Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
2510/15.6YLPRT.L1-8
Relator: ANTÓNIO VALENTE
Descritores: ARRENDAMENTO
COMUNICAÇÃO DE MUDANÇA DE SEDE
INVALIDADE DO DESPEJO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 06/28/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: Tendo a Sociedade arrendatária comunicado à senhoria a mudança da sua sede para a morada do locado, o envio das cartas pela senhoria, cerca de um ano depois, comunicando a resolução do contrato de arrendamento, nos termos dos nºs 3 e 4 do art. 10º do NRAU, para o endereço anterior da sociedade arrendatária, torna inválido o procedimento especial de despejo.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa :
No presente procedimento especial de despejo, que MH move contra Sociedade de Construções Rufino & Santos, Unipessoal, Lda., veio a arrendatária deduzir oposição pedindo a sua absolvição da instância, com fundamento na excepção de ineptidão do requerimento de despejo ou, caso assim se não entenda, com fundamento na nulidade de todo o processado e, em qualquer dos casos, pede a sua absolvição do pedido em virtude do pagamento.
Alega para tanto, e em síntese, a falta de causa de pedir, por não haverem sido indicados o valor e os meses em dívida quanto à falta de pagamento de rendas, e a invalidade da notificação judicial avulsa, uma vez que nunca negou a abertura da porta ao AE e, na data indicada, se encontrava no Porto, em trabalho; alega, ainda, a excepção peremptória do pagamento, visto que os meses de Fevereiro e Março de 2015, que julga serem os pedidos, se encontram pagos, o mesmo sucedendo quanto às rendas devidas até Setembro do mesmo ano, não juntando os recibos por a senhoria lhos não enviar.
Não tendo procedido à junção de documento comprovativo do pagamento da caução prevista no artigo 15°-F, da Lei n° 6/2006, de 27/2, foi notificado para o efeito, o que veio fazer através do requerimento de fls. 154.
 
Notificada, a senhoria apresentou a sua resposta, pugnando pela improcedência da oposição, por infundada, e impugnou a tempestividade e suficiência da caução.
Procedeu-se ao julgamento, vindo a ser proferida sentença que julgou improcedente a excepção dilatória da ineptidão do requerimento de despejo e não verificada a nulidade do processado, julgando a oposição procedente por invalidade da notificação judicial avulsa, absolvendo a requerente do pedido de despejo.  

