Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
1203/13.3YRLSB-6
Relator: MARIA DE DEUS CORREIA
Descritores: AUTORIZAÇÃO DE IMPORTAÇÃO DE MEDICAMENTO
PROCEDIMENTOS CAUTELARES
APARÊNCIA DE DIREITO
PROTECÇÃO DA PATENTE
CONTAGEM DOS PRAZOS
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 03/27/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Sumário: I-Para que seja decretada providência cautelar ao abrigo do disposto no art.º 338.º I do Código de Propriedade Industrial é necessário e suficiente que seja feita prova sumária da titularidade do direito de propriedade industrial e da violação desse direito.
II-O artigo 13.º do Regulamento (CE) n.º 469/2009 do Parlamento Europeu e do Conselho de 6 de maio de 2009, relativo ao certificado complementar de protecção para os medicamentos, lido em conjugação com o considerando 9 deste Regulamento, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a que um titular de uma patente e de um certificado complementar de protecção possa invocar a duração da validade de tal certificado por um período superior a quinze anos, a partir da primeira autorização de introdução no mercado (AIM), na União Europeia.
III-Esta interpretação tem como pressuposto que a AIM seja emitida em data posterior á concessão da patente e não no caso analisado nestes autos em que a AIM é anterior à patente.
IV-Só no primeiro caso é que surge a desprotecção do titular da patente que o Regulamento (CE) n.º 469/2009 visa corrigir, criando um mecanismo jurídico – certificado complementar de protecção- que tem como objectivo compensar o titular da patente pelo período em que não gozou da protecção efectiva conferida pela patente, em face da demora na emissão da AIM.
(sumário da Relatora)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: ACÓRDÃOS DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA

    I-RELATÓRIO                       

       No decurso da acção arbitral — e após prolação do acórdão de 5 de Abril de 2013,determinando a suspensão da instância por pendência de causa prejudicial —, vieram as Demandantes N…AG e N…, S.A. requerer providências cautelares não especificadas contra uma das Demandadas – R…, Lda.

         As Requerentes alegam, em síntese, que a Requerida introduziu no comércio os genéricos V… no dia 1 de Julho de 2013, dirigindo comunicações às farmácias oferecendo tais medicamentos para venda e solicitando encomendas para os mesmos; e que, tendo tais medicamentos como substância activa o v…, protegido pelo exclusivo decorrente da patente portuguesa n.º 00000 (adiante, "PT 00000") e pelo Certificado Complementar de Protecção n.º 00 (adiante, "CCP 00"), a referida actuação da Requerida viola os direitos de propriedade industrial das Requerentes, nos termos do artigo 101.º, n.º 2, do Código da Propriedade Industrial e do artigo 5.5 do Regulamento (CE) n.º 469/2009 do Parlamento Europeu e do Conselho de 6 de Maio de 2009.

         Por despacho de 9.07.2013 foi ordenada a notificação da Requerida para contestar, tendo esta deduzido a sua oposição em 22.07.2013, pugnando pelo indeferimento das providências.

         Por requerimento de 31.07.2013, vieram as Requerentes responder à oposição, na parte que qualificam como sendo matéria de excepção.

           Tendo as partes arrolado testemunhas, foram as mesmas inquiridas em audiência realizada em 1.08.2013.

           Realizada a audiência, a convite do Tribunal, as partes apresentaram os respectivos memorandos, sintetizando as questões essenciais a que os árbitros deveriam responder, bem como as soluções que consideraram adequadas para cada uma dessas questões.

         Foi proferido acórdão pelos Juízes Árbitros, nos termos do qual foram julgados procedentes os pedidos de providências cautelares formulados e consequentemente, foi determinado:

        Intimar a Requerida a, no prazo de cinco dias a contar da prestação da caução pelas Requerentes, retirar do mercado português, a suas expensas, os medicamentos contendo V… como substância ativa identificados no artigo 000.0 do R.l. ou sob qualquer outro nome comercial, em qualquer das suas formulações e dosagens, pelo prazo do CCP 00, tal como foi emitido pelo INPI, i.e. até 19 de março de 2014;

       Intimar a Requerida a abster-se de fabricar, importar, oferecer, armazenar, introduzir no comércio ou usar qualquer medicamento contendo a substância ativa V…, em qualquer das suas formulações e dosagens, sob o nome comercial V... R..., V... + Hidro… R... ou sob qualquer outro nome comercial, pelo prazo do CCP 00, tal como foi emitido pelo INPI, i.e. ate 19 de marco de 2014;

      Proibir a Requerida de transmitir a terceiros as AIMs dos medicamentos genéricos acima referidos, até 19 de março de 2014.

    Fixar, nos termos das disposições conjugadas do artigo 338.º-l, n.º 4 do CPI, do artigo384.º do CPC e do artigo 829.º-A do CC, uma sanção pecuniária compulsória de € 30.000,00 (trinta mil euros), a ser paga pela Requerida às Requerentes, por cada dia de atraso no cumprimento das intimações acima referidas ou de incumprimento dessas determinações.

      (v) Subordinar a concessão destas providências a prestação de uma garantia bancária no valor de € 2.500.000,00 (dois milhões e quinhentos mil euros), pelas Requerentes a favor da Requerida, para vigorar ate decisão final da acção principal deste processo cautelar, acrescido de 6 meses para eventual execução. O instrumento de garantia devera ser junto aos autos, após o que começarão a vigorar as providências acima referidas.

       O tribunal fixa as custas deste procedimento, provisoriamente a cargo da Requerida, para serem atendidas na conta final em €50.000 (para honorários, conforme proposta das partes apresentada por requerimento que se junta aos autos, expressamente aceite pelos árbitros), acrescidos de €2.500 (para encargos administrativos, nos termos do Regulamento de Arbitragem para litígios emergentes de direitos de propriedade industrial relacionados com os medicamentos de referencia e medicamentos genéricos).

     Inconformada com esta decisão arbitral, a R..., Lda interpôs recurso para este Tribunal da Relação, formulando as seguintes conclusões:

1. No essencial, a defesa da Recorrente - na presente providência e, bem assim, na acção principal da qual depende a presente providência - assentou na invocação de que o CCP 00 é ineficaz, porquanto a PT00000 foi requerida em 18/02/1991 e concedida em 26/06/1998 e a primeira autorização de introdução no mercado do medicamento D… (V...) data de 13/05/1996.

2. Logo, atendendo ao disposto no Considerando 9° do Regulamento (CE) N.° 469/2009

do Parlamento Europeu e do Conselho, de 6 de Maio de 2009, que determina que o  CCP apenas pode beneficiar de um período máximo de 15 anos de exclusividade a  partir da 1.ª autorização de introdução no mercado na EU, o CCP 00 apenas seria eficaz

até 13/11/2011 (13/05/1996 + 15 anos + 6 meses da extensão pediátrica entretanto  concedida ao CCP 00).

3. O TA proferiu um acórdão limitando-se a concluir que a defesa da Recorrente consiste numa "questão extremamente complexa, sobre a qual já foram expendidas os mais diversos entendimentos ...".

