Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | DURO MATEUS CARDOSO | ||
Descritores: | SUSPENSÃO DA INSTÂNCIA CAUSA PREJUDICIAL ACÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE DESPEDIMENTO COLECTIVO PRESCRIÇÃO | ||
Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 05/29/2019 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | CONFIRMADA A SENTENÇA | ||
Sumário: | I - Decorre do art. 327º-2 do CC que quando se trate de absolvição da instância o novo prazo prescricional começa a correr logo após o acto interruptivo. II- Não é aplicável o prazo de dois meses estabelecido no art. 327º-3 do CC quando a absolvição da instância é imputável à autora que apresentou na acção de despedimento colectivo uma coligação ilegal de pedidos. III- Tendo havido já decisão judicial a julgar ilícito o despedimento da autora e a determinar a sua reintegração, embora ainda sem trânsito em julgado, em acção intentada antes do completar do prazo prescricional previsto no art. 337º-1 do CT/2009 na primeira acção, uma vez que existe a possibilidade de a mesma vir a ser confirmada e a transitar em julgado, tal implicando a reposição ou retoma da vigência jurídica do contrato de trabalho que foi celebrado entre autora e ré, sempre a autora poderá vir a ter a possibilidade de invocar os mesmos créditos no prazo de um ano após nova e futura cessação do contrato de trabalho, por força do art. 337º-1 do CT/2009. IV- Tal possibilidade não se compagina com uma eventual decisão, neste momento, de consideração dos efeitos da ocorrência da invocada prescrição relativamente à primeira acção, sob pena de se estar a impedir, nesta altura, o exercício de um direito que a apelante pode, eventualmente, ter o direito de exercer mais tarde. V- Justifica-se por isso a suspensão da instância relativamente à 1ª acção por existência de causa prejudicial. | ||
Decisão Texto Parcial: | |||
Decisão Texto Integral: | Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa I- AAA, intentou no Juízo de Trabalho de Sintra a presente acção declarativa, com processo comum, CONTRA, BBB, LDA. II- PEDIU o pagamento de trabalho suplementar, nocturno, e em dias de descanso e feriados, bem como descansos compensatórios. III- ALEGOU, em síntese, que: - Os créditos peticionados estão prescritos; - No âmbito do processo especial de despedimento colectivo a correr termos com o nº 610/16.4T8SNT, o despedimento da autora foi considerado ilícito por decisão de 24/10/2017; - Tal decisão foi objeto de recurso por parte da ré e ainda está pendente de decisão no Tribunal da Relação e se for revogada e o despedimento for considerado lícito, o contrato de trabalho da autora considera-se cessado em 9.8.2015; - Se assim ocorrer presente ação foi proposta já depois de decorrido o prazo de prescrição de 1 ano a que alude o art. 337º, nº 1, do CT. - As quantias agora pedidas foram também peticionadas na acção de despedimento colectivo tendo a aqui também ré sido absolvida da instância quanto aos mesmos pedidos por cumulação ilegal de pedidos, por decisão de 24/10/2017. IV- A autora RESPONDEU à contestação dizendo, em síntese, nesta parte agora com interesse, que não se verifica a prescrição atentos os efeitos interruptivos consignados nos arts. 326º e 327º do CC. Dispensou-se a realização de Audiência prévia e foi elaborado despacho saneador em que se decidiu pela forma seguinte: “Nos termos do art. 337º, nº 1, do CT, o crédito de empregador ou de trabalhador emergente de contrato de trabalho, da sua violação ou cessação, prescreve decorrido um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho. O contrato de trabalho da autora cessou em 9.8.2015, por despedimento. Porém, o despedimento em questão foi declarado ilícito e a ré foi condenada a reintegrar a autora. Por força desta decisão, o contrato de trabalho foi reposto em vigor e mantém-se plenamente válido e em execução. Esta decisão não transitou em julgado porque a ré interpôs recurso que ainda não foi decidido. Se a decisão vier a ser revogada e o despedimento vier a ser declarado lícito, então o contrato de trabalho cessou em 9.8.2015 e a prescrição poderá ter ocorrido face ao disposto nos arts. 323º, 326º e 327º, do CC, pois o novo prazo de prescrição de 1 ano não se conta do trânsito em julgado da decisão de absolvição da instância, mas sim a partir do ato interruptivo. Porém, se a decisão for confirmada, como o contrato é reposto em vigor nem sequer existe prazo de prescrição em curso. Conclui-se, do exposto, que a decisão que vier a ser proferida quanto à licitude ou ilicitude do despedimento influencia diretamente