Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
6459/18.2T8FNC.L1-2
Relator: NELSON BORGES CARNEIRO
Descritores: CONTRATO DE ARRENDAMENTO PARA FINS NÃO HABITACIONAIS
CESSÃO DE UNIDADE HABITACIONAL
DENÚNCIA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 12/07/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I – A declaração negocial vale com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante, salvo se este não puder razoavelmente contar com ele.
II – No âmbito dos negócios formais a declaração não pode valer com um sentido que não tenha no texto do documento o mínimo de correspondência, ainda que de forma imperfeita; todavia, tal sentido poderá, nos termos do artigo 238.º/2 do Código Civil, ser válido se corresponder à vontade real dos declarantes e a isso se não opuserem razões determinantes de forma.
III – Os contratos de arrendamento, para fins não habitacionais, celebrados antes e na vigência do RAU e do DL n.º 257/95, de 30/9, sem duração limitada, não obstante se lhes aplicar o regime do NRAU, não são livremente denunciáveis pelo senhorio, por força do disposto nos arts. 26º/4 e 28º/2, ambos da Lei n.º 6/2006, de 27/2.
IV – As disposições transitórias do NRAU acabam por funcionar como não tocando nos anteriores regimes do arrendamento urbano, em matérias como a denúncia ou a oposição à renovação do contrato.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os juízes da 2ª secção (cível) do Tribunal da Relação de Lisboa:

1. RELATÓRIO
MC, intentou ação declarativa de condenação com processo comum contra DORISOL – SOCIEDADE DE EMPREENDIMENTOS TURÍSTICOS, S.A., pedindo a sua condenação:
- No reconhecimento de que o contrato assinado a 18-04-1979, está extinto por oposição à renovação;
- Na entrega imediata da fração objeto do contrato, sito no oitavo andar do Edifício ..., no Caminho ...;
- No pagamento das quantias em dívida por juros de mora no depósito das compensações devidas, acrescido de juros até efetivo pagamento;
- Na fixação de uma sanção compulsória diária pelo atraso na entrega à herança da fração autónoma, no valor de € 100,00.
Foi proferida sentença que absolveu a ré dos pedidos contra a mesma formulados, julgou prejudicado o conhecimento do pedido reconvencional e, absolveu a autora do pedido respeitante à litigância de má-fé.
Inconformada, veio a autora apelar da sentença, tendo extraído das alegações[1],[2] que apresentou as seguintes
CONCLUSÕES[3]:
1. O Tribunal a quo considerou erradamente que tinha sido celebrado um contrato
de arrendamento para fins não habitacionais.
2. A decisão proferida pelo tribunal a quo tem na sua génese a nomenclatura utilizada, verificando-se por isso, uma clara prevalência da forma, em detrimento da matéria, quando na verdade subsiste uma larga quantidade de jurisprudência em sentido divergente.
Para o efeito, verifique-se o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, processo nº 576/ 11.7TCFUN de 20/08/2014; acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 20/03/2012 e acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 14/03/2009.
3. A Recorrente invocou na petição inicial que teria comunicado à recorrida a natureza do contrato, facto que não foi objeto de impugnação pela recorrida.
Por esse motivo o Tribunal a quo deveria ter dado como provado que se trata de um contrato de cessão de exploração, dada a prova documental carreada aos presentes autos, integralmente reproduzida e não impugnada, devendo considerar na lista de factos dados como provados, o seguinte: “A Autora enviou à Ré uma carta com data de 22.03.2013 a submeter a disciplina do contrato às regras da cessão de exploração, rejeitando a natureza de contrato de arrendamento.”
4. Durante a segunda metade do século passado, é facto assente que este tipo de contrato eram celebrados com frequência, os quais tinham como verdadeiro objetivo financiar a construção do imóvel e não garantir um contrato de arrendamento eterno, situação que se mostra integralmente oposta ao espírito comercial que subjaz à situação de facto.
5. Neste tipo de contratos está em causa a aquisição de frações integradas em prédios urbanos compostos por apartamentos turísticos, frações estas adquiridas numa fase embrionária, a fase de construção, que depois são cedidas à entidade hoteleira exploradora, permitindo deste modo o financiamento da construção, sem que para tanto, se afigurasse necessário o recurso a entidades financeiras.
6. A designação que as partes atribuem ao acordo firmado deverá ser entendida como um elemento entre outros a ter em consideração para alcançar o real sentido das declarações de vontade, nada garantindo que a conclusão atingida coincida com o Nomen utilizado pelas partes.
7. Foi estipulado no contrato que as despesas relativas à administração do condomínio serão suportadas pela inquilina, o que num típico contrato de arrendamento não seria possível, atendendo ao facto de as mesmas estarem a cargo do senhorio.
Visto que o tribunal deu como provado este facto, o contrato em apreço deve ser qualificado como um contrato atípico de cessão de exploração.
8. A recorrente tem o direito de deduzir oposição à renovação, que lhe deve ser reconhecido por se tratar de um contrato de cessão de exploração.
9. Caso o Tribunal ad quem venha a ter outro entendimento e qualifique o contrato como contrato de arrendamento, o que não se concede nem concebe, e só por dever de patrocínio se alega, entende-se que este não pode ser submetido ao regime vinculístico.
10. O tribunal a quo tinha de ter em conta as cláusulas que afastam este regime e que contêm a real vontade das partes, sendo por isso imprescindível que se decida pela não aplicação do regime vinculístico ao presente contrato, o que desde já se requer.
11. A decisão, agora, em crise impõe a manutenção de uma relação contratual demasiado onerosa para o senhorio, que pode até ser considerada abuso de direito pelo enorme sacrifício que impõe ao senhorio em face da contraprestação existente para a inquilina.
