Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
1262/22.8T8VFX-A.L1-6
Relator: ANABELA CALAFATE
Descritores: DESPEJO
RESOLUÇÃO DO CONTRATO
FALTA DE PAGAMENTO DA RENDA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 04/13/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I – O diferimento de desocupação do locado para habitação é decidido de acordo com o prudente arbítrio do tribunal, devendo o juiz ter em consideração as exigências da boa-fé.
II – A apelante beneficia de habitação sem pagar rendas à senhoria desde Fevereiro de 2019, sabe desde 15/06/2019 que o contrato de arrendamento foi resolvido por falta de pagamento das rendas e ainda assim, nem sequer demonstrou que já diligenciou por obter habitação social, apesar de alegar que não se consegue de um dia para o outro.
III – Assim, as exigências da boa fé impõem a confirmação da decisão proferida em 31/01/2023 que indeferiu o pedido de diferimento da desocupação do imóvel formulado em 28/10/2022.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na 6ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa

I – Relatório
M… instaurou procedimento especial de despejo no Banco Nacional de Arrendamento em 03/03/2020 contra S…, invocando ter procedido à resolução do contrato de arrendamento por falta de pagamento de rendas.
A requerida foi notificada conforme carta de 02/02/2021 enviada pelo BNA.
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Em 25/01/2022 foi o requerimento de despejo convertido em título de desocupação.
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Na sequência de requerimento apresentado pela requerida, foram os autos distribuídos em 08/04/2022 ao Juízo Local Cível de Vila Franca de Xira - Juiz 1.
Em 20/04/2022 foi proferido o seguinte despacho:
«A requerida vem apresentar pedido de suspensão de desocupação do locado, incidente esse que se encontra previsto no art.º 15º-M do N.R.A.U.
No entanto, não se verificam os pressupostos prévios para apreciação do referido incidente.
Com efeito, desde logo não foi requerida autorização judicial para entrada no domicílio dos requeridos nos termos e com os requisitos do art.º 15º-L, nºs 1 e 2, als. a) e b) do N.R.A.U., a qual se impõe quando o locatário não desocupe o locado de livre vontade, como também não consta terem sido encetadas as diligências executórias nem observado o disposto no art.º 15º-M, nºs 2 e 3 do N.R.A.U.
Nessa medida, indefiro liminarmente o pedido de suspensão de desocupação do locado, sem prejuízo da sua apreciação ulterior observado que esteja o anteriormente referido.
Notifique.
Dê baixa e devolva ao BNA.».
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Em 26/04/2022 foi apresentado requerimento nestes termos:
«M…, na qualidade de Requerente nos autos à margem referenciados, notificada que foi do despacho de 21.04.2022, vem por este meio requerer a V. Exª que tome, com a máxima urgência possível, as diligências necessárias para que seja obtida a autorização judicial para entrada do locado com o auxílio dos órgãos de polícia criminal, devidamente fundamentado, nos termos do artigo 15º-L, n.ºs 1 e 2, alíneas a) e b) do NRAU, bem como que sejam tomadas as diligências a que se refere o artigo 15-M, n.ºs 2 e 3 do NRAU, em virtude de a Requerente ter por certo que os requeridos não irão colaborar para a celeridade da resolução do presente litigio que já se perpetua há demasiado tempo.».
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Em 20/06/2022 foi proferido o seguinte despacho:
«A Sra. Agente de Execução veio requerer autorização judicial para entrada no domicílio nos termos e para os efeitos do art.º 15º-L, nº 1 do N.R.A.U., tendo utilizado o modelo de requerimento a que alude o art.º 12º da Portaria nº 9/2013, de 10.01., e junto os documentos a que alude o nº 2 do mencionado art.º 15º-L.
Todavia, compulsados os autos verifica-se que não foi cumprido o disposto no art.º 15º-D, nº 2 do NRAU quanto ao cônjuge da arrendatária requerida, devendo o mesmo ser igualmente notificado nos termos e para os efeitos do nº 1 de tal preceito, dado que o locado é desde logo casa de morada de família.
