Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
3805/15.4T8BRR.L1-4
Relator: FILOMENA MANSO
Descritores: TRABALHADOR ESTUDANTE
HORÁRIO DE TRABALHO
ASSÉDIO MORAL
RESOLUÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 04/05/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: ALTERADA A SENTENÇA
Sumário: 1.–Na organização do tempo de trabalho do trabalhador-estudante, a entidade empregadora, sempre que possível, deve ajustar o horário de trabalho de modo a permitir àquele a frequência das aulas e a deslocação para o estabelecimento de ensino. Não sendo possível, assiste ao trabalhador o direito a dispensa de trabalho, que depende do período normal de trabalho semanal e que, in casu, era de cinco horas (art. 90, nº3, c) do CT).
2.–O art. 208-A do CT transpõe para a figura do banco de horas o mecanismo do instituto da adaptabilidade individual, sendo o mesmo fixado por acordo entre entidade patronal e trabalhador, que deve regular a forma da compensação do trabalho prestado em acréscimo e que pode revestir a modalidade de redução equivalente do tempo de trabalho.
3.–Neste caso, a lei confere ao trabalhador a iniciativa de fixar o exacto momento em que a redução deve ter lugar ou, na sua falta, deve a entidade patronal fixá-la.
4.–O assédio moral, contemplado no art. 29, nº1 do CT, pode revestir duas formas: o assédio discriminatório e o que não se baseia em nenhum factor de discriminação (mobbing), sendo que nem todas as situações de conflito laboral podem ser qualificadas como mobbing.
5.–Não tendo o Autor alegado ou provado que no regime de banco de horas fora instituída, como compensação do acréscimo de trabalho, uma redução do tempo de trabalho e, na afirmativa, em que termos se concretizava, não podia impô-la, unilateralmente e segundo as suas conveniências, no âmbito da proposta que efectuou à empregadora, quando invocou, em simultâneo, o regime de trabalhador- estudante.
6.–Não tendo também, logrado fazer prova de situações que integrem assédio moral, não se verifica a justa causa de resolução que invocou para a resolução do contrato de trabalho.
7.–Tendo o contrato de trabalho tido a duração de 12 meses, nos termos do nº3 do art. 245 do CT o cômputo total das férias ou da correspondente retribuição não pode exceder o proporcional ao período anual de férias tendo em conta a duração do contrato.

(Sumário elaborado pela Relatora)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os Juizes, do Tribunal da Relação de Lisboa.


1RELATÓRIO:


AAA propôs contra BBB, a presente acção com forma de processo comum pedindo a condenação da Ré a:
a)-reconhecer a justa causa de despedimento do Autor;
b)-em consequência, a pagar-lhe indemnização de antiguidade de €2.084,82;
c)-pagar férias e subsídio de férias de €892,22;
d)-pagar subsídio de Natal de €334,46;
e)-compensar o Autor pelos danos não patrimoniais no valor de €2.000,00;
f)-compensar o Autor com os juros legais sobre as referidas importâncias desde a data da citação até integral pagamento.

Para tanto alegou, em síntese, que resolveu o contrato de trabalho que o ligava à R., invocando justa causa, por lhe ter sido negado o estatuto de trabalhador-estudante e ter sido vítima de actos de assédio moral praticados pelo vice-presidente da Ré, a partir do momento em que requereu a sua concessão, o que lhe causou problemas de saúde.

Mais legou que, na data da cessação do contrato de trabalho, ficaram por pagar os os proporcionais de férias, subsídio de férias e de Natal.

Foi realizada Audiência de Partes, nos termos do disposto no art.º 54.º, n.º 2, do Código de Processo do Trabalho, na qual não foi possível obter o acordo das partes.

A Ré contestou, alegando por sua vez e em resumo que o Autor requereu, ao abrigo do estatuto de trabalhador-estudante, que lhe fossem concedidas 8 horas de dispensa de trabalho semanais, sendo que, nos termos legais, só lhe eram devidas 5 horas, porque as restantes, respeitantes ao banco de horas, dependem do acordo da entidade patronal. Uma vez que a Ré tinha outra funcionária em gozo de licença de maternidade, a outra colega do Autor não podia ser obrigada a trabalhar 9 horas seguidas, sem qualquer interrupção, por ser ilegal e não ter meios financeiros para contratar outra trabalhadora, propôs ao Autor várias soluções alternativas, que não foram por este aceites. Nega ainda que tenham sido praticados pelo seu vice-presidente quaisquer actos de coacção ou assédio e ainda que os subsídios de férias e de Natal foram pagos em duodécimos e que o Autor gozou férias em Agosto de 2015, nada lhe sendo devido.

Conclui pela improcedência da acção.

Foi proferido despacho saneador tabelar, identificado o objecto do litígio e enunciados os temas da prova.

Procedeu-se a julgamento, com cumprimento das formalidades legais, após o que foi proferida sentença, na qual foi exarada a seguinte,
DECISÃO:
Nestes termos, julgo a presente ação improcedente e, consequentemente, absolvo a R. BBB dos pedidos formulados pelo A. João A...M...G....
Valor da ação: € 5.180,93 (cinco mil cento e oitenta euros e noventa e três cêntimos).
Custas a cargo do A..
Registe e notifique.

