Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
4829/17.2T8LSB.L1-2
Relator: VAZ GOMES
Descritores: HERANÇA
DIVISÃO DE COISA COMUM
COMPROPRIEDADE
ERRO NA FORMA DE PROCESSO
LITIGÂNCIA DE MÁ FÉ
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 05/03/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I - Ocorrendo comunhão hereditária existe um património comum a vários herdeiros, no caso o património comum resultante da abertura da herança do mencionado JC... de que faz parte a referida ½ indivisa do imóvel e, relativamente a essa herança, não é possível efectivar a divisão de um imóvel do mesmo património (que não será o único bem ao que resulta dos documentos a fls. 40/43 relativo ao inventário respectivo), porquanto da aceitação sucessória apenas decorre directamente para cada um dos herdeiros o direito a uma quota hereditária, não a titularidade no direito de propriedade dos respectivos bens que lhes advirá pela partilha; a solução da acção de divisão de coisa comum é reservada para a compropriedade que até pode advir, na sequência do desfecho do inventário, mas que também pode não advir e ser adquirida por um dos interessados herdeiros ou terceiro.
II - Se a Autora não pretende a divisão da ½ do prédio que lhe coube juntamente com os referidos AE... e Joaquim Miguel em legado e em partes iguais, se o que pretende é a divisão de todo o imóvel, sobre cuja ½ incide registo de legado a favor a requerente e de outras duas pessoas que são co-réus na acção, e sobre a ½ restante o registo a favor da Autora e dos Réu sem determinação de parte ou direito nos termos dos art.ºs 37 e 49 do CRgP, terá de aguardar o desfecho do inventário que corre, para se saber quem será(ão) o(s) respectivo(s) titular(es).
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: I – RELATÓRIO
APELANTE/AUTORA: AM... (representada pelo ilustre advogado JM..., com escritório em Lisboa, conforme cópia do instrumento de procuração de 15/12/2016 de fls. 4.º v.).
*
APELADOS/RÉUS: AR... (representado pela ilustre  advogada RC..., com escritório em Lisboa, conforme cópia do instrumento de procuração de 26/4/2017 de fls. 51, MF..., ML... representadas pela ilustre advogada AS..., com escritório em Sintra, conforme cópias dos instrumentos de procuração de 30/3/2017 de fls. 35v/36), AE... (não contestou mas encontra-se representada pela ilustre  advogada MLA..., com escritório em Lisboa, conforme cópia do instrumento de procuração de 9/6/2017 de fls. 68), JM... (citado, não coonestou nem juntou procuração)
*
Com os sinais dos autos. Valor da acção: 654.770,00 euros (sentença recorrida)
*
I. Inconformada com a decisão de 6/9/2017, (ref.ª368782589 de fls.73 e ss), que julgando verificado o erro na forma do processo por a acção usada de divisão de coisa comum não ser o meio próprio para proceder à divisão do prédio identificado na p.i., porque metade do prédio em questão faz parte de herança indivisa, tornando-se necessária a partilha prévia dessa metade, consequentemente absolveu os requeridos da instância, dela apelou a Autora, em cujas alegações conclui em suma:
a) O prédio dos autos já configura, actualmente uma compropriedade nos seguintes termos: 1/6 pertencente à Requerente como legatária, 1/6 pertencente ao Requerido JM..., 1/6 pertencente à Requerida AE... e ½ pertencente, sem determinação de parte ou de direito à Requerente e aos Requeridos, a Requerente não pede que lhe seja adjudicada a parte correspondente à sua quota enquanto comproprietária e enquanto herdeira, há 4 partes, 3 pessoas cada uma delas com 1/6 e uma “quarta pessoa” composta pelos seis titulares da ½ do prédio no regime de indivisão hereditária, pelo que concretizada a divisão, haverá fracções que serão adjudicadas a cada um dos 3 titulares individuais, sendo as demais fracções adjudicadas, sem determinação e parte ou direito a todos os herdeiros, o entendimento da sentença de que se torna necessário efectuar a partilha dos quinhões hereditários para saber se ao seu direito de legatária deve ou não acrescer um direito de propriedade em resultado da adjudicação da parte do prédio que pertence à herança contraria a letra e o espírito da lei (Conclusões 1 a 6)
b) Se, por exemplo a metade indivisa do prédio fosse detida por determinada pessoa distinta da pessoa que detém a outra metade, esta pessoa ficaria obrigada a manter-se na indivisão enquanto a herança à qual era alheia não fosse partilhada, no caso é indiscutível que todos os comproprietários foram chamados a intervir na acção independentemente da forma de que se revestir o respectivo direito, em termos de legitimidade nada obsta à divisão, não havendo qualquer utilidade prática ou jurídica para que previamente à divisão do imóvel se proceda à partilha dos bens deixados pelos comproprietários falecidos, sendo perfeitamente possível proceder à divisão dos prédios acabando com uma indivisão indesejada para alguns de compropriedade, uma vez que não está em causa dividir a parte qe está por partilhar, ao decidir do modo que decidiu a sentença violou o disposto no art.º 1412/1 do CCiv, devendo ser revogada ordenando-se o prosseguimento dos autos.
I.2. Em contra-alegações concluem, em suma, os requeridos:
a) A notificação da sentença foi elaborada a 7/9/2027, presume-se feita a 11/9/2017 terminando o prazo de recurso a 11/10/2017, ao interpor recurso a 16/10/2017, no 3.º dia útil subsequente ao termo do prazo sem ter pago de imediato a multa do art.º 139/5/c do C.P.C. não podia o recurso ser admitido (Conclusões I a III)
b) A sentença recorrida decidiu bem em sede de apelação a recorrente veio alterar o pedido inicialmente formulado alegando para o efeito que afinal apenas pretende a divisão de parte do prédio que se encontra por partilhar, o que não corresponde à verdade, como resulta dos factos alegados e do pedido formulado, a sentença está devidamente fundamentada de facto e de direito (Conclusões III a XVIII)
Termina pedindo que se negue provimento ao recurso mantendo-se a decisão.
I.3. Nada obsta ao conhecimento do recurso, porque como resulta do despacho do relator mostra-se paga a multa a fls. 83/84.
I.4 Questão a resolver: Saber se ocorre no despacho recorrido erro de interpretação e de aplicação do art.º 1412/1 do CCiv, inexistindo o erro na forma de processo referido no mesmo
II- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
É do seguinte teor a decisão recorrida:
“AM... veio propor a presente acção especial de divisão de coisa comum contra AR... e outros, tendo tal acção por objecto um prédio urbano, constituindo metade desse prédio parte de uma herança indivisa na qual a requerente tem a qualidade de herdeira, demandando como requeridos os outros herdeiros e sendo igualmente legatária da restante metade do prédio em comum e partes iguais, com duas outras pessoas, que demanda, igualmente, como requeridos nesta acção, tal como resulta da certidão do registo predial, relativa ao prédio em causa, que foi junta com a petição inicial.
Citados os requeridos, vieram AR..., MF... e ML..., apresentar contestação na qual invocam, além do mais, a inadequação do meio processual usado pela requerente, defendendo que o processo próprio para por termo à indivisão é o processo de inventário que já foi iniciado por uma das requeridas.
Pedem ainda a condenação da requerente como litigante de má-fé por ter usado o presente processo, bem sabendo que este não é o meio próprio para a efectivação do seu direito.
A requerente respondeu pedindo, por sua vez, a condenação por litigância de má-fé dos requeridos contestantes.
Cumpre decidir:
Tendo em conta que o objecto do pedido de divisão é um prédio urbano do qual metade faz parte de uma herança indivisa, desde logo se coloca a questão da adequação da presente acção.
Com efeito, tanto a jurisprudência como a doutrina apontam maioritariamente para a necessidade de haver partilha prévia dos bens da herança entre os herdeiros para que estes possam posteriormente dividir os bens que tenham ficado em compropriedade para alguns deles ou em que subsista a compropriedade por uma parte desses bens já pertencer a titular diverso.
Ou seja, consideram tal jurisprudência e doutrina que a contitularidade que existe entre os herdeiros não corresponde a um direito de propriedade comum e só quando este exista é legítimo lançar mão da acção de divisão de coisa comum.