Tal assim é imposto pelo disposto no art.º 15º-B, nº 3 do NRAU e ainda no art.º 6º, nºs 1 e 2 do D.L. nº 1/2013 de 07.01., nos termos do qual a notificação ao cônjuge do arrendatário, quando o locado constitua casa de morada de família, é efetuada para o local arrendado nos termos do nº 3 do art.º 15º-D do NRAU.
Nessa medida, foi violado o disposto no art.º 15º- D do NRAU nos termos acima expostos, pelo que, ao abrigo do art.º 15º-L, nº 4, al. c) do NRAU recuso a autorização para entrada no domicílio.
Notifique.
Dê baixa.».
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Em 18/07/2022 foram os autos remetidos ao BNA.
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Em 28/10/2022 a requerida S… pediu o diferimento da desocupação do imóvel pelo prazo mínimo de 90 dias.
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A requerente M… opôs-se o pedido de diferimento da desocupação.
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E em 31/01/2023 foi proferida a seguinte decisão:
«S…, requerida nos autos de procedimento especial de despejo, deduziu incidente em 28.10.2022, no decurso do prazo de oposição do requerido C…, seu cônjuge consigo residente no locado, pedindo o diferimento da desocupação do locado pelo prazo mínimo de 90 dias, a fim de procurar outra habitação.
Para o efeito alegou que vive com o seu cônjuge e com a sua filha menor, tendo apenas como rendimento o rendimento social de inserção.
Mais referiu que até ao momento não conseguiu arranjar qualquer habitação, não obstante tenha já efetuado esforços nesse sentido, e que está a atravessar muitas dificuldades, visto ter vários problemas de saúde, correndo risco de subsistência e vivendo da ajuda de amigos e família.
Acresce que tem várias crises de asma e desequilíbrio de audição, sofrendo ainda de depressão, encontrando-se muito alterada ao receber a notificação de que iria ser despejada.
O seu cônjuge tem problemas de saúde, de entre os quais depressão agravada com consultas de psiquiatria, estando por isso numa luta contra o tempo para arranjar uma habitação.
A convite do Tribunal juntou documento comprovativo do que aufere a título de rendimento social de inserção e da data desde o qual o aufere.
Indicou testemunhas.
Notificada, a requerente veio informar ter idade avançada e necessitar dos rendimentos do imóvel face ao atual elevado custo de vida, encontrando-se sem receber qualquer renda por parte dos requeridos desde 2019, pretendendo o despejo imediato.
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II.
Dos elementos e documentos constantes dos autos resulta desde logo assente e comprovado, com relevância, a seguinte fatualidade:
1) Por escrito datado de 31.03.2016 a requerente deu de arrendamento à requerida, para habitação própria, o prédio urbano sito em Rua …, nº …, 1ºB, P…, Vila Franca de Xira, inscrito na matriz sob o art.º …, pela renda mensal de €270,00, a ser paga no primeiro dia útil do mês anterior a que respeitasse, com início em 01.04.2016 e pelo prazo de cinco anos, renovável por iguais períodos.
2) No ato da subscrição do escrito anteriormente referido a requerida pagou a importância de € 540,00 correspondente ao mês de caução e à renda do mês de abril de 2016.
3) A requerida e o requerido, fiador no contrato referido em 1), não pagaram as rendas de Fevereiro de 2019 e dos meses subsequentes.
4) Foi efetuada a notificação da requerida, por contato pessoal de solicitador de execução, em 15.06.2019, através da qual a requerente deu conhecimento à requerida de que considerava resolvido o contrato de arrendamento referido em 1) em virtude da falta de pagamento das rendas referentes aos meses de Fevereiro de 2019 a Maio de 2019.
5) A requerida aufere rendimento social de inserção no valor de € 455,18 desde 10.05.2016.
6) A requerida reside no locado com o requerido e com uma filha menor.
7) O requerido sofre de patologia depressiva major, patologia degenerativa da coluna cervical e epicondilite bilateral.
8) A requerida sofre de patologia depressiva major, patologia degenerativa da coluna e anemia.
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III.
Dispõe o art.º 15º-N, nº 1 do N.R.A.U. que, no caso de imóvel arrendado para habitação, dentro do prazo para a oposição ao procedimento especial de despejo, o arrendatário pode requerer ao juiz do tribunal judicial da situação do locado o diferimento da desocupação, por razões sociais imperiosas, devendo logo oferecer as provas disponíveis e indicar as testemunhas a apresentar, até ao limite de três.
