Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
158/15.4PLLRS.L1-5
Relator: ALDA TOMÉ CASIMIRO
Descritores: CONVERSÃO DA MULTA EM PRISÃO
PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO
SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 06/11/2019
Votação: UNANIMIDADE
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NÃO PROVIDO
Sumário: - O exercício do contraditório mostra-se cumprido com a notificação ao condenado para se pronunciar sobre a conversão da multa em prisão subsidiária, já que o direito que o condenado tem a ser ouvido se satisfaz com a sua audição processual, não carecendo de ser uma audição presencial, que a lei processual penal não exige, entendimento que não é inconstitucional.
- Só após o trânsito em julgado da condenação em pena de prisão substituída por pena de multa, e antes de o condenado entrar em incumprimento, é que o tribunal, a requerimento do condenado, poderá permitir o pagamento da multa em dias de trabalho, se entender que através desta forma de cumprimento se realizam “de forma adequada e suficiente as finalidades de punição.
- Não é o Tribunal que tem que averiguar da causa do incumprimento do condenado, se esta é culposa ou não, sendo ao condenado que incumbe alegar e provar que a razão do não pagamento da multa lhe não é imputável.
- A regra prevista no nº 3 do art. 49º do Código Penal, enquanto faz depender a suspensão da execução da prisão subsidiária da demonstração pelo condenado de que o não pagamento da multa lhe não é imputável, não contraria o nº 1 do art. 32ª da Constituição, onde se consagra a plenitude das garantias de defesa, nem o princípio in dubio pro reo”.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, na 5ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa,

Relatório

No âmbito do processo comum (singular), nº 158/15.4PLLRS, que corre termos no Juiz 4 do Juízo Local Criminal de Loures, do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Norte, foi o arguido J. , condenado, como autor material de um crime de falsificação agravado, p. e p. pelo art. 256º, nº 1, alíneas e) e f) e nº 3 do Cód. Penal, na pena de 210 dias de multa; e de um crime de condução de veículo sem habilitação legal, p. e p. pelo art. 3º, nºs 1 e 2, do D.L. 2/98 de 3.01, na pena de 120 dias de multa. Operado o cúmulo jurídico, ficou o arguido condenado na pena única de 290 (duzentos e noventa) dias de multa, à taxa diária de € 5,00 – no montante global de € 1.450,00 (mil quatrocentos e cinquenta euros).
Na sentença foi o arguido alertado de que não pagando a multa nem requerendo a sua substituição por trabalho a favor da comunidade, poderá cumprir 193 (cento e noventa e três) dias de prisão subsidiária.
A decisão transitou em julgado.
Porque o arguido não procedeu ao pagamento da multa, foi determinado que cumprisse a pena de prisão subsidiária.
Inconformado com tal despacho, veio o arguido apresentar o presente recurso em que pede que seja revogado o despacho recorrido, por via das nulidades cometidas e se proferira acórdão que anule todo o processado que contenda com a violação do princípio do contraditório e violação das regras de notificação. Subsidiariamente, pede que se ordene a suspensão da execução da pena de prisão subsidiária por se justificar.
Para tanto formula as conclusões que se transcrevem:
1- Recorre-se do despacho que converte a pena de multa no montante de € 1.450,00, em 193 dias de prisão subsidiária, pelo não pagamento.
2- E recorre-se porque se entende que, num primeiro momento, o Tribunal a quo não notificou devidamente o arguido em dois momentos relevantes - o Despacho definitivo de que agora se recorre (Refª 138914130) e o Despacho (Refª 135832397) para dizer o que tiver por conveniente relativamente à conversão da multa em 193 dias de prisão subsidiária.
3- Isto por ter o Tribunal a quo julgado regulares tais notificações efectuadas por via postal simples com prova de depósito.
4- Quando, quer da lei, quer da jurisprudência maioritária decorre a necessidade de, atenta a gravidade do que está em causa - a liberdade de um cidadão - se exigir por qualquer forma a notificação pessoal do condenado, que garanta a real e efectiva notificação para o contraditório e não apenas a sua presunção.
5- O Tribunal a quo não foi sensível aos requerimentos que o condenado - pela mão do seu defensor oficioso e com o primeiro dos quais, pelo menos, foi acompanhado pelo MP (Refª 136483 406) e,
6- Persistiu em considerar o arguido notificado quando todos os elementos dos autos indiciam o oposto. E mais,
7- Aconselhavam vivamente uma notificação pessoal, por OPC, directa, expressa, clara, indubitável e bem explicada ao arguido, até porque como se referiu no ponto 7 das Motivações existem sinais de problemas mentais do ora recorrente.
8- Nada disso ocorreu o que, salvo o devido respeito e consideração, não só viola o art. 49º, do C. Penal, como o princípio do contraditório, princípio esse de cariz constitucional e do direito penal. Para além de que,
9- Vai contra a jurisprudência maioritária (vide ponto 11 das alegações).
10- Com tal procedimento incorreu o Tribunal a quo em nulidades insanáveis por violação do disposto no art. 119º, al. c) do CPP e por força do art. 61º, nº 1, al. b) do mesmo diploma legal e ainda do art. 32º, nº 5 da CRP.
11- Mas, ainda que se considerassem perfeitas e regulares tais notificações, o que só por mera hipótese académica se poderá aceitar, o Tribunal “a quo” omitiu duas relevantes e decisivas questões sobre o que estava em causa;
12- Por um lado, obnubilou totalmente a eventualidade do arguido prestar trabalho a favor da comunidade, e, em acto contínuo,
13- Não se preocupou em concretizar da real possibilidade ou impossibilidade deste pagar a multa e, muito menos, se essa impossibilidade lhe é culposamente imputável, tudo obrigações que resultam do corpo e do espírito do art. 49º e demais legislação penal e processual penal, quando é assente que o cumprimento da pena de prisão efectiva constitui a ultima ratio do Direito Penal.
14- Hipotecando, “ab inicio”, a possibilidade de uma suspensão da execução da pena de prisão subsidiária que até se nos afigura, no caso vertente, perfeitamente plausível, face às informações existentes nos autos e ao preceituado no nº 3, do art. 49º, do C. Penal, para além da inexistência manifesta de fundamentação do despacho recorrido relativamente à culpa ou não do arguido no não pagamento da multa.
15- Situação que configura a violação por errada aplicação e interpretação do art. 49º do C. Penal.