A ré contra-alegou, pugnando pela improcedência da apelação da autora.
Colhidos os vistos[4], cumpre decidir.
OBJETO DO RECURSO[5],[6]
Emerge das conclusões de recurso apresentadas por MC, ora apelante, que o seu objeto está circunscrito às seguintes questões:
1.)  Reapreciação da matéria de facto.
2.) Saber se foi celebrado um contrato de arrendamento para fins não habitacionais ou, um contrato de cessão de unidade habitacional para exploração como alojamento turístico.
3.) Saber se pode ser reconhecida a cessação do contrato de arrendamento por oposição à sua renovação, com a consequente restituição do arrendado.
2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1. FACTOS PROVADOS NA 1ª INSTÂNCIA
A) A 18 de Abril de 1979, por escritura pública exarada de folhas 67 verso a 70 do livro de escrituras número 40 C do 1.º Cartório Notarial do Funchal, LSC e HC, casados em regime de comunhão geral de bens, vieram dar cumprimento a um contrato promessa celebrado a 19 de Dezembro de 1974 com a sociedade Dorisol, S.A..
B) Assim, nessa data, cumprindo o prometido, não sem que tivesse de atualizar o valor
de compra, já liquidado, dado o constrangimento hipotecário que impendia sobre a fração em favor da então Caixa Económica do Funchal, pelo preço de trezentos mil escudos, o referido casal LSC e HC adquiriu uma fração autónoma designada pela letra A – Oitavo, com a área de 32,32 metros quadrados, localizada no nono piso (oitavo andar) do prédio urbano constituído em propriedade horizontal denominado “Edifício ...”, sito no Caminho ..., na freguesia de ..., concelho do Funchal.
C) O prédio urbano, acabado de construir, foi constituído em propriedade horizontal e está inscrito na matriz urbana da referida freguesia de ... sob o artigo … e descrito na competente Conservatória do Registo Predial do Funchal, sob o n.º … a folhas 48 verso do Livro ……., hoje extratado sob o número … da referida freguesia.
D) O prédio foi destinado a apartamentos turísticos.
E) No mesmo ato, o casal adquirente celebrou um contrato (designado de arrendamento) com a sociedade vendedora, tendo por objeto a fração adquirida, que sujeitaram às cláusulas descritas na referida escritura: “Disseram ainda os outorgantes, nas invocadas qualidades, que entre a representada do primeiro outorgante, como arrendatária, e os segundos outorgantes, como senhorios, é titulado o arrendamento da identificada fração “A-OITAVO”, arrendamento regulado nos termos das cláusulas seguintes:
PRIMEIRA – Prazo: o de um ano, com início reportado a um de Abril corrente, e as renovações dar-se-ão nos termos legais aplicáveis.
SEGUNDA – Renda mensal: é de dois mil e quinhentos escudos, e será paga no domicílio dos senhorios ou no de quem os representar nesta cidade, no primeiro dia útil do mês a que disser respeito.
TERCEIRA – Destino: exercício da atividade de hotelaria e similares.
QUARTA – Obras: não são permitidas sem consentimento dos senhorios e em qualquer caso não darão lugar a indemnização seja de que natureza for.
QUINTA – Enquanto durar o respetivo contrato, as despesas relativas à administração do condomínio serão suportadas pela inquilina.”
F) A fração era nova e até então não tinha servido qualquer atividade.
G) A 04 de Julho de 2006, faleceu HC e a 22 de Junho de 2013 faleceu LSC e HC.
H) São seus herdeiros GC, casado no regime da comunhão de adquiridos com MC, JC, divorciado, e a autora.
I) A autora é cabeça-de-casal.
J) A fração identificada em B) faz parte do acervo hereditário.
K) A herança não foi partilhada, encontrando-se os bens em comum e sem determinação de parte ou de direito.
L) Na qualidade de cabeça-de-casal, a 05 de Janeiro de 2018, a autora opôs-se à renovação do contrato celebrado em 1979 com a ré, exigindo a entrega do locado a 01 de Abril de 2018.
M) Em resposta dada a 14 de Fevereiro, a ré considerou não ser válida a denúncia, por o “contrato estar sujeito às normas transitórias do NRAU e apenas poder ser cessado por denúncia por parte do senhorio nos casos previstos no artigo 1101.º, alíneas a) e b) do Código Civil.”
N) Mais alegou que o contrato “cai na categoria dos contratos de arrendamento sem
duração limitada, sendo vinculístico.
O) A ré recusou e continua a recusar a entrega do imóvel à autora.
P) A falecida LSC, em Setembro de 2012, reportou esta situação à ré, lamentando nunca ter recebido qualquer satisfação por parte da ré, o que originou troca de correspondência.
2.2. FACTOS NÃO PROVADOS NA 1ª INSTÂNCIA
1) A recusa da entrega do imóvel causou prejuízos, dado o valor exponencial do mercado imobiliário.
2) A “renda mensal” foi atualizada e é hoje no valor de € 60,34.
3) Em 2011 a “renda mensal” era no valor de € 60,45.
4) A ré tem vindo a proceder ao pagamento das “rendas” por depósito bancário, algumas de forma tardia.
5) Em 2011, foram pagos quatro meses.