A acção de divisão de coisa comum seria o meio processual adequado se o bem que é seu objecto tivesse sido legado na integra a várias pessoas ou se a herança tivesse sido toda distribuída em legados mas não já em casos como o presente em que parte do bem cuja divisão se pretende ainda se encontra indiviso por pertencer a um património hereditário.
O direito dos herdeiros sobre os bens que constituem a herança indivisa é um direito indivisível, recaindo tal direito sobre o conjunto da herança, com o seu activo e passivo e não sobre cada um dos bens que a compõem.
Assim, no caso concreto, sendo a requerente igualmente herdeira da herança de que faz parte metade do prédio aqui em causa, torna-se impossível determinar o seu quinhão para efeitos da divisão, sem antes ter sido efectuada a partilha dos quinhões hereditários para saber se ao seu direito como legatária irá acrescer ou não um direito de propriedade em resultado da adjudicação da parte do prédio que pertence à herança.
Se é certo que o nº 1 do artº 1412º do Código Civil estatui que «nenhum dos comproprietários é obrigado a permanecer na indivisão, salvo se houver convencionado que a coisa se conserve indivisa» e que a requerente pode ser considerada comproprietária de metade do prédio, também é certo que a restante metade do prédio se encontra indivisa, sendo necessário individualizar um direito de propriedade sobre essa parte para que seja viável a sua divisão mediante o uso da acção de divisão de coisa comum.
Em conclusão, a presente acção de divisão de coisa comum, como bem invocam os requeridos que a contestaram, não é meio processual próprio para proceder à divisão do prédio identificado na petição inicial.
Da litigância de má-fé:
Pedem os Requeridos contestantes e a Requerente, a condenação recíproca em multa e indemnização a seu favor, por considerarem que os respectivos comportamentos processuais integram um caso de litigância de má-fé.
Porém, tendo em conta a definição legal da litigância de má-fé que consta do art. 542º, nº2 CPC afigura-se-nos claro que os comportamentos processuais das partes não integram nenhumas das alíneas do referido preceito.
Com efeito, não se vislumbra a ilegalidade manifesta das pretensões ou oposições deduzidas, qualquer distorção dos factos por qualquer um dos sujeitos processuais em confronto, qualquer omissão grave do dever de cooperação ou qualquer uso manifestamente reprovável do processo ou dos meios processuais, com o fim de conseguir um objectivo ilegal ou entorpecer a acção da justiça.
Estamos simplesmente, em nosso entender, em presença de uma discordância das partes quanto ao meio próprio para efectivar o direito que a requerente pretende exercer, discordância essa que consideramos legítima e sobre a qual já se tomou posição.
Assim, não haverá que condenar nenhuma das partes por litigância de má-fé.
Pelo exposto, julgo verificado o erro na forma de processo e, em consequência, absolvo os requeridos da instância.
Custas pela requerente.
Valor: 654.770,00 euros
Registe e Notifique.”
III- FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
III.1. Conforme resulta do disposto nos art.ºs 608, n.º 2, 5, 635, n.º 4, 649, n.º 3, do CPC[1] são as conclusões do recurso que delimitam o seu objecto, salvas as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras e as que sejam de conhecimento oficioso. É esse também o entendimento uniforme do nosso mais alto Tribunal (cfr. por todos o Acórdão do S.T.J. de 07/01/1993 in BMJ n.º 423, pág. 539.
III.2. Não havendo questões de conhecimento oficioso são as conclusões de recurso que delimitam o seu objecto tal como enunciadas em I.
III.3. Saber se ocorre no despacho recorrido erro de interpretação e de aplicação do art.º 1412/1 do CCiv, inexistindo o erro na forma de processo referido no mesmo
III.3.1. A Autora propôs contra os Réus e ao abrigo do disposto no art.º 1412 do CCiv e 925 do Código de Processo Civil, acção de processo especial de divisão de coisa comum do prédio que identificam em 1, pedindo que se julgue a acção procedente “procedendo-se à divisão e, substância do prédio e uma vez fixados os quinhões dos interessados, adjudicando-se as fracções autónomas resultantes da divisão com todas as legais consequências”; em suma dizendo que a Autora e os Réus são donos em comum e partes iguais de ½ do prédio urbano identificado no art.º 1 da p.i., metade essa que foi adquirida em comum e partes iguais pelos seus actuais e mencionados comproprietários por legado de AD..., sendo Autora e Réu igualmente donos em comunhão e sem determinação de parte ou de direito da outra metade, metade essa que foi adquirida em comum e sem determinação e parte ou de direito pelos seus actuais e mencionados comproprietários (da outra metade), por secessão hereditária por morte de JM... como resulta do prédio 1 que é divisível, o qual é composto por 5 lojas todas com saída directa para a Rua Palmira (Anjos/Lisboa) e mais 4 pisos, 1.º, 2.º, 3.º e 4.º andares com lados esquerdo e direito todos com saída para partes comuns do prédio, designadamente para a as escadas que dão serventia aos andares, tendo ainda no r/c a casa da porteira com serventia de escada.
III.3.2. Citadas as rés MF... e ML... vieram contestar suscitando como questão prévia a de que a Ré Maria Leonor em 8/6/2015 requereu inventário para partilha dos bens de herança deixados por óbito de JC... conforme doc 2 que junta e que corre termos no Cartório Notarial em Lisboa; ao invés do sustentado a Autora e os Réus não são comproprietários do imóvel dos autos mas sim titulares de uma quota sobre o total da herança indivisa por óbito de Joaquim da Cunha, o prédio é um bem da Autora e dos RR em comunhão hereditária e não em compropriedade, sendo o processo de inventário o adequado para por termo à comunhão hereditária como resulta do art.º 2/1 da Lei 23/2013 de 5/3, processo esse em que pode suceder que o imóvel em causa até seja adjudicados apenas a um herdeiro, caso em que se tornará absolutamente inútil a divisão que se pretende fazer nos autos, sendo que a habilitação de herdeiros não confere ao habilitado a qualidade de comproprietário dos bens da herança que só pode ser adquirida em inventário ou partilha extrajudicial como sem decidiu no ac Rlxa de 6/4/2000, CªJª 2000, 2-219, na acção de divisão de coisa comum a compropriedade não é a causa de pedir mas sim o pressuposto do pedido, se Autores e Réus não são comproprietários antes titulares de herança indivisa nas qual se integra o imóvel, a acção de divisão de coisa comum não é a própria (Ac RLxa de 9/10/2012); também co co-réu António Rosado, citado, veio suscitar a questão prévia da existência do mencionado inventário e que em bom rigor a acção deveria ficar suspensa até terminar a acção de inventário onde se definirá ou não a situação de comproprietários do imóvel; aceita os factos de 1 a 4 e em parte do 5.º, não se opõe à divisão na certeza de que não existe acordo entre os interessados, mas que a situação de compropriedade apenas poderá ficar definida no inventário.
III.3.3. A Autora veio responder a ambas as contestações, relativamente à do co-réu Joaquim, reiterando o que já dissera reforçando que o prosseguimento da acção irá determina a divisão do prédio mediante a constituição da propriedade horizontal e adjudicação das fracções daí resultantes aos diversos comproprietários enquanto que ao nível do inventário apenas acontecerá que uma vez concretizada a divisão, apenas se deixa de partilha a ½ do prédio detida sem determinação de parte ou direito para se passar a partilha diversas fracções igualmente sem determinação de parte ou direito e se o inventário terminar antes da presente acção a pessoa ou pessoas a quem for adjudicada a ½ antes indivisa, apenas terá de se habilitar no presente processo, prosseguindo os seus termos, quanto à contestação das requeridas, além de pedir a condenação as mesmas como litigantes de má fé ao contestarem a divisibilidade do prédio quando resulta da certidão e da caderneta predial que o mesmo é divisível em substância, não sendo verdade que a totalidade do prédio integre a herança indivisa de JC..., pois desta só faz parte a ½ indivisa do mesmo registada sem determinação e parte ou direito a favor de todos da requerente e de todos os requeridos, já que da outra ½, por via de um legado feito por AAC..., ficou a pertencer em partes iguais à requerente a AE... e JM...; no inventário referido para partilha da herança do mencionada Joaquim de que faz parte a ½ em referência, não pode vir a ser adjudicada a qualquer dos interessados a totalidade do prédio porquanto só ½  dele está aí por partilhar, o que também revela má fé. Verdade que na p.i. a Autora pede que se proceda à divisão em substância de todo o prédio com adjudicação das fracções autónomas resultantes da divisão e em sede de recurso, pede que se divida apenas a parte que não está por partilhar da referida herança de Joaquim, o que é nitidamente uma modificação do pedido não permitida.