4. Tal Acórdão é manifestamente ilegal e deve ser revogado.

5. Desde logo, a questão que o Tribunal qualificou como "extremamente complexa"  consiste apenas em interpretar o teor do Considerando 9° do Regulamento (CE) N.° 469/2009 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 6 de Maio de 2009 e, de seguida, responder à seguinte questão: esse Considerando tem ou não carácter normativo devendo ser tido em conta no cálculo da duração do CCP 00?

6. Trata-se de uma questão relativamente simples que, ao contrário do que é referido pelo Tribunal, já foi objecto de inúmeras decisões judiciais noutros países e decisões arbitrais em Portugal, todas convergindo para a mesma interpretação: o Considerando 9 do referido regulamento tem carácter normativo e deve ser tido em conta no cálculo da duração do CCP segundo o artigo 13° desse Regulamento!

7. Aliás, na arbitragem relativa ao composto M…, esta mesma questão foi julgada pelo TA em sede de despacho saneador e não na decisão final de mérito, o que revela que se trata de uma questão relativamente simples.

8. Note-se ainda que o TA nem sequer determinou que a análise desta questão - que se encontra claramente resumida em meras cinco páginas das alegações finais da  Recorrente - iria provocar algum atraso ou qualquer outro inconveniente processual que fosse incompatível com o processamento urgente da presente providência.

9. No âmbito da presente providência o Tribunal negou à Requerida o direito ao  contraditório e uma defesa efectiva, isto apesar de, anteriormente, no despacho  interlocutório proferido no dia 5 de Abril de 2013, o Tribunal ter determinado que  "jamais se poderia sustentar que, para garantia dessa celeridade, se devesse  prescindir, material e utilmente, da tutela jurisdicional de que, por imperativo  constitucional, as Demandadas gozam"!

10. O princípio do contraditório é inerente ao direito a uma defesa efectiva,  constitucionalmente consagrada, sendo decorrente da bilateralidade do processo:  quando uma das partes alega alguma coisa, há-de ser ouvida também a outra parte,  sendo-lhe dada oportunidade de resposta e utilização de todos os meios de defesa em Direito admitidos.

11. Assim, conclui-se que o Acórdão recorrido violou o princípio do contraditório e da  proibição da indefesa, consagrados nos artigos 13° e 20° da Constituição, e, não se  pronunciando sobre uma matéria sobre a qual se deveria ter pronunciado, violou  igualmente o disposto no artigo 668°, n° 1, alínea d), do Código de Processo Civil, aplicável ex vida alínea MM) da Acta de Instalação.

12. Acresce que, a fls. 3 a 6 do acórdão recorrido, o TA efectuou uma análise aprofundada do âmbito de protecção da PT00000. Estas incursões do TA pela química alongam-se por mais de três páginas no acórdão recorrido.

13. Não obstante, no que concerne à matéria estritamente jurídica, isto é, à  inoponibilidade do CCP 00 face ao teor do Considerando 9° do Regulamento CPP, os  árbitros consideraram tratar-se de matéria muito complexa para ser apreciada!

14. Assim, muito embora tenham aceitado analisar todas as questões trazidas aos autos pelas Recorridas - entre elas o âmbito de protecção da patente - o Tribunal recusou -  se discutir as questões invocadas pela Recorrente violando de forma inaceitável o  princípio da imparcialidade e de igualdade entre as partes previsto nos artigos 10°, n° 1, do Regulamento do Centro de Arbitragem, 16, alínea a) da Lei n° 31/86, de 29 de  Agosto, o artigo 3°-A do Código de Processo Civil e o artigo 13° da Constituição.

15. Será ainda de salientar que, muito embora no despacho interlocutório proferido no dia 5 de Abril de 2013 se tenha determinado a suspensão da instância arbitral com  fundamento na existência de uma questão prejudicial - a pendência, no Tribunal de  Comércio de Lisboa, de uma acção na qual se peticiona a declaração de nulidade da PT 00000 e do CCP n° 00 - no âmbito da presente providência "a ponderação actual  acerca da prejudicialidade leva o tribunal a inclinar-se em sentido oposto à suspensão".

16. Ora, como é evidente, os fundamentos que determinaram a suspensão da acção principal - em especial, o reconhecimento do direito constitucional da Recorrente a  uma defesa efectiva - devem manter-se no âmbito deste processo cautelar.

17. Note-se também que, como o Tribunal bem sabe, na acção que se encontra pendente no Tribunal de Comércio de Lisboa, na qual se peticionou a declaração de nulidade da PT 00000 e do CCP n° 00, a Autora não requereu que fosse declarada a ineficácia do CCP 00 com base na aplicação do Considerando 9 do Regulamento (CE) N.° 469/2009 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 6 de Maio de 2009.

18. Uma vez que na acção principal o Tribunal também não se pronunciou sobre a duração do CCP 00, cabe à Recorrente questionar: Em que momento processual tenciona o TA tomar uma posição quanto a esta matéria?

19. Na ação principal não poderá fazê-lo porque decidiu suspendê-la até que a questão  prejudicial deixe de subsistir, o que, como TA bem sabe, não irá suceder antes de  Março de 2014, tal como é confirmado pelo voto de vencido proferido pelo árbitro Dr. P…. ao despacho interlocutório...e na providência cautelar o TA não se mostrou disponível para analisar essa questão...

20. Em suma, o TA sabia (ou, pelo menos, tinha a obrigação de saber), pelo teor da  oposição apresentada pela Recorrente, que a questão central a ser discutida nos presentes autos é precisamente a ausência de aparência de direito das Recorridas pelo facto do CCP 00 não entrar em vigor e ser inoponível. Recusando-se a analisar essa questão, para além de violar o direito da Recorrente a uma defesa efectiva, o Tribunal onera a Recorrente com procedimentos adicionais tendo em vista o ressarcimento dos danos sofridos com o decretamento desta providência.

21. Será ainda de salientar que a Lei n.° 62/2011, de 12 de Dezembro, instituiu a arbitragem necessária como o meio próprio para dirimir estes litígios, no pressuposto de se tratar de um mecanismo de composição de litígios mais especializado pelo que às partes assiste o direito de exigir que os árbitros que integram o TA estudem em profundidade a matéria em discussão.

22. Assim, no momento em que um árbitro aceita o encargo numa arbitragem, as partes estão (fundadamente) confiantes que este terá conhecimentos suficientes e disponibilidade para julgar a causa.

23. Por outro lado, os árbitros aceitaram a proposta das partes no pagamento de honorários no montante de €50.000,00, quanto à presente providência, a que acrescem €100.000,00 de honorários cobrados pelo Tribunal no âmbito da acção principal.

24. Tais montantes apenas são justificáveis pela especialização e disponibilidade dos árbitros para apreciar todas as questões que lhe são submetidas em tempo útil.

25. Assim, a Recorrente não pode deixar de manifestar a sua exasperação, estupefação e preocupação perante a recusa ou indisponibilidade do TA na análise da questão jurídica sobre a não entrada em vigor do CCP 00 face ao disposto no Regulamento CCP com base na alegação de que tal questão é demasiado complexa.

