Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
2961/11.5T2SNT-A.L1-6
Relator: CARLOS M. G. DE MELO MARINHO
Descritores: RELAÇÃO CARTULAR
RELAÇÃO CAUSAL
LEGITIMIDADE SUBSTANTIVA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 07/05/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: Desaparecendo a relação cartular e apenas subsistindo a relação causal, a legitimação substantiva do exequente há-de emergir da demonstração da existência, entre ele e o executado, de uma relação obrigacional de dimensão pecuniária espelhada no título ou alegada e patenteada no requerimento inicial.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na 6.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa.


I.RELATÓRIO:
                             

E..., com os sinais identificativos constantes dos autos,  deduziu oposição à execução contra si instaurada em que agora figura como Exequente N..., Sociedade neles também melhor identificada.
O Tribunal "a quo" descreveu o processado até à prolação da sentença impugnada, nos seguintes termos:
À execução que lhe foi instaurada por N... veio a executada E...  deduzir oposição.
Pede a extinção da execução quanto a si instaurada.

Fundamenta a sua pretensão, em síntese, dizendo:
a)- A exequente propôs a presente contra a oponente e S... entretanto declarada insolvente;
b)- Deu à execução uma letra sacada pela executada S... e aceite pela oponente E... que, como a própria exequente assume, se encontra prescrita;
c)- Tal título terá sido endossado à exequente pela outra executada;
d)- Não existe, ou existiu, qualquer relação causal ou subjacente entre exequente e oponente, pelo que o título não pode valer como mero quirógrafo, sendo ilegítimo exigir o seu pagamento à oponente.
Notificada, contestou a exequente, impugnando e mantendo que o título pode fundamentar a presente execução contra a executada.

Foi proferida sentença que decretou:
Pelo exposto, considerando que o título apresentado não é executivo quanto à executada e oponente E..., julgo procedente a oposição deduzida e declaro, por consequência, extinta a execução quanto à executada/oponente.

É dessa sentença que vem o presente recurso interposto por N..., que alegou e apresentou as seguintes conclusões:
I.– Vem o presente recurso interposto da douta sentença de proferida em 23.06.2017, que absolveu a Executada E... da instância executiva, porque o exequente não alegou, como lhe competia, a relação material subjacente.
II.– Porém, contrariamente ao decidido, no requerimento executivo, o exequente sob a epígrafe "Factos" - cfr. n.º 2 e 3 - expressamente identificou a relação material subjacente. – cfr. Requerimento Executivo.
III.– Por sua vez, confessada pela própria executada – cfr. artigos 21º da oposição.
IV.– Acrescentando, porém, ter já pago, por conta da divida, a importância de €1.644,07 — cfr. artigo 22º da oposição.
V.– Em síntese, tendo-se feito menção expressa e literal a "transacção comercial ", que a executada prontamente reconheceu e confessou, a ordenada extinção da execução, com fundamento na inexistência de título executivo, violou o disposto no artigo 703º, n.º 1, al. c) do CPC.

Terminou pedindo que a sentença fosse revogada e a acção prosseguisse os seus termos.

Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

É a seguinte a questão a avaliar:
Tendo-se feito menção expressa e literal a «transacção comercial», que a executada prontamente reconheceu e confessou, a ordenada extinção da execução com fundamento na inexistência de título executivo, violou o disposto no artigo 703.º, n.º 1, al. c) do Código de Processo Civil?

II.FUNDAMENTAÇÃO.

Fundamentação de facto.

Vem provado que:
1)- A exequente deu à execução o documento com cópia junta a fl.s 5 dos autos de execução, no mais aqui dado por integralmente reproduzido, onde consta no anverso, designadamente:
(…) vencimento – 2009-01-31;
(…) Nome e morada do sacado – E... (…);
(…) Assinatura do sacador (ilegível) por cima de carimbo com os dizeres S... (…);
2)- E no verso está aposta outra assinatura ilegível por cima de carimbo com os dizeres S...;
3)- A execução apensa deu entrada a 3 de fevereiro de 2011.

Fundamentação de Direito.
Tendo-se feito menção expressa e literal a «transacção comercial», que a executada prontamente reconheceu e confessou, a ordenada extinção da execução com fundamento na inexistência de título executivo, violou o disposto no artigo 703.º, n.º 1, al. c) do Código de Processo Civil?
A al. c) do n.º 1 do  art. 703.º do Código de Processo Civil inclui entre os títulos executivos os títulos de crédito, «ainda que meros quirógrafos, desde que, neste caso, os factos constitutivos da relação subjacente constem do próprio documento ou sejam alegados no requerimento executivo».

Tal significa que, desaparecendo a relação cartular e apenas subsistindo a relação causal, a legitimação substantiva do exequente há-de emergir da demonstração da existência, entre ele e o executado, de uma relação obrigacional de dimensão pecuniária espelhada no título ou alegada e patenteada no requerimento inicial..

Ora, não se provou a existência, entre a Recorrente E... (…) e a Sociedade Recorrida N..., de um vínculo jurídico com esses contornos,  conforme se extrai com nitidez do material fáctico acima lançado.

Esta rarefação demonstrativa confere inteira razão ao Tribunal «a quo» que a assinalou e dela extraiu, como consequência, a procedência da oposição.
É de sinal negativo a resposta à questão analisada.

III.DECISÃO.
Pelo exposto, julgamos a apelação da improcedente e, em consequência, confirmamos a sentença impugnada.
Custas pela Apelante.
*



Lisboa, 05.07.2018



Carlos M. G. de Melo Marinho (Relator)
Anabela Moreira de Sá Cesariny Calafate (1.ª Adjunta)
António Manuel Fernandes dos Santos (2.º Adjunto)