6) No que reporta ao último ano e meio (contado da instauração da ação), registaram-se os seguintes atrasos:
- “renda” do mês de Abril de 2017 – paga no dia 24;
- “renda” do mês de Maio de 2017 – paga no dia 17;
- “renda” do mês de Junho de 2017 – paga no dia 30;
- “renda” do mês de Julho de 2017 – paga no dia 13;
- “renda” do mês de Agosto de 2017 – paga no dia 14;
- “renda” do mês de Outubro de 2017 – paga no dia 13;
- “renda” do mês de Novembro de 2017 – paga no dia 9;
- “renda” do mês de Dezembro de 2017 – paga no dia 21;
- “renda” do mês de Janeiro de 2018 – paga no dia 12;
- “renda” do mês de Fevereiro de 2018 – paga no dia 16;
- “renda” do mês de Março de 2018 – paga no dia 9;
- “renda” do mês de Abril de 2018 – paga no dia 10;
- “renda” do mês de Maio de 2018 – paga no dia 8;
- “renda” do mês de Junho de 2018 – paga no dia 13;
- “renda” do mês de Julho de 2018 – paga no dia 16;
- “renda” do mês de Agosto de 2018 – paga no dia 13;
- “renda” do mês de Setembro de 2018 – paga no dia 12;
- “renda” do mês de Outubro de 2018 – paga no dia 9.
2.3. O DIREITO
Importa conhecer o objeto do recurso, circunscrito pelas respetivas conclusões, salvas as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, e as que sejam de conhecimento oficioso[7] (não havendo questões de conhecimento oficioso são as conclusões de recurso que delimitam o seu objeto).
1.) REAPRECIAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO.
A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa – art. 662º/1, do CPCivil.
A reapreciação da matéria de facto por parte desta Relação, tem um campo muito restrito, limitado, tão só, aos casos em que ocorre flagrantemente uma desconformidade entre a prova produzida e a decisão tomada. Com efeito, não se trata de um segundo julgamento até porque as circunstâncias não são as mesmas, na 1ª e na 2ª instância. Não basta, pois, que não se concorde com a decisão dada, pois é necessária a demonstração da existência de erro na apreciação do valor probatório dos meios de prova que efetivamente, no caso, foram produzidos.
Na realidade, tem que se ter presente, que no âmbito do julgamento em processo civil rege o princípio da livre apreciação das provas, sem prejuízo da observância de formalidade especial para a existência ou prova de um determinado facto, pese embora seja exigível que o julgador decida segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto.
Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição, os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida, e a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas – art. 640º/1/a/b/c), do CPCivil.
A não satisfação destes ónus por parte do recorrente implica a rejeição imediata do recurso[8].
Ele tem de especificar obrigatoriamente, na alegação de recurso, não só os pontos de facto que considera incorretamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizada, que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da adotada pela decisão recorrida[9].
A apelante nas suas alegações ao impugnar a decisão proferida sobre a matéria de facto, cumpriu os ónus de especificação/ identificação que se referem no art. 640º/1/2, do CPCivil.
Aditamento de facto
A apelante alegou que “enviou uma missiva à Recorrida, com data de 22.03.2013, onde se pode ler que “não posso deixar de referir, que ao contrário do que se afirma na vossa missiva, o contrato por nós celebrado não é de arrendamento mas sim de cessão de exploração”.
Assim, concluiu que deve ser aditado um novo facto com a seguinte redação: “A Autora enviou à Ré uma carta com data de 22.03.2013, a submeter a disciplina do contrato às regras da cessão de exploração, rejeitando a natureza de contrato de arrendamento”.
Vejamos a questão.
Os factos provados só devem conter matéria de facto, devendo estar rigorosamente expurgados de tudo quanto sejam questões de direito: de tudo quanto envolva noções jurídicas. Os factos materiais que possam interessar a estas noções é que devem ser respondidos.
É questão de facto tudo o que tende a apurar quaisquer ocorrências da vida real, quaisquer eventos materiais e concretos, quaisquer mudanças apuradas no mundo exterior, e é questão de direito tudo o que respeita à interpretação e aplicação da lei.
A matéria de direito respeita à aplicação das normas jurídicas aos factos, à valoração feita pelo tribunal, de acordo com a interpretação ou a aplicação da lei e a qualquer juízo, indução ou conclusão jurídica; o resultado dessa atividade é avaliado segundo um critério de correção ou de justificação[10].
É admissível a utilização, na descrição dos factos provados de conceitos jurídicos simples e inequívocos, correntemente utilizados na linguagem vulgar, desde que não incidam sobre o ponto dúbio do litígio[11].
Saber se a ”disciplina do contrato se deve submeter às regras da cessão de exploração, rejeitando a natureza de contrato de arrendamento”, além de ser conclusivo, integra matéria de direito e não matéria de facto, pelo que não se poderá responder a tal pergunta, pois não contém factos, mas uma conclusão a retirar de outros factos.
Por outro lado, sendo a natureza jurídica do contrato um ponto dúbio do litígio, não seria admissível a sua descrição nos factos provados.
Concluindo, o facto que a apelante pretende ver aditado, integra matéria de direito e não matéria de facto, pelo que, não poderá constar da mesma.
Deste modo, não importa, pois, alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto e que ficou consagrada na decisão proferida em 1ª instância, por não se mostrar verificado o condicionalismo previsto no art. 662º/1, do CPCivil.
Destarte, nesta parte, improcedem as conclusões 1ª a 3ª, do recurso de apelação.
2.) SABER SE FOI CELEBRADO UM CONTRATO DE ARRENDAMENTO PARA FINS NÃO HABITACIONAIS OU, UM CONTRATO DE CESSÃO DE UNIDADE HABITACIONAL PARA EXPLORAÇÃO COMO ALOJAMENTO TURÍSTICO.
A apelante alegou que “Foi estipulado no contrato que as despesas relativas à administração do condomínio serão suportadas pela inquilina, o que num típico contrato de arrendamento não seria possível, atendendo ao facto de as mesmas estarem a cargo do senhorio”.       
Assim, concluiu que “o contrato deve ser qualificado como um contrato atípico de cessão de exploração”.