Foram dados como provados os seguintes factos:
1) Por escrito particular datado de 31 de Março de 2014, MH deu de arrendamento a Sociedade de Construções Rufino & Santos, Unipessoal, Lda., para habitação, o 10º andar, letra C, do prédio urbano sito na Avenida IH, em Cascais.
2) O arrendamento foi celebrado pelo prazo de dois anos, com início em 01/04/2014 e termo em 31/03/2016, renovando-se automaticamente por períodos iguais e sucessivos de um ano, salvo se alguma das partes se opusesse à sua renovação ou o denunciasse nos termos legais.
 3) A renda mensal acordada, durante o primeiro ano de vigência do contrato, foi a de 650,00 €, sujeita a actualizações anuais, a pagar no primeiro dia útil do mês anterior àquele a que respeitar, por depósito ou transferência bancária (cláusula 6a).
4) Todas as notificações e comunicações a efectuar no âmbito do contrato deveriam ser dirigidas para os endereços constantes do cabeçalho e cláusula 5a do contrato, mantendo-se até à comunicação, por escrito, de um novo endereço (cláusula 15ª).
5) Por escrito de 28/04/2014, a arrendatária comunicou à senhoria a alteração do seu endereço e o do seu gerente para a morada do locado, sita na Avenida IH, Cascais.
6) A senhoria requereu a notificação judicial avulsa da inquilina comunicando-lhe a resolução do contrato de arrendamento, com fundamento na falta de pagamento das rendas vencidas em 1 de Janeiro e 1 de Fevereiro de 2015, relativas aos meses de Fevereiro e Março de 2015, respectivamente, no montante de 650,00 € cada uma delas e no montante global de 1 300,00 €.
7) Em 30 de Março de 2015, o Agente de Execução AO lavrou certidão de notificação, com o seguinte teor:
"CERTIFICO que dia 25.03.2015, pelas 11.00h me desloquei à Av. IH em Cascais para notificar a Sociedade de Construções Rufino e Santos Unipessoal Lda onde fui atendido por intercomunicador pelo Sr. AF o qual me negou a abertura da porta, não tendo assim possibilidade de o notificar.
Pelo porteiro fui informado que naquele lugar é a residencia do referido Sr. AF. Foi testemunha o Sr. Dr. RR, Solicitador com a cédula n°  000. "
8) A senhoria enviou à arrendatária e ao seu legal representante cartas registadas, com aviso de recepção, datadas de 21/05/2015, endereçadas ao primitivo domicílio, a da arrendatária, e ao domicílio convencionado, a do seu legal representante, com o seguinte teor:
«No seguimento da notificação Judicial Avulsa de Resolução do contrato de arrendamento por falta de pagamento de rendas (processo n° 626/15.8T8CSC   - Comarca de Lisboa oeste - Cascais - Inst. Local - secção Cível -  J4) para o domicílio convencionado, atendendo que o Sr. AF se "negou a abertura da porta" ao Ilustre Agente de Execução no passado dia 25/03/2015, venho por este meio comunicar a V. Ex. a a resolução do contrato de arrendamento que se iniciou em 01 de Abril de 2014, cumprindo o disposto do artigo 10° nº 3 e 4 do NRAU (envio carta registada com aviso receção), conforme Documento que se anexa.»
 9) As cartas foram devolvidas ao remetente constando, da que foi endereçada à arrendatária, a menção "Mudou-se ", aposta pelos CTT.
10) No dia 25 de Março de 2015, o Sr. AF, legal representante da arrendatária, encontrava-se no Porto, em trabalho.
11) Em 10/08/2015, a Requerida procedeu ao pagamento, por transferência bancária, da quantia de 1.462,50 €, a favor da Requerente.
12) Em 01/10/2015, a Requerida procedeu ao pagamento, por transferência bancária, da quantia de 1 462,50 €, a favor da Requerente.
13) Em 10/11/2015, a Requerida procedeu ao pagamento, por transferência bancária, da quantia de 1 462,50 €, a favor da Requerente.
14) Com a oposição, a Requerida não procedeu à junção do documento comprovativo do pagamento da caução prevista no artigo 15°-F n° 3, da Lei n° 6/2006, de 27/2.
15) Notificada para o efeito, nos termos que constam do despacho de fls. 150, veio juntar documento comprovativo do depósito, em 09/12/2015, da quantia de 975,00 €, a título de caução.

