Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
6490/12.1T2SNT-C.L1-6
Relator: ANTÓNIO SANTOS
Descritores: ADMINISTRADOR DA INSOLVÊNCIA
LEGITIMIDADE
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 05/11/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: N
Texto Parcial: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: Tendo presente o disposto nos artºs 81º, nº1 e 85º, nº3 , ambos do CIRE, pacífico é que em razão da declaração da insolvência de devedor, fica este último privado dos poderes de administração e disposição relativamente a bens compreendidos na massa insolvente, ou seja, sendo essencialmente os efeitos da referida decisão de natureza patrimonial, e reflectindo-se eles nos poderes de actuação do insolvente no referido domínio e na sua esfera jurídica, passam os poderes em causa a ser da competência do administrador da insolvência .
A legitimidade que o CIRE confere ao administrador da insolvência de agir/actuar em defesa do interesse da massa insolvente e dos direitos dos credores, não é partilhada/ cumulativa com uma outra - de igual natureza e conteúdo - do próprio insolvente, a ponto de no âmbito da prossecução e defesa dos interesses e direitos acima referidos poder também o insolvente agir por si e em “substituição” do administrador da insolvência no desempenho das funções que lhe incumbe/compete.
Em face do referido carece o devedor insolvente de legitimidade para, sponte sua, substituir-se ao administrador da insolvência no exercício de concreta tarefa em defesa dos interesses dos credores, v.g. dirigindo-se a processo de insolvência de um terceiro e nele deduzir uma reclamação de um crédito .

(Sumário elaborado pelo Relator)
Decisão Texto Parcial: Acordam os Juízes, do Tribunal da Relação de Lisboa.

                                                          
  1. Relatório

                      
No seguimento da propositura de acção com processo especial de declaração de INSOLVÊNCIA , veio o Tribunal judicial de Sintra, por sentença já transitada em julgado, a declarar a insolvência de A e de B, fixando-se na competente sentença o prazo ( em 30 dias ) para os credores deduzirem a reclamação de créditos.

1.1.Deduzidas diversas reclamações, seguiu-se então a apresentação pelo administrador da insolvência da lista dos credores por si reconhecidos e não reconhecidos ( cfr. artº 129º, do CIRE ) , e , apresentadas que foram concretas impugnações [ v.g. por  C e mulher, D ] , a uma delas [ a de  C e mulher, D ] veio o Exmº administrador da insolvência RESPONDER , nos termos do nº1, do artº 131º, do CIRE, impetrando que fosse a mesma considerada INEFICAZ
1.2. Por fim, APÓS pronunciarem-se os impugnantes C e mulher, D , sobre a “Resposta” do administrador da insolvência identificada em 1.1., e considerando-se - implicitamente - o processo já “pronto” para o efeito,  foi pelo Exmº Juiz proferido saneador-sentença  [ em 7/12/2016 ] , nos termos do artº 136º, nº6, do CIRE, sendo o respectivo excerto decisório do seguinte teor :
“ (…)
V DECISÃO:
Nestes termos, e face a todo o exposto:
a)-Julgo verificados os créditos nos termos descritos sob o item III supra, incluindo os créditos objecto das impugnações deduzidas e procedentes ;
b)-Graduo os mesmos créditos da seguinte forma:
- Relativamente ao produto resultante da venda do direito sobre o prédio descrito na Conservatória do Registo Predial do Barreiro sob o n° 929.
O crédito garantido por hipoteca reclamado pela " E ….,S.A.", de acordo com a prioridade de inscrição e até aos limites garantidos e reconhecidos.
Todos os demais créditos comuns, na respectiva proporção caso não obtenham satisfação integral.
Os créditos subordinados.

- Relativamente ao produto resultante da venda do prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de Sintra sob o n° 250. Fracção "A"
O crédito garantido por hipoteca reclamado pelo "…Bank (Portugal) SA", de acordo com a prioridade de inscrição e até aos limites garantidos e reconhecidos.
Todos os demais créditos comuns, na respectiva proporção caso não obtenham satisfação integral.
Os créditos subordinados.