                                                  *
A Digna Magistrada do Ministério Público junto da primeira instância contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso e apresentando as seguintes conclusões:
1- No nosso entender, não foram respeitados os requisitos expressos no art. 412º, nº2 do C.P.P, pois o recorrente deveria ter indicado as normas jurídicas violadas, bem como o sentido em que, no seu entendimento o tribunal recorrido interpretou cada norma ou com que a aplicou e o sentido em que ela devia ter sido interpretada, ou com que devia ter sido aplicada e ainda, em caso de erro na determinação da norma aplicável, a norma jurídica que, no entendimento do recorrente, devia ser aplicada;
2- Ora, resulta de modo claro da análise da sua motivação, que o recorrente pese embora, indique alguns preceitos jurídicos, fazendo alusão aos mesmos, não indica, em nosso entender, o sentido em que deviam ser interpretadas ou aplicadas, o que no nosso entender é insuficiente;
3- Quanto á questão suscitada da não notificação regular do arguido, temos a dizer que, visa a lei, ao notificar o arguido, que este possa exercer o seu direito de defesa, consagrando-se no art. 32º da C.R.P., que o processo criminal assegura todas as garantias de defesa, tem estrutura acusatória, estando a audiência de discussão e julgamento e os actos instrutórios que a lei determinar, subordinados ao princípio do contraditório, bem como, que a lei define os casos em que, assegurados os direitos de defesa, pode ser dispensada a presença do arguido ou acusado em actos processuais, incluindo a audiência de julgamento (art.32, nº1, 5, 6 da C.R.P.);
4- Refere ainda o art. 20º, nº 4 da C.R.P., que todos têm direito a que uma causa em que intervenham, seja objecto de decisão, em prazo razoável e mediante processo equitativo, ou seja, no âmbito do processo penal em geral, mais concretamente, na audiência de discussão e julgamento, o arguido deve ter ao seu alcance um processo equitativo, que só se poderá verificar, se lhe forem asseguradas as necessárias garantias de defesa, tendo de funcionar em absoluto o princípio do contraditório;
5- Conforme é referido no Ac. Constitucional 172/92, de 6/05 de 1993, BMJ nº427, pág. 57, "o processo penal de um Estado de direito há-de cumprir dois objectivos fundamentais; assegurar ao Estado a possibilidade de realização do seu jus puniendi e oferecer aos cidadãos as garantias necessárias para os proteger contra os abusos que possam cometer-se no exercício do poder punitivo, designadamente contra a possibilidade de uma sentença injusta;
6- Tal processo há-de, por conseguinte, ser um processo equitativo (a due process, a fair process), que tenha por preocupação dominante a busca da verdade material, mas sempre com inteiro respeito pela pessoa do arguido, o que, entre o mais, exige que se assegurem a este todas as garantias de defesa e que não se admitam provas que não passem pelo crivo do contraditório e pela percepção directa e pessoal do juiz (principio da oralidade e da imediação);
7- O sentido essencial do princípio do contraditório está em que nenhuma prova deve ser aceite em audiência, nem nenhuma decisão (mesmo só interlocutória) deve aí ser tomada pelo Juiz sem que previamente tenha sido dada ampla e efectiva possibilidade ao sujeito processual contra o qual é dirigida de a discutir, de a contestar e de a valorar";
8- Ora, o princípio do contraditório, só se concretiza em sede de audiência de discussão e julgamento se o arguido souber da existência da mesma e se puder estar nela presente, e posteriormente a esta, ou anteriormente, se tomar conhecimento, sendo notificado, das decisões que o afectem, nos termos do art. 113º do C.P.P.;
9- Qualquer obstrução externa à concretização destes direitos constitui violação daquele princípio e por isso o Estado está obrigado a assegurar que os mesmos se materializem;
10- É neste âmbito que surgem os normativos dos arts. 119º al. c), em que comina com nulidade insanável a ausência do arguido nos casos em que a lei exige a sua comparência;
11- Deste modo, uma notificação, só cumpre a sua função, se chegar ao efectivo conhecimento do destinatário, ou, pelo menos, é susceptível de ser por si conhecida, nos termos em que se encontra legalmente regulamentada;
12- Importa então analisarmos, na situação em apreço, ou seja, quando do despacho que converte a pena de multa em dias de prisão subsidiária, como é que deve ser efectuada essa notificação, se é exigível que se efectue por contacto pessoal, ou se basta o envio de carta para a morada a morada constante do TIR;
13- Tal questão foi largamente discutida na doutrina e jurisprudência antes da alteração legislativa da Lei 20/2013, que veio dar uma nova redacção aos arts 196º, nº3 al. e) e 214º, nº1 al. e), ambos do C.P., e em que maioritariamente se entendia que tinha que ser efectuada uma
notificação por contacto pessoal, sendo o argumento predominante o facto de o TIR se extinguir com o trânsito em julgado da decisão e portanto não se poderia efectuar validamente, uma notificação para a morada do TlR, sendo esta uma medida de coacção que já se havia extinguido, daí a necessidade de ser efectuada uma notificação por contacto pessoal;

14- Ora, com a alteração legislativa em 2013, com a nova redacção dada os arts 196º e 214º, inverteu-se a situação, sendo praticamente unanime a jurisprudência no sentido de que basta a notificação por carta enviada para a morada do TlR pese embora, ainda muito minoritariamente haja quem continue a entender que deve ser por contacto pessoal;
15- Uma vez que o TIR prestado nos autos, foi já com a nova redacção da Lei 20/2013, iremos debruçar-nos sobre esta questão já com a alteração introduzida, não sem antes fazermos como que uma resenha histórica da situação dos autos;
16- O arguido prestou TIR a fls 6 dando como morada para notificações a Praceta A... Mem Martins, morada esta que consta da acusação e para onde foram enviadas todas as notificações que se seguiram, nomeadamente da audiência de discussão e julgamento bem como da sentença, da qual foi notificado nessa mesma morada a fls 141v, em 16/02/2017;
17- Em 17/05/2017, a fls 154 dos autos, foi prestado novo TlR sendo indicada a morada para efeitos de notificação, Rua T.,… Lisboa;
18- Notificado a fls 161 para efectuar o respectivo pagamento, para a nova morada, veio o arguido apresentar o requerimento de fls 165 para efectuar o pagamento em prestações, o que lhe foi deferido;
19- Ora, uma vez que este não pagou qualquer prestação, e havendo a informação nos autos de que a sua entidade patronal, face á notificação enviada com a ref 135311499, veio a resposta de fls 197, em 20/11/2017, onde é referido que o arguido nunca aí trabalhou, que tem problemas de saúde mental, que aparece á porta do estabelecimento para pedir alimentação;
20- Em 07/12/2017 a Mmª Juiz, ordenou a notificação ao arguido para o exercício do contraditório quanto à conversão da pena de multa em prisão subsidiária (fls 198), a qual foi feita por via postal simples, com prova de depósito, para a morada constante do TIR;
21- Em 21/02/2018, foi dada a promoção para o mesmo ser notificado através da PSP, tendo-se em conta as dificuldades do arguido, nomeadamente mentais (conforme informação que já referimos supra), que a Mmª Juiz entendeu não ser de efectuar, uma vez que o mesmo estava regularmente notificado, e na verdade não podemos deixar de referir que nos termos da lei o arguido foi regularmente notificado, quisemos ao promover o supra descrito, e conhecendo as orientações da jurisprudência, que pese embora maioritariamente num sentido, não é unânime, deixar em aberto todas as hipóteses, tendo-se ainda a informação fornecida que será apenas uma suspeita sem confirmação, sendo que o requerimento que o arguido dirigiu ao processo, não denotou qualquer insuficiência e foi por si manuscrito, daí depois referimos em 20/11/18, face ao requerimento apresentado pelo seu ilustre mandatário, que o arguido está regularmente notificado, e que foi cumprido o normativo legal e que pese embora esteja em causa a liberdade do arguido, este pode a todo o tempo, efectuar o pagamento da multa e assim, obstar á sua prisão;
22- Assim, podemos dizer que em consonância com a promoção supra referida, entendemos que o arguido foi regularmente notificado;
23- Abordando as várias questões suscitadas, no que diz respeito á audição prévia do arguido, importa desde já referir, que foi manifesto, no nosso entender, o desinteresse do arguido para o julgamento e a condenação proferida;
24- O arguido, apesar de regularmente notificado, não compareceu em julgamento, nem na leitura da sentença, e nem procedeu ao pagamento da multa em que foi condenado apesar de igualmente regularmente notificado;
25- A única intervenção do arguido nestes autos foi para requerer o pagamento em prestações face á notificação que lhe foi efectuada, sendo certo que depois não procedeu ao pagamento de uma única prestação, nem veio após, alegar qualquer motivo que lhe impedisse o pagamento, qualquer impossibilidade, para desse modo alegar que não lhe era imputável o não pagamento, sendo certo que já sabia que tinha que pagar e que nem em prestações o fez;
26- Ora, dispõe o artigo 49º do CP sob a epígrafe "conversão da multa não paga em prisão subsidiária":
1 - Se a multa, que não tenha sido substituída por trabalho, não for paga voluntária ou coercivamente, é cumprida prisão subsidiária pelo tempo correspondente reduzido a dois terços, ainda que o crime não fosse punível com prisão, não se aplicando, para o efeito, o limite mínimo dos dias de prisão constante do nº1 do artigo 41º
2 - O condenado pode a todo o tempo evitar, total ou parcialmente, a execução da prisão subsidiária, pagando, no todo ou em parte, a multa a que foi condenado.
3 - Se o condenado provar que a razão do não pagamento da multa lhe não é imputável, pode a execução da prisão subsidiária ser suspensa, por um período de 1 a 3 anos, desde que a suspensão seja subordinada ao cumprimento de deveres ou regras de conduta de conteúdo não económico ou financeiro. Se os deveres ou as regras de conduta não forem cumpridos, executa-se a prisão subsidiária; se o forem, a pena é declarada extinta.