· Inconformada recorre a requerida, concluindo que:
· A recorrente não se conforma com a douta sentença do tribunal a quo por considerar que o tribunal equivocadamente interpretou os factos provados nos autos nos quesitos nºs 9 e 10, e, aplicou erradamente as seguintes as normas jurídicas:
· desvalorização da carta com o registo nº RD 594158936PT enviada em 21-05-2015 para a inquilina, para a morada do locado que foi devolvida com indicação pelos CTT que "Não atendeu" , bem como, uma incorrecta valorização das declarações da testemunha arrolada pela ré em contraposição ao documento junto como certidão elaborada pelo agente de execução AO datada de 25-03-2015, onde declara que o representante da ré não abriu a porta e se recusou assinar e receber a notificação judicial avulsa, e da restante matéria provada, conforme infra se expõe.
· Incorrecta aplicação das normas jurídicas prevista no artigo 10° nº 3 e 4 do NRAU, por força do princípio da integração da lei na interpretação das normas jurídicas previsto no nº 1 do artigo 10° C. Civil;                         
· Ao disposto artigo 10° da Portaria n° 9/2013 e nºs 3, 4 e 5 do art° 15° F e art° 15°-H do NRAU - distribuição e termos posteriores ao Procedimento de Despejo - no que concerne à admissão da oposição ao despejo sem ter sido acutelado os valores necessárias na prestação de caução por parte da inquilina/ recorrida.
Da reapreciação da prova
- No que concerne o quesito nº 9 da matéria provada:
Tendo em conta a prova documental, impugna-se a redação do Facto 9 porque as cartas foram devolvidas ao remetente, constando, quanto à carta com o Registo nº RD 594158936PT, que foi endereçada para a morada do locado a menção "Não atendeu", oposta pelos CTT; e quanto à carta com o Registo n° RD 594158940PT que foi endereçada à morada da sede da arrendatária a menção "Mudou-se", aposta pelos CTT.
- Assim salvo melhor opinião o quesito nº 9 deveria ter a seguinte redação:
“As cartas foram devolvidas ao remetente constando, quanto à carta com o Registo nº RD 594158936PT, que foi endereçada para a morada do locado a menção "Não atendeu", oposta pelos CTT; e a carta com o Registo n° RD 594158940PT que foi endereçada à morada da sede da arrendatária a menção "Mudou-se", aposta pelos CTT.
- No que concerne o quesito nº 10 da matéria provada:
A recorrente também não aceita que considerado como provado o conteúdo do Facto 10 por verificar-se incoerência entre as declarações da testemunha PF e as constantes na certidão do agente de Execução de fls. 77, confirmadas pelo agente de Execução RR que testemunhou a diligência; e a testemunha não é clara nas suas declarações quanto à certeza temporal que no dia 25/03/2015 o Sr. AF se encontrava no Porto.
- O tribunal a quo formou a sua convicção pela única testemunha ouvida PF, companheira do Sr. AF (representante da recorrida) que afirmou que no dia 25/03/2017 o representante da ré encontrava-se no Porto consigo. 
- A testemunha não relatou nenhum facto que objectivamente se reportasse ao dia 25/03/2015 e confirmasse, indiscutivelmente, que o representante da ré se encontrava no Porto.
- A testemunha não esclareceu, relatando um facto pessoal ou profissional ocorrido no dia 25/03/2015 de especial relevância para si , de forma a certificar o dia no qual o representante da ré foi para o Porto para estar consigo, somente temporalizando vagamente que na semana anterior ao dia 29/03 o representante da recorrida esteve consigo. 
- Por oposição, a Notificação judicial avulsa foi realizada no período da manhã às 1l horas, no dia 25 de Março 2015, conforme certidão do agente de execução, agindo num ato de fé pública em nome do tribunal.
- O agente de execução emitiu certidão negativa realizada por si e, devidamente atestada por testemunha junta aos autos - que, no dia 25/03/2015 às 11 horas na presença do seu colega Dr. RR o representante da Requerida Sr. AF pelo intercomunicador não abriu a porta e não assinando o documento (notificação judicial avulsa).
- E, consta se verifica nesse documento que o agente de execução indagou junto do porteiro do prédio para ter a certeza qual o andar do Sr. AF - não se limitando a confiar nos dados constantes na notificação.  