26. Até porque, ao longo dos anos, os tribunais civis têm analisado, em sede de processos cautelares, questões envolvendo patentes muitíssimo mais complexas do que aquela que o TA se recusou conhecer!

27. Inacreditavelmente, o TA interpretou o conceito de fumus boni juris de forma ligeira para se recusar a analisar os fundamentos trazidos aos autos pela Recorrente sobre a não entrada em vigor do CCP 00: a análise da aparência do direito deve efectuar-se tendo em conta a Lei aplicável, designadamente, as disposições do Regulamento CCP e não com base num documento emitido pelo INPI (documento que o próprio TA reconhece no despacho interlocutório de 5 Abril não fazer presumir a validade do direito mas apenas que se verificam os requisitos da sua concessão)!

28. Tornando-se, assim, evidente que, nos termos do disposto no artigo 9°, n° 4, do Regulamento de Arbitragem, o Tribunal se escusou injustificadamente ao exercício pleno da sua função pelo que o acórdão recorrido violou o disposto no artigo 202°, da Constituição.

29. De acordo com o disposto no artigo 13° n.°1 do Regulamento CCP, o certificado produz efeitos no termo legal da validade da patente de base, durante um período que corresponde ao período decorrido entre a data da apresentação do pedido da patente de base e a data da primeira autorização de introdução no mercado na Comunidade, reduzido um período de cinco anos.

30. Sucede que, o Considerando 9° do Regulamento CCP estabelece que "o titular de uma patente e de um certificado deve poder beneficiar no total de um período máximo de quinze anos de exclusividade a partir da primeira autorização de introdução no mercado da Comunidade do medicamento em causa".

31. O teor do Considerando 9° do Regulamento CCP é preciso, claro e imperativo, pelo que, mesmo através do elemento literal se percebe que este preceito goza claramente de carácter normativo.

32. O Regulamento CCP determina que "O presente regulamento é obrigatório em todos os seus elementos e directamente aplicável em todos os Estados-Membros", não se fazendo qualquer distinção entre considerandos e artigos.

33. Aliás, tal como decorre do Considerando 7° do Regulamento CCP, a razão pela qual a matéria dos CPP é regulada num regulamento comunitário (e não em legislação nacional dos Estados Membros) reside precisamente na intenção do legislador comunitário de harmonizar a legislação dos diversos Estados-Membros em matéria de CPP e daí que em todos os Estados Membros da União Europeia, à exceção de Portugal, a fórmula de cálculo da duração do CCP prevista no artigo 13° do Regulamento CCP esteja perfeitamente harmonizada com o período máximo de exclusividade de 15 anos previsto no Considerando 9° do Regulamento CCP.

34. Assim, tendo em conta o disposto no Considerando 9° do Regulamento CCP, que visa harmonizar a duração dos CCPs nos Estados Membros da UE, o período máximo de exclusividade atribuída pelo CCP 00 terminou, como é óbvio, no dia 13/11/2011 (15 anos a partir da 1.ª AIM na EU acrescido da extensão pediátrica de 6 meses).

35. Em suma, o CCP 00 consiste num CCP de duração negativa, figura que, aliás, foi vinculisticamente admitida em diversos arestos, designadamente, pelo Acórdão do Tribunal de Justiça, de 8 de Dezembro de 2011, proferido no âmbito do processo C 125/106.

36. A interpretação do Considerando 9. perfilhado pela Recorrente foi unanimemente aceite por toda a jurisprudência que apreciou esta questão: despacho saneador de 4 de Janeiro de 2013 proferido na arbitragem relativa à substância activa M…, Acórdão de 14/03/2006 do Supremo Tribunal da Áustria, sentença proferida pelo Tribunal de Utrecht (Holanda) litígio entre a B… e algumas empresas do Grupo T…, relativo à substância activa N… e decisão proferida por um Tribunal Arbitral português quanto à substância activa D….

37. As Recorridas não citaram, porque não existe, qualquer decisão que vá em sentido divergente das inúmeras decisões judiciais citadas pela Recorrente que já se pronunciaram sobre esta matéria.

38. Por fim, será de salientar que, ao contrário do que foi decidido pelo TA, não ficou demonstrada a existência de danos irreparáveis (nem sequer de difícil reparação), pelo que não se encontram preenchidos os requisitos do artigo 283° do CPC e deve ser julgado inadmissível o processamento da presente providência cautelar na pendência da suspensão da ação principal.

   Nestes termos, deverá ser concedido provimento ao presente recurso, ser revogada a decisão proferida pelo Tribunal Arbitral violou de forma totalmente inadmissível o princípio constitucional do acesso à justiça (na vertente do direito a uma defesa efectiva) previsto no artigo 20° da Constituição da República Portuguesa (CRP), o princípio da imparcialidade previsto nos artigos 10° do Regulamento de Arbitragem do Centro de Arbitragem da Associação de Comércio de Lisboa (Regulamento de Arbitragem), princípio da igualdade entre as partes previsto no artigo 3°-A do Código de Processo Civil (CPC) e 13° da CRP, o seu dever de julgar e decidir sobre as matérias que lhe são apresentadas previsto no artigo 202° da CRP (mediante concretização do disposto no artigo 20° da CRP) e no artigo 9°, n.° 4 do Regulamento de Arbitragem, o disposto no artigo 668°, n.° 1 al. d) do Código de Processo Civil e, finalmente, o disposto nos artigos 338°-I do Código de Propriedade Industrial (CPI), 381° e 387° do CPC e, consequentemente, deverá ser substituída por outra decisão que indefira a providência cautelar.

   Nas suas contra alegações, as Recorridas N… AG e N… pronunciaram-se pela improcedência das conclusões formuladas no recurso e pedindo, consequentemente a confirmação do acórdão arbitral.

       Cumpre apreciar e decidir:

          II-OS FACTOS

       No acórdão arbitral foram dados como provados ou suficientemente indiciados os seguintes factos, agrupados por temas, “para facilitar a compreensão do decidido” e com a referência, antes de cada um, da peça processual em que o mesmo foi alegado e a indicação dos documentos, depoimentos ou demais elementos de prova em que se baseou a decisão:

As Requerentes

- (R.l. 163) A N…, S.A., é inteiramente detida pela N… AG. (S…)

- (R.l. 163) Os prejuízos financeiros decorrentes da infração de direitos de propriedade industrial da N…, S.A., terão repercussão na N… AG. (S…)

- (R.l. 167) Os valores gastos pelo Grupo N… em investigação e desenvolvimento de medicamentos atingem anualmente milhares de milhões de dólares norte-americanos. (S… e M…)

A Requerida

- (Oposicao 1, 2, 3 e 4 e R.l. 185) A R... faz parte do Grupo T…, um grupo farmacêutico de grande dimensão a nível mundial (R…).