Inconformado,  interpôs o Autor recurso para esta Relação, no qual formulou as seguintes:

CONCLUSÕES.
1.–Vem o presente recurso, com reapreciação da prova gravada, ser interposto da sentença que considerou improcedente o pedido do A. relativo ao reconhecimento da justa causa do despedimento, ao pagamento da indemnização de antiguidade, férias e subsídio de férias e subsídio de natal e á compensação pelos danos extra- patrimoniais.
2.–O apelante foi impedido de exercer os seus Direitos de trabalhador estudante, motivo que justifica o seu despedimento por justa causa, foi vítima de assédio moral pelo empregador e tem créditos salariais a receber.
3.–O Tribunal recorrido defende que os pedidos do Autor são indeferidos por “ tais factos nunca ocorreram porque o que o A. pediu foi, e unicamente, 4 horas como trabalhador-estudante, acrescidas de 4 horas do banco de horas - sendo que a escolha do momento para gozo das horas do banco não está na sus disponibilidade -, sendo que foi esta e apenas esta, a proposta que foi rejeitada; e não o que consta da carta de resolução do contrato de trabalho. Deste modo, tendo o A. fundado a resolução do contrato de trabalho em factos que não aconteceram, não resta senão concluir pela improcedência, nesta parte, dos pedidos formulados…”.”O A. alegou que foi vítima de atos de assédio moral praticados pelo vice-presidente da R., o que lhe causou problemas médicos; com tais fundamentos, requereu a condenação da R. a pagar indemnização por danos não patrimoniais, no valor de € 2.000,00. Não se provaram os factos alegados pelo A., pelo que, também nesta parte, cumpre julgar improcedentes os pedidos formulados”….” Apurou-se que os subsídios de férias e de Natal foram pagos em duodécimos e que o A., em Agosto de 2015, gozou 30 dias de férias. Deste modo, a presente ação é improcedente igualmente nesta parte.”
4.–Esta argumentação é contrária á prova produzida por testemunhas e por documentos e á lei, contendo a prova considerada provada imprecisões de diversa ordem que inquinam a decisão.
5.–Na sentença considera provado baseada no art.º12 da PI que “ nessa proposta apresentada pelo trabalhador este teria as 4 horas semanais respeitantes aos seus direitos como trabalhador estudante e 4 horas do seu banco de horas que á data eram de 71 horas” quando o art.12.º da PI refere 5 horas semanais por direito.
6.–Na sentença é considera provado que “ …foi proposto ao mesmo (A.), várias soluções para que este pudesse compatibilizar o trabalho com o estágio”…” as alternativas dadas pela ré seriam faltar ao estágio e não completar este ano o seu mestrado, gozar uma licença sem vencimento, adiar para Março de 2016…” o que manifestamente é contraditório pois nenhuma destas soluções é uma compatibilização com o horário de trabalho. É sim obrigar o trabalhador a desistir do seu mestrado, mesmo que seja por um ano.
7.–Na sentença é considera provado que “… é ilegal e inviável e …que a sua colega fosse obrigada a trabalhar nove horas seguidas”. O que não é verdade, as horas extraordinárias não são ilegais, não era inviável e a colaboradora faria 8 horas e não as 9 horas.
8.–A R. recusou ao A. o Estatuto de trabalhador estudante, para o ano lectivo de 2015/2016, quando a sua concessão é automática, efectuada, a comunicação prevista no art.º94º do C.T, comunicação que foi efectuada.
9.–O A requereu que fossem concedidas 8 horas semanais com flexibilização do horário de trabalho.
10.–Para tal foi combinado com a colega (…) que duas vezes por semana seria possível ao A. fazer o seu estágio de seis meses.
11.–A colaboradora (…)  faria o horário das 9H30 às 17H30, de oito horas, e não as 9 horas que constam na sentença, nos factos provados.
12.–A R. nunca deu qualquer alternativa credível ao A., nunca lhe disse por exemplo que ele poderia usufruir das cinco horas semanais de despensa do trabalho.
13.–As alternativas foram simplesmente que o A. não frequentasse o estágio naquele ano lectivo ou que pedisse licença sem vencimento.
14.–Estas propostas encapotadas são a recusa clara, do pedido do A. sobre usufruir do Estatuto de trabalhador Estudante. Pois se a R. diz que só para o próximo ano o A. pode usufruir dos seus direitos de trabalhador-estudante está a negar os direitos solicitados nesse ano, nega inclusivé às 5 horas semanais de dispensa que o A. tinha direito por lei.
15.–Assim, o comportamento da ré confere ao autor o direito á resolução por justa causa do contrato de trabalho nos termos do artigo número 394º, n.º 2, alíneas b), e) e f), do Código do Trabalho.
16.–Justa causa que deveria ter sido reconhecida pelo Tribunal recorrido
17.–Na sentença é considerado que os subsídios de férias e de natal foram pagos em duodécimos e que em agosto de 2015, o A. gozou 30 dias de férias.
18.–Conforme a R. junta como docs. 7, 8, 9 e 10 ( recibos de vencimentos do A.) o A. só recebia, mensalmente, em duodécimos metade dos subsídios de férias e natal em duodécimos e as férias gozadas foram respeitantes ao ano anterior ( 2014).
9/12 7
19.–O A. tem direito no ano da cessação do contrato ás ferias e subsídios de férias e natal proporcionais e foi isso que foi pedido.
20.–Quanto aos subsídios eram pagos na proporção de metade, mensalmente em duodécimos, tem assim o A. direito á outra metade. (DOC.7,8,9 ESS da contestação)
21.–E as férias do ano de 2015 ainda não tinham sido gozadas por não estarem vencidas, as férias gozadas em 2015 eram respeitante ao ano de 2014.
22.–O A. tem ainda direito á compensação pela antiguidade do valor de €2.084,82, quantia peticionada.
23.–Quanto ao assédio moral o testemunho da testemunha (…) foi bastante claro nesse especto, conforme é referido na sentença
Pelo exposto, com o douto suprimento de V.Exa. deve ser concedido provimento ao presente recurso, condenado a Ré apelada á totalidade dos pedidos, com o que se fará JUSTIÇA.