Estatui ainda o nº 2 de tal preceito que o diferimento de desocupação do locado para habitação é decidido de acordo com o prudente arbítrio do tribunal, devendo o juiz ter em consideração as exigências da boa-fé, a circunstância de o arrendatário não dispor imediatamente de outra habitação, o número de pessoas que habitam com o arrendatário, a sua idade, o seu estado de saúde e, em geral, a situação económica e social das pessoas envolvidas, só podendo ser concedido desde que se verifique algum dos seguintes fundamentos:
a) Que, tratando-se de resolução por não pagamento de rendas, a falta do mesmo se deve a carência de meios do arrendatário, o que se presume relativamente ao beneficiário de subsídio de desemprego, de valor igual ou inferior à retribuição mínima mensal garantida, ou de rendimento social de inserção;
b) Que o arrendatário tem deficiência com grau comprovado de incapacidade igual ou superior a 60%.
No caso em apreço a requerida veio invocar dificuldades económicas como justificação para o não pagamento de rendas, resultando da factualidade provada que de fato a requerida recebe rendimento social de inserção.
Todavia, a mesma recebe tal rendimento social de inserção desde 10.05.2016, um mês e meio depois da celebração do contrato de arrendamento, tendo sempre pago as rendas, só tendo deixado de o fazer desde Fevereiro de 2019.
Assim, não alega a requerente factos de onde se infira que tenha deixado de pagar as rendas em virtude da sua carência económica superveniente.
Desconhece-se, por outro lado, qual o rendimento auferido pela requerida e/ou pelo requerido à data da celebração do contrato de arrendamento, sendo certo que nessa data – e um mês e meio antes da requerida passar a auferir rendimento social de inserção – a mesma entregou €540,00 à requerente a título de caução e da renda do mês de Abril.
Deste modo, uma vez que que a requerida pagou as rendas devidas desde o início do arrendamento até Janeiro de 2019, não é possível concluir que a falta do pagamento das rendas desde Fevereiro de 2019 se tenha devido à sua carência de meios.
Acresce que, pese embora o alegado e comprovado quanto às patologias de que os requeridos padecem, não padece a requerida de deficiência com grau comprovado de incapacidade igual ou superior a 60%.
Termos em que, não se verificando o condicionalismo previsto na alínea a) do nº 2 do art.º 15º-N do N.R.A.U., nem o previsto na sua alínea b), não se encontram reunidos os pressupostos para o diferimento da desocupação do locado.
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IV.
Termos em que, face ao exposto, ao abrigo do art.º 15º-0, nº 1, als. b) e c) do N.R.A.U., indefiro liminarmente o pedido de diferimento de desocupação do locado formulado.
Fixo o valor do incidente em €9.180,00 (art.º 304º, nº 1, 1ª parte do C.P. Civil e art.º 26º do D.L. nº 1/2013, de 07.01.).
Custas do incidente pela requerida, sem prejuízo do apoio judiciário concedido – art.º 22º, nº 4, al. b) do D.L. nº 1/2013, de 07.01. e 527º, nºs 1 e 2 do C.P. Civil.
Registe e notifique.
Dê baixa.
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Consigna-se que o disposto no art.º 6º-E, nº 7, al. c) da Lei nº 1-A/2020, de 19.03., na sua redação atual, pressupõe a dedução do competente incidente aquando da execução do ato de entrega do locado, se concedida previamente a competente autorização judicial e caso não se verifique o previsto no art.º 15º-M,
nºs 2 a 4 do N.R.A.U. quanto à suspensão da desocupação do locado.
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Comunique ao B.N.A. e oportunamente devolva.».
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Inconformada, apelou a requerida S…, terminando a alegação com as seguintes conclusões:
«1º - O Douto Despacho não faz a correcta aplicação do direito aos factos.