- (Oposicao 6) As empresas incluídas no Grupo T… são titulares de várias patentes, incluindo:

- Patente Europeia n.º … (Processos para a medição da potência do acetato de g…);

- Patente Europeia n.º … (Terapia de combinação com acetato de g… e r… para o tratamento de …);

- Patente Europeia n.º … (Processo para preparação de misturas de acetato de g… utilizando a… purificado);

- Patente Europeia n.º … (Formulação de volume reduzido de acetato de g… e métodos de administração) (docs. n.ºs 1, 2, 3 e 4 juntos a oposição).

A Patente n.º 00000

- (R.l. 25) A N… AG teve registada a seu favor a patente portuguesa n.º 00000 (doravante designada por "PT00000" ou, simplesmente, "Patente"), a qual, em sintese, abrange a invenção de vários compostos de b… básicos, formulações galénicas de medicamentos contendo esses produtos como substancias ativas, o processo para a síntese dos compostos acima referidos, o processo para a preparação das suas formulações galénicas e a utilização terapêutica das referidas substancias ativas e formulações, (doc. n.9 1 junto a p. i. da acção principal, M… e A…)

- (R.l. 29) A Patente foi concedida pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial ("INPI") em 26 de junho de 1998. (doc. n.º 1 junto a p. i. da acção principal e Oposição 52)

- (Oposição 52) A primeira autorização de introdução no mercado na EU dos medicamentos D… teve lugar em 13.5.1996. (doc. n.9 2 junto a p. i. da acção principal)

- (R.l. 46) A Patente vigorou ate 26 de junho de 2013. (Oposicao 42)

- (R.l. 26) Entre os compostos de b… abrangidos pelas reivindicações da Patente encontra-se um composto, com a denominação comum internacional de "V...", que tem os seguintes nomes quimicos:

(a) omissis

(b) omissis

(c) omissis

 (doc. n.º 1 junto a p. i. da acção principal, M… e

A…)

- (R.l. 27) O V... tem a seguinte estrutura:

            (…)

(doc. n.º 1 junto a p. i. da acção principal, M... e A...)

- (R.l. 28) As reivindicações da Patente relacionam-se com o V..., com a sua formulação galenica e com as suas utilizações terapêuticas, (doc. n.º 1 junto a p. i. da acção principal, M... e A...)

- (R.l. 31) As reivindicações da Patente são de quatro categorias: reivindicações de produto, reivindicações de processo e reivindicações de uso e formulação, (doc. n.º 1 junto a p. i. da acção principal, M... e A...)

- (R.l. 32) As reivindicações 1.ª a 32.ª são de produto, incluindo a l .ª reivindicação um grande número de diferentes compostos de formula geral (I) ilustrada na Figura 1 a seguir:

            (…)

Figura 1 - Fórmula Geral (I)

 (doc. n.º 1 junto a p. i. da acção principal, M... e A...)

- (R.l. 33) Nesta estrutura, a posição de ligação do anel a… B ao anel a… A não está especificada (i.e., a ligação que une o anel a… B está desenhada sem que esteja ligada a uma posição especifica do anel a… A) e por isso estão incluídos na reivindicação os compostos que têm o anel B ligado a uma variedade de posições do anel A. (doc. n.º 1 junto a p. i. da acção principal, M... e A...)

- (R.l. 34) Analogamente, a posição específica do grupo R3 no anel a… B não está definida, sendo permitida uma variedade de posições, (doc. n.9 l junto a p. i. da acção principal, M... e A...)

- (R.l. 35) A reivindicação especifica que os dois anéis podem estar mais substituídos (para alem de R3) ou não, consoante o caso, e da origem a uma ampla variedade de mais compostos possíveis com substituintes adicionais, (doc. n.9 1 junto a p. i. da acção principal, M... e A...)

- (R.l. 37) Tanto a forma (S) do grupo presente no V... como a correspondente forma (R) estão incluídas na definição da 1.ª reivindicação, (doc. n.9 1 junto a p. i. da acção principal, M... e A...)

- (R.l. 38) A reivindicação 26.ª abrange o V..., por referência ao seu nome sistemático especifico (…). (doc. n.º 1 junto a p. i. da acção principal, M... e A...)

- (R.l. 39) O V... esta pois abrangido, pelo menos, pelas reivindicações l.ª e 26.ª da

Patente. (M... e A...)

- (R.l. 40) As reivindicações 33.ª e 34.ª são reivindicações de utilização médica, (doc. n.º 1 junto a p. i. da acção principal, M... e A...)

- (R.l. 41) A reivindicação 33.ª abrange compostos de acordo com quaisquer das reivindicações l.ª a 32.ª (em forma livre ou como os seus sais utilizáveis farmaceuticamente), para utilização no tratamento do corpo humano ou animal, (doc. n.º1 junto a p. i. da acção principal, M... e A...)

- (R.l. 42) A reivindicação 33.ª abrange a utilização terapêutica de V... (ou dos seus sais utilizáveis farmaceuticamente) para tratamento, uma vez que o V... é abrangido, pelo menos, pelas reivindicações l .ª e 26.ª (M... e A...)

- (R.l. 43) A reivindicação 35.ª abrange preparações que compreendem um composto de acordo com qualquer das reivindicações l.ª a 34.ª e, portanto, o V... (em forma livre ou como sais utilizáveis farmaceuticamente) com excipientes farmacêuticos, quando apropriado. (M... e A...)

- (R.l. 44) As reivindicações 40.ª a 44.ª abrangem a utilização de compostos de acordo com qualquer das reivindicações 1.ª a 34.ª e, por isso, o V... (em forma livre ou como sais utilizáveis farmaceuticamente) para a produção de preparações farmacêuticas. M... e A...).

- (R.l. 45) A reivindicação 40abrange genericamente essa utilização. (M... e A...)

O Certificado Complementar de Proteção n.º 00

- (R.l. 47 e Oposição 123) A Requerente N… AG é titular do Certificado Complementar de Proteção n.º 00 ("CCP 00"), concedido pelo INPI em 2 de junho de 1999, válido de 26.6.2013 ate 19.3.2014. (certidão junta aos autos em 31.7.2013)

- (R.l. 48) O CCP 00 foi concedido tendo por patente base a PT00000 e por referência a

primeira autorização de introdução no mercado na Comunidade do medicamento contendo como substancia ativa o V... (D…), datada de 13.5.1996. (certidão junta aos autos em 31.7.2013)

O contrato de licença de exploração

- (R.l. 69) Entre a N… AG e a N…, S.A., foi celebrado um contrato pelo qual aquela concedeu a esta uma licença de exploração da PT00000 e do CCP 00, concedendo-lhe, entre outros, o direito de comercializar, utilizar ou por qualquer outra forma usar, os produtos farmacêuticos cobertos pelas reivindicações da Patente, (doc. n.º 6 junto a p. i. da acção principal)

- (R.l. 70) Tal contrato de licença de exploração de patente encontra-se registado no INPI. (doc. n .° 1 junto a p. i. da acção principal)

Medicamentos comercializados pela N…, S.A., que contêm V...

