Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
3352/2006-7
Relator: CAETANO DUARTE
Descritores: INSOLVÊNCIA
EXECUÇÃO
SUSPENSÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 09/21/2006
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: AGRAVO
Decisão: CONCEDIDO PROVIMENTO
Sumário: O artigo 88.º/1 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas segundo o qual “ a declaração de insolvência determina a suspensão de quaisquer diligências executivas ou providências requeridas pelos credores da insolvência […] e obsta à instauração ou ao prosseguimento de qualquer acção executiva instaurada pelos credores da insolvência […]” deve ser interpretado no sentido de que a execução deve ser sustada quanto ao insolvente mas não deve ser declarada finda

(SC)
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa

K.[…] contra V. […] Lda., M. […], H.[…] e M.F.[…] procedimento cautelar de arresto, na sequência da falta de paga­mento duma dívida no valor de € 187.177,92, pedindo o arresto de créditos sobre várias empresas. Decretado o arresto, foram notificados os devedores, vieram a ser confirmadas dívidas no montante de € 28.891,45 e foram depositados à ordem do processo € 25.414,94. Em 22 de Fevereiro de 2005, a requerente veio depois a propor execução comum na qual pediu a conversão do arresto em penhora. Em 24 de Junho de 2005, foi declarada insol­vente a firma V. […] Lda. e por despacho de 15 de Novembro de 2005, o juiz a quo declarou extinta a execução quanto àquela executada mandando-a prosseguir relativamente às executadas M.[…], H.[…] e M.F.[…] Desta decisão vem o pre­sente recurso interposto pelo exequente.
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Nas suas alegações, defende o agravante, em resumo:
- A agravante conseguiu obter a decretar o arresto de bens de V.[…]Lda. tendo o mesmo arresto sido parcialmente cumprido porque alguns dos credores da referida firma  não respeitaram a notificação para pagar as quantias em dívida à ora agravante;
- Em 22 de Fevereiro de 2005, no seguimento da providência cautelar, a agra­vante propôs execução contra a firma devedora na qual está pendente a conver­são do arresto em penhora;
- Em 24 de Junho de 2005, a  executada foi declarada insolvente, tendo a agra­vante dado conhecimento de tal facto nos autos, informando que estes deviam ficar suspensos até à sua apensação aos autos de insolvência;
- Em 15 de Novembro de 20005, o juiz julga finda a instância executiva contra a V.[…] Lda. mandando prosseguir apenas contra os outros executados;
- Apesar de haver depósitos efectuados na Caixa Geral de depósitos, o juiz a quo manteve a extinção da instância;
- Estando apreendidas nos autos quantias relevantes e estando pendentes de apreen­são quantias de elevado valor, não se justifica a extinção da instância até porque o Código da Insolvência só manda suspender os actos executivos.

O juiz a quo manteve a sua decisão.

Corridos os vistos, cumpre decidir.
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O objecto do recurso é delimitado pelas alegações dos recorrentes – artigo 684º do Código de Processo Civil. No caso dos autos, há que decidir se, ao abrigo do artigo 88º do Código da Insolvência, os autos de execução devem ser suspensos ou considerados extin­tos.

Diz o n.º 1 do artigo 88º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas:

“A declaração de insolvência determina a suspensão de quaisquer diligências exe­cutivas ou providências requeridas pelos credores da insolvência que atinjam os bens integrantes da massa insolvente e obsta à instauração ou ao prosseguimento de qualquer acção executiva intentada pelos credores da insolvência; porém, se houver outros execu­tados, a execução prossegue contra estes.”

Este regime tem-se mantido ao longo dos vários códigos de falência e/ou insolvên­cia e é muito claro: as execuções que já estejam a correr contra o insolvente são, de ime­diato, sustadas e não podem ser intentadas novas execuções que atinjam os bens integran­tes da massa insolvente. E previne-se a hipótese de a execução pendente contra o insol­vente ter mais executados: neste caso, a execução é sustada quanto ao insolvente mas pros­seguem os seus termos relativamente aos outros executados.

O juiz a quo, ao abrigo desta disposição legal, decidiu julgar “finda, quanto àquela executada, a presente instância executiva”. Apesar de nada ser explicado sobre a razão deste entendimento, parece-nos que se partiu do princípio que sustar a execução era o mesmo que declará-la finda. Entendimento que terá em conta o facto de, como é normal, a massa insolvente se vir a mostrar insuficiente para pagar aos credores e, findo o processo de insolvência, não haver bens para o prosseguimento da execução. No entanto, podemos imaginar que o processo de insolvência não chegue ao seu termo – porque o insolvente se opõe ao mesmo e obtém vencimento ou porque o credor requerente da insolvência desiste – ou que, no fim do processo de insolvência, ainda hoje bens sobre os quais  possa prosse­guir a execução. Nesse caso, a existência duma execução sustada tem a vantagem de evitar a repetição de todo o processado que já tinha sido realizado até ao momento da declaração de insolvência.

Em resumo: é possível encontrar situações em que a sustação da execução não seja equivalente ao seu fim e em que se justifica a manutenção da execução apesar das diligên­cias do processo ficarem paradas. Deve, por isso, o n.º 1 do artigo 88º do Código da Insol­vência e Recuperação de Empresas  ser interpretado no sentido de que a execução deve ser sustada quanto ao insolvente mas não deve ser declarada finda.
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Pelo exposto, acordam em conceder provimento ao recurso, revogando o despacho recorrido que deverá ser substituído por outro em que se ordene a sustação da execução quanto à insolvente.

Sem custas.

Lisboa, 21 de Setembro de 2006

José Albino Caetano Duarte
Domingos Manuel Gonçalves Rodrigues
António Pedro Ferreira de Almeida