Vejamos a questão, isto é, se foi vontade das partes celebrarem um contrato de cessão de unidade habitacional para exploração para fins turísticos regulado pelo Decreto Regulamentar n.º 14/78, de 12-05, e pelo regime subsequente previsto no Decreto Regulamentar 8/89, 21-03.
Está provado que:
– O prédio foi destinado a apartamentos turísticos – facto provado D).
– O casal adquirente celebrou um contrato (designado de arrendamento) com a sociedade vendedora, tendo por objeto a fração adquirida, que sujeitaram às cláusulas descritas na referida escritura: “Disseram ainda os outorgantes, nas invocadas qualidades, que entre a representada do primeiro outorgante, como arrendatária, e os segundos outorgantes, como senhorios, é titulado o arrendamento da identificada fração “A-OITAVO”, arrendamento regulado nos termos das cláusulas seguintes:
PRIMEIRA – Prazo: o de um ano, com início reportado a um de Abril corrente, e as renovações dar-se-ão nos termos legais aplicáveis.
SEGUNDA – Renda mensal: é de dois mil e quinhentos escudos, e será paga no domicílio dos senhorios ou no de quem os representar nesta cidade, no primeiro dia útil do mês a que disser respeito.
TERCEIRA – Destino: exercício da atividade de hotelaria e similares.
QUARTA – Obras: não são permitidas sem consentimento dos senhorios e em qualquer caso não darão lugar a indemnização seja de que natureza for.
QUINTA – Enquanto durar o respetivo contrato, as despesas relativas à administração do condomínio serão suportadas pela inquilina – facto provado E).
– A fração era nova e até então não tinha servido qualquer atividade – facto provado F).
Primeiro, um contrato deve qualificar-se de “cessão de apartamento em exploração turística” se o seu conteúdo e fins se enquadrarem no estabelecido no Decreto Regulamentar n.º 14/78, de 12-05[12].
O Decreto Regulamentar n.º 14/78, define como complexo de apartamentos turísticos a explorar, com habitualidade, por determinada entidade um conjunto de apartamentos independentes, de interesse turístico, dando neles alojamento dia a dia ou por períodos não excedentes a um mês, com apoio de serviços de limpeza, lavagem de roupas e portaria-receção (arts. 33º/1; 35º/2/3, e 37º)[13].
Embora a exploração do conjunto deva ser realizada globalmente por uma única entidade, isso não significa que os apartamentos hajam de lhe pertencer todos; essa entidade pode ser proprietária apenas de algum ou alguns ou até de nenhum (arts. 4º/1 e 5º/1, ex vi do art. 35º/1).
Quanto aos apartamentos de que a entidade não seja proprietária, eles só poderão ficar afetos a essa exploração global se os respetivos donos tiverem feito com aquela um contrato escrito de cessão de exploração, pelo qual cedam o direito à exploração dos seus apartamentos (arts. 5º/1/2, ex vi do art. 35º/2).
Desta regulamentação logo se evidencia que estamos perante uma modalidade negocial autónoma, perfeitamente distinta do arrendamento, já que são afastadas as respetivas regras limitativas quanto à renovação obrigatória ou compulsiva.
Mais se evidencia que uma unidade habitacional, não pertencente à entidade exploradora do complexo pode ser afeta a essa exploração global mediante um contrato específico, que a lei chama de cessão de exploração.
Mas essa afetação pode findar, assim acontecendo logo que se extinga o contrato, quer pelo decurso do respetivo prazo, quer por distrate das partes, ou por qualquer outro motivo de extinção de um negócio jurídico.
A unidade habitacional fica então desligada ou desvinculada do conjunto e o seu proprietário retoma, quanto a ela, liberdade de movimentos.
De toda esta regulamentação resulta que o proprietário de um apartamento, que reúna as condições necessárias para o efeito, tem o direito à sua exploração turística, mediante alojamento dia a dia ou períodos não excedentes a um mês.
Mas se não pretender exercê-lo por si mesmo, pode cedê-lo temporariamente à entidade que explore globalmente o bloco ou blocos de que o apartamento faz parte.
É essa cedência temporária que constitui o contrato de cessão de exploração turística a que se refere a lei (art. 5º/2, do Decreto Regulamentar n. 14/78, ex vi do art. 35º/1, do mesmo diploma)[14].
Ora, por um lado, não está provado, nem alegado, que entre as partes tenha sido outorgado um contrato de cessão de exploração turística (contrato escrito que atribua o direito à exploração de uma fração).
Por outro lado, também não está provado, nem alegado, que a apelada tenha assegurado a ligação às infra estruturas hoteleiras eventualmente existentes no prédio e tenha integrado a fração no conjunto de serviços eventualmente fornecidos por essa entidade (apesar da fração estar integrada num prédio destinado a apartamentos turísticos).
Assim, não se pode concluir, perante a matéria de facto, que a fração autónoma tenha sido integrada num estabelecimento comercial pertença da apelada e, deste modo, afetada à sua atividade comercial hoteleira e turística.
Assim sendo, objetivamente, o conteúdo e fins do contrato outorgado não se enquadram no estabelecido no Decreto Regulamentar n.º 14/78, de 12-05.
Temos, pois, conforme entendimento do tribunal a quo, que subscrevemos, “assentando-se que as partes outorgantes, intitulando-se senhorios e arrendatária, celebraram um negócio que intitularam de arrendamento, através do qual titularam o arrendamento de uma fração, mediante o pagamento de uma renda, para o exercício da atividade de hotelaria e similares, afigura-se, como ab initio dito, que tal acordo consubstancia um contrato de arrendamento para fins não habitacionais”.
Assim, entre as partes foi outorgado um contrato de arrendamento urbano para exercício de atividade comercial ou industrial, atualmente designado, para fins não habitacionais, previsto nos arts. 1108.º a 1113.º, do CCivil[15].