III.3.4. Consta da cópia da certidão permanente de fls. 6 e ss relativa ao prédio urbano sito na Rua Palmira, n.ºs 33, 33-b, 33-c, 33-d, 33-e, 33-f, 33-g e Rua Particular 33 da mesma rua que se trata de um “edifício loja de 4 andares e quintal desanexado do prédio descrito sob o n.º 3925...” Pela Ap.194 de 27/02/2012 foi registada às 9:53:08UTC a aquisição “Usa Legado quota adquirida ½,” sendo sujeito passivo AAC... e sujeitos activos AE... (Ré), JM... (réu) e AM... (Autora); donde a conclusão que por via do legado mencionado ficou registada a aquisição de 1/3x1/2=1/6 para cada uma dessas pessoas; a outra ½ pela apresentação dessa mesma data está registada a favor de AE..., AM..., AR...; JM..., MF..., ML... “em comum e sem determinação de parte ou direito” “causa : Sucessão Hereditária, Quota Adquirida ½”, sendo sujeito passivo JC.... Ou seja esta ½ do prédio faz parte da herança indivisa do mencionado Joaquim e o registo foi feito nos termos dos art.ºs 37 49 do CRgP, segundo os quais o meeiro ou qualquer dos herdeiros pode pedir a favor de todos os titulares, o registo de aquisição de bens e direito que façam parte da herança indivisa (37/1), registo que é feito em comum e sem determinação de parte ou direito com base em documento comprovativo da habilitação e em declaração que identifique os respectivos bens (49). O registo nos termos do art.º 37/1 não se confunde com o registo nos termos do art.º 37/2 refere-se ao registo por um dos comproprietários ou compossuidores dos direitos ou bens a favor dos demais titulares e tem geralmente em vista justamente a divisão judicial ou extrajudicial dos bens. Existirá no caso dos autos uma situação de compropriedade ou de composse, ainda que só relativamente a ½ do prédio em questão a justificar ou permitir o uso da acção judicial de divisão de coisa comum por cum dos comproprietário e relativamente à totalidade (é esse o único pedido atendível, porquanto face ao princípio da estabilidade da instância quanto ao pedido e causa de pedir na falta de acordo como previsto nos art.ºs 264 e 265).
III.3.5. A herança é comummente designada na doutrina como uma comunhão, na medida em que sendo vários os herdeiros os seus direitos incidem sobre uma plêiade de bens e direitos relativamente a cada um dos quais não é possível afirmar que qualquer deles seja titular do direito de propriedade até porque em partilha pode qualquer desses bens ou direitos ficar a pertencer a apenas um ou alguns dos herdeiros aplicando-se-lhe, é certo, as regras da compropriedade. As regras da compropriedade são aplicáveis com as necessárias adaptações à comunhão de quaisquer outros direitos, sem prejuízo do disposto especialmente para cada um deles (art.º 1404 do CCiv); na falta de acordo sobre o uso da cosia comum a qualquer dos comproprietários é lícito servir-se dela e o uso da coisa comum por um dos comproprietários não constitui posse exclusiva, ou posse de quota superior à dele, salvo se tiver havido inversão do título (art.º 1406, n.ºs 1 e 2 do CCiv). O comproprietário pode dispor da sua quota na comunhão mas não pode sem consentimento dos restantes consortes dispor de parte especificada da coisa comum (in casu em exclusivo gozo pessoal, já que ao construir sobre o terreno os Autores inviabilizam o gozo desse terreno por parte dos outros comproprietários), sendo que a disposição de parte especificada da coisa comum é havida como disposição de coisa alheia (art.º 1408, n.ºs 1 e 2 do CCiv).
III.3.6.Segundo a doutrina tradicional na compropriedade a cada um dos comproprietários pertence um quota parte ideal ou abstracta da coisa, fracção do direito de propriedade que se estende até a divisão sobre todas e cada uma das partes do objecto _BAUDRY e CHAUVEAU, Des biens, n.º 267, doutrina que foi combatida na medida em que no fundo se trata de uma ficção para facilitar e explorar as relações existentes entre os condóminos (o objecto imediato de um direito deveria ser uma coisa e não também um direito como é o caso da quota), sustentando uns que o que ocorre é que o direito se fracciona (UNGER, Revista di diritto civile, 1921, p.12) e quem pense que não é o direito que se reparte antes o seu valor económico (WINDSCHEID, Pandette, § 142, nota 11) e quem sustente que não ocorre nenhum fraccionamento do direito, acontecendo que cada consorte é titular de um direito de propriedade sobre toda a coisa (vários direitos de vários titulares sobre a coisa toda (DERNBURG, Pandette, I, § 195) e ainda quem entenda que a compropriedade forma uma pessoa colectiva, entidade distinta dos consortes (LUZZATO, La comproprieta nel diritto italiano, n.ºs 19 e ss).[2] Entre nós, não tem sido pacífico o entendimento sobre a natureza jurídica da compropriedade, por último Menezes Leitão sustentando que a Lei não personifica a compropriedade pelo que carece de sentido qualificá-la como pessoa colectiva como alguma doutrina alemã a entende, Henrique Mesquita reconhece a unidade subordinada a uma organização, ainda que não personalizada, Rui Pinto Duarte e Menezes Leitão reconhecem a unidade do direito com pluralidade de titulares, Sousa Antunes rejeita a ideia unitária, contrapõe a doutrina da pluralidade de direitos sobre a mesma coisa, o mesmo acontecendo com José Luís Bonifácio Ramos que não aderindo às teorias unitárias sustenta que sobrevindo a compropriedade serão os diversos sujeitos titulares de uma única coisa, a unidade opera a nível da coisa não ao nível do direito, sobre elas incidem vários direitos e propriedade titulados por sujeitos distinto dos demais, o regime jurídico do instituto ajuda a perceber esta situação pois identifica os direitos dos diferentes sujeitos da coisa submetida ao regime uno da compropriedade.[3] Perfilhamos este entendimento. Na comunhão em mão comum ou propriedade colectiva, há um património que é afectado a um certo fim que pertence a dois ou mais sujeitos unidos por um determinado vínculo que tanto pode ser o património comum dos cônjuges, das sociedades não personalizadas e a comunhão hereditária, afectação a um fim que inexiste na compropriedade.[4]
III.3.7. Ocorrendo comunhão hereditária existe um património comum a vários herdeiros, no caso o património comum resultante da abertura da herança do mencionado JC... de que faz parte a referida ½ indivisa do imóvel e relativamente a essa herança não é possível efectivar a divisão de um imóvel do mesmo património (que não será o único bem ao que resulta dos documentos a fls. 40/43 relativo ao inventário respectivo), porquanto da aceitação sucessória apenas decorre directamente para cada um dos herdeiros o direito a uma quota hereditária, não a titularidade no direito de propriedade dos respectivos bens que lhes advirá pela partilha; a solução da acção de divisão de coisa comum é reservada para a compropriedade que até pode advir, na sequência do desfecho do inventário, mas que também pode não advir e ser adquirida por um dos interessados herdeiros ou terceiro. A Autora não pretende a divisão da ½ do prédio que lhe coube juntamente com os referidos AE... e JM... em legado e em partes iguais pretende a divisão de todo o imóvel e para isso terá efectivamente de aguardar o desfecho do inventário que corre. Neste sentido é não só a doutrina como a jurisprudência unânime como decorre do AcSTJ disponível no sítio www.dgsi.pt que a seguir se transcreve parcialmente:
1100/11.7TBABT.E1.S1        
Nº Convencional:       7ª SECÇÃO
Relator:           ÁLVARO RODRIGUES
Descritores:    HERANÇA
HERANÇA INDIVISA
PARTILHA DA HERANÇA
SUCESSÃO POR MORTE
INVENTÁRIO
QUOTA INDIVISA
COMPROPRIEDADE
ACÇÃO DE DIVISÃO DE COISA COMUM
           