Contra-alegou a Ré pugnando pela manutenção do julgado.

Subidos os autos a esta Relação e colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

Sendo o objecto do recurso delimitado pelas respectivas conclusões, são as seguintes as questões a decidir:
1.-impugnação da matéria de facto;
2.-justa causa de resolução do contrato de trabalho;
3.-créditos salariais.

II–FUNDAMENTOS DE FACTO.

A 1ª instância considerou provados os seguintes factos:
1.-O autor esteve ao serviço da ré, sob a sua direção e autoridade, desde 1 de Outubro de 2014 com contrato de trabalho sem termo, após ter efetuado um ano de estágio remunerado. (art.º 1.º petição inicial)
2.-O autor tinha a categoria profissional de Ajudante de ação educativa de 1.ª e auferia mensalmente uma remuneração base de € 545, 00 e € 2,38 diários de subsídio de refeição, com média mensal de € 49,98, no valor total de € €594,00; com o horário, por turnos, entre as 7h30 e 15h30 ou entre 11h30 e as 19h30. (art.º 2.º petição inicial)
3.-O trabalhador era estudante universitário e, no ano letivo de 2015/2016, era o segundo e último ano do seu Mestrado. (art.º 3.º petição inicial)
4.-O autor nunca requereu o estatuto de trabalhador estudante até este ano letivo pois foi sempre conseguindo conciliar o seu trabalho com os estudos (art.º 4.º petição inicial)
5.-Porém, este ano letivo, o plano curricular obrigava o autor a frequentar um estágio de 350 horas divididas entre Outubro de 2015 e Maio de 2016, com o mínimo de 12 horas semanais. (art.º 5.º petição inicial)
6.-Esse estágio, na Escola Secundária (…), tinha de ser efetuado entre as 9H30 e as 17H30, horário do serviço de Psicologia da Escola. (art.º 6.º petição inicial)
7.-O que obrigou o autor a requerer o estatuto de trabalhador-estudante, no dia 18 de Setembro de 2015. (art.º 8.º petição inicial)
8.-A ré sempre teve conhecimento que o autor é estudante universitário e sabia de que teria de realizar um estágio, em 31 de Agosto de 2015, numa reunião informal entre membros da direção e trabalhadores. (art.º 9.º petição inicial)
9.-A trabalhadora (…) nunca foi despedida, encontrando-se apenas em gozo de licença de maternidade. (art.º 32.º contestação)
10.-Na sequência deste conhecimento e após vários pedidos verbais, a questão da frequência do estágio e do estatuto de trabalhador-estudante, foi abordada em reunião da direção da instituição com os seus trabalhadores, em 17 de Setembro de 2015. (art.º 10.º petição inicial)
11.-Nessa reunião, na qual o autor participou, ficou patente que a entidade patronal iria recusar o seu pedido pois, apesar de ter-lhe sido apresentado uma proposta, a resposta do membro da direção, Sr. (…), foi que só no ano letivo de 2016/17 seria possível. (art.º 11.º petição inicial)
12.-Nessa proposta apresentada pelo trabalhador, este teria as 4 horas semanais respeitantes aos seus direitos como trabalhador estudante, e 4 horas do seu banco de horas, que à data eram de 71 horas. (art.º 12.º petição inicial)
13.-O Sr. Presidente, Dr. (…), informou nessa data que o autor teria de formalizar o seu pedido para ser deliberado na reunião de direção. (art.º 13.º petição inicial)
14.-Assim, no dia 18 de Setembro de 2015, o autor formalizou o pedido do estatuto de trabalhador-estudante com a proposta que tinha efetuado na reunião do dia 17 de Setembro, ou seja, duas vezes por semana, o autor, com o acordo dos colegas, entraria às 7h30 e sairia às 9H00 e regressaria às 18H e terminaria às 19h30. (art.º 14.º petição inicial)
15.-Perante a comunicação escrita enviada pelo A. datada de 18 de Setembro de 2015, o primeiro momento em que a R. teve conhecimento do horário de estágio do A., foi proposto ao mesmo, várias soluções para que este pudesse compatibilizar o trabalho com o estágio. (art.º 8.º contestação)
16.-As alternativas dadas pela ré seriam faltar ao estágio e não completar este ano o seu mestrado, gozar uma licença sem vencimento, adiar para Março 2016. (art.º 23.º petição inicial)
17.-Ou seja, uma delas foi a que a partir de Março de 2016, data em que regressa a trabalhadora que se encontra de licença de maternidade, poderia a R. dispensar ao A. as horas solicitadas pelo mesmo para a frequência do estágio. (art.º 9.º contestação)
18.-Outra solução, seria que o A. adiasse a frequência do estágio para o próximo ano letivo. (art.º 10.º contestação)
19.-Outra alternativa seria pedir licença sem vencimento durante o período do estágio, dado que isso já possibilitaria à R contratar outro trabalhador para o seu lugar, sem acréscimo de encargos para a R.. (art.º 11.º contestação)
20.-A R. explicou, por diversas vezes, ao A. que a Instituição não tinha meios financeiros para contratar outro trabalhador para suprir as suas ausências. (art.º 14.º contestação)
21.-Trata-se de uma Instituição de Solidariedade Social com poucos recursos, e que o pedido que o A. estava a efetuar à R. significaria que a sua colega fosse obrigada a trabalhar 9 horas seguidas, sem qualquer interrupção. (art.º 15.º contestação)
22.-O que para além de ilegal, era inviável, pois o A. exercia as funções de ajudante de ação educativa e, para estas funções apenas existem 2 pessoas, o A. e uma colega. (art.º 16.º contestação)
23.-No dia 25 de Setembro de 2015, foi o autor informado verbalmente pela direção, na pessoa do seu Presidente, que recusavam o estatuto de trabalhador-estudante nos termos da proposta apresentada. (art.º 15.º petição inicial)
24.-Em 28 de Setembro de 2015, o A. enviou à R. carta de resolução por justa causa do contrato de trabalho, o que o fez nos termos do artigo número 394.º n.º2, alíneas b), e) e f), do Código do Trabalho. (art.º 18.º petição inicial)
25.-Por carta datada de 30 de Setembro de 2015, o A. recebeu o indeferimento da sua proposta, com o fundamento de que o autor tinha pedido horas a que não tinha direito e que tinham dado alternativas que tinham sido rejeitadas. (art.º 19.º petição inicial)
26.-A partir do pedido supra referido, o Sr. (…) começou a frequentar com mais frequência a instituição. (art.º 29.º petição inicial)
27.-O que ocorreu porque com a entrada do seu neto para o A.T.L., neste 1º ano, o mesmo vai levá-lo e busca-lo à Instituição. (art.º 34.º contestação)
28.-Tal como fazia com os outros trabalhadores, (…) dava ordens ao autor para limpar a carrinha da instituição, quando quem, por vezes, fazia esse serviço, era uma entidade externa; bem como para colocar gasóleo, que ele trazia em bidons, na carrinha da instituição. (art.º 30.º petição inicial)
29.-Tais bidons são oferecidos à Instituição por um benfeitor da R., que é carecida de recursos, aproveita e agradece tal dádiva. (art.º 40.º contestação)
30.-Durante o mês de Setembro de 2015, o A. sofreu de duas crises de enxaquecas graves, a última das quais em 23 de setembro. (art.º 32.º petição inicial)
31.-Enxaquecas que o obrigaram a interromper o seu trabalho, para se isolar em um ambiente escuro e silencioso. (art.º 33.º petição inicial)
32.-O autor sofre de enxaquecas ocasionais mas espaçadas no tempo, nunca duas durante o mês. (art.º 34.º petição inicial)
33.-Os subsídios de férias e de Natal foram pagos em duodécimos. (art.º 49.º contestação)
34.-O A., em Agosto de 2015, gozou 30 dias de férias. (art.º 5.º contestação).