- Além disso, a testemunha declarou ter relação de namorada/ companheira com o representante da ré AF - o que obsta a uma total isenção no testemunho, tendo demonstrado conhecer a situação em causa nos autos (rendas em atraso relativas ao imóvel).  
- Ficou provado que só a partir de 10/08/2015, a ré iniciou os pagamentos das rendas (factos 11 a 13), pelo que não poderá colocar em causa o desconhecimento da falta de pagamento de rendas e do objectivo da notificação judicial avulsa.
- Em 21/05/2015 a senhoria enviou mais duas cartas registadas com aviso de recepção (nos termos do nº 33 e 4° do NRAU) (Facto 9), uma para a sede da ré (Registo nº RD 594158940PT ) que veio devolvida com indicação "mudou-se" e outra para o locado que veio devolvida com indicação "não atendeu" (reg n° RD 594158936PT).
- O representante da Ré não levantou a correspondência endereçada à inquilina, o que se impunha, uma vez que, a carta era dirigida à inquilina, pessoa coletiva e, cujas regras de notificação/ citação são diferentes das pessoas singulares.  
- A decisão do tribunal a quo, não poderia ter desvalorizado a certidão do Agente de Execução AO, confirmada pela testemunha agente de Execução RR, face ao testemunho da testemunha PF; nem desvalorizar as cartas enviadas à posteriori pela senhoria à Ré, no sentido de atribuir um efeito jurídico à inércia do inquilino, designadamente, aquando das interpelações decorrentes da resolução do contrato de arrendamento por falta de pagamento de rendas.  
De Direito
· - Salvo melhor opinião, não se verifica invalidade da notificação judicial Avulsa porque:
· - A senhoria por notificação judicial avulsa à inquilina, procedeu à comunicação da resolução do contrato de arrendamento, com fundamento na falta de pagamento das rendas vencidas em 1 de Janeiro e 1 de Fevereiro de 2015, relativas aos meses de Fevereiro e Março de 2015, respectivamente, no montante de 650,00 € cada uma delas e no montante global de 1 300,00 € (ponto 6. dos factos assentes).
· Em 30 de Março de 2015, o Agente de Execução AO lavrou certidão de notificação, com o seguinte teor: "CERTIFICO que dia 25.03.2015, pelas 11.00h me desloquei à Avª IH em Cascais para notificar a Sociedade de Construções Rufino e Santos Unipessoal Lda onde fui atendido por intercomunicador pelo Sr. AFo qual me negou a abertura da porta, não tendo assim possibilidade de o notificar. Pelo porteiro fui informado que naquele lugar é a residência do referido Sr. AF. Foi testemunha o Sr. Dr. RR, Solicitador com a cédula n° 5635. (ponto 7. dos factos assentes).             
· - Após um mês, em 21/05/2015, a senhoria enviou à arrendatária e ao seu legal representante cartas registadas, com aviso de recepção, datadas de 21/05/2015, endereçadas ao primitivo domicílio, a da arrendatária (sede) RD 594158940PT e ao domicílio convencionado (locado) reg nº RD 594158936PT) com o seu legal representante, com o seguinte teor:
· «No seguimento da notificação Judicial Avulsa de Resolução do contrato de arrendamento por falta de pagamento de rendas (processo na 626/15.8T8CSC  Comarca de Lisboa oeste - Cascais - Inst. Local - secção Cível - J4) para o domicílio convencionado, atendendo que o Sr. AF se "negou a abertura da porta" ao Ilustre Agente de Execução no passado dia 25/03/2015, venho por este meio comunicar a V. Ex." a resolução do contrato de arrendamento que se iniciou em 01 de Abril de 2014, cumprindo o disposto do artigo 10º nº 3 e 4 do NRAU (envio carta registada com aviso receção), conforme Documento que se anexa.»
· - As cartas foram devolvidas ao remetente constando, que foi endereçada à sede da arrendatária, a menção "Mudou-se", e a que foi enviada para o locado com menção "não atendeu" aposta pelos CTT. Ora,
· - Tendo a senhoria optado pela notificação judicial avulsa, nos termos do referido artigo 9° nº 7 alínea a), e tendo-se esta frustrado e o agente de execução, na presença duma testemunha certificado que o representante da ré não quis abrir a porta após ter atendido no intercomunicador, a senhoria só poderia enviar nova comunicação passado 30 dias, nos termos nas alíneas a) e b) do n° 5 do aludido artigo 10° NRAU.  