Data do Acordão:      30-01-2013
Votação:         UNANIMIDADE
Texto Integral:            S
Privacidade:   1
           
Meio Processual:        REVISTA
Decisão:         CONCEDIDA A REVISTA
Área Temática:         DIREITO CIVIL - DIREITOS REAIS / DIREITO DA PROPRIEDADE -- DIREITO DAS SUCESSÕES / ACEITAÇÃO DA HERANÇA.
Doutrina:       
- J. A. Lopes Cardoso, Partilhas Judicias, vol. I, pp. 3 e 4.
- Luís Filipe Pires de Sousa, Acções Especiais de Divisão de Coisa Comum e de Prestação de Contas.
- Nuno Espinosa G. Silva, Direito das Sucessões, 1980, p.110.
- Pereira Coelho, Direito das Sucessões, 2ª ed. 1966-1967.
- Pereira Coelho, Direito das Sucessões, 2ª ed., 1966-1967.
- Rabindranath Capelo de Sousa, Lições de Direito das Sucessões, vol. II, 3ª edição.
Legislação Nacional:
CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 1412.º, N.º1, 2050.º, N.ºS 1 E 2.
Jurisprudência Nacional:      
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:
-DE 14 DE JANEIRO DE 1972, IN REV. TRIBUNAIS, ANO 90º, PG. 69; DE 10-12-1987; E DE 4-02-1997.
           