4- O disposto nos nºs 1 e 2 é correspondentemente aplicável ao caso em que o condenado culposamente não cumpra os dias de trabalho pelos quais, a seu pedido, a multa foi substituída. Se o incumprimento lhe não for imputável, é correspondentemente aplicável o disposto no número anterior.
27- Ainda, no Código de Processo Penal, dispõe o artigo 491º sob a epígrafe "Não pagamento da multa "
1 - Findo o prazo de pagamento da multa ou de alguma das suas prestações sem que o pagamento esteja efectuado, procede-se à execução patrimonial.
2 - Tendo o condenado bens suficientes e desembaraçados de que o tribunal tenha conhecimento ou que ele indique no prazo de pagamento, o Ministério Público promove logo a execução, que segue os termos da execução por custas.
3 - A decisão sobre a suspensão da execução da prisão subsidiária é precedida de parecer do Ministério Público, quando este não tenha sido o requerente.
28- Refere o artigo 61º, nº1 al. b) do C.P.P. - o arguido goza, em especial, em qualquer fase do processo e salvas as excepções da lei, dos direitos de: b) ser ouvido pelo Tribunal ou pelo juiz de instrução sempre que eles devam tomar qualquer decisão que pessoalmente o afecte.
29- Assim, de acordo com o disposto no artigo 49º, nº1 do Código Penal os pressupostos de conversão de uma pena de multa não substituída por trabalho a favor da comunidade, em prisão subsidiária são o seu não pagamento voluntário ou coercivo.
Para isso, é bastante que a multa não tenha sido paga voluntariamente e que "a impossibilidade de pagamento coercivo resulte “ab initio” por não existirem bens que permitam pelo menos tentar obter o pagamento". Vide ac. do TRC de 06.02.2013, disponível no site www.dgsi.pt.
30- Resulta dos autos que as guias emitidas para pagamento da multa não foram pagas. E ainda que apesar das diligências efectuadas não foi possível apurar a existência de bens ou rendimentos (conforme informação da PSP de fls 201), razão pela qual o MP não instaurou execução;
31- Portanto, quanto a este aspecto mostram-se efectuadas as diligências que ao caso se impunham, verificando-se deste modo, os pressupostos de conversão da pena de multa em prisão subsidiária;
32- Posto isto, a questão colocada prende-se com a averiguação da necessidade de audição do arguido antes da prolação do despacho de conversão;
33- Assim, antes de mais, importa realçar que ao arguido foi sempre concedido o exercício do contraditório mediante notificação pessoal, para além da notificação através do defensor, relativamente ao pagamento da multa de substituição e às consequências legais da omissão desse pagamento;
34- Na verdade, o arguido foi notificado sempre através do seu defensor, das condições em que lhe foi concedido o pagamento fraccionado da multa de substituição; para proceder ao pagamento da totalidade do valor da multa, sob pena de cumprimento da prisão imposta na sentença;
35- E note-se a este respeito que neste momento, não está em causa a liberdade do arguido, até porque a pena não é originariamente privativa da liberdade e o condenado pode a todo o tempo evitar a execução da prisão subsidiária, desde que pague no todo ou em parte, a multa em que foi condenado (art. 49º nº2 do CP.)
36- A notificação em causa não cabe no elenco taxativo do art. 113º nº10, 2ª parte, não se exigindo a notificação pessoal do arguido, nem a sua audição pessoal para se pronunciar sobre a possibilidade de conversão da pena de multa em prisão subsidiária;
37- Acresce ainda que, a qualidade de arguido conserva-se durante todo o decurso do processo nos termos do art. 57º nº2 do C.P.P.
Conforme é referido no Acórdão 109/2012, de 06/03, do Tribunal constitucional "o condenado numa pena sabe que a sua relação com o tribunal não fica definitivamente encerrada com a sentença condenatória. E determinando o art. 49º nº1 do C.P. que não pagando o condenado a multa, há que proceder à sua conversão em prisão subsidiária, há necessidade de comunicação com o arguido.
Ora observados os referidos deveres de comunicação por parte do condenado, as cautelas que rodeiam a notificação, via postal simples, com prova de depósito (nº 3 e 4 do art. 113º do C.P.P.), torna este meio de notificação um meio adequado, segundo a comum experiência, a garantir o conhecimento do acto comunicado".
38- Primeiro, o despacho de 26/09/2018 foi proferido após a notificação para o arguido exercer o contraditório e sem que o arguido tivesse reagido;
39- Depois, não existe imposição legal de audição presencial do arguido sobre o incumprimento da multa, ou seja, sobre os motivos do não pagamento da multa, previamente ao despacho que determina a sua conversão em dias de prisão subsidiária;
40- A multa deve ser paga no prazo de 15 dias a contar do trânsito em julgado, após notificação que lhe deve ser feita, nos termos do art. 489º, nºs 1 e 2, do CPP, assistindo ao arguido o direito de requerer o pagamento em prestações ou dentro do prazo de um ano, nos termos do art. 47º nº3, do CP, a substituição por dias de trabalho (art. 490º, do CPP), porém findo o prazo para pagamento da multa ou de alguma das suas prestações sem que o pagamento por inteiro esteja efectuado, procede-se, nos termos do art. 491º nº1, do CPP, à execução patrimonial;
41- Cumprida esta plúrima regra procedimental, não assiste outra alternativa ao tribunal, desde que ante este se não haja comprovado previamente a impossibilidade não culposa de satisfazer a multa, que não seja a de a converter em dias de prisão subsidiária.
Entendemos que não tem paralelo tal situação, com a imposição do contraditório presencial do condenado aplicável em caso de incumprimento da suspensão da pena, nomeadamente das regras e deveres que a condicionam, que decorre do artigo 495º, nº2, do Código Processo Penal, pois que não se verificam os pressupostos para aplicação analógica daquela norma;
42- Note-se ainda, conforme referido a propósito e em anotação ao artigo 49º do CP escreve Maia Gonçalves, no Código Penal Anotado, 13ª Edição, pág. 203, «... o cumprimento da pena de prisão subsidiária é agora determinado após a verificação de que a multa não substituída por trabalho não foi paga, voluntária ou coercivamente. Não é, portanto, necessário que na sentença se fixe a pena subsidiária, como sucedia na vigência do art. 46º, nº3 na versão originária do código quanto á prisão alternativa. No entanto, a ordem de cumprimento da prisão subsidiaria terá que ser dada por despacho do juiz após verificação dos pressupostos enunciados no nº1. Cremos não se poder dispensar a intervenção judicial, e mesmo o respeito pelo princípio do contraditório, já que isso violaria ditames constitucionais, designadamente o artigo 27º da CRP.»