· - As normas jurídicas no preceituado nas alíneas a) e b) do nº 5, 3° e 4° do aludido artigo 10°, (recusa de assinatura da certidão ou impossibilidade de localização do inquilino), aplicam-se à frustração da comunicação quando o senhorio tenha optado por efectuá-la através de carta registada com aviso de recepção, e aplica-se quando o senhorio opta por um comunicação mais formal e exigente, como é o caso da notificação judicial avulsa;
· No âmbito do principio da integração da lei e das lacunas da lei, «A lei que permite o menos (carta registada com AR) permite o mais (notificação judicial avulsa)»
· A lei não prevê situação específica em que há recusa de assinatura da certidão ou impossibilidade de localização do inquilino quando estamos perante uma Notificação Judicial Avulsa - o que implica aplicar normas jurídicas no preceituado nas alíneas a) e b) do nº 5,3° e 4° do aludido artigo 10°.
· Como o artigo 10° NRau estabelece um procedimento nas situações em que se fruste a receção da comunicação escrita (por correio registado) ao inquilino mediante recusa de assinatura da certidão ou impossibilidade de localização do inquilino - e, nestes casos, a única entidade a atestar a não entrega da comunicação é funcionário do CTT (entidade que não tem fé publica) - dever-se-à aplicar este normativo legal quando a comunicação é realizada por Agente de Execução (entidade com fé publica) e que mediante testemunha atesta que a inquilina não quis nem receber nem assinar a Notificação Judicial Avulsa.
· Assim sendo, o recorrente não concorda com o entendimento do tribunal a quo, ou seja, que o normativo do Artigo 10° do NRAU não é aplicável à comunicação da resolução do contrato de arrendamento quando executada por Notificação judicial Avulsa.
· A recorrente não se conforma que o tribunal considere que não foi acautelado um dos requisitos para a utilização do procedimento especial de despejo, com vista à efectivação da cessação do contrato de arrendamento, em caso de resolução por comunicação - o comprovativo da comunicação prevista no nº 2 do artigo 1084°, do Código Civil - artigo 15° nº 2 alínea e) do NRAU - quando se juntou certidão do agente de execução e duas comunicações à ré, endereçadas para o locado devolvida com a menção não atendeu, e outra endereçada para a sede da mesma devolvida com a menção mudou-se. 
· Os pagamentos das rendas em causa não foram realizados no tempo e lugar próprios - cf. factos provados 11., 12. e 13.
- A senhoria arguiu a intempestividade e a insuficiência da caução prestada pela Requerida, nos termos do artigo 15°-F n° 3 e 4, do NRAU. 
- A lei obrigava que a inquilina ao deduzir oposição ao pedido de despejo tivesse prestado caução, nesse momento, relativamente ao valor das rendas, encargos ou despesas em atraso e efectuar o depósito das rendas vencidas, sob pena da oposição se considerar como não deduzida.
- A inquilina sabia que ao não caucionar a totalidade do valor em dívida e, a que estava adstrita para poder deduzir oposição, a oposição seria liminarmente rejeitada - sem prosseguir os trâmites processuais, o que não aconteceu.  
- O tribunal a quo errou quando não se pronunciou contra a admissibilidade da oposição deduzida, quando a lei estipula como condição dessa admissibilidade do articulado (oposição ao despejo) a prestação de caução em valor suficiente para acautelar o valor das rendas, encargos ou despesas em atraso e efectuar o depósito das rendas vencidas.  
- A ilegalidade supra referida, foi invocada pela senhoria em momento próprio e, o tribunal não se pronunciou sobre a mesma, prosseguindo os autos, violando o disposto artigo 10° da Portaria nº 9/2013 e nºs 3, 4 e 5 do art. 15° F e art. 15°-H - distribuição e termos posteriores - do NRAU.
Nestes termos em que, nos melhores de Direito deve ser concedido provimento ao presente recurso, revogando-se a decisão recorrida, determinando-se a que a douta oposição seja considerado improcedente por inexistir invalidade da notificação e por a recorrida não ter deduzido caução em valor suficiente.
  