Sumário :       

I - Tanto a jurisprudência, como a mais abalizada doutrina da especialidade, apontam decisivamente no sentido de que só se pode dividir os bens da herança de que se seja proprietário, ou seja, que tenham sido atribuídos aos herdeiros em partilha previamente realizada.
II - A ratio de tal solução é muito simples: é que, até à partilha, os co-herdeiros de um património comum, adquirido por sucessão mortis-causa, não são donos dos bens que integram o acervo hereditário, nem mesmo em regime de compropriedade, pois apenas são titulares de um direito sobre a herança (acervo de direitos e obrigações) que incide sobre uma quota ou fracção da mesma para cada herdeiro, mas sem que se conheça quais os bens concretos que preenchem tal quota.
III - É pela partilha (extrajudicial ou judicial e, neste caso, através do processo de inventário-divisório) que serão adjudicados os bens dessa universalidade que é herança e que preencherão aquelas quotas.
Por isso, assim se ponderou no aresto deste Supremo Tribunal, de 04-02-1997 supra citado: «A compropriedade pressupõe um direito de propriedade comum sobre uma coisa ou bem concreto e individualizado, ao invés do que sucede na contitularidade do direito à herança que recai obre uma universalidade de bens, ignorando-se sobre qual ou quais deles o direito hereditário se concretizará».
IV - O Ilustre Professor de Coimbra, Doutor Rabindranath Capelo de Sousa assim ensina nas sua Lições de Direito das Sucessões: «Nos casos em que haja lugar à partilha da herança, segundo a opinião dominante, o domínio e posse sobre os bens em concreto da herança só se efectivam após a partilha, uma vez que até aí a herança constitui um património autónomo nada mais tendo os herdeiros do que o direito a uma quota parte do património hereditário» ( Lições de Direito das Sucessões, pg. 185).
V - Por sua vez, outro Professor de Coimbra, o Doutor Pereira Coelho, assim escreveu nas sua obra de Direito das Sucessões: «Não se trata uma vulgar compropriedade entendida como participação na propriedade de bens concretos e determinados. Pelo contrário, contitularidade do direito à herança significa tanto como um direito a uma parte ideal, não de cada um dos bens de que se compõe a herança, mas sim da própria herança em si mesma considerada» (Pereira Coelho, Direito das Sucessões, 2ª ed. 1966-1967).
           