43- A este respeito, escreve também, o Sr Conselheiro Henrique Gaspar no Código de Processo Penal Comentado, Almedina 2014, págs. 209 e segs., em anotação ao artigo 61º do CPP, através da expressão «direitos e deveres processuais», o nº1 concretiza o conteúdo material do estatuto do arguido, no que respeita ao catálogo de direitos instrumentais do direito de defesa. O direito de presença nos actos processuais que respeitem ao arguido é instrumental do exercício do contraditório e do direito de defesa. O direito do arguido a ser ouvido significa direito a pronunciar-se antes de ser tomada uma decisão que directa e pessoalmente o afecte, não tem que consistir numa audiência pessoal e oral e, por regra, o direito a ser ouvido para exercer o contraditório satisfaz-se com a pronúncia por escrito através de intervenção processual do defensor;
44- Igualmente, o Tribunal Constitucional tem-se pronunciado no sentido de que o conteúdo essencial do princípio do contraditório se traduz em que nenhuma prova deve ser aceite na audiência, nem nenhuma decisão - ainda que interlocutória - deve ser tomada pelo juiz, sem que previamente tenha sido dada ampla e efectiva possibilidade ao sujeito processual contra o qual é dirigida de a discutir, e de a contestar;
45- Concordamos com a necessidade de ouvir o arguido, no exercício do contraditório, daí a notificação ordenada pela Mmª Juiz em 04/12/2017 para que o mesmo fosse notificado para o exercício do contraditório quanto à conversão da pena de multa em prisão subsidiária, sendo inclusive referido que se consignasse que estava em causa o cumprimento de 193 dias de prisão subsidiária, entendemos contudo que essa audição não tem de ser presencial, no sentido de pessoal e oral, por essa necessidade não decorrer nem do disposto nos artigos 49º, nº1, do CP nem dos arts. 489º a 491º-A do CPP, sendo que sempre que o legislador entende que a referida audição deve ser presencial estabelece-o na respectiva norma, como acontece no disposto no nº 2, do artigo 495º, do CPP, que como já referimos não tem aqui qualquer aplicação;
46- No caso em apreço, entende-se que o tribunal assegurou ao arguido a possibilidade de exercer o contraditório antes de decidir pela conversão da pena de multa em pena de prisão subsidiária e a mais não estava obrigado legalmente;
47- Deste modo, entendemos, que bem decidiu a Mmª Juiz ao notificar o arguido nos termos em que o fez, tanto mais que o arguido esteve sempre informado sobre todas as vicissitudes da tramitação processual, teve amplas possibilidades de justificar os motivos do incumprimento da pena de multa tanto que veio apresentar requerimento aos autos subscrito por si, foi-lhe deferido o pagamento em prestações, que não pagou sequer uma delas nem apresentou qualquer justificação ou motivo impeditivo, sem assim, indicar, por escrito, os motivos da sua atitude omissiva (Neste sentido Ac. do TRP de 23/11/2016, proc. nº 786/11.7PTPRT.P1, relatora a Exma. Desembargadora Maria Dolores Sousa e Silva; Ac. do TRC de 29/06/2016, proc. nº 113/12.6GBALD.C1, relatora a Exma. Desembargadora Elisa Sales);
48- Não foi assim, cometida qualquer nulidade a este respeito, nomeadamente a expressa no art. 119º al c) do C.P.P., pelo que bem decidiu a Mmª Juiz;
49- No que respeita á notificação do arguido do despacho para o exercício do contraditório quanto à possibilidade da conversão da pena de multa em prisão subsidiária, entendemos que quanto a esta questão não há muito a dizer e a mesma é pacífica;
50- Nos termos do art. 113º nº 10 do C.P.P., não sendo uma das situações elencadas nesse preceito legal como ressalva, a notificação deverá ser efectuada ao defensor, como na verdade o foi, sendo até, também efectuada ao arguido, ambas em 15/12/17, o primeiro por via postal registada e ao segundo por via postal simples;
51- Não temos assim, qualquer dúvida de que o arguido está regularmente notificado desse despacho, pois que tal notificação foi enviada para a morada do TIR o qual sendo já com a nova redacção se mantém válido mesmo após o trânsito em julgado da sentença (fls 199 e 203);
52- Quanto á notificação do despacho que converteu a pena de multa em prisão, tal questão, muito controversa antes da Lei 20/2013, em que maioritariamente se entendia que tal notificação deveria ser efectuada por contacto pessoal, após a nova redacção do art. 196º e 214º inverteu-se a situação e pese embora não se possa dizer que já é pacífica, é largamente
maioritária a posição defendida pela jurisprudência de que basta a notificação via postal para a morada do TIR que por força da nova redacção dos citados preceitos legais, continua válido mesmo após o trânsito em julgado da decisão (No sentido de que a notificação deve ser pessoal, vide, acórdãos da Relação do Porto de 19 de Janeiro de 2011, processo nº 662/05.2GNPRT-A.P123; de 23 de Fevereiro de 2011, processo nº 18/08.5PHMTS-B.P1; de 9 de março de 2011, processo nº 630/06.7PCMTS-A.P1; de 18 de maio de 2011, processo nº 241/10.2PHMTS-A.P1 e de 14 de Dezembro de 2011, processos nºs 344/09.6PBMTS-B.P1 e 80/10.0PTPRT-A.P1, todos disponíveis in
www.dgsi.pt.;
53- A outra corrente, que entende que tal notificação poderá ser efectuada por via postal com prova de depósito, para a residência constante do termo de identidade e residência (nesta esteira se perfilam, também da Relação do Porto, os acórdãos de 6 de Abril de 2011, processo nº 53/10.3PBMTS-A.P1; de 2 de maio de 2012, processo nº 4261/07.6TAMTS-A.P1; de 4 de Junho de 2014, processo nº 618/08.3GCSTS-A.P1; de 27 de Setembro de 2017, processo nº 9126/00.TDPRT-A.P1; de 8 de Novembro de 2017, processo nº 664/14.8GAPFR-A.P1 e de 13 de Junho de 2018, processo nº 92.8GBOAZ.P1. disponíveis, igualmente in www.dgsi.pt.).
54- No sentido da necessidade da notificação pessoal, temos os seguintes argumentos:
- É distinta a natureza da prisão subsidiária e da multa, na medida em que uma implica a privação da liberdade e a outra apenas sacrifício patrimonial. Assim, a conversão da multa em prisão subsidiária constitui uma modificação essencial da decisão condenatória em momento posterior à sentença.
- O efectivo direito ao recurso, que faz parte das garantias de defesa, é melhor defendido com a notificação pessoal do arguido, sendo esta a única que assegura o efectivo conhecimento da decisão. Só a notificação pessoal satisfaz as exigências do processo equitativo, previstas no artigo 20º nº 4 da Constituição da República Portuguesa e no artigo 6º da Convenção
Europeia dos Direitos Humanos.

- A jurisprudência do Acórdão uniformizador nº 6/10 não se aplica ao caso porque tratou da notificação ao arguido de decisão diferente e porque a tese ali defendida, entre uma parte da sentença transitada e outra não transitada, no caso da revogação da suspensão da execução da pena de prisão, não é transponível para a situação da conversão da multa em prisão subsidiária. Além do mais, na situação tratada no Acórdão uniformizador o arguido tem garantido, em momento prévio ao despacho que se considerou poder ser notificado por via postal, o exercício do contraditório, com a audição do artigo 495º do CPP, o que não sucede previamente ao despacho de conversão da multa em prisão, em que não é obrigatória tal audição presencial.
- As obrigações do TIR extinguem-se com o trânsito em julgado da sentença, pelo que não pode pensar-se que a notificação postal feita para a morada do TIR produziu um efectivo conhecimento da decisão pelo arguido, quando deixaram de subsistir as obrigações de manter a residência e de comunicar as alterações subsequentes.
- As consequências do despacho que converte a multa em prisão subsidiária são bem mais graves do que várias situações previstas no artigo 113º nº 10 do CPP em que se exige a notificação pessoal do arguido, pelo que não faria qualquer sentido, entender que neste caso basta uma notificação postal.
55- No sentido de ser bastante a notificação postal, os argumentos são de outra ordem:
- A partir da revisão do CPP de 2000 a notificação postal é a regra prevista para a comunicação dos actos processuais, inclusivamente ao arguido, regra essa que vale tanto durante a pendência do TIR como em momento posterior, na medida em que a lei não distingue e o arguido mantém sempre essa qualidade no processo.
- A pena de multa convertida em prisão não altera a sua natureza de pena principal. O que se executa é ainda a pena principal fixada na sentença, através de uma "sanção de constrangimento", pois que o arguido pode a todo o momento fazer cessar a prisão, por acto da sua exclusiva vontade, pagando a multa ou demonstrando impossibilidade de a pagar e pedindo a suspensão da prisão.
- O arguido condenado em pena de multa teve dela conhecimento pessoal (quando da sentença) e sabe que consequências terá a falta de pagamento. O despacho que determina a aplicação dessas consequências não constitui assim uma modificação superveniente do conteúdo da sentença que tenha de ser levada ao conhecimento pessoal do arguido.
- Apesar da extinção dos efeitos do TIR com o trânsito da sentença, (isto antes da alteração legislativa com a lei 20/2013) as prescrições do artigo 196º do CPP que não têm efeitos restritivos nos direitos fundamentais, não constituem medidas de coacção e por isso podem manter-se para além desse momento.
