Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
473/15.7T8LSB.L1-2
Relator: ONDINA CARMO ALVES
Descritores: CONTRATO DE CONCESSÃO
UNIÃO DE CONTRATOS
CONTRATOS SUCESSIVOS
EXTINÇÃO DO CONTRATO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 11/16/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: 1.O julgamento de mérito ou de fundo no despacho saneador pode ocorrer quando o processo fornece já os elementos suficientes para que o litígio em causa possa ser decidido com segurança, inexistindo prova a produzir quanto a factos essenciais para a decisão da causa.
2.Na união alternativa, são celebrados dois contratos, em termos tais que, conforme ocorra ou não certo evento, assim se considerará celebrado apenas um deles.
3.Na união com dependência, há entre os contratos um vínculo traduzido no facto de a validade e vigência de um contrato depender da validade e vigência do outro.
4.Ocorre na união com dependência uma inseparável ou inextrincável relação de sujeição e de existência jurídica entre dois vínculos contratuais, sendo que o vínculo contratual principal determina a celebração e a vigência de um outro que não existiria se o primeiro não ganhasse existência jurídica.
5.A caducidade é de verificação automática, resulta imediatamente do facto jurídico stricto sensu que a desencadeia. E, sendo um meio de extinção ex nunc, os efeitos decorrentes desta forma de extinção de um negócio jurídico são, em regra, apenas para o futuro verificado o facto convencionalmente previsto como susceptível de ser fundamento da caducidade, a mesma surge e opera, dependendo de simples constatação desse evento impeditivo da eficácia do negócio jurídico em causa.
6.Verificada uma coligação de contratos entre o contrato de concessão de uso privativo do terminal marítimo celebrado entre a concedente APSS e vários concessionários, designadamente, autora e ré e um contrato celebrado entre as entre estas últimas, a extinção por caducidade do contrato principal (de concessão) em relação a ré, uma das concessionárias, implica inexoravelmente a extinção do contrato dependente celebrado entre autora e ré.
(Sumário elaborado pela Relatora)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os Juizes, do Tribunal da Relação de Lisboa.


I.RELATÓRIO:


MINAS ……., com sede em ….., intentou, em 07.01.2015, contra ENERGIA, …., com sede social, acção declarativa, com processo comum, através da qual pede a condenação da ré no pagamento à autora, a quantia de € 360.151,36, acrescida de juros vincendos até integral e efectivo pagamento.

Fundamentou a autora, no essencial, esta sua pretensão da seguinte forma:
1.Em 15.01.1996 foi celebrado o contrato de concessão de direito de uso privativo de um terminal marítimo entre administração dos Portos de Setúbal e Sesimbra (APSS), concedente, e autora e ré, concessionárias.
2.Em 28.11.1996, autora e ré celebraram um protocolo nos termos do qual a ré pagaria anualmente à autora o montante de Esc. 54.710.000$00 destinado a ressarci-la dos prejuízos sobre a perda dos seus direitos exclusivos sobre o terminal.
3.O pagamento da quantia prevista no protocolo foi sempre pago pela ré até ao ano de 2013.
4.Por carta de 16.01.2013 a ré informa a autora da carta enviada à APSS comunicando a cessação da actividade e consequente caducidade do contrato quanto à ré nos termos da Cl. 23, nº 9 do contrato de concessão.
5.A autora entende ser devida a indemnização compensatória prevista no protocolo referente ao ano de 2014, o que a ré recusa.
6.A autora entende que, não obstante a comunicação da ré, a qual chegou a seu conhecimento em 21.01.2013, aquele seu direito venceu-se a 01.01.2014, pois tal comunicação só operava após um ano e o pagamento de tal indemnização está dependente da efectiva utilização do terminal.
7.A ratio da Cl. 23º nº 9 é a ocorrência de um evento superveniente após a produção normal dos efeitos contratuais, mas não retroactivo (chamada caducidade dissolutiva).

Citada, o réu apresentou contestação, em 09.02.2015, invocando, em síntese, que:
1.Nunca a ré, em 2014, utilizou o terminal em causa, o que a autora sabe desde 16.01.2013.
2.A concedente recebeu a carta da ré em 18.01.2013 e não pôs em causa a caducidade do contrato de concessão.
3.A autora também não pôs em causa tal caducidade, nem questionou que a ré tivesse deixado de utilizar o terminal.
4.Em 24.04.2013 foi efectuado um primeiro auto de vistoria, momento em que a ré informou ter, em 15.04.2013, carregado um último navio.
5.Em 15.10.2013, foi realizada uma vistoria ad perpetuam rei memorium que ficou pendente de homologação, a qual ocorreu em 28.03.2014, aí tendo sido considerado adequado o prazo de 3 meses para desmantelamento dos bens indicados no auto de vistoria.
6.A caducidade operou no dia 18.01.2014 nos termos da Cl. 23º nº 9 do contrato de concessão. Nos termos do protocolo a indemnização é devida enquanto a ré for utilizadora do terminal tout court, independentemente da caducidade da concessão. As partes negociaram, assim, uma condição resolutiva.
7.Tendo cessado a utilização em Abril de 2013 os efeitos do protocolo extinguiram-se nesse momento, sendo tal consentâneo com o princípio geral nos termos do qual uma indemnização pressupõe um prejuízo efectivo.
8.Qualquer uma das vistorias pressupõe que a ré tenha deixado de utilizar o terminal.
9.A própria autora admitiu a cessação da utilização do terminal pela ré na carta de 11.02.2014.
10.O protocolo não prevê qualquer prazo para o pagamento da indemnização.
11.Verifica-se uma união de contratos com dependência unilateral do protocolo em relação à concessão. O primeiro extingue-se com a extinção do segundo se antes não ocorrer outra causa.
12.A caducidade do contrato de concessão ocorreu em 18.01.2014. Caso não se entenda que o protocolo caducou com a cessação da utilização o mesmo caducaria em 18.01.2014.
13.Quanto muito seria apenas devido o pagamento de parte proporcional da indemnização anual (de 01 a 18.01.2014).

Notificada a autora, por determinação do despacho de 05.05.2015, ao abrigo do disposto no artigo 3º, nº 3 do CPC, veio esta responder à contestação apresentada dela ré, em 19.05.2015, alegando, em síntese que:
1.Só no início do segundo semestre de 2014 teria a R tal espaço desocupado após o desmantelamento dos bens.
2.A desistência por parte da ré da exclusividade só terminou em meados do ano de 2014, momento a partir do qual o espaço deixou de estar na sua disposição.
3.A carta da autora à APSS de 11.02.2014 só pode integrar um acto de denúncia do contrato, acto não previsto como forma de cessação do contrato de concessão.
4.A eventual caducidade está na dependência da APSS e não numa mera comunicação da R.
5.Inexiste abuso de direito da sua parte.

Foi levada a efeito a audiência prévia, em 10.01.2016, constando da respectiva Acta que as partes afirmaram não existir possibilidade de acordo, mantendo inalteradas as posições vertidas nos articulados.

Mais se refere a aludida Acta que a Exma. Juíza do Tribunal a quo facultou às partes, nos termos do artigo 591º, nº 1 alínea b) do CPC a discussão de facto e de direito, uma vez que se admitia que os autos continham os elementos que permitiam o conhecimento imediato no todo do mérito da causa, pelo que os mandatários de autora e ré alegaram de facto e de direito, tendo sido ordenado que os autos fossem conclusos, a fim de ser proferida sentença.

O Tribunal a quo proferiu decisão, em 10.02.2016, constando do Dispositivo da sentença o seguinte:

Pelo exposto, e sem necessidade de mais considerações, julgo a presente acção parcialmente procedente, por parcialmente provada, e consequentemente,
Condeno a R no pagamento à A da quantia de € 13.457,70, acrescida de IVA e de juros de mora, à taxa legal, desde 30/08/2014 até efectivo e integral pagamento.
Custas na proporção do decaimento.
Registe e notifique.

Inconformada com o assim decidido, a autora interpôs recurso de apelação, em 28.03.2016, relativamente à sentença prolatada.