Relativamente ao produto resultante da venda do prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de Sintra sob o n 250, fracção "B"
O crédito garantido por hipoteca reclamado pelo ''Deutsche Bank (Portugal) SA", de acordo com a prioridade de inscrição e até aos limites garantidos e reconhecidos.
Todos os demais créditos comuns, na respectiva proporção caso não obtenham satisfação integral.
Os créditos subordinados.                                               
As dívidas da massa insolvente (art.° 51° do CÍRE), saem precípuas do produto da venda nos termos do art.° 172°, n.°s 1 e 2, do mesmo diploma legal).
Custas a cargo da massa insolvente.
Registe e notifique.
Comunique ao Sr. Administrador de insolvência.
Processei e revi.
2016-12-07
1.3. Notificados da sentença identificada em 1.2., e com ela inconformados , da mesma apelaram então C e mulher D, reclamantes e Impugnantes, apresentando na respectiva peça recursória as seguintes conclusões  :
1 Os Recorrentes entregaram ao Administrador de Insolvência (AI) inicialmente nomeada, por 3 Cartas Registadas no dia 08.08.2012, por ele recebidas, todas no dia 13.08.2012, 3 Reclamações de Créditos, uma no valor de 279.717,34 € - que foi reconhecida pelo Sr. AI e  2 outras, no valor de 300.000 euros e de 50.000 euros, que não foram objecto de qualquer apreciação - positiva ou negativa - por parte do Sr. AI, quer para o efeito da Assembleia de Credores de 11.09.2012 quer para o efeito do Parecer a que se reporta o Artigo 129 no. 1 do CÍRE.
2 Os Recorrentes-Falidos impugnaram, no prazo legal, em 28.10.2013, a relação dos créditos a que se reporta o Artigo 129 nº. 1 do CIRE  ( impugnação parcial do crédito da Credora E ) e, no mesmo prazo, arguiram a nulidade derivada do facto de não ter sido reconhecidos aqueles 2 outros Créditos reclamados e, para o efeito, entregaram nos autos o teor das Petições Iniciais de essas 3 Reclamações de Créditos, e respectivos documentos, bem como parte da Prova da expedição e recebimento de esses Articulados.
3 E, em 08.07.2016, na sequência do douto Despacho para se pronunciarem sobre o Requerimento de 02.06.2016 do Sr. AI, os Recorrentes entregaram a "Resposta" a esse requerimento e entregaram nos autos as demais provas relativas ao facto de terem sido expedidas as referidas Cartas Registadas e de as mesmas terem sido recebidas por parte da pessoa que inicialmente exerceu as funções de Administrador de Insolvência, Dr. Fernando Caldeira Martins.
4 E, em 11.09.2012, os aqui Recorrentes, através do seu mandatário, o Advogado signatário, participaram na Assembleia de Credores, tendo sido admitidos os 3 créditos a que se reportam as referidas 3 Reclamações de Créditos, apesar de os mesmos não constarem, sem justificação alguma, no Relatório que o Sr. Administrador de Insolvência então elaborou, e , nessa Assembleia, os Recorrentes, enquanto Credores, apresentaram uma proposta que não foi aprovada por parte dos Credores.
5 A impugnação dos créditos da Bolsimo fundou-se, na essência, no facto de a Bolsimo ter reclamado o pagamento de  (a) - juros a uma taxa fixa de 5% ao ano em vez de à taxa contratual, a de "Euribor a 6 Meses" + 1,75%, (b) - um valor indemnizatório, para a situação ade mora, de 8%  em vez de apenas 4%, (c) - ter considerado a situação de "mora" como existente desde 18.02.2002 em vez de 23.04.2006 e (d) - por isso, ter peticionado 1.751.500,73 euros em vez, no máximo, 1.393.500 euros
6 Os Recorrentes-falidos ainda não foram declarados isentos do pagamento do chamado "passivo remanescente" (ou "passivo restante")
7 Ora, os mencionados créditos reclamados pelos Recorrentes não fazem parte dos "bens compreendidos na Massa Insolvente" do processo de Lisboa/Almada e o Sr. Al não os arrolou como tal no Auto de Apreensão de Bens, sendo que de este Auto apenas constam 2 bens imóveis, um dos quais já foi vendido.
8 Pelo menos até 18.12.2012, os aqui Recorrentes-Falidos (no processo de Almada, agora Lisboa) ainda não estavam definitivamente declarados como Falidos, em virtude de, face ao recurso que foi interposto, a douta Sentença de 29.05.2012 apenas transitou em julgado em 18.12.2012.
9 O Sr. AI, relativamente à substância da Reclamações de Créditos ou à prescrição dos créditos que se lhe reportam ou, ainda, à caducidade do direito de as efectuar, ou à extemporaneidade das mesmas e, ainda, quanto à correcção da parcial Impugnação dos Créditos da E efectuada pelos Recorrentes, nada disse no (seu) Relatório a que se reporta o Artigo 129 nº 1 do CÍRE, apenas invocando que o mandato do Advogado signatário já tinha caducado em virtude de ter sido proferida a Sentença da Falência dos Recorrentes.
10 Face a estes factos, não se concorda com a decisão judicial proferida, em virtude de, em vez da douta Sentença, haverá de ter sido proferido um Despacho Saneador, nos termos e para os efeitos do disposto nos Artigos 595, 596 e 597, todos do CPC, a fim de que se efectuasse uma mais aprofundada Produção de Prova atinente a todos os factos alegados pelos aqui Recorrentes (quer enquanto Reclamantes quer enquanto Impugnantes ), declarasse provados os factos constantes das 9 Conclusões anteriores, com a subsequente especificação dos Temas da Prova e a realização do Julgamento e, subsequentemente, com a prolação da douta Sentença final; com efeito.
11 as intervenções processuais dos Recorrentes visaram a defesa dos seus interesses e, reflexamente, os interesses da Massa Insolvente do seu processo de Falência (esta decretada no ex-Tribunal de Almada e a decorrer agora no Tribunal de Lisboa) - aumentando o Activo Patrimonial da Massa Falida e diminuindo o Passivo Patrimonial da Massa Falida dos Falidos nos autos;  e  ,
12 obviamente, os interesses dos Recorrentes são totalmente opostos aos interesses dos Credores no presente processo de Falência e aos interesses dos Falidos no mesmo e visaram, e visam, que seja maior o volume do Activo patrimonial da Massa Insolvente dos Recorrentes e menor o montante do crédito de um dos demais credores no presente processo de Falência ;
13 Por essas razões, os Recorrentes têm todo o legítimo interesse em agir, como agiram nos autos e, assim, o direito a reclamar, autonomamente, créditos, na defesa da sua Massa Insolvente , e mesmo que tal seja feito contra o entendimento da pessoa do Sr. Administrador de Insolvência e, por isso mesmo, todos os actos que praticaram para os efeitos dos presentes autos, em 08.08.2012, 11.09.2012, 28.10.2013 e 08.07.2016, são inteiramente válidos e eficazes e de pleno valor jurídico.
14 De facto, se bem que o Al possa substituir-se ao Falido, à natureza da sua intervenção processual está subjacente o facto de, usualmente, o Falido se desinteressar totalmente da sua vida financeira e patrimonial e, de tal facto, não decorre - e nem o CIRE o afirma - que ao Falido está vedada tomar providências no sentido de zelar pelos seus interesses ; já que a natureza da intervenção dos Ads é meramente residual, complementar, ou substitutiva, dos Falidos e não exclusiva.
15 Aliás, os direitos que são atribuídos ao AI não acarretam para o Falido qualquer "interdição", ou sequer, "inabilitação" ( que não é de se presumir ), à semelhança do que se dispõe nos Artigos 152 , 153 e 154, todos do Código Civil sobre tal matéria, mantendo os Falidos, após a Falência, integralmente toda a sua personalidade jurídica e personalidade judiciária ( com as poucas excepções previstas no CIRE e apenas relativas aos "bens" que já integrem a Massa Insolvente e que o Al administra em nome da Massa Insolvente).
16 Aliás, com a ressalva das pequenas excepções referidas na Conclusão anterior, os Falidos podem praticar os normais, e usuais, actos de administração dos seus interesses gerais, nomeadamente, o direito legítimo de defenderem os seus interesses juntos de pessoas que são suas Devedoras e junto de Credores que lhe estão a invocar uma quantidade de créditos superior àquela a que têm direito.
17 Aliás, a concreta situação em causa nos autos sempre se enquadra, como enquadra, no disposto no disposto no artigo 110 no. 2, alínea a) do CÍRE, já que o Al não tomou as devidas providências para que os interesses da Massa Insolvente fossem salvaguardados, já que não se pronunciou sobre as Reclamações que haviam sido entregues, violando o artigo 129 nº. 1 do CÍRE, não notificou os Recorrentes para o efeito de reclamarem os seus créditos - de cuja existência tomou conhecimento na Assembleia de Credores de 11.09.2012 -, não se pronunciou sobre a substância (as razões e fundamentos) das 2 Reclamações de Créditos apresentadas, quer após 11.09.2012 e antes de 28.10.2013 quer em 02.06.2016, e sobre a impugnação ao crédito reclamado pela Bolsimo e nem sequer obteve o Parecer da Comissão de Credores; de modo tal que,
18 Se os Recorrentes não tivessem actuado da forma como o fizeram, ocorreriam, pelo facto de o Sr. Al não ter tomado quaisquer providências ou realizado quaisquer diligências (pois, quer em 15.10.2013 quer em 02.06.2016, nada disse expressamente sobre as questões em causa ) e, além disso, nem sequer cumpriu a mais elementar das regras do mandato decorrentes do disposto no Artigo 1161 alínea a) do Código Civil ( pois nunca contactou os Recorrentes sobre a razão dos seus pedidos ), os "prejuízos previsíveis para a massa insolvente" (do processo de Lisboa no. 1518/12 ALM) a que se reporta o Artigo 110 nº. 2 alínea a) do CÍRE.
19 Aliás, a situação em causa nos autos é totalmente permitida pela correcta interpretação, de modo conjugado, do disposto no Artigo 81, no. 4 e no. 5, do CÍRE, na medida em que todas as "intervenções processuais" dos Recorrentes, nos autos, reflectem-se/repercutem-se, no futuro, no valor do Activo da sua Massa Insolvente, este definido no Apenso de "Apreensão de Bens", aumentando este, considerando-se as mesmas efectuadas "no âmbito" do seu processo de Falência, visto que os actos praticados pelos Recorrentes manifestamente "interessam" a essa Massa Insolvente visto aumentarem o valor económico da mesma e é esse critério de "interesse" que preside à norma que concede poderes aos Ais para poderem, também, praticar actos de administração da Massa Insolvente (artigo 81 no. 4 do CÍRE)
20 E, por isso, em caso de oposição, entre o Al e os Falidos, sobre o entendimento sobre a melhor administração da Massa Insolvente, na perspectiva do possível incremento da mesma, devem aplicar-se os princípios constantes do disposto no Artigo 81 no. 5 do CÍRE, ainda que em detrimento do entendimento do Al sobre a matéria, tanto mais que,
21 à situação dos autos não é aplicável o Artigo 85 no.s 1 e 3 do CÍRE ; não só porque o presente processo não está apensado ao processo de Falência dos Recorrentes como também não pode ser apensado porque se trata de 2 processos de Falência totalmente distintos entre si e, além disso, nos autos nada está a ser discutido que se reporte ao elenco dos "bens integrantes da massa insolvente", estes constituídos apenas por 2 bens imóveis.
22 A "Massa Insolvente" é apenas um Património, um acervo patrimonial, dotado de personalidade judiciária mas não de personalidade jurídica ; e o direito de propriedade dos bens que constituem o Activo da Massa Insolvente pertencem, em regime de direito de propriedade, até à Liquidação, ao Devedor-Falido e não à Massa Insolvente ou aos Credores (artigo 184. no. 1, a contrario, do CIRE).
23 O Falido apenas não pode dispor dos seus bens na exacta medida em que tal facto esteja "em conflito" - e enquanto o esteja - com os interesses da "Massa Insolvente" e os Credores da mesma; e o Recorrentes, sendo credores Reclamantes a quem foi reconhecido 1 crédito reclamado, têm legítimo interesse, enquanto "interessados" (para os efeitos do CIRE (art. 129-130) em que os Créditos dos demais Credores reclamantes nos presentes autos, nomeadamente o da E, sejam reduzidos ao seu valor real e verdadeiro.
24 O actual Al, actuando da forma como o fez até agora, não defendeu os referidos princípios de defesa da Justiça, mas apenas defendeu os interesses dos "Credores" da "Massa Insolvente" no presente processo, e "contra" e "em oposição" aos Credores do processo de Lisboa/antes Almada (que ele também representa).
25 O Sr. Al incorre, permanentemente, numa situação de uma manifesta DUPLA INCOMPATIBILIDADE funcional, na medida em que, sendo os interesses da "Massa Insolvente" do processo de Lisboa/Almada opostos aos da Massa Insolvente" do processo de Lisboa Oeste, não pode a mesma pessoa exercer a função de Al em ambos, ao mesmo tempo.
26 De facto, a função primordial, e essencial, do Sr. Al é a de ser o Representante não dos Falidos, quando pessoalmente considerados, mas sim da Massa Insolvente e, reflexamente, dos Credores ( cfr. o Artigo 12.° no. 2 do seu Estatuto dos Ais); ora ,
27 a) - por um lado, os Recorrentes reclamaram 3 elevados créditos "contra" a Massa Insolvente dos presentes autos (tendo-lhes sido reconhecido, e graduado, 1 deles), estando pois as 2 "Massas Insolventes" entre si em situação de manifesta oposição (por este facto) ;  e  ,
      b) - por outro lado, nas 2 Massas Insolventes um dos "Bens" apreendidos nas mesmas é exactamente um mesmo Prédio urbano (o descrita na Conservatória da Registo Predial de Barreira sob o n.º 929/2DD2DID9, da freguesia de Alto Seixalinho, concelho de Barreiro, inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o artigo 2650
28 não podendo pois, por um lado, defender os interesses dos Credores num e noutro dos referidos 2 processos de Falência (e as respectivas Massas Insolventes), bem como os interesses dos Falidos, representando-os, nos presentes autos de Lisboa Oeste - Carlos …. e sua esposa - e, por outro lado, defender, representando-os, os interesses dos aqui Recorrentes-Falidos, declarados falidos no processo de Almada, pessoas que, provadamente, são Credores daqueles, e , por isso, estão em patente "litígio processual" com eles, sendo que 56/71 5C
29 tal situação afecta a liberdade, a isenção, a imparcialidade e a independência da função do Sr. Al; pelo que ocorre, quanto ao Sr Al, um manifesto IMPEDIMENTO, por manifesta dupla incompatibilidade de interesses, de "defender" os interesses dos aqui Recorrentes-Falidos.
30 Como decorre dos autos - e dos seus desenvolvimentos - o entendimento sobre os factos que o Sr. Al tem acerca dos factos (entendimento aliás sem quaisquer plausíveis justificações dadas nos autos ou fora deles) é totalmente contrário e oposto ao entendimento dos factos havido por parte dos Recorrentes; ora,
31 quando há divergência de entendimentos acerca da posição a ser tomada sobre certo e determinado facto de natureza patrimonial que tenha, hipoteticamente, relevância para a Massa Insolvente, não pode ser o Sr. Al, de modo absoluto, soberano, e definitivo, e apenas com a sua vontade, decidir se a actuação - directa - das pessoas dos Falidos é legítima ou ilegítima ou se a mesma beneficia ou prejudica a Massa Falida,
32 tanto mais que o Sr. Al não pode, ao mesmo tempo, ser defensor dos interesses dos Credores nos autos e, ao mesmo tempo, ser defensor dos interesses das pessoas aqui Recorrentes, quando - como ora se vê bem claramente - os interesses de uns e de outros (Credores e Recorrentes) são antagónicos e o certo é que a função dos Ais é CUMULATIVA com a dos demais Credores e, até, com a pessoa do FALÍDO, mas não é EXCLUSIVA da pessoa dos Ais.
33 E o Sr. Al tem poderes não para representar os interesses em geral do Falido mas sim para defender os interesses do Falido que interessem à Massa Falida, na perspectiva de defesa dos interesses que se traduzam em valores monetários que possam advir para a Massa Falida, ou seja, apenas pode administrar os bens da Massa Insolvente; mas nunca por nunca tem poderes para representar o Falido como se ele fosse um inimputável, interdito ou inabilitado.
34 E até porque o direito do propriedade dos "bens" da Massa Insolvente pertence aos Falidos até ao findar da "Liquidação" do activo - cfr. o Artigo 184 do CIRE - no caso de litígio de entendimentos sobre se se haverá de reclamar créditos ou se impugnar créditos de outros credores recomentes, a melhor interpretação a ser seguida é a de, e até pela simples jurisprudência das cautelas, se praticarem todos e quaisquer actos que beneficiem a Massa Insolvente, devendo ser dada prevalência ao entendimento dos Falidos, e sem qualquer prejuízo para os interesses destes.
35 Salvo o devido respeito, mesmo na "tese" de que o Sr. Al seria uma espécie de CURADOR dos Falidos, em caso de existência de uma "oposição de entendimentos", só teria uma óbvia saída possível: aceitar-se a Oposição deduzida por parte dos aqui Recorrentes (aliás, em ordem ao apuramento da verdade dos factos).
36 Ou, no limite, tal "litígio" de entendimentos haveria de ser suprido, por analogia com o previsto no Artigo 153 no. 2, através de uma decisão judicial - a ser proferida pelo Tribunal da Falência dos aqui Recorrentes (em Lisboa e não em Lisboa Oeste) - que ponderasse o interesse em se "reclamar ou não" e "impugnar ou não"; mas nunca apenas com a vontade, única e soberana, da pessoa do Sr. Administrador de Insolvência.
37 Se não for entendido como aqui se alega, e conclui, estar-se-á a impedir que os Falidos, no caso, os Recorrentes, possam exercer os seus legítimos direitos, no caso, o direito ao acesso à justiça previsto no Artigo 20.o da Constituição da República Portuguesa lhe atribui e o direito de propriedade previsto no Artigo 62 da mesma CRP - normativos legais que, assim, estariam a ser violados .
38 E, por estas mesmas razões, ainda que se entendesse que teria, formalmente, caducado o Mandato do Advogado signatário - o que não se aceita - ainda assim a solução processual exigível seria a de se notificar os Recorrentes, pessoal e expressamente, de tal facto e para, querendo, constituir, de novo, mandatário 8° mesmo ou outro).
39 (Normas, e princípios jurídicos, violadas) (síntese) Ao ter decidido como consta da douta Sentença de 07.12.2016, ocorreu a violação das normas jurídicas, e princípios jurídicos, constantes dos normativos seguintes ( e melhor explicitada no Capítulo seguinte ), respeitantes :
a à emissão de Parecer do Sr. AI sobre os Créditos Reclamados (Artigo 129 do CIRE)
b à legitimidade processual dos Recorrentes) - (Artigos 2 e 30 do CPC e Artigo 130 do CIRE) e 
c à apreciação das nulidades invocadas processualmente (Artigo 595 nº. 1 alínea a) do CPC)
d ao Estatuto da função de Administrador de Insolvência ( Estatuto do AI), nomeadamente as previstas nos Artigos 2, 4 e 12, no.s 1 e 2 da Lei 22/2013, de 26.02.
e ao Contrato de mandato (Artigo 1161 alínea a) do Código Civil - Artigo 129 do CIRE.
f à apreciação da prova, e julgamento, considerando os factos subsumidos ao disposto no Artigo 85 do CIRE (violando os Artigos 81 e 85 do CIRE)
g à prolação da Sentença, antes da produção de prova, e as regras legais sobre a inversão do ónus da prova (Artigo 129 do CIRE, Artigo 572 e 574 do CPC, Artigo 568, Artigo 732 no. 3 e Artigos 790 e 791, todos do CPC  aqui aplicável e de acordo com o disposto nos Artigos 129 a 136 do CIRE)
h ao direito de propriedade privada (considerando os Créditos reclamados como da propriedade da Massa Insolvente dos Recorrentes e não de estes próprios) (Artigo 184 do CIRE e Artigo 62 da C. R. P. e Artigo 85 no. 1 e 3 do CIRE)
i aos princípios do "regresso de melhor fortuna") ( Artigo 233 no. 1 alínea d) do CIRE) e da "exoneração do passivo restante") (Artigo 235 do CIRE)
j ao princípio do "caso julgado", ao considerar a Sentença de 29.05.2012 como válida e eficaz a partir de essa data e não apenas a partir de 18.12.2012 (Artigo 619 do CPC);
1 à tutela da "Personalidade jurídica" e "Personalidade judiciária", na medida em que confundindo uma com a outra, cerceou os direitos dos Recorrentes (Artigos 152, 153 e 154 do Código Civil e dos Artigos 81, no.s 81 no. 3 e 81 no. 4, Artigo 85 no.s 1 e 3 do CIRE).
m à interdição e inabilitação - violando o disposto no artigo 81, 85 e 110 do CIRE, conjugado, pelo menos, com o disposto nos artigos 152, 153 e 154, todos do Código Civil.
n ao mandato forense - impedindo que os Recorrentes pudessem constituir novo mandato - (Artigos 48 e 49 do CPC).
o à natureza da função, e da intervenção do AI, nos processos - considerando-a exclusiva em vez de complementar, ou substitutiva, dos Falidos - impedindo a aplicação do disposto no Artigo 110 no. 2 alínea a) do CIRE.
p à protecção dos "interessados", máxime os Credores reclamantes legitimamente reconhecidos (Artigos 568, Artigo 732 no. 3 e Artigos 790 e 791, todos do CPC - aqui aplicável e de acordo com o disposto nos Artigos 129 a 136 do CÍRE e Artigos 129 e 130 do CÍRE).
q ao exercício do direito de acesso à justiça (previsto no Artigo 20 da CRP) e, bem assim, a garantia de acesso aos tribunais prevista no Artigo 2 do CPC.
r à correcta formulação, e decisão, das Sentenças, visto que foram violados os princípios ínsitos no disposto nas alíneas b), c) e d) do no. 1 do Artigo 615.° do CPC.