A requerente contra-alegou sustentando a bondade da decisão recorrida.

Cumpre apreciar.
O presente recurso assenta na questão de saber se deve ser conferida eficácia à notificação judicial avulsa efectuada pela senhoria.
Invoca-se ainda a questão da intempestividade e insuficiência da caução prestada pela inquilina nos termos do art. 15º-F nºs 3 e 4 do NRAU.

Uma vez que na sentença recorrida se iniciou a abordagem do litígio pela questão da notificação judicial avulsa e também porque na apelação a recorrente pretende a reapreciação da prova e modificação do teor dos nºs 9 e 10 da decisão factual, começaremos por analisar esta matéria.
Ouvida a única testemunha, PF, residente no Porto, namorada do sócio gerente da arrendatária, Engenheiro AF, aquela referiu que na semana anterior a 29 de Março de 2015 o aludido sócio gerente se encontrava no Porto. Esclareceu que se recorda do facto porque no dia 29 de Março partiu para Genebra tendo o Engº AF levado a testemunha para o aeroporto.
É evidente que existe uma discrepância entre este depoimento e a certidão elaborada pelo Agente da Execução, na qual refere que no dia 25/03/2015 pelas 11h se deslocou ao local arrendado para notificar a arrendatária, tendo sido atendido por intercomunicador “pelo Sr. AFo qual me negou a abertura da porta, não tendo assim possibilidade de o notificar. Pelo porteiro fui informado que naquele local é a residência do referido Sr. AF”.
Indicando-se como testemunha desses factos o Dr. RR, solicitador.
A notificação judicial avulsa destinava-se a comunicar à arrendatária a resolução do contrato de arrendamento, com fundamento na falta de pagamento das rendas relativas a Fevereiro e Março de 2015. Essa falta de pagamento tempestiva resulta provada, face ao ponto nº 1 dos factos não provados e ao ónus da prova do pagamento que incide sobre a arrendatária.

Por outro lado, a senhoria enviou à arrendatária e ao seu legal representante cartas registadas com aviso de recepção que vieram devolvidas.
Referimo-nos às cartas contendo a comunicação da resolução contratual.
No seu recurso, a Autora menciona as cartas com nº de registo RD 594158936PT e RD 594158940PT. Estas cartas foram enviadas à arrendatária para a Rua AAA, Casal do Bica, Massamá, e a AF, este para a Avenida IH Cascais (ver fls. 86 e seguintes).
Tais cartas não comunicam a resolução contratual mas antes a não renovação do contrato de arrendamento.
Tendo o requerimento de despejo sido recusado pelo Balcão Nacional do Arrendamento, a 01/09/2015 (fls. 93).
Face a isso, a senhoria reconhecendo não ter sido “instruída a comunicação ao inquilino correcta de resolução do contrato de arrendamento” veio, a fls. 95, juntar comprovativo de tal comunicação.
Juntando a carta dirigida à inquilina, Sociedade de Construções Rufino e Santos Unipessoal Lda, enviada para a Rua AA, Casal do Bica, Massamá, comunicando-lhe a resolução do contrato de arrendamento. Esta carta tem o nº de registo RD 5941 5892 2 PT (fls. 96 a 99).
E enviou uma carta comunicando tal resolução do contrato de arrendamento a AF, para a Avenida IH, Cascais, com o nº de registo RD 5941 5889 6 PT (fls. 100 a 103).
                                                        
Assim, a alteração que a recorrente pretende ver efectuada no tocante ao nº 9 da decisão de facto, terá de se reportar às cartas que enviou contendo a comunicação da resolução contratrual e que têm um número de registo dos CTT diferente do que se indica na apelação.
Diga-se de resto que mesmo que se atendesse aos números de registo indicados na apelação, a conclusão a que teríamos de chegar, em termos de integração jurídica, seria a mesma. Veremos adiante porquê.
Para já, aceita-se rectificar a decisão factual, mas nos termos expostos, passando o nº 9 a ter o seguinte teor:
“As cartas foram devolvidas ao remetente constando, quanto à carta com o registo nº RD 59415889 6PT enviada a AF para a morada do locado a menção “não atendeu”, aposta pelos CTT; e a carta com o registo nº RD594158922PT que foi enviada à arrendatária para o endereço Rua AA Casal do Bica, Massamá, com a menção “mudou-se” aposta pelos CTT”.