São as seguintes as CONCLUSÕES da recorrente:
 i.A recorrente peticiona uma indemnização compensatória destinada a ressarci-la dos prejuízos sobre a perda dos direitos exclusivos sobre o terminal, referente ao ano 2014, dado que aquando da comunicação por parte da R da caducidade do contrato (16-01-2013) a obrigação de pagamento já se tinha vencido a 01/01/2013.
ii.A sentença de que era se recorre foi proferida nos termos do artº 595, nº 1 b) do CPC, em sede de despacho saneador sentença, o Tribunal prescindiu da produção de prova.
iii.Em quinze de Janeiro de 1996, foi celebrado um “Contrato de Concessão de Direito de Uso Privativo de um Terminal Marítimo Integrado no Domínio Público de Estado Afecto à Administração dos Portos de Setúbal e de Sesimbra, Situado na Margem Direita do Rio Sado, na Cachaforra, Freguesia de S. Sebastião, Concelho e Distrito de Setúbal” entre a Administração dos Portos de Setúbal e Sesimbra – APSS -, na qualidade de Concedente e a A., a R e a sociedade Somin…., estas na qualidade de Concessionarias.
iv.Nos termos do citado contrato “… é conferido às CONCESSIONARIAS, em contitularidade, o direito de uso privativo do terminal portuário identificado na cláusula quarta, doravante TERMINAL, integrado no domínio público do Estado afecto à CONCEDENTE.” - Cfr. Clausula Primeira do Contrato, tudo conforme melhor resulta do doc. nº 1 junto com a Petição Inicial.
v.Entretanto, Recorrente e Recorrida em 28 de Novembro de 1996, celebraram um Protocolo que, nos termos do disposto na clausula 1ª estabelece: “1. A título de indemnização pelos prejuízos sofridos por PA em resultado da renuncia à situação de titular exclusivo da licença de uso privativo nº 1/96 do TCPS, bem como da renúncia à legitima expectativa de vir a celebrar com a APSS, por convolação da licença, um contrato de concessão de serviço público de movimentação de cargas no TCPS, o qual se encontrava negociado e apenas pendente de assinatura e do exercício do qual decorreria uma actividade comercial lucrativa para a Minas …., a Energia …. enquanto for utilizadora do TCPS pagará anualmente à Minas… um montante destinado a ressarci-la dos prejuízos sofridos com a perda dos seus direitos exclusivos sobre o terminal ...”
vi.A indemnização anual prevista e estipulada no protocolo – que a Recorrida estava obrigada a pagar à Recorrente - tinha por fim compensar a Recorrente: - da renúncia de titular exclusivo de uso privativo de um terminal; - da renúncia à legitima expectativa de vir a celebrar por convolação com a APSS um contrato de serviço público de movimentação de cargas.
vii.A ratio da indemnização assentava na compressão do direito de utilização do terminal por parte da Recorrente. Enquanto existisse a compressão de tal direito, o que ocorreria e ocorreu durante todo o tempo em que a Recorrente não o pôde utilizar na sua plenitude, fosse porque a Recorrida o ocupasse com utilização ou sem utilização efectiva, a Recorrida teria de pagar o valor estipulado.
viii.A diminuição do direito da Recorrente correspondeu ao direito da Recorrida, sendo certo que é alheio a este protocolo a intensidade da utilização por parte da Recorrida ou o número de vezes e forma como esta utilizava o direito concedido.
ix.A douta sentença declara existir uma união interna, hierárquica e vertical entre o Contrato de Concessão e o Protocolo, existindo um nexo funcional entre ambos sendo a dependência existente unilateral. E por isso conclui (incorrectamente em sentido lato em nosso entender)
- “a extinção do contrato principal afectará a subsistência do contrato dependente, o qual deixa de ter qualquer razão de existir”
- “… a extinção do contrato de concessão acarretou a extinção do protocolo em 18/01/2014. Isto independentemente da R. se encontrar com vista à reversão gratuita de alguns bens para o estado e ao desmantelamento e remoção de outros, processo aliás ao qual a A. é absolutamente alheia”.
“Consequentemente entendemos que é devida a quota parte da indemnização referente ao ano de 2014 no que concerne ao período de 01/01/2014 a 18/01/2014 inclusivé”.
(…)
x.A Recorrida declarou à Recorrente ter actuado a caducidade do contrato, com efeitos já muitos dias após 1 de Janeiro de 2014. A actuação da caducidade era possível face ao disposto no contrato de Concessão. As razões estratégicas e tecnológicas referidas na clausula 23º nº 9 do Contrato de Concessão, justificativas da declarada (pela recorrida) caducidade do contrato, são um evento superveniente, que ocorreu após a produção normal de efeitos contratuais, mas não retroactivo.
xi.No caso em concreto a caducidade (dissolutiva) dissolve o negócio, salvaguardando sempre os efeitos produzidos até 20 de Janeiro de 2014, destruindo o negocio a partir desta data, a destruição do negocio é ex nunc (desde agora) e não ex tunc é a chamada Caducidade Dissolutiva (neste sentido vide Aníbal de Castro in “Caducidade na Doutrina, na Lei e na Jurisprudência”, 3º Edição, Livraria Petrony, 1984, pag. 164 e sgts).
xii.Contudo se a alegada e declarada caducidade dissolveu o negócio a realidade é que atento o teor e conteúdo do Protocolo não dissolve os efeitos já produzidos por tal negócio, de relevante conteúdo jurídico. Por isso a dependência contratual Contrato de Concessão/Protocolo com a qual a sentença fundamenta a conclusão final não tem aptidão para afastar a obrigação de a recorrida ter de cumprir o pagamento vencido a 1 de Janeiro de 2014, direito da Recorrente vencido e exigível a partir de tal data no que respeita ao ano de 2014, de uma só vez ou a pagar em duodécimos.
xiii.Seguindo a argumentação da sentença, que não se aceita, e no caso de a Recorrente aceitar que o valor da indemnização fosse pago em duodécimos resulta um parodoxo (conforme o disposto na cláusula 2ª do Protocolo), a Recorrida só teria que pagar parte do duodécimo de Janeiro de 2014, quando na verdade continuava a Recorrente impedida de ter a disponibilidade e gozar o espaço cedido por via do Protocolo celebrado!
xiv.O fundamento da indemnização que a Recorrida deveria pagar à Recorrente era o seguinte:
- Por via do contrato de concessão a APSS atribuiu à Recorrente o direito exclusivo do uso privativo de um terminal marítimo.
- Por via de Protocolo legitimado pela APSS a Recorrente aceita a compressão do seu direito, cedendo parte do espaço que gozava em exclusividade à recorrida deixando por isso de poder usar e gozar o espaço que se encontrava ao dispôr da Recorrida.
xv.O Protocolo não impunha, nem fazia depender a indemnização a receber pela Recorrente da intensidade de uso por parte da Recorrida do espaço cedido, e resulta dos factos provados pontos 23., 24. e 25. (página oito da sentença) que pelo menos até finais de Junho de 2014 a A. Recorrente não gozava a plenitude do uso, do direito que detinha por via do contrato de concessão vide Clausula 1ª do Protocolo.
(…)
xvi.Assim e por isso, independentemente de se considerar existir união de contractos, impunha-se decisão diversa, pois é absolutamente abusivo concluir que a mera comunicação efectuada pela Recorrida permitiu à Recorrente gozar o seu direito de uso sem a limitação e compressão que ocorreu com o Protocolo (…)
xvii.A comunicação/carta efectuada pela Recorrida não anulou os efeitos que já se tinham produzido em 1 de Janeiro de 2014, nem sequer permitiu disponibilizar a totalidade do espaço (uso do terminal) entenda-se o que foi concedido pela Recorrente à Recorrida. Ainda que se entenda (como o entendeu incorrectamente a sentença de que se recorre) que “a extinção do contrato principal afectará a subsistência do contrato dependente, o qual deixa de ter qualquer razão de existir”, a realidade é que tal afirmação tem de ser acompanhada de outra, a de que a Recorrida tem de respeitar e cumprir  os efeitos contratuais produzidos em 1 de Janeiro de 2014.
xviii.A sentença confunde vencimento com notificação para pagamento e com forma de pagamento.
O Protocolo define o prazo de pagamento: anual.
Aliás, note-se que a cláusula 2ª do Protocolo define que o pagamento pode ser distribuído em duodécimos.
E, tendo em conta que o pagamento é devido pela “perda dos prejuízos sofridos com a perda dos seus direitos exclusivos sobre o terminal”, se tal pagamento fosse efectuado em duodécimos, estes teriam de ser pagos enquanto existisse a perda dos “direitos exclusivos”.
xix.Ademais o que foi estipulado pelo Protocolo é que a 1 de Janeiro de cada ano se renovava a sua produção de efeitos pelo período de um ano, ou seja, a 1 de Janeiro de cada ano vencia-se a obrigação da R. de pagar o valor anual indemnizatório estabelecido e protocolado.
Desde logo e tendo em conta o disposto no artigo 771º nº 1 do Código Civil, citado pela sentença, a obrigação aqui em análise decorrente do estipulado no Protocolo venceu-se em 1 de Janeiro de 2014 e não com a interpelação.
A mera comunicação/carta efectuada pela Recorrida não foi acontecimento com relevo jurídico bastante para permitir à Recorrente recuperar o direito (entenda-se a parte do direito) que havia perdido por via da celebração do Protocolo.
Por isso nunca poderá afirmar-se como o faz a sentença recorrida que a obrigação se tornou exigível apenas com a interpelação.
Esta interpretação deixaria em aberto uma insuportável contradição na ordem jurídica, que não pode aceitar contradições no seu seio, o que configura uma causa da nulidade da sentença nos termos do disposto no artº 615º nº 1 c) do CPC.
A perda do direito exclusivo da recorrente só cessou quando o terminal ficou desocupado e livre de tudo quanto pertencia à Recorrida, o que só ocorreu posteriormente a Julho de 2014 (artº 28 dos factos provados)
xx.Se a Mma Juiz a quo pretendia concluir que a simples comunicação de desinteresse na utilização da “concessão” permitiu no imediato e em acto contínuo o gozo da plenitude por parte da Recorrente dos direitos exclusivos, então teria obrigatoriamente de fazer prova em sede de julgamento, o que entendeu não fazer, é que não só não foi feita prova como tal não aconteceu na prática.
Assim e por isso também a sentença não poderia por um lado tirar uma conclusão que não integrava o que foi contratado, e por outro uma conclusão que para se obter exigia produção de prova em sede de julgamento.
xxi.A douta sentença interpretou mal os elementos constantes dos autos e retirou conclusões decidindo sobre factos que só poderiam ser conhecidos em sede de prova testemunhal e com realização da audiência de julgamento.
xxii.Preteriu a Mma Juiz a quo a produção de prova essencial para poder concluir que “após a data de 18/01/2014 não se pode, de modo algum, falar de utilização em sentido próprio. “
Na verdade, após 18/01/2015 a Recorrente manteve os “prejuízos sofridos com a perda dos seus direitos exclusivos sobre o terminal” e por isso a sentença teria de concluir em sentido contrário ao que concluiu, razão que legitima o presente recurso no interesse de uma decisão justa e correcta e em abono da defesa do Direito.
xxiii.A sentença recorrida violou entre outras as seguintes normas legais 330º, 333º e 777 nº 1 do CC (nos termos supra definidos), o artº 595º nº 1 b) do CPC, dado que os autos não permitia conhecer imediatamente do pedido e ainda artº 615º nº 1 c).
Pede, por isso, a apelante, que seja proferido Acórdão corrigindo a decisão recorrida, decidindo pela procedência da acção conforme requerido na PI.
    