III–APRECIAÇÃO.

1.-Da impugnação da matéria de facto:
Na conclusão 5ª insurge-se o Autor relativamente à matéria inserta no ponto 12, pretendendo que esta tem por base o que foi alegado no art. 12 da p.i. e aí se refere que na proposta apresentada pelo Autor este teria direito a 5 horas semanais como trabalhador estudante e não 4 horas , como ficou assente.
Sem razão, porém.
Com efeito, a proposta que o Autor apresentou à Ré e que veio a formalizar, por escrito, tem o conteúdo a que alude o ponto 12.
Tal proposta consta do doc. de fls 25 junto com a p.i. e dela se retira que o Autor pretendia a dispensa de 8 horas semanais e a flexibilidade do seu horário de trabalho, de modo a ser possível realizar as actividades lectivas do Mestrado, pretendendo que 4 delas “são as estabelecidas por lei na condição de dispensa, (...)  para que as outras quatro sejam descontadas em regime de banco de horas.”
Assim, mantém-se o teor do ponto 12.

Porém, e porque mais consentâneo com o teor do documento em causa, altera-se a redacção do ponto 14, que passa a ser a seguinte:
14.-Assim, no dia 18 de Setembro de 2015, o A. apresentou um “Requerimento de estatuto trabalhador estudante”, de acordo com a proposta que tinha efectuado no dia 17 de Setembro, nos termos que constam do escrito de fls. 25 e cujo teor aqui se dá por reproduzido.
Refere o Autor na conclusão 6ª que existe contradição entre o teor dos pontos 15 e 16.

Estes pontos têm o seguinte teor:
15.-Perante a comunicação escrita enviada pelo A. datada de 18 de Setembro de 2015, o primeiro momento em que a R. teve conhecimento do horário de estágio do A., foi proposto ao mesmo, várias soluções para que este pudesse compatibilizar o trabalho com o estágio. (art.º 8.º contestação)
16.-As alternativas dadas pela ré seriam faltar ao estágio e não completar este ano o seu mestrado, gozar uma licença sem vencimento, adiar para Março 2016. (art.º 23.º petição inicial)
A invocada contradição, segundo o Autor, radica no facto de nenhuma das alternativas apresentadas pela Ré representavam uma compatibilização com o seu horário de trabalho, obrigando-o antes a ter de desistir do mesmo Mestrado.

Porque o segmento inserto na parte final do ponto 15 tem cariz conclusivo (se as alternativas apresentadas visavam compatibilizar o trabalho com o estágio, há-se retirar-se do conteúdo dessas mesmas propostas em face do horários de trabalho e do estágio), determina-se a eliminação dessa expressão, passando o ponto 15 a ter a seguinte redacção:

15.-Perante a comunicação escrita enviada pelo A. datada de 18 de Setembro de 2015, o primeiro momento em que a R. teve conhecimento do horário de estágio do A., esta apresentou várias alternativas.
Por último, a crítica do Apelante dirige-se para os ponto 21 e 22, pretendendo que as horas que a sua colega faria, para viabilizar a dispensa de horas que pretendia, eram 8 horas e não 9, como consta do ponto 21, o que não é ilegal, traduzindo antes a prestação de trabalho extraordinário.
Porque da matéria assente devem constar apenas factos e não matéria conclusiva e/ou de direito, é patente que no ponto 22 não pode figurar a expressão “o que para além de ilegal, (...)”, que deve ser eliminada.
Quanto ao horário que a colega Ângela R... devia cumprir para viabilizar a pretensão do Autor – 8 horas em vez de 9 horas – não resulta provado, em face da prova produzida, mormente do depoimento desta testemunha, em que este respalda a sua impugnação, pelo que se mantém o teor do ponto 21.