- Depois da revisão de 2000, o arguido é também co-responsável pelo valor da celeridade processual. A notificação postal pressupõe sempre um contacto pessoal prévio, com a constituição de arguido e a prestação do TIR. A escolha do receptáculo postal pelo arguido e os mecanismos de certificação pelo agente dos serviços postais dão suficientes garantias de que a comunicação chega ao seu conhecimento.
56- Ora, se é certo que tem particular importância a notificação da decisão de conversão da pena de multa em pena de prisão na medida em que afecta a liberdade do condenado, de igual importância se reveste a decisão de revogação da suspensão de uma pena de prisão, e relativamente a esta foi uniformizada jurisprudência por acórdão do Supremo Tribunal de Justiça nº 6/2010, in DR 1ªS. de 21 de Maio de 2010, no sentido de admissibilidade de a notificação ser efectuada por via postal na morada indicada no termo de identidade e residência. Como já salienta o supra mencionado acórdão da Relação do Porto de 4 de Junho de 2014 «Por uma questão de coerência e unidade do sistema jurídico, deve considerar-se aplicável à situação vertente o princípio subjacente a essa jurisprudência. As duas situações são (independentemente da diferente natureza das penas em causa) substancialmente equiparáveis: da mesma forma que numa condenação em pena de prisão suspensa pode distinguir-se entre a condenação na pena suspensa substituta, que transita em julgado de imediato, e a condenação em pena de prisão efectiva, que é eventual e não transita em julgado antes do despacho de revogação dessa suspensão, também numa condenação em pena de multa pode distinguir-se entre essa condenação em si mesma, que transita em julgado de imediato, e a condenação na pena de prisão subsidiária, que é inerente a tal condenação em multa, mas também é virtual e não se torna efectiva antes da conversão dessa multa (e, portanto, não transita em julgado antes dessa conversão);
57- Note-se ainda que, a prisão subsidiária não é uma pena de substituição, que tem de ser aplicada na sentença, a opção político-criminal de privilegiar a aplicação da pena de multa, levou a que o legislador consagrasse soluções com vista a evitar, até ao limite, o cumprimento da prisão subsidiária e nessa medida, o condenado pode sempre evitar o cumprimento dessa prisão, quer pagando a multa em que foi condenado, quer alegando e provando factos susceptíveis de configurar um incumprimento não culposo, situação em que o juiz pode suspender a execução da prisão subsidiária nos termos do nº 3 do artigo 49º do Cód. Penal;
58- A pena de multa convertida em pena de prisão subsidiária não perde a natureza originária de pena pecuniária nem desaparece para dar lugar à prisão subsidiária (Neste sentido, os acórdãos do STJ de 10.01.2013, CJ/Acs STJ, XXI, tomo I, 187, e desta Relação de 30.04.2014, Processo nº 143/06.7GAPRD-A.P1, e de 26.03.2014, processo nº 419/08.0GAPRD-B.P1, in www.dgsi.pt) e por isso, no nosso entender, não pode falar-se aqui em alteração in pejus da sentença condenatória (cfr. o acórdão do TRP de 07.05.2015, processo nº 104/10.1S6LSB-A.L1-9, in www.dgsi.pt);
59- Embora as consequências da revogação de uma pena de substituição como é a suspensão da execução da prisão não sejam as mesmas que a conversão da pena de multa em prisão subsidiária, se o condenado não reagir contra a sanção de constrangimento, se nada fizer para aproveitar as possibilidades que os nºs 2 e 3 do artigo 49º do Código Penal lhe proporcionam, pode-se dizer, que como foi o caso, pois que o arguido apesar de ter vindo requerer o pagamento em prestações, depois não o chegou a efectuar, o efeito directo é o mesmo: a privação da liberdade do condenado;
60- Como se afirma no acórdão do TRP de 02.11.2011 (processo nº 150/08.5GACDR. P1, in www.dgsi.pt), "entre a pena de prisão como pena principal e a prisão subsidiária como sanção penal de constrangimento, uma e outra, na sua execução, têm o mesmo conteúdo material: a privação de liberdade derivada de uma condenação criminal, cumprida em estabelecimento prisional".
61- Parece-nos notório, que a querela jurisprudencial existente se terá esbatido com as alterações introduzidas aos artigos 196º e 214º do Código Processo Penal pela Lei nº 20/2013, de 21/02, como se verifica pelos mais recentes acórdãos em que se debate a questão.
Na verdade, a Lei nº 20/2013 veio dar nova redacção, designadamente, ao artigo 214º, nº 1, alínea e), do Código Processo Penal, nos termos do qual as medidas de coacção se extinguem de imediato com o trânsito em julgado da sentença condenatória, à excepção do Termo de identidade e residência que só se extinguirá com a extinção da pena;
63- Deste modo, de acordo com este normativo legal, as prescrições decorrentes do termo de identidade e residência mantêm-se até à extinção da pena, sendo as notificações ao arguido, após o trânsito em julgado da sentença (sem prejuízo de admissibilidade de outras modalidades de notificação previstas no artigo 113º alíneas a) a c) do Código Processo Penal), efectuadas por via postal simples para a morada indicada aquando a prestação do termo de identidade e residência - cfr. artigo 196º, nº 3, alínea c) do Código Processo Penal;
64- Assim, através da notificação por via postal simples dos despachos proferidos após a prestação do termo de identidade e residência com todas as informações ao arguido contidas no artigo 196º, nº 3 do Código Processo Penal, permite-se a satisfação das exigências de eficácia e celeridade da administração da justiça penal, que se exige e que se visa, sem postergar a garantia de defesa dos arguidos;
65- Impõe-se ao arguido, que já foi devidamente advertido de que as suas notificações passarão a ser efectuadas por via postal para a morada indicada no termo de identidade e residência, que não altere a sua residência sem comunicar essa alteração ao Tribunal, e se o arguido não cumprir tal obrigação, impende sobre si a responsabilidade pelo prejuízo e consequências que daí lhe advenha;
66- Por conseguinte, no caso dos autos, tendo o arguido prestado termo de identidade e residência nos termos da actual redacção do artigo 193º do Código Processo Penal com as advertências constantes no mesmo, a notificação a efectuar do despacho que converteu a pena de multa em prisão subsidiária, foi correctamente efectuada pela Mmª Juiz, ao ser levada a efeito através de aviso postal para a morada constante do termo de identidade e residência (Neste sentido o Ac do TRP de 13/06/2018, proc. nº 92/15.8GBOAZ-A.P1, relator Desembargadora Maria Luísa Arantes; Ac
do TRP de 27/09/2017, proc. nº 9126/00.0TDPRT-A.P1, relator Desembargador Neto de Moura; Ac do TRP de 04/06/14, proc. nº 618/08.3GCSTS-A.P1, relator Desembargador Pedro Vaz Pato. Ainda, perfilhando o mesmo entendimento, o acórdão da Relação de Coimbra de 13 de Julho de 2016, processo nº 120/14.4PTCBR.C1; Também, o acórdão do TRP de 28 de Setembro de 2016, processo nº 1239/06.0PTPRT-A.P1, não obstante preconizar o entendimento da necessidade da notificação pessoal (antes da entrada em vigor da Lei nº 20/2013, de 21/02) por razão de protecção das garantias de defesa, acaba por ressalvar a suficiência da notificação do despacho que converte em prisão subsidiária a pena de multa por via postal simples na hipótese de o arguido ter prestado termo de identidade e residência em momento posterior à vigência da redacção dos artigos 196º nº 3 e) e 214º nº 1 e) do Código Processo Penal, (como foi o caso dos presentes autos) ou seja, se tiver sido advertido de que as obrigações e consequências inerentes se mantêm até cessar a execução da pena);

67- Assim, como é defendido no Ac. do TRP, muito recente, proferido em 12.09.18, in www.dgsi.pt-e com o qual concordamos, "Desta forma, ou seja, através da notificação por via postal simples dos despachos proferidos após a prestação do termo de identidade e residência com todas as informações ao arguido contidas no artigo 196º, nº 3 do Código Processo Penal, permite-se a satisfação das exigências de eficácia e celeridade da administração da justiça penal, sem postergar a garantia de defesa dos arguidos. Na verdade, impõe-se ao arguido oportunamente advertido de que as suas notificações passarão a ser efectuadas por via postal para a morada indicada no termo de identidade e residência, que não altere a sua residência sem comunicar essa alteração ao Tribunal. Se não cumpre tal obrigação, impende sobre si a responsabilidade pelo prejuízo que daí lhe advenha.";