Decisão Texto Integral:         
Acordam no SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:
(...)
Tanto a jurisprudência, como a mais abalizada doutrina da especialidade, apontam decisivamente no sentido de que só se pode dividir os bens da herança de que se seja proprietário, ou seja, que tenham sido atribuídos aos herdeiros em partilha previamente realizada.
Neste exacto sentido, podem ver-se, entre outros, o Acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça, de 10-12-1987, de que foi Relator, o Exmº Conselheiro Almeida Ribeiro assim sumariado:
I - Os herdeiros, por meio de acção de divisão de coisa comum, só podem dividir os bens da herança de que já sejam proprietários, isto é, que lhes tenham já sido atribuídos em partilha previamente realizada.
II - A existência ou inexistência de partilha prévia é pois, um facto que tem imperiosamente de ser apurado pelas instâncias quando aquela acção tenha por objecto bens da herança.
Igualmente, se pode apontar, in hoc sensu,  o Acórdão do STJ de 4-02-1997, relatado pelo Exmº Conselheiro Silva Paixão, assim sumariado na parte que ora interessa:
II - A compropriedade pressupõe um direito de propriedade comum sobre uma coisa ou bem concreto e individualizado, ao invés do que sucede na contitularidade do direito à herança que recai sobre uma universalidade de bens, ignorando-se sobre qual ou quais deles o direito hereditário se concretizará.
III - Os herdeiros do comproprietário não podem usar de acção de divisão de coisa comum (nem podem nela ser demandados), sem que, previamente, se tenham habilitado e procedido à partilha.