- (R.l. 161) Entre outros, são comercializados em Portugal pela N…, S.A., os

seguintes medicamentos que contem V... como substancia ativa, nas dosagens, sob as formas farmacêuticas e nas embalagens seguintes:

(…)

- (Oposicao 148) O titular das AIM dos medicamentos T… e Co-T… é a empresa Laboratório…., Lda. (cujo capital social pertence integralmente a empresas do Grupo N…), mas a distribuição de tais medicamentos e feita pela N…, S.A., desde 1.1.2013 (folhas com elementos sobre o T... e o Co-T... da página do Infarmed na Internet, rubrica I…, certidão do registo comercial do Laboratório Normal e carta-circular da N… juntas aos autos durante a sessão de prova por depoimentos).

- (R.l. 176) A N… S.A. também comercializa em Portugal dois outros produtos que contêm V... (+ A…) como substância, sob os nomes E… e C… (M…).

AIM de que a R... é titular

- (R.l. 131) A R... e titular, entre outras, das AIM relativas aos medicamentos genéricos a seguir identificados, doravante abreviadamente designados por "Genéricos V...":

            (…)

(pagina do Infarmed na Internet, rubrica I…, acedida no dia 4.8.2013)

Introdução no mercado pela R... dos Genéricos V...

- (R.l. 132) A R... introduziu no comércio os Genéricos V... no dia 1 de julho de 2013. (does. juntos ao r.i. sob os n.os 1 a 6 e docs. juntos ao requerimento das Requerentes de 8.7.2013)

Características dos Genéricos V...

- (R.l. 135) Os Genéricos V... contêm o V... como substância ativa. (docs. juntos ao r.i. sob os n.os 1 a 6)

Valor provável das vendas dos Genéricos V... até 31.3.2014

- (Oposição 174) No periodo de 1.7.2013 a 31.3.2014, as vendas dos Genéricos V... atingirão, provavelmente, cerca de € 3.400.000,00, gerando uma margem bruta de cerca de € 2.900.000,00. (L…)

Dados sobre os medicamentos comercializados pela N…, S.A., que contêm V...

- (R.l. 164) Os medicamentos contendo V... como substância ativa, comercializados em Portugal sob as designações comerciais D..., Co-D..., T... e Co-T..., são dos produtos das Requerentes mais conhecidos e mais vendidos em Portugal, representando para a N…, S.A., produtos-chave do seu negócio. (S... e M...)

- (R.l. 165) No ano de 2012, os medicamentos contendo V... como substância ativa representaram, pelo menos, 12% das vendas totais da Novartis Farma, S.A. (M... e M...)

- (R.l. 166) Nos anos de 2011 e 2012, os valores totais das vendas dos medicamentos D..., Co-D..., T... e Co-T... foram de cerca de €29.500.000,00 e de €22.000.000,00 respetivamente. (S... e M...)

- (R.l. 166) Em 2013, o valor das vendas dos medicamentos D..., Co-D..., T... e Co-T... deverá atingir cerca de € 19.550.000. (S...)

Consequências da introdução no mercado dos Genéricos V... sobre as vendas dos medicamentos comercializados pela N…, S.A., que contêm V...

- (R.l. 168) Os medicamentos genéricos beneficiam de um regime de venda ao público que, no plano do preço, os beneficia relativamente aos medicamentos originais. (S...)

- (R.l. 213) Os preços dos medicamentos genéricos são no mínimo 50% mais baixos do que os preços dos medicamentos originais. (M...)

- (Oposição 173) A quota, em unidades, dos medicamentos genéricos vendidos em farmácias, no mercado concorrencial, é atualmente de 44,1%. (doc. n.º 17 junto a oposição e L...).

- (R.l. 172) É provável que a erosão do valor das vendas do D..., do Co-D..., do T... e do Co-T..., um ano após a entrada dos Genéricos V... no mercado, se aproxime dos 50% . (S...)

- (R.l. 175) Em valor, a quebra nas vendas que a Novartis Farma, S.A., sofrerá no tocante aos medicamentos D..., Co-D..., T... e Co-T..., por força da introdução no mercado dos Genéricos V..., atingirá provavelmente nos primeiros nove meses cerca de € 4.000.000.00. o que corresponderá a um decréscimo na margem bruta de cerca de €3.600.000.00. (S...)

- (R.l. 176) A introdução no mercado dos Genéricos V... terá ainda impacto sobre o E… e o C…, que, como referido, também contêm V... (+ A…) como substância ativa (M...).

- (R.l. 178) Em 2012, o volume total de vendas do E… e do C… foi de cerca de €15.000.000.00. (S...)

- (R.l. 179) A quebra nas vendas que a N…, S.A., sofrerá no tocante ao E… e ao C…, por força da introdução no mercado dos Genéricos V..., atingirá nos primeiros nove meses, provavelmente, cerca de € 1.500.000,00, o que corresponderá a um decréscimo na margem bruta de cerca de € 1.350.000,00.

            III-O DIREITO           

           Tendo em conta as conclusões de recurso formuladas que delimitam o respectivo âmbito de cognição por parte deste Tribunal da Relação, as questões que importa decidir são as seguintes:

           1-Violação dos princípios do contraditório, da imparcialidade, da igualdade das partes e nulidade por omissão de pronúncia;

           2-Aferir da existência dos requisitos para o decretamento das providências cautelares requeridas, o que pressupõe a análise da questão da vigência da patente 00000 e do CCP20 titulados pelas Requerentes, de acordo com os Regulamentos (CE) n.º 469/2009, de 6 de maio, relativo ao certificado complementar de protecção para os medicamentos e n.º 1901/2006 de 12 de dezembro, relativo a medicamentos para uso pediátrico.

           1-A Apelante invoca a violação, no acórdão arbitral, dos princípios do contraditório e do direito a uma defesa efectiva, da imparcialidade, da igualdade das partes e ainda nulidade por omissão de pronúncia. Tudo isto a propósito de o acórdão arbitral não ter apreciado a questão da vigência do CCP00 entendendo tratar-se de questão “extremamente complexa, sobre a qual já foram expendidos os mais diversos entendimentos”. Segundo a Apelante esta questão não é complexa, pois consistiria apenas em saber se o Considerando 9 do Regulamento (CE) n.º 469/2009 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 6 de maio de 2009 “tem ou não carácter normativo devendo ser tido em conta no cálculo da duração do CCP 00”.

           Na verdade, a questão da interpretação do artigo 13.º do Regulamento (CE) n.º 469/2009 do parlamento Europeu e do Conselho, de 6 de maio de 2009, relativo ao certificado complementar de protecção (CCP) para os medicamentos, em conjugação com o considerando 9 deste Regulamento, para dessa interpretação concluir pela caducidade dos direitos invocados pelas Requerentes e ora Apeladas, foi a linha fundamental de argumentação e de defesa da ora Apelante. Porém, tal linha de argumentação não foi seguida pelo acórdão arbitral que a propósito referiu:

            Alegaram as Requerentes (arts. 47 a 60 do R.l.) que o CCP 00, cuja duração inicial terminava em 23.09.2013, caducara, mercê da extensão pediátrica [decorrente do art. 36.9 do

Regulamento (CE) n.º1901/2006], a 23.03.2014, tendo posteriormente esclarecido (arts. 78 a

82 da resposta a oposição) que o INPI alterou essa data para 19/03/2014, devido a uma

precisão do modo de cálculo desse prazo. Em contrário disso, a Requerida sustenta (arts. 49 a

140 da oposição) que a PT00000 já caducou e que o CCP 00 nem chegou a entrar em vigor,

essencialmente por aplicação do limite de 15 anos que, no entender da Requerida, decorrera

imperativamente do Considerando 9 do citado Regulamento (CE) n.9 469/2009.