A ré, ENERGIA ……., apresentou contra-alegações, em 27.04.2016, propugnando pela improcedência do recurso e formulou as seguintes CONCLUSÕES:
i.O Tribunal a quo considerou que, atendendo aos factos provados, é indiscutível estar-se perante uma situação de caducidade do Contrato de Concessão, que operou os seus efeitos em 18 de Janeiro de 2014, tendo conduzido à extinção em simultâneo do Protocolo, dado ambos os Contratos se encontrarem numa situação de união interna, hierárquica e vertical, pelo que somente é devido o pagamento correspondente ao período de 1 a 18 de Janeiro de 2014, o qual somente se venceu com a interpelação por carta da Minas …., datada de 30 de Julho de 2014, i.e., a 30 de Agosto de 2014, 30 dias após a emissão da factura.
ii.Embora o Tribunal a quo tenha andado bem ao julgar improcedente o pedido da Recorrente quanto à quase totalidade do montante indemnizatório relativo ao ano de 2014, pois nada poderia ser devido a partir da indubitável extinção do Contrato de Concessão em 18 de Janeiro de 2014, mesmo em relação à parte referida em que a ora Recorrida foi condenada, a mesma não se conforma e irá interpor recurso subordinado ao presente recurso independente nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 633.º do Código de Processo Civil, por entender que nada é devido quanto ao ano de 2014.
iii.Da interpretação dos Considerandos e da Cláusula 1.ª do Protocolo (constante do doc. n.º 2 junto com a p.i.), resulta claro que o pagamento deste montante anual pela Recorrida à Recorrente era uma contrapartida pela utilização do TCPS para compensar o investimento feito pela Recorrente e a perda de exclusividade da mesma na utilização do Terminal que somente se justificava enquanto a Recorrida fosse utilizadora do mesmo (“a Energia ….. enquanto for utilizadora do TCPS pagará anualmente à Minas ….. um montante destinado a ressarci-la dos prejuízos sofridos com a perda dos seus direitos exclusivos sobre o terminal” – cfr. Cláusula 1.ª, n.º 1, parte final, do Protocolo).
iv.A utilização do Terminal pela Recorrida a que se refere o Protocolo é a prevista e regulada no Contrato de Concessão (Cláusulas 2.ª, 3.ª, 5.ª, 6.ª e  15.ª), dado que o Protocolo só existe porque existe o Contrato de Concessão, nos termos do qual a Recorrente exerce em contitularidade com as restantes duas Concessionárias o direito de utilização privativa do Terminal (cfr. Considerandos e Cláusula 1.ª do Protocolo).
v.Em particular, no caso da Minas ….., a utilização consistia na movimentação de granéis líquidos exclusivamente provenientes ou com destino à Central Termoeléctrica de Setúbal, o que se fazia através da chegada e saída de navios para a respectiva descarga marítima no oleoduto identificado na alínea m) do n.º 2 da Cláusula 5.ª que assegurava o abastecimento da Central referida (cfr. Cláusulas 2.ª, 5.ª e 6.ª do Contrato de Concessão).
vi.Assim, nos termos do Protocolo celebrado entre a Recorrente e a Recorrida o pagamento do montante indemnizatório anual devido tinha como pressuposto a utilização do Terminal por parte da Recorrida nos termos e para o fim do Contrato de Concessão, sendo essa utilização pela Recorrida que justificava a indemnização acordada com a Recorrente inicialmente, nomeadamente a utilização exclusiva do oleoduto identificado na alínea m) da Cláusula 5.ª e as restantes partes em contitularidade, nos termos e para o fim do Contrato de Concessão, sendo certo que o oleoduto reverte para o concedente com a extinção da concessão quanto à Minas …., nos termos gerais previstos no Contrato de Concessão (cfr. a respetiva Cláusula 23.ª, n.º 9).
vii.Do Protocolo resulta que as partes estabeleceram uma condição resolutiva no sentido de o Protocolo, e a obrigação de pagamento do montante indemnizatório anual nele previsto, se extinguir com a extinção da utilização do Terminal pela Recorrida nos termos e para o fim previsto no Contrato de Concessão, existindo uma união de contratos com dependência unilateral do primeiro em relação ao segundo.
viii.Dos factos provados no autos retira-se que, em 2014, a Recorrida nunca utilizou o Terminal de Carga de Praias de Setúbal nos termos e para o fim previstos no Protocolo e no Contrato de Concessão – em particular, no caso da Energia …., a movimentação de granéis líquidos exclusivamente provenientes ou com destino à Central Termoeléctrica de Setúbal (cfr. Cláusulas 2.ª, 5.ª e 6.ª do Contrato de Concessão) –, dado terem ocorrido factos, que não lhe são imputáveis, que tornaram dispensável a utilização do Terminal pela Recorrida (cfr. pontos 3 a 7, 10 e 20 a 22 da decisão da matéria de facto).
ix.A cessação da utilização do Terminal foi comunicada pela Recorrida à Recorrente por carta datada de 16 de Janeiro de 2013 e confirmada novamente em 24 de Abril de 2013, não tendo sido, em qualquer destas ocasiões, contestada pela Recorrente (cfr. pontos 11, 12 e 20 a 23 da decisão da matéria de facto e doc. n.º 3 junto com a p.i.).
x.Pelo que se deve entender que a condição resolutiva implícita no acordo das  artes – a cessação da utilização do Terminal pela Recorrida antes de 2014 – operou ipso facto em 2013, extinguindo-se os efeitos do Protocolo em 2013 e, em qualquer caso, inexistindo qualquer obrigação de pagamento da Recorrida relativa ao ano de 2014.
xi.O próprio argumento da Recorrente de que a ratio da indemnização assentava na compressão do seu direito de utilização do Terminal, independentemente da utilização, é incorrecto, impreciso e não procede: não foi a compressão da utilização da Recorrente que explicou a indemnização acordada com a Recorrida no Protocolo, mas simplesmente, como do respetivo teor resulta inequivocamente, a circunstância de proporcionar a esta última uma utilização de que de outro modo não teria, pelo que se justifica plenamente que, cessando a utilização do Terminal pela Recorrida especificamente prevista nos termos e para o fim do Contrato de Concessão, cesse também a indemnização devida.
xii.Tal como referido na sentença a quo, a pendência de homologação do auto de vistoria, dependente de membros da APSS, DGEG – Direcção Geral de Energia e Geologia e da Agência Portuguesa do Ambiente, o facto de o Estado ter entrado na posse dos bens que reverteram para os mesmo em 2014 e de ter sido concedido à Recorrente o prazo de três meses para remover alguns bens identificados no auto de vistoria, em nada altera o conceito de utilização do Terminal pela Recorrida para efeitos do Protocolo, correspondente à utilização nos termos e para o fim do Contrato de Concessão, por se tratarem de procedimentos previstos na lei para a reversão dos bens para o concedente após a extinção do Contrato de Concessão por caducidade em 18 de Janeiro de 2014.
xiii.Ora, como resulta provado nos autos, o auto em causa teve lugar em Outubro de 2013 e se é certo que a respetiva formalização por parte das entidades administrativas competentes apenas ocorreu mais tarde isso ficou a dever-se a razões a que a Recorrida é totalmente alheia.
xiv.Qualquer pagamento efectuado pela Recorrida à Recorrente, ao abrigo do Protocolo, relativamente ao ano de 2014 – incluindo o pagamento da quota-parte da indemnização respeitante ao período compreendido entre 1 de Janeiro de 2014 e 18 de Janeiro de 2014 – constituirá um enriquecimento sem causa da Recorrente às custas da Recorrida.
xv.Sem prejuízo do referido, e em qualquer caso, sempre o Protocolo cessou os seus efeitos no dia 18 de Janeiro de 2014 com a caducidade do Contrato de Concessão (cfr. Cláusula 23.ª, n.º 9, do Contrato de Concessão), de cuja existência, validade e eficácia o primeiro dependia unilateralmente, extinguindo-se também qualquer obrigação de pagamento de qualquer montante relativa ao ano de 2014 a partir dessa data.
xvi.Quando muito, embora sem conceder, seria apenas devido o pagamento da parte proporcional do montante indemnizatório anual respeitante ao último ano como referido na sentença a quo, a pendência de homologação do auto de vistoria, dependente de membros da APSS, DGEG – Direcção Geral de Energia e Geologia e da Agência Portuguesa do Ambiente, o facto de o Estado ter entrado na posse dos bens que reverteram para os mesmo em 2014 e de ter sido concedido à Recorrente o prazo de três meses para remover alguns bens identificados no auto de vistoria, em nada altera o conceito de utilização do Terminal pela Recorrida para efeitos do Protocolo, correspondente à utilização nos termos e para o fim do Contrato de Concessão, por se tratarem de procedimentos previstos na lei para a reversão dos bens para o concedente após a extinção do Contrato de Concessão por caducidade em 18 de Janeiro de 2014.
xvii.Ora, como resulta provado nos autos, o auto em causa teve lugar em Outubro de 2013 e se é certo que a respetiva formalização por parte das entidades administrativas competentes apenas ocorreu mais tarde isso ficou a dever-se a razões a que a Recorrida é totalmente alheia.
xviii.Qualquer pagamento efectuado pela Recorrida à Recorrente, ao abrigo do Protocolo, relativamente ao ano de 2014 – incluindo o pagamento da quota-parte da indemnização respeitante ao período compreendido entre 1 de Janeiro de 2014 e 18 de Janeiro de 2014 – constituirá um enriquecimento sem causa da Recorrente às custas da Recorrida.
xix.Sem prejuízo do referido, e em qualquer caso, sempre o Protocolo cessou os seus efeitos no dia 18 de Janeiro de 2014 com a caducidade do Contrato de Concessão (cfr. Cláusula 23.ª, n.º 9, do Contrato de Concessão), de cuja existência, validade e eficácia o primeiro dependia unilateralmente, extinguindo-se também qualquer obrigação de pagamento de qualquer montante relativa ao ano de 2014 a partir dessa data.
xx.Quando muito, embora sem conceder, seria apenas devido o pagamento da parte proporcional do montante indemnizatório anual respeitante ao último ano em que o Protocolo ainda se manteve, isto é, de 1 a 18 de janeiro de 2014, sendo assim aquela importância computada pro rata temporis, admitindo-se que seja possível extrair do nosso direito um princípio de acordo com o qual a última prestação devida deve ser computada pro rata temporis, isto é, que o montante indemnizatório previsto no Protocolo não é, no caso em apreço, devido por inteiro, sendo-o somente na parte correspondente ao tempo decorrido no período a que respeita.
xxi.Contrariamente ao que Recorrente alega, a existir qualquer obrigação, a mesma não se venceu nem a 1 de Janeiro de 2014, nem mesmo no momento em que o Protocolo se extinguiu.
xxii.Independentemente do momento da extinção do Protocolo – quer por cessação da utilização do Terminal pela Recorrida antes de 2014, quer por força da caducidade do Contrato de Concessão em 18 de Janeiro de 2014 –, nunca  a  obrigação  de  pagamento do montante anual referente ao ano de 2014 – a existir, o que não se concede de modo algum, pelo menos na sua totalidade – se vencera ou tornara exigível durante a vigência do Protocolo, dado que, estando em causa uma obrigação não sujeita a prazo certo convencionado pelas partes, a mesma somente se tornaria exigível em sentido forte – o relevante para os presentes autos – mediante interpelação do devedor (artigo 777.º, n.º 1, do Código Civil), o que apenas veio a ocorrer num momento em que o Protocolo já havia indubitavelmente cessado.