Mas, mesmo assim, apesar do nomem iuris do contrato[16],[17], [18], poder-se-á entender que foi vontade das partes celebrar um contrato de cessão de unidade habitacional para fins turísticos e, não um contrato de arrendamento urbano para exercício de atividade comercial?
Vejamos.
A declaração negocial vale com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante, salvo se este não puder razoavelmente contar com ele (art. 236º, do CCivil).
Nos negócios formais, não pode a declaração valer com um sentido que não tenha mínimo de correspondência no texto do respetivo documento, ainda que imperfeitamente expresso (art. 238º, do CCivil).
Na verdade, constituindo esta restrição ”um corolário natural, se não mesmo inevitável, do carácter solene destes negócios”, o texto do documento tem, nesse caso, função equivalente ao da letra da lei[19],[20].
A razão de ser deste regime especial está na tutela da aparência e da confiança que tenha ou venha a ser depositada por terceiros no sentido objetivo do negócio. As exigências legais de forma dos negócios jurídicos são excecionais e fundam-se na necessidade de promover a ponderação das partes, de certeza e segurança no tráfego, e de documentação[21].
O art. 236º, do CCivil contem regras de interpretação para a generalidade dos negócios jurídicos. O art. 238º estabelece regras específicas relativas aos negócios formais. Subsidiariamente, o art. 237º firma, por sua vez, regras aplicáveis para a hipótese de as referidas não conduzirem a um resultado conclusivo sobre o sentido do negócio jurídico[22].
O juiz terá de discernir aquele que corresponder à expetativa razoável que dele teria o declarante, posto na posição de um declaratário típico. Será pois necessário alegar e provar, pelos meios próprios, que um declaratário normal, na posição típica daquele declaratário real teria entendido a declaração neste ou naquele sentido[23].
Conforme entendimento do tribunal a quo “O acordo em apreço intitula-se compra e venda e arrendamento, as suas partes outorgantes autointitulam-se senhorios e arrendatária. Mais declaram que, em tais qualidades (senhorios e arrendatária), entre as partes outorgantes é titulado o arrendamento de uma fração. E que a renda mensal: é de dois mil e quinhentos escudos, e será paga no domicílio dos senhorios ou no de quem os representar nesta cidade, no primeiro dia útil do mês a que
disser respeito. Importa não olvidar igualmente a convenção do prazo contratual: de um ano, com início reportado a um de Abril corrente, e as renovações dar-se-ão nos termos legais aplicáveis”.
As exigências legais de forma são excecionais e fundam-se na necessidade de promover a ponderação das partes, de certeza e segurança no tráfego, e de documentação[24].
Assim, no acordo celebrado por escritura pública, as partes outorgantes denominaram o contrato de “arrendamento” e não de “cessão de exploração”, reportaram o pagamento a uma “renda” e, não a uma “compensação” e, estipularam a renovação automática do contrato, não a impedindo.
Tais cláusulas insertas no acordo correspondem aos elementos típicos de um contrato de arrendamento e, não a um contrato de cessão de unidade habitacional para exploração fins turísticos.
Ora, tendo as partes outorgado tal acordo por escritura pública, tendo por isso ponderado o respetivo clausulado, quiseram celebrar um contrato de arrendamento, pois de outro modo, caso não o quisessem celebrar, não teriam inserto tais cláusulas no mesmo, mas outras, que não se identificassem com este tipo de contrato.
O tempo que as partes tiveram para ponderar o tipo de contrato que quiseram outorgar e, as cláusulas que quiseram inserir no mesmo, leva-nos a concluir que quiseram outorgar um contrato de arrendamento.
Portanto, as partes não se quiseram comprometer na cedência da fração para exploração como alojamento turístico no âmbito de um estabelecimento hoteleiro, mas sim, quiseram-se comprometer no âmbito de um contrato de arrendamento.
Se o quisessem fazer, poderiam tê-lo feito, atendendo a que tiveram tempo para ponderar o tipo de contrato que quiseram outorgar e, deste modo, dariam tal exploração da fração à apelada (e, deste modo, outorgando um contrato nos termos do art. 5º/2, do Decreto Regulamentar 14/78 e, não um contrato de arrendamento por escritura pública).
Acresce ainda dizer, que não se sabe, por nada estar alegado ou provado, se a fração foi cedida para a apelada a explorar na sua atividade hoteleira e, deste modo, a tenha integrado nesta sua atividade.
Temos, pois, que do sentido das declarações das partes outorgantes, não se pode interpretar que quiseram outorgar um contrato de cessão de unidade habitacional para exploração com fins turísticos e, deste modo, afastar o regime do arrendamento.
Também conforme entendimento do tribunal a quo “o tratamento contabilístico desta relação contratual aponta no sentido do arrendamento”, isto por haver retenção de IRS (quando há um arrendamento) e não cobrança de IVA (quando há a prestação de um serviço).
Alega ainda a apelante que o sentido das declarações das partes aponta para um contrato de arrendamento, pois “foi estipulado que as despesas relativas à administração do condomínio seriam suportadas pela inquilina, o que num típico contrato de arrendamento não seria possível”.
Pensamos que não será pelo facto de as partes terem estipulado que as despesas da administração serem por conta da inquilina que se pode concluir que não se está perante um contrato de arrendamento.
Isto porque, dado que o regime dos encargos e despesas é supletivo, a lei admite que os mesmos fiquem a cargo do arrendatário, bastando que haja estipulação escrita das partes nesse sentido (art. 1078º/1, CCivil)[25].
Constituem encargos da coisa locada, os impostos prediais, as taxas, os prémios de seguro, os encargos de condomínio, bem como o pagamento de bens ou serviços relativos ao local arrendado. Estes encargos ficarão assim a cargo de quem foram contratualmente atribuídos[26].