2º - O art.º 15º-N n.º 1 NRAU permite ao arrendatário, no caso de despejo de imóvel arrendado para habitação, diferir a desocupação por razões sociais imperiosas, devendo, nomeadamente, ponderar-se a circunstância de o arrendatário não dispor imediatamente de outra habitação, o número de pessoas que com ele habitam, a sua idade, o seu estado de saúde e, em geral, a situação económica e social das pessoas envolvidas (nº 2 do art.º 15º-N NRAU).
3º A requerente não dispõe de outro local para a habitar para lá do imóvel ajuizado, nem dispõem de capacidade económica (vive com o marido e uma filha menor, tendo um rendimento muito baixo), para procurar outra casa no mercado normal da habitação, restando-lhe o recurso à habitação social que, como é sabido de todos, não se consegue de um dia para o outro, acrescendo que a sua situação precária tem vindo a agravar-se.
4º - Com efeito, o mercado imobiliário atualmente está impossível, com rendas muito inflacionadas.
5º - Acresce que o credor não sairá assim tão prejudicado com a espera, para satisfação do comando constitucional de a todos assegurar o direito a uma habitação (art.º 65º da CRP).
6º - De facto, ponderando os prejuízos com o protelamento da situação até ao prazo requerido para diferimento, o prejuízo da requerente com a entrega imediata, superará em muito o da Proprietária, e assim estar-se-á a dar cumprimento aquele desígnio constitucional.
7º - Ora, na situação sub judice, temos que o incidente em causa foi deduzido atempadamente.
8º - A recorrente, cumpriu todas as formalidades: alegou de forma pormenorizada e concisa os fundamentos plasmados nas alíneas a) a b) do n.º 2 art.º 15-N, in fine, que preenche na totalidade e arrolou testemunhas.
9º - Pelas razões alegadas, se a desocupação suceder, a aqui recorrente cairá numa dessas situações, uma vez que, entre outras coisas, carece de rendimentos, não tendo ninguém que a possa auxiliar.
10º - Perante todo o cenário desolador do ponto de vista económico e social que ficou descrito nas alegações, está de todo justificado o diferimento da entrega do local em causa.
11º - Tal diferimento deverá ser por um período não inferior a 90 dias, para se dar oportunidade à requerente de encontrar uma nova habitação e refazer a sua vida, sem o risco máxime de cair na desgraça.
12º - Tal diferimento, não afecta o direito fundamental à habitação do proprietário, na medida em que este não carece da habitação para sua residência.
13º - O Douto Despacho recorrido, viola por errada interpretação a aplicação do disposto nos art.º 15º-N n.º 1 e 2 da NRAU e art.º 65º CRP.
Nestes Termos, deve ser dado provimento ao recurso e revogado o Douto Despacho recorrido.»
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Não há contra-alegação.
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Colhidos os vistos, cumpre decidir.
II – Questões a decidir
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação da apelante, sem prejuízo de questões de conhecimento oficioso, pelo que a questão a decidir é:
- se estão reunidos os requisitos para o diferimento da desocupação do imóvel de que a apelante foi arrendatária
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III – Fundamentação
A) Além do que consta na decisão recorrida é de considerar provado:
A apelante nasceu em 15/12/1970 (cfr Declaração da Segurança Social em que informa que é beneficiária do RSI).
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B) O Direito
Sustenta a apelante que a decisão recorrida viola o disposto nos art.º 15º-N n.º 1 e 2 do NRAU e no art.º 65º CRP.
O art.º 65º da Constituição da República Portuguesa estabelece:
«1. Todos têm direito, para si e para a sua família, a uma habitação de dimensão adequada, em condições de higiene e conforto e que preserve a intimidade pessoal e a privacidade familiar.
2. Para assegurar o direito à habitação, incumbe ao Estado:
a) Programar e executar uma política de habitação inserida em planos de ordenamento geral do território e apoiada em planos de urbanização que garantam a existência de uma rede adequada de transportes e de equipamento social;
b) Promover, em colaboração com as regiões autónomas e com as autarquias locais, a construção de habitações económicas e sociais;
c) Estimular a construção privada, com subordinação ao interesse geral, e o acesso à habitação própria ou arrendada;
d) Incentivar e apoiar as iniciativas das comunidades locais e das populações, tendentes a resolver os respectivos problemas habitacionais e a fomentar a criação de cooperativas de habitação e a autoconstrução.