40 (Petitório) - Pelo que, e salvo o devido respeito pela douta decisão, o Tribunal haveria que, como aqui se requer, ter decidido apreciar, e decidir, as questões que foram suscitadas nos autos pelos Recorrentes e, em consequência:
(a)- elaborar, nos termos e para os efeitos do disposto nos Artigos 595, 596 e 597, todos do CPC, e do Artigo 136 do CIRE, um Despacho Saneador, sem que fosse proferida uma Sentença final ou, quando assim não se entenda,
(b)-considerar provados todos os factos alegados e referentes às 2 Reclamações de Créditos, de 300.000 euros e de 50.000 euros, reconhecendo-o estes em benefício dos Recorrentes, e, inerentemente, da sua Massa Insolvente ;
(c)-considerar provados todos os factos alegados nas presentes Alegações e que constam das Conclusões no.s 1 a 10 ;
(d)-considerar devidamente impugnado, parcialmente, o crédito reclamado pela Bolsimo ( nos termos da Impugnação que foi efectuada pelos Recorrentes) e  (e), quanto a esta Reclamação de Créditos da Bolsimo, ordenado que (e.1) seja elaborado o Despacho Saneador, com a completa Especificação dos Factos Provados e a elaboração dos Temas da Prova, e ( e.2) submetendo tudo ao necessário Julgamento para apuramento da matéria de facto necessária para a boa decisão da causa e (e.3) a subsequente decisão da causa, requerendo-se pois que ser revogada a douta sentença, na parte ora aqui impugnada.
XIX Vícios da SENTENÇA e normas jurídicas, e princípios, violadas
 Ao ter decidido como consta da douta Sentença de 07.12.2016, ocorreu a violação das normas jurídicas, e princípios jurídicos, de seguida mais desenvolvidamente explicitadas :
a Omissão de pronúncia
Ao não ter tomado conhecimento da causa, relativamente aos factos que haveria de ter conhecido, e não conheceu, relativas ao objecto da causa, já que

Primeiro.
Não tomou conhecimento da questão de saber se a douta Sentença proferida no ex-Tribunal de Almada, em 29.05.2012 - que decretou a Falência dos Recorrentes - tinha transitado em julgado antes de 08.08.2012 (data da entrega das Reclamações de Créditos) ou depois de esta data.
De facto, o Tribunal haveria que ter tomado conhecimento de tal facto ; exactamente porque o mesmo foi alegado, e provado, na sua "Resposta" de 08.07.2016 e, assim, o Tribunal não apreciou esse facto alegado pelos Recorrentes e que é relevante para a boa decisão da causa, já que essa douta Sentença transitou em julgado apenas em 18.12.2012.
Todavia, e por simplificação, o Tribunal apenas considerou provado que "Os ora impugnantes E e D  foram declarados insolventes no âmbito do processo de insolvência n.° 1518/12.8 TBALM, e em que foi nomeado administrador de insolvência António ……;
" mas não se referindo a "datas" ( da Sentença e do seu trânsito em julgado), de modo tal que essas datas tanto poderiam ter ocorrido há 10 anos como apenas há 10 meses. E, assim, o Tribunal não tomou conhecimento, e haveria de tê-lo feito, de um facto relevante - constante dos autos - e que era decisivo para a boa decisão da causa.

Segundo .
.o Tribunal não tomou conhecimento da questão de saber qual era o "Parecer" do Sr Al sobre as 2 Reclamações de Créditos que foram formuladas (e acerca da qual o Sr. Al, embora tendo o dever de se pronunciar sobre tal facto - nos termos do Artigo 129 do CÍRE . e, assim, o Tribunal não apreciou a questão de saber se o Sr. Al, no seu Relatório do Artigo 129 do CIRE alegou, ou não, alguma causa extintiva do direito invocado pelos Credores Reclamantes, tal como a prescrição ou a extemporaneidade da feitura das Reclamações de Créditos;  e ,
e sendo certo que o Tribunal nem sequer apreciou a óbvia de saber-se a razão da não-pronúncia do Sr. Al, no seu Relatório, sobre as ditas 2 Reclamações de Crédito em análise no presente recurso (apesar de todas as 3 Reclamações terem sido recebidas em 13.08.2012). sendo certo que,
mesmo que, em tese, os Recorrentes não pudessem entregar o Requerimento de 28.10.2013, o Tribunal não poderia deixar de efectuar um juízo crítico dos factos, visto que as Reclamações de Créditos foram entregues (em 08.08.2012) e a Sentença que havia decretado a Falências dos Recorrentes só tinha transitado em julgado em 18.12.2012 ( e sendo certo que, na "Resposta" de 08.07.20IG entregue nos autos pelos Recorrentes tal facto foi alegado (embora que tendo sido, erroneamente, afirmado que tal data era a de 07.01.2013)
Pelo que concluiu, erroneamente, pela ilegitimidade dos Recorrentes, violando as normas legais atinentes a esta matéria (Artigos 2 e 30 do CPC e Artigo 130 do CIRE).

Terceiro.
E, tendo em conta o alegado, igualmente o Tribunal não se pronunciou sobre uma questão que haveria que ter conhecido: a nulidade processual invocada, no Requerimento dos Recorrentes entregue nos autos no dia 28.10.2013 e segundo o qual veio a alegar o facto de o Sr. Administrador de Insolvência não se ter pronunciado - prestando o seu Parecer -sobre as 2 Reclamações de Créditos que, agora, se discutem no recurso.

Quarto.
Por outro lado, o Tribunal não cuidou de verificar o facto de que o Sr. Al está numa situação de incompatibilidade para o exercício das suas funções; in casu, uma dupla incompatibilidade.
De facto, na sua relação com os Recorrentes-Falidos em conjunto com os Falidos nos presentes autos, o Sr. Al não pode, face ao entendimento dos Recorrentes expresso nos autos (o facto de ter reclamado Créditos e 1 deles ter sido reconhecido), por um lado, actuar em nome deles em ordem impedindo, na prática, que o Activo da Massa Insolvente seja superior e, por outro lado, defender, legitimamente, os interesses da mesma Massa Insolvente (se bem que o que fez, na prática, foi prejudicá-la) e, ao mesmo tempo, os interesses da Massa Insolvente dos presentes autos.
E, por sua vez, na sua relação com os Credores da Massa Insolvente e os Credores da Massa Insolvente dos presentes autos, não pode, por um lado, dizer que defende os interesses de uns e de outros - sem que haja "oposição" entre uma coisa e outra - precisamente porque um dos bens do Activo da Massa Insolvente é constituído pelo mesmo prédio urbano e que foi apreendido nos 2 processos judiciais.
Ora, como os aqui Recorrentes são, nos 2 processos judiciais distintos, por um lado Credores e, por outro. Falidos, e como os Credores são diferentes num e noutro dos processos, e porque os Recorrentes são credores reconhecidos nos presentes autos e porque um dos bens apreendidos nos 2 processos é o mesmo, patente é que o Sr. Al incorre numa situação de manifesta incompatibilidade para e exercício das suas funções (com dupla cama) e não pode ser Al nos 2 processos ao mesmo tempo
Ora, assim sendo, não poderia o Tribunal deixar de conhecer a situação e, atendendo à manifesta "oposição" entre os Recorrentes - que são Credores da Massa Insolventes dos autos - e o Sr. Al, e haveria, pois, que ter equacionado essa questão e decidido - ao invés do que decidiu - que a "posição" assumida pelo Sr. Al não pode ser validada nos autos e que, em consequência, e até por essa razão, haveria de ser entendido que os Recorrentes tinham toda a legitimidade para praticar os actos que praticaram.
Na verdade, o Sr. Al tem de exercer as suas funções com a total isenção, independência e imparcialidade e, de esta forma, não está a exercê-las de esse modo, já que tem uma permanente angústia processual": a de saber se haverá de privilegiar a melhor defesa dos interesses dos Credores da Massa Insolvente do processo de Lisboa-Almada ou os dos Credores da Massa Insolvente dos presentes autos (de Lisboa Oeste).
Não tendo assim procedido, o Tribunal não só não tomou conhecimento de questões que haveria de ter conhecido, como violou as normas legais sobre o exercício da função de Administrador de Insolvência (Estatuto do Al), nomeadamente as previstas nos Artigos 2, 4 e 12, no.s 1 e 2 da Lei 22/2013, de 26.02.
Quinto.
E igualmente o Tribunal não tomou conhecimento da questão - que haveria de ter conhecido - de saber se o Sr. Al havia, ou não, cumprido as regras legais sobre as suas relações com os Recorrentes-Falidos. Na verdade,
se o Sr. Al se arroga o facto de ser a única pessoa que pode representar os Falidos-Recorrentes deveria, tendo em conta que sabia que os Recorrentes se arrogavam de direitos de crédito sobre os Falidos, ter cumprido não apenas as mais elementares regras do mandato - as previstas no Artigo 1161 alínea a) do Código Civil - mas também as regras legais previstas no Artigo 129 do CÍRE (notificação aos Credores para reclamarem, querendo, os seus créditos).
Não o tendo feito, o Tribunal não fez qualquer juízo crítico sobre a correcção, e a transparência, da actuação de um do agente judiciário que é o Sr. Al, violando assim as referidas normas legais.