É assim perfeitamente legitimo estipular-se que qualquer encargo do prédio ou fração, qualquer despesa que tenha de se fazer face, ao longo do arrendamento, decorram por conta do arrendatário como, em vez disso, do senhorio: “as partes estipulam, por escrito, o regime”[27].      
Não será, pois, pelo facto de as partes terem estipulado que as despesas da administração seriam por conta da apelada/inquilina, que se pode concluir que se está
perante um contrato de arrendamento.
Concluindo, exigindo o art. 238º, do CCivil que nos negócios formais a interpretação tenha um mínimo de correspondência no texto, a interpretação contrária, não só não tem este suporte literal, como até se lhe opõe[28].
Isto é, foi celebrado um contrato de arrendamento urbano para exercício de atividade comercial , e não um contrato de arrendamento urbano para exercício de atividade comercial (os elementos constitutivos e a vontade declarada não têm cobertura no Decreto Regulamentar n.º 14/78).
Destarte, nesta parte, improcedem as conclusões 4ª) a 7ª), do recurso  de apelação
3.) SABER SE PODE SER RECONHECIDA A CESSAÇÃO DO CONTRATO DE ARRENDAMENTO POR OPOSIÇÃO À SUA RENOVAÇÃO, COM A CONSEQUENTE RESTITUIÇÃO DO ARRENDADO.
A apelante alegou que “Caso o Tribunal ad quem venha a ter outro entendimento e qualifique o contrato como contrato de arrendamento, entende-se que este não pode ser submetido ao regime vinculístico”.
Assim, concluiu que “O tribunal a quo tinha de ter em conta as cláusulas que afastam este regime e que contêm a real vontade das partes, sendo por isso imprescindível que se decida pela não aplicação do regime vinculístico ao presente contrato”.
Está provado que:
– Na qualidade de cabeça-de-casal, a 05 de Janeiro de 2018, a autora opôs-se à renovação do contrato celebrado em 1979 com a ré, exigindo a entrega do locado a 01 de Abril de 2018 – facto provado L).
– Em resposta dada a 14 de Fevereiro, a ré considerou não ser válida a denúncia, por o “contrato estar sujeito às normas transitórias do NRAU e apenas poder ser cessado por denúncia por parte do senhorio nos casos previstos no artigo 1101.º, alíneas a) e b) do Código Civil – facto provado M).
– Mais alegou que o contrato “cai na categoria dos contratos de arrendamento sem duração limitada, sendo vinculístico – facto provado N).
– A ré recusou e continua a recusar a entrega do imóvel à autora – facto provado O).
Vejamos a questão.
As normas do presente capítulo aplicam-se aos contratos de arrendamento para habitação celebrados antes da entrada em vigor do RAU, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 321-B/90, de 15 de outubro, bem como aos contratos para fins não habitacionais celebrados antes da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 257/95, de 30 de setembro – art. 27º, do Novo Regime do Arrendamento Urbano (NRAU), aprovado pela Lei n.º 6/2006, de 27-02.
Aos contratos referidos no número anterior não se aplica o disposto na alínea c) do artigo 1101.º do Código Civil – art. 28º/2, do NRAU.
O NRAU aplica-se aos contratos celebrados após a sua entrada em vigor, bem como às relações contratuais constituídas que subsistam nessa data, sem prejuízo do previsto nas normas transitórias – art. 59º/1, do NRAU.
O senhorio pode denunciar o contrato de duração indeterminada nos casos seguintes: Necessidade de habitação pelo próprio ou pelos seus descendentes em 1.º grau; Para demolição ou realização de obra de remodelação ou restauro profundos; Mediante comunicação ao arrendatário com antecedência não inferior a cinco anos sobre a data em que pretenda a cessação – art. 1101/a/b/c, do CCivil.
O RAU (aprovado pelo DL nº 321-B/90, de 15-10) entrou em vigor a 18-11-1990 e, o DL nº 257/95, de 30-09, entrou em vigor a 05-10-1995.
Tendo as partes outorgado em 1979-04-18, o contrato de arrendamento urbano para exercício de atividade comercial, ser-lhe-ão aplicáveis as normas transitórias estatuídas no art. 27º e seguintes do NRAU.
Ora, de acordo com o estatuído no art. 28º/2, do NRAU, não se aplica aos contratos habitacionais ou não habitacionais, o disposto na alínea c), do art. 1101º, do CCivil (possibilidade de denúncia de contrato de duração indeterminada, sem necessidade de justificação, mediante mera comunicação com antecedência de 5 anos)[29].
Assim sendo, atendendo à data da outorga do contrato, estando sujeito às normas transitórias do NRAU, não se lhe aplica o estatuído no art. 28º/2, do NRAU, isto é, o mesmo não pode ser denunciado pelo senhorio, sem necessidade de qualquer justificação ou fundamento, mediante mera comunicação ao arrendatário, com antecedência de 5 anos.
Temos, pois, que não podendo o contrato outorgado em 1979-04-18, ser denunciado livremente pela apelada, a oposição a essa renovação com a consequente entrega da fração, carece de fundamento legal, pois não tem a virtualidade de o fazer cessar.
Concluindo, os contratos de arrendamento, para fins habitacionais e não habitacionais, celebrados antes e na vigência do RAU e do DL n.º 257/95, de 30/9, sem duração limitada, não obstante se lhes aplicar o regime do NRAU, não são livremente denunciáveis pelo senhorio, por força do disposto nos arts. 26º/4 e 28º/2, ambos da Lei n.º 6/2006, de 27/2[30],[31],[32].
Improcedendo as conclusões do recurso de apelação, há que confirmar a decisão proferida pelo tribunal a quo.