3. O Estado adoptará uma política tendente a estabelecer um sistema de renda compatível com o rendimento familiar e de acesso à habitação própria.
4. O Estado, as regiões autónomas e as autarquias locais definem as regras de ocupação, uso e transformação dos solos urbanos, designadamente através de instrumentos de planeamento, no quadro das leis respeitantes ao ordenamento do território e ao urbanismo, e procedem às expropriações dos solos que se revelem necessárias à satisfação de fins de utilidade pública urbanística.
5. É garantida a participação dos interessados na elaboração dos instrumentos de planeamento urbanístico e de quaisquer outros instrumentos de planeamento físico do território.».
Portanto, este comando constitucional refere o direito à habitação, especificando as obrigações do Estado para garantir esse.
Por sua vez, o art.º 15º-N do NRAU prevê:
«1 - No caso de imóvel arrendado para habitação, dentro do prazo para a oposição ao procedimento especial de despejo, o arrendatário pode requerer ao juiz do tribunal judicial da situação do locado o diferimento da desocupação, por razões sociais imperiosas, devendo logo oferecer as provas disponíveis e indicar as testemunhas a apresentar, até ao limite de três.
2 - O diferimento de desocupação do locado para habitação é decidido de acordo com o prudente arbítrio do tribunal, devendo o juiz ter em consideração as exigências da boa-fé, a circunstância de o arrendatário não dispor imediatamente de outra habitação, o número de pessoas que habitam com o arrendatário, a sua idade, o seu estado de saúde e, em geral, a situação económica e social das pessoas envolvidas, só podendo ser concedido desde que se verifique algum dos seguintes fundamentos:
a) Que, tratando-se de resolução por não pagamento de rendas, a falta do mesmo se deve a carência de meios do arrendatário, o que se presume relativamente ao beneficiário de subsídio de desemprego, de valor igual ou inferior à retribuição mínima mensal garantida, ou de rendimento social de inserção;
b) Que o arrendatário tem deficiência com grau comprovado de incapacidade igual ou superior a 60 /prct..
3 - No caso de diferimento decidido com base na alínea a) do número anterior, cabe ao Fundo de Socorro Social do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social pagar ao senhorio as rendas correspondentes ao período de diferimento, ficando aquele sub-rogado nos direitos deste.».
Resulta deste normativo legal que o juiz deve ter em consideração as exigências da boa fé.
Como a apelante sustenta que não dispõe no imediato de outra habitação, importa sublinhar:
- o contrato de arrendamento teve início em 01/04/2016 e a apelante não paga rendas desde Fevereiro de 2019;
- a apelante foi notificada em 15/06/2019 de que a senhoria/apelada considerava resolvido o contrato de arrendamento em virtude da falta de pagamento das rendas referentes aos meses de Fevereiro de 2019 a Maio de 2019,
- e foi notificada da instauração do procedimento especial de despejo por carta do BNA de 02/02/2021;
- em 28/10/2022 veio requerer o diferimento da desocupação pelo prazo mínimo de 90 dias.
Significa que desde há vários anos que a apelante poderia ter tratado de procurar habitação social, não fazendo sentido por isso dizer agora que «não se consegue de um dia para o outro».
Além disso, como se pondera na decisão recorrida, não se mostra que a situação económica que a apelante invoca tenha sofrido alteração desde a data da celebração do contrato.
Em suma, desde Fevereiro de 2019, ou seja, desde os seus 48 anos de idade que a apelante beneficia de habitação sem pagar rendas à senhoria e desde 15 de Junho desse mesmo ano sabe que o contrato de arrendamento foi resolvido por falta de pagamento das rendas, mas ainda assim, nem sequer demonstrou que já diligenciou por obter habitação social.
Perante isto, só podemos concluir que as exigências da boa fé impedem que seja deferida a sua pretensão, impondo-se a confirmação da decisão recorrida.
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IV – Decisão
Pelo exposto, julga-se improcedente a apelação, confirmando-se a sentença recorrida.
Custas pela apelante, sem prejuízo da protecção jurídica.

Lisboa, 13 de Abril de 2023
Anabela Calafate
António Manuel Fernandes dos Santos
Ana de Azeredo Coelho