Quanto ao ponto 22, em face do referido supra, passa a ter a seguinte redacção:
22.-O que era inviável, pois o A. exercia as funções de ajudante de ação educativa e, para estas funções apenas existem 2 pessoas, o A. e uma colega. (art.º 16.º contestação)
Porque se encontram juntos aos autos os documentos a que aludem os pontos 24 e 25 e porque se mostra relevante saber, com exactidão, o seu teor, altera-se a seu conteúdo que passa a ser o seguinte:
24.-Em 28 de Setembro de 2015, o Autor remeteu à Ré o escrito de fls. 27-28 dos autos, comunicando-lhe a resolução do seu contrato, com invocação de justa causa, nos termos e com os fundamentos que dele constam e que aqui se dão por reproduzidos.
25.-Por carta datada de 30 de Setembro de 2015, a Ré comunicou ao Autor o indeferimento da sua proposta, nos termos que constam do escrito de fls 30, onde se refere:
“A Direcção do (…) vem por este meio acusar a receção da sua carta, datada de 18 de Setembro de 2015.
Relativamente à sua solicitação para usufruir do estatuto de trabalhador estudante, temos a referir que foi indeferida pela Instituição, tendo em conta que o seu pedido para ser dispensado do trabalho, com vista à realização de estágio curricular, foi de oito horas semanais, ultrapassando as cinco horas semanais que esse estatuto lhe confere. O indeferimento, decidido em reunião de Direcção e comunicado verbalmente a 25/09/2015, deve-se ao transtorno que iria causar no funcionamento do Centro de Estudos, prejudicando e obrigando outros colaboradores a trabalhar para além o seu horário de trabalho.
Neste sentido foram apresentadas propostas alternativas, por parte da entidade patronal, soluções essas que foram rejeitadas.
Face ao exposto, entendemos que não existem condições para a dispensa do trabalho, nos moldes em que esta foi solicitada, dado que isso iria comprometer manifestamente o funcionamento da Instituição.”

Por ser ainda relevante para a decisão da causa, encontrando-se provado documentalmente, adita-se ainda novo ponto com o seguinte teor:
35.-Nos termos do contrato de trabalho celebrado entre Autor e Ré e que se encontra junto por cópia a fls. 18-18, o Autor obrigou-se a prestar um período normal de trabalho de 7,12 horas diárias e 36 horas semanais.
Como se alcança da motivação da matéria de facto, o ponto 33 fundamenta-se nos recibos de vencimento juntos pela Ré com a contestação.
Assim, por ser relevante saber os exactos montantes pagos pela Ré a título de subsídios de férias e de Natal, altera-se o ponto 33 que passa a ter o seguinte teor.

33.-A Ré pagou ao Autor os montantes a que aludem os recibos de vencimento de fls. 51-60, no valor global de €545,00, a título de subsídio de férias e €403,76, a título de subsídio de Natal.
Tendo ainda em conta o recibo de fls. 58, o ponto 34 passa também a ter a seguinte redacção:
34.-O A., em Agosto de 2015, gozou 30 dias de férias, tendo a Ré pago a respectiva retribuição de €545,00.
No mais, mantém-se a matéria de facto fixada pela 1ª instância, que assim se considera definitivamente assente.

2.-Da justa causa de resolução do contrato.
Vejamos agora se o Recorrente resolveu com justa causa o contrato de trabalho que o vinculava à Ré, desde 1.10.2014 até à sua cessação.

A sentença recorrida concluiu pela negativa.

O Apelante discorda.

Vejamos então se lhe assiste razão.

Dispõe o art. 394º, n.º 1 do CT de 2009 que, ocorrendo justa causa, o trabalhador pode fazer cessar imediatamente o contrato.
A declaração de resolução do contrato deve ser feita por escrito, com a indicação sucinta dos factos que a justificam, nos trinta dias subsequentes ao conhecimento desses factos (art. 395º, n.º 1 do CT), sendo apenas atendíveis para justificar a resolução, os factos invocados nessa comunicação.

O art. 394º, n.º 2 do mesmo diploma enuncia, a título exemplificativo, alguns dos comportamentos da entidade empregadora constitutivos de justa causa de resolução do contrato e que, nos termos do art. 396º, n.º 1, conferem ao trabalhador o direito a uma indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos.

Entre esses comportamentos figura, com pertinência para o caso em apreço, a violação culposa de garantias legais ou convencionais do trabalhador (al. b).

O art. 394º, n.º 4 do CT diz-nos, por seu turno, que a justa causa deve ser apreciada nos termos do n.º 3 do art. 351º, com as necessárias adaptações. Quer isto dizer que, na apreciação da justa causa, o tribunal deve atender ao grau de lesão dos interesses do trabalhador, ao carácter das relações entre as partes e às demais circunstâncias que se mostram relevantes.

Assim para que um trabalhador possa resolver o seu contrato de trabalho, com direito a indemnização, é necessário que a conduta da entidade empregadora configure um comportamento culposo que pela sua gravidade e consequências torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho.