A R. por seu turno, apresentou RECURSO SUBORDINADO, em 27.04.2016, na parte em que a mesma lhe foi desfavorável, com impugnação da matéria de facto e de direito, tendo formulado as seguintes CONCLUSÕES:
(…)
No que respeita à decisão do Tribunal «a quo» sobre a matéria de facto,
i.Impugna-se a decisão da matéria de facto na parte em que julgou como não provados e irrelevantes para a decisão da causa os seguintes pontos concretos da matéria de facto:
-“Que, em 2014, a R. nunca tenha utilizado o Terminal de Carga de Praias do Sado (artigo 3.º da contestação);
-Que o representante da R. presente no dia 24/04/2013 (inventário) tenha dito à APSS, à A. e à Somin…. que, no dia 15/04/2013, a R. tinha carregado o último navio com o fuelóleo remanescente na Central termoeléctrica pelo que, a partir dessa data, deixou de ser utilizadora do Terminal (art. 23.º, 50.º da contestação)” (pp. 8 e 9 da sentença do Tribunal a quo).
ii.Entende a R. que tais factos estão provados nos autos: o primeiro por estar implícito e pressuposto no teor dos factos considerados provados nos pontos 10 a 12, 21, 22 e, principalmente, 23 a 25 da decisão da matéria de facto, bem como no teor dos próprios documentos juntos com a contestação – principalmente, dos docs. n.º 2, 3 e 4 – com base nos quais se julgaram provados os respectivos factos referidos; o segundo facto acima transcrito (correspondente ao teor do artigo 22.º da contestação) resulta provado por se tratar de facto pessoal que a A. tinha obrigação de conhecer e que a mesma não impugnou na resposta à contestação, tendo ficado confessado nos autos nos termos do artigo 574.º, n.º 3, do Código do Processo Civil.

No que respeita à decisão do Tribunal a quo sobre a matéria de direito,
iii.Considera-se que inexiste fundamento para o pagamento de todo e qualquer montante anual relativo a 2014, o que implicará necessariamente a improcedência do recurso independente interposto pela A. e a revogação da sentença de condenação parcial da R. no pagamento à A. da quantia de € 13.457,70, acrescida de IVA e de juros de mora, à taxa legal, desde 30.08.2014 até efectivo e integral pagamento.
iv.Da interpretação dos Considerandos e da Cláusula 1.ª do Protocolo, resulta claro que o pagamento deste montante anual pela R. à A. era uma contrapartida pela utilização do TCPS para compensar o investimento feito pela A. e a perda de exclusividade da mesma na utilização do Terminal que somente se justificava enquanto a R. fosse utilizadora do mesmo (“a Minas ….. enquanto for utilizadora do TCPS pagará anualmente à PA um montante destinado a ressarci-la dos prejuízos sofridos com a perda dos seus direitos exclusivos sobre o terminal”.
v.A utilização do Terminal pela R. a que se refere o Protocolo é a prevista e regulada no Contrato de Concessão (Cláusulas 2.ª, 3.ª, 5.ª, 6.ª e 15.ª), dado que o Protocolo só existe porque existe o Contrato de Concessão, nos termos do qual a A. exerce em contitularidade com as restantes duas Concessionárias o direito de utilização privativa do Terminal.
(…)
vi.Do Protocolo resulta que as partes estabeleceram uma condição resolutiva no sentido de o Protocolo, e a obrigação de pagamento do montante indemnizatório anual nele previsto, se extinguir com a extinção da utilização do Terminal pela R. nos termos e para o fim previsto no Contrato de Concessão, existindo uma união de contratos com dependência unilateral do primeiro em relação ao segundo.
vii.Dos factos provados no autos retira-se que, em 2014, a R. nunca utilizou o Terminal de Carga de Praias de Setúbal nos termos e para o fim previstos no Protocolo e no Contrato de Concessão – em particular, no caso da Enegia …, a movimentação de granéis líquidos exclusivamente provenientes ou com destino à Central Termoeléctrica de Setúbal –, dado terem ocorrido factos, que não lhe são imputáveis, que tornaram dispensável a utilização do Terminal pela R. (cfr. pontos 3 a 7, 10 e 20 a 22 da decisão da matéria de facto).
viii.A cessação da utilização do Terminal foi comunicada pela R. à A. por carta datada de 16 de Janeiro de 2013 e confirmada novamente em 24 de Abril de 2013, não tendo sido, em qualquer destas ocasiões, contestada pela A.
ix.Pelo que se deve entender que a condição resolutiva implícita no acordo das partes – a cessação da utilização do Terminal pela R. em Abril de 2013 – operou ipso facto em Abril de 2013, extinguindo-se os efeitos do Protocolo nessa data. e, em qualquer caso, inexistindo qualquer obrigação de pagamento da R. relativa ao ano de 2014.
(…)
A autora, apresentou, em 20.05.2016, resposta ao recurso subordinado, defendendo que o mesmo carece de fundamento, devendo ser julgado integralmente improcedente,

Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

II.ÂMBITO DO RECURSO DE APELAÇÃO.

Importa ter em consideração que, de acordo com o disposto no artigo 635º, nº 4 do Código de Processo Civil, é pelas conclusões da alegação das recorrentes (recurso principal e subordinado) que se define o objecto e se delimita o âmbito dos recursos, sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto dos recursos.

Assim, e face ao teor das conclusões formuladas a solução a alcançar pressupõe a análise das seguintes questões, sendo certo que atenta a interligação do seu objecto, apreciar-se-ão, conjuntamente, ambas as apelações.

i)DA NULIDADE DA SENTENÇA AO ABRIGO DO DISPOSTO NA ALÍNEA C) DO N.º 1 DO ARTIGO 615.º DO CPC  (RECURSO PRINCIPAL DA AUTORA)

ii)DA EXISTÊNCIA NOS AUTOS DE TODOS OS ELEMENTOS INDISPENSÁVEIS À PROLAÇÃO DE UMA DECISÃO CONSCIENCIOSA E QUE PERMITIA AO TRIBUNAL DECIDIR DE MÉRITO NO DESPACHO SANEADOR COM A NECESSÁRIA SEGURANÇA;
(RECURSO PRINCIPAL DA AUTORA)

iii)DA NECESSIDADE DE AMPLIAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO DADA COMO PROVADA;
(RECURSO SUBORDINADO DA RÉ)

iv)DA VERIFICAÇÃO DE ERRO DE JULGAMENTO NA SUBSUNÇÃO JURÍDICA ADUZIDA, TENDO EM CONSIDERAÇÃO OS FACTOS APURADOS.
                                     (RECURSO PRINCIPAL E SUBORDINADO)
O que implica a análise:    
a)DO CONTRATO DE CONCESSÃO E DO ACORDO CELEBRADOS ENTRE AUTORA E RÉ, DENOMINADO DE “PROTOCOLO” E A SUA RESPECTIVA INTERLIGAÇÃO. A UNIÃO OU COLIGAÇAO DE CONTRATOS.

b)DA CADUCIDADE DO CONTRATO DE CONCESSÃO E AS RESPECTIVAS REPERCUSSÕES NO ACORDO FORMALIZADO ENTRE AS PARTES, DESIGNADO POR “PROTOCOLO”

III.-FUNDAMENTAÇÃO.

A–
FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO.