           Trata-se, efectivamente, de uma questão extremamente complexa, sobre a qual foram já expendidas os mais diversos entendimentos, como exuberantemente resulta dos extensos articulados apresentados pelas partes.

Sucede, porém, que a complexidade desse escrutínio não se coaduna com a natureza sumária

de um procedimento cautelar e com o carácter (inevitavelmente) perfunctório dos juizos nele

produzidos. O julgador das providências cautelares deve bastar-se com um fumus boni juris,

deixando para a acção principal a análise aprofundada do bem (ou mal) fundado do direito

invocado pelo requerente, cuja aparência será suficiente para justificar a tutela cautelar. Ora,

no caso dos autos, as Requerentes alegaram e demonstraram que são titulares de um Certificado Complementar de Protecção emitido pela entidade competente, o Instituto Nacional da Propriedade Industrial, que atesta a validade desse titulo "de 2013.06.26 até 2014.03.19". Em face disso, é inegável que as Requerentes fizeram prova sumária da aparência do direito que invocam como causa de pedir para sustentar o seu requerimento de medidas cautelares.

Importa contudo sublinhar que esta conclusão não envolve, da parte deste tribunal, uma tomada de posição na controvérsia relativa à interpretação do art. 13.9 do Regulamento (CE) n.9 469/2009 e do seu Considerando 9. De resto, atenta a precariedade e a eficácia relativa das decisões cautelares, consagradas pelo n.º 4 do art. 383.º do CPC, este entendimento em nada prejudica a decisão a proferir, a este respeito, na acção principal”.           

            Quid juris?           

            É certo que o tribunal deve conhecer “de todas as questões que lhe são submetidas, isto é, de todos os pedidos deduzidos, todas as causas de pedir e excepções invocadas e de todas as excepções de que oficiosamente lhe cabe conhecer. O não conhecimento de pedido, causa de pedir ou excepção cujo conhecimento não esteja prejudicado pelo anterior conhecimento de outra questão constitui nulidade.”[1] Porém, já não existirá nulidade no caso de o tribunal não considerar “linhas de fundamentação jurídica, diferentes da da sentença, que as partes tenham invocado”.[2]

           Ora, se é verdade que a questão suscitada pela Requerida tem a natureza de excepção e nessa medida estaria incluída nas matérias sobre as quais o Tribunal teria de se pronunciar, sob pena de nulidade, também é certo que o mesmo Tribunal justificou a razão jurídica pela qual entendeu que tal questão não devia ser apreciada em sede de procedimento cautelar. Para o Tribunal a quo, para justificar a tutela cautelar foi bastante que as Requerentes tivessem alegado e demonstrado que eram titulares “de um Certificado Complementar de Protecção emitido pela entidade competente, o Instituto Nacional da Propriedade Industrial, que atesta a validade desse titulo "de 2013.06.26 até 2014.03.19".

Considerou o Tribunal que, feita a prova sumária da aparência do direito que invocavam como causa de pedir para sustentar o seu pedido de medidas cautelares, não seria necessário analisar a questão da vigência do CCP 00, à luz da interpretação  do  art.º 13 e Considerando 9 do citado Regulamento (CE) n.º 469/2009, defendida pela ora Apelante.

           Cremos que, independentemente de sufragarmos ou não o entendimento plasmado no acórdão arbitral, este não enferma de nulidade. À luz do entendimento jurídico nele desenvolvido, a questão suscitada pela Requerida não cabia no âmbito de apreciação do Tribunal, atentas as características próprias do processo em apreço.

           Tão pouco se vislumbra no acórdão qualquer violação dos princípios basilares do nosso sistema processual civil como o contraditório, da imparcialidade , ou da igualdade das partes.

           Improcedem, por conseguinte, as conclusões da Apelante a este propósito.

           2-Importa agora, entrar na questão fulcral do litígio e que constitui o cerne deste recurso. Importa efectivamente saber se, perante os elementos fácticos e jurídicos disponíveis, deveriam ter sido decretadas as providências cautelares tal como ocorreu por força do acórdão arbitral ora em apreço.

           Estava em causa saber se as Requerentes preenchiam os requisitos de que depende o decretamento das requeridas providências cautelares.

           Estamos no âmbito da lesão de um direito de propriedade industrial (a patente e o respectivo CCP), integrando-se na previsão do art.º 338.º n.º1 do Código de Propriedade Industrial (CPI), norma especial que consagra os requisitos do decretamento das providências cautelares nesta área. Lembremos, em matéria de direito de patentes industriais a especial protecção que a estas é conferida pelo art.º 101.º do CPI, ao estabelecer, no seu n.º2, que “ a patente confere ainda ao seu titular o direito de impedir a terceiros, sem o seu consentimento, o fabrico, a oferta, a armazenagem, a introdução no comércio ou a utilização de um produto objecto de patente ou a importação ou posse do mesmo, para algum dos fins mencionados”. E no n.º3 dispõe que “ o titular da patente pode opor-se a todos os actos que constituem violação da sua patente, mesmo que se fundem noutra patente com data de prioridade posterior, sem necessidade de impugnar os títulos ou de pedir a anulação das patentes em que esse direito se funde”.

           Portanto, a providência deve ser decretada, sempre que se esteja ante uma lesão grave, atenta a importância patrimonial ou extrapatrimonial do direito ou do bem que aquele incide e que está em risco de ser sacrificado[3].

           Ora bem, para que fosse possível decretar as requeridas providências cautelares, impunha-se antes de mais que as Requerentes fossem titulares de um direito de propriedade industrial cujo exercício estivesse em risco em consequência da actuação da Requerida. E, assim, o Tribunal a quo concluiu que “da matéria dada como indiciariamente provada resulta claro que as Requerentes são titulares do direito exclusivo de exploração da invenção a que se referem a PT00000 e o CCP 00, com a respectiva extensão pediátrica e que este CCP 00 se encontra em vigor até 19.03.2014.

           Ora, aqui reside o cerne da questão. A Requerida veio, precisamente, defender-se alegando que, de acordo com a interpretação correcta do art.º 13.º do Regulamento (CE) n.º 469/2009 do Parlamento Europeu e do Conselho e seu considerando n.º9, deverá entender-se que o período máximo de exclusividade atribuída pelo CCP n.º00 terminou, no dia 13/11/2011  (15 anos a partir da 1.ª AIM acrescido da extensão pediátrica de 6 meses), razão pela qual impugna a validade do certificado emitido pelo INPI, no dia 31 de Julho de 2013. Segundo a sua argumentação, à data em que foi instaurado o procedimento cautelar, nenhum direito de exclusividade, decorrente da patente 00000 e CCP 00 assistia às Requerentes, por caducidade de tal direito. Assim, quando a Requerida, em 1 de Julho de 2013, introduziu no comércio os genéricos V..., já não estaria a violar qualquer direito de propriedade industrial titulado pelas Requerentes.