Sendo apenas atendíveis para fundamentar a justa causa os motivos invocados na carta de resolução, vemos que nela o Autor a sustenta em dois fundamentos, a saber:
a)-Ter-lhe sido negado pela Ré “o benefício do seu trabalho ser ajustado de modo a permitir a frequência das aulas e a deslocação para o estabelecimento de ensino e a dispensa do trabalho, de cinco horas semanais, sem perda de direitos;”
b)-Ter a pretensão do Autor “causado mau estar no seu ambiente de trabalho, sofrendo o trabalhador pressão e coacção diárias por parte de elementos responsáveis pela entidade patronal.”

O direito à protecção das condições de trabalho dos trabalhadores-estudantes, consagrado no art. 59, nº2, f) da CRP, encontra-se actualmente densificado no Código do Trabalho (arts. 89 a 96-A), normas estas que correspondem, no essencial, ao regime do CT anterior e do RCT e que se tinham inspirado no primeiro regime geral que vigorou entre nós sobre esta matéria e que constava do Estatuto do Trabalhador-Estudante, aprovado pela Lei nº116/97, de 4.11.

As normas do CT são ainda completadas pela Lei nº 105/2009, de 14.12, cujo art. 12 estabelece algumas especificidades da frequência de estabelecimento de ensino por trabalhador-estudante.

Decorre do nº1 do art. 89 do CT que “Considera-se trabalhador-estudante o trabalhador que frequenta qualquer nível de educação escolar, bem como curso de pós-graduação, mestrado ou doutoramento em instituição de ensino, ou ainda curso de formação profissional ou programa de ocupação temporário de jovens com duração igual ou superior a seis meses.

Para a concessão do estatuto de trabalhador-estudante preconiza o nº1 do art. 94 do CT que “O trabalhador estudante deve comprovar perante o empregador a sua condição de estudante, apresentando igualmente o horário das actividades educativas a frequentar.”

Efectuada essa prova perante a entidade patronal, o art. 90 do CT regula a organização do tempo de trabalho do trabalhador estudante, nos seguintes termos:
1–O horário de trabalho de trabalhador-estudante deve, sempre que possível, ser ajustado de modo a permitir a frequência das aulas e a deslocação para o estabelecimento de ensino.
2–Quando não seja possível a aplicação do disposto no número anterior, o trabalhador-estudante tem direito a dispensa de trabalho para frequência de aulas, se assim o exigir o horário escolar, sem perda de direitos e que conta como prestação efectiva de trabalho.

3–A dispensa de trabalho para frequência de aulas pode ser utilizada de uma só vez ou fraccionadamente, à escolha do trabalhador-estudante, e tem a seguinte duração máxima, dependendo do período normal de trabalho semanal:
a)-Três horas semanais para período igual ou superior a vinte horas e inferior a trinta horas;
b)-Quatro horas semanais para período igual ou superior a trinta horas e inferior a trinta e quatro horas;
c)-Cinco horas semanais para período igual ou superior a trinta e quatro horas e inferior a trinta e oito horas;
d)-Seis horas semanais para período igual ou superior a trinta e oito horas.

4–O trabalhador-estudante cujo período de trabalho seja impossível ajustar, de acordo com os números anteriores, ao regime de turnos a que está afecto tem preferência na ocupação de posto de trabalho compatível com a sua qualificação profissional e com a frequência de aulas.
5–Caso o horário de trabalho ajustado ou a dispensa de trabalho para frequência de aulas comprometa manifestamente o funcionamento da empresa, nomeadamente por causa do número de trabalhadores-estudantes existente, o empregador promove um acordo com o trabalhador interessado e a comissão de trabalhadores ou, na sua falta, a comissão intersindical, comissões sindicais ou delegados sindicais, sobre a medida em que o interesse daquele pode ser satisfeito ou, na falta de acordo, decide fundamentadamente, informando o trabalhador por escrito.
(...)

Revertendo ao caso concreto, decorre dos factos provados que o Autor, no ano lectivo de 2015/2016, frequentava o 2º ano de Mestrado.

Estava assim em condições de beneficiar do estatuto de trabalhador estudante, nos termos do nº1 do art. 89 do CT.

Todavia, contrariamente ao que sustenta o Apelante, a concessão desse estatuto não é “automática”, dependendo da prova, perante o empregador, dos requisitos a que alude o nº1 do art. 94 supra referido, ou seja, da sua condição de estudante e do horário das actividades a frequentar.

In casu apenas ficou provado que o Autor formalizou perante a empregadora o pedido de concessão desse estatuto, invocando a verificação desses requisitos, mas não que tenha apresentado a prova respectiva.

Não obstante, a Ré não se prevaleceu dessa situação para negar o reconhecimento do invocado estatuto.

O que fez, outrossim, foi negar-lhe a organização do seu horário de trabalho nos termos pelo mesmo reivindicado e que se traduzia na dispensa de 8 horas semanais de prestação de trabalho, sendo 4 ao abrigo do estatuto de trabalhador estudante e as restantes 4 do seu banco de horas (que, à data, era de 71 horas), repartidas por dois dias da semana, entre as 7,30h e as 9h e regresso às 18h e término às 19,30h.

Decorre do nº1 do art. 90 que o empregador deve, sempre que possível, ajustar o horário de trabalho do trabalhador de modo a permitir-lhe a frequência das aulas e a deslocação para o estabelecimento de ensino.

No presente caso, o plano curricular do Autor obrigava-o a frequentar um estágio de 350 horas dividido entre Outubro de 2015 e Maio de 2016, com o mínimo de 12 horas semanais, que devia ter lugar na Escola Secundária da Baixa da Banheira.