Perante a prova não coincidente e que aparentemente se contradiz, saliente-se que, apesar de namorada do gerente da requerida, a testemunha ouvida depôs com aparente isenção, parecendo segura daquilo que referiu. E de tais declarações resulta de modo claro que o Engº AF esteve no Porto com ela na semana que antecedeu o dia 29/03/2015, quer por razões inerentes à relação entre ambos quer por razões profissionais, já que a testemunha é dona de uma empresa de decoração e arquitectura de interiores com a qual o gerente da requerida colabora, enquanto engenheiro civil.
Neste aspecto, a notificação judicial avulsa é menos precisa, já que o Agente da Execução não viu quem estava no locado, afirmando apenas que foi atendido no intercomunicador pelo Sr. AF que se recusou a abrir a porta.
 
Quer a testemunha Paula quer o próprio Engº AF afirmaram que o pai deste tem a chave do locado, onde se desloca, quando o filho está no Porto, para ver a correspondência. Teria sido interessante ouvir esta pessoa sobre os factos, tal como poderia ajudar a esclarecer a situação ouvir o Agente da Execução para se ter uma ideia mais completa do diálogo que foi travado com a pessoa que se achava no locado.
De qualquer modo, da prova a que aludimos, resulta uma diferença com algum significado: a testemunha afirmou que no período em causa o gerente da requerida estava com ela no Porto, enquanto que na certidão da notificação avulsa se afirma que o Agente da Execução foi atendido pelo intercomunicador por AF Fernando AF, sem que se saiba se foi a pessoa que se encontrava no locado que se identificou desse modo ou se o AE tirou tal conclusão do facto de ter sido informado pelo porteiro que esse locado era a residência do AF. Mas, mais importante, não se pode afirmar que tal pessoa fosse efectivamente o Engº AF.
Daí que não existam motivos suficientemente ponderosos para alterar o nº 10 da decisão factual.
Perante isto, não se verifica nenhuma das situações previstas no nº 5 a) e b) do art. 10º do NRAU, que se reporta expressamente à notificação avulsa ou contacto pessoal de advogado, solicitador ou agente da execução - art. 9º nº 7 a) e b) do mesmo diploma.
Com efeito não ocorre a recusa do destinatário da notificação em assinar a mesma nem estamos perante a impossibilidade de localizar o destinatário da comunicação.
Insurge-se a recorrente contra a tese expressa na sentença recorrida, quanto à não aplicação aos casos de notificação judicial avulsa das disposições dos nºs 3 e 4 do art. 10º do NRAU.
O certo é que os nºs 3 e 4 se referem, expressamente, às comunicações por carta registada com aviso de recepção e o nº 5 à notificação avulsa, parecendo clara a intenção do legislador em distinguir o respectivo regime.
O problema contudo nem se centra no sentido a dar ao referido art. 10º do NRAU.
É que, como resultou provado, a carta contendo a comunicação de resolução do arrendamento, com o registo nº RD594158922PT foi remetida à sociedade arrendatária Sociedade de Construções Rufino & Santos, Unipessoal, Lda, para a morada sita na Rua AA, Casal da Bica, Massamá, isto quando a aludida arrendatária comunicara à senhoria em 28/04/2014 a alteração do seu endereço e do seu gerente para a morada do locado na Avenida IH, Cascais.
A carta com o registo nº RD594158896PT, contendo a comunicação de tal resolução do contrato, foi endereçada a AFpara a morada do locado.
Ou seja, a senhoria enviou à arrendatária a carta comunicando a resolução do arrendamento, para um endereço que a própria arrendatária lhe comunicara no ano anterior já não ser o seu, por se ter mudado para o locado.
Embora as sociedades sejam notificadas na pessoa dos seus representantes isso não significa que se envie a comunicação alvo da notificação directamente em nome de tal representante e não em nome da sociedade arrendatária.
O que a recorrente fez foi enviar a carta registada com aviso de recepção dirigida à arrendatária, contendo a comunicação da resolução do arrendamento, para uma morada que não podia ignorar já não ser a dessa arrendatária.
Ao invés, enviou para o locado, morada da arrendatária, uma carta contendo a comunicação da resolução, mas dirigida directamente a AF.
Conclui-se pois que a carta que releva, a dirigida à arrendatária, foi endereçada para uma morada que já não era a desta, facto que a senhoria não podia ignorar. Mas não lhe enviou qualquer carta para a morada que a arrendatária lhe comunicara, no ano anterior, ser a sua.
Logo, existe incumprimento pela senhoria do dever de comunicação da resolução, mesmo que se entendesse serem aqui aplicáveis os nºs 3 e 4 do art. 10º do NRAU.
             