Foi dado como provado na sentença recorrida, o seguinte:
1.A A, é concessionária e exploradora do complexo mineiro designado por “Minas …., sucedendo nos direitos e nas obrigações desta sociedade.
2.A R também alterou a sua firma e nome, passando actualmente a designar-se por Energia…...
3.Em 15/01/1996 foi celebrado um “Contrato de Concessão de Direito de Uso Privativo de um Terminal Marítimo” Integrado no Domínio Público de Estado afecto à Administração dos Portos de Setúbal e de Sesimbra, situado na margem direita do Rio Sado, na Cachaforra, Freguesia de S. Sebastião, Concelho e Distrito de Setúbal, entre a Administração dos Portos de Setúbal e Sesimbra – APSS -, na qualidade de Concedente e a A a R  e a sociedade Somin….., estas na qualidade de Concessionárias.
4.Nos termos citado contrato “…é conferido às CONCESSIONARIAS, em contitularidade, o direito de uso privativo do terminal portuário identificado na cláusula quarta, doravante TERMINAL, integrado no domínio público do Estado afecto à CONCEDENTE.” Cfr. Cl. 1ª .
5.O contrato estabelece e regula nas suas cláusulas, entre outras coisas, o fim da concessão (Cls. 2ª), o conteúdo do direito de uso privativo (Cls. 3ª), localização e descrição do terminal (Cls. 4ª e 5ª), as taxas a pagar pelas concessionarias, actualização e formas de pagamento (Cls. 13ª), modificação (Cls. 21º), reversão (Cls. 22ª), rescisão e caducidade do contrato (Cls. 23ª) e efeitos do contrato (Cls. 24ª).

6.Dispõem as cláusulas 3ª, 13ª, 22ª e 23ª:
“…3ª (Conteúdo do direito de uso privativo)
«O direito que constitui objecto da presente concessão inclui os poderes de construção previstos no…
13ª (Taxas a pagar pelas CONCESSIONÁRIAS, actualização e formas de pagamento)
1.Pelo uso privativo do TERMINAL as CONCESSIONARIAS pagarão anualmente à CONCEDENTE, a partir da data da celebração do presente contrato, uma taxa de uso privativo calculada nos seguintes termos:
1.1. Um parte fixa…
1.2. Uma parte variável…
… 3. Actualização da taxa a que se refere o nº 1 ocorrerá em um de Janeiro de cada ano …
…4. Os pagamentos referidos na presente cláusula serão efectuados (…) no prazo de trinta dias contados a partir da emissão das respectivas facturas”
…19ª (Prazo da Concessão)
…A concessão é outorgada pelo prazo de 30 (trinta) anos a contar do dia um de janeiro de mil novecentos e noventa e seis…
…22ª (Reversão)
1.Decorrido o prazo de concessão, o TERMINAL concedido, … reverterão gratuitamente para a CONCEDENTE …
2.A concedente entrará na posse dos bens a que se refere o número anterior, sem dependência de qualquer formalidade que não seja uma vistoria ad perpetum rei memorium, para a qual serão convocados os representantes das concessionárias.
3.Do auto de vistoria constará o inventário do TERMINAL, as obras, os edifícios e as instalações fixas afectos à concessão, assim como a descrição do seu estado de conservação e da respectiva aptidão para o desempenho da sua função. …
…23º (Rescisão e caducidade do contrato)
…9.Se, por alterações estratégicas ou tecnológicas qualquer das CONCESSIONÁRIAS justificar a desnecessidade da utilização do TERMINAL, operar-se-á a caducidade do contrato em relação a ela, aplicando-se a situação prevista para a reversão, devendo a concessionária interessada notificar a CONCEDENTE com a antecedência mínima de um ano”.

7.Por outro lado, a A e a R, em 28/11/1996, celebraram um Protocolo que, em sede de considerandos, se fez constar:
“…f) Aceitando as razões invocadas pela Somin…. e pela Energia …. a Minas …. desistiu expressamente, junto da APSS do seu exclusivo de exploração do terminal, retirou requerimento de convolação da licença de usos privativo em concessão de serviço público e movimentação de cargas e, conjuntamente com a Somin….. e Energia ……, requereu em 28 de Junho de 1995, a atribuição de uma licença de uso privativo em contitularidade das três sociedades, a qual será substituída, logo que possível, por um contrato de concessão de uso privativo, igualmente em contitularidade;
… g)Na mesma data, SOMIN….. e Energia …. – reconhecendo que a Minas…. havia construído e dotado em equipamento o terminal a expensas suas, e que a mesma sofreria prejuízos decorrentes da sua renuncia à qualidade de única titular de licença de uso privativo de que, à época, estava investida, bem como da renuncia à expectativa legitima de vir a celebrar com a APSS o contrato de concessão de serviço publico mencionado em c)–concordam em ressarcir Minas …. desses prejuízos, pagando-lhe um montante indemnizatório anual;
“… h)E, considerando, finalmente, que na sequência do requerimento referido em f), a APSS veio a outorgar, com efeitos a partir de 1 de Janeiro de 1996, um contrato de concessão de uso privativo do TCPS, em contitularidade com a Minas… , SOMIN…. e Energia …..”.
8.Nos termos da cl. 1ª do Protocolo identificado no ponto anterior:
«1. A título de indemnização pelos prejuízos sofridos por Minas…. em resultado da renúncia à situação de titular exclusivo da licença de uso privativo n.º 1/96 do TCPS, bem como da renúncia à legítima expetativa de vir a celebrar com a APSS, por convolação da licença, um contrato de serviço público de movimentação de cargas no TCPS, o qual se encontrava negociado e apenas pendente de assinatura e do exercício do qual decorreria uma atividade comercial lucrativa para a Minas…. a Energia …., enquanto for utilizadora do TCPS, pagará anualmente à Minas ….. um montante destinado a ressarci-la dos prejuízos sofridos com a perda dos seus direitos exclusivos sobre o terminal.
2.A indemnização não está sujeita a qualquer actualização ou indexação e o seu montante é de Esc: 54.710.000$00, por ano…
3.As partes podem convencionar que o pagamento da indemnização seja distribuído em duodécimos definindo, neste caso, os respectivos procedimentos”.
9.O pagamento do valor da indemnização, até ao ano de 2013, foi sempre cumprido pela R.
10.A R, por carta enviada à A, em 16/01/2013, cujo assunto: “Contrato de Concessão de Uso Privativo do Terminal Marítimo”, informa a A que: “… nesta mesma data foi enviada à APSS, no âmbito do contrato de Concessão de Uso Privativo do Terminal Marítimo, informando esta entidade sobre a cessação de actividade da Central Termoeléctrica de Setúbal e notificando sobre a caducidade do aludido contrato em relação à Energia…...”.
11.Encontrava-se anexa a esta carta cópia da carta enviada à APSS na mesma data sobre o assunto: “Notificação para efeitos do disposto na cláusula 23ª, nº 9 do Contrato de Concessão de Uso Privativo do Terminal Marítimo integrado no Domínio Publico do Estado afecto à Administração dos Portos de Setúbal e Sesimbra, situado na margem direita do rio Sado, na Cachafarra, Freguesia de S. Sebastião, Concelho e Distrito de Setúbal”, onde se lê o seguinte:
«…a Central Termoeléctrica de Setúbal cessou em definitivo a atividade de produção de energia eléctrica a partir das 00h00 do dia 7 de janeiro de 2013
… Neste contexto, entendemos que, no que diz respeito à Energia…..., se verificam todos os pressupostos de aplicação do disposto na Clausula nº 23ª, nº 9 do Contrato de Concessão de Uso Privativo relativo ao Terminal Portuário pelo que notificamos V. Exa. para os efeitos ali previstos, devendo, em consequência, a caducidade do aludido contrato operar os seus efeitos em relação à Energia……. no prazo de um ano a contar da recepção desta carta …”.
12.A carta referida no ponto 10 foi recepcionada pela A no dia 21/01/2013.
13.Por carta de 11/02/2014, a A. comunicou à R. que: «Não obstante a V. comunicação à Administração dos Portos de Setúbal e Sesimbra (APSS), datada de 16 de janeiro de 2013, com a denúncia do contrato de Concessão mencionado em Assunto, celebrado em 15 de janeiro de 1996, da qual gentilmente nos deram conhecimento na mesma data, ainda não nos foi comunicado que tal denúncia tenha operado, pelo que na presente data entendemos que se manterá a utilização do TCPS por V. Exas.
Na verdade a única informação que nos foi prestada pela APSS é a de que o processo de homologação do Auto de Vistoria realizada nos termos do artigo 36.º do Decreto-Lei n.º 226-A/2007, de 31 de maio, pela Comissão Técnica ainda se encontra por concluir e que, por isso, a APSS ainda não tomou posse administrativa dos bens para si revertíveis com a saída de V. Exas. da Concessão……ao abrigo da Cláusula 1ª do Protocolo…somos a informar que oportunamente vos será remetida a fatura respeitante à indemnização compensatória respeitante ao ano de 2014» (15º p.i./24º a 26º, 51º, 76º cont).
14.A esta carta respondeu a R. através da carta de 24/03/2014 reiterando que o Contrato de Concessão se extinguiu por caducidade nos termos contratualmente previstos em 18/01/2014, sem dependência de qualquer outra formalidade, designadamente homologação do auto de vistoria, e que não havia qualquer fundamento para emissão de fatura respeitante à indemnização compensatória correspondente ao ano de 2014.
15.Nesta carta a R. refere, corrigindo a A, no sentido de que não denunciou o contrato, mas sim “antes declarou a respectiva caducidade”.
16.Em 30/07/2014 a A enviou à R uma carta em que exigia novamente o pagamento do montante relativo à indemnização compensatória respeitante a 2014, carta essa que capeava a factura 1600000155, no valor de € 272.892.32 mais IVA, relativamente à indemnização compensatória de 2014.
17.Nessa carta a A fundamenta a manutenção dos efeitos do contrato para o ano de 2014, uma vez que a 01/01/2014 o contrato de concessão e o protocolo se mantinham e em consequência o seu bom cumprimento o impunha o pagamento da indemnização.
18.A esta carta respondeu a R. através de carta de 27/08/2014 reiterando a sua posição e devolvendo a fatura em questão.
19.A concedente recebeu a carta datada de 16/01/2013 no dia 18/01/2013.
20.A concedente não pôs em causa a caducidade do contrato de concessão, nem questionou os fundamentos para o efeito invocados na aludida carta de 16/01/2013.
21.Nessa altura a A não pôs em causa ou contestou os factos e fundamentos invocados na carta datada de 16/01/2013.
22.Nessa altura a A não questionou que, de acordo com o teor de tal carta, a R. tivesse deixado de utilizar o Terminal.
23.Foi efectuado, em 24/04/2013, um auto de vistoria tendo em vista o exame dos bens da Energia …..  afetos à concessão, para avaliação do estado de conservação e da respectiva aptidão para o desempenho da sua função, que contou com a presença de representantes de todas as partes no Contrato de Concessão, incluindo um representante da A, embora a acta elaborada pela APSS não tenha chegado a ser assinada pelos mesmos.
24.Em 15/10/2013, foi realizada uma vistoria ad perpetuam rei memoriam no Terminal Portuário das Praias do Sado por uma comissão técnica composta por representantes da concedente, da Direção-Geral de Energia e Geologia e da Agência Portuguesa do Ambiente, bem como por representantes da R, e subscrita por todos eles, tendo ficado, naquele momento, pendente de homologação pelo Presidente da APSS, S.A., pelo Presidente da APA e pelo Diretor-Geral da Energia e Geologia.
25.Por carta da APSS, S.A. de 28/03/2014 foi a R. notificada da homologação da proposta de vistoria ad perpetuam rei memoriam de janeiro de 2014, nos termos do artigo 36.º do Decreto-Lei n.º 226-A/2007, de 31 de maio, tendo sido considerado adequado o prazo de três meses, a contar da receção da notificação em causa, para o desmantelamento e remoção dos bens indicados no auto de vistoria.