A nível doutrinal, assim se pronuncia o Ilustre Magistrado, Dr. Luís Filipe Pires de Sousa, na sua obra de referência «Acções Especiais de Divisão de Coisa Comum e de Prestação de Contas», apoiado em largo acervo jurisprudencial aí indicado:
«No caso de comunhão hereditária a mesma cessa pela partilha de uma generalidade de bens entre os interessados, por forma a ficar determinado quais os patrimónios individuais em que tais bens passarão a estar integrados.
Até à partilha, os herdeiros são apenas titulares de um direito sobre o conjunto da herança e não sobre bens certos e determinados .
Enquanto não se fizer a partilha, os herdeiros têm sobre os bens que constituem a herança indivisa um direito indivisível, recaindo tal direito sobre o conjunto da herança e não sobre bens certos e determinados desta. A contitularidade do direito à herança implica um direito a uma parte ideal desta considerada em si mesma e não sobre cada um dos bens que a compõem.
Nessa medida, não se tratando de coisa comum de que sejam comproprietários, não podem os herdeiros instaurar acção de divisão de coisa comum para dividir prédio que integre a herança.
Só após a atribui­ção dos bens em partilha é que os herdeiros podem recorrer à acção de divisão de coisa comum.
Dito de outro modo, os herdeiros do comproprietário não podem instaurar acção de divisão de coisa comum sem que, previamente, tenham procedido à partilha. Só após a individualização de um direito de propriedade sobre uma quota do prédio é que se torna viável a divisão de coisa comum.»[1].
A ratio de tal solução é muito simples.
É que, ao contrário do que supõem as Recorridas autoras, até à partilha os co-herdeiros de um património comum, adquirido por sucessão mortis-causa, não são donos dos bens que integram o acervo hereditário, nem mesmo em regime de compropriedade, pois apenas são titulares de um direito sobre a herança (acervo de direitos e obrigações) que incide sobre uma quota ou fracção da mesma para cada herdeiro, mas sem que se conheça quais os bens concretos que preenchem tal quota.
        É pela partilha (extrajudicial ou judicial e, neste caso, através do processo de inventário-divisório) que serão adjudicados os bens dessa universalidade que é herança e que preencherão aquelas quotas.
Por isso, assim se ponderou no aresto deste Supremo Tribunal, de 4-02-1997 supra citado: «A compropriedade pressupõe um direito de propriedade comum sobre uma coisa ou bem concreto e individualizado, ao invés do que sucede na contitularidade do direito à herança que recai obre uma universalidade de bens, ignorando-se sobre qual ou quais deles o direito hereditário se concretizará».
O Ilustre Professor de Coimbra, Doutor Rabindranath Capelo de Sousa assim ensina nas sua Lições de Direito das Sucessões:
«Nos casos em que haja lugar à partilha da herança, segundo a opinião dominante, o domínio e posse sobre os bens em concreto da herança só se efectivam após a partilha, uma vez que até aí a herança constitui um património autónomo nada mais tendo os herdeiros do que o direito a uma quota parte do património hereditário»[2]
Por sua vez, outro Professor de Coimbra, o Doutor Pereira Coelho, assim escreveu no seu Direito das Sucessões:
«Não se trata uma vulgar compropriedade entendida como participação na propriedade de bens concretos e determinados. Pelo contrário, contitularidade do direito à herança significa tanto como um direito a uma parte ideal, não de cada um dos bens de que se compõe a herança, mas sim da própria herança em si mesma considerada»[3]
Já num acórdão deste Supremo Tribunal de 1980, brilhantemente relatado pelo emérito e saudoso Juiz Conselheiro Octávio Dias Garcia, que chegou a ser Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, é patente a adesão dos Ilustres Juízes Conselheiros que o subscreveram, a tais ensinamentos.
 Após o quadro legal, doutrinal e jurisprudencial sobre tal questão, que aqui deixámos esboçado, é tempo de reverter agora ao caso sub judicio, tendo para tanto bem presente o que se lê na douta decisão da 1ª Instância sobre o suporte factual do presente processo:
«No caso dos autos, na falta dos títulos aquisitivos dos prédios identificados na petição inicial, em relação às requerentes e aos requeridos, foram juntas, pelas primeiras, certidões prediais dos vários prédios em discussão, analisadas as quais, se constata que os titulares inscritos, ora são uns requeridos, ora são outros requeridos (juntamente com as requerentes ), sendo a causa da aquisição a dissolução da comunhão conjugal e a sucessão hereditária e, também, em alguns casos a sucessão testamentária.
Sucede que, em alguns ( bastantes ) casos, surge, também, no registo que a aquisição se encontra em comum e sem determinação de parte ou direito, o que revela, inequivocamente, que o prédio ainda não foi partilhado entre os herdeiros, sendo o seu titular uma herança ilíquida e indivisa ( assim acontece com os prédios descritos na Conservatória do Registo Predial de Constância com os n°s 508/19940117 e 648/19940117, da freguesia de Constância, apenas referidos a título de exemplo, porque há mais prédios nestas condições registais, sendo certo que não constam dos autos os títulos aquisitivos, ou seja, os testamentos ou as escrituras de partilha ).
Pelo  exposto,  a presente  acção  de  divisão  de  coisa comum,   como   o mencionaram os requeridos que a contestaram não é meio processual próprio para proceder à divisão dos prédios identificados na petição inicial».
(..)
É inteiramente certo que o nº 1 do artº 1412º do Código Civil estatui que «nenhum dos comproprietários é obrigado a permanecer na indivisão, salvo se houver convencionado que a coisa se conserve indivisa».
Trata-se da consagração legal do vetusto brocardo romano «in communione vel societate nemo compelitur invitus detineri».