           Afigura-se-nos que a questão da contagem do período máximo de exclusividade conferido pela patente titulada pelas Requerentes é essencial para aferir da probabilidade da existência do direito destas e, por conseguinte, essencial para apurar da verificação dos requisitos para decretar as providências cautelares e perfeitamente consentânea com a natureza do processo em causa. Apesar de o julgador das providências cautelares se dever bastar com um fumus boni iuris, sendo suficiente a aparênciado direito para justificar a tutela cautelar, esse juízo não deve ser “colocado num patamar tão baixo da escala gradativa da convicção do juiz que se tutelem situações destituídas de fundamento razoável”[4].

           É por isso é necessário apreciar a questão supra identificada e que pressupõe efectivamente a interpretação do art.º 13.º do Regulamento (CE) n.º 469/2009 do Parlamento Europeu e do Conselho de 6 de maio de 2009 relativo ao certificado complementar de protecção para os medicamentos (CCP).

           Estabelece o art.º 13.º do Regulamento no seu n.º1 que “ o certificado produz efeitos no termo legal da validade da patente de base, durante um período que corresponde ao período decorrido entre a data da apresentação do pedido da patente de base e a data da primeira autorização de introdução no mercado na comunidade, reduzido um período de cinco anos.”

           E no n.º2: “Não obstante o disposto no n.º1, o período de validade do certificado não pode exceder cinco anos a contar da data em que produzir efeitos

           O n.º 3 estipula que “ os períodos previstos nos n.ºs 1 e 2 serão prorrogados por seis meses no caso do pedido previsto no art.º 36.º do Regulamento (CE) n.º 1901/2006. Nesse caso, o período previsto no n.º1 do presente artigo só pode ser prorrogado uma vez.”

           Porém, o Parlamento Europeu e o Conselho da União Europeia aprovaram o referido Regulamento, tendo em conta o Tratado que institui a Comunidade Europeia, nomeadamente o artigo 95.º, tendo em conta a proposta da Comissão, tendo em conta o parecer do Comité Económico e Social Europeu e considerando, designadamente, entre outros que (9) “a duração da protecção conferida pelo certificado deverá ser determinada de forma a permitir uma protecção efectiva suficiente. Para este efeito, o titular de uma patente e de um certificado deve poder beneficiar no total de um período máximo de quinze anos de exclusividade a partir da primeira autorização de introdução no mercado da Comunidade do medicamento em causa.”

           Ora, não há dúvida que não sendo o considerando uma norma legal, através dele se extraem as razões ou princípios que nortearam o legislador na produção da norma e, nesse sentido, constitui um elemento importantíssimo para a interpretação dessas normas, já que na interpretação, além da letra, devemos considerar o sentido ou espírito da lei[5].

           Também assim entendeu o Tribunal de Justiça da União Europeia em recente decisão proferida em 13 de Fevereiro de 2014, e que ambas as partes juntaram aos presentes autos. O Tribunal de Justiça apreciou um  pedido de decisão prejudicial apresentado nos termos do artigo 267.º do TFUE, pelo Tribunal Arbitral necessário ( Portugal) no âmbito do processo instaurado por M… Inc. contra A… Ltd, Alter S.A, L… Ltd, S…BV e R…, Unipessoal Lda. Tal pedido de decisão prejudicial teve por objecto, justamente, a mesma questão que se coloca nestes autos, ou seja a interpretação do art.º 13.º do Regulamento (CE) n.º 469/2009 do Parlamento Europeu e do Conselho de 6 de maio de 2009, relativo ao certificado complementar de protecção para os medicamentos e a propósito de um litígio com a mesma natureza daquele que ora nos ocupa, ou seja, a respeito do período máximo de exclusividade conferido pela patente de base e pelo certificado complementar de protecção.

            O Tribunal de Justiça da União Europeia, considerando que a resposta a tal questão não suscita nenhuma dúvida razoável e pode, além disso, ser claramente deduzida da jurisprudência do Tribunal de Justiça[6] declarou que “ o artigo 13.º do Regulamento (CE) n.º 469/2009 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 6 de maio de 2009, relativo ao certificado complementar de protecção para os medicamentos, lido em conjugação com o considerando 9 deste regulamento, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a que um titular de uma patente e de um certificado complementar de protecção possa invocar a totalidade da duração da validade de tal certificado calculada em  aplicação deste artigo 13.º numa situação em que, devido a essa duração, beneficiaria de um período de exclusividade , respeitante a um princípio activo,  superior a quinze anos a partir da primeira autorização de introdução no mercado, na União Europeia, do medicamento que consiste nesse princípio activo ou que o contém.”

           Vejamos então o caso que nos ocupa: Está dado como assente nos autos que a primeira autorização de introdução no mercado (AIM), na EU, dos medicamentos D..., teve lugar em 13-05- 1996, sendo que a patente 00000 foi concedida pelo INPI em 26 de Junho de 1998 e vigorou até 26 de Junho de 2013. Está assente que a R... introduziu no comércio os genéricos V... no dia 1 de Julho de 2013.          

        Ora, no caso em apreço, o “período de exclusividade”, tem de contar-se a partir da concessão da patente e não a partir da concessão da AIM, sendo que esta foi anterior àquela. Como é evidente, não é a AIM que garante a exclusividade, mas sim a titularidade da patente, sendo que esta foi anterior àquela. Assim, o período de exclusividade terminou em 26 de Junho de 2013.

           Como se sabe a obtenção da autorização de introdução no mercado (AIM) é essencial para a comercialização em Portugal do respectivo medicamento (cfr. Artigo 14.º n.º1 do Decreto-Lei n.º 178/2006, de 30 de Agosto- Estatuto do Medicamento). O processo administrativo de obtenção da AIM de um novo medicamento, demora normalmente vários anos até ser deferido, sendo que ocorre em data posterior à data do pedido da patente correspondente, o que reduz o período de validade efectiva do direito de exclusivo concedido pela patente. Ou seja, a entidade titular da patente não pode rentabilizar o direito de exclusividade conferido pela patente, enquanto não lhe foi concedida a autorização de introdução no mercado (AIM). Assim, a protecção efectiva conferida pela patente fica reduzida a um período que será insuficiente para amortizar os investimentos efectuados na investigação e desenvolvimento do medicamento inovador. Por isso é que o legislador comunitário criou a figura do certificado complementar de protecção (CCP), cuja finalidade é a prorrogação do prazo de validade das patentes químico-farmacêuticas, para garantir uma duração efectiva adequada para amortizar os investimentos efectuados na investigação e desenvolvimento do medicamento inovador. Assim, em relação a tal “duração adequada” o legislador comunitário convencionou que um período de exclusividade máximo de 15 anos a partir da primeira AIM é suficiente para garantir ao seu titular uma protecção efectiva.