Sexto.
Além disso, o Tribunal igualmente não se pronunciou sobre factos que haveria de ter conhecido e que eram relevantes para a boa decisão da causa.
De facto, o Tribunal haveria de ter considerado como Provados factos que estão provados nos autos e, designadamente, os constantes das Conclusões 1 a 10 do presente recurso. Exactamente - e, nomeadamente, para os efeitos do Artigo 640 do CPC - porque esses factos, relevantes para a boa decisão da causa, resultam de todos os Documentos constantes dos autos, nomeadamente dos seguintes :
1 as Reclamações de créditos entregues pelos Recorrentes no dia 08.08.2012 ao Sr. Administrador de Insolvência inicialmente nomeado ( 1 das quais consta dos autos ), Reclamações essas que foram juntas aos autos, de novo, com os Requerimentos entregues nos autos em 28.10.2013
2 Requerimentos entregues nos autos, no dia 28.10.2013, e a que correspondem as seguintes referências do CÍTÍUS: 6738355, 6738382, 6738577, 6738579, 6738582, 6738586 e 6738592,e todos os documentos dos mesmos
3 Requerimento do Sr. Al entregue nos autos em 02.06.2016, e todos os documentos do mesmo
4 Requerimento dos Recorrentes entregues nos autos no dia 08.07.2016 e a que correspondem as seguintes referências do CÍTÍUS : 7447884, 7447888 e 7447891 e todos os documentos dos mesmos.

2 a errada qualificação dos factos.
Por outro lado, o Artigo 85 no. 1 do CÍRE refere-se à substituição do Falido pelo Al, mas apenas nas situações em que as acções se reportem a "bens compreendidos na massa insolvente".
Ora, por um lado, impugnar um crédito que foi reclamado pela Bolsimo não é estar a agir judicialmente em relação a "bens" "compreendidos na massa insolvente" dos aqui Recorrentes.
E, por outro lado, os "créditos" a que se reportam as 2 Reclamações de Créditos que foram formuladas e não foram reconhecidas judicialmente não são nenhum dos "bens integrados na massa insolvente" (embora possam vir a sê-lo).
Na verdade, os únicos bens que, até agora, faziam parte da "massa insolvente" dos Recorrentes eram 2 bens imóveis, um dos quais já foi vendido.
Pelo que o Tribunal decidiu erroneamente ao ter considerado que os "bens" a que se reportam as reclamações efectuadas e a impugnação deduzida são bens "integrados na massa insolvente" e, assim, decidiu mal ao considerar que tinha de ser o Sr. Al a defender os interesses dos aqui Recorrentes.
Pelo que o Tribunal violou o disposto nos Artigos 81 e 85 do CÍRE acerca de esta matéria.

3 ERROS DE JULGAMENTO.

3.1. Erro de julgamento.
Tendo os Recorrentes sido declarados falidos em 29.05.2012, mas tendo transitado em julgado a Sentença apenas em 18.12.2012, tinham os Recorrentes-Falidos o direito de reclamar os seus Créditos no processo de Falência, em 08.08.2012 (como bem o fizeram).
Ora, mesmo que os Recorrentes não pudessem entregar o Requerimento que entregar nos autos em 28.10.2013 (alegando que tinham entregue as 3 Reclamações de Créditos em D8.DB.2DI2 e juntando os documentos comprovativos de tal facto), nunca a decisão judicial poderia ser no sentido de, no seu Relatório do Artigo 129 do CIRE, valorar não apenas um hipotético "não reconhecimento" expresso de 2 das 3 Reclamações de Crédito por parte do Sr. Al -_o que nem sequer ocorreu - e, muito menos, uma "não-referência" a essas 2 Reclamações de Crédito naquele mesmo Relatório,
Já que, não tendo sido efectuada a Contestação especificada dos factos alegados - como se prevê no Artigo 572 e 574 do CPC - e não tendo o Sr. Al entregue qualquer motivo, razão, causa ou justificação para o não-reconhecimento ou para a não-referência das 2 Reclamações de Créditos -
e estando essas Reclamações de Créditos em total oposição a esse hipotético "não-reconhecimento" ou àquela "não-referência" no Relatório, de acordo com o disposto no Artigo 568, Artigo 732 no. 3 e Artigos 790 e 791, todos do CPC - aqui aplicável e de acordo com o disposta nos Artigos 12º a 13º do CÍRE - tal situação processual só poderia redundar no "encaminhar" da questão para a sede adequada: a realização do Julgamento, antecedida do respectivo Despacho Saneador.

3.2. Erro de julgamento.
Na douta Sentença o Tribunal afirmou o seguinte:
"Aliás, os credores não são C e D , mas sim a massa insolvente de José C e D
Em suma, carecem de legitimidade para a apresentação de impugnação."

Ora, o Tribunal, ao ter declarado que os Credores são "a massa insolvente de C e D ", incorreu em um outro erro de julgamento, já que, na realidade, os verdadeiros titulares do direito propriedade do "direito de crédito" perante os Falidos nos presentes autos são as pessoas dos aqui Recorrentes e não a sua "Massa Insolvente" (sendo esta, e apenas, a mera "administradora" de esses bens).
Neste mesmo sentido isso se afirma no. 15 do Sumário do douto Acórdão do STJ, de 15.03.2012 www.dgsi.pt, no Processo no. 501710.2TVLSB.S1 da 1.a Secção), do qual consta que
15) Além do mais, e atendendo ao artigo 184º do CIRE, a dispor que se, após a liquidação, existir um saldo a exceder o necessário para o pagamento integral das dívidas da massa, o mesmo deve ser entregue ao devedor, sempre o demandante (munido de um título executivo) pode obter o pagamento do seu crédito, tal como o poderá fazer se o devedor lograr obter bens após o encerramento do processo.")
Donde, ao ter decidido de essa forma, o Tribunal claramente violou e violou o princípio constante do Artigo 184 do CIRE e o direito de propriedade privada dos Recorrentes previsto no Artigo 62 da C. R. P..

3.3. Erro de julgamento.
Por outro lado o Tribunal violou o disposto no Artigo 233 no. 1 alínea d) do CÍRE (o chamado princípio do "regresso de melhor fortuna"), conjugado com o disposto no Artigo 235 ( "exoneração do passivo restante" ), na medida em que, ao decidir como decidiu,
.impede que os Recorrentes-Falidos possam desenvolver todas as diligências no sentido de que o seu património seja aumentado - directa ( mediante a cobrança de créditos bens) e indirectamente (mediante a impugnação de créditos de terceiros).
na medida em que certo é que, quanto menor for o acervo de valores monetários acrescidos para a Massa Insolvente dos Recorrentes, maior será, no futuro, o montante do "passivo remanescente" que há que ser pago aos Credores no processo de Falência dos Recorrentes, depois de efectuada a "Liquidação'" do Activo da Falência e,
causando este facto um prejuízo aos Falidos-Recorrentes, ficarão estes lesados nos seus legítimos direitos.

3.4. Erro de Julgamento e ausência total de fundamentação.

O Tribunal, ao ter-se remetido apenas para o disposto no Artigo 85 no. 1 e 3 do CIRE não fundamentou a sua decisão, na medida em que
a o disposto no Artigo 85 no. 1 não é, aqui, aplicável, em virtude de, por um lado, os créditos reclamados não constituem bens da Massa Insolvente dos Recorrentes e, por outro lado, o processo dos presentes autos não está apensada ao processo de Falência e, por lado ainda, o crédito da E não é um dos "bens compreendidos na massa insolvente" das Recorrentes ; e ,
b mesmo que assim se entendesse, sempre o Tribunal não tinha tido em conta o facto de a Sentença de 29.05.2012 só ter transitado em julgado em 18.12.2012 e, além disso,
c o Tribunal não cuidou de aplicar o disposto no Artigo 81 no. 3 do CÍRE, o qual haveria de ter sido interpretado - em cotejo com o no. 4 do mesmo Artigo - no sentido de que, para o efeito da questão em apreço, a "Impugnação" do crédito da E e as 2 Reclamações de Créditos que foram feitas, se inserem "no âmbito" do Processo de Falência dos Recorrentes, de modo tal que, logo que esses créditos sejam reconhecidos noutros processos judiciais, o Activo da Massa Insolvente é acrescida de valores monetários consideráveis, repercutindo-se (ou reflectindo-se) pois no desenvolvimento de esse processo judicial.
E, de este modo, o Tribunal ,
  violou as regras legais sobre o Caso Julgado (em virtude a Sentença que decretou a Falência apenas transitou em julgado apenas em 18.12.2012) - ao considerar a Sentença eficaz desde o dia 29.05.2012 - violando assim o disposto no Artigo 619 do CPC ;
violou as regras sobre a "Personalidade jurídica", e sobre "Personalidade judiciária", na medida em que cerceou os direitos de personalidade dos Recorrentes ao considerar, em termos efectivos, a perda de direitos processuais dos Recorrentes, considerando os Recorrentes como que Interditos ou inabilitados, ou seja, as normas constantes dos Artigos 152, 153 e 154 do Código Civil e dos Artigos 81, no.s 81 no. 3 e 81 no. 4, Artigo 85 no.s 1 e 3 do CIRE.

3.5. Erro de Julgamento.
Para além disso, o Tribunal violou o disposto no Artigo 110 no. 2 alínea a) do CIRE, na medida em que, e como está demonstrado nos autos, o Sr. Al não pretende impugnar, parcialmente, o crédito da E e não pretende reclamar os 2 Créditos a que recurso se reporta.
E tanto assim é que, se se tratasse apenas de uma mera questão processual - de legitimidade -o Sr. Al já poderia, em representação do Falido, ao abrigo do disposto no Artigo 129 do CIRE. reclamado esses 2 Créditos e ter impugnado o crédito da E, visto que jia decorreram, desde Outubro de 2013 mais do que 3 anos e desde Maio de 2016 mais do que 7 meses.
E, nesse caso, o Tribunal, e até porque a natureza da intervenção dos Ais é meramente residual, complementar, ou substitutiva, dos Falidos e não exclusiva, ao não ter enquadrado a situação no disposto no Artigo 110 no. 2 alínea a) do CIRE, violou os mais elementares direitos dos Reclamantes ao ter decidido como decidiu.

3.6. Erro de Julgamento.
Por outro lado, o Tribunal igualmente violou as normas constantes do disposto no Artigos 48 e 49 do CPC, na medida em que, se entendia que aquele - específico - mandato concedido ao Advogado signatário caducara, haveria que notificar, de tal facto, directa e expressamente, para que os mesmos, querendo, constituíssem novo mandato (a favor do mesmo Advogado ou de outro); porém, o Tribunal não decidiu nesse sentido.