3. DISPOSITIVO

3.1. DECISÃO
Pelo exposto, acordam os juízes desta secção cível (2ª) do Tribunal da Relação de Lisboa em julgar improcedente o recurso e, consequentemente, em confirmar-se a decisão recorrida.       
3.2. REGIME DE CUSTAS
Custas pela apelante (na vertente de custas de parte, por outras não haver[33]), porquanto a elas deu causa por ter ficado vencida[34].
                             
Lisboa, 2022-12-07[35],[36]
Nelson Borges Carneiro
Paulo Fernandes da Silva
Pedro Martins
_______________________________________________________
[1] Para além do dever de apresentar a sua alegação, impende sobre o recorrente o ónus de nela concluir, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão – ónus de formular conclusões (art. 639º, nº 1) – FERREIRA DE ALMEIDA, Direito Processual Civil, volume II, 2ª edição, p. 503.
[2] As conclusões exercem ainda a importante função de delimitação do objeto do recurso, como clara e inequivocamente resulta do art. 639º, nº 3. Conforme ocorre com o pedido formulado na petição inicial, as conclusões devem corresponder à identificação clara e rigorosa daquilo que o recorrente pretende obter do tribunal superior, em contraposição com aquilo que foi decidido pelo tribunal a quo – ABRANTES GERALDES – PAULO PIMENTA – PIRES DE SOUSA, Código de Processo Civil Anotado, volume 1º, 2ª ed., p. 795.
[3] O recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão. Versando o recurso sobre matéria de direito, as conclusões devem indicar, as normas jurídicas violadas; o sentido com que, no entender do recorrente, as normas que constituem fundamento jurídico da decisão deviam ter sido interpretadas e aplicadas, e invocando-se erro na determinação da norma aplicável, a norma jurídica que, no entendimento do recorrente, devia ter sido aplicada – art. 639º, nºs 1 e 2, do CPCivil.
[4] Na sessão anterior ao julgamento do recurso, o processo, acompanhado com o projeto de acórdão, vai com vista simultânea, por meios eletrónicos, aos dois juízes-adjuntos, pelo prazo de cinco dias, ou, quando tal não for tecnicamente possível, o relator ordena a extração de cópias do projeto de acórdão e das peças processuais relevantes para a apreciação do objeto da apelação – art. 657º, n.º 2, do CPCivil.
[5] Todas as questões de mérito que tenham sido objeto de julgamento na sentença recorrida e que não sejam abordadas nas conclusões do recorrente, mostrando-se objetiva e materialmente excluídas dessas conclusões, têm de se considerar decididas, não podendo de elas conhecer o tribunal de recurso.
[6] Vem sendo entendido que o vocábulo “questões” não abrange os argumentos, motivos ou razões jurídicas invocadas pelas partes, antes se reportando às pretensões deduzidas ou aos elementos integradores do pedido e da causa de pedir, ou seja, entendendo-se por “questões” as concretas controvérsias centrais a dirimir.
[7] Relativamente a questões de conhecimento oficioso e que, por isso mesmo, não foram suscitadas anteriormente, a Relação deve assegurar o contraditório, nos termos gerais do art. 3º, nº 3. A Relação não pode surpreender as partes com uma decisão que venha contra a corrente do processo, impondo-se que as ouça previamente – ABRANTES GERALDES – PAULO PIMENTA – PIRES DE SOUSA, Código de Processo Civil Anotado, volume 1º, 2ª ed., p. 829.
[8] AMÂNCIO FERREIRA, Manual dos Recursos em Processo Civil, 4ª ed., Revista e Atualizada, Almedina, p. 157, nota (333).
[9] LEBRE DE FREITAS - ARMINDO RIBEIRO MENDES, Código de Processo Civil Anotado, Artigos 676º a 943º, Vol. 3º, Coimbra Editora, 2003, p. 53.
[10] REMÉDIO MARQUES, Acão Declarativa à Luz do Código Revisto (Pelo DL n.º 303/2007, de 24/08), p. 35.
[11] LEBRE DE FREITAS, A Acão Declarativa Comum, À Luz do Código Revisto, Coimbra Editora, p. 170.
[12] Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 1991-04-30, Relator: VASSANTA TAMBA, http://www.dgsi.pt/jstj.
[13] Seguiu-se de perto o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 1996-02-13 (Uniformizador de Jurisprudência), Relator: HERCULANO LIMA, http://www.dgsi.pt/jstj.
[14] Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 1996-02-13, de uniformização de jurisprudência, Relator: HERCULANO LIMA, http://www. dgsi.pt/jstj.
[15] A antiga referencia às duas categorias (comercial ou industrial) era irrelevante pois, esteja-se perante um ou outro destes fins, o regime arrendatício será exatamente o mesmo – PINTO FURTADO, Comentário ao Regime do Arrendamento Urbano,  3ª ed., p. 727.
[16] A qualificação de um contrato, na perspetiva da definição do respetivo regime, é uma questão jurídico-normativa a solucionar, fundamentalmente, por subsunção da factualidade clausulada aos preceitos legais, tratando-se de operação que abstrai da concreta vontade das partes dirigida a um ou outro modelo negocial, sendo por isso mesmo despiciendo na qualificação o nomem iuris que as partes tenham decidido aplicar no convénio – Ac. Tribunal da Relação de Évora de 2000-00-00, Relatora: ALEXANDRA MOURA SANTOS, http://www.dgsi.pt/jtre.
[17] A qualificação jurídica de um contrato é uma operação que parte do facto e que a ele regressa para efeito de o regulamentar, de determinar a sua disciplina jurídica; consiste em referenciar um caso concreto a um conceito jurídico reconhecido por uma autoridade normativa para lhe aplicar o seu regime   – PEDRO PAIS DA VASCONCELOS, Contratos Atípicos, pp. 160/61.