B-FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

i.DA NULIDADE DA SENTENÇA AO ABRIGO DO DISPOSTO NA ALÍNEA C) DO N.º 1 DO ARTIGO 615.º DO CPC

A sentença, como acto jurisdicional, pode atentar contra as regras próprias da sua elaboração e estruturação ou contra o conteúdo e limites do poder à sombra da qual é decretada, e então torna-se passível de nulidade, nos termos do artigo 615º, nº 1 do novo Código de Processo Civil.

A este respeito, estipula-se no apontado normativo, sob a epígrafe de “Causas de nulidade da sentença”, aplicável aos despachos ex vi do artigo 613º nº 3  do mesmo diploma que:
“1 - É nula a sentença:
a) Quando não contenha a assinatura do juiz;
b) Quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
c) Quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível.
d) Quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;
e) Quando condene em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido.....”

O apelante imputa à sentença a nulidade decorrente da alínea c) do citado normativo, por contradição entre os factos provados e a decisão, reconduzindo-se tal nulidade a um vício de conteúdo, na enumeração de J. CASTRO MENDES, Direito Processual Civil, II vol., 793 a 811, ou seja, vício que enferma a própria decisão judicial em si, nos fundamentos, na decisão, ou nos raciocínios lógicos que os ligam.

No que concerne ao aludido vício, doutrina e jurisprudência têm entendido que essa nulidade ocorre quando os fundamentos invocados deveriam conduzir, num processo lógico, à solução oposta da que foi adoptada naquela.
           
Esta nulidade – oposição entre os fundamentos e a decisão – só se verifica quando os fundamentos, quer de facto quer de direito, invocados pelo juiz devam, logicamente, conduzir ao resultado oposto ao que é expresso na sentença.

A contradição entre os fundamentos e a decisão a que se refere o citado normativo é uma contradição de ordem formal, que se refere aos fundamentos estabelecidos e utilizados na sentença, e não aos que resultam do processo.

E, tal nulidade traduzida na desconformidade entre a decisão e o direito aplicável - substantivo ou adjectivo – não se confunde com o erro de julgamento, ou seja, na subsunção dos factos à norma jurídica ou, muito menos, com o erro na interpretação desta.

É que, quando o juiz entende que dos factos apurados resulta determinada consequência jurídica e este seu entendimento é expresso na fundamentação, ou dela decorre, poderemos, sim, estar perante um erro de julgamento. Nesse caso, o juiz fundamenta a decisão, mas decide mal. Resolve as questões colocadas num certo sentido porque interpretou e/ou aplicou mal o direito - LEBRE DE FREITAS, CPC Anotado, vol. 2.º, pág. 670.

Na sentença recorrida, o tribunal a quo, tendo em consideração os factos alegados e que resultaram provados, aplicou o direito que julgou adequado e pertinente ao caso em apreciação, não se vislumbrando qualquer contradição entre os fundamentos e a decisão que, de resto, tão pouco a apelante a concretiza no corpo das alegações, apenas invocando, nas respectivas conclusões, que (…) a interpretação que a sentença recorrida faz que a obrigação se tornou exigível com a interpelação deixaria e aberto uma insuportável contradição na ordem jurídica.

Ora, como é sabido, situação diversa da nulidade da sentença é a de saber se houve erro de julgamento, pois como se refere no Ac. do STJ de 21.05.2009 (Pº 692-A/2001.S1), acessível no supra citado sítio da Internet Se a questão é abordada mas existe uma divergência entre o afirmado e a verdade jurídica ou fáctica, há erro de julgamento, não “errore in procedendo”.

O alegado vício de conteúdo a que se refere o artigo 615º, n.º 1, alínea c) do Código do Processo Civil, não se verifica, por conseguinte, na sentença recorrida, pelo que improcede o que a tal respeito consta das conclusões da apelante.
                   
Importa, então, apurar se há erro de julgamento, o que implica a análise das concretas questões suscitadas no recurso.

ii.DA EXISTÊNCIA NOS AUTOS DE TODOS OS ELEMENTOS INDISPENSÁVEIS À PROLAÇÃO DE UMA DECISÃO CONSCIENCIOSA E QUE PERMITIA AO TRIBUNAL DECIDIR DE MÉRITO NO DESPACHO SANEADOR COM A NECESSÁRIA SEGURANÇA E DA NECESSIDADE DE ADITAMENTO DE NOVOS FACTOS À MATÉRIA DADA COMO PROVADA.

Como é sabido, o julgamento de mérito ou de fundo no despacho saneador só pode ocorrer quando o processo fornece já os elementos suficientes para que o litígio em causa possa ser decidido com segurança, ou seja, quando não existe prova a produzir quanto a factos essenciais para a decisão da causa.
Conforme resulta da formulação legal do artigo 595.º, n.º 1 alínea b), do CPC, o despacho saneador destina-se a conhecer imediatamente do mérito da causa, sempre que o estado do processo permitir, sem necessidade de mais provas, a apreciação, total ou parcial, do ou dos pedidos deduzidos ou de alguma exceção perentória.

No caso vertente, a Exma. Juíza do Tribunal a quo, aquando da realização da audiência prévia entendeu que os autos continham os elementos suficientes para conhecer de imediato do mérito da causa, desse facto tendo dado conhecimento aos mandatários das partes, que a tal de não opuseram e nessa audiência proferiram alegações orais, de facto e de direito e, em momento ulterior proferiu decisão, reafirmando que o processo continha todos os elementos que permitiam o imediato conhecimento do mérito, julgou a acção parcialmente procedente.
 
A aporia assenta, portanto, em apurar se o estado do processo permite decidir do mérito da causa, sem necessidade de mais provas para além das já processualmente adquiridas.

No caso vertente, invoca a apelante, no recurso principal (conclusões xx. a xxii.) que:
-Se a Mma Juiz a quo pretendia concluir que a simples comunicação de desinteresse na utilização da “concessão” permitiu no imediato e em acto contínuo o gozo da plenitude por parte da Recorrente dos direitos exclusivos, então teria obrigatoriamente de fazer prova em sede de julgamento, o que entendeu não fazer, é que não só não foi feita prova como tal não aconteceu na prática. Assim e por isso também a sentença não poderia por um lado tirar uma conclusão que não integrava o que foi contratado, e por outro uma conclusão que para se obter exigia produção de prova em sede de julgamento.
-A douta sentença interpretou mal os elementos constantes dos autos e retirou conclusões decidindo sobre factos que só poderiam ser conhecidos em sede de prova testemunhal e com realização da audiência de julgamento.
-Preteriu a Mma Juiz a quo a produção de prova essencial para poder concluir que “após a data de 18/01/2014 não se pode, de modo algum, falar de utilização em sentido próprio. “
-Na verdade, após 18/01/2015 a Recorrente manteve os “prejuízos sofridos com a perda dos seus direitos exclusivos sobre o terminal” e por isso a sentença teria de concluir em sentido contrário ao que concluiu, razão que legitima o presente recurso no interesse de uma decisão justa e correcta e em abono da defesa do Direito.

Ora, o que a apelante alega nada tem a ver com a circunstância dos autos não conterem todos os elementos necessários para conhecer de imediato no mérito da causa, nos termos do nº 1, alínea b) do CPC, posto que se entende que, na verdade, toda a prova documental constante dos autos é suficiente para a prolação de uma profícua e conscienciosa decisão sobre o mérito da causa, sem necessidade de mais provas.