4 VIOLACÕES DE LEI.

4.1. Violação de lei.
Por outro lado,
mesmo que se entendesse que o Sr. Al é, nos termos do CÍRE, o representante legal dos Recorrentes,
atendendo ao facto de estes, aparentemente, terem, acerca das suas relações com a Massa Insolvente dos presentes autos (no que respeita às Reclamações de Crédito e à Impugnação dos Créditos da Bolsimo), uma posição diferente da do Sr. Al, não poderia ter sido decidido que a sua "decisão" era a decisão definitiva e a única válida, já que,
em caso de "litígio" entre o entendimento dos Falidos e o entendimento do seu representante legal, dever ser dada prevalência aos interesses dos Recorrentes-Falidos  e, quando muito, a "divergência de entendimentos" teria de ser suprida judicialmente ( por similitude com o disposto no Artigo 153 no. 2 do Código Civil) e, em qualquer caso, pelo Tribunal onde corre a Falência dos Recorrentes  ( em Lisboa-Almada) e não pelo Tribunal dos presentes autos.
Não tendo procedido assim o Tribunal violou os direitos dos Recorrentes, ao invalidar os actos praticados pelos Recorrentes através do seu legítimo mandatário forense.
E, assim, violou o disposto no artigo 81, 85 e 110 do CÍRE, conjugado, pelo menos, com o disposto nos artigos 152, 153 e 154, todos do Código Civil.

4.2. Violação de lei.
Por último, se o Tribunal declara, agora, que tem o entendimento de que o Mandato tinha caducado, então, a fim de não prejudicar os interesses da própria pessoa dos aqui Recorrentes haveria que
a em primeiro lugar, ser decidida a questão - prévia - e, de seguida, permitir aos Recorrentes que pudessem defender-se, incidentalmente, quanto a esta matéria e
b em função do que o Tribunal viesse a decidir - em caso de recurso - proceder à feitura /O da Sentença (ou Despacho Saneador) ou,
c se se entendesse que os Recorrentes poderiam conferir novo mandato, com base em nova Procuração, notificariam os Recorrentes para esse mesmo efeito, concedendo aos Recorrentes um prazo para entregarem novo instrumento de mandato forense.
Não tendo assim procedido, o Tribunal actuou em violação do disposto nos Artigos 48 e 49 e 590º, todos do CPC, impedindo os Reclamantes, aqui recorrentes, de exercer um seu legítimo direito, prejudicando os seus interesses.

4.3. Violação de lei.
(A Impugnação de Créditos da Bolsimo e a prolação do Despacho Saneador)
Se o Tribunal reconheceu, agora, aos Recorrentes o direito a serem considerados como Credores, ao ter-lhes reconhecido, em seu nome (tal como consta da lista dos Credores reconhecidos pelo Sr. Al), um crédito no montante de 279.717,34 €,
e se, por essa razão, os Recorrentes são "interessados" em contestar os créditos reclamados por outros credores - tudo nos termos e para os efeitos do conceito de "interessado" previsto nos Artigo 129 e 130 do CÍRE,
não pode aceitar-se que o Tribunal tenha decidido não valorar a "Impugnação" (parcial) do crédito da E que por eles foi efectuada.
De facto,
se aos Recorrentes é reconhecida a qualidade de "Credores Reclamantes", não pode ser aceite que não se possa efectuar, nessa qualidade, a impugnação de créditos que são "opostos" e "prejudiciais" aos créditos reclamados por outros credores.
Pelo que, por estas razões, o Tribunal violou o disposto nos Artigos 568, Artigo 732 no. 3 e Artigos 790 e 791, todos do CPC - aqui aplicável e de acordo com o disposto nos Artigos 123 a 136 do CÍRE.

5 Violação de lei e violação da Constituição da República Portuguesa.
Por último, entendem os Recorrentes que o Tribunal, ao actuar da forma como o fez, violou o disposto na Constituição da República Portuguesa, já que, da decisão tomada, resulta, quer a violação do direito de propriedade privada dos Recorrentes (na medida em que os seus créditos podem ser - directamente e indirectamente - perdidos), nos termos em que está previsto no Artigo 62 da mesma CRP, quer o impedimento ao exercício do direita de acesso à justiça (previsto no artigo 20 da CRP) e, bem assim, a garantia de acesso aos tribunais prevista no Artigo 2 do CPC.

6 Vícios da Sentença.
Pelo que, face ao facto de terem sido violadas as normas, e princípios, antecedentemente identificados na presente Capitulo, e, bem assim, não ter efectuado a apreciação das nulidades invocadas processualmente pelos Recorrentes - no seu Requerimento de 28.10.2013, corroborado pelo de 08.07.2016 (em violação do disposto no Artigo 595 no. 1 alínea a) do CPC) - a douta Sentença é, parcialmente, nula, na medida em que, prejudicando os interesses dos aqui Recorrentes,
l.º Não especificou "os fundamentos de facto e de direito" que justificaram a decisão ;
2.º os fundamentos da decisão estão em oposição com a decisão e com a prova produzida nos autos e a própria decisão está em oposição com toda essa prova dos autos
3.º e, sobretudo, a Meritíssima Juíza da causa não se pronunciou sobre questões, quer fácticas, quer de natureza jurídica, que deveria ter apreciado.
- violando assim o disposto nas alíneas b), c) e d) do no. 1 do Artigo 615.° do CPC, e assim tornando impossível que a decisão judicial pudesse ter sido outra (e que desse razão aos pedidos dos aqui Recorrentes).
Para os efeitos do Artigo 640 do CPC - factos relevantes para a boa decisão da causa (cfr. a Conclusão 10, referentes às Conclusões 1 a 9 - a Prova resulta de todos os Documentos constantes dos autos, nomeadamente dos seguintes:
1 as Reclamações de créditos entregues pelos Recorrentes no dia 08.08.2012 ao Sr. Administrador de Insolvência inicialmente nomeado (1 das quais consta dos autos). Reclamações essas que foram juntas aos autos, de novo, com os Requerimentos entregues nos autos em 28.10.2013
2 Requerimentos entregues nos autos, no dia 28.10.2013, e a que correspondem as seguintes referências do CÍTÍUS : 6738355, 6738382, 6738577, 6738579, 6738582, 6738586 e 6738592, e todos os documentos dos mesmos
3 Requerimento do Sr. Al entregue nos autos em 02.06.2016, e todos os documentos do mesmo
4 Requerimento dos Recorrentes entregues nos autos no dia 08.07.2016 e a que correspondem as seguintes referências do CÍTÍUS: 7447884, 7447888 e 7447891 e todos os documentos dos mesmos.
Decidindo-se como peticionado, assim se fará a esperada e, como sempre, costumada JUSTIÇA!

1.4. Não foram apresentadas contra-alegações.
                                                          
Thema decidendum

1.5 Colhidos os vistos, cumpre decidir, sendo que , estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões [ daí que as questões de mérito julgadas que não sejam levadas às conclusões da alegação da instância recursória, delas não constando, têm de se considerar decididas e arrumadas, não podendo delas conhecer o tribunal ad quem ]  das alegações dos recorrentes ( cfr. artºs. 635º, nº 3 e 639º, nº 1, ambos do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei nº 41/2013, de 26 de Junho ), e sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa e/ou deva conhecer oficiosamente, a questão a apreciar e a decidir são as seguintes :
I Aferir se a decisão/sentença recorrida padece do vício de NULIDADE :
Nos termos do artº 615º,nº1, alínea b), do CPC, porque não  especifica os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
Nos termos do artº 615º,nº1, alínea c), do CPC, porque os fundamentos de facto estão em oposição com a decisão;
Nos termos do artº 615º,nº1, alínea d), do CPC, porque não  conhece de questões que devia apreciar;
II Aferir se a decisão identificada em 2.7. ( infra ) da motivação de facto do presente Ac. , se impõe ser revogada ;
IIIApurar se , no seguimento da revogação da decisão identificada em II, se impõe determinar o prosseguimento dos autos, com a completa Especificação dos Factos Provados e a elaboração dos Temas da Prova, tendo em vista a prolação de decisão de mérito no tocante aos créditos reclamados pelos apelantes e não reconhecidos , e relativamente ao crédito reclamado pela Bolsimo e pelos apelantes  impugnado.
                                                          
2.Motivação de Facto.

A)-Em sede de saneador-sentença recorrido, fixou o tribunal a quo a seguinte factualidade :
2.1.Os impugnantes C e D foram declarados insolventes [ por sentença proferida em 29/5/2012 - confirmada por Ac. do Tribunal da Relação de Lisboa, de 27/11/2012 - , e transitada em julgado em 18/12/2012  ] no âmbito do processo de insolvência n.° 1518/12.8 TBALM, e em que foi nomeado administrador de insolvência António … ;
2.2.A insolvência indicada em 2.1. foi requerida por "E" contra os ora impugnantes, representado na altura pelo advogado, Dr. António ….. .
B)Do processado no “ apenso de reclamação e verificação de créditos” dos autos de  insolvência de A  e de B , e com interesse para  a apreciação da apelação identificada em 1.3. , resulta ainda a seguinte factualidade :
2.3.O Sr. administrador de insolvência António …., apresentou a relação a que se refere o art. 129°, do C.I.R.E., de créditos reconhecidos e não reconhecidos , a qual consta de fls. 16 e segs.;

2.4.Da Lista identificada em 2.3., e no tocante a credores  reconhecidos , consta a indicação , v.g., de :
a)C e mulher D , na qualidade de titulares de crédito no valor total de 279.717,34€ [ 200.531,95€ de capital e 79.185,39€ de juros ] ;
b)E, na qualidade de titular de crédito no valor total de 1.751.391,07€723.256,95€ de capital e 1.028.134,12€ de juros ];

2.5.C e mulher D, em sede de requerimento dirigido ao Juiz, vieram deduzir impugnação [ através de articulado subscrito pelo Exmº Advogado Dr. António …. ] da lista identificada em 2.4., considerando que da mesma não constava, erradamente, outros 2 créditos reclamados pelos mesmos credores, sendo :
a)um de € 300.000,00,  a título de valores que eventualmente venham a pagar pessoalmente, de acordo com o regime de solidariedade e por conta da responsabilidade derivada das dívidas de uma sociedade irregular que possuíam (em quotas de igual valor) com os insolventes, por efeito do disposto no art. 524°, do CC;
b)um de €50.000,00 por conta de valores que tenham de satisfazer às Finanças e devidos pela referida sociedade irregular, tendo em conta o regime de solidariedade das obrigações ;

2.6.C e mulher D, em sede de requerimento dirigido ao Juiz, vieram deduzir impugnação  [ através de articulado subscrito pelo Exmº Advogado Dr. António …. ] da lista identificada em 2.4., considerando que da mesma constava, erradamente, o reconhecimento de um crédito da reclamante E, no valor total de 1.751.391,07€723.256,95€ de capital e 1.028.134,12€ de juros ], pois que o crédito em causa não é superior a 723.256,95€ de capital , acrescido de 592.250,33€ de juros e 23.690,01€, de imposto de Selo;
2.7.Na sentença identificada em 1.2., e no tocante às impugnações identificadas em 2.5 e 2.6., decidiu-se nos seguintes termos :
“ (…)
Prescreve o art. 85°, n.°s l e 3 do CIRE que em todas as acções de natureza patrimonial intentadas pelo devedor este é substituído pelo administrador de insolvência.
Ou seja, no caso concreto, após a declaração de insolvência, o mandato conferido ao Dr. António … caducou em relação a todos os actos praticados em processos de natureza patrimonial, como é o caso em apreço.
Aliás, os credores não são C e D, mas sim a massa insolvente de C e D.
Em suma, carecem de legitimidade para a apresentação de impugnação.”
                                                          
3.Da Fundamentação de Direito.
3.1.Da invocada NULIDADE DA SENTENÇA, à luz do nº1, alíneas b),  c)  e  d), primeira parte do artº 615º, do CPC .
Consideram os apelantes C e mulher, D, que padece a sentença recorrida do vício de nulidade subsumível nas  alíneas  b), c) e d), primeira parte , do nº1, do artº 615º, do CPC, essencialmente porque não apreciou/conheceu a mesma das impugnações que ambos deduziram quanto à lista de créditos apresentada pelo administrador da insolvência, a que acresce que a decisão proferida relativamente a tais impugnações mostra-se ainda não alicerçada em fundamentos de facto e de direito ( porque não especificados )  e , ademais , está também em oposição com os fundamentos invocados.
Não reconhecendo o tribunal a quo ( no âmbito do despacho a que alude o nº1, do artº 617º, do CPC ) a existência dos vícios adjectivos pelos apelantes invocados , e impondo-se decidir da respectiva e efectiva verificação, importa antes de mais tecer breves considerações sobre a ratio da norma do artº 615º, do CPC, maxime sobre a alínea d), do respectivo nº 1 e, bem assim, sobre o alcance das alínea b) e c), do mesmo normativo.