[18] Traduzindo-se a liberdade que o artº 405º do C. Civil reconhece aos contraentes essencialmente na definição desse conteúdo, e de modo nenhum na livre escolha de um tipo contratual envolvente do clausulado, como quer que este se configure, trata-se, na qualificação jurídica de um contrato, de operação que abstrai da concreta vontade das partes dirigida a um ou outro modelo negocial, sendo por isso mesmo despiciendo na qualificação o nomem iúris que as partes tenham decidido aplicar no convénio – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2003-04-09, Relator: LUCAS COELHO, http://www.dgsi.pt/jstj.
[19] Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2005-05-12, Relator: OLIVEIRA BARROS, http://www.dgsi.pt/jstj.
[20] O texto do documento que titula o negócio desempenha nele um papel equivalente ao da letra da lei, porquanto naquele se consubstancia a declaração e, através desta, a vontade das partes. É por meio desse documento que o declaratário entra em contacto coma  vontade do declarante – CARVALHO FERNANDES, Teoria Geral do Direito Civil, II, 4ª edição, p. 447.
[21] PEDRO PAIS DE VASCONCELOS – PEDRO LEITÃO PAIS DE VASCONCELOS, Teoria Geral do Direito Civil, 9ª edição, p. 555.
[22] Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2005-05-12, Relator: OLIVEIRA BARROS, http://www.dgsi.pt/jstj.
[23] PEDRO PAIS DE VASCONCELOS – PEDRO LEITÃO PAIS DE VASCONCELOS, Teoria Geral do Direito Civil, 9ª edição, p. 552.
[24] PEDRO PAIS DE VASCONCELOS – PEDRO LEITÃO PAIS DE VASCONCELOS, Teoria Geral do Direito Civil, 9ª edição, p. 555.
[25] MENEZES LEITÃO, Arrendamento Urbano, 9ª ed., pp. 97/8.
[26] MENEZES LEITÃO, Arrendamento Urbano, 9ª ed., p. 84.
[27] PINTO FURTADO, Comentário ao Regime do Arrendamento Urbano,  3ª ed., p. 418.
[28] Nos negócios formais, há uma maior relevância dos elementos interpretativos de ordem objetiva, em detrimento do sentido correspondente à vontade real do declarante, ainda que conhecido do declaratário ou cognoscível – CARVALHO FERNANDES, Teoria Geral do Direito Civil, II, 4ª edição, p. 447.
[29] Mantém-se igualmente em vigor o regime relativo à transmissão por morte, duração, renovação e denúncia, também em termos próximos ao que vigoravam no RAU, reafirmando-se assim a plenitude do arrendamento vinculismo arrendatício, prevendo-se, no entanto, uma transição para o RAU e atualização de rendas por via de negociação entre as partes – MENEZES LEITÃO, Arrendamento Urbano, 9ª ed., p. 181.
[30] Ac. Tribunal da Relação do Porto de 2011-07-13, Relator: JOSÉ FERRAZ, http://www.dgsi.pt/jtrp.
[31] Os arrendamentos para fins habitacionais e não habitacionais, celebrados antes ou na vigência do RAU e DL 25 7/95, de duração não limitada, não são livremente denunciáveis pelo senhorio, por força do disposto nos arts° 26°/4 e 28° da Lei n° 6/2006. Neste caso, não está na disponibilidade dos senhorios denunciar livremente o contrato de arrendamento em causa pelo que não se pode considerar operativa a comunicação destes aos arrendatários com vista à não renovação do contrato de arrendamento - Ac. Tribunal da Relação do Porto de 2012-05-14, Relator: RUI MOURA, http://www.dgsi.pt/jtrp.
[32] A aplicação no tempo do NRAU consta do respetivo art° 59º n°1, segundo o qual ele se aplica “aos contratos celebrados após a sua entrada em vigor, bem como às relações contratuais constituídas que subsistam nessa data, sem prejuízo das normas transitórias”; estas normas constam dos art°s 26° a 58° NRAU. Da conjugação dos art°s 26°, 27° e 28° dessa Lei resulta que o legislador pretendeu que aos contratos de arrendamento para fins não habitacionais (assim como aos contratos de arrendamento habitacionais celebrados antes do RAU), anteriores ao DL n° 257/95, de 30/9, não se aplique a regra da denúncia livre por parte do senhorio. Desta forma, o legislador manteve em vigor os antigos regimes, relativamente aos contratos celebrados à sua sombra; As disposições transitórias acabam por funcionar como não tocando nos anteriores regimes do arrendamento urbano, em matérias como a denúncia ou a oposição à renovação do contrato - Ac. Tribunal da Relação do Porto de 2010-02-23, Relator: VIEIRA E CUNHA, http://www.dgsi.pt/jtrp.
[33] Como o conceito de custas stricto sensu é polissémico, porque é suscetível de envolver, nos termos do nº 1 do artigo 529º, além da taxa de justiça, que, em regra, não é objeto de condenação – os encargos e as custas de parte, importa que o juiz, ou o coletivo de juízes, nos segmentos condenatórios das partes no pagamento de custas, expressem as vertentes a que a condenação se reporta – SALVADOR DA COSTA, As Custas Processuais, Análise e Comentário, 7ª ed., p. 8.
[34] A decisão que julgue a ação ou algum dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da ação, quem do processo tirou proveito – art. 527º, nº 1, do CPCivil.
[35] A assinatura eletrónica substitui e dispensa para todos os efeitos a assinatura autógrafa em suporte de papel dos atos processuais – art. 19º, nº 2, da Portaria n.º 280/2013, de 26/08, com as alterações introduzidas pela Portaria n.º 267/2018, de 20/09.
[36] Acórdão assinado digitalmente.