a solução a dar à questão da prescrição. Nos termos do art. 272º, nº 1, do Código de Processo Civil, o tribunal pode ordenar a suspensão quando a decisão da causa estiver dependente do julgamento de outra já proposta. Esta norma permite assim a suspensão quando existir uma causa prejudicial. Uma ação é prejudicial doutra sempre que, naquela, se ataca um ato ou facto jurídico que é pressuposto necessário desta. A relação de dependência entre uma ação e outra, como causa de suspensão da instância, assenta no facto de numa ação se discutir, em via principal, uma questão que é essencial para a decisão da outra, em termos de a decisão proferida numa ser suscetível de inutilizar os efeitos pretendidos na outra, por a resolução da primeira - a prejudicial -, por si, só poder modificar uma situação jurídica que tem de ser considerada para a decisão da segunda - a dependente. Assim, é de concluir que existe uma relação de prejudicialidade entre a decisão sobre a ilicitude do despedimento que é objeto da ação nº 610/16.4T8SNT e estes autos, devendo, consequentemente, ser suspensa a instância até tal questão ser decidida. * Face ao exposto, nos termos do art. 272º, nº 1, do Código de Processo Civil, declaro suspensa a instância até à decisão, com trânsito em julgado, sobre a licitude ou ilicitude do despedimento da autora no âmbito da ação nº 610/16.4T8SNT, visto a mesma constituir causa prejudicial relativamente à prescrição invocada nos presentes autos. Consequentemente, fica sem efeito o julgamento designado. Notifique.” Desta decisão a autora interpôs recurso de Apelação, apresentando as seguintes conclusões: 1.ª Com a interposição da ação que aprecia a regularidade do despedimento da A. cumulou a mesma o pedido de pagamento do trabalho suplementar tendo interrompido a prescrição com a citação realizada no âmbito desta ação; 2.ª De acordo com o art.º 326º, do CC, a interrupção inutiliza todo o tempo decorrido da prescrição; 3.ª Nos termos do art.º 327º nº 1 e 2, a contagem do novo prazo prescricional apenas se inicia com o trânsito em julgado da decisão no processo que a interrompeu; 4.ª Tendo o despacho de 24/10/2017, absolvido o R. da instância, a contagem do novo prazo de 1 ano iniciar-se-á com o trânsito em julgado ocorrido a 13/11/2017; 5.ª Ao interpor a ação em 26/09/2018 a A. a mesma foi interposta dentro do referido prazo de 1 ano; 6.ª Não estando em causa a existência de prescrição nos termos do art.º 337º, do CT, por ter sido interrompida com a interposição da primeira ação, erra a Meritíssima Juíza ao declarar a suspensão da instância por causa prejudicial; Termos em que, Venerandos Juízes Desembargadores: a) Devem V. Exas, Venerandos Desembargadores, julgar procedente, por provado, o presente recurso, decidindo, pelos erros de julgamento contidos no despacho de 08/01/2019. E assim se fazendo a costumada JUSTIÇA! A ré contra-alegou (fols. 273 v. a 275), pugnando pela improcedência do recurso. Correram os Vistos legais tendo a Digna Procuradora-Geral Adjunta do Ministério Público emitido Parecer (fols. 284), no sentido da confirmação da decisão recorrida. V- Os factos considerados provados, não impugnados, são os seguintes: 1- A presente ação foi instaurada em 26.9.2018. 2- A autora foi despedida pela ré em 9.8.2015 no âmbito de um despedimento coletivo. 3- A autora impugnou o referido despedimento no âmbito do processo de impugnação de despedimento coletivo nº 610/16.4T8SNT e aí peticionou as verbas que pede nesta ação. 4- Por decisão de 24.10.2017, proferida na ação de impugnação de despedimento coletivo, a ré foi absolvida da instância quanto a esses pedidos por se ter considerado que existia uma coligação ilegal de pedidos. 5- A decisão referida em 4) transitou em julgado em 13.11.2017. 6- Por decisão de 24.10.2017, proferida na ação de impugnação de despedimento coletivo, foi declarado ilícito o despedimento da autora e a ré foi condenada a reintegrá-la no seu posto de trabalho, atribuindo-lhe funções inerentes à sua categoria profissional, sem prejuízo da sua antiguidade. 7- A ré interpôs recurso desta decisão, o qual ainda não se encontra decidido. 8. A ação de impugnação de despedimento coletivo nº 610/16.4T8SNT foi instaurada em 11.1.2016. * Atento o disposto no art. 662º-1 do CPC e porque com interesse para a decisão da causa, após consulta também dos autos de impugnação de despedimento coletivo nº 610/16.4T8SNT, aditam-se dois factos provados com os nºs 8 e 9 e as seguintes redacções: 8- A ré Mondelez foi citada nos autos de impugnação de despedimento coletivo nº 610/16.4T8SNT no dia 22/1/2016, conforme aviso de recepção postal de fols. 217 daqueles autos. 