As considerações aduzidas pelo julgador de 1ª instância é que podem não se encontrar consubstanciadas nos factos apurados e resultantes da prova documental constante do processo, pelo que o acerto ou desacerto da decisão recorrida será questão a analisar em momento subsequente.

Já quanto a alegação da ré, no recurso subordinado, (conclusões v. e vi.) de que se deverá dar como provada a factualidade que na decisão de facto inserta na sentença recorrida foi considerada não provada (artigos 3º, 23º e 50º da contestação), mas irrelevantes para a decisão da causa, sempre se dirá que tal factualidade resultará necessariamente dos factos constantes dos nºs 22. a 25. da Fundamentação de Facto, como a própria ré/apelante, aliás, conclui, razão pela qual se torna inútil o aditamento de novos factos, sendo certo que a sua relevância ou irrelevância será questão a apreciar subsequentemente.

Assim sendo, improcede o que, em adverso consta das conclusões do recurso principal e subordinado (conclusões xx. a xxii. do recurso principal da autora e conclusões v. e vi. do recurso subordinado da ré).

iii.DA VERIFICAÇÃO DE ERRO DE JULGAMENTO NA SUBSUNÇÃO JURÍDICA ADUZIDA, TENDO EM CONSIDERAÇÃO OS FACTOS APURADOS.

a)DO CONTRATO DE CONCESSÃO E DO ACORDO CELEBRADOS ENTRE AUTORA E RÉ, DENOMINADO DE “PROTOCOLO” E A SUA RESPECTIVA INTERLIGAÇÃO. A UNIÃO OU COLIGAÇAO DE CONTRATOS.

b)DA CADUCIDADE DO CONTRATO DE CONCESSÃO E AS RESPECTIVAS REPERCUSSÕES NO ACORDO FORMALIZADO ENTRE AS PARTES, DESIGNADO POR “PROTOCOLO”

Como é sabido, a doutrina civilista distingue o contrato misto da coligação ou união de contratos, também chamada coligação de contratos – cfr. a este propósito VAZ SERRA, BMJ 91, 11 e segs, ANTUNES VARELA, Das Obrigações Em Geral, 3ª ed., 231-234, ALMEIDA COSTA, Direito das Obrigações, 8ª ed., 331-338.

No contrato misto, há uma unidade contratual, um só negócio jurídico, cujos elementos essenciais respeitam a tipos contratuais distintos.

Na união ou coligação de contratos, ao contrário do contrato misto, existe uma pluralidade de contratos, os quais se mantêm diferenciados, conservando cada um a sua individualidade.

Pese embora as diversas nomenclaturas utilizadas pela doutrina, a união de contratos pode agrupar-se em três categorias fundamentais: união extrínseca; união alternativa; união com dependência, também designada união interna – cfr. INOCÊNCIO GALVÃO TELLES, Manual dos Contratos em Geral, Refundido e Actualizado, Coimbra Editora, 476 e PEDRO PAIS DE VASCONCELOS, Contratos Atípicos, Colecção Teses, Almedina, 215-219.

Na união extrínseca, o único factor de ligação reside na circunstância de se celebrarem na mesma ocasião, constando por exemplo do mesmo escrito.

Na união alternativa, são celebrados dois contratos, em termos tais que, conforme ocorra ou não certo evento, assim se considerará celebrado apenas um deles.

Na união com dependência, há entre os contratos um vínculo traduzido no facto de a validade e vigência de um contrato depender da validade e vigência do outro.

Ocorre na união com dependência uma inseparável ou inextrincável relação de sujeição e de existência jurídica entre dois vínculos contratuais, sendo que o vínculo contratual principal determina a celebração e a vigência de um outro que não existiria se o primeiro não ganhasse existência jurídica.

Assim, o contrato dependente só se desencadeia ou emerge porque existe um contrato principal ou dominante que lhe propicia e determina a vigência. O contrato dependente acompanha e segue o contrato dominante pelo que, deixando de subsistir o contrato-causa não existem razões para que o contrato-efeito ou dominado se mantenha.

No caso vertente, está demonstrado nos autos e não sofre qualquer contestação, que autora e ré foram intervenientes, em 15.01.1996, num contrato, designado por Contrato de concessão de Direito de Uso Privativo de um Terminal Marítimo integrado no Domínio Público do Estado afecto à Administração dos Portos de Setúbal e de Sesimbra, situado na margem direita do Rio Sado, na Cachaforra, Freguesia de S. Sebastião, Concelho e Distrito de Setúbal, nos termos do qual a Administração dos Portos de Setúbal e Sesimbra (APSS), na qualidade de Concedente, outorgou, designadamente a autora e ré, na qualidade de cessionárias, a concessão, em regime de contitularidade, do direito de uso privativo do aludido terminal portuário, tendo por finalidade a movimentação de cargas, exclusivamente provenientes ou com destino aos estabelecimentos industriais das concessionárias e que se enquadrem no exercício normal das suas actividades industriais – Nºs 3 a 5 da Fundamentação de Facto.

Tal contrato de concessão foi outorgado pelo prazo de 30 anos a contar do dia 1 de Janeiro de 1996, nele se estabelecendo, designadamente, as taxas a pagar pelas concessionárias, a respectiva actualização, as formas de pagamento, a reversão decorrido o prazo de concessão, bem como as condições em que se poderá verificar a rescisão do contrato, por parte da concedente, bem como a caducidade do contrato, no caso de falência de qualquer das concessionárias e ainda na circunstância de qualquer das concessionárias, por motivo da alterações estratégias ou tecnológicas justificar a desnecessidade da utilização do terminal portuário em causa. Prevê o contrato neste caso que se operará a caducidade do contrato em relação a essa concessionária, aplicando-se a situação prevista para a reversão, devendo a concessionária interessada notificar a concedente com a antecedência mínima de um ano – v. Nº  6        da Fundamentação de Facto.

Posteriormente à outorga desse contrato de concessão, autora e ré subscreveram um acordo, em 28.11.1996, que intitularam de “Protocolo”, nos termos do qual, designadamente, a ré reconheceu que a autora havia construído e dotado em equipamento o terminal a expensas suas, e que a mesma sofreria prejuízos decorrentes da sua renúncia à qualidade de única titular de licença de uso privativo de que, à época, estava investida, bem como da renúncia à expectativa legitima de vir a celebrar com a APSS o contrato de concessão de serviço público mencionado em c) – concordou em ressarcir a autora desses prejuízos, pagando-lhe um montante indemnizatório anual (considerando g) do aludido Protocolo) - v. Nº  7  da Fundamentação de Facto.

E, decorre da clausula 1ª do aludido Protocolo que, a título de indemnização pelos prejuízos sofridos pela autora, em resultado da aludida renúncia à situação de titular exclusiva da licença de uso privativo nº 1/96 do TCPS (Terminal de carga de Praias do Sado), bem como da renúncia à legítima expectativa de vir a celebrar com a APSS, por convolação da licença, um contrato de concessão de serviço público de movimentação de cargas no TCPS, o qual se encontrava negociado e apenas pendente de assinatura e do exercício do qual decorria a actividade lucrativa para a autora, a ré (“Energia …., enquanto for utilizadora do TCPS”) pagará anualmente à autora um montante destinado a ressarci-la dos prejuízos sofridos com a perda dos seus direitos exclusivos sobre o terminal. E, o montante indemnizatório anual foi estabelecido no número 2 da cláusula 1ª, prevendo o nº 3 da aludida cláusula a possibilidade de as partes convencionarem que o pagamento da indemnização fosse dividido em duodécimos, definindo neste caso os respectivos procedimentos - v. Nº  8  da Fundamentação de Facto.

Dúvidas não há que em causa está a existência de uma situação configuradora de uma coligação de contratos. Afastada, de forma liminar, a hipótese de se tratar de uma união alternativa ou extrínseca, estar-se-á, indubitavelmente, perante uma união com dependência, dada a conexão interna e inextrincável que existe entre o contrato de concessão e o contrato que as partes designaram por “Protocolo”.

Ora, provado igualmente ficou que a ré, ao abrigo do clausulado no Contrato de Concessão, remeteu à Concedente, carta datada de 16.01.2013, invocando a verificação dos pressupostos insertos no nº 9 da cláusula 23ª e notificando-a para os efeitos ali previstos, devendo, em consequência, a caducidade do contrato operar os seus efeito em relação à ré, no prazo de um ano a contar da recepção da carta, recepção essa que ocorreu em 18.01.2013 - v. Nº  10, 11 e 19 da Fundamentação de Facto.

Na mesma data – 16.01.2013 - a ré remeteu também à autora uma carta, que esta recepcionou em 21.01.2013, dando-lhe conhecimento da notificação efectuada à Concedente sobre a caducidade do contrato de concessão, remetendo cópia da aludida missiva - v. Nº 10 a 12 da Fundamentação de Facto.

Sobre a referida comunicação, a autora veio a responder apenas por carta de 11.02.2014, aludindo à denúncia do contrato de concessão, efectuada pela ré e ao facto da concedente ainda não ter tomado posse administrativa dos bens para ela revertíveis, com a saída da ré da concessão. Mais informando a ré de que iria ser remetida a factura respeitante à indemnização compensatória do ano de 2014, factura essa que a autora remeteu à ré, conjuntamente com a carta datada de 30.07.2014, na qual exigia o pagamento do montante constante da factura - v. Nº 13 e 16 da Fundamentação de Facto.

Foi entretanto trocada correspondência entre autora e ré, no sentido da manutenção dos respectivos entendimentos. A ré afirmando, por um lado, não ter denunciado o contrato, antes declarado a respectiva caducidade, procedendo a devolução da factura;  a autora, por outro lado, fundamentando a manutenção do contrato para o ano de 2014, uma vez que a 01.01.2014, o contrato de concessão e o protocolo se mantinham, o que impunha o pagamento da indemnização - v. Nº 14, 15, 17 e 18  da Fundamentação de Facto – antagonismo que se manteve ao longo do processo e permanece nos recursos interpostos.