Alega ainda a recorrente que a caução prestada pela arrendatária nos termos do art. 15º-F nºs 3 e 4 do NRAU, foi intempestiva e insuficiente.
Embora a arrendatária tenha procedido ao depósito da caução no prazo concedido pelo tribunal, o seu montante (€ 975,00) não é o devido (€ 1.300,00).
Na verdade, a lei fulmina tal incumprimento considerando a oposição como não deduzida – art. 15º 4 do NRAU.

Contudo, previamente, seria necessário que o procedimento especial de despejo fosse válido. E o certo é que, nos próprios termos em que é formulado, tem de se considerar como inatendível.
Com efeito, no requerimento de notificação judicial avulsa – fls. 63 e seguintes – a senhoria afirma, além do mais, no nº 5, que “por comunicação escrita de 28/04/2014 a requerida comunicou à requerente a alteração da morada quer da requerida Sociedade de Construções Rufino e Santos Unipessoal Lda bem como do seu gerente para a morada do locado sita na Avenida IH Cascais (...)”.
E depois envia carta registada com aviso de recepção comunicando a resolução do arrendamento à arrendatária para uma morada diferente. E aqui já nem nos referimos à carta em que comunicava à mesma arrendatária e para tal morada que sabia não ser a correcta, a não renovação do contrato (esta, é que é a carta com o nº de registo indicado nas alegações de recurso).
Não é verdade, contrariamente ao art. 5º das alegações que a carta com nº de registo RD 594158936PT tenha sido dirigida à arrendatária. Como se vê de fls. 83/85 (ou também fls. 37/39) a carta foi enviada para AF. Além disso, tal carta não comunicava a resolução do contrato de arrendamento mas a sua não renovação, como vimos.

Logo, nos próprios termos invocados pela requerente e reiterados na apelação, se verifica que a mesma não deu cumprimento aos preceitos legais que ela própria insiste deverem ser aplicáveis – nºs 3 e 4 do art. 10º do NRAU.
Assim, previamente a qualquer oposição da inquilina, é o procedimento levado a cabo pela senhoria que tem de ser rejeitado por inválido.

A carta com a comunicação da resolução do contrato de arrendamento, endereçada para o local arrendado, não foi enviada à arrendatária mas sim, repete-se, a AFe nela nem sequer se refere a sua qualidade de gerente da sociedade (fls. 112).

Conclui-se assim que:
– Tendo a Sociedade arrendatária comunicado à senhoria a mudança da sua sede para a morada do locado, o envio das cartas pela senhoria, cerca de um ano depois, comunicando a resolução do contrato de arrendamento, nos termos dos nºs 3 e 4 do art. 10º do NRAU, para o endereço anterior da sociedade arrendatária, torna inválido o procedimento especial de despejo.

Nestos termos, julga-se a apelação improcedente, confirmando-se a sentença recorrida.  
Custas pela recorrente.

LISBOA, 28/6/2018

António Valente

Ilídio Sacarrão Martins

Teresa Prazeres Pais