9- A ré Mondelez foi citada nos presentes autos no dia 4/10/2018, conforme aviso de recepção postal de fols. 138. VI- Nos termos dos arts. 635º-4, 637º-2, 608º-2 e 663º-2, todos do CPC/2013, o âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação; os tribunais de recurso só podem apreciar as questões suscitadas pelas partes, salvo se importar conhecê-las oficiosamente. Atento o teor das conclusões das alegações apresentadas pelo apelante, a questão que fundamentalmente se coloca no presente recurso é a de saber se a suspensão da instância não deveria ter sido decretada. VII- Decidindo Sustenta a apelante ter havido uma interrupção do prazo de prescricional previsto no art. 337º-1 do CT/2009 por força da citação ocorrida na acção de despedimento colectivo em que os mesmos pedidos foram deduzidos, atento o disposto nos arts. 323º, 326º e 327º, todos do CC. E, assim sendo, iniciando-se novo prazo de 1 ano a partir do trânsito em julgado da decisão de absolvição da instância (13/11/2017), é manifesto que a prescrição só ocorreria a 13/11/2018 enquanto que a presente acção foi interposta a 26/9/2018. Conclui que não havendo possibilidade de ocorrer a prescrição não se coloca sequer a possibilidade e existência de causa prejudicial. Mas não é inteiramente assim como a autora/apelante coloca as coisas. Atentemos. Decorre do art. 327º-2 do CC que quando se trate de absolvição da instância o novo prazo prescricional começa a correr logo após o acto interruptivo, ou seja, no caso que nos ocupa, o novo prazo começou a correr desde a data da citação da ré ocorrida nos autos de despedimento colectivo (P. nº 610/16.4T8SNT), ou seja a 22/1/2016 (facto provado nº 8). Seguro também que não é aplicável sequer o prazo de dois meses estabelecido no art. 327º-3 do CC na medida que a absolvição da instância é imputável à autora que apresentou na acção de despedimento colectivo uma coligação ilegal de pedidos. Também não é possível fazer apelo ao disposto no art. 279º-2 do CPC, mesmo para quem defende que este regime é adicionável ao regime do art. 327º-2-3 do CC (Veja-se neste sentido o Prof. Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, 1º vol., 3ª ed., pag. 552, e em sentido contrário António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, Código de Processo Civil Anotado, Vol. 1º, pags. 326 e 327), uma vez que tendo a decisão de absolvição da instância transitado a 13/11/2017, a presente acção só foi intentada a 26/9/2018 (factos provados nºs 1 e 4), ou seja, muito para além dos 30 dias previstos naquele art. 279º-2 do CPC. Portanto, a 22/1/2016 iniciou-se novo prazo prescricional de 1 ano que se completou a 23/1/2017, muito antes sequer da instauração desta acção a 26/9/2018 (facto provado nº 1). Porém, tendo havido já decisão judicial proferida a 24/10/2017 a julgar ilícito o despedimento da autora e a determinar a sua reintegração, embora ainda sem trânsito em julgado (factos provados nºs 6 e 7), ou seja, na acção intentada antes do completar daquele prazo prescricional ocorrido a 23/1/2017, e uma vez que existe a possibilidade de a mesma vir a ser confirmada e transitar em julgado, tal implicando a reposição ou retoma da vigência jurídica do contrato de trabalho que foi celebrado entre autora e ré, sempre a autora poderá vir a ter a possibilidade de invocar estes mesmos créditos no prazo de um ano após nova e futura cessação do contrato de trabalho, por força do art. 337º-1 do CT/2009, não se podendo compaginar esta realidade jurídica com uma eventual decisão, neste momento, de consideração dos efeitos da ocorrência da invocada prescrição. Isto sob pena de se estar a impedir, nesta altura, o exercício de um direito que a apelante pode, eventualmente, ter direito de exercer mais tarde por via da ilicitude do seu despedimento. Aliás, por isso e acertadamente, a ré só invocou a prescrição dos créditos “à cautela” para o caso de o despedimento vir a ser declaro lícito (art. 9º da contestação). Daí que, também acertadamente, o despacho recorrido considerou existir uma causa prejudicial e decidiu suspender a instância até à decisão, com trânsito em julgado, sobre a licitude ou ilicitude do despedimento da autora no âmbito da ação nº 610/16.4T8SNT. Por isso, a apelação improcede. VIII- Pelo exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar a apelação improcedente, confirmando-se a decisão recorrida de suspensão da instância. Custas da apelação a cargo da apelante/autora. Lisboa, 29 de Maio de 2019 Duro Mateus Cardoso Albertina Pereira Leopoldo Soares |