68- Na verdade, de entre as diversas obrigações e consequências subjacentes à prestação de termo de identidade e residência, destacam-se com particular relevo para o caso sub iudice as circunstâncias de todas as notificações futuras passarem a ser legitimamente feitas por mera via postal simples (nos termos da alínea c) do nº 3 do artigo 196º e do nº 3 do artigo 113º, ambos do Código de Processo Penal) e do incumprimento da comunicação de alteração de residência legitimar a representação do arguido por defensor e bem assim a realização da própria audiência de julgamento na sua ausência (nos termos da alínea d) do nº 3 do artigo 196º e do artigo 333º, ambos do Código de Processo Penal);
69- Deste modo, no alargamento intencional, face á divergência jurisprudencial de que o legislador, decerto se apercebeu, dos efeitos do termo de identidade e residência para além do trânsito em julgado da sentença condenatória e até à cessação da execução da pena (operado quando da apontada alteração legislativa de 2013) e não existindo outra norma que determine outra forma expressa de como efectuar a notificação ao arguido do despacho de conversão proferido ao abrigo do artigo 49º nº 1 do Código Penal, quando, existe termo de identidade e residência validamente prestado nos autos ao abrigo deste novo regime legal, a notificação a efectuar-se ao arguido deve e pode processar-se por aquela para a qual o mesmo foi expressamente advertido: ou seja, por via postal simples para a morada por si indicada para o efeito;
70- Em resumo, se o arguido tiver prestado TIR em momento posterior à vigência da redacção dos artigos 196º nº 3 e) e 214º nº 1 e) do CP, como é o caso dos autos, tendo, portanto, sido já advertido de que as obrigações e consequências inerentes se mantêm até cessar a execução da pena, consideramos defensável que se aceite que a notificação do despacho que converte a multa em prisão subsidiária se efectue apenas por via postal simples, desde que expedida para a morada do TIR ou para nova morada devidamente comunicada pelo arguido e observadas rigorosamente as respectivas formalidades;
71- O importante é a prova segura da recepção da notificação postal pelo arguido que assim, garante um efectivo respeito pelos seus direitos de defesa e torna dispensável a notificação por contacto pessoal, notando-se que no caso o arguido foi notificado para a morada do novo TlR sendo que chegou a fazer um requerimento aos autos a pedir o pagamento em prestações, como já anteriormente referimos, demonstrando desse modo ter efectivo conhecimento das notificações enviadas para essa morada;
72- Por conseguinte, estava o arguido regularmente notificado quer quanto ao exercício do contraditório, quer do despacho que converteu a pena de multa em prisão subsidiária, pois que o foi para a morada constante do TIR pelo que, bem decidiu a Mmª Juiz ao converter a pena de prisão bem como na forma de notificação, não tendo violado qualquer norma legal
                                                  *
Nesta Relação, a Digna Procuradora-Geral Adjunta emitiu douto Parecer no sentido da improcedência total do recurso.
O recorrente respondeu, reiterando argumentos expendidos no recurso.
                                     
Efectuado o exame preliminar e colhidos os vistos legais, foram os autos à conferência, cumprindo agora apreciar e decidir.
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Fundamentação

É este o despacho recorrido:
O arguido J.  foi condenado nos presentes autos, por sentença já transitada em julgado, pela prática de um crime de falsificação, p. e p. pelo art.256º nº1 al. e) e f) e 3 e de um crime condução sem habilitação legal., p. e p. pelo art.3º nºs 1 e 2 do DL 2/98 de 3 de Janeiro na pena única de 290 dias de multa à taxa diária de €5,00, o que perfaz a multa global de €1.450,00.
O arguido requereu o pagamento em prestações, o que foi deferido, não procedendo ao pagamento de qualquer prestação. Não requereu a substituição da pena de multa por trabalho a favor da comunidade.
Não foram apurados quaisquer bens penhoráveis ao arguido. Neste âmbito não foi instaurada execução.
O arguido foi notificado para exercer o contraditório quanto à conversão da multa não paga em prisão subsidiária, nada tendo dito.
Assim, em face do exposto e, ao abrigo do disposto no artigo 49º, nº 1 do Código Penal, converto a pena de multa aplicada ao arguido na pena de prisão subsidiária por 193 (cento e noventa e três) dias.
Notifique.
Notifique ainda o arguido, nos termos do disposto no artigo 49º, nº 2 do Código Penal.
A cada dia ou fracção de detenção corresponde o valor de €7,51 (sete euros e cinquenta e um cêntimos) (já que está em causa o não cumprimento de 290 (duzentos e noventa) dias de multa à taxa diária de €5,00 (cinco euros), no total de €1.450,00 (mil quatrocentos e cinquenta euros), a que corresponde a prisão subsidiária de 193 (cento e noventa e três) dias: se 193 (cento e noventa e três) dias são iguais a €1.450,00 (mil quatrocentos e cinquenta euros), então a cada dia de detenção corresponde €7,51 (sete euros e cinquenta e um cêntimos), nos termos do disposto no artigo 491º-A, nº 3 do Código de Processo Penal.
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Apreciando.
De acordo com a jurisprudência fixada pelo Acórdão do Plenário das Secções do STJ de 19.10.1995 (in D.R., série I-A, de 28.12.1995), o âmbito do recurso define-se pelas conclusões que o recorrente extrai da respectiva motivação, sem prejuízo, contudo, das questões de conhecimento oficioso.
Assim, cumpre averiguar se:
- o processado é nulo por violação do disposto no art. 119º, alínea c) do Cód. Proc. Penal e por força do art. 61º, nº 1, alínea b) do mesmo Cód. e do nº 5 do art. 32º da Constituição da República Portuguesa;
- o despacho recorrido deveria ter apreciado a possibilidade de o arguido prestar trabalho a favor da comunidade e pronunciar-se sobre se o não pagamento da multa é culposamente imputável ao arguido, com vista a uma possível suspensão da execução da pena.
                                                  *
Das nulidades
Alega o recorrente que o processado é nulo – por violação do disposto no art. 119º, alínea c) do Cód. Proc. Penal e por força do art. 61º, nº 1, alínea b) do mesmo Cód. e do nº 5 do art. 32º da Constituição da República Portuguesa – porque não foi pessoalmente notificado do despacho recorrido (que converteu a pena de multa em prisão subsidiária) nem do despacho que, visando o exercício do contraditório, o notificou sobre a imposição do cumprimento da pena de prisão subsidiária.
Nos termos do art. 119º, alínea c) do Cód. Proc. Penal, constitui nulidade insanável a ausência do arguido nos casos em que a lei exigir a respectiva comparência.
O arguido/recorrente foi condenado, por sentença proferida em 5.04.2016, pela prática de um crime de falsificação, p. e p. pelo art. 256º nº 1 al. e) e f) e nº 3 e de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo art. 3º nºs 1 e 2 do D.L. 2/98 de 3 de Janeiro, na pena única de 290 dias de multa à taxa diária de €5,00.
O arguido/recorrente foi pessoalmente notificado da sentença em 16.02.2017.
Em 17.05.2017 o arguido prestou novo TIR, indicando nova morada.
O arguido requereu o pagamento da multa em prestações, o que foi deferido, não tendo procedido ao pagamento de qualquer prestação.
Por despacho proferido em 7.12.2017 foram declaradas vencidas todas as prestações da multa e ordenado que se procedesse a pesquisas visando apurar a titularidade de bens/direitos do arguido, sendo que nada sendo apurado deveria ser o arguido notificado para o exercício do contraditório quanto à conversão da pena de multa em 193 dias de prisão subsidiária.
Deste despacho foram notificados o Defensor do arguido e este, por carta enviada com PD para a morada constante do TIR.