           Na verdade, os propósitos do Regulamento CCP estão expressamente previstos nos respectivos Considerandos:

           “os medicamentos, nomeadamente os resultantes de uma investigação longa e onerosa, só continuarão a ser desenvolvidos na Comunidade e na Europa se beneficiarem de uma regulamentação favorável que preveja uma protecção suficiente para incentivar tl investigação.”(Considerando 3.º)

          “Actualmente, o período que decorre entre o depósito de um pedido de patente para um novo medicamento e a autorização de introdução no mercado do referido medicamento reduz a protecção efectiva conferida pela patente a um período insuficiente para amortizar os investimentos efectuados na investigação” ( Considerando 4.º)

           Destas circunstâncias resulta uma protecção insuficiente que penaliza a investigação farmacêutica (Considerando 5.º)

           Existe o risco de deslocalização dos centros de investigação situados nos Estados –Membros para países que oferecem uma melhor protecção. (Considerando 6.º)

           É conveniente prever uma solução uniforme a nível comunitário, evitando assim uma evolução divergente das legislações nacionais que origine novas disparidades susceptíveis de entravar a livre circulação dos medicamentos na Comunidade e de, por isso, afectar directamente o funcionamento do mercado interno. (Considerando 7.º).

           É pois necessário prever um certificado complementar de protecção para os medicamentos relativamente aos quais tenha sido dada autorização de introdução no mercado e que possa ser obtido a pedido do titular de uma patente nacional ou europeia nos mesmos termos em cada Estado – Membro. Consequentemente, o regulamento é o instrumento mais adequado.( Considerando 8.º)

           Segue-se o Considerando 9.º que foi objecto de mais pormenorizada análise:

            “A duração da protecção conferida pelo certificado deverá ser determinada de forma a permitir uma protecção efectiva suficiente. Para este efeito, o titular de uma patente e de um certificado deve poder beneficiar no total de um período máximo de quinze anos de exclusividade a partir da primeira autorização de introdução no mercado da Comunidade do medicamento em causa.”

            Ora, da leitura dos considerandos do Regulamento (CE) n.º 469/2009 do parlamento Europeu e do Conselho de 6 de maio de 2009, e do art.º 13.º do Regulamento, bem como do próprio acórdão do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE), supra mencionado, resulta que o certificado complementar de protecção (CCP) é um mecanismo jurídico comunitário criado pelo citado Regulamento para compensar o titular de uma patente químico –farmacêutica pelo período em que sendo titular da patente, contudo ainda não podia, na prática retirar os benefícios económicos respectivos, pelo facto de não ter sido emitida a autorização de introdução no mercado (AIM). Portanto, pressuposto fáctico subjacente à aprovação do Regulamento é que exista uma patente em data anterior à AIM. Só assim se coloca o problema que o Regulamento pretende resolver.

            No caso que ora nos ocupa, a situação é oposta. A AIM foi emitida em data anterior à própria concessão da patente. Na verdade, a AIM data de 13 de maio de 1996 e a patente foi concedida pelo INPI em 26 de Junho de 1998. Resulta, portanto, que no caso em apreço, não se verifica a situação de desprotecção do titular da patente que justificou a criação do CCP. Logo, não se justifica, a extensão prevista no art.º 13.º do Regulamento CCP. Porém, com uma excepção: a que resulta da aplicação do Regulamento (CE) n.º 1901/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho de 12 de Dezembro de 2006, relativo a medicamentos para uso pediátrico. O objectivo prosseguido por este Regulamento consiste em compensar os esforços efectuados para avaliar os efeitos pediátricos do medicamento em causa[7]. Por conseguinte, decorre da leitura conjugada dos Regulamentos (CE) n.º 469/2009 de 6 de maio de 2009 e n.º1901/2006 que o CCP e a prorrogação pediátrica conferem, em conjunto, ao titular de uma patente de base, um direito exclusivo de uma duração máxima de quinze anos e seis meses, a partir da data da concessão da primeira AIM do medicamento na União[8].

           Como já resulta do exposto, isto é assim, pressupondo que a AIM é posterior à concessão da patente, pois se não for, como é o caso sub judice, o período de quinze anos tem obviamente de ser contado após a data da concessão da patente, pois antes, não há qualquer direito de exclusividade que só é conferido pela patente e não pela AIM.

            No caso como o que nos ocupa, em que a AIM é anterior à concessão da patente, o respectivo titular já beneficiou do período de exclusividade de 15 anos e mais o período que mediou entre a AIM e a concessão da patente, ou seja, mais de dois anos, Logo, temos de considerar que o CCP 00, terá uma duração igual a zero e o ponto de partida da prorrogação pediátrica de seis meses.

            Conclui-se portanto que a validade do CCP 00 não termina em 19 de março de 2014, mas sim em 26 de Dezembro de 2013 (26 de Junho de 2013 + seis meses de prorrogação pediátrica).

            Assim, em 1 de Julho de 2013, data em que a R... introduziu no comércio os genéricos V... ainda estava em vigor o direito exclusivo de exploração da invenção a que se referem a Patente 00000 e o CCP 00, com a respectiva extensão pediátrica.

           Nesta conformidade, encontravam-se preenchidos os requisitos legais para o decretamento das providências cautelares, tal como decidido no acórdão arbitral, devendo apenas ser alterada a data do prazo do CCP 00 que deverá entender-se válido até 26 de Dezembro de 2013.

            IV-DECISÃO

           Face ao exposto, acordamos neste Tribunal da Relação de Lisboa, em julgar parcialmente procedente o recurso e, consequentemente, confirmar a decisão arbitral na parte em que julgou procedentes os pedidos de providências cautelares, alterando a data de vigência das mesmas cujo termo se fixa em 26 de Dezembro de 2013.

           Custas pela Apelante e pelas Apeladas na proporção de  2/3 para a primeira e 1/3 para estas.

            Lisboa, 27 de Março de 2014

            Maria de Deus Correia

            Maria Teresa Pardal

            Carlos de Melo Marinho


[1] José Lebre de Freitas, A. Montalvão Machado e Rui Pinto, Código de Processo Civil Anotado, Vol.2.º, 2.ª edição, Coimbra Editora, p.704.
[2]Idem”.
[3] Vide Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 18-03-2010, disponível em www.dgsi.pt
[4] António Santos Abrantes Geraldes, Temas da Reforma do Processo Civil, III volume, Almedina, 1998, p.75.
[5] José de Oliveira Ascensão, O Direito, Introdução e teoria geral, Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, p.351.
[6] Nomeadamente do despacho de 14 de Novembro de 2013, Astrazeneca ( C-617/12, ainda não publicado na Colectãnea) e que decidiu que “ o titular de uma patente e de um certificado não deve poder beneficiar de um período superior a quinze anos de exclusividade a partir da data da primeira AIM, concedida na União, do medicamento em causa.”
[7] Vide a este propósito Acórdão do Tribunal de Justiça da União Europeia de 8 de Dezembro de 2011, Processo C- 125/10 M… Corp., antiga M…& Co. Inc. contra D…, disponível in eur-lex.europa.eu/lex

[8] Idem.