Todavia, o direito de exigir a divisão a que se refere o citado inciso legal e que é adjectivado pela acção de divisão de coisa comum, tem pressupostos, e um deles é que os herdeiros do autor da sucessão não dispõem sobre os bens que integram acervo hereditário um direito real, maxime, o direito de propriedade, carecem de efectuar a partilha antes de pretender a divisão de coisa comum.

Não há, porém, salvo o devido respeito, que confundir compropriedade com contitularidade do direito à herança, como fazem as Recorridas
Partilhados os bens, a benefício de inventário ou extrajudicialmente (nesta modalidade só se houver consenso de todos), então as quotas hereditárias serão, em concreto, preenchidas e, só então, os herdeiros serão proprietários dos bens que integrarem as respectivas quotas ou quinhões.
Como judiciosamente escreve Lopes Cardoso, «aberta a sucessão, serão chamados à titularidade das relações jurídicas do falecido aqueles que gozam de prioridade na hierarquia dos sucessíveis, desde que tenham a  necessária capacidade.

Do facto de serem chamados à sucessão não se segue, necessariamente, que se lhes radique desde logo a qualidade de sucessores, pois é mister que a aceitem, retroagindo neste caso os efeitos da aceitação ao momento inicial de abertura ( artº 2050º, nºs 1 e 2 do C. Civil)[4].
O que vale dizer que a transmissão jurídica e a transmissão real da posse da herança se reportam a momentos que não coincidem, pois enquanto o primeiro corresponde à morte do seu autor, o segundo tem início com a aceitação por parte do que lhe sucede».
Mais adiante, o Ilustre Autor escreve:

«A exigência da aceitação tem a sua razão de ser, por isso que na universalidade que a herança constitui se compreendem direitos e obrigações e bem podem estas sobrelevar àqueles».

É, no entanto, imprescindível frisar bem que da aceitação sucessória apenas decorre directamente para cada um dos herdeiros o direito a uma quota hereditária[5],   não a titularidade no direito de propriedade dos respectivos bens que lhes advirá pela partilha.

É tempo de terminar, recordando um aresto deste Supremo Tribunal,  cronologicamente antigo, mas pleno de actualidade, que é o Acórdão de 14 de Janeiro de 1972, que assim sentenciou:

« A herança, antes da partilha, é uma universitatis juris, com conteúdo próprio, fixado na lei ( cfr. artigos 2064º, nº 2, 2068º, 2070º, 2074º, nº 3, 2079º, 2088º, 2089º, 2091º, 2098º e outros do Código Civil).

Os herdeiros são titulares de um direito indivisível, enquanto se não fizer a partilha. Até à partilha tal direito recai, assim, sobre o conjunto da herança e não sobre bens certos e determinados dela. Logo, não pode atribuir-se ao co-herdeiro, antes da partilha, a qualidade de proprietário de qualquer bem da herança»[6].

Pelo exposto, há que reconhecer que bem havia decidido a 1ª Instância ao sentenciar que só após a atribui­ção dos bens em partilha é que os herdeiros podem recorrer à acção de divisão de coisa comum.
(...)”

IV- DECISÃO.

Tudo visto acordam os juízes em julgar improcedente a apelação e consequentemente confirmam a decisão recorrida.
Regime da Responsabilidade por Custas: tal como decidido pela 1.ª instância em despacho de 10/10/2017 de fls. 77, por se trata de um processado simples sem questões complexas que terminou após os articulados, nos termos do art.º 6/7 do RCP dispensa-se o pagamento do remanescente da taxa de justiça nesta fase recursiva. As custas em ambas as instâncias são da responsabilidade da apelante que decai e porque decai (art.º 527/1 e 2)

Lxa., 03-05-2018

João Miguel Mourão Vaz Gomes

Jorge Manuel Leitão Leal

Ondina Carmo Alves

[1] Na redacção que foi dada ao Código do Processo Civil pela Lei 41/2013 de 26/7, atento o disposto nos art.º 5/1, 8, e 7/1 (a contrario sensu) e 8 da mesma Lei que estatuem que o novel Código de Processo Civil entrou em vigor no passado dia 1/09/2013 e que se aplica imediatamente, atendendo a que a acção foi autuada e distribuída ao Juízo local Cível  3 de Lisboa da Comarca de Lisboa em 16/3/2017 e a data da decisão recorrida que é de 6/9/2017; ao Código referido, na redacção dada pela Lei 41/2013, pertencerão as disposições legais que vierem a ser mencionadas sem indicação de origem.
[2] Manuel Rodrigues, in A Posse, Almedina, 1981, pág. 142/143; este autor num outro estudo na Revista de Legislação e Jurisprudência, n.º 55, pp 319 e ss, sustenta que a compropriedade analisa-se em um conjunto de direitos da mesma natureza e extensão, estando cada um dos consortes, no exercício respectivo do direito, limitado pelo exercício dos outros, de modo que há uma realização simultânea e coordenada de todos eles, não se concebendo uma realização simultânea e contraditória de todos eles.
[3] Bonifácio Ramos, José Luís, in Manual de Direitos  Reais, 2017, AAFDL, pp 344/345.
[4] Último autor e obra citados, pág. 337.