a acção ou a tolerar a acção, de acordo com a vontade do coactor e contra a sua vontade. Para haver consumação, não basta a adequação da acção (isto é, a adequação do meio utilizado: violência ou ameaça com mal importante) e a adopção, por parte do destinatário da coacção, do comportamento conforme à imposição do coactor, mas é ainda necessário que entre este comportamento e aquela acção de coacção haja uma relação de efectiva causalidade. A consumação do crime de coacção basta-se com o simples início da execução da conduta coagida. Se o objecto da coacção for a prática de uma acção, a coacção consuma-se, quando o coagido iniciar esta acção.

O crime de coacção exige dolo, bastando-se com o dolo eventual. Assim não é o coagido (dolo específico), bastando que o agente, sejam quais forem as suas motivações, tenha consciência de que a violência que exerce ou a ameaça que faz é susceptível de constranger e com tal se conforme.

No caso em apreço, o arguido em face dos factos provados conclui-se que o arguido, por duas vezes constrangeu AB…, ameaçando-o de morte, a não fazer algo, verificando-se, assim, os elementos objectos do crime de coacção.

Tendo, o arguido, actuado de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida pela lei penal, também está preenchido o elemento subjectivo.

Destarte, estão preenchidos os elementos típicos dos dois crimes de coacção agravada, nos termos do art. 155.°. n.° 1. al. a), do Código Penal.  (sublinhado nosso).

Posto que mais à frente, aquando da determinação das penas concretas, não se mencione qual a moldura legal que se teve por operativa, dúvidas não existem em como de harmonia com o preceito em causa, no caso em apreço, aquela é de prisão de um a cinco anos (a prisão até dois anos ou multa até 240 dias refere-se apenas ao crime de ameaça previsto no art. 153.°).

Haverá então que conferir razão ao Ministério Público quando sustenta que a infracção em apreço não contempla a possibilidade de aplicação de pena não detentiva como pena principal.

III — 3.2.) Nesta conformidade, teremos que proceder à sua re-determinação, operação para a qual importa recordar os factores que para o efeito foram utilizados na sentença recorrida:

No caso em apreço as necessidades de prevenção geral são moderadas, não se podendo considerar que provocam um alarme geral. As necessidades de prevenção especial não assumem especial relevo porquanto o arguido nunca sofreu qualquer condenação. Aufere mensalmente uma pensão de reforma no valor de € 300,00 e uma pensão de viuvez no valor de € 400,00. Actualmente tem 89 anos de idade, ficou psicologicamente descompensado desde que enviuvou.

Na determinação da medida concreta da pena, importa atender à culpa do agente, às exigências de prevenção de futuros crimes e a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, deponham a favor do agente ou contra ele (art° 71° do C.P.).

Nestes termos, e à luz das citadas disposições legais, tendo o arguido actuado com dolo directo e sendo elevado o grau de ilicitude do facto.

Ora num quadro como a afirmado, a quantificação sugerida pelo Ministério Público - duas penas de 1 ano e 6 meses de prisão -, afiguram-se-nos adequada à resenha enunciativa acima deixada transcrita, já que traduz uma sanção claramente abaixo da média dos intervalos mínimo e máximo apontados, assim contrabalançado aquela maior ilicitude, com as menores exigências de culpa e de prevenção especial consignadas.

Julgamos todavia, que o seu cúmulo jurídico poderá ser reduzido para os dois anos, atendendo à idade do arguido e ao tempo que evidenciou ser capaz de manter uma conduta lícita.

III — 3.3.) A pena em questão não pode ser convertida em multa, ex vi do 43.° do Cód. Penal, da mesma forma que não se justifica, por motivos óbvios, a sua substituição por trabalho a favor da comunidade (art. 58.°)

Porém, face à personalidade do arguido, às sua condições de vida, à sua conduta anterior e posterior aos crimes em apreço e às circunstâncias destes (melhor descritas na sentença recorrida), não será difícil concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizaram de forma adequada e suficiente as finalidade da punição.

Razão pela qual a sua execução será de suspender nos termos do art. 50.°, n.° 1, do Código Penal.

III — 3.4.) Uma vez que o respectivo quadro sancionatório foi modificado, haverá também que refazer o cúmulo jurídico das penas de multa aplicadas.

Remanescem as seguintes:

- 70 dias de multa pelo crime de ameaça agravada;

- 120 dias pelo de detenção de arma proibida.

A razão económica diária comum, é a mínima legal.

Por força do estatuído no art. 77.°, n.° 2, do Diploma acima citado, a pena a impor tem como limite máximo a soma das penas concretas acima indicadas (190 X), e como limite mínimo (120 x).

Ora atendendo à personalidade do arguido, em que pontua, por um lado, a circunstância da sua avançada idade e o facto de não ter ainda contacto com o sistema judicial, mas por outro, um nível de perturbação provocado no núcleo de pessoas que lhe são próximas física e pessoalmente já preocupante, entendemos ajustado aplicar-lhe a pena única de 160 dias de multa, à taxa diária de 5 euros.

Nesta conformidade:

IV — Decisão:

Nos termos e com os fumdamentos indicados, na precedência quase integral do recurso interposto pelo Ministério Público decide-se nesta Relação:

- Revogar as sanções aplicadas em 1.a Instância aos crimes de coacção agravada tidos por verificados (dois), razão pela qual, por cada um deles, ficará agora o arguido AG... condenado na pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão.

No seu cúmulo jurídico, na pena de 2 (dois) anos de prisão.

Determinar a suspensão da respectiva execução por igual período.

- Na reformulação do cúmulo jurídico das remanescentes penas de multa aplicadas aos crimes de ameaça agravada e de detenção de arma proibida, mais se condena o arguido mencionado na pena única de 160 (cento e sessenta) dias de multa à taxa diária de 5,00 (cinco euros),. o que se traduzirá na multa total de 800,00 (oitocentos euros).

Elaborado em computador. Revisto pelo relator, o 1,0 signatário.

Lisboa, 21 de Outubro de 2014

Luís Gominho

José Adriano