Ora bem.
Antes de mais, pertinente é não olvidar que as causas de nulidade da sentença são de previsão/enumeração taxativa (1), estando as mesmas ( quais nulidades especiais (2) ) discriminadas no nº1, do artº 615º, do actual CPC, razão porque forçoso é que qualquer vício invocado como consubstanciando uma nulidade da sentença, para o ser, deve necessariamente integrar o tatbestand de qualquer uma das alíneas do nº1, da citada disposição legal.

Depois, importante é outrossim ter sempre em atenção que, como é consabido, não faz de todo qualquer sentido incluir-se no âmbito das nulidades de sentença um qualquer erro de julgamento ( de facto e/ou de direito) , sendo de resto prática confrangedoramente recorrente em sede de instâncias recursórias a confusão do mero  "error in procedendo" com o "error in judicando".

Isto dito, reza a alínea d), do nº1, do artº 615º, do CPC, que a sentença é nula quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento “.

O vício/nulidade referida, mostra-se em consonância com o dever que recai sobre o Juiz de, em sede de sentença , resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, servindo de cominação ao seu desrespeito (3).

Sobre o Juiz recai , portanto, no dizer de Lebre de Freitas e outros (4) , a obrigação de apreciar/conhecer “ todas as questões que lhe são submetidas, isto é, de  todos os pedidos deduzidos, todas as causas de pedir e excepções invocadas e todas as excepções de que oficiosamente lhe cabe conhecer (…), sendo que, a ocorrer uma tal omissão de apreciação/conhecimento, e  , não estando em causa a mera desconsideração tão só de eventuais “(…) linhas de fundamentação jurídica, diferentes da da sentença e que as partes hajam invocado (…) “,  então o “ não conhecimento do pedido , causa de pedir ou excepção cujo conhecimento não esteja prejudicado pelo anterior conhecimento de outras questões, constitui nulidade”.

Porém, importa não olvidar que, como há muito advertia José Alberto dos Reis (5), não se devem confundir factos (fundamentos ou argumentos) com questões (a que se reportam os artigos 608.º, n.º 2, e 615º, n.º 1, alínea d), do CPC) a resolver, pois que uma coisa é não tomar conhecimento de determinado facto invocado pela parte, e , outra completamente distinta, é não tomar conhecimento de determinada questão submetida à apreciação do tribunal.

Em rigor, para nós e em termos conclusivos, dir-se-á que as questões a que alude a alínea d), do nº1, do artº 615º, do CPC, mais não são do que as que alude o nº2, do artº 607º, e artº 608º, ambos do mesmo diploma legal, e que ao Tribunal cumpre solucionar, delimitando-se e emergindo as mesmas da análise da causa de pedir apresentada pelo demandante e do seu confronto/articulação com o pedido que na acção é formulado.

Ou seja, e dito de um outro modo, não se confundindo é certo as questões a resolver pelo juiz em sede de sentença com quaisquer argumentos e razões que as partes invoquem em defesa das suas posições, o correcto/adequado será em rigor considerar-se que o vocábulo “questões” a que alude a alínea d), do nº1, do artº 615º, do CPC, mostra-se empregado na lei adjectiva com o sentido equivalente a “questões jurídicas” ainda carecidas de resolução, impondo-se que no âmbito das mesmas seja dada prioridade às questões de natureza processual que ainda estejam por resolver ( nulidades, excepções dilatórias ainda por apreciar ou outras questões de natureza processual que interfiram no resultado),   e  , sem embargo da apreciação das questões que sejam de conhecimento oficioso, deve o juiz limitar-se a apreciar as que foram invocadas, evitando, deste modo, a nulidade da sentença por excesso de pronúncia, nos temos do art. 615º, nº 1, al. d), in fine. (6)

Já no tocante à nulidade da alínea b), do nº1, do artº 615º, e como é outrossim entendimento uniforme e há muito consolidado, quer na jurisprudência (7) , quer na doutrina (8), uma coisa é a falta absoluta de motivação ( quando a mesma não existe de todo) ,  e , outra bem diferente - o que não integra já o vício de nulidade - , é a existência de alguma fundamentação, sendo porém ela escassa, deficiente ou até mesmo pobre.

Ou seja, para que ocorra o vício de nulidade a que se refere o artº. 615º, nº.1, al. b), do Código de Proc. Civil,  seja de facto e/ou de direito,  necessário é que a falta de fundamentação seja absoluta, não bastando que a justificação da decisão – em termos de facto e de direito – seja deficiente, apoucada, ou incompleta, vício este último que, podendo é verdade afectar o valor doutrinal da sentença, sujeitando-a ao risco de ser revogada em recurso, não a fulmina de nulidade. (9)

Por fim, relativamente ao vício de nulidade da sentença nos termos do artigo 615º, n.º 1 , alínea c) , do Código do Processo Civil, decorrente de pretensa contradição entre a fundamentação e a decisão, a mesma apenas existe quando os fundamentos invocados - de facto e de direito - devessem , necessária e logicamente (qual vício lógico), conduzir a uma decisão diferente/oposta àquela que a sentença expressa, sob pena de existir entre ambos uma contradição insanável e incompreensível (a decisão colide com os fundamentos em que ostensivamente se apoia ) . (10)

Dito de uma outra forma, e como ensinam Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio e Nora (11), na alínea c), do nº1, do pretérito artº 668º do CPC, a lei refere-se à contradição real entre os fundamentos e a decisão e não à hipóteses de contradição aparente, resultantes de simples erro material, seja na fundamentação, seja na decisão.

É que, e em rigor, como bem explicam ainda os mesmos e ilustres Prof.s (12) citados, na situação referida, “há um vício real no raciocínio do julgador ( e não um simples lapsus calami do autor da sentença ): a fundamentação aponta num sentido ; a decisão segue caminho oposto ou, pelo menos, direcção diferente”.

Ainda como referência ao vício formal referido , e agora nas palavras de Lebre de Freitas, Montalvão Machado e Rui Pinto (13),” Entre os fundamentos da decisão não pode haver contradição lógica : se na fundamentação da sentença, o julgador seguir determinada linha de raciocínio, apontando para determinada conclusão e, em vez de a tirar, decidir noutro sentido, oposto ou divergente, a oposição será causa de nulidade da sentença”.

E, logo a seguir, os mesmos autores advertem que  Esta oposição não se confunde com o erro de subsunção dos factos à norma jurídica ou, muito menos, com o erro na interpretação desta: quando, embora mal, o juiz entende que dos factos apurados resulta determinada consequência jurídica e este seu entendimento é expresso na fundamentação, ou dela decorre, encontramo-nos perante o erro de julgamento e não perante oposição geradora de nulidade; mas já quando o raciocínio expresso na fundamentação aponta para determinada consequência jurídica e na conclusão é tirada outra consequência, ainda que esta seja a juridicamente correcta, a nulidade verifica-se. A oposição entre os fundamentos e a decisão tem o seu correspondente na contradição entre o pedido e a causa de pedir, geradora da ineptidão da petição inicial (art. 193-2-b).”

Em suma, a hipótese da alínea c), pressupõe a existência de uma oposição real entre os fundamentos e a própria decisão, isto é, situações em que os fundamentos invocados pelo julgador devessem ter conduzido, logicamente e coerentemente , a um  resultado diferente do expresso na decisão . (14)

Aqui chegados, e apetrechados dos considerandos de natureza doutrina e jurisprudencial supra explanados, e descendo agora ao concreto, importa de imediato começar por afastar a existência do vício adjectivo subsumível à alínea b) do nº1, do artº 615º, do CPC, porque , como é manifesto, a decisão apelada proferida pelo tribunal a quo integra a especificação dos fundamentos de facto e de direito nos quais se apoia, concorde-se, ou não, com ambos e com a forma de subsunção dos primeiros aos segundos.

Na verdade, e no tocante ao objecto essencial da apelação ora em analise, mostram-se devidamente explanados na sentença recorrida quais os fundamentos de facto e de direito da decisão do tribunal a quo da qual discordam os apelantes.

De igual modo, também o vício de nulidade de sentença, com base em pretensa contradição entre a fundamentação e a decisão ou comando /dispositivo – a solução dada ao litígio , não se  mostra presente, pois que, analisado o grosso ( a globalidade) da fundamentação do a quo aduzida na sentença, não se descortina,  antes pelo contrário, que aponte ela necessária e obrigatoriamente para um único sentido, tendo porém o Exmº julgador enveredado, contraditoriamente, por diferente desfecho/solução.

É que, em momento algum, se admite  - na decisão recorrida -  justificar a apreciação das impugnações pelos recorrentes atravessadas nos autos ,  mas , a final , e em contradição, vem todavia o tribunal a quo a decidir pelo não conhecimento do mérito de ambas.

É certo que, ambos os recorrentes, não nutrem qualquer “simpatia” com o comando decisório da sentença apelada e na parte ora em análise, considerando que, em função v.g. de outros considerandos a valorar e a atender, , deveria ter sido ele diferente.

Sucede que, a terem os recorrentes razão, então o vício que atinge a sentença será já de natureza substantiva ( error in judicando), que não adjectiva, não sendo ele , de todo, subsumível à previsão do artº 615º, do CPC.

Por fim, passando de seguida à análise do invocado vício de nulidade de sentença com fundamento na omissão de pronúncia pelo a quo de concreta questão que o tribunal a quonão apreciou/conheceu, e porque a questão em causa diz respeito ao julgamento do mérito das impugnações pelos apelantes deduzidas, basta ter presente a decisão que integra o item 2.7. da motivação de facto do presente Acórdão para concluir - sem quaisquer dificuldades - para facilmente se concluir que não existe de todo qualquer omissão de pronuncia.

É que, como supra vimos já também , nesta sede não é de todo pertinente incluir-se no âmbito das nulidades de sentença um qualquer erro de julgamento , seja de facto e/ou de direito, confundindo-se o "error in procedendo" com o "error in judicando" , e , como é manifesto , ainda que com base em fundamento de natureza processual , apreciou/conheceu o tribunal a quo as impugnações - deduzidas pelos ora apelantes - da lista de credores apresentada pelo Administrador da insolvência,  considerando/julgando que “carecem - os ora apelantes - de legitimidade para a apresentação de impugnação “.

Dir-se-á que, em obediência ao critério da ordem do julgamento plasmado no artº 608º, nºs 1 e 2, do CPC, e julgando existir fundamento de natureza processual que obstava ao conhecimento do mérito das impugnações  pelos ora apelantes deduzidas,  prejudicada se mostrava a prolação da decisão a que alude o nº3, do artº 136º, do CIRE  - com referência à alínea b), do artº 510º e artº 511º, do CPC anterior ao aprovado pela Lei nº 41/2013, de 26 de Junho.