Estando o Autor vinculado a um horário de trabalho, por turnos, entre as 7,30h e as 15,30h ou entre as 11,30h e as 19,30h, é evidente que havia sobreposição entre o horário de trabalho e o escolar.

Embora decorra para a empregadora, em primeira linha, a obrigação de compatibilizar estes horários, ficou provado que sendo o Autor ajudante de acção educativa, aquela apenas dispunha de outra pessoa para o exercício dessas funções. Mais se provou que a Ré é uma Instituição de Solidariedade Social com poucos recursos económicos e que a pretensão do Autor acarretaria a que a outra colega fosse obrigada a trabalhar nove horas seguidas ou, em alternativa, que fosse contratada outra trabalhadora para suprir as ausências, sendo que aquela não dispunha de meios financeiros para o efeito.

Daqui flui que não se mostrava possível a organização do tempo de trabalho do Autor nos moldes propostos por este.

Adianta o nº 2 do mesmo preceito que, não sendo possível a harmonização dos horário de trabalho e lectivo, assiste ao trabalhador a dispensa de trabalho que, no caso, era de cinco horas semanais, uma vez que o seu período normal de trabalho semanal era de 36 horas (art. 90, nº3, b).

Porque essa dispensa não era suficiente para cumprir o plano curricular, pretendia ainda o Autor usufruir de 4 horas semanais, ao abrigo do banco de horas, sendo que, ao tempo, dispunha de 71 horas.

O art. 208-A do CT, aditado pelo art. 3º da Lei nº 23/2012, de 25.6, transpõe para a figura do banco de horas o mecanismo da instituição da adaptabilidade individual. Nele se admite que o regime de banco de horas possa ser instituído por acordo entre empregador e trabalhador, acordo este que pode ser celebrado mediante proposta, por escrito, do empregador, presumindo-se a aceitação do trabalhador que a ele se não oponha, por escrito, nos 14 dias seguintes ao conhecimento do mesmo (nºs 1 e 2 do art. 208-A).

Nestas hipóteses, o acréscimo de trabalho está limitado a duas horas diárias e 50 semanais, existindo um limite de 150 horas anuais (nº1 do art. 208-A).

O acordo que consagre o regime de banco de horas deve regular a forma de compensação do trabalho prestado em acréscimo, em qualquer das modalidades preconizadas no nº4 do art. 208.

Assim, esta compensação pode revestir, nomeadamente, a modalidade de redução equivalente do tempo de trabalho. Neste caso, a lei concede ao trabalhador a iniciativa de fixar o exacto momento em que a redução do trabalho deve ter lugar ou, na sua falta, deverá ser a entidade patronal a fazê-lo.

Pretendendo o Autor usufruir do banco de horas, cabia-lhe alegar e provar que fora fixada a modalidade de redução equivalente do tempo de trabalho e quais os períodos concretamente fixados, de modo a poder aferir-se se a pretensão do mesmo de gozar de dispensa das 4 horas semanais, no período em questão, estavam contempladas no acordo respeitante ao banco de horas.  

Não o tendo feito, não lhe pode ser reconhecido o direito de, unilateralmente, impor à Ré a redução do tempo de trabalho, no período pretendido.

Ao recusar o requerimento formulado pelo Autor, ao abrigo do estatuto de trabalhador estudante, mas que abarcava também um período a gozar no âmbito do banco de horas, que não comprovou estar contido no acordo que este instituto pressupõe, há que concluir que a entidade patronal não actuou de forma ilícita.

Acresce que o fundamento invocado pelo Autor na comunicação de resolução do contrato de trabalho é o da não concessão pela Ré da dispensa de cinco horas de prestação de serviço semanais, ao abrigo do estatuto de trabalhador-estudante, sendo que não ficou provado tal factualidade, já que o que ficou demonstrado foi que a Ré indeferiu o seu o pedido, de acordo com a proposta que aquele lhe apresentou (4 horas semanais ao abrigo do estatuto de trabalhador estudante e outras 4 por conta do banco de horas).

Relativamente ao assédio moral de que diz ter sido vítima, o Autor apenas alude na comunicação rescisória ao “mau estar no seu ambiente de trabalho, sofrendo o trabalhador pressão e coacção diárias por parte de elementos responsáveis pela entidade patronal” e que lhe terão causado problemas de saúde.

Ora estas expressões são vagas e não estão minimamente suportadas em factos concretos, o que impede um juízo valorativo sobre a conduta da Ré integradora da justa causa invocada.

De qualquer forma, sobre esta matéria apenas se provou o que consta dos pontos 28 e 29.

Diz-nos o art. 29, nº1 do CT  o que deve ser entendido por assédio moral.

Assim, entende-se por assédio o comportamento indesejado, nomeadamente o baseado em factores de discriminação, praticado aquando do acesso ao emprego ou no próprio emprego, trabalho ou formação profissional, com o objectivo de perturbar ou constranger a pessoa, afectar a sua dignidade, ou de lhe criar um ambiente intimidativo, hostil, degradante, humilhante ou desestabilizador.

O assédio moral pode assumir duas formas: o assédio moral discriminatório, em que o comportamento indesejado e com efeitos hostis se baseia em qualquer factor discriminatório que não o sexo (este contemplado no nº2 do art. 29); e o assédio moral não discriminatório, quando não se baseia em nenhum facto discriminatório, mas pelo seu carácter continuado e insidioso, tem os mesmos efeitos hostis, almejando, em última análise, afastar o trabalhador da empresa (mobbing).

No caso vertente, não resulta dos factos provados que a Apelada tenha assumido qualquer comportamento indesejado e hostil baseado em qualquer factor de discriminação do tipo dos enumerados no art. 24, nº1 do CT, razão pela qual deve concluir-se no sentido de que aquela não cometeu qualquer comportamento susceptível de se enquadrar no assédio moral discriminatório.