Não tendo sido apurados bens ao arguido susceptíveis de penhora, foi proferido em 27.09.2018 o despacho recorrido, que converteu a pena de multa em prisão subsidiária, de que foram notificados o Defensor do arguido e este, por via postal simples mediante carta enviada com PD para a morada constante do TIR.
Alega o recorrente que a notificação que lhe foi feita de ambos os despachos (quer para exercer do contraditório quanto à conversão da pena de multa em 193 dias de prisão subsidiária, quer para o notificar daquela conversão) é nula e acarreta a nulidade do processado porque as respectivas notificações tinham que ser feitas pessoalmente e não por carta enviada com prova de depósito para a morada do TIR.
Sobre notificações rege o art. 113º do Cód. Proc. Penal.
Nos termos do nº1 do referido art. 113º, as notificações efectuam-se por contacto pessoal com o notificando [alínea a)]; e também “mediante via postal simples, por meio de carta ou aviso, nos casos expressamente previstos” [alínea c)], e nestes casos, preceitua o nº 3 do mesmo normativo, que “o funcionário judicial lavra uma cota no processo com a indicação da data da expedição da carta e do domicílio para a qual foi enviada e o distribuidor do serviço postal deposita a carta na caixa de correio do notificando, lavra uma declaração indicando a data e confirmando o local exacto do depósito, e envia-a de imediato ao serviço ou ao tribunal remetente, considerando-se a notificação efectuada no 5º dia posterior à data indicada na declaração lavrada pelo distribuidor do serviço postal, cominação esta que deverá constar do acto de notificação”. Acrescenta o nº 4 que “se for impossível proceder ao depósito da carta na caixa de correio, o distribuidor do serviço postal lavra nota do incidente, apõe-lhe a data e envia-a de imediato ao serviço ou ao tribunal remetente”.
Cumpre então saber quais são os casos expressamente previstos a que alude o art. 113º, nº 1, alínea c) do Cód. Proc. Penal.
O arguido que prestou Termo de Identidade de Residência conta-se nestes casos.
De acordo com a previsão do nº 2 do art. 196º, do Cód. Proc. Penal, “para o efeito de ser notificado mediante via postal simples, nos termos da alínea c) do nº 1 do artigo 113º, o arguido indica a sua residência, o local de trabalho ou outro domicílio à sua escolha”. E estabelece o nº 3, que “do termo deve constar que àquele foi dado conhecimento: a) Da obrigação de comparecer perante a autoridade competente ou de se manter à disposição dela sempre que a lei o obrigar ou para tal for devidamente notificado; b) Da obrigação de não mudar de residência nem dela se ausentar por mais de cinco dias sem comunicar a nova residência ou o lugar onde possa ser encontrado; c) De que as posteriores notificações serão feitas por via postal simples para a morada indicada no nº 2, excepto se o arguido comunicar uma outra, através de requerimento entregue ou remetido por via postal registada à secretaria onde os autos se encontrem a correr nesse momento; d) De que o incumprimento do disposto nas alíneas anteriores legitima a sua representação por defensor em todos os actos processuais nos quais tenha o direito ou o dever de estar presente e bem assim a realização da audiência na sua ausência, nos termos do art. 333º; e) De que, em caso de condenação, o termo de identidade e residência só se extinguirá com a extinção da pena”.
A redacção do art. 196º do Cód. Proc. Penal que transcrevemos entrou em vigor com a Lei 20/2013 de 21.02, que aditou a alínea e) ao nº 3.
O arguido/recorrente prestou Termo de Identidade e Residência na vigência da actual redacção do art. 196º do Cód. Proc. Penal, logo tinha conhecimento de que, apesar da condenação, o termo de identidade e residência só se extinguia com a extinção da pena e que as notificações subsequentes à prestação do TIR seriam feitas por via postal simples para a morada indicada. Como aconteceu.
Alega o recorrente que, porque está em causa a liberdade de um cidadão, é exigível a notificação pessoal do condenado feita por OPC, sob pena de violação do direito do contraditório.
Ora acontece que o recorrente foi notificado pessoalmente, nos termos das disposições legais supra citadas. Só não foi notificado por contacto pessoal.
Antes da entrada em vigor da Lei 20/2013 de 21.02 e da actual redacção da alínea e) do nº 3 do art. 196º do Cód. Proc. Penal, grande parte da jurisprudência defendia que as notificações em questão nos autos tinham que ser feitas por contacto pessoal, pois que as obrigações impostas pelo TIR se tinham extinguido com o trânsito em julgado da sentença condenatória. Presentemente já não é assim (cfr. ainda a actual redacção da alínea e) do art. 214º do mesmo Código), como resulta evidente da leitura da jurisprudência indicada pela Digna Procuradora Adjunta que subscreveu as contra-alegações e que nos dispensamos de reproduzir.
Acrescentaremos, secundando o Acórdão da Relação do Porto de 27.09.2017 (Proc. 9126/00.0TDPRT-A.P1), que “é o entendimento contrário que tem larga prevalência na jurisprudência, sobretudo a partir do acórdão de uniformização de jurisprudência n.º 6/2010, de 15.04.2010 (DR, I, de 21.05.2010) em que o Supremo Tribunal de Justiça decidiu:
«I - Nos termos do n.º 9 do artigo 113.º do Código de Processo Penal, a decisão de revogação da suspensão da execução da pena de prisão deve ser notificada tanto ao defensor como ao condenado.
II - O condenado em pena de prisão suspensa continua afecto, até ao trânsito da revogação da pena substitutiva ou à sua extinção e, com ela, à cessação da eventualidade da sua reversão na pena de prisão substituída, às obrigações decorrentes da medida de coacção de prestação de termo de identidade e residência (nomeadamente, a de ‘as posteriores notificações serão feitas por via postal simples para a morada indicada’).
III - A notificação ao condenado do despacho de revogação da suspensão da pena de prisão pode assumir tanto a via de ‘contacto pessoal’ como a ‘via postal registada, por meio de carta ou aviso registados’ (16) ou, mesmo, a «via postal simples, por meio de carta ou aviso» [artigo 113.º, n.º 1, alíneas a), b) e c) e d), do CPP).»
Considerou o STJ que «as razões em que encontra fundamento a exigência de notificação da sentença tanto ao arguido como ao seu defensor - necessidade de garantir um efectivo conhecimento do seu conteúdo por parte daquele em ordem a disponibilizar-lhe todos os dados indispensáveis para, em consciência, decidir se a impugna ou não - são transponíveis para a notificação do despacho de revogação da suspensão, em vista das consequências nele implicadas para o condenado».”
E continua o citado Acórdão do Tribunal da Relação do Porto: “Não são idênticas as situações (a que foi objecto do acórdão de uniformização de jurisprudência e a que é objecto deste recurso) para as quais se propugna solução idêntica.
A prisão subsidiária não é, como já se referiu, uma pena de substituição, que tem de ser aplicada na sentença. Por outro lado, como é sabido, a opção político-criminal de privilegiar a aplicação da pena de multa, levou a que o legislador consagrasse soluções com vista a evitar, até ao limite, o cumprimento da prisão subsidiária. Por isso que o condenado pode sempre evitar o cumprimento dessa prisão, quer pagando a multa em que foi condenado, quer alegando e provando factos susceptíveis de configurar um incumprimento não culposo, caso em que o juiz pode suspender a execução da prisão subsidiária (n.º 3 do artigo 49.º do Cód. Penal).
(…) Embora as consequências da revogação de uma pena de substituição como é a suspensão da execução da prisão não sejam as mesmas que a conversão da pena de multa em prisão subsidiária pelas razões que já referimos, se o condenado não reagir contra a sanção de constrangimento, se nada fizer para aproveitar as possibilidades que os n.os 2 e 3 do artigo 49.º do Código Penal lhe proporcionam, o efeito directo é o mesmo: a privação da liberdade do condenado.
(…) Resta, então, a questão de como efectuar a notificação.