Em conclusão, improcedem in totum as conclusões recursórias dos apelantes dirigidas para os vícios adjectivos da sentença recorrida.
                                              
3.2. - Se a decisão identificada em 2.7. ( infra ) da motivação de facto do presente Ac. , se impõe ser revogada.

Dissentindo os apelantes da decisão proferida pelo tribunal a quo e que se mostra vertida no item 2.7. do presente  Ac. [ a qual integra o saneador-sentença recorrido ],  aduzem os apelantes que merece a mesma ser revogada sobretudo porque :
a) os Recorrentes-Falidos ( no processo de Almada, agora Lisboa ) ainda não estavam definitivamente declarados como Falidos, em virtude de, face ao recurso que da mesma foi interposto, a douta Sentença de 29.05.2012 apenas transitou em julgado em 18.12.2012 ;
b) as intervenções processuais dos Recorrentes visaram a defesa dos seus interesses e, reflexamente, dos interesses da Massa Insolvente do seu processo de Falência (esta decretada no ex-Tribunal de Almada e a decorrer agora no Tribunal de Lisboa ) - aumentando o Activo Patrimonial da Massa Falida e diminuindo o Passivo Patrimonial da Massa Falida dos Falidos nos autos ; 
c) os Recorrentes têm todo o legítimo interesse em agir, como agiram nos presentes autos e, assim, o direito de reclamarem, autonomamente, créditos, na defesa da sua Massa Insolvente , e ainda que tal seja feito contra o entendimento da pessoa do Sr. Administrador de Insolvência ;
d) a natureza da intervenção dos Administradores de Insolvência é meramente residual, complementar, ou substitutiva dos Falidos  e  não exclusiva, podendo estes últimos praticar os normais, e usuais, actos de administração dos seus interesses gerais, nomeadamente, o direito legítimo de defenderem os seus interesses juntos de pessoas que são suas Devedoras ;
e) a actuação dos apelantes sempre se enquadra , de resto, no disposto nos artigos 81º,  nº4  e nº5, 110º , nº 2, alínea a) , todos do CIRE ,  e  , ademais, a função dos Administradores de Insolvência é CUMULATIVA com a dos demais Credores  e, até , com a pessoa do FALIDO, mas não é EXCLUSIVA;
f) a decisão apelada impede os Falidos/Recorrentes, de poderem exercer os seus legítimos direitos, infringindo o seu direito ao acesso à justiça previsto no Artigo 20º da CRP e o direito de propriedade previsto no Artigo 62 da mesma CRP.
g) a entender-se que teria, formalmente, caducado o Mandato do Advogado signatário , ainda assim a solução processual exigível seria a de se notificar os Recorrentes, pessoal e expressamente, de tal facto e para, querendo, constituírem , de novo, um mandatário.
Vejamos, de imediato, se a argumentação dos apelantes - dirigida para a almejada revogação da decisão identificada em 2.7. ( infra ) da motivação de facto do presente Ac. -  , merece ser atendida.
Ora bem
Estatui-se nas als. d) , e) e g), do n.º 1 do art. 36.º do CIRE, sob a epígrafe “Sentença de declaração de insolvência”, que :

“1. Na sentença que declarar a insolvência, o juiz:
(…)
d)-Nomeia o administrador da insolvência, com indicação do seu domicílio profissional;
e)-Determina que a administração da massa insolvente será assegurada pelo devedor, quando se verifiquem os pressupostos
exigidos pelo n.º 2 do artigo 224.º;
g)-Decreta a apreensão, para imediata entrega ao administrador da insolvência, dos elementos da contabilidade do devedor e de todos os seus bens, ainda que arrestados, penhorados ou por qualquer forma apreendidos ou detidos e sem prejuízo do disposto no n.º 1 do artigo 150º
”.

Já os artºs  54º  e  55º, nºs  1, 3 e 8 , também do CIRE, rezam que :

Artº 54º
Início de funções
O administrador da insolvência, uma vez notificado da nomeação, assume imediatamente a sua função “:

Artº 55º
“Funções e seu exercício”
“ 1.Além das demais tarefas que lhe são cometidas, cabe ao administrador da insolvência, com a cooperação e sob a fiscalização da comissão de credores, se existir:
(…)
b)-Prover, no entretanto, à conservação e frutificação dos direitos do insolvente e à continuação da exploração da empresa, se for o caso, evitando quanto possível o agravamento da sua situação económica.
(…)
3 O administrador da insolvência, no exercício das respectivas funções, pode ser coadjuvado sob a sua responsabilidade por técnicos ou outros auxiliares, remunerados ou não, incluindo o próprio devedor, mediante prévia concordância da comissão de credores ou do juiz, na falta dessa comissão.
(…)

8 O administrador da insolvência dispõe de poderes para desistir, confessar ou transigir, mediante concordância da comissão de credores, em qualquer processo judicial em que o insolvente, ou a massa insolvente, sejam parte”.
Por sua vez, agora de acordo com o disposto nos arts. 81.º85.º, ainda do mesmo Diploma Legal (CIRE), dizem-nos ambos que  :

Artigo 81
Transferência dos poderes de administração e disposição
1 Sem prejuízo do disposto no título X, a declaração de insolvência priva imediatamente o insolvente, por si ou pelos seus administradores, dos poderes de administração e de disposição dos bens integrantes da massa insolvente, os quais passam a competir ao administrador da insolvência.
2 Ao devedor fica interdita a cessão de rendimentos ou a alienação de bens futuros susceptíveis de penhora, qualquer que seja a sua natureza, mesmo tratando-se de rendimentos que obtenha ou de bens que adquira posteriormente ao encerramento do processo.
(…)
4 O administrador da insolvência assume a representação do devedor para todos os efeitos de carácter patrimonial que interessem à insolvência.
5 A representação não se estende à intervenção do devedor no âmbito do próprio processo de insolvência, seus incidentes e apensos, salvo expressa disposição em contrário
(…)

Artigo 85.º
Efeitos sobre as acções pendentes
1 Declarada a insolvência, todas as acções em que se apreciem questões relativas a bens compreendidos na massa insolvente, intentadas contra o devedor, ou mesmo contra terceiros, mas cujo resultado possa influenciar o valor da massa, e todas as acções de natureza exclusivamente patrimonial intentadas pelo devedor são apensadas ao processo de insolvência, desde que a apensação seja requerida pelo administrador da insolvência, com fundamento na conveniência para os fins do processo.
2
3 O administrador da insolvência substitui o insolvente em todas as acções referidas nos números anteriores, independentemente da apensação ao processo de insolvência e do acordo da parte contrária.”

Importante é ainda considerar o que vem  estatuído no artº 112º, nº1, do CIRE, ( sob a epígrafe “Procurações”), ou seja, que “ Salvo nos casos abrangidos pela alínea a) do n.º 2 do artigo 110.º, com a declaração de insolvência do representado caducam as procurações que digam respeito ao património integrante da massa insolvente, ainda que conferidas também no interesse do procurador ou de terceiro”.

Por fim, reza o artº 14º, do Cire ( epígrafe recursos “ ) , que “ Os recursos sobem imediatamente, em separado e com efeito devolutivo “.

Feita a referida e breve resenha dos normativos do CIRE que, em nosso entender, mostram-se conexos com a “questão” ora em sindicância, e sendo certo que os “efeitos” primordiais decorrentes da declaração de insolvência verificam-se basicamente, senão quase exclusivamente, ao nível meramente “patrimonial”, (15) não se descortina que outra devesse ter sido a decisão apelada no que às impugnações deduzidas pelos ora apelantes concerne.

Na verdade, não obstante a sentença proferida no processo de insolvência n.° 1518/12.8 TBALM , não se mostrar ainda transitada em julgado aquando das impugnações deduzidas pelos apelantes no âmbito dos presentes autos, a verdade é que tal não obstava ao imediato exercício de funções nos referidos autos pelo administrador da insolvência nomeado na referida sentença [ cfr. artº 36º, alínea d) e 54º, ambos do CIRE ]  .

É que, em razão da natureza urgente dos autos em apreço ( cfr. artº 9º, do CIRE ), e do consequente/compreensível efeito devolutivo atribuído aos recursos no respectivo âmbito interpostos, é óbvio que o início de funções do administrador da insolvência não fica de todo condicionado ao trânsito em julgado da sentença de declaração de insolvência do devedor.

Ou seja, uma vez notificado da nomeação, fica o administrador da insolvência imediatamente investido de todos os poderes legais que lhe cabem e deve iniciar com brevidade e diligência o correspondente exercício, na defesa dos interesses dos credores . (16)

Por outra banda, também o argumento - este por sua vez invocado/aduzido na decisão apelada e ora em apreciação - da caducidade do mandato conferido ao Dr. António ……, e partindo do pressuposto que a procuração e mandato conferidos pelo devedor caducam com a declaração de insolvência [ porque utilizados para prática de acto que não é de todo estranhos à massa insolvente ] , não serve para, de imediato, obstar ao conhecimento dos instrumentos atravessados nos autos pelo mesmo Dr. António …….. em nome dos apelantes, pois que, então, impunha-se lançar mão do mecanismo de suprimento do vício de falta de procuração, fixando-se prazo para o respectivo suprimento, nos termos do artigo 48.º, nº 2 , do C.P.C ( actualmente em vigor, e correspondente ao artº 40º,nº2, do pretérito CPC ).

“Ultrapassados” os referidos “obstáculos”, e tendo agora presente o disposto nos artºs 81º e 85º do CIRE , maxime os respectivos “ comandos “ acima transcritos, incontornável é concluir que , em razão da declaração da insolvência do devedor, fica este último privado dos poderes de administração e disposição relativamente a bens compreendidos na massa insolvente , ou seja, como bem salientam Luís Carvalho Fernandes e João Labareda (17), “ o efeito primordial da declaração de insolvência, quanto ao devedor, é de natureza patrimonial e reflecte-se nos seus poderes de actuação nesse domínio da sua esfera jurídica” , sendo os referidos poderes atribuídos ao administrador da insolvência . (18)

Mais precisam Luís Carvalho Fernandes e João Labareda (19), que  “as limitações dos poderes do insolvente contidas nos n.º 1 e 2  [ do artº 81º ] reportam-se a actos em que ele tem uma posição activa - de sujeito activo, passe a expressão”, podendo porém já o devedor ter uma posição passiva no tocante a actos relativos à massa insolvente, como sucede quando lhe é feito o pagamento de créditos seus.

A referida solução, explica Luís Manuel de Menezes Leitão (20) , compreende-se, dado que a declaração de insolvência faz pressupor uma certa desconfiança na capacidade de administração do devedor, dado que aí pode ter residido a causa da sua situação de insolvênciaacrescentando ainda Maria do Rosário Epifânio (21) que a solução aludida justifica-se também por importar proteger o interesse dos credores concursais .

Dir-se-á que, como bem se salienta em douto Ac. proferido por este mesmo Tribunal da Relação de Lisboa (22) “ que o falido/insolvente, com a perda do poder de administração e disposição dos bens integrantes da massa falida/insolvente, fica numa situação de indisponibilidade relativa, salvaguardando-se, assim, a massa insolvente dos actos que ele possa indevidamente praticar sobre o referido património autónomo”.