E dos comportamentos descritos nos aludidos pontos 28 e 29 também não se pode retirar a existência de assédio moral na sua forma discriminatória ou mobbing.

É que, e desde logo, importa ter presente que nem todas as situações de conflito laboral podem ser qualificadas como mobbing.

Com efeito, o que diferencia o conflito laboral do assédio moral é a intencionalidade que está por detrás de um e outro, sendo que neste último existe, como motivação da conduta, uma clara e manifesta intencionalidade do agressor de se livrar da pessoa assediada, o que não está presente no primeiro.

A acrescer a essa intenção, o comportamento subsumível ao conceito de assédio moral há-de ser sistemático, repetitivo e com clara premeditação de realização daquela intenção, o que manifestamente não decorre dos factos provados, em que os trabalhos exigidos ao Autor e que este considera vexatórios eram também dirigidos a outros colaboradores.

Há assim concluir pela não verificação de justa causa para a resolução do contrato promovida pelo Autor.

3.-Dos créditos laborais
Reitera o Autor no recurso que tem direito no ano da cessação do contrato às férias e subsídios de férias e de Natal e Natal proporcionais.

Vejamos.

De acordo como o nº1 do art. 237 do CT/2009, o trabalhador, com a celebração do contrato de trabalho, tem direito, em cada ano civil, a um período de férias retribuídas, que se vence em 1 de Janeiro.

No entanto, uma coisa é a aquisição do direito a férias, outra é a sua exigibilidade ou vencimento. Assim, da conjugação dos arts. 237, nºs 1 e 2 do CT, constata-se que, em regra, o direito a férias reporta-se ao trabalho prestado no ano civil anterior, vencendo-se no dia 1 de Janeiro do ano subsequente.

A excepção a essa regra é a que resulta dos nºs 1, 2 e 3 do art. 239
do CT, segundo os quais, no ano de admissão, o trabalhador tem direito a dois dias úteis de férias por cada mês de duração do contrato, até 20 dias, cujo gozo pode ter lugar após seis meses completos de execução do contrato, que pode incidir ainda no ano civil da contratação ou no ano civil subsequente, conforme a data do respectivo contrato.

Por sua vez, o período anual de férias tem a duração mínima de 22 dias úteis (art. 238, nº1 do CT).

Quanto aos efeitos da cessação do contrato de trabalho no direito a férias, o art. 245 do CT estabelece que, cessado o contrato, o trabalhador tem direito a receber a retribuição de férias e respectivo subsídio:
a)-correspondente a férias vencidas e não gozadas;
b)-proporcionais ao tempo de serviço prestado no ano da cessação.
Pra evitar que da conjugação das regras mencionadas decorra um regime de maior favorecimento dos trabalhadores com contrato de trabalho de curta duração, no nº3 do art. 245 do CT estabeleceu-se a regra da proporcionalidade entre o direito a férias destes trabalhadores e a duração do contrato, no caso dos contratos cuja duração não seja superior a 12 meses. Nesta situação, o cômputo total das férias ou da correspondente retribuição não pode exceder o proporcional ao período anual de férias tendo em conta a duração do contrato.

No caso vertente, o contrato de trabalho iniciou-se em 1.10.2014 e cessou com a comunicação do Autor enviada para a Ré em 28.9.2015. Sendo esta declaração uma declaração recipienda, que só se torna eficaz com o seu conhecimento pelo declaratário, mas desconhecendo-se a data em que este conhecimento se verificou, ter-se-á que presumir, por analogia, tal como acontece com as notificações para as partes que não constituam mandatário, que a mesma se verificou no 3º dia posterior ao do registo (art. 249 do CPC), ou seja, em 1.10.2015, data em que se completavam 12 meses do contrato (art. 279, c) do CC).

Tendo o Autor gozado 22 dias úteis de férias em Agosto de 2015, e recebido a retribuição correspondente e ainda € 545, 00, a título de subsídio de férias, nada lhe é devido a esse título.

Relativamente ao subsídio de Natal, o mesmo é proporcional ao tempo de serviço prestado no ano civil, no ano de admissão do trabalhador e no ano da cessação do contrato (art. 263, nº2, a) e b), sendo que, por força do nº1 do art. 262 abrange apenas a retribuição base e diuturnidades, pelo que o Autor tem direito a receber;
a)-no ano de admissão 3/12 da retribuição base;
b)-9/12 no ano da cessão, sendo o valor global de €545,00.

Tendo a Ré feito apenas prova de haver pago ao trabalhador, a este título a quantia de €403,76, sendo que era sobre esta que recaía o ónus da prova do pagamento, por se tratar de factualidade impeditiva do direito invocado pelo Autor (art. 342, nº2 do CC), temo o trabalhador direito à respectiva diferença, no montante de €141,24, a que acrescem juros de mora vencidos a partir da data da citação (conforma peticionado) e vincendos, à taxa legal, até efectivo pagamento.

Procede, pois, apenas parcialmente, a apelação.

IV–DECISÃO.

Pelo exposto, acorda-se em julgar parcialmente procedente a apelação, pelo que se altera a sentença recorrida, condenando-se a Ré a pagar ao Autor a quantia de €141,24, acrescida de juros de mora vencidos a partir da data da citação e vincendos, à taxa legal, até efectivo pagamento.
Custas por Apelante e Apelada na proporção do respectivo decaimento.


Lisboa, 5 de Abril de 2017   

                                
Filomena Manso
José Manuel Duro
Albertina Pereira