Sobretudo depois do citado acórdão uniformizador, não se antolha qualquer razão válida para se defender que a notificação tem ser efectuada por contacto pessoal com o notificando (…) se no AUJ n.º 6/2010 se fixou jurisprudência no sentido de que a notificação ao condenado do despacho de revogação da suspensão da pena de prisão pode assumir tanto a via de “contacto pessoal” como a “via postal registada, por meio de carta ou aviso registados”, ou, mesmo, a «via postal simples, por meio de carta ou aviso, tendo ficado vencida a posição que defendia a exigência de notificação por contacto pessoal, não se descortina por que há-de ser-se mais exigente quando se trata de notificação da decisão de conversão da multa em prisão subsidiária. (…) Em suma, a notificação ao arguido/condenado pode ser efectuada por qualquer das formas previstas nas alíneas a), b) e c) do n.º 1 do artigo 113.º do Cód. Proc. Penal.
Este argumento, conjugado com o outro já referido da actual redacção da alínea e) do nº 3 do art. 196º do Cód. Proc. Penal, são decisivos, salvo o devido respeito por opinião contrária, para concluirmos, tal como no despacho recorrido, pela perfeição da notificação efectuada ao arguido/recorrente da decisão da conversão da multa em prisão subsidiária – o mesmo se diga da notificação do despacho para o exercício do contraditório quanto à conversão da pena de multa em 193 dias de prisão subsidiária – inexistindo a nulidade invocada.
Acrescentaremos, apenas, que neste caso entendemos que o exercício do contraditório está cumprido com a notificação ao condenado para se pronunciar sobre a conversão da multa em prisão subsidiária, já que o direito que o condenado tem a ser ouvido se satisfaz com a sua audição processual, não carecendo de ser uma audição presencial, que a lei processual penal não exige (neste sentido cfr. o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 2.04.2019, proc. nº 137/14.9GELSB-5).  
Resta dizer que este entendimento não é inconstitucional por violação do disposto nos arts. 60º e 61º do Cód. Proc. Penal, nomeadamente o direito do arguido a ser ouvido quando o Tribunal deva tomar qualquer decisão que pessoalmente o afecte, nem do exercício do contraditório, consagrado no art. 32º, nº 5, da Constituição da República Portuguesa, pois que se entende que o arguido foi correctamente notificado, na morada que tinha indicado para receber notificações, para exercer o contraditório.

Do erro na interpretação e aplicação dos arts. 48º e 49º do Cód. Penal
Alega o arguido/recorrente que o despacho recorrido não se pronunciou sobre a eventualidade de prestar trabalho a favor da comunidade, nem apreciou, como devia, se o não pagamento da multa lhe é culposamente imputável, com vista a uma possível suspensão da execução da pena.
Preceitua o nº 1 do art. 48º do Cód. Penal que “a requerimento do condenado, pode o tribunal ordenar que a pena de multa fixada seja total ou parcialmente substituída por dias de trabalho em estabelecimentos, oficinas ou obras do Estado ou de outras pessoas colectivas de direito público, ou ainda de instituições particulares de solidariedade social, quando concluir que esta forma de cumprimento realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição”.
Todavia, não só, no caso, não houve qualquer requerimento do arguido para que fosse operada a substituição da multa por dias de trabalho, como o requerimento do condenado a que alude o art. 48º do Cód. Penal não pode ser feito a todo o tempo.
Resta dizer que este entendimento não é inconstitucional por violação do disposto nos arts. 60º e 61º do Cód. Proc. Penal, nomeadamente o direito do arguido a ser ouvido quando o Tribunal deva tomar qualquer decisão que pessoalmente o afecte, nem do exercício do contraditório, consagrado no art. 32º, nº 5, da Constituição da República Portuguesa, pois que se entende que o arguido foi correctamente notificado, na morada que tinha indicado para receber notificações, para exercer o contraditório.
Refere na sua fundamentação o Acórdão do STJ para Uniformização de Jurisprudência nº 7/2016 de 18.02.2016, publicado na Série I do DR de 21.03.2016, que “(…) só após o trânsito em julgado da condenação em pena de prisão substituída por pena de multa, e antes de o condenado entrar em incumprimento, é que o tribunal a requerimento do condenado poderá permitir o pagamento da multa em dias de trabalho, se entender que através desta forma de cumprimento se realizam “de forma adequada e suficiente as finalidades de punição” (cf. artigo 48.º, do CP). Isto é, o tribunal terá que concluir que, perante o dever de pagamento da pena de multa e uma vez demonstrada a impossibilidade (não imputável ao condenado) de o cumprir, pode o condenado pagar em dias de trabalho. Na verdade, entendemos que só perante a impossibilidade de pagamento da multa imediatamente, ou em diferido, ou em prestações, é que se pode entender que, em respeito pelas finalidades de punição, maxime a de socialização do condenado, aquela possa ser cumprida deste outro modo. Até porque só assim se pode solicitar a tolerância da sociedade para com esta outra forma de pagamento. E “com a demonstração da vontade do condenado em prestar dias de trabalho, poderemos já, na maioria dos casos, considerar que as necessidades de prevenção especial, no sentido da adesão aos valores da comunidade e à reparação simbólica da lesão do bem jurídico violado se encontram já assimiladas pelo condenado”. (negrito nosso).
No caso dos autos, o recorrente requereu o pagamento da pena de multa em prestações, que lhe foi deferido. Porém, nada pagou. Foi o recorrente pessoalmente notificado, tal como o seu ilustre Defensor, para o exercício do contraditório quanto à conversão da multa em prisão subsidiária, mas nada requereu a este respeito.
Não podia o Tribunal recorrido ter determinado a substituição da pena de multa por prestação de trabalho a favor da comunidade sem requerimento para esse efeito do interessado.
Assim, cumprido o disposto no nº 1 do art. 491º do Cód. Proc. Penal, com vista ao cumprimento coercivo da multa, não tendo sido encontrados bens penhoráveis, foi proferido o despacho recorrido, determinando o cumprimento da pena de prisão subsidiária.
Dispõe o nº 1 do art. 49º do Cód. Penal que “se a multa, que não tenha sido substituída por trabalho, não for paga voluntária ou coercivamente, é cumprida prisão subsidiária pelo tempo correspondente reduzido a dois terços, ainda que o crime não fosse punível com prisão, não se aplicando, para o efeito, o limite mínimo dos dias de prisão constante do n.º 1 do artigo 41.º”.
Ressalva o nº 2 do mesmo art. 49º que “o condenado pode a todo o tempo evitar, total ou parcialmente, a execução da prisão subsidiária, pagando, no todo ou em parte, a multa a que foi condenado”.
E preceitua o nº 3 daquele artigo que “se o condenado provar que a razão do não pagamento da multa lhe não é imputável, pode a execução da prisão subsidiária ser suspensa, por um período de 1 a 3 anos, desde que a suspensão seja subordinada ao cumprimento de deveres ou regras de conduta de conteúdo não económico ou financeiro. Se os deveres ou as regras de conduta não forem cumpridos, executa-se a prisão subsidiária; se o forem, a pena é declarada extinta”.
Como resulta claro da leitura do dispositivo, não é o Tribunal que tem que averiguar da causa do incumprimento do condenado (se culposa ou não). É ao condenado que incumbe alegar e provar que a razão do não pagamento da multa lhe não é imputável. E, como já decidiu o Tribunal Constitucional (Acórdão nº 491/2000, in BMJ nº 501, p. 64ss, também in www.tribunalconstitucional.pt) “A regra prevista no nº 3 do art. 49º do Código Penal, enquanto faz depender a suspensão da execução da prisão subsidiária da demonstração pelo condenado de que o não pagamento da multa lhe não é imputável, não contraria o nº 1 do art. 32ª da Constituição, onde se consagra a plenitude das garantias de defesa, nem o princípio in dubio pro reo”.

Resta ao recorrente, caso pretenda eximir-se ao cumprimento da prisão subsidiária, proceder ao pagamento da multa (cfr. o nº 2 do art. 49º do Cód. Penal).
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Decisão

Pelo exposto, acordam em negar provimento ao recurso e confirmam o despacho recorrido.
Custas pelo recorrente, fixando a taxa de justiça em 5 (cinco) UCs.

Lisboa, 11.06.2019
(processado e revisto pela relatora)
Alda Tomé Casimiro
Anabela Simões Cardoso