Isto dito , se atentarmos que [ em razão da conjugação do disposto nos artºs 46º, nº1 e 81º, nºs 1, 2 e 4 , ambos do CIRE , e 773º, este último do CPC - alusivo à penhora de créditos ] a massa insolvente compreende os bens do devedor que não estejam isentos de penhora , e tanto os existentes à data da declaração de insolvência, como os adquiridos na pendência do processo, pacífico nos parece ser que carece o insolvente de legitimidade para,  por si ( sponte sua ) , e ao arrepio do exercício das funções que ao administrador da insolvência incumbe , dirigir-se a um processo de insolvência de terceiro/devedor reclamar um crédito que, a existir,  há-de necessariamente integrar também ele a massa insolvente do processo no âmbito do qual foi ele próprio - reclamante - declarado insolvente.

E ,  a fortiori,  menor  legitimidade (23) tem o mesmo insolvente para,  por si ( sponte sua ) , e ao arrepio  do exercício das funções que ao administrador da insolvência incumbe , dirigir-se a processo de insolvência de terceiro/devedor deduzir impugnação da lista de credor reconhecido , nos termos do disposto no artº 130º, do CIRE.

O acabado de afirmar, em face do disposto no nº3, do artº 85º, do CIRE, é de resto a interpretação que melhor se compatibiliza com uma adequada harmonia e unidade do sistema jurídico que nos rege ( cfr. artº 8º,nº1, do CC ),  e, bem assim, com a presunção de que goza o legislador e à qual se refere o nº3, do citado artº do CC, mal se compreendendo que, se uma vez declarada a insolvência, deve o administrador da insolvência substituir o insolvente em todas as acções pendentes pelo devedor intentadas e de natureza exclusivamente patrimonial, possa ainda assim o mesmo devedor desencadear ex novo e sponte sua um procedimento judicial também de natureza exclusivamente patrimonial e mesmo já depois de ter sido judicialmente declarado insolvente.

Acresce que, importa não olvidar, do CIRE [ do artº 82º, nº3, alínea a) ] resulta também  a exclusiva legitimidade , durante a pendência do processo de insolvência, do administrador da insolvência para propor e fazer seguir acções de responsabilidade que legalmente couberem, em favor do próprio devedor [  contra os fundadores, administradores de direito e de facto, membros do órgão de fiscalização do devedor e sócios, associados ou membros ] e  independentemente do seu acordo,  e  , para todos os efeitos,  os poderes que a lei lhe confere [ ao administrador da insolvência ] , têm a natureza de poderes funcionais, os quais não só pode, como, sobretudo, deve o administrador da insolvência desempenhar com a diligência de um gestor criterioso e ordenado [ cfr. artº 59º,nº1,do CIRE ].

Em suma, a atribuição da legitimidade ao administrador da insolvência para desencadear procedimentos judiciais de carácter patrimonial em defesa da massa insolvente “,  justifica-se [ de lege lata ] , quer porque o insolvente fica imediatamente privado dos poderes de administração e de disposição ( artº 81º, nº1, do CIRE ), quer porque após a declaração de insolvência o administrador da insolvência assume a representação do insolvente para todos os efeitos de carácter patrimonial que interessem à insolvência e aos credores, quer porque é também do interesse dos credores  - no tocante à satisfação dos seus créditos - que exista uma centralização dos poderes/deveres de reclamar na pessoa do administrador da insolvência.

Não se olvida que, ao atribuir-se ao administrador da insolvência a legitimidade para substituir o insolvente nas acções pendentes de natureza patrimonial  e a propor no interesse da massa insolvente e dos direitos dos credores, não é de afastar a possibilidade de os direitos dos credores serem postos em causa em razão de uma eventual omissão e/ou inércia do administrador da insolvência no âmbito do desempenho da missão funcional primordial que lhe cabe de se orientar necessariamente para a satisfação dos interesses dos credores.

Mas , a ocorrer a referida situação “patológica”, há-de reger então o artº 59º, do CIRE [ com a epígrafe de “RESPONSABILIDADE “], não justificando a mesma que possam os credores e/ou o insolvente agir por si e em “substituição do administrador no âmbito das funções que lhe incumbe/compete desempenhar , podendo , quando muito, solicitarem ao Juiz [ a quem incumbe fiscalizar a actividade do administrador - cfr. artº 58º do CIRE ] que exija a prestação - pelo administrador - de informação pertinente sobre assunto relevante [ relacionado com a competência do administrador ] e no interesse da massa insolvente e dos direitos dos credores.

De resto,   mal se compreenderia que , estando vedado ao próprio juiz, no âmbito da fiscalização da actividade do administrador ( cfr. [artº 58º, do CIRE ), instruir o administrador sobre o modo de proceder, ou determinar-lhe o cumprimento de concretos actos inseridos no âmbito das respectivas competências e funções,  pudesse já o insolvente censurar tacitamente uma omissão do administrador da insolvência, ao substituir-se ao mesmo [ e no âmbito de efectiva situação de conflito entre a administração da massa e o insolvente ] no exercício de concreta tarefa em defesa dos interesses dos credores.

Em conclusão, porque fica o insolvente privado dos poderes de administração e disposição relativamente a bens compreendidos na massa insolvente ( cfr. artigo 88.º, n.º 1, do CIRE), cabendo ao administrador da insolvência representá-lo relativamente aos referidos  bens , e ,  ademais (24) , não resulta outrossim dos autos que o administrador da insolvência tenha manifestado  expressa e inequivocamente não existir interesse em reclamar determinado crédito do insolvente junto de processo de insolvência de terceiro/devedorcarece o insolvente de legitimidade para , ex novo e sponte sua, deduzir a reclamação do  crédito referido.

Destarte, não sendo - no tocante à defesa do património do devedor/insolvente e integrante da respectiva massa - a actuação do  Administrador de Insolvência CUMULATIVA com a do INSOLVENTE, e, porque  ao atribuir-se apenas ao Administrador de Insolvência a incumbência de representar o insolvente em todos os actos de caracter patrimonial que interessem à insolvência, não se impede o Falido de exercer os seus legítimos direitos [ infringindo o seu direito ao acesso à justiça previsto no Artigo 20º da CRP e o direito de propriedade previsto no Artigo 62º da mesma CRP ]  , inevitável é a confirmação da decisão apelada.

A referida confirmação do julgado, justifica-se ainda porque, manifestamente, não se enquadra a intervenção dos apelantes na previsão do nº5, do artº 81º, do CIRE , pois que , para todos os efeitos, a presente acção não se identifica com a acção de insolvência n.° 1518/12.8 TBALM, não sendo um seu incidente e/ou  apenso , logo , a indisponibilidade relativa referida nos nºs 1 e 4 , do artigo 81.º , do CIRE , não se mostra afastada/arredada, cabendo ao administrador da insolvência nomeado na acção referida - n.° 1518/12.8 - substituir/representar os insolventes  [ C e D ] nestes autos.

Improcedem, portanto, as conclusões do recurso interposto por C e mulher D, dirigidas para a almejada revogação da sentença recorrida.
                                                          
4. Sumariando ( cfr. artº 663º, nº7,  do CPC):
4.1. Tendo presente o disposto nos artºs 81º, nº1  e 85º, nº3 , ambos do CIRE , pacífico é que  em razão da declaração da insolvência de devedor, fica este último privado dos poderes de administração e disposição relativamente a bens compreendidos na massa insolvente , ou seja, sendo essencialmente os efeitos da referida decisão de natureza patrimonial, e reflectindo-se eles  nos poderes de actuação do insolvente no referido domínio e na sua esfera jurídica, passam os poderes em causa a ser da competência do administrador da insolvência .
4.2. A legitimidade que o CIRE confere ao administrador da insolvência de agir/actuar  em defesa do interesse da massa insolvente e dos direitos dos credores, não é partilhada/cumulativa com uma outra - de igual natureza e conteúdo - do próprio INSOLVENTE, a ponto de no âmbito da prossecução e defesa dos interesses e direitos acima referidos poder também o insolvente agir por si e em “substituição” do administrador da insolvência no desempenho das funções que lhe incumbe/compete.
4.3. Em face do referido em 4.1. e 4.2.,   carece o devedor insolvente de legitimidade para , sponte sua, substituir-se ao  administrador da insolvência no exercício de concreta tarefa em defesa dos interesses dos credores, v.g. dirigindo-se a processo de insolvência de um terceiro e nele deduzir uma reclamação de um crédito .
                                                          
5. Decisão.

Em face de tudo o supra exposto,
acordam os Juízes na ...ª Secção Cível do Tribunal da Relação de LISBOA , em , não concedendo provimento à apelação interposta por C e mulher D;
5.1. Confirmar/manter a sentença apelada.
Custas pelos apelantes.



LISBOA, 11/5/2017



António Manuel Fernandes dos Santos(O Relator)
Francisca da Mata Mendes(1ª Adjunta)
Eduardo Petersen Silva(2º Adjunto)


                                                      
(1)Cfr. Antunes Varela e outros, in Manual de Processo Civil, 1984 , Coimbra Editora, págs. 668 e segs..
(2)Cfr. Luís Filipe Brites Lameiras, in Notas Práticas Ao Regime dos Recursos Em Processo Civil, 2ª Edição, Almedina, pág. 33.
(3)Cfr. v.g. o Ac. do STJ de 6/5/2004, disponível in www.dgsi.pt.
(4) In Código de Processo Civil Anotado, Vol. 2º, pág. 670.
(5)In Código do Processo Civil Anotado, vol.V, Coimbra Editora, págs. 143-145.
(6)Cfr. ANTÓNIO SANTOS ABRANTES GERALDES, Juiz-Conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça, in sentença Cível, texto-base da intervenção efectuada nas “Jornadas de Processo Civil” organizadas pelo CEJ, em 23 e 24 de Janeiro de 2014).
(7) Cfr. o Ac. do STJ  de 5/5/2005, in www.dgsi.pt.
(8) Cfr. o Prof. José Alberto dos Reis, in C. Proc. Civil anotado, V , Coimbra Editora, 1984, pág.139 a 141 ;  Prof. Antunes Varela e Outros, in Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág. 687 a 689 e Luís Filipe Brites Lameiras, in Notas Práticas ao Regime dos Recursos em Processo Civil,  2ª. edição, Almedina, 2009, pág.36.
(9)Prof. José Alberto dos Reis, ibidem, pág.140.
(10)Cfr. José Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil, anotado, 5ª , pág. 141.
(11)In Manual de Processo Civil, 1984, Coimbra editora, pág. 671.
(12)In ob. citada, pág. 671.
(13)In Código de Processo Civil, Anotado, Coimbra Editora, vol. II, pág. 670,
(14)Cfr. J.O. Cardona Ferreira, in Guia de Recursos em Processo Civil, 5ª Edição, pág. 71.
(15)Cfr. Carvalho Fernandes e J. Labareda, In CIRE Anotado, Quid Júris -Sociedade Editora, 3ª Edição, 2015, pág. 411.
(16)Cfr. Carvalho Fernandes e J. Labareda, In CIRE Anotado, Quid Júris -Sociedade Editora, 3ª Edição, 2015, pág. 324.
(17)Ibidem, pág. 411.
(18)Ibidem, pág. 411
(19)Ibidem, pág. 412
(20)In Direito da Insolvência, 2013, 5ª Edição, pág. 147 .
(21)In Manual de Direito da Insolvência, 2014, 6ª Edição, Almedina, pág. 94.
(22)Ac. de 06-03-2008, Proc. nº 1610/2008-8, sendo Relator SALAZAR CASANOVA, e in www.dgsi.pt.
(23) Nos termos de qualificação - que não de indisponibilidade -  utilizada por Pedro Macedo, in Manual de Direito das Falências, Vol II , 1968, pág. 109.
(24)Cfr. v.g. Ac. do Tribunal da Relação do Porto, de 11/10/2016, Proc. nº 2996/13.3YYPRT-A.P1 , e in www.dgsi.pt.
                                                          
Decisão Texto Integral: