Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
760/16.7PCAMD-A.L1-3
Relator: MORAES ROCHA
Descritores: PROCESSO TUTELAR
MEDIDA CAUTELAR
IMPEDIMENTO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 04/11/2018
Votação: DECISÃO INDIVIDUAL
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: CONFLITO DE COMPETÊNCIA – INQUÉRITO - PROCESSO TUTELAR EDUCATIVO
Sumário: I– As medidas de coacção a aplicar a um arguido em processo crime e a medida cautelar de guarda em Centro Educativo em regime aberto, aplicada em processo tutelar educativo, são respostas jurídicas substancialmente distintas entre si, tal como as finalidades de uma e outra divergem na sua natureza.

II– Atento a diferença entre os dois sistemas (o do CPP e o da LTE), não se compreende que num processo em que se visa a protecção e educação do menor, bem como a sua inserção na comunidade, artigos 2.º e 7.º da LTE, sendo certo que o menor é inimputável, se imponham impedimentos ao julgador do mesmo jaez do processo criminal.

III– Não se aplica, assim, o impedimento previsto no art. 40.º, al. a) do CPP na fase de julgamento, ao juiz que decida na fase de inquérito aplicar medida cautelar de guarda em Centro Educativo em regime aberto.

Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa.



Reportam-se estes autos a um conflito negativo de competência entre o Juiz 1 e o Juiz 2 ambos do Juízo de Família e Menores de Loures, porquanto ambos negam a competência para assegurar os termos dos autos do processo 760/16.7PCAMD-A.L1, atribuindo-a reciprocamente.

Os despachos em causa transitaram em julgado.

Foi observado o disposto no art. 36.º, n.º 1 do CPP.

Neste Tribunal da Relação de Lisboa o Exmo. PGA pronuncia-se no sentido de atribuir a competência ao Juiz 1.

A questão a dirimir diz respeito à atribuição de competência para assegurar os termos dos autos do processo 760/16.7PCAMD-A.L1, um Processo Tutelar Educativo que foi atribuído ao Juiz 1 para efeitos de julgamento.

Porquanto a titular do Juiz 1 teve intervenção na fase de inquérito desse mesmo processo, aplicando ao menor a medida cautelar de guarda em Centro Educativo em regime aberto, entendeu que se encontrava impedida de assegurar os ulteriores termos processuais, remetendo os autos à juíza substituta.

A titular do Juiz 2 na qualidade de substituta do Juiz 1, ao receber o processo declara-se incompetente, não reconhecendo fundamento legal para o impedimento do Juiz 1.

Cumpre apreciar e decidir.

O fundamento legal invocado pela titular do Juiz 1 para o seu impedimento, resulta, no seu entendimento, do disposto nos arts. 40.º, al. a) e 46.º do CPP ex vi art. 128.º n.º 1 da LTE.

Vejamos o que nos diz o artigo 40.º, al. a):
«Impedimento por participação em processo
Nenhum juiz pode intervir em julgamento, recurso ou pedido de revisão relativos a processo em que tiver:
a)- Aplicado medida de coacção prevista nos artigos 200.º a 202.º;»
Ora, os artigos 200.º a 202.º reportam-se à «proibição e imposição de condutas», «obrigação de permanência na habitação» e à «prisão preventiva», respectivamente. Será que a medida cautelar de guarda em Centro Educativo em regime aberto se pode reconduzir a alguma destas figuras jurídicas?

A resposta só pode ser negativa, os artigos 200.º a 202.º do CPP são medidas de coacção a aplicar a um arguido em processo crime e a medida cautelar de guarda em Centro Educativo em regime aberto é uma medida cautelar aplicada em processo tutelar educativo, sendo substancialmente distintas entre si as finalidades de uma e outra, bem como são diferentes as naturezas dos dois sistemas.

Este regime específico da LTE afasta a aplicação subsidiária das correspondentes normas da lei processual penal que com ela estão em colisão, sendo assim no caso que nos ocupa.

Atento a diferença entre os dois sistemas (o do CPP e o da LTE), não se compreende que num processo em que se visa a protecção e educação do menor, bem como a sua inserção na comunidade, artigos 2.º e 7.º da LTE, sendo certo que o menor é inimputável, se imponham impedimentos ao julgador do mesmo jaez do processo criminal.

Aliás, o impedimento legal imposto pelo artº 40º do CPP deriva de na decisão de aplicação de uma das medidas dos art. 200º a 202º do mesmo diploma, ser plausível a formação de uma intensa convicção de culpabilidade, que poderia contagiar a liberdade do juiz julgador o que não ocorre no caso em análise pela simples razão da distinta finalidade dos dois regimes, na LTE não existe arguido e, portanto, a questão da culpabilidade não assume o relevo que tem em processo penal.

Do que se deixou dito, é mesmo possível referir que o conhecimento do menor em fase anterior do processo permite ao juiz de julgamento melhor decisão em termos de educação, protecção e inserção.

Pelo exposto, determina-se atribuir competência ao Juiz 1, do Juízo de Família e Menores de Loures, para assegurar os termos dos autos do processo 760/16.7PCAMD-A.L1, nomeadamente a fase de jul36.º do CPP.



Lisboa, 11 de Abril de 2018



Moraes Rocha