A caducidade de um contrato consiste na sua extinção em virtude da ocorrência de um facto jurídico stricto sensu e não de um negócio jurídico ou sequer de um acto jurídico – v. LUÍS MANUEL TELES DE MENEZES LEITÃO, Direito das Obrigações, Vol II, 9ª edição, 104 e ANTUNES VARELA, Das Obrigações em Geral, II, 273 e ss.

A caducidade é de verificação automática, resulta imediatamente do facto jurídico stricto sensu que a desencadeia. E, sendo um meio de extinção ex nunc, os efeitos decorrentes desta forma de extinção de um negócio jurídico são, em regra, apenas para o futuro. Não tem, em princípio, eficácia retroactiva apenas determinando a extinção do negócio jurídico para o futuro, exceptuando-se a caducidade resultante da verificação de uma condição resolutiva, a qual é normalmente de eficácia retroactiva (art. 276º). Nos outros casos, a extinção da relação apenas ocorrerá para o futuro, podendo no entanto, as partes salvo quando a lei o vede, estipular eficácia retroactiva da caducidade, nos termos do artigo 330º, nº 1 do CC.

E, verificado o facto convencionalmente previsto como susceptível de ser fundamento da caducidade, a mesma surge e opera, dependendo de simples constatação desse evento impeditivo da eficácia do negócio jurídico em causa.

Face à factualidade apurada, é manifesto que a ré, ao abrigo norma contratualizada (Cláusula 23º, nº 9) que previa a possibilidade de por termo ao contrato de concessão, justificando a desnecessidade da utilização do Terminal, devido a alterações estratégicas ou tecnológicas – in casu a cessação em definitivo da actividade de produção de energia da Central Termoeléctrica de Setúbal, a partir das 00h00 do dia 7.01.2013 - fez operar a caducidade do contrato, com efeitos no prazo de um ano a contar da recepção da carta datada de 14.01.2013, dirigida à Concedente, dando disso conhecimento à co-concessionária e outorgante no Protocolo subscrito por autora e ré, não tendo, nem a concedente colocado em causa a caducidade do contrato ou contestado a fundamentação apresentada pela ré, nem a autora, nessa data, e de acordo com o teor da missiva, questionou o invocado fundamento ou questionou que a ré tivesse deixado de utilizar o Terminal - v. Nº 10, 11, 20 a 22  da Fundamentação de Facto.

Operada a caducidade do contrato de concessão, por carta datada de 14.01.2013, e tratando-se de uma declaração receptícia que tem destinatário e que, nos termos do artigo 224º do CC, só se torna eficaz logo que chegue ao declaratário ou dele seja conhecida, o que, in casu, ocorreu em 18.01.2013, quando recebida a carta pela Concedente, com efeitos a 18.01.2014 - v. Nº 19 da Fundamentação de Facto.

E, uma vez que no contrato as partes nele outorgantes não estipularam a eficácia retroactiva da caducidade, a extinção da relação contratual apenas ocorrerá para o futuro.

Nos termos do nº 9 da cláusula contratual aqui em apreciação que estabelece uma forma específica de operar a caducidade do contrato, prevê-se para além do prazo de antecedência mínima para o efeito, que terá aplicação a situação prevista para a reversão.

Da conjugação da cláusula 22ª sob a epígrafe “reversão” e da citada cláusula 23ª, nº 9, há que concluir que operada a caducidade com efeitos a 18.01.2014, as obras executadas no Terminal alvo de concessão e as instalações fixas, que sejam propriedade da concessionária que fez operar a caducidade, reverterão gratuitamente para a Concedente, entrando esta na posse desses bens, sem dependência de qualquer formalidade que não seja uma vistoria ad perpetum rei memorium para a qual serão convocados os representantes da concessionária - v. Nº 6 da Fundamentação de Facto.

E assim sucedeu, posto que, em 24.04.2013, teve lugar uma vistoria, tendo como objecto o exame dos bens da ré afectos à concessão, onde esteve presente um representante da autora e, em 15.10.2013, foi finalmente realizada uma vistoria ad perpetuam rei memoriam, por uma comissão técnica, tendo participado um representante da ré, vistoria essa que foi homologada nos termos do artigo 36º do Decreto-Lei nº 226-A/2007, de 31 de Maio e da qual foi dado conhecimento à ré, por carta endereçada pela Concedente, datada de 28.03.2014, dando um prazo de três meses para a ré proceder ao desmantelamento e remoção dos bens indicados no auto de vistoria - v. Nº 6 da Fundamentação de Facto.

Entendendo-se, como se entende, que com a declaração da caducidade do contrato de concessão desencadeada pela ré e que se tornou eficaz com o recebimento da carta datada de 14.01.2013, os mecanismos legalmente estabelecidos no artigo 36º do Decreto-Lei nº 226-A/2007, de 31 de Maio e que foram igualmente previstos no contrato, não têm qualquer repercussão na operada caducidade que, como acima se afirmou, fez extinguir o contrato de concessão, com relação à ré, em 18.01.2014, sendo que o eventual atraso na conclusão de tais exigências legais não poderão ser imputáveis à ré.

Acresce que, sendo o contrato de concessão o contrato principal e, o contrato denominado “Protocolo”, o contrato dependente, forçoso é concluir que a extinção do primeiro, em 18.01.2014, acarretou, inevitavelmente a extinção do segundo.

Mas, entende a autora/apelante, em suma, que a produção dos efeitos do contrato designado por “Protocolo” se renovava anualmente – no dia 1 de Janeiro de cada ano – e que a obrigação da ré de pagar o estabelecido valor anual indemnizatório referente ao ano de 2014 se venceu em 01.01.2014, discordando da sentença recorrida que invocou não constar do “Protocolo” qualquer prazo no que concerne ao pagamento da mencionada indemnização – como efectivamente não consta – e que, por isso, considerou aplicável a regra subsidiária do artigo 777º, nº 1 do C.C.

Não assiste, todavia, razão à autora/apelante, visto que extinto que se encontra o contrato celebrado entre autora e ré, designado por “Protocolo”, por virtude da caducidade do contrato de concessão, não se pode considerar que a ré estivesse vinculada a pagar a contraprestação acordada para além da vigência do contrato.

Ademais, tendo a autora conhecimento de que a ré fez operar a caducidade do contrato de concessão no início do ano de 2013, com efeitos a 2014, não tendo sido colocado em causa o facto convencionalmente previsto como susceptível de ser fundamento da caducidade, pretender que a ré procedesse ao pagamento da totalidade da indemnização prevista para todo o ano de 2014, quando o contrato designado por “Protocolo” se extinguiu com a cessação do contrato principal, em 18.01.2014, seria até atentatório do dever de agir de boa fé na execução dos contratos, dever esse que constitui um verdadeiro dever jurídico.

Concorda-se, por conseguinte, com a sentença recorrida, quando ali se determina que a ré está obrigada a pagar à autora a quantia de € 13.457,70, correspondente ao período de vigência do contrato entre o dia 1 e o dia 8 de Janeiro de 2014, acrescida dos juros de mora, à taxa legal.

E, assim considerando, entendemos que não assiste razão à ré, quanto ao argumentário inserto no seu recurso subordinado.

Reiterando o que acima ficou dito, a extinção do contrato de concessão, em regime de contitularidade, do direito de uso privativo do aludido terminal portuário, tendo por finalidade a movimentação de cargas, exclusivamente provenientes ou com destino aos estabelecimentos industriais das concessionárias e que se enquadrem no exercício normal das suas actividades industriais - o que sucedeu em 18.01.2014 - acarreta inexoravelmente a extinção do contrato dependente, designado de “Protocolo”, sendo que o pagamento da indemnização ali estipulado apenas se manterá enquanto estiver em vigor o contrato de concessão e nele a ré se mantiver como co-concessionária do mesmo, i.e., como utilizadora do direito de uso privativo do dito terminal portuário, não estando em causa a efectiva utilização do terminal, mas sim o direito de uso do mesmo, objecto do contrato de concessão.

Não corroboramos, assim, o defendido pela ré, quando visa extrair da cláusula 1ª do Protocolo o entendimento de que a indemnização somente se mantinha enquanto a ré procedesse à efectiva utilização do terminal, já que o que se tem de concluir da necessária interligação entre os contratos coligados é que, a indemnização será devida enquanto se mantiver a atribuída concessão, sendo de afastar que em tal cláusula se consagre qualquer condição resolutiva.

De resto, este entendimento nunca antes foi evidenciado pela ré que, conforme resulta da matéria provada, deixou de utilizar o Terminal ainda durante o ano de 2013, o que levou, de resto, a fundamentar a operada caducidade do contrato de concessão, tendo efectuado todos os devidos pagamentos, inclusive o do ano de 2013 - v. Nºs 9, 13 e 16 da Fundamentação de Facto.

Nestes termos, julgam-se improcedentes, quer o recurso principal da autora/apelante, quer o recurso subordinado da ré/apelante, confirmando-se a sentença recorrida.

As apelantes serão responsáveis pelas custas respectivas, nos termos do artigo 527º, nºs 1 e 2 do Código de Processo Civil.

IV.DECISÃO:

Pelo exposto, acordam os Juízes desta ...ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa em julgar improcedentes os recursos, mantendo-se a decisão recorrida.
Condenam-se as apelantes no pagamento das custas respectivas.



Lisboa, 16 de Novembro de 2016  


                                                                                                     
Ondina Carmo Alves -Relatora
Pedro Martins                                